Por uma Epistemologia Crítica aos Estudos em Administração Pública

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Por uma Epistemologia Crítica aos Estudos em Administração Pública Autoria: Elisa Zwick

Resumo Este ensaio objetiva construir um embasamento epistemológico crítico à administração pública. Partindo da fundamentação de Burrel e Morgan (1979) elaboramos uma ilustração integradora a respeito da natureza das ciências sociais e da natureza da sociedade em suas polaridades. Entendendo que esta visão não é suficiente para pautar o campo da administração pública em suas questões axiológicas, passamos a apresentar “as tipologias teóricometodológicas das ciências em Habermas” como promissoras para pensar o campo, esboçando um quadro metodológico mais apropriado. A partir desta elaboração, chegamos à dialética negativa de Adorno como abordagem sociológica à fundamentação de uma epistemologia crítica à administração pública.

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1. Introdução Todo o processo de geração do conhecimento científico requer um percurso que esteja coerentemente embasado em uma perspectiva epistemológica e que seja capaz de atender ao avanço da ciência e da sociedade. Na prática, significa que, para a construção de uma pesquisa, é necessário que seja eleito o percurso epistemológico mais adequado, de modo que se estabeleçam estratégias de ação que levem, em primeiro lugar, a um contato apropriado e positivo com o objeto pesquisado. Em segundo lugar, a liberdade de escolha quanto ao referencial teórico adequado à pesquisa é também fundamental, o que se dá quando o pesquisador é autônomo para escolher seus caminhos, não estando sujeito a atitudes repressivas que o coíbam. Qualquer coação não condiz com uma postura adequada para uma pesquisa científica, aspecto que é analisado por Eco (1988), que o complementa ao apontar que o avanço do conhecimento passa a ser comprometido quando surgem restrições que inibem o trabalho do pesquisador. Portanto, para que nos desenvolvamos como sujeitos críticos na academia, precisamos participar de um processo que promova um encontro que seja, de fato, frutífero com pelo menos uma faceta do que poderíamos chamar de “árvore genealógica do conhecimento”. Como resultado, teremos não só uma pesquisa, mas, um sujeito transformado por ter evoluído na direção de concepções inovadoras à sociedade. Seja qual for a área estudada, acreditamos que a função da pesquisa científica é a de conduzir a descobertas que levem à formação de sujeitos capazes de romper com crenças ou modelos, sendo a formação pelo pensamento crítico um dos melhores veículos para se alcançá-lo. Se o processo do conhecimento não permitir uma abertura em direção à ação reflexiva da subjetividade humana, os sujeitos críticos não se formam e, por conseguinte, poucas mudanças o conhecimento resultante é capaz de gerar na sociedade, visto que pode estar carregado de vícios ao participar de resultados que, não raro, possam ser encomendados com vistas à manutenção do status quo. Aliada a uma perspectiva epistemológica adequada, ao anseio por uma formação crítica e à liberdade de pesquisa, para ser científico todo o estudo precisa apresentar uma coerência interna, independentemente de sua extensão. A coerência, porém, é apresentada somente no momento em que seu autor adota uma postura de pesquisa que perpasse todo o seu trabalho e, além disso, que esteja em sintonia com aquilo que acredita ser verdade para o avanço da sociedade. Obviamente, precisamos pensar em que sentido o pesquisador quer que a sociedade avance. Porém, mesmo feita com a melhor das intenções, os resultados de uma pesquisa podem ter consequências a priori incontroláveis, isto é, não mitigadas. Para evitar dramáticos desfechos é preciso que tenhamos consciência de que a postura epistemológica adotada para realizar qualquer pesquisa tem o potencial de interferir diretamente na realidade vivida. Tendo presente essa preocupação, este estudo surge no intuito de construir um embasamento à adoção de uma perspectiva para a elaboração de uma tese de doutorado que visa nortear-se por uma leitura teórico-crítica à administração pública. Sentimos a obrigação de construir previamente algumas orientações para estabelecer uma fundamentação inicial quanto à nossa postura de pesquisa, no sentido de esclarecer os pressupostos que irão governar nossa interação com o objeto durante o percurso da pesquisa. Assim, este ensaio tem como objetivo abordar, especificamente, algumas questões basilares à construção de um percurso de pesquisa seguro, quais sejam: Qual seria o percurso ontológico, epistemológico e metodológico mais apropriado para responder a uma tese teórica norteada por uma abordagem crítica? Quais os direcionamentos/elementos necessários para essa abordagem crítica? Que perspectiva metodológica é capaz de dar conta desse direcionamento? Para responder minimamente a essas questões e desenvolver um constructo teórico que possa dar conta do que nos têm inquietado, exploramos o tema deste ensaio em três seções: (i) delineando uma tipologia onto-epistemo-metodológica, em que tratamos dos 2

