PREPARANDO AS MULHERES E HOMENS PARA OS DESAFIOS DO AMANHÃ

May 26, 2017 | Autor: Milton Machel | Categoria: International Business, African Politics, Ethics and economics, International Commerce
Share Embed


Descrição do Produto

UNIVERSIDADE POLITÉCNICA

ORAÇÃO DE SAPIÊNCIA

Fevereiro de 2014

Pelo Dr. Tomaz A. Salomão Antigo Secretário Executivo da SADC

Magnífico Reitor da Universidade Politécnica, Prof. Doutor Lourenço do Rosário, Magnífica Vice Reitora da Universidade Politécnica, Prof. Doutora Inês Nogueira, Ilustres Membros do Corpo Docente, Distintos Convidados, Excelências, Caros Estudantes, Comunidade Académica, Caros Representantes dos Media, Caros Amigos, Minhas Senhoras e Meus Senhores.

2

I.

INTRODUÇÃO

Começo por agradecer o convite que me foi formulado pela Universidade Politécnica para proferir a Oração de Sapiência por ocasião da abertura do Ano Académico 2014. Sem ter a certeza de ser capaz de responder as expectativas criadas a volta de uma oração de sapiência, aceitei com humildade tão distinto convite e tomei-o como um desafio. É a segunda vez que tenho a honra de ser convidado pela Universidade Politécnica para partilhar algumas reflexões em ocasiões magnas como esta. O ano passado por ocasião da graduação dos primeiros mestrados da vossa delegação em Nampula, tive o raro privilégio de me dirigir aos recém-graduados à volta dos desafios da vida real, suas imposições e exigências. Desta vez aceitei o convite e um pouco na mesma linha escolhi como tema “PREPARANDO AS MULHERES E HOMENS PARA OS DESAFIOS DO AMANHÔ. Terminei as minhas responsabilidades de Secretário Executivo da SADC em Agosto do ano passado e achei por bem que depois 3

de 8 anos de passagem pelo Secretariado da SADC ser de bomtom colocar por escrito aquilo que foram os momentos marcantes desta experiência única. Poderão imaginar os dramas por que passei, quando em minha mente pensei que os protocolos do Comércio, Finanças, Energia e Transportes iriam ser o meu ponto de concentração e atenção, - pela minha experiência passada -, vi-me forçado a estudar e conviver com complicadíssimos dossiers político-diplomáticos e de segurança, sem sequer ter passado por uma escola de diplomacia. Aí o bom senso a paciência e o sorriso mesmo quando muito amargo, passaram a ser os meus companheiros de jornada preferidos especialmente nos últimos 5 anos do meu mandato. Assim foi com o Zimbabwe, Madagáscar, Lesotho e RDCongo. Não pretendo com este trabalho dar lições aos estados membros ou suas lideranças, mas apenas, e muito apenas, deixar uma reflexão e notas pessoais de um cidadão moçambicano que passou pela SADC e escreveu o que pensa sobre o bloco regional nomeadamente:  Onde estamos bem,  Onde podíamos fazer melhor, 4

 Onde penso que não estamos bem e precisamos de corrigir como por exemplo ao nível da implementação do protocolo de Livre Circulação e finalmente, Em que fase do processo nos encontramos?!  O da cooperação entre estados membros  Ou o da integração sabido que esta última pressupõe a entrega de parte da soberania dos estados

membros

em

matérias

previamente

acordadas para que as decisões sejam tomadas algures e por uma entidade que presta contas sim aos

estados

membros,

mas

com

poderes

decisórios independentes. Este é um livro mais dirigido às novas gerações (às mulheres e os homens de amanhã), analistas estratégicos e instituições de ensino. Cada um, poderá tirar as suas ilações, concordando ou discordando com as minhas asserções e conclusões, ou mesmo para os académicos, questionarem o modelo de integração que estamos prosseguindo.

5

Espero com o apoio da Universidade de Wits onde me encontro actualmente a leccionar, concluir o primeiro esboço em Março próximo, para quem uma vez mais vão os meus sinceros agradecimentos e reconhecimento pelo apoio que me tem sido prestado.

II.

