Primeiros Passos para Campanhas Políticas em Mídias Sociais

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Descrição do Produto

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Ferramentas e cases para fazer

CAMPANHAS POLÍTICAS EM redes SOCIAIS

Ebook escrito por RICARDO AZARITE

Sobre o autor Jornalista formado na ECA-USP, é especialista em mídias sociais, sua área de atuação desde 2009. Atualmente trabalha no Kekanto, rede social onde os usuários compartilham opiniões e recomendações de estabelecimentos comerciais. É co-autor do livro “Monitoramento e Métricas de Mídias Sociais: do estagiário ao CEO”, escrito com Diego Monteiro, sócio do Scup. Ricardo também é autor de “Gamification: como gerar engajamento com jogos nas redes sociais“, ebook lançado pelo Scup Ideas. Faz MBA em Marketing Político na ECA-USP. *Os dados contidos nesse ebook são de responsabilidade do autor

Índice

Introdução................................................................................ 4 O dia a dia da campanha...................................................... 6 O case americano: Barack Obama em 2008................. 27 O case brasileiro: Marina Silva em 2010...................... 37 Edição de texto: Claudia Gasparini | Edição de Arte: Lucas Moschione | Supervisão: Eliseu Barreira Junior Imagens deste ebook: Shutterstock e Flickr (Creative Commons License)

Ferramentas e cases para fazer campanhas políticas em mídias sociais

Introdução O trabalho de marketing político lida com um produto extremamente volátil: o candidato, passional, emotivo, imperfeito - um ser humano. Essa característica única, adicionada à quantidade de poder e interesses envolvidos é o que o diferenciam do marketing de produto. Se um trabalho do planner de marketing tradicional tem uma premissa exata, previsível e conhecida (seu produto), quem trabalha com política está num ambiente mais obscuro. Este e-book pretende servir como lanterna e iluminar o caminho de todos os profissionais de marketing político em mídias sociais, dando continuidade àquele lançado anteriormente pelo Scup Ideas, no qual foram abordadas questões que devem ser consideradas antes mesmo de qualquer planejamento, tais como: qual é o contexto da internet e mídias sociais no país? Quem é, sociologicamente falando, ideas.scup.com . @scup . facebook.com/scupbrasil facebook/scupbrasil

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o brasileiro? Como está a distribuição do eleitorado? Quais são as limitações – e permissões – que a Legislação Eleitoral delineia? Como se organizam os personagens envolvidos na campanha? E como isso impacta na rotina de trabalho? Se esses dados devem ser anteriores ao planejamento e à execução, é a partir deles que serão definidas as regras do jogo. E é nisso que este e-book irá se debruçar: como planejar minha campanha? Como relacionar o trabalho de mídias sociais com as demais áreas do marketing? Quem deve fazer parte do meu time? Como medir sucesso? Como minha equipe deverá agir no dia a dia? Em quem devo me espelhar? Quais são meus benchmarks? A obra completa, portanto, tem como objetivo servir de ponto de partida para os aventureiros que seguirão no caminho da política – em específico para aqueles que trabalharão com mídias sociais, área que já galgou seu espaço de importância em toda e qualquer estratégia de marketing.

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O dia a dia da campanha Antes de dar a largada O ambiente de mídias sociais é pluridirecional, caótico, desordenado, incontrolável. Nele, todos os receptores e interlocutores podem ser emissores. É a tal “comunicação 2.0”, não é? Por serem tão complexas, mídias sociais podem ser avaliadas sob diversas óticas quando são trabalhadas sob o guarda-chuva do marketing. Vou, antes de prosseguir aqui, falar de uma teoria filosófica interessante, criada pelo libanês Nassim Nicholas Taleb: anti-frágil. ideas.scup.com . @scup . facebook.com/scupbrasil facebook/scupbrasil

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Taleb vê que, no mundo, as coisas podem ser frágeis, robustas ou anti-frágeis. A primeira é aquilo que, dentro de um ambiente caótico, piora de qualidade, quebra, assim como é um cálice de cristal. A segunda, apesar de ser comumente tratada como antônimo natural da primeira, trata daquilo que permanece idêntico antes e depois de momentos de caos – é como se fosse uma pedra de diamante. A terceira expressão, então, serve como antônimo diametralmente oposto ao primeiro: é aquilo que, quando em um ambiente caótico, melhora, ganha novos atributos, fica mais preparado – como é um conceito bastante abstrato, vamos retomar à Mitologia Grega para ilustrar: a Hidra de Lerna1 é anti-frágil. Pois bem, feita essa conceituação, vamos trazer sua campanha eleitoral em mídias sociais para uma definição: como o time do seu candidato se vê em um ambiente 2.0? Se ele não gosta de expor seu nome e sofrer críticas, certamente é frágil. Se se expõe e sabe rebater bem a críticas e crises, já demonstra ser robusto. Se usa esses espaços para evoluir sua própria candidatura, alterando os rumos da campanha e de seu projeto de governo, certamente é anti-frágil nas mídias sociais.

Tabela 12

Frágil

Robusto

Anti-frágil

O ambiente de mídias sociais é...

Mais uma mídia para divulgação do candidato

Um local de diálogo e conversação

Um ambiente que ensinará ao candidato aquilo que o eleitor quer

Propósito

Tenho mídias sociais porque o Obama fez em 2008

Trabalho com mídias sociais porque meu concorrente tem

Trabalho com mídias sociais porque minha campanha pode ficar melhor

Envolvimento

Restrito à equipe de mídias socias

Restrito à área de marketing

Mídias sociais impactam outras áreas da campanha

Impacto

Relatórios e mensurações

Relacionamento com o eleitor

Mudança nos rumos da campanha

Indicadores

Indicadores de mídia (reach, PV, RTs, etc.)

Interações com o eleitor

Total de evangelizadores do candidato

1 Para refrescar a memória: a Hidra de Lerna é aquele monstro que Hércules teve que matar em seu segundo trabalho. A principal característica da Hidra era que, sempre que se cortasse uma de suas cabeças, outras duas nasciam no lugar. 2 Inspirado na tabela SMC Reference Number 6 (2012, p.50)