aspectos ontológicos, epistemológicos, metodológicos necessários a estudos de caráter crítico e emancipatório; (ii) por um percurso filosófico teórico-crítico, em que buscamos traçar, de modo mais conciso, a perspectiva a ser adotada quanto a um objeto específico, mas cujas reflexões poderão instrumentalizar outros estudos no âmbito da administração pública; e (iii) considerações finais, em que apontamos alguns direcionamentos para o estudo do tipo que queremos desenvolver, o que poderá servir de orientação para acadêmicos que desejam também escrever teses fundamentadas em estudos de natureza crítica. 2. Delineando uma Tipologia Onto-epistemo-metodológica Quando iniciamos o “garimpo” por materiais que pudessem nos orientar a respeito de uma construção epistemológica, constatamos que é usual que os estudos voltados à administração sejam sustentados pelas proposições do clássico debate paradigmático de Kuhn (1987), cujas conjecturas ensejaram formações conceituais para os estudos organizacionais pelo texto de Burrel e Morgan (1979). Mesmo que os debates acerca do texto tenham ocorrido com mais vigor entre estudiosos no período de 1979 a 1990, visto que outro trabalho de Morgan, Imagens da organização, é que toma atenção da comunidade acadêmica posteriormente, o texto sobre os paradigmas não deixou de ser influente, porém menos lido (CALDAS, 2005). Entrementes, essa fundamentação tem sido igualmente adotada em estudos voltados à área pública e suas variantes, como estudos que tratam de questões sociais e de emancipação. Não é estranho que tais estudos estejam fundamentados desse modo, pois a base do próprio ensino das teorias em administração pública ainda tem sido muito semelhante àquela adotada nas escolas tradicionais de administração empresarial ou gestão mercadológica. E o fato de haver esta condução nas pesquisas até o presente talvez seja por que o campo carece de mais debates sobre matrizes epistemológicas próprias ou mais apropriadas, advindas de estudos teóricos mais profundos e capazes fornecer uma fundamentação mais qualificada. Para contribuir nesse sentido, retomamos o debate sobre os paradigmas apresentando, nesta seção, um breve esboço a respeito deste constructo em seus principais aspectos, embora compreendamos que “o projeto da epistemologia não pode contentar-se com a simples descrição de uma evolução no tempo” (JAPIASSU, 2002, p. 5). Elaboramos uma leitura ilustrativa própria sobre os quatro principais paradigmas elencados por Burrel e Morgan (1979), que apresentamos na Figura 1. Em seguida, nos direcionamos a uma leitura diversa, ancorada na mais recente contribuição de Paes de Paula (2014), a qual nos indica o “círculo das matrizes epistemológicas” como uma nova alternativa para nortear a criação de abordagens sociológicas às ciências sociais [e aplicadas]. Também buscamos apresentar uma ilustração própria a respeito (Figura 2), partindo do que verificamos como “as tipologias teórico-metodológicas das ciências em Habermas”. Pelas polêmicas ensejadas por Burrel e Morgan (1979) na academia e por um contato anterior com a obra de Habermas (1980), aliado às contribuições de Paes de Paula (2014), que nos damos conta da importância do constructo habermasiano para nos apoiar na edificação de um estudo que preserve o caráter notadamente interdisciplinar1 da administração. No que tange à construção do conhecimento, é preciso lembrar que se trata de levar em conta a disciplina intelectualmente constituída em uma unidade bem definida do saber, sendo esta, em sua aproximação, considerada de modo detalhado e funcional, incluindo-se as possíveis relações com as demais disciplinas (JAPIASSU, 1975). É nesse sentido que é importante alicerçarmos a necessidade de preservar o caráter interdisciplinar da administração. Por esta visão, respeitamos as disciplinas em si, permitindo o uso dos seus elementos a favor da construção de um conhecimento permeável, ao passo que a transdisciplinarirade ignora o fundamento das disciplinas que formam um conhecimento, pois 3

pretende pairar sobre elas como se nada lhes devesse no campo dos fundamentos, razão pela qual Faria (2010a) denomina esta perspectiva do ponto de vista da metafísica2. Nesse sentido, devemos também atentar à dialética, que interrelaciona conceitos e conteúdos e que, com efeito, nunca foi uma afirmação genérica a revelia de uma necessária passagem de mediação pela particularidade, isto é, o não domínio absoluto da particularidade não pode significar a sua exclusão a priori. Preservar a particularidade em seu desenvolvimento até o extremo, necessidade apontada por Hegel (2003)3, é a visão que nos oferece possibilidades de desdobramentos mais ricos à união de perspectivas. 2.1. A visão paradigmática Como sabemos, Burrel e Morgan (1979) têm sido alvos constantes de consulta nas elaborações científicas em ciências sociais, pois há décadas oferecem parâmetros ao desenvolvimento da pesquisa e produção do conhecimento no campo. A partir da constatação de que as teorias não surgem do nada, mas são inerentes a uma filosofia da ciência, bem como a uma teoria da sociedade, os autores desdobram essas duas facetas. A primeira teria a ver com a natureza das ciências sociais, representada pela oposição entre subjetivo e objetivo, em que os autores chegam a quatro conjuntos de suposições, que são polarizadas a partir das perspectivas da ontologia, da epistemologia, da natureza humana e da metodologia. A ontologia é uma área complexa da filosofia, que engloba inúmeras discussões4. Burrel e Morgan (1979) a tratam enquanto essência dos fenômenos do ser (eidos), situando as ciências sociais entre o nominalismo e o realismo. Ao recorrermos à história da filosofia, verificamos que, na verdade, essas são posições que se intensificaram em debate havido na Idade Média, envolvendo filósofos como Pedro Abelardo e Guilherme de Ockham, dentre outros, que já estabeleciam discussões entre a linguagem e a materialidade (LEITE JÚNIOR, 2001). Não pretendemos aqui nos estender no debate ontológico, pois acreditamos que autores da filosofia, como o citado, possam melhor fundamentar aos leitores. No entanto, Burrel e Morgan (1979) afirmam que a posição nominalista envolve o pressuposto de que o mundo social externo à cognição individual é composto por nomes, conceitos e rótulos que servem como ferramentas para interpretar e gerir o mundo externo. Já o realismo é composto pela visão de que o mundo social externo à cognição individual é o mundo real, constituído por forças tangíveis e estruturas relativamente imutáveis, sendo que o mundo social existe independentemente da apreciação individual. Já a epistemologia, o segundo ponto que os autores elencam, é que determina o posicionamento do pesquisador do ponto de vista do conhecimento. Essa é uma decisão crucial, senão a mais importante, ao processo da pesquisa, pois é definidora dos seus direcionamentos. Por isso a ela dedicamos uma análise mais extensa. Epistemologicamente, o autor de um trabalho pode enveredar pelo caminho do positivismo ou do antipositivismo. Mesmo que este caminho possa não ser tão estanque ou dessa maneira polarizado – debate ao qual nos dedicamos na subseção seguinte –, lembramos que ele conduzirá os postulados, os métodos e as conclusões da pesquisa do cientista. Nessa acepção, não podemos ignorar que a produção científica está continuamente sujeita às condições ideológicas, não só porque o cientista, como sujeito do conhecimento, pode ser elencado como um sujeito ideológico, mas porque as suas práticas de produção de conhecimento estão estritamente vinculadas com as ideologias teóricas e plasmadas no tecido do saber do qual emergem as ciências. Assim, notamos que, se a administração pública ainda não se dissociou suficientemente de certas práticas, é porque permanece epistemologicamente envolta em ideologias que têm sido, internamente, construídas e motivadas. Como críticos a estes constructos temos diversos estudos que, partindo de Guerreiro Ramos (1981), apontam a importação acrítica de teorias como responsável por este direcionamento, como, por exemplo, Serva (1996), Tenório (2008), Paes de Paula (2005) e Bariani Júnior (2011). 4