MOTIVACÃO DO TEMA ESCOLHIDO

Aceitei este convite movido pela convicção de que o vosso nobre esforço de preparar o recurso mais importante de que dispomos o HOMEM, para fazer face aos desafios de hoje mas sobretudo aos de amanhã deve ser amparado, acarinhado, ontem, hoje e sempre. Esta é sem dúvida, das mais nobres missões que temos pela frente como mulheres e homens deste país. Julgo mesmo que as mulheres e homens da minha geração e outras, devem na medida das suas possibilidades, partilhar o seu conhecimento e experiência prática com os mais novos de tal sorte que estes possam num futuro mais ou menos longínquo desempenhar as suas funções e responsabilidades sem complexos uma vez que estão dotados das bases do conhecimento teórico e as vezes prático que o mundo de hoje 6

impõe. Ao saberem mais e ao estarem melhor preparados, estes jovens terão obrigação de fazer mais e sobretudo melhor que as gerações que os antecederam e todos ganhamos com isso. É isto, caros estudantes, que me anima ao vir com humildade partilhar alguns momentos convosco e, obviamente, com o vosso corpo docente. Hoje faremos apenas uma abordagem genérica dos assuntos e aqui voltarei (obviamente caso a Reitoria assim o decida), para desempacotarmos algumas das matérias em temas muito específicos, a saber:  No domínio do comércio internacional: Estado das negociações entre os grandes blocos, “a famosa ronda negocial iniciada em Doha”  No domínio da macro economia: Comportamento no país e na região das principais variáveis, nomeadamente a inflação e a taxa de câmbio e as implicações a curto prazo do enfraquecimento do Rand Sul-Africano  No domínio da política monetária: Implicações para o desenvolvimento dos grandes e médios empreendimentos

no

pais

de

uma

restritiva ou expansionista, e, finalmente 7

política

 Qual

é

o

impacto

de

todos

estes

elementos/factores na agenda de integração económica regional. III.

O QUE DE VÓS SE ESPERA

Quando saírem daqui, caros amigos, o que importa não é apenas o diploma ou certificado que vos satisfaça ao nível pessoal ou compense os enormes sacrifícios que vossos pais e parentes consentiram para que se pudessem graduar que vai contar. Não se espera de vós uma resposta em coro ou uníssono de que 2+2=4, ou que,

. Essa resposta, mesmo que correcta

encontrámo-la no homem mais comum da sociedade; de vós espera-se uma resposta de o porquê 2+2 não é igual a 5 ou porquê a , pondo as coisas de forma simplificada. De vós se espera uma análise de hipóteses e pressupostos que nos levem a eliminar metodologicamente o que não está certo e assim chegarmos a resposta mais acertada. É assim porque se entende que vós estais armados de instrumentos de análise necessários para fazer no mínimo a

8

interpretação correcta dos fenómenos que nos rodeiam mesmo não sendo possível dar resposta a tudo como e óbvio. A grande diferença entre políticos e académicos é a de que, os políticos sonham e por vezes esses sonhos nada têm a ver com o que é possível e real; mas eles têm mesmo que sonhar. Os académicos também podem sonhar, simplesmente, precisam de testar os seus sonhos como hipóteses do que pode ser possível em contraposição do que deve ser definitivamente afastado como hipótese a considerar usando uma metodologia apropriada. De vós espera-se que, no futuro, como gestores possam dar um contributo para o melhoramento da imagem das contas públicas do país ao nível do déficit fiscal mas sobretudo o aconselhamento aos decisores sobre a contratação de uma dívida pública sustentável para que a vossa geração e as vindouras não sejam escravas das responsabilidades do capital e juros de uma dívida contraída hoje ou de aparentes donativos que acarretam consigo pesadas responsabilidades externas.