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É evidente que uma postura do candidato quanto a mídias sociais impacta todos os processos da campanha. Uma postura anti-frágil exige abertura das demais áreas, sinergia entre os líderes, um esforço muito grande por parte de todos os envolvidos e uma maturidade maior para análise de resultados. Já uma postura frágil é mais facilmente criada quando há uma área de mídias sociais separada das demais, com autonomia e independência que desburocratizam ao mesmo tempo em que impossibilitam um impacto maior na campanha. Retomemos os conceitos do outro ebook que lançamos sobre política, em que descrevíamos uma estrutura de organização entre os fornecedores da campanha que fosse ora suficiente, ora otimizada e ora engajada. Apesar de parecer que suficiente gera uma campanha frágil, uma estrutura otimizada tem um olhar robusto e a engajada leva a uma campanha anti-frágil, não é tão preciso esse paralelismo. É evidente que uma estrutura engajada facilita uma maturidade de atuação do tipo anti-frágil. No entanto, não é apenas porque as áreas estão mais integradas que há, necessariamente, uma perspectiva madura com mídias sociais. Ainda há um preconceito muito grande com mídias on-line – ainda mais porque ainda há relativa baixa penetração da internet no Brasil, se comparada à da televisão e demais meios de divulgação (como cavaletes e materiais impressos distribuídos pela cidade). O curto tempo de duração da campanha e a vaidade do candidato costumam ditar as estratégias eleitorais, o que diferencia o trabalho de uma estratégia de marketing digital para uma empresa de bens de consumo, por exemplo. Para que se tenha a maturidade de atuar de modo anti-frágil com mídias sociais, ou o candidato já vem com essa crença ou cria-se um vínculo muito forte entre o líder de marketing digital e o partido – como acontece com Marina Silva e a MVL Comunicações, empresa que realizou a campanha em 2010 e que vem, desde então, cuidando de sua saúde on-line.

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Tabela 23

Frágil

Robusto

Anti-frágil

Conteúdo

Atendem a objetivos pontuais e são geralmente desconexos

Pretendem gerar uma conversação com o eleitor

O foco é no médio prazo e exige participação de todos os núcleos

Interação

“Faço porque preciso”

Há relacionamento e realmente se importam com o eleitor

A interação altera substancialmente o coração da campanha

Tomada de decisão

Quando mídias sociais servem para isso, calibra estratégia de marketing

Recorrentemente mídias sociais são base para mudar estratégia de campanha

Mídias sociais alteram a maneira como as áreas se relacionam

Estratégia de campanha

Alimenta a estratégia de marketing digital

Alimenta a estratégia de marketing geral

Alimenta a estratégia de campanha total

É mais fácil perceber qual é a maturidade da campanha no durante, enquanto as ações são feitas. Basta confrontar o que é feito com a tabela 2, para vermos qual é a postura da campanha com mídias sociais. Vê-se que, em campanhas com maturidade para ver mídias sociais como um ambiente anti-frágil, precisa-se de uma integração entre todas as áreas envolvidas em detrimento do que for encontrado. É expresso que, durante a campanha, pode-se ser robusto com o que diz respeito à interação, mas ser frágil no tocante à estratégia da campanha . Ora, é muito mais fácil gerar relacionamento na fanpage do candidato do que usar insights gerados daí para alterar a maneira como aborda temas polêmicos e de interesse de seu eleitor, por exemplo. A campanha não precisa ser sempre madura em termos de anti-fragilidade – isso exige muitos insumos; esforços de tempo, de dinheiro, de pessoas e de processos. É preciso ter consciência da necessidade do seu candidato, dos objetivos (que costumam vir do partido), do orçamento e de quais fornecedores farão parte da equipe – não se cria sinergia entre as áreas sem antes haver proximidade e compartilhamento de valores entre os líderes. Você, como coordenador da campanha de mídias sociais, deve estar ciente dessas opções e apresentá-las aos demais líderes, para que sejam pensadas em maneiras de melhor adaptar as estratégias como um todo. 3 Inspirada na tabela SMC Reference Number 7 (2012, p.51)

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Dando os primeiros passos no planejamento Uma vez sabido o nível de maturidade que sua campanha terá, passa-se para o momento de planejamento – que você, profissional de mídias sociais, já conhece tão bem. A lógica é a mesma: (1) análise de ambiente, (2) definição de objetivos e métricas, (3) planejamento estratégico, (4) planejamento tático, definição de planos e cronograma. Este e-book não buscará criar um modelo para cada uma das etapas do planejamento, mas pretende descrever o que deve estar na cabeça do planner durante cada etapa. A primeira delas é a análise de ambiente, momento de conhecimento do que pode ser feito e de quais são os riscos e oportunidades pelos quais seu candidato pode passar. Alguns dados que devem ser obtidos pelo planner durante essa etapa não dependerão apenas de seus próprios esforços e deverão ser conseguidos com outros fornecedores, como equipe jurídica, política e outros. A seguir estão os verticais de análise que a equipe de marketing político alcança sem terceiros: • Legal/Jurídica: Quais são as restrições legais? Como devo agir para estar dentro da lei? • Internet: Quantos usuários de internet há no Brasil? E no meu curral eleitoral? E por rede social? Como o usuário de internet no Brasil costuma usá-la? Quais são as principais atividades? O brasileiro está acostumado a fazer transações comerciais pela internet? Qual é o tipo de uso em cada rede social? • Histórico: Quais foram os casos de sucesso de campanhas em mídias sociais? E os grandes fracassos? O que posso aprender com eles? Quais são as minhas críticas às campanhas bem-sucedidas? E os elogios às malsucedidas? Como as campanhas anteriores podem me ajudar na campanha deste ano? • Concorrentes: Quais são meus concorrentes? Quais são seus eleitores? A quem ele se dirige? Como ele se dirige a eles? Quais são os pontos fracos e fortes deles? Qual é o histórico dele na internet? E quais eram suas estratégias de marketing off-line? Quanto investem em mídias sociais? Qual é o processo que eles têm? A seguir, estão as informações que dependem de terceiros . Não quer dizer que o planner não consiga encontrá-las por conta própria, mas, por serem dados de um assunto muito específico, com análises complexas, é ideal que um fornecedor especializado nessas verticais esmiúce-as, evitando conclusões baseadas em

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premissas equivocadas 4. Os verticais são os seguintes: • Partidária: qual é o partido? Qual seu histórico eleitoral? Quais são seus valores e posicionamentos? Quais são seus públicos eleitorais? Quais são as figuras de maior representatividade? Onde ele é mais forte? • Política e Eleitoral: como está o eleitor brasileiro? Como ele vota? Qual é a dinâmica eleitoral costumeira historicamente? Como é a dinâmica eleitoral no seu curral eleitoral? Como se organizam as coligações? A quem você está coligado? Como o eleitorado vê sua coligação? E seu partido? Como seu curral eleitoral vê sua coligação? E seu partido? Como seu eleitorado se relaciona com política? É participativa? Qual é o estrato eleitoral que costuma votar em seu partido? E nos partidos de sua coligação? • Processual: Como está organizada a estrutura e o modo de trabalho da campanha? Quem está próximo ao núcleo de mídias sociais? Quem precisa saber dos resultados? Quem se interessa pelo assunto? Qual é a maturidade para mídias sociais dos profissionais envolvidos na campanha? Quais serão as restrições/ riscos desse processo para o trabalho de marketing digital? E os benefícios/ oportunidades? Como a coligação do meu partido pode ser útil para meu processo? Quais são as ferramentas e informações compartilháveis entre partido e coligação? Qual será o budget destinado para mídias sociais? Quais ferramentas usaremos? Como elas podem ser úteis e como podem atrapalhar a operação? Uma análise de ambiente bem feita deverá responder a praticamente todas as perguntas do planner da campanha. Acima estão listadas algumas – provavelmente as mais cruciais –, mas certamente você encontrará outros questionamentos mais pertinentes para seu candidato durante seu planejamento. Nesse momento, não se planeja nada, não se define o que é bom ou o que é ruim, o que precisa ser feito ou que se deve deixar de lado no planejamento; essa etapa deve ser isenta de vieses. Evite, inclusive, correlacionar seus objetivos ou interesses eleitorais de seu candidato aqui, pois isso pode tornar sua análise mais tendenciosa para uma ou outra tomada de decisão durante o planejamento.