Quanto à construção ideológica da ciência em geral, Pinto (1979, p. 147) afirma que “a ciência não surge ‘do nada’, mas do grau de conhecimento existente a cada momento e que se encontra em poder de certos grupos sociais, desenvolvendo-se em função de um fim comunitário”. Para ele, o direito de fixar os rumos da pesquisa científica está nas mãos de um determinado grupo que controla os programas de pesquisa havendo, inerente à decisão individual voluntária, também uma finalidade coletiva para que se chegue a uma determinada descoberta a ser aproveitada em benefício conjunto. Sobre as inclinações epistemológicas propriamente ditas, verificamos que na base do surgimento do positivismo está o nome de Auguste Comte, em especial devido à criação do chamado positivismo social. Nascido da exigência de constituir a ciência como alicerce de uma nova ordem social e religiosa unitária, o positivismo social é conectado a uma forma de positivismo cujo embasamento ainda é a metafísica, por deificar a matéria e cultuar religiosamente a ciência (ABBAGNANO, 1985, p. 118). Para Japiassu (1981), um dos efeitos mais patentes da preponderância positivista tem sido o impedimento de que as ciências assumam uma função crítica. Os estudos sobre as questões epistemológicas adotadas no fazer científico chamaram a atenção de Japiassu (1975) ao analisar criticamente a pesquisa, alertando para o problema da objetividade da ciência. Para ele, as ciências voltadas ao estudo do homem apresentam-se como técnicas de intervenção na realidade, estando, portanto, longe de serem imparciais. Assim, ao invés de propulsora do senso crítico, a ciência passa a cumprir, pela ótica positivista, um papel avesso quando seu potencial natural lhe é absorvido. Por isso é preciso ter cuidado ao aplicar o constructo positivista às ciências sociais, pois os estudiosos não estão suscetíveis a controlar completamente os resultados de sua pesquisa. São justamente as interferências de pesquisas na sociedade reveladoras de que em nada a produção científica atende os pressupostos da neutralidade, o que nos alerta sobre a obrigação do nosso compromisso com o tecido social5. Desta feita, ao contrário do que por muito tempo defenderam os teóricos associados ao positivismo, que seduziram grande parte da comunidade do campo social, a neutralidade científica é um mito6, sobretudo porque o cientista dialoga com interesses políticos e ideológicos, os quais governam desde a seleção de seu objeto de estudo, segundo afirma Japiassu (1975). Em seu estudo Conhecimento e interesse Habermas (1980)7 também defendeu tese semelhante, apresentando como um dos argumentos o fato de que não podemos desconectar o conhecimento do interesse, pois isto remete a uma ciência objetivista que, afastada da teoria, resulta em uma conexão ingênua entre enunciados teóricos e dados fatuais. Resultante disto, teríamos, também, uma desvinculação do próprio ideal libertador e emancipatório, que encontra correspondência na Teoria Crítica e atende à epistemologia antipositivista. Na postura de cunho antipositivista, percebe-se que a unilateralidade de processos técnicos no saber da ciência moderna foi duramente criticada pelos filósofos da Escola de Frankfurt8, em especial Adorno e Horkheimer, que acusaram a criação de uma nova forma de dominação do homem pelo homem e do homem sobre a natureza (FRAGA, 2008). Desta maneira, considera-se a não neutralidade dos indivíduos, uma vez que as ciências humanas e sociais são entendidas como plenas de métodos mais dinâmicos, segundo assinala Oliveira (1988). Com isso, pela postura antipositivista, reverte-se a questão metodológica tradicional, o que possibilita colocar sujeitos e objetos em um mesmo plano de relações, pressupondo sua interação, a qual se torna, também, uma interação entre teoria e práxis e entre conhecer e agir, o que aparece suprimido em inclinações positivistas. É por esta perspectiva que não podemos acolher que, na administração pública, para a qual aqui se buscam os fundamentos de uma epistemologia crítica, sejam adotadas posturas diferentes daquelas que promovam uma relação horizontalizada entre sujeito e objeto do conhecimento. O terceiro pressuposto de Burrel e Morgan (1979), a natureza humana, se refere à relação do homem com o ambiente externo, podendo ser perpassada por uma postura 5

determinista (objetiva) ou voluntarista (subjetiva). A primeira correspondente a respostas mecânicas frente às situações do mundo externo, ao passo que a segunda representa uma relação mais criativa e arbitrária. A visão voluntarista significa, portanto, um posicionamento mais aberto e dinâmico, em que cada qual se torna capaz de criar e controlar seus ambientes. Podemos verificar essa oposição nos questionamentos sobre a modernização, feitos por Guerreiro Ramos (2009), em que ele aponta a emergência do modelo da possibilidade (Teoria P) em substituição ao modelo das necessidades (Teoria N). Este seria um clássico exemplo que indica aos cientistas sociais a dicotomia entre determinismo e voluntarismo, pois ao apontar como agem os pressupostos da Teoria N em oposição à Teoria P, Ramos se volta à necessidade desta sobrepor-se àquela, conjecturando sete pares de assertivas polares. Ramos (1981) não deixa de embasar-se pela perspectiva paradigmática Kuhnina, o que não significa que sua formulação deva ser descartada para pensar uma administração pública criticamente fundamentada. Pelo contrário, é um dos autores que mais prezamos para o nosso estudo. A última dimensão tratada por Burrel e Morgan (1979) é a metodológica, para a qual pode ser adotada a inclinação nomotética ou a ideográfica. A nomotética está relacionada à forma de tratar o mundo social como uma realidade objetiva e externa, em que se buscam leis universais que expliquem e governem a realidade mantendo associação com o método hipotético-dedutivo. Já pelo posicionamento ideográfico se consideram as experiências subjetivas como mais importantes no processo de construção do mundo social. Quanto ao debate metodológico não precisamos nos ater, visto que ele anda de mãos dadas com a postura epistemológica do pesquisador. Depois de definir a natureza das ciências sociais, apresentando o objetivismo e o subjetivismo permeado pelos quatro conjuntos de suposições, o segundo grande momento da discussão de Burrel e Morgan (1979) corresponde à natureza da sociedade. Os autores seguem embasados em Kuhn (1987), que definiu os paradigmas como marcos teóricos ou modelos orientadores de pesquisa e produção do conhecimento, os quais se consolidam a partir de leis criadas segundo fases normais e revolucionárias, não tendo, em si, caráter incremental. Eles podem ser substituídos por outros completamente diferentes, conforme o avanço científico e da história (KUHN, 1987). Assim, Burrel e Morgan (1979) organizam seus pressupostos, apresentando, por um lado, a sociologia da regulação e, por outro, a sociologia da mudança radical. Segundo Paes de Paula (2014, p. 5), eles acreditam que a distância que separa essas duas teorias da sociedade é semelhante a que separa a sociologia de Durkheim da sociologia de Marx. Assim, Burrel e Morgan (1979) verificam a existência de apenas quatro paradigmas sociológicos distintos para a análise de uma ampla variedade de teorias sociais. É esse conjunto de proposições que procuramos sintetizar na Figura 1:

Figura 1. Natureza das ciências sociais e natureza da sociedade em suas polaridades Fonte: Elaborado pela autora com base em Burrel e Morgan (1979).