9

Mesmo os esperados rendimentos dos chamados grandes projectos, sejam ele o carvão, gás, etc., estarão assim amarrados a estas responsabilidades externas no lugar de reforçarem a capacidade dos orçamentos dos sectores de educação, saúde, abastecimento de água e manutenção de infra-estruturas, sectores vitais para o melhoramento do bem-estar das pessoas. Desta forma contribui-se, e de forma negativa, para a manutenção do ciclo vicioso do empobrecimento e suas consequências nefastas para a estabilidade social no futuro. De vós espera-se no futuro o desenho e aconselhamento de políticas de gestão e aproveitamento de energia eléctrica com a compreensão clara de que a energia compreende a geração, transmissão e distribuição. Ao investir-se na geração e transmissão sem a contrapartida necessária na distribuição, corremos o risco de assistirmos a um galopante blackout (apagão) nas nossas cidades e vilas como já acontece em Nampula, Beira, Chimoio, Xai-Xai e partes de Maputo, criando nos consumidores um estado de ansiedade e incerteza permanentes. As implicações disto podem assumir proporções graves e alarmantes para o clima e ambiente de negócios. Ora vejamos: 10

Durante uma recente visita, à zona carbonífera do Moatize diziame um dos operadores que pelo facto de a cidade da Beira ter ficado sem energia por cerca de 10 dias ou mais, a operação portuária ficou paralisada e daí a melhor decisão foi a de suspender também a operação ferroviária com as suas implicações uma vez que o planeado é a execução de 5.5 comboios por dia no sentido descendente ou seja Moatize – Beira. Estes comboios que não foram realizados não são recuperáveis no tempo uma vez que a linha não está ainda preparada para acomodar mais comboios. Os prejuízos acumulados podem ser alinhados da seguinte forma: Um comboio de 40 vagões com 60 tons cada equivale a 2400 tons por comboio; o preço actual do carvão mineral está em 110 dólares a tonelada o que significa: 2400 x 110USD = 264.000 USD x 5.5 = 1.452.000USD por dia de prejuízos

pelos

15

dias,

21.780.000USD

de

prejuízos

acumulados na operação ferroviária, sem contar com as despesas decorrentes dos navios que se encontram no alto mar e no porto que com operação ou sem operação vão facturando.

11

Tudo isto somado, e este é o aspecto mais grave, contribui para criar uma percepção por vezes errada de que o país não está preparado para acolher projectos desta magnitude, para além do impacto negativo na nossa competitividade no mercado mundial onde temos que ombrear com gigantes como Austrália, China, Estados Unidos, África do Sul, Índia entre outros. Queremos engenheiros planificadores do nosso desenvolvimento energético que ao saberem que o novo edifício do Banco de Moçambique na baixa da cidade de Maputo, vai consumir tanto de energia como toda a cidade de Pemba, recomendem os investimentos necessários e que se impõem à jusante, de outro modo, o racionamento e os apagões serão parte do nosso quotidiano. Na mesma ocasião, Cabora Bassa encontrava-se em pleno funcionamento com as suas cinco turbinas creditando os cerca de 1460 megawatts para a África do Sul e, os cerca de 480 para Moçambique e Zimbabwe. Todavia, parte desta energia não chegava aos seus destinatários gerando os chamados apagões na Zona Centro.

12

A questão não está pois na geração em Cabora Bassa, Mavuzi, Chicamba ou amanhã em Mpanda Nkua mas sim na transmissão e sobretudo na distribuição que se encontra sobrecarregada acima dos limites de tolerância. Deve-se notar que nos últimos dias o Zimbabwe, que foi sempre dependente de energia de Moçambique e em alguns momentos com dificuldades de cumprir com as suas responsabilidades, acabou virando exportador de energia para Moçambique o que não deixa de ser inédito face as dificuldades com que aquele país se depara no domínio da energia. De vós pois espera-se que saiam de entre outros, gestores integrais do nosso bem-estar social, económico, sustentável e em harmonia. Por isso, estão aqui e um dia serão diplomados em breve e amanhã estarão a competir num mercado que se espera cada mais exigente.

13

IV.

O MUNDO DE HOJE

Vivemos num mundo em rápidas e constantes mutações, em que as relações entre os estados são norteadas por 2 grandes paradigmas:  O acesso ao Mercado  O acesso à recursos minerais e energéticos. Em alguns casos se necessário, mesmo o recurso a Guerra pode ser usado, assim como o endividamento forçado. Exemplos como a RDCongo, RCAfricana, Sudão do Sul, Mali, Somália, são bem reveladores desta triste mas real situação. Durante a recente visita do Primeiro do Japão a 3 países da África Oriental nomeadamente Etiópia, Tanzânia e Moçambique, onde foram identificadas enormes reservas de gás natural e sabido que a sua exploração vai decorrer daqui há 5 anos, e dada a dinâmica política no Japão, que o Primeiro Ministro até seja então outro, o importante a ser realçado é que o mandato supremo recebido pelo Primeiro Ministro de Sua Majestade o Imperador é o de assegurar que a grande Ilha do Pacífico e uma das mais modernas economias do mundo, continue a sobreviver e para tal, os recursos energéticos são fundamentais.