Objetivos estratégicos Após a realização desse diagnóstico de contexto, parte-se para uma etapa mais high-level: delineação de objetivos estratégicos e principais métricas – quando falamos de “métricas”, aqui, não são aquelas referentes ao trabalho e operação em 4 Por esse motivo, é essencial que a equipe de marketing em mídias sociais tenha proximidade com, pelo menos, os responsáveis pela campanha (seja alguém do partido, da assessoria política, da assessoria jurídica ou da equipe de pesquisa de mercado, que são pilares que sustentam as estratégias de marketing político).

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mídias sociais, mas sim aqueles diretamente relacionados ao objetivo do candidato, são os chamados KPIs (Key Performance Indicators). É claro que o objetivo de todo candidato é se eleger, mas isso não é objetivo – é consequência de algo maior. A campanha publicitária de Lula, em 2002, tinha como objetivo criar a imagem do “Lulinha Paz e Amor”, em contraposição àquele sindicalista “raivoso” que se viu nas candidaturas anteriores. A campanha publicitária de Marina Silva em 2010 – e a subsequente estratégia de criação de seu partido, o Rede – é mostrar ao eleitorado brasileiro que ela está interessada em fazer um novo tipo de política. A campanha publicitária de Tiririca, em 2010, pretendia atingir os descrentes de todos os políticos existentes. A campanha de Dilma Rousseff quis aliar sua candidatura ao sucesso do governo Lula e ao poder das mulheres. Esse talvez seja o trabalho mais complexo de se fazer: se é comum no mercado corporativo que as empresas cheguem às agências sem saber qual é seu objetivo, será tampouco provável que o candidato o saiba. As análises de ambiente – tanto durante sua confecção quanto após sua apresentação ao candidato – serão bastante úteis para gerar inputs ao planner quanto ao objetivo de seu cliente. Naturalmente, se o objetivo for “ter uma fanpage com mais likes que a do meu principal concorrente”, sua estratégia será bem diferente se o objetivo for “criar uma rede de mobilização em torno de princípios compartilhados”. As métricas – ou KPIs – não serão necessariamente referentes a mídias sociais. É mais provável que sejam um mix de diversas métricas menores e que envolvam, entre elas, resultados de pesquisas de intenção de voto e de reprovação/aprovação do candidato. É impossível prever como seus KPI devem ser montados. Mas, para descobrir se são bons o suficiente, simule resultados com seu candidato e veja se ambos concordam que eles respondem satisfatoriamente à sua necessidade e ao objetivo desenhado. Após esse momento, dá-se início ao planejamento, que é dividido em quatro etapas: (a) estratégico, (b) tático e definição de planos, (c) operacional e (d) cronograma, de modo que o (a) é mais amplo e superficial/genérico e o (d) é extremamente descritivo e detalhado. No dia a dia das agências, é comum que se entregue tudo isso em, no máximo, dois documentos – quando há necessidade, há anexos mais detalhados de pontos de interesse do cliente. O mesmo acontece no marketing político.

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O planejamento estratégico (a) descreve, em um grau mais superficial, como a campanha atuará. Se o objetivo é “criar uma rede de mobilização”, a conclusão do planejamento estratégico poderá ser “criar um candidato próximo, humano e paternalista”. Se o objetivo é “ter mais likes que meu concorrente”, a conclusão poderá ser “criar conteúdo compartilhável e de grande identificação com meu eleitor”. Evidentemente que a conclusão não surge sem antes haver uma retomada daquilo que foi descoberto na análise de ambiente confrontado com aquilo que foi estabelecido como objetivo e KPI. O documento do planejamento estratégico deve seguir uma linha de raciocínio próxima a essa: nosso objetivo é X, nosso ambiente tem as características Y e Z, sendo que A e B são oportunidades de grande relevância, C e D são riscos de média relevância e E é um risco de grande relevância, por isso, acreditamos que o candidato deva seguir a estratégia A ou B, tendo A uma vantagem J e B uma vantagem H. O planejamento estratégico ditará o restante do trabalho do planner, por isso, vale validá-lo antes de dar continuidade. Posteriormente à validação, segue-se para o planejamento tático e à criação de planos. Nesse momento, começa-se a descrever a operação de modo mais claro – quais serão as mídias sociais usadas? Quantas pessoas serão utilizadas para cada uma das equipes? Quais serão os processos genericamente? Como será nosso tom de voz em cada mídia social? Como será o relacionamento da equipe de mídias sociais com as equipes de marketing digital? E de marketing off-line? Teremos um monitoramento? E faremos relacionamento? O planejamento tático descreve os “o quês” e “comos” de cada trabalho. Pense sempre nesses três verticais e tenha como parâmetro os objetivos estratégicos, os KPIs e seu orçamento. Os planos táticos são documentos que alinham as principais diretrizes da operação. Hipoteticamente, meu candidato fará relacionamento no Facebook e no Twitter e terá um monitoramento de concorrência e um de marca. Um plano tático descreveria como seria feito esse relacionamento (qual é o tom de voz, qual é o SLA, quais são as métricas etc) e outro plano tático serviria como diretriz para o monitoramento (quais seriam as buscas setadas na ferramenta, quais seriam as definições para classificação de sentimento, quais seriam as tags e como fazer o tagueamento). Perceba que, cada vez mais, seu analista saberá como será seu trabalho. Por fim, o planejamento operacional deverá descrever o dia a dia de sua equipe – quantas vezes serão feitas tais atividades, quantas vezes serão enviados relatórios

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para o cliente, qual é o tempo dedicado a cada tarefa, etc. É nesse momento do planejamento que se sugere um cronograma, com as datas – pelo menos em overview – de cada uma das fases de trabalho. Todos os planejamentos expostos até aqui não são cravados em pedra – pelo contrário, são atualizáveis durante o trabalho e devem ser evoluídos conforme se encontram melhorias e evoluções. Para mais informações sobre isso, veja um aprofundamento nesse capítulo ainda, algumas páginas à frente.