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Nas ciências, em linhas gerais, há um forte predomínio do paradigma funcionalista, epistemologicamente positivista, cuja concepção ocorreu no domínio das ciências naturais e se estendeu, posteriormente, às ciências sociais, influenciando as suas inclinações ontológicas, de natureza humana e metodológicas. Este paradigma adéqua às ciências sociais o conceito de função, a exemplo do que fez Malinowski (1978) em seus estudos ao analisar as funções dos atores sociais, considerando sob um viés progressivo a noção de função. Sendo objetivista, o funcionalismo inevitavelmente norteia-se pelo consenso. Assim, os funcionalistas entendem a realidade como envolta em normas culturais ordenadoras da vida social, sendo que o mundo “funciona” independente da vontade das pessoas, pois é autorregulado. Embora Malinowski (1978) tenha partido dessa premissa, ela não fez parte de seus estudos sempre, pois o funcionalismo pressupõe o distanciamento entre o sujeito e o objeto na pesquisa, sendo válido somente o viés do observador, em suas explicações objetivas e racionais da realidade. No paradigma interpretativo, também sob a faceta da regulação, a realidade social é vista como produto da experiência interpretativa daqueles que a constroem. Burrell e Morgan (1979) caracterizam que os estudos sob este paradigma buscam a compreensão e explicação de aspectos da vida organizacional, admitindo-se diferentes interpretações e significados à realidade. Ao assumir que as pessoas transformam a realidade, este paradigma procura compreender o compartilhamento da realidade social, numa dimensão de que possa haver a construção social da realidade, segundo o que preconizam Berger e Luckmann (2009), que concebem o homem como dialeticamente capaz de construir o seu próprio mundo social. Desse modo, o paradigma interpretativo abrange uma visão subjetiva da realidade. Embora localizado na sociologia da mudança radical, o paradigma estruturalista radical é o que mais se aproxima do funcionalismo, pois adota uma abordagem objetivista da realidade social, convergindo com sua leitura (veja-se que no desenho o aproximamos do funcionalismo). Contraditoriamente, detém sua ênfase aos aspectos relacionados a conflitos inerentes às estruturas sociais, aos modos de produção e às contradições sociais, dedicando-se ao debate sobre as tensões de qualquer estrutura. A teorização de Marx, por ser considerada estruturalista e por adotar a dimensão dialética, é relacionada a este paradigma que, diferentemente do anterior, cunha a sociologia da mudança radical. Por outro lado, o paradigma humanista radical não difere muito no sentido da construção social da realidade, pois corresponde em suas dimensões ao interpretativismo. Porém, a realidade é vinculada ao processo de consciência humana e suas patologias, bem como à interação social entre indivíduos. Sendo-lhe presente a postura antipositivista e a urgência de mudanças radicais da estrutura social vigente, seu arcabouço permite o debate sobre o modo de produção, a alienação e as contradições inerentes à sociedade, visando à emancipação do ser humano. Portanto, o humanismo radical integra a Teoria Crítica, o que inclui a forte presença de Marx também nesse paradigma. Diante da exposição dos paradigmas na versão de Burrel e Morgan (1979), concordamos que seu texto promoveu a segregação de perspectivas, dada a incomensurabilidade paradigmática que propunham os autores, considerada excessiva ortodoxia (CALDAS, 2005). Nesse sentido, nos associamos à voz de Paes de Paula (2014) que questiona o sentido de manter modelos paradigmáticos polarizados e, além disso, sob um guarda-chuva contraditório. Para o percebermos, basta voltarmos à Figura 1. Quando temos, por exemplo, o funcionalismo combinando com o estruturalismo radical em suas proposições, mas cada um convergindo a modelos sociológicos completamente distintos, assim como o que ocorre com o humanismo radical e o interpretativismo, algo de fato, precisa ser reformulado. A autora nos leva a ver outro modo de lidar com a questão da ciência, não mais pelo tão criticado viés de Burrel e Morgan (1979), mas pelo círculo das matrizes epistemológicas. É sobre esta perspectiva que passamos a ensaiar algumas reflexões para defendermos a construção de uma epistemologia crítica aos estudos na administração pública. 7

2.2. O revés: desvelando as tipologias teórico-metodológicas Além de imbuídos da visão nomológica Kuhniana, Paes de Paula (2014, p. 8) levanta como outro equívoco de Burrel e Morgan (1979) o fato de tomarem como sinônimos a rivalidade e a incomensurabilidade. Mas, a questão chave que nos convence de que não podemos adotar a visão paradigmática para os estudos em administração pública parte da constatação da autora quanto a não comensurabilidade (incapacidade de serem medidos) dos fenômenos sociais. Isto porque, axiologicamente, os fenômenos são dimensionados por posições ideológicas, o que Burrel e Morgan (1979) apresentam, quando muito, comparativamente às polaridades regulação e conflito, interpretação que, agora, concordamos ser muito falha diante da riqueza dos estudos voltados à sociedade. A falha detectada não descarta a nossa discussão sobre a descrição dos elementos ontológicos, epistemológicos, metodológicos e de natureza humana, que fundam os paradigmas de Burrel e Morgan (1979), representados na Figura 1, pois acreditamos que eles permanecem como mediadores da construção científica. Porém, assumimos que a pesquisa em administração pública deve ser pautada pela questão axiológica de modo mais dinâmico, para que nos assentemos na necessidade de compreensão de outras dimensões importantes, a exemplo da ideologia. Segundo Eagleton (1997), a ideologia mantém uma possível relação com a condução de comportamentos sociais e com a própria formação dos seres humanos em sociedade, estendendo-se aos processos pelos quais os interesses de certos grupos são universalizados, naturalizados, racionalizados e legitimados em prol de certos modos de poder político. É preciso, portanto, uma epistemologia que discuta, em associação, conhecimento e interesses para que a emancipação seja possível. Ignorar essa dimensão de análise, no que tange às discussões em administração pública, é rechaçar a dimensão crítica, o que equivale à naturalização, por exemplo, da dicotomia entre política e administração, por muitas décadas defendida como padrão para o estudo na área pública, segundo destaca Denhardt (2012). É neste sentido que percebemos como fundamental um embasamento pela elaboração habermasiana, apontada por Paes de Paula (2014) como uma lógica alternativa mais promissora para orientar os estudos organizacionais. Segundo ela, a nova lógica que podemos extrair de Habermas (1980) versa sobre uma perspectiva onde o conhecimento sociológico se desenvolve na tentativa de integrar os interesses cognitivos em três facetas: teórica, prática e libertadora. Assim, não seguimos mais a lógica da separação paradigmática sobre o guardachuva de apenas duas abordagens sociológicas que são concorrentes entre si e, ainda, portadoras de pressupostos convergentes e antagônicos. Para compreender a dinâmica do que sustenta Habermas, é preciso ter em mente a tese central de Conhecimento e Interesse: “todo conhecimento é posto em movimento por interesses que o orientam, dirigemno, comandam-no. É ‘neles’, e não na suposta imparcialidade do chamado método científico, que a pretensão pela universalidade do saber pode ser avaliada. O nexo teoria-práxis é, assim, mantido” (HECK, 1987, p. 12).