14

Em simultâneo é necessário evitar que o seu poderoso vizinho com quem há disputas em torno das ricas águas das (Ilhas denominadas Senkaku pelo Japão e Diaoyu pela China) tome controle total dos recursos em África, em particular ao longo da costa oriental. Por isso, foram escolhidos 3 países do Oceano Índico cujas reservas dão a tranquilidade necessária de acesso ao gás e carvão para os próximos 25 anos ou mais. Dizia-me um ilustre ex-colega, académico e amigo etíope que ficou frustrado com o discurso do Primeiro-Ministro Japonês para o qual fora convidado; perguntei-lhe as razões e disse-me que esperava ouvir do Primeiro Ministro uma mensagem mais dirigida aos africanos e neste caso etíopes; dizia ele que aquele alto dignitário mais se estava dirigindo a uma audiência no Japão, daí a sua frustração. O meu comentário foi de que o Primeiro Ministro Japonês estava certo uma vez que ele representa e defende os interesses japoneses; ele estava fazendo o trabalho dele e dirigia-se aos seus contribuintes. Compete a nós Africanos ter clareza sobre os nossos interesses e saber como os defender ou projectar, quer em fóruns internos 15

ou quer mesmo nos internacionais. E a melhor forma de o fazer é assegurar que nas negociações dos contratos que assinamos em particular aqueles que se prendem com a exploração de recursos naturais não renováveis os nossos países também fiquem a ganhar, mesmo que inicialmente tudo gire a volta de uma percepção de que também saímos a ganhar. Perguntei ao meu ilustre amigo qual tinha sido a mensagem do seu país (Etiópia), ao ilustre Primeiro Ministro Japonês ao que me respondeu, não ter a certeza. Após uma longa conversa, os dois convergimos ao concluir que era tempo de os Africanos de maneira concertada transmitirem nos fóruns do TICAD1 4, 5 e 6 uma mensagem, para além dos elogios formais a cooperação, de que em face aos interesses estratégicos do Japão em África, se aquele país pretende de facto ser um actor influente no apoio ao desenvolvimento, o seu instrumento actual de cooperação, precisa de ser revisitado de modo a torná-lo mais eficaz e também providenciar ganhos aos países em desenvolvimento.

11

Instrumento do Governo Japonês de Cooperação e Ajuda ao Desenvolvimento

16

O Japão poderia assim trazer algo de inovador na cooperação Norte-Sul, não baseada no já gasto modelo de condicionalidades a que fomos habituados pelo Ocidente. Tal modelo deveria incluir responsabilidades para o sector privado japonês em diferentes domínios promotores de desenvolvimento. Ao proceder desta forma, o Japão podia fazer a diferença e todos ficaríamos a ganhar desde as grandes Toyota, Mitsubishi, Nissan, Izuzu, Honda, Komatsu, etc., até ao pequeno homem de negócios ou camponês nas zonas rurais mais recônditas dos nossos países, onde quando se ouve o rugir de um veículo aproximar-se, é sempre salvo quase nulas excepções, um motor de marca “MADE IN JAPAN”. Doutro modo os fóruns do TICAD não passarão de mais de um “talking show”. Ainda na senda dos recursos minerais e energéticos, muito facilmente referimo-nos a biliões de dólares americanos como o custo dos grandes projectos de investimento, mas esquecemonos de referir que menos de 1% das transacções dos mesmos passam pelo nosso sistema financeiro com muito pouco ou nada

17

a ver com a nossa instituição guardiã, o Banco Central; trata-se de transacções ou pagamentos feitos do exterior para o exterior. Será mesmo que tem que ser assim ?! Julgo que não, desde que de forma gradual nos habilitemos, judicial, financeira, económica e tecnologicamente com os recursos humanos habilitados a negociar um dia, de igual para igual certos de que nem sempre vamos ganhar e por vezes perderemos. Por se tratar de recursos naturais não renováveis o cuidado tem de ser ainda maior, uma vez que negociado e encerrado o dossier, qualquer reabertura negocial poderá apenas ser feita com penalizações, as vezes tão iguais como o custo inicial do projecto. De uma coisa pode-se ter a certeza: Ninguém investe para perder dinheiro e quanto mais ganhar melhor. Do nosso lado como país, como empresa nacional, estaremos a ganhar o que devemos ganhar?! Esta é a pergunta real que se põe.