Medindo os resultados Como foi falado no tópico anterior, o planejamento tático deve prever quais serão as métricas aferidas para cada uma das tarefas da equipe de mídias sociais. Bem, também vimos que numa etapa anterior ao planejamento, definem-se objetivos e KPIs (as métricas que mais nos aproximam da análise real de resultados). Claramente, as métricas estabelecidas antes do planejamento não são as mesmas daquelas definidas posteriormente. Enquanto a primeira atende ao candidato e à sua perspectiva geral da campanha, a segunda serve como descritivo – ou “justificativa” – do resultado obtido como KPI. Vamos pensar em uma lógica de funil (Imagem 1): quanto mais próximo à ponta direita, mais referente ao “negócio” e à candidatura; quanto mais próximo à ponta esquerda, mais próximo à operação do trabalho em mídias sociais. O que está em roxo é o que pode justificar o resultado obtido em verde.

Imagem 1

Métricas de Tendência (Táticas)

Métrica de Negócio (KPI)

Sub-submétrica 1 Sub-métrica 1

Métrica 1

Sub-submétrica 2

KPI Sub-métrica 2

Métrica 2

Sub-submétrica 3

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As métricas de tendência são intimamente ligadas à operação de mídias sociais e não é possível prevê-las e defini-las antes de desenvolver um planejamento tático. Ainda assim, existem algumas métricas genéricas que servem de ponto de partida para você. Separando por função de mídias sociais, temos o seguinte:

Monitoramento

• Volume de menções por sentimento: avalia-se quantitativamente o total de menções que foram feitas sobre o candidato de modo a classificá-las de acordo com o sentimento (positivo, negativo, neutro, misto, etc.). Com essa análise, descobre-se a saúde da marca do candidato; • Volume de menções por categoria: aqui se avalia quantitativamente o total de menções que foram feitas sobre o candidato de modo a classificá-las de acordo com tags definidas (tipo de interlocutor, tipo de mídia utilizada, momento de comunicação, etc.). A partir desse resultado, pode-se descobrir qual assunto ou interlocutor gera mais menções positivas, negativas, neutras, etc.; • Volume de menções por horário: com essa análise, coloca-se num gráfico o total de menções por período de tempo (preferencialmente com alto grau de detalhes, como hora e dia da semana). Assim, é possível descobrir quando os principais ativadores/detratores do candidato estão on-line; • Volume de menções por região: essa métrica é importante para a política, principalmente para cargos proporcionais, quando o candidato costuma ter um curral eleitoral específico; • BI: o buzz inteligence é a leitura dos resultados quantitativos vistos sob uma ótica de análise de causalidade. Busca-se explicar o que causou os resultados obtidos; • Comparativo com outros candidatos: de amplo viés, pode-se comparar quaisquer métricas acima mencionadas com os resultados obtidos pela concorrência; • Share of voice: do total de menções obtidas referente às campanhas publicitárias dos candidatos, quanto foi falado sobre seu cliente. É interessante usar essa perspectiva para comparar sentimento e categorias; • Relevância de interlocutores: tem como premissa a relevância de cada interlocutor que citou seu candidato. Também é interessante cruzar esses resultados com sentimento e categorias.

Relacionamento

• Total de ativadores: Daqueles que se relacionaram com seu candidato, quantos viraram evangelizadores e passaram a “fazer campanha por você”. A definição de ativadores não é precisa e variará de acordo com o objetivo de seu candidato; • Total de recomendações: quantos usuários de internet mencionaram seu candidato o recomendam ou recomendam algum conteúdo postado;

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• Grau de satisfação do interlocutor: Após alguma interação com o candidato (seja receptiva ou proativa), qual é o grau de satisfação.

Conteúdo/Ativação

• Alcance das postagens: é o tal do “reach”, isto é, quantas pessoas foram impactadas pelo meu conteúdo. Pode-se fazer uma análise dupla disso com o total de menções positivas ou negativas • Engajamento: esse talvez seja o termo mais vago e utilizado em mídias sociais, não há até hoje uma definição totalmente aceita para “engajamento”, mas quero utilizar, aqui, como sendo a reincidência de interação espontânea do meu interlocutor com meu conteúdo. É possível criar “níveis de engajamento”; • Total de recomendações: similar à métrica de recomendação obtida no relacionamento; • Leads: daqueles que viram suas postagens, quantos realizaram alguma atividade de interesse no meu site (cadastro de e-mail, doação, aceitação de voluntariar-se, etc.).

Formando seu dream team Antes de selecionar quem fará parte da sua equipe, é preciso retomar como está definido o modelo de trabalho (falamos disso no capítulo anterior). A equipe de mídias sociais está integrada à comunicação geral ou é uma equipe à parte? Mídias sociais têm o devido interesse estratégico ou são algo secundário? Os objetivos são pontuais ou são em longo prazo? O orçamento dedicado à área de mídias sociais é grande? Uma vez que se mapeia qual é a estrutura montada, sabe-se com maior precisão se os profissionais serão dedicados, qual é o formato de trabalho que será usado, etc. Pois bem, para simplificar a avaliação desse cenário, vamos usar duas variáveis: orçamento/interesse estratégico e trabalho em mídias sociais.

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Gráfico 16 Trabalho dedicado

Generalistas Focados

Especialistas Focados

Generalistas Compartilhados

Especialistas Compartilhados

Profissionais focados em mídias sociais com conhecimento genérico de marketing

Profissionais generalistas que atuam em outras áreas do marketing

Profissionais focados em mídias sociais com excelente conhecimento técnico

Profissionais com excelente conhecimento técnico em mídias sociais que atuam em outras áreas do marketing

Orçamento/Interesse Estratégico

Ora, quanto maior o interesse estratégico ou o orçamento dedicado, maior será a possibilidade de se contratar uma equipe extremamente capacitada e especializada ao trabalho de mídias sociais. Quanto maior for o trabalho que será gasto, por sua vez, maior será a necessidade de uma equipe dedicada a mídias sociais – lembre-se sempre de considerar o modelo em que está organizado o seu trabalho. Uma vez feito esse panorama, partimos à escolha dos profissionais. Esse processo contém muitas dificuldades, já que o perfil exigido para esse trabalho não é facilmente encontrado no mercado. É provável que você, quando disse para seus amigos e colegas que gostaria de trabalhar com marketing político, foi recebido com um surpreendente “Nossa! Você precisa ter coragem pra ir pra essa área, né?”. Você, quando estiver planejando como deve ser a sua equipe, irá buscar – talvez um pouco “no achômetro” – profissionais que tenham interesse na área e que estejam dispostos a trabalhar com marketing de um produto um pouco, por assim dizer, heterodoxo. 6 Gráfico baseado no SMC Reference Number 51 (2012, p. 168)

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Bem, de todo modo, há pelo menos três grandes áreas de interesse que devem ser confrontadas com as competências de seus profissionais: Política7, Marketing e Mídias Sociais. Dentro de cada uma dessas áreas de interesse, avaliaremos apenas 3 competências que são basais para a rotina de um marqueteiro político: Paixão, Técnica e Estratégia. Por “Paixão”, quero dizer a “afinidade” do profissional com o tema; por “Técnica”, definiremos o que diz respeito ao ferramental e às possibilidades da prática; por “Estratégia”, englobaremos tudo no âmbito de análise de contexto, definição de objetivos e conhecimento de mensuração.