Ao combater a suposta neutralidade científica, Habermas (1980) se remete a uma crítica contundente ao positivismo que, para ele, tem sua raiz nas ciências sociais “na medida em que propunha a adoção de um método inerente a uma ciência empírico-analítica do comportamento, orientado conforme o modelo da ciência analítica normativa”. Esta inclinação promove uma compreensão epistemológica em que há “a separação entre conhecimento e interesses”, que possibilita a elevação da eficiência prática a um nível distinto e intocável de elaboração, bem como uma configuração, no nível lógico, que leva à vinculação, no plano gramatical, da “separação entre conteúdos meramente emotivos e cognitivos” (HABERMAS, 1980, p. 302-303). Disso deriva que a produção teórica aparece liberta da vida prática e que o sujeito seja encarado de modo estático. Por esta percepção reina, ainda, a ideia de objetivismo associado a uma “conexão ingênua entre enunciados teóricos e dados fatuais” (HABERMAS, 1980, p. 305). 8

Para enfrentar o objetivismo (presente tanto no paradigma interpretativo, quanto no estruturalismo radical, sociologicamente opostos na formulação de Burrel e Morgan), Habermas (1980) defende a necessidade de conexão entre regras lógico-matemáticas e o interesse como guia do conhecimento. Na medida em que apresenta a missão da Teoria Crítica como desvinculada do positivismo, ele analisa três categorias inerentes ao processo de pesquisa em seus fins (ou interesses) cognoscentes específicos: enquanto (i) as ciências empírico-analíticas promovem um interesse teórico e as (ii) ciências histórico-hermenêuticas vinculam-se a um interesse prático, nas (iii) ciências criticamente fundamentadas, governa o interesse libertador. Assim, a nossa interpretação quanto ao constructo habermasiano se daria segundo o que identificamos como “tipologias teórico-metodológicas das ciências”, esboçadas na Figura 2:

Figura 2. As tipologias teórico-metodológicas das ciências em Habermas Fonte: Elaborado pela autora com base em Habermas (1980; 1971) e Paes de Paula (2014).

Paes de Paula (2014, p. 12; 17) anuncia a correspondência mais direta da abordagem empírico-analítica ao funcionalismo, da histórico-hermenêutica com o interpretativismo, ao passo que a matriz crítica corresponderia ao humanismo. Embora abarcadas por um mesmo círculo, nós compreendemos que a produção do conhecimento e, portanto, das teorias, se dá em quadros metodológicos diferenciados, os quais aparecem na figura incluindo as suas características. No entanto, Habermas (1980) reflete sobre a junção dos interesses nas ciências empírico-analíticas e hermenêuticas: Tomados conjuntamente, os dois momentos, isto é, a construção lógica do sistema de proposições admitidas e o tipo de condições de verificabilidade sugerem a interpretação (...). Nem a teoria é construída dedutivamente nem a experiência é organizada tendo em vista o resultado da operação (...). A pesquisa hermenêutica analisa os dados da realidade (...) a compreensão do sentido orienta-se para um consenso possível do sujeito agente no quadro autocompreensivo. Enquanto o técnico postula o interesse prático, tendo em vista o conhecimento (HABERMAS, 1980, p. 306-307).

Para Habermas (1980), enquanto a ciência empírico-analítica atua em um nível de abstração liberto dos interesses naturais da vida prática, mas sujeito a leis, o conhecimento histórico-hermenêutico situa-se fora do âmbito de abordagem anterior, embora ambas levem a um saber nomológico. Diferentemente, as ciências críticas priorizam um quadro metodológico 9