18

Ao visitar muito recentemente projectos de investimentos a serem implementados por uma grande empresa de um “país amigo” em montantes referidos como que equivalentes a biliões de USD financiados por um banco participado pelo estado (EXIM BANK), chamou-me atenção que de entre os biliões de USD referidos se encontravam água mineral, ferro de construção, cimento, uniforme para operários, tampas de saneamento, tudo isto importado e muito pouco ou nada da nossa indústria local, isto para não me referir a mão-de-obra não qualificada mas importada. É verdade que tudo isto está se traduzindo em muita actividade no terreno, com camiões pesados circulando para cima e para baixo, alguns dos quais devido a falta de controlo de carga nas nossas básculas, vão danificando prematuramente as nossas estradas.

Mas

toda

esta

actividade

com

excepção

do

fornecimento de água, energia, areia e pedra em muito pouco contribui para expandir a procura da produção interna em suporte a estes grandes empreendimentos. Dizia-me com muito orgulho um jovem gestor formado na Universidade de Harvard nos Estados Unidos, de que aquela era a política do seu país e pouco espaço de negociação havia e se 19

tal tivesse que ocorrer isso teria que ser feito com a capital ou com a sede da sua empresa situada numa província localizada no centro da grande potência do futuro. O mandato dele, dizia ele, era o de gerir os materiais recebidos e com os recursos humanos disponíveis assegurar o bom desempenho das empresas do seu país no perímetro da zona económica especial. São todas estas responsabilidades que um dia vão ter de ser pagas com as receitas provenientes do camarão, da madeira (se é que daqui há 5 anos ainda exista) ou com as receitas do carvão e gás num futuro não menos distante. Daí ser crucial a qualidade do que negociamos e como negociamos como país e sua transparência sobretudo quando há responsabilidades

externas

acrescidas,

porque

independentemente de quem hoje negoceia todos vamos ser chamados a pagar amanha como cidadãos deste país. DAÍ

NOVAMENTE

SUBLINHAR

A

IMPORTÂNCIA

DA

CAPACIDADE E ARCABOIÇO DAS NOSSAS EQUIPAS NEGOCIAIS,

CUJA

FORMAÇÃO

É

UM

CONTÍNUO, PERMANENTE E PERSISTENTE.

20

PROCESSO

V.

A SADC COMO BLOCO REGIONAL

Dizia no início da minha intervenção, que havia terminado o meu mandato como Secretário Executivo do nosso bloco regional. A SADC é hoje um dos blocos mais fortes e respeitados no nosso continente, pelo seu percurso, história e feitos. Com uma população de cerca de 280 milhões de habitantes, o bloco foi crescendo de 7 membros para 9 e hoje integra 15 países. [Slide 1] O PIB gerado na região é de cerca de 650 biliões de USD o que parece um número grande, mas ele é inferior ao PIB gerado pela Turquia sózinha. [Slide 2]

A história do bloco remonta aos anos 80, com a transformação dos países da Linha da Frente para Conferência de Coordenação das Acções de Investimento e Aproveitamento das Infraestrururas de Transporte em particular, de modo a isolar ainda mais o regime Sul Africano do Apartheid e acelerar a sua queda. [Slide 3]

21

Entre os muitos acontecimentos desde então, destaca-se a batalha de Kwito Canavale, no sul de Angola em 1988 cujo desfecho marcou o início do desmoronamento do regime do Apartheid e seus alicerces. Os moçambicanos mais idosos estarão seguramente recordados da célebre manhã de Segunda Feira em que o ataque aéreo à Matola, decorreu precisamente na mesma hora em que o DC10 da LAM proveniente de Paris aterrava em Mavalane. Seguiram-se a independência da Namíbia, a Libertação de Nelson Mandela em 1990, o fim da guerra em Moçambique em 1992 com a assinatura dos Acordos de Paz de Roma. Finalmente o Apartheid passou definitivamente à história em 1994 com a proclamação da nova África do Sul Democrática a 9 de Maio de 1994. O preço pago sobretudo por países como Angola, Botswana, Moçambique e Zâmbia em termos humanos e materiais foi elevadíssimo e os seus efeitos sentem-se e sentir-se-ão ainda ao longo dos anos. 22