Tabela 3

Paixão

Técnica

Estratégia

Operação

Planejamento

Atendimento

Coordenação

Para facilitar a compreensão, ilustramos essa parte com 3 tabelas, uma para cada área (Política, Mídias Sociais e Marketing), cruzando o tipo de trabalho (Operação, Planejamento8 , Atendimento e Coordenação) com a competência referida (Paixão, Técnica e Estratégia). Em cada cruzamento, colocamos pesos, representados por quantidade de bolinhas. Quanto maior for a quantidade de bolinhas em cada 7 É importante ressaltar que “Política”, aqui, não se refere à habilidade de intermediação característica do fazer político, tampouco do que diz respeito à rotina do noticiário político – “Política”, nesse âmbito é (1) dinâmica eleitoreira, incluindo base eleitoral, legislação eleitoral, reconhecimento de representatividade dos partidos, etc. e (2) marketing político propriamente dito, no que diz respeito a histórico, casos de sucesso, etc. 8 Apenas para evitar super-detalhamento, condensamos em Planejamento também os profissionais responsáveis pela realização de análises de resultados (sejam analistas de BI, profissionais de métricas, pesquisas de mercado, etc.). Apesar de não serem, evidentemente, os mesmo profissionais e suas competências distintas, fizemos uma média que representa minimamente todos esses profissionais.

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cruzamento, maior deverá ser a competência mínima – e por competência mínima, consideramos o mínimo para que se tenha sucesso no trabalho de mídias sociais. Pelo que descrevemos na tabela 3, e equipe de Operação e de Atendimento devem ser igualmente apaixonadas pela Política – isso porque são os membros da equipe que mais diretamente estarão ligados ao cliente e à rotina do trabalho. Por sua vez, são igualmente os que menos devem compreender da prática e de análise. Claro que, para a equipe de inteligência (Coordenação e Planejamento), é crucial que sejam conhecidos os meandros do aspecto político. Alguém tão analítico deve ser apaixonado pela Política. Esse amor, contudo, não é imperativo para que se tenha sucesso numa campanha; mais vale um planner que tenha bom olhar analítico politicamente à contratação de um profissional apenas apaixonado. Às equipes de Operação e Atendimento, aliás, cabe muito mais serem apaixonadas por Política do que terem conhecimento técnico ou estratégico em quaisquer das três áreas, enquanto que às equipes de Planejamento e Coordenação, a paixão é desimportante ou coadjuvante em todas elas. No tocante exclusivamente a mídias sociais (tabela 4), toda a equipe deve ter um conhecimento minimamente satisfatório técnico das ferramentas, pois esse é o foco do trabalho; Planejamento e Coordenação, por serem os responsáveis, respectivamente, por planejar e por vender o projeto para um cliente desconhecedor do assunto, não podem ser medianamente conhecedores das práticas. Enquanto isso, a estratégia deve ser centralizada na equipe de Planejamento. É claro que a Coordenação poderá ser tão estratégica quanto a seus planners, contudo isso não é uma necessidade para o sucesso – até mesmo porque, ao vender o serviço a um cliente desconhecedor, é provável que não se aprofunde tanto na estratégia propriamente dita.

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Tabela 4

Paixão

Técnica

Estratégia

Operação

Planejamento

Atendimento

Coordenação

Com exceção da equipe de Operação e ao peso das competências estratégicas para a equipe de Planejamento de Coordenação, as competências gerais de marketing são as mesmas para todas as combinações (tabela 5). Essa área é a que deverá integrar mídias sociais às demais estratégias e ferramentas do marketing – televisivo, impresso, assessoria de imprensa, etc . Dessa maneira, cabe à Coordenação conseguir fazer o elo das estratégias, em parceria à equipe de Planejamento.

Tabela 5

Paixão

Técnica

Estratégia

Operação

Planejamento

Atendimento

Coordenação

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Escolhendo as ferramentas Uma vez feito o planejamento e já sabendo qual será o orçamento da campanha destinado a mídias sociais, consegue-se prever quais serão as necessidades técnicas para a operação. Assim, sabe-se precisar melhor qual tipo de software e ferramentas serão usadas. O planejamento já consegue descrever as métricas e KPIs que deverão ser monitorados e como esses dados serão obtidos, é provável que o planner já consiga listar as ferramentas prováveis a serem contratadas. Ainda assim, a Coordenação deverá avaliar qual ferramenta contratar. Grosso modo, há ferramentas dedicadas exclusivamente para mídias sociais (como o Scup, para monitoramento, e o Facebook Insights, para análise de resultados no Facebook) e outras dedicadas a web analytics (como o Google Analytics, para mensuração de tráfego, e o CrazyEgg, focado em usabilidade do site). Além dessa distinção, há ferramentas chamadas de horizontais - que, dentro de um grande grupo de funcionalidades, se mostram generalistas, sem se especializar em uma tarefa específica . Há também outras chamadas de verticais – que não realizam todas as funções, mas são extremamente eficientes para a realização de um trabalho ou para uma mídia específica (como é o caso do Facebook Insights). Retomando novamente as estruturas de trabalho e organização das equipes de marketing apresentadas no nosso outro ebook sobre política – seja uma agência única para realizar toda a campanha ou várias especializadas em uma parte do marketing – vemos que são diversas áreas que precisam andar em sinergia para o sucesso. Desse modo, além de pensar nas ferramentas focadas em mídias sociais ou web analytics, do tipo vertical ou horizontal, deve-se levar em consideração a capacidade de integração entre os resultados das ferramentas a serem contratadas – nem que seja uma integração a posteriori, em um Excel com as exportações em arquivos “.csv”.