mediado pelo conceito de autorreflexão, que cumpre o papel de formar um conhecimento libertador. Em nosso esboço interpretativo de Habermas (1980) percebemos os interesses em cada um dos quadros, mas eles se articulam de modo que o conhecimento lhes é circundante, evitando o que o autor qualifica como cegueira cognitiva, ou seja, existe uma convergência à geração de um conhecimento que seja o mais completo possível. Para Paes de Paula (2014), a visão habermasiana nos remete ao fato dos interesses se voltarem à solução de problemas sistêmicos. Nós acreditamos que integrar os interesses cognitivos, como aponta Habermas, não é ruim nem equívoco. No entanto, para fins de sustentação de uma abordagem crítica aos estudos em administração pública, visionamos que, aliado a cada uma das “matrizes” ou “tipologias teórico-metodológicas” determinados interesses são, obrigatoriamente, defendidos mais proximamente, tal como o esboço procura trazer. Assim, cada matriz ou tipologia defende a sua versão de verdade e não podemos ignorar que os interesses são distintos entre elas. Com isso, temos que os interesses servem de guias do conhecimento e que, aqueles mediam construções teóricas cuja finalidade nunca é obter conclusões arbitrárias. Os quatro conjuntos de proposições de Burrel e Morgan (1979) já nos conduziam a perceber esta relação entre pressupostos e conclusões. Seriam mais importantes ao processo norteador de construção do conhecimento não as dicotomias, mas, agora, como ressalta Paes de Paula (2014), as responsabilidades axiológicas, ideológicas e epistemológicas. Por isto, as inserimos circundantes às abordagens sociológicas, representando, ao campo da administração pública, a importância que há em se dialogar com os valores e o modo como se versa sobre o conhecimento. Se não percebermos que esse debate se dá num importante plano de abrangência político, o terceiro elemento, o ideológico, nos passa ao largo e a falsificação de conteúdos, segundo Habermas (1980) denominada como a própria elaboração ideológica, permanece obscurecida no nível da ação coletiva. Assim, lançamos o desafio de pensar a respeito dos elementos teóricos que integram uma abordagem crítica aos estudos em administração pública. 3. A Dialética Negativa Como Abordagem Sociológica à Administração Pública Resguardados os riscos de possíveis limitações cognitivas, precisamos consolidar “preferências cognitivas e de lógica de pensamento, bem como preferências em relação a interesses” (PAES DE PAULA, 2014, p. 14), de modo a respeitar a natureza do estudo a ser conduzido. Ao elegermos a perspectiva crítica, entendemos como principal interesse em voga o emancipatório. Não eliminamos, portanto, os demais. Porém, eles se tornam instrumentos para elevar este interesse primordial a um grau de compreensão maior, o que Paes de Paula (2014) distingue, ao analisar Habermas (1980), como uma nova forma de fazer ciência, embora não acompanhamos a tese do filósofo sobre a universalidade da hermenêutica. O fato de reivindicarmos uma abordagem crítica nos leva, num primeiro momento, a buscar aprofundamento quanto ao próprio conceito de crítica. Segundo Faria (2010a; 2010b; 2010c), a postura verdadeiramente crítica é assumida por poucos pesquisadores na área. Discriminada como radical, ela condiz com a investigação basilar dos fenômenos, ao passo que desvela dimensões de poder e controle capitalista, se constituindo numa postura epistemológica que denuncia o status quo. Ao assumir o marxismo como inclinação teórica, o autor assessora-se pelo discurso da escola de Frankfurt, também conhecida como Teoria Crítica, e nos auxilia, valorosamente, na mediação de uma abordagem crítica aos estudos em Administração pública. Assim, parametrizados pelo berço dessa discussão, a Escola de Frankfurt, chegamos ao que seria uma abordagem de fato crítica aos estudos organizacionais. É clássico o debate ensejado pela tradição frankfurtiana entre Teoria Tradicional e Teoria Crítica, aquela vista como ciência enformada (conformista, adaptativa, positivista) e esta perspectivando a práxis social libertadora. Assim, a Teoria Crítica opõe-se a praticamente todos os aspectos da Teoria Tradicional. Segundo Horkheimer (1980, p. 136-137), “o que a 10

teoria tradicional admite como existente, sem engajar-se de alguma forma: o seu papel positivo numa sociedade que funciona (...) e a confirmação através da posição do cientista, são questionados pelo pensamento crítico”. Na visão da Teoria Crítica, os indivíduos tornamse sujeitos cognoscentes, com capacidade reflexiva de mudar a própria realidade e, ao fazê-lo, aderem ao processo de ação transformadora pela práxis. Ignorar tal proposta depõe a crítica. Não se trata, portanto, de qualquer Teoria Crítica. Embora na atualidade se possam contar com diferentes modelos de Teoria Crítica, originariamente Horkheimer a defendia como partícipe do campo teórico de Marx, na medida em que ele é capaz de levar à compreensão do mercado capitalista, analisando a distribuição de poder político e a riqueza (NOBRE, 2004). Porém, segundo Nobre (2004), com os desdobramentos da Escola de Frankfurt, a Teoria Crítica passou a ser abordada por intermédio de duas grandes linhas, sendo a primeira fundada na dialética do esclarecimento, de Adorno e Horkhemier, que diagnosticam a racionalidade burocrático-instrumental da sociedade capitalista, e a outra centrada no modelo comunicativo de Habermas. Para Nobre (2004), o constructo habermasiano se contrapõe à posição, denominada aporética, de Horkheimer e Adorno, tentando reverter o diagnóstico deles de que o modelo de emancipação permanece bloqueado. Assim, conforme Nobre (2004, p. 56), Habermas defende o abandono das formulações originais de Marx em detrimento do paradigma comunicativo, norteador de uma “reprodução simbólica” da sociedade. Nesse sentido, elabora-se um dimensionamento comunicativo mediado por aquilo que se consegue, efetivamente, comunicar num mundo em que as condições reais seriam simétricas. O trabalho pela simetria seria constante e tarefa desempenhada a todo o momento dentro das condições dadas, não enfrentando de modo revolucionário a estrutura capitalista, por exemplo. Ao delimitar essas como as duas avenidas da Teórica Crítica, Nobre (2004, p. 58) assinala as diferenças de cada um desses endereçamentos: É grande a distância, entretanto, a separar essas formulações de Habermas da enunciação original dos princípios fundamentais da Teoria Crítica tal como realizada por Marx. Entre outras, uma das consequências mais imediatas dessa reformulação dos parâmetros críticos por Habermas é a de que “emancipação” deixa de ser sinônimo de “revolução”, de abolição das relações sociais capitalistas pela ação consciente do proletariado como classe. O que terá como contrapartida, por exemplo, uma valorização dos potenciais emancipatórios presentes nos mecanismos de participação próprios do Estado democrático de direito, que é o principal objeto de investigação dos trabalhos de Habermas a partir da década de 1990.

Ao desvelarmos a diferenciação entre os dois principais projetos de Teoria Crítica, percebemos como importante a associação a um deles. Embora, como esboço metodológico, o constructo de Habermas (1980) revele-se de grande valia para o nosso estudo, percebemos que, enquanto projeto teórico-político, ou seja, comparativamente ao que Faria (2010a; 2010b; 2010c) qualifica como análise de uma “economia política do poder” ao tratar criticamente das teorias administrativas, ele nos desampara. Por isso, ao elegermos como nosso direcionamento a abordagem sociológica crítico-dialética, pressupomos que nossos anseios somente possam ser atingidos por meio da dialética negativa de Adorno, pois é um projeto que “pretende pensar a dialética, núcleo da filosofia, sem sistema” (PERIUS, 2008, p. 61), se constituindo na exacerbação da negatividade dialética de Marx. Ao conceituar o pensamento voltado à dialética negativa, Buck-Morss (2011, p. 167) afirma que “Adorno empreendia a dupla tarefa de ver através das meras aparências e da realidade burguesa, bem como da pretendida adequação dos conceitos burgueses utilizados para defini-la”. Segundo a autora, a contradição da dialética negativa aparece com a negação tida como princípio lógico (apontada como filosofia negativa na Figura 2), o que possibilita angariar um pensamento dinâmico, cuja força permite impulsionar a reflexão crítica. Seu 11