Esta é uma realidade que a não ser devidamente registada pelos historiadores facilmente passará para o esquecimento, como se nada tivesse acontecido e como se os Sul Africanos de todas as raças tivessem sido sempre iguais, o que não é o caso. Infelizmente as marcas desse passado negro e sombrio continuam a fazer-se sentir e as testemunhas vivas estão desaparecendo do mundo dos vivos como muito recentemente quando perdemos o Homem que simbolizava essa gloriosa e heróica luta contra o apartheid, Nelson Mandela. O seu nome e feitos continuarão a ser homenageados por todos amantes da humanidade num convite a cada ser humano, mulher e homem para tudo fazer para que amanhã seja uma pessoa melhor para todos que o rodeiam, quer conhecidos e os desconhecidos. Por tudo isto e por tudo aquilo que os povos desta região passaram, esta região Austral de África é qualificada hoje como um bom exemplo e uma referência na transição de uma era de confrontação violenta e sangrenta para uma era de paz, respeito mútuo, reconciliação e segurança. 23

Estou mais do que certo e convicto de que não passa pela cabeça de nenhum moçambicano -, no pleno exercício das suas faculdades -, ver uma ou duas linhas acrescidas naquele slide e que digam:  2013/2014



REINÍCIO

DA

GUERRA

EM

MOÇAMBIQUE. Mesmo aqueles, que ontem aparentemente divergiam à mesa das negociações, seguramente não estavam interessados no retorno a um cenário de guerra, nem a brincar, porque com a guerra não se brinca ou se fazem experiências e todos sabemos disso.  Moçambique não merece;  Os Moçambicanos não merecem tal sofrimento;  Velhos, mulheres e crianças em particular nas zonas mais afectadas, não podem continuar a viver na incerteza, apreensão e de trouxas nas suas costas e na cabeça.

Estamos encorajados pelos consensos recentemente alcançados à mesa das negociações pelo que junto a minha voz a de tantos 24

outros compatriotas e não só, para apelar ao Governo e a Renamo para que tudo façam, para que de uma vez por todas o machado da guerra seja definitivamente enterrado e as armas se calem para sempre em Moçambique. Não haverá nem vencedor nem vencidos, o único ganhador será Moçambique e o seu Povo. Esta é a mensagem de que toda a Nação está ansiosa de ouvir. Aos facilitadores e a Si, caro amigo e irmão Prof. Lourenço do Rosário e seus colegas de equipa o nosso reconhecimento e encorajamento para prosseguirem sem desfalecimentos na vossa nobre missão e contribuir para que Moçambique volte a ter paz efectiva e possa continuar a desenvolver-se. Estou certo que a história está registando tudo o que têm feito por nós. Quando se trata de manter e preservar a Paz vai-se sempre a tempo de acomodar o que pode ser acomodado ainda que tardiamente, porque infelizmente morreram pessoas inocentes e a vida não tem preço. Esta é a janela de oportunidade que temos e Moçambique não a pode desperdiçar. A história do nosso continente, a Mãe África infelizmente mostra que em vários países enquanto os nacionais lutam entre si, mutilam-se e matam-se, aqueles há que vão tirando benefício e 25

partido desta situação estimulando-a, por via da venda de armas e munições para assim puderem continuar a extrair os nossos recursos minerais e outros enquanto que nós ficamos mais empobrecidos, as desigualdades se agravam e a justiça social não passa de uma miragem. Somos assim qualificados por esses mesmos instigadores e outros beneficiários legais ou ilegais dos nossos recursos, como incapazes e incompetentes de resolver as diferenças e os diferendos entre nós. Estes são os tristes casos da RDCongo, RCAfricana, Sudão do Sul, Somália, Mali dentre outros. Moçambique vai ainda a tempo de evitar este cenário triste e desumano, mortífero e inaceitável e já demos provas no passado de que somos capazes de o fazer. A oportunidade é agora.