Como criar sinergia com a comunicação off-line Uma campanha política, diferentemente de uma ação publicitária comum de um produto de bem de consumo, trabalha com diversas frentes comunicativas concomitantes – é uma campanha em que se exige uma sinergia comunicativa bastante grande dentro dos players de Marketing. Como mostramos neste capítulo,

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dependendo da importância da candidatura de seu cliente para o partido, da robustez dos esforços de marketing e do tamanho das equipes, é natural que haja mais ou menos frequentes reuniões de alinhamento entre os líderes – sejam esses alinhamentos estratégicos ou pontuais/táticos. Há, porém, equipes que devem estar próximas do começo ao fim, independentemente da proximidade delas com a coordenação da campanha: as de marketing on-line e off-line. Em marketing on-line, podem existir equipes de mídias sociais, SEO, equipe responsável pelo site, e-mail marketing, web analytics, etc. Em marketing off-line, há equipes de TV, rádio, impresso, assessoria de imprensa, pesquisa de mercado, etc. Mídias sociais conseguem atender a objetivos de praticamente todas as áreas da campanha – ora por parte do monitoramento, ora da criação de conteúdo ou de relacionamento. Mídias sociais servem, então, como ferramentas para as demais frentes do marketing – há, ainda, uma retroalimentação entre todas as equipes, de modo que o que se faz em uma peça televisiva impacta na estratégia de mídias sociais e vice-versa. Essa característica é, inclusive, o que torna imperativa a sinergia entre comunicação off-line e on-line – e ela só será completa com processos rotineiros nos quais participem todas as áreas. As equipes de comunicação off-line e on-line estão presentes sempre na briefagem, no momento em que o cliente mostra seus objetivos e estratégias, sendo que vão gradativamente se aproximando nas demais etapas do planejamento, de acordo com o nível de integração das áreas. Bem, evidentemente que cada campanha exigirá e permitira uma aproximação Suficiente, Otimizada e Engajada. Como vemos na Tabela 6, quando a primeira é mais dinâmica e focada no marketing, a Engajada se mostra mais completa e traz multiplicidade de vieses que permitem um processo mais robusto para todas as áreas, como contras, temos, respectivamente, a superficialidade e a falta de integração com áreas core, como pesquisa e o próprio cliente (no caso de uma integração suficiente), e a burocratização e potencial risco de criação de impeditivos criativos para o marketing (para uma integração engajada).

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Tabela 6 Prós

Contras

Suficiente

Otimizada

Engajada

- Mais dinâmico; - Foco no marketing.

- Viés mais abrangente (marketing e pesquisa).

- Multiplicidade de vieses; - Mais integração da equipe.

- Não integra com pesquisa de mercado; - Mais superficial.

- Candidato não acompanha os resultados.

- Processos + lentos; - Maior possibilidade de impeditivos para o marketing.

A área de pesquisa de mercado, apesar não ser considerada pertencente ao marketing propriamente dito, tem uma importância enorme para a prática do marqueteiro: é ela que ditará muito do rumo de posicionamento do candidato diante do eleitorado. O próximo tópico deste capítulo tratará do dia a dia da campanha e como se relacionará a área de mídias sociais com as demais. Se seu processo de integração das áreas optar por apenas uma sinergia pontual com a equipe de pesquisa no momento de compartilhamento e análise de resultados, o modelo apresentado a seguir pode atender a suas necessidades.

A rotina de trabalho O trabalho do marketing político é extremamente similar àquele tradicional ao qual você deve estar acostumado com sua empresa: assim como o diretor da empresa define as metas à gerência de marketing, o gerente passa, ou ao coordenador de mídias sociais ou à agência responsável, a estratégia que deverá ser seguida – é evidente que pode haver algumas alterações no escopo e na estratégia de acordo com o que for conversado com a equipe de operação/planejamento de mídias sociais. Onde pode residir uma distinção entre as práticas corporativas e políticas é a frequência de alinhamento estratégico – ora, dois dias sem uma conversa sobre estratégia para um candidato à Presidência pode significar a perda significativa de votos, enquanto que, para um bem de consumo, a velocidade é outra. Nesse ponto, podemos aprofundar um pouco sobre o que já foi falado anteriormente; de acordo com a importância da campanha para o partido e a complexidade da organização de trabalho, pode-se precisar de alinhamentos estratégicos mais esparsos ou frequentes, aprofundados ou superficiais.

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A campanha da então candidata do PV, Marina Silva, em 2010 foi coordenada pela equipe de Caio Túlio Costa, da MVL Comunicações. Sua campanha foi um marco para o marketing político brasileiro e alcançou um resultado expressivo de quase 20 milhões de eleitores. O total investido e a importância dada pelo PV para Marina Silva foram tão grandes e a equipe estava tão complexamente organizada que eram necessárias reuniões diárias com todos os líderes (de marketing, do partido, das áreas jurídica/legal, de pesquisa de mercado, de comunicação off-line e online, e demais áreas menores) para apresentação dos resultados do dia anterior e tomada das ações do dia corrente. Dessa maneira, além de toda a campanha se alinhar e andar numa mesma direção, a multiplicidade de vieses colaborava com análises mais precisas dos resultados obtidos. Evidentemente que, para a eleição de um candidato de menor expressividade para um cargo de igual coadjuvância, a rotina de trabalho não exigiria tamanha preocupação. Pois então para uma campanha importante para o partido – seja ela para cargos majoritários ou proporcionais – é natural que sejam mais frequentes as reuniões de compartilhamento de resultados e de calibração estratégica. Ao mesmo tempo, uma estrutura mais complexa exige que esse compartilhamento seja mais completo e aprofundado.

Gráfico 2 Tamanho da equipe de marketing

Alinhamentos esparsos

Alinhamentos rotineiros

Reuniões pontuais com os líderes de todas as áreas da campanha

Reuniões muito frequentes com os líderes de todas as áreas da campanha

Status esparsos

Status rotineiros

Compartilhamentos pontuais de relatórios de status de todas as áreas da campanha

Compartilhamentos muito frequentes de relatórios de status de todas as áreas da campanha

Importância da campanha para o Partido Vale retomar aqui, também, a estrutura de trabalho dos fornecedores e das agências. Se uma única agência de marketing coordenar todos os esforços de comunicação (tanto de mídias sociais quanto as demais áreas), é bem provável que tal alinhamento estratégico será feito em um duplo-momento (ora internamente à