pensamento é perpassado pela defesa e prática do uso reflexivo dos conceitos e, ao atentar à realidade, o filósofo procura “iluminar melhor ou de forma inovadora a própria realidade”, constituindo-se este “um objetivo que perpassa todo o seu pensamento” numa busca por “aquilo que o pensamento não é; aquilo que antecede ou ultrapassa a racionalidade instrumental ou qualquer pretensão de sistema”, em prol de uma filosofia de resistência (SCHÜTZ, 2012, p.33). Ao negar um discurso linear, Adorno busca dar vida aos conceitos e enseja reflexões sobre a transformação das categorias. Quando elas se transformam há, por conseguinte, transformações de toda a constelação de categorias, o que reverbera a elas, individualmente (ADORNO, 2009). O seu debate sobre o conceito de essência nos auxilia a compreender melhor a questão categórica: A essência é aquilo que é encoberto segundo a lei da própria inessência (...). Aquele para o qual tudo aquilo que aparece possui o mesmo valor porque não possui conhecimento de nenhuma essência que permita o estabelecimento de distinções, este se alia, por um amor à verdade fanatizante, à não-verdade, à obtusidade científica desprezada por Nietzsche (ADORNO, 2009, p. 146).

Assim, a negação, ao impulsionar a crítica, permite que o pensar, a exemplo do trabalho, dissolva o existente, apontando novas possibilidades ao transformar a própria natureza das coisas por um lado e do pensamento por outro (PERIUS, 2008). No caso do pensar, se opera uma desnaturalização de realidades instituídas, num movimento em que a própria natureza humana é envolvida por pressupostos voluntaristas, quando a crítica já aparece inserida na dimensão ontológica. Não haveria, no entanto, possibilidades de sínteses inequívocas em Adorno, basicamente porque, para ele, razão e verdade não são coincidentes, conforme aponta Buck-Morss (2011). Em sua crítica à ratio burguesa ou ao idealismo, Perius (2008, p. 51-52) aponta que Adorno caracteriza a dialética negativa como “um anti-sistema e sua tarefa é a de quebrar a força do sujeito e o engano de uma subjetividade constitutiva (...) sendo que, em sua fúria, a ratio burguesa tornou tudo homogêneo, tudo idêntico a si mesma, eliminou do sistema idealista tudo o que se encontrava fora”. Mas, o que está fora, para o autor, é aquilo que verdadeiramente nos angustia. Porquanto a função da dialética negativa é trazer a lume aqueles elementos da realidade que, em outras circunstâncias, aparecem obscurecidos. Nesse sentido é importante compreender, como uma das ideias centrais da teorização de Adorno, que a realidade não se resume aos conceitos. Quando defendemos uma crítica conceitual, que permita perpassar as aparências, estamos nos remetendo à necessidade de um constructo epistemológico que enfrente a apresentação de essências fundadas pelo positivismo. Adorno (2009, p. 147) alerta que “o positivismo transforma-se em ideologia, alijando primeiramente a categoria objetiva da essência e, então, de maneira consequente, o interesse pelo essencial”. Entendemos que, por essa visão, isso significa que, se adotarmos uma epistemologia positivista aos estudos em administração pública, estaremos dando conta de categorias de modo inessencial e promoveríamos uma falsificação da realidade. O antipositivismo, do contrário, introduz a necessidade de reflexão sobre todos os processos que envolvem o convívio social e a busca pela emancipação humana. Portanto, nos parece mais coerente mantermos, aos estudos que pretendam desenvolver a abordagem sociológica crítico-dialética, uma postura que integre interesses da vida prática, motivando a autorreflexão, de modo que os interesses que estão em jogo sejam defendidos em sua totalidade e que as responsabilidades sejam desveladas. 4. Considerações finais Objetivamos, com este ensaio, construir um embasamento epistemológico crítico à administração pública. Após pesquisas consecutivas no campo dos estudos organizacionais terem desafiado a formulação Kuhniana e, por tabela, as conclusões de Burrel e Morgan 12

(1979), voltamo-nos ao debate a respeito da questão paradigmática de modo diferenciado, buscando por um constructo que paute o campo da administração pública em suas responsabilidades axiológicas, epistemológicas e metodológicas. Assim, passamos a apresentar uma interpretação que qualificamos como as tipologias teórico-metodológicas das ciências em Habermas (1980), de modo que esboçamos um quadro metodológico mais apropriado para pensar o campo da administração pública criticamente. Assim, a partir desta elaboração, chegamos à dialética negativa de Adorno como abordagem sociológica à fundamentação de uma epistemologia crítica à administração pública. Abraçamos a tese de Paes de Paula, da “incompletude cognitiva”, e a ela acrescentamos a necessidade dos conhecimentos serem encarados de maneira caleidoscópica, ou seja, conforme a abordagem utilizada, percebemos o surgimento de diferentes “figuras”, que representam leituras diversas da realidade, não sendo, necessariamente, uma equivocada com relação à outra, mas elas se manifestam com interesses diferentes entre si. O que precisamos atentar, no intermédio do processo de pesquisa, são os reflexos que causam a postura do pesquisador na sociedade. Nesse sentido, concordamos que é preciso um investimento em “escavações teóricas”, de modo que a “teoria das reconstruções epistemológicas” (PAES DE PAULA, 2014), nos mostre da necessidade de aumentar nossa percepção a respeito das teorias, angariando uma leitura mais integral da realidade. Mas, por mais que uma das tipologias apontadas possa oferecer um alto grau de sofisticação, o papel do pesquisador é lhe retroalimentar, tanto no sentido de corroborar com sua utilidade, como para propor-lhe reformulações. Assim, nos mesmos moldes do que aponta Japiassu (2002, p. 6) sobre o desafio das ciências humanas, a área da administração pública necessita recusar modelos que depõem contra conceitos que lhe são caros, inaugurando “uma racionalidade nova, num campo particular (...) afirmando uma investigação livre sobre um objeto definido por ele mesmo”. Como também aponta o autor, é preciso que se negue uma ciência sendo construída somente em bases que recuperam a ideologia dominante e favorecem o status quo, pois conhecimentos dessa ordem carregam a mera função de fornecer “receitas científicas” que reforçam mecanismos legitimadores de poder. Esta lógica trabalha apenas na direção de técnicas e práticas que não preservam dimensões como a autonomia e a emancipação, pelo contrário, incentiva a propagação da racionalidade instrumental. Todavia, numa dimensão que ultrapassa a pretensão de sistema, a dialética negativa de Adorno possibilita formular um esboço a respeito da realidade que esteja além das aparências, conduzindo ao pensamento crítico quando desnaturaliza o instituído e desvela o oculto. Referências ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes: 1998. ______. História da filosofia. Lisboa: Presença, 1985. v. 10. ADORNO, T. W. Dialética Negativa. Rio de Janeiro: Zahar, 2009 BARIANI JUNIOR, E. Guerreiro Ramos e a redenção sociológica: capitalismo e sociologia no Brasil. São Paulo: Unesp, 2011. BERGER, P. L.; LUCKMANN. T. A construção social da realidade: tratado de sociologia do conhecimento. 31ª ed. Petrópolis: Vozes, 2009. BOBBIO, N. Democracia (verbete). In: BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política, v. 1, 3. ed. Brasília: Ed. UnB, 1991. p. 319-329. BOURDIEU, P. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Ed. Unesp, 2004. BUCK-MORSS, S. Origen de la dialéctica negativa: Theodor W. Adorno, Walter Benjamin y el Instituto de Frankfurt. Buenos Aires: Eterna Cadencia Editora, 2011. 13