VI.

A ESTRUTURA PRODUTIVA DA SADC

Moçambique é um dos países fundadores do nosso bloco regional a SADC, cuja história tentei sumarizar no transparente que passei. [Slide 4]. 26

A sua estrutura produtiva gera um PIB de cerca de 650 biliões de USD americanos e é comandada pela África do Sul que representa 68% daquele valor. Angola país emergente de uma guerra devastadora de mais de 18 anos, implementou um robusto programa de reconstrução nacional, assente na reabilitação das suas infra-estruturas sociais, transportes, energia e água suportado pela gestão adequada dos seus recursos petrolíferos e diamantíferos hoje emerge como a segunda economia do bloco. [Slide 5]

Moçambique a par da Namíbia, representa apenas 2.5 a 3% do total. Um caso interessante e que merece uma análise cuidada e despida de preconceitos é o caso do vizinho Zimbabwe que de segunda economia da região, passou hoje a ter um papel pouco significante como resultado da implementação de políticas cuja sustentabilidade e benefícios para o país hoje, são bastante discutíveis. Mas esse assunto não é objecto da nossa agenda de hoje.

27

Ao nível do produto interno bruto per capita não obstante os esforços feitos na recuperação económica do país, o nosso PIB per capita continua a ser dos mais baixos da região estando apenas acima do Malawi, Madagáscar e RDCongo e a par com a Tanzania. [Slide 6]

Este número apenas traduz uma realidade que é a de que grande parte dos moçambicanos vive ainda na pobreza ou mesmo na pobreza absoluta e as desigualdades entre os que têm e os que pouco ou nada têm são ainda enormes. Aliás, se sairmos dos nossos centros urbanos, municípios e vilas e mergulharmos pelo interior do nosso país somos ainda confrontados com esta difícil realidade. Ao nível das zonas peri-urbanas a realidade não é diferente, agravada pelo rápido afluxo de compatriotas das zonas rurais para as urbanas, na ilusão de encontrar uma vida melhor ou mais decente; por sua vez estas zonas urbanas não estão preparadas com infra-estruturas ou planeamento urbano adequado para fazer face a uma pressão adicional resultante da formação de novas famílias e de emigrantes rurais.

28

Este quadro é agravado pela pressão adicional de emigrantes estrangeiros

desde

Somalis,

Nigerianos,

Ruandeses,

Congoleses, Etíopes, Paquistaneses, Bengalis, Portugueses, Chineses, e outros que estão tomando espaço nas nossas urbes competindo com os nacionais.

VII. OS DESAFIOS QUE VOS ESPERAM NO MUNDO REAL Esta difícil realidade longe de nos aterrorizar, deve trazer a nossa atenção e consciência dos grandes problemas com que o país se vai confrontar nos próximos tempos ou seja a curto e médio prazo. Quero mesmo acreditar que vocês serão actores activos na procura de soluções para os mesmos. Sou tentando a destacar dentre eles quatro. O primeiro, de uma população de 23 milhões em 2012 seremos em 2025, 33 milhões a uma taxa de crescimento média anual de 2.7%. Segundo dados do INE, 49.5% desta população é jovem e com idades entre os [0 – 14] anos. Cerca de 51% da mesma população estará em idade

activa, exercendo uma pressão

adicional traduzida na necessidade de mais escolas, hospitais mas sobretudo emprego. 29

O segundo desafio prende-se com a rápida expansão das nossas cidades e vilas que a não ser acompanhada por um adequado planeamento físico do uso e aproveitamento do espaço -, urbanização -, vai apenas contribuir para agravar o caos e a confusão que já tomou conta das nossas urbes, onde o negócio de terrenos e espaço por parte de elementos da autoridade municipal está na ordem do dia estimulando a corrupção e a marginalização dos indefesos e pobres que muito pouco ou nada podem fazer. O terceiro desafio prende-se com o aumento da produtividade e competitividade do sector agrícola, e a do país no geral a médio e longo prazos, porque dela dependem novos investimentos e consequentemente

a

criação

de

novos

empregos.