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agência, ora externo, com a equipe política do candidato e das demais áreas). Independentemente da estrutura do trabalho e do modelo que será usado para essas reuniões de calibração estratégica, vale a pena pensar um pouco mais detalhadamente sobre como deverão ser feitos os relatórios – sejam eles para os coordenadores do partido, para o próprio candidato, para os líderes de outras áreas do marketing, para outras áreas paralelas ao marketing, etc. Há três pilares que deverão ser usados como guias para você: (1) Qual é a autoridade do autor do relatório? É o coordenador de mídias sociais? É o coordenador de marketing digital? É o planner? É um analista? Quanto maior for o autor na hierarquia processual, mais estratégico deve ser o olhar, (2) O que esperam os (quais são os interesses dos) consumidores do relatório? O candidato provavelmente quer saber dos resultados vistos de acordo com os KPIs definidos; a equipe de assessoria de imprensa gostará de saber sobre a repercussão de seus releases e esforços; a equipe jurídica provavelmente buscará possíveis riscos ou oportunidades de ataque, etc. e (3) Qual é o conhecimento técnico dos consumidores do relatório? Eles conseguiriam compreender que o menor bounce rate e o maior tempo de visita por unique pageview é aquele cujo source é de referal de mídias sociais? Ou é melhor falar que o público que vem do Facebook é mais engajado do que os demais? Tendo avaliado os três pilares colocados acima, seu relatório terá forma e conteúdo escolhidos para seu consumidor. Seguem algumas boas práticas para que seus relatórios – tanto internos quanto para a coordenação da campanha – sejam precisos: • So What: para cada bloco de conteúdo, faça um resumo (um sumário executivo) com o mais importante de cada seção; • Exemplos e gráficos: ao ilustrar os resultados com gráficos, tabelas e exemplos, a compreensão fica mais fluida; • Didática: nem superestime, nem subestime – conheça bem o consumidor do relatório e mostre para ele aquilo que está a seu alcance de compreensão; • Foque nos votos: mostre sempre como o que você está descrevendo se relaciona com a campanha e no sucesso nas urnas. Não fique preso às métricas de mídias sociais, mostre KPIs. Esse alinhamento talvez seja a etapa mais importante do processo da campanha – é ela que será capaz de pulverizar os resultados obtidos de todas as áreas com as demais, e isso inclui, obviamente, os resultados de mídias sociais. A essa etapa, podemos dar o nome de aculturamento.

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Uma vez feitos os alinhamentos estratégicos com as lideranças da campanha, é responsabilidade do líder de mídias sociais se voltar à operação de quem bota a mão na massa com as conclusões feitas no momento de compartilhamento de resultados. As equipes de atendimento e de coordenação, portanto, servem como geradores de inputs criativos para que a equipe de planejamento reavalie e evolua seu plano. O processo do Marketing trabalha com três tipos de puts – o input (aquilo que serve de matéria prima, como insights criativos), o throughput (referente aos processos e mensurações) e o output (o produto de marketing, de fato). Não é, portanto, só de inputs que o Planejamento da campanha irá se alimentar – durante o processo criativo e após a divulgação das peças, geram-se novos insights e/ou problemas a serem resolvidos. Dessa forma, então, além de um realinhamento estratégico vindo de modo externo ao processo de mídias sociais, a própria equipe gera novas possibilidades ao Planejamento. Cabe ao planner, então, compilar esses novos inputs e evoluir o plano – seja alterando processos, métricas, KPIs ou mudando as diretrizes da Operação. Repare que, quando vindos da equipe interna, essas melhorias são mais pontuais e referentes ao dia a dia; quando vindos da equipe de Atendimento e da Coordenação, trata-se de um realinhamento estratégico que impacta mais frontalmente o todo da campanha.

Imagem 2

Interno

Externo

Operação

Atendimento e coordenação

Otimizações pontuais, melhoria de processos e calibração fina

Otimizações estratégicas, sinergia com outras áreas

Planner

Validar

Evoluir

Rever métricas e processos

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Obama e “a campanha do futuro” Negro, filho de muçulmano, com sobrenome Hussein e... presidente dos EUA. São muitas características contrassensuais para um presidente de um país com eleitorado tão conservador. Mérito de uma coordenação de campanha excepcional, que alcançou a marca de ícone aos marqueteiros políticos de plantão. Já é senso comum dizer que Obama, em 2008, conseguiu deslocar a lógica de campanha eleitoral para o mundo on-line – uma tarefa que era, até então, majoritariamente off-line. Joe Crump, um dos estrategistas e vice-presidente da Razorfish, agência contratada para a campanha de Obama, diz que o então candidato contava com características

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que o afastavam do eleitorado “padrão” dos EUA – homens e mulheres de meiaidade, filhos do “welfare state”. Ora, de acordo com o estrategista, a campanha só seria bem-sucedida se tivesse uma base eleitoral alternativa; especificamente os jovens da Geração Y e as minorias da população. A necessidade dessa guinada se estendeu até os slogans do candidato (“Change we can believe in” e “Yes, we can”). A visão de Crump não era à toa – uma pesquisa da NBC News mostra que o eleitor de Obama foi majoritariamente jovem e negro, como previsto. Resultados - Eleição 2008 nos Estados Unidos

Total

Todos os eleitores

Eleitores brancos

Obama McCain 53% 46%

Obama McCain 43% 55%

18 a 29 anos

66%

31%

54%

44%

Republicanos Democratas Independentes

15% 95% 66%

84% 4% 27%

11% 92% 62%

88% 7% 32%

Homens Mulheres

62% 69%

34% 29%

52% 56%

45% 42%

Com graduação Sem graduação

65% 66%

32% 31%

55% 50%

42% 48%

Brancos Negros Hispânicos

54% 95% 76%

44% 4% 19%

Mais de 30 anos

50%

48%

41%

57%

Republicanos Democratas Independentes

8% 88% 48%

90% 11% 48%

7% 83% 44%

91% 16% 52%

Homens Mulheres

47% 52%

51% 46%

39% 44%

59% 54%

Com graduação Sem graduação

49% 50%

49% 48%

42% 38%

56% 60%

Brancos Negros Hispânicos

41% 96% 62%

57% 4% 36%

Fonte: pesquisa final realizada pela NBC News.

Bem, a pirâmide etária da sociedade dos EUA não é tão desigual como a de países menos desenvolvidos – ou seja, os jovens, sozinhos, não conseguiriam eleger o candidato democrata. Era necessário usá-los como multiplicadores e replicadores da mensagem pró-Obama. Uma pesquisa feita após os resultados eleitorais expõe que quase 30% de seus jovens eleitores foram voluntários ativos no decorrer da campanha, um total tido como “surpreendente” inclusive pela equipe coordenadora. Crump sugere que esse

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resultado tenha surgido como efeito colateral positivo das estratégias do núcleo que ele chama de “new media”, cujo orçamento não passou de “singelos” US$34mi (cerca de míseros 6% do total investido na campanha). New Media não é um núcleo simples – assim como não é o núcleo de mídia tradicional off-line – e comporta praticamente todas as estratégias digitais, desde o site até mídias sociais, passando pelas demais ferramentas, como apps, mídia paga e estratégias de SEO. Crump ressalta quais são os sete pontos que julga serem essenciais para o sucesso de uma estratégia de marketing político on-line:

A - Time de especialistas

“Trabalhar com internet é fácil! Até meu sobrinho faz sites”: quem trabalha com internet e mídias sociais já deve ter ouvido/lido isso algumas vezes. Estratégias on-line não podem mais ser tidas como parte coadjuvante e devem ser tão profissionalizadas quanto qualquer outro núcleo da comunicação. Crump destaca que, em 2008, Obama contava com um time de estrelas de 20 diretores experts em internet – destaque para Eric Schmidt, CEO do Google e Chris Hughes, um dos fundadores do Facebook.