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Japiassu e Marcondes (2006, p. 109-110) caracterizam a interdisciplinaridade como um método capaz de promover a interação entre duas ou mais disciplinas, havendo a possibilidade de estabelecer complementaridade entre métodos, conceitos, estruturas e axiomas fundantes de práticas científicas, tendo como objetivo utópico a formação de unidade do saber. Seria, portanto, uma forma de enfrentar o “esfacelamento do saber” provocado pela “especialização sem limites” (JAPIASSU, 2006). Encontramos uma aplicação dessa perspectiva em Faria (2010a), que defende uma concepção interdisciplinar para estudar as relações de poder nas organizações do ponto de vista da Teoria Crítica, sendo que argumenta que por meio dessa abordagem as disciplinas podem operar em conjunto em uma direção convergente. 2 Engels (1987, p. 64) define a metafísica como um método especulativo, portador de antíteses desconexas, em que não se podem pensar os objetos e as imagens senão como objetos de investigação separados, fixos, imóveis, estáticos, unilaterais. Faria (2010a) qualifica o projeto transdisciplinar como metafísico por acreditar que a transdisciplinaridade pretende introduzir a superação do conhecimento disciplinar, se constituindo em uma forma de saber que paira sobre as disciplinas de modo a se opor a elas. 3 O domínio do particular sobre o universal é expresso nessa passagem de Hegel (2003, p. 18): “precisamente pelo fato de que o princípio da particularidade se desenvolve para si até a totalidade, ele passa à universalidade e tem exclusivamente nesta a sua verdade e o direito da sua realidade efetiva positiva. Essa unidade, (...) é precisamente por isso, não enquanto liberdade, mas sim enquanto necessidade, a de que o particular se eleve à forma da universalidade e nessa forma procure e tenha o seu subsistir”. 4 Embora a ontologia de Lukács, que “culmina efetivamente numa teoria do gênero humano” (TERTULIAN, 1996, p. 55) seja atualmente a mais conhecida na filosofia, não é somente ela que fornece compreensões sobre a questão ontológica. Aliás, ela se constitui, na realidade, num rompimento com a história de uma ontologia tradicional. Fundada por Aristóteles como filosofia do ser enquanto ser, na idade média a ontologia é representada pelo realismo essencialista na querela dos universais, na modernidade criticada por Kant e retomada em novas bases por Nicolai Hartmann, que influenciou junto com Marx a ontologia do ser social de Lukács. Contemporaneamente, na filosofia, segundo Markovic (1976, p. 95, grifos do autor), a ontologia expressa

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preocupações quanto ao humanismo, sendo a ontologia humanista “a teoria filosófica dos objectos do mundo humano, cujas fronteiras são constituídas por todos os tipos de actividade humana (...), bem como as operações físicas com o corpo humano”. 5 Ao defender que a ciência precisa ser pensada também socialmente, Fraga (2011, p. 184) refere como exemplo a “trajédia de Einstein”, “o nome contemporâneo mais popular da história da Ciência”, que, depois do horror da destruição vista em de Hiroshima e Nagasaki arrependeu-se da descoberta da fissão nuclear que possibilitou a produção da bomba atômica. A decepção quanto aos resultados de sua descoberta fez com que Einstein se voltasse a atividades pacifistas daquela data até o fim de sua vida. Segundo Bourdieu (2004) Einstein seria um exemplo típico de deformação do espaço em torno de si; com suas invenções tendo tocado a qualquer físico independentemente de sua interação com ele, o impacto provocado no campo científico equipara-se a um “grande estabelecimento que, ao baixar seus preços, lança fora do espaço econômico toda uma população de pequenos empresários”. No entanto, precisamos ter visível que há distinção entre o jogo de mercado e o jogo com vidas humanas. 6 Sociologicamente, Malinowski “vê no [mito] a justificação retrospectiva dos elementos fundamentais que constituem a cultura de um grupo” (ABBAGNANO, 1998, p. 674). 7 Na versão inglesa publicada em 1971, cuja versão aqui também citamos, o livro leva o título Knowledge and human interests. Traduzido do Alemão por Jeremy J. Shapiro, Erkenntnis und Interesse, foi originalmente publicado em 1968. 8 A Escola de Frankfurt, cuja expressão Teoria Crítica é empregada como seu sinônimo por representar suas concepções, teve a sua origem em Marx e, com o passar do tempo adquiriu certo hibridismo intelectual. Sofreu influências de Kant, Hegel, Nietzsche e Freud, numa perspectiva de interdisciplinaridade crítica (FREITAG, 1990). A ideia da Escola surgiu em 1923, quando Félix Weil, na companhia de Pollock, Luckács, Wittfogel, Korsch e Sorge, organizou a Primeira Semana Marxista do Trabalho no sentido de debater as questões do mundo contemporâneo e o anseio por autonomia e independência do pensamento. Numa época circundada pela revolução social na Rússia e convulsões sociais na Europa, a Escola surgiu como o lastro do pensamento revolucionário de esquerda com a fundação do Instituto de Pesquisa Social em 1924 (MATOS, 1993). A Escola pode ser dividida em duas gerações. Na primeira, destacam-se pensadores como Benjamin, Horkheimer, Marcuse e Adorno. Depois, destaca-se a presença de Habermas, principal nome da segunda geração. Hoje a Teoria Crítica teria chegado à sua terceira geração, representada por pensadores como Axel Honneth.

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