A

competitividade terá de estar associada ao desenvolvimento de uma classe empresarial (efectiva) nacional forte. O quarto e último desafio, provavelmente o mais importante, prende-se com a coerência lógica entre o modelo económico que estamos prosseguindo como país –, a economia de mercado -, a construção de uma democracia multipartidária e finalmente uma

30

sociedade caracterizada por muita pobreza, desigualdades, economia informal e muito desemprego. Será possível pensar num modelo coerente e de coexistência pacífica entre os factores acima mencionados, ou a sociedade que construímos será o resultado de remendos feitos aqui e acolá? Reflectir nestas matérias e apontar caminhos, é um dos grandes desafios que se coloca aos académicos e estudiosos como parte do seu contributo para o enriquecimento da Agenda 2025. Dizia-me um estudioso em matérias de estratégia continental que o maior desafio de África nos próximos 10 anos é o de que vão ser introduzidos no mercado de emprego cerca de 110 milhões de africanos dos quais apenas há emprego garantido, em termos de projecção, para cerca de 55 milhões; o remanescente vai procurar emprego fora do continente, ou para agravar os nossos problemas dentro do continente, ou seja, em cada um dos nossos países Moçambique incluído. Este é na realidade o problema com que nos vamos confrontar.

31

A este junta-se a crescente e visível degradação do meio ambiente e os seus efeitos negativos nas nossas já frágeis economias. Ao terminarem os vossos cursos receberão certificados e diplomas que permitirão a vossa integração num mercado cada vez mais competitivo ao nível nacional, regional e continental. Daqui



20

ou

30

anos,

vocês

próprios

far-se-ão,

eventualmente após um longo percurso, a pergunta mais importante das vossas próprias vidas a saber:  Como médico, engenheiro, economista, jurista, gestor de empresa, psicólogo, docente, chefe de família, político, de que maneira individual ou colectivamente contribui, após a formação que recebi na Universidade Politécnica ou num outro estabelecimento no futuro, para uma maior EQUIDADE,

JUSTIÇA

SOCIAL

E

MENOS

DESIGULDADE na nossa sociedade ?

O vosso contributo como indivíduos só será possível se a vossa conduta for norteada por princípios e valores dentre os quais destaco três: 32

 A INTEGRIDADE,  A ÉTICA,  O PROFISSIONALISMO

Cada um destes valores vale por si ou interagindo com os outros. Estes valores não se compram e não se adquirem em nenhum estabelecimento, eles cultivam-se no quotidiano pela nossa conduta moral e social e fazem com que toda a sociedade olhe para cada um de vocês como uma referência de com quem trabalhar, com quem fazer parcerias, porque se é íntegro no que se diz e se faz, defendem valores morais éticos e o produto do vosso trabalho é de alta qualidade, como resultado do estudo meticuloso dos assuntos e zelo profissional. É daí que serão procurados por pessoas singulares, empresas, instituições

para

beberem

de

vós

ou

obter

o

vosso

aconselhamento profissional pelo vosso mérito e idoneidade. Os vossos nomes serão bandeira e guião no mercado. Isto pode permitir relançar e ou consolidar as bases para construção em Moçambique de uma sociedade aberta assente nos valores de liberdade, igualdade, justiça e mérito, onde o

33

medo não existe e o respeito pela diferença seja nossa cultura no quotidiano. Vocês estarão, quando saírem da porta da Universidade Politécnica, na posição de um avião a descolar com o trem da frente no ar e sem possibilidade de retorno, com duas opções possíveis:

 A primeira, a de tentar abortar a descolagem com todas as consequências imprevisíveis e que podem ser fatais para o vosso futuro ou alternativamente,  Sair do chão, ganhar altitude e guindar para os céus

por

mérito

próprio,

merecendo

como

resultado o respeito de outros profissionais, instituições e da sociedade.

A todos vós desejo que esta última opção seja a que vai nortear e abraçar-vos

no

futuro,

mas

tudo

exclusivamente de cada um de vós.

34

depende

única

e

À Universidade Politécnica, sua Reitoria e Corpo Docente continuem a honrar Moçambique e sintam-se honrados por estarem nesta difícil e nobre missão de investir na maior riqueza e recurso que Moçambique tem, os seus filhos. Uma vez mais humildemente agradeço o convite que me foi formulado, e pela atenção que me dispensaram o meu MUITO OBRIGADO !

35

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.