B - Seja encontrável

Quando se pensa em estratégias para alcançar seu público em mídia tradicional, basta buscar aquele veículo que fala diretamente com seu nicho. Na internet, isso é mais complexo – precisa-se pensar em SEO, em seeding de conteúdo, em backlinks, em publicidade paga (permitida nos EUA), etc. O objetivo para Crump e sua equipe era estar presente onde quer que seu público estivesse – é interessante ressaltar que Obama estava presente, inclusive, em jogos on-line.

C - Seja relevante

Não basta ser encontrado. De que adianta um potencial eleitor ter contato com o candidato e este não encontrar relevância ou interesse no que Obama diz? Pouco ou nada. Crump define que “relevância” é falar o que e como seu interlocutor quer ouvir. Não à toa, Obama tinha perfil em 30 comunidades virtuais distintas – ora falava com negros, ora com hispânicos, ora com membros da Igreja, ora com homossexuais, etc. O trabalho de segmentação é extenuante, mas é na cauda longa que se fará a diferença na contagem dos votos.

D - Estimule engajamento

O sucesso da campanha de Obama se deve, e muito, ao interesse de seus eleitores em colaborar com o candidato naquilo que fosse necessário – ora, um político que

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fala a minha língua e trata dos assuntos em que tenho interesse (retomando o item C) deve ser o melhor de todos, evidentemente. O hub midiático e comunicativo da campanha de Obama era o site MyBarackObama.com (apelidado carinhosamente de MyBO.com), onde havia ferramentas e possibilidades de contribuição do eleitorado – conquiste-o e ele usará as ferramentas que você dará a ele a seu favor.

E - Fortaleça os fãs

A comunicação de Obama era segmentada por público específicos, como já comentei. Havia, contudo, “macro-grupos” (peers, na palavra de Crump) que estavam acima de todos os segmentos. Em cada um desses peers, os dirigentes da campanha encontravam as lideranças que mais se destacavam e que mais estavam próximos da “ideologia Obama” e destinavam a eles tarefas de replicarem a mensagem dele. A estratégia é “espelhar” o candidato em lideranças locais desses “grupos de interesse” similares. Dessa forma, aproximava-se o político ao eleitor, dando mais credibilidade e confiança aos indecisos. Concomitantemente, o líder local ganhava destaque e importância. Essa estratégia também foi levada ao MyBO.com, como uma estratégia de gamification simples: hierarquizavam-se os eleitores mais ativos nas ferramentas do site, criando uma espécie de “liderança paralela” àquela off-line, descrita acima.

F - Privilegie os fiéis

Ok, há um incentivo social para que os visitantes do MyBO.com ajudem na campanha, utilizando uma das ferramentas disponíveis. Os estímulos positivos causados pelo rankeamento dos melhores e mais ativos eleitores são bons, mas podem ter efeito curto (talvez sirva para os primeiros dias/semanas de utilização no site). Por esse motivo, Crump e sua equipe passaram a utilizar uma estratégia comum a redes sociais on-line de sucesso, como o Yelp (que surgiu em 2004 e, à época, estava crescendo exponencialmente), que se utilizava de uma separação clara entre os “Yelp Elites” e os usuários comuns – os primeiros tinha acesso a informações de antemão, brindes exclusivos, convites a eventos, etc. Crump, da mesma forma, selecionava os eleitores que mais se dedicavam à campanha e destinava a eles uma atenção especial, como divulgando novidades ou resultados de antemão, um convite para uma reunião, etc. – uma recompensa simples para os dirigentes, mas significativa para quem vê a campanha de fora. Dessa forma, estimulava-se e motivava a continuidade dos voluntários.

G - Seja transparente

O voto é uma doação de confiança e poder do cidadão ao candidato que melhor lhe representar. O mínimo de retribuição que pode ser feita, segundo Crump, é transparência e sinceridade. Isso inclui liberação de planilhas e agendas do candidato.

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As prévias Bem, a estratégia parece atender às expectativas e demandas de um eleitorado cansado da “Doutrina Bush” e do “Clintonismo” democrata, que reinavam na política federal americana, mas antes de poder levá-la a campo, havia um período longo até que tudo se concretizasse. Nos EUA, o processo de prévias dos partidos é considerado essencial para a vitória de qualquer candidato, pois serve como uma “campanha fora de época”10. As prévias do Partido Democrata contavam com três principais polos, sendo que apenas um dele seguia o padrão homem, branco, meia idade, cristão e de família tradicional americana: Joe Biden – curiosamente, o terceiro colocado no final da disputa. Dos outros candidatos, um era negro e a outra, uma mulher. As prévias serviram para que os candidatos entrassem em contato com o eleitorado democrata pela primeira vez. Obama tinha uma estratégia similar à utilizada na campanha real contra o republicano John McCain para as prévias: (1) se aproximar de grupos específicos e falar-lhes de modo personalizado – o primeiro grupo, por exemplo, foi composto por estudantes universitários que se mostraram favoráveis à eleição de Obama logo em 2006, durante o mandato dele como senador – e (2) buscar apoio por meio de voluntários que se sentissem interessados em trabalhar na campanha. Foi no período das prévias que surgiu uma das ferramentas mais poderosas da campanha: no painel do MyBO.com, convidava-se o eleitor a espalhar a mensagem, chamar seus próximos a apoiar Obama. O nome da campanha era Make Five Calls (“Faça cinco ligações”) e a ferramenta on-line permitia que qualquer um ligasse gratuitamente para qualquer número de telefone que quiser. Havia, contudo, uma listagem dos telefones de interesse para Obama. Ora, o resultado já é conhecido de todos: Obama vence as prévias e fortalece seu nome para a candidatura. O primeiro contato dele com os grupos de interesse seguindo a estratégia de modulação de discurso serviu como etapa fundamental para divulgar e embasar os valores que se agregariam à “marca” Obama.

10 Isso não existe no Brasil. O processo de decisão do candidato é restrito ao corpo dirigente do partido e seu anúncio oficial é feito meses antes da eleição. Logo após o anúncio, começam as campanhas. Lembrando que é completamente ilegal qualquer tipo de atividade midiática ou de proselitismo antes da data definida pela Legislação Eleitoral.

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A candidatura Se, num primeiro momento, Crump focou seus esforços em desenhar a marca Obama (em termos comuns a nós, marqueteiros, era o momento de fazer branding), a candidatura não poderia ter outro objetivo que não obter votos, ter a maior fatia nas tabelas de intenção de voto. É importante ressaltar que as estratégias feitas para as prévias continuavam ativas; o que houve foi um incremento nas táticas e uma calibração no foco. O site MyBO.com foi, então, se tornando mais robusto, completo no que diz respeito a ferramentas e simples de usar, que estimulassem o crowdsourcing. Nesse momento, eram dois os axiomas que permeavam a campanha:

Keep it real, keep it local (Mantenha real, mantenha local)

A candidatura tem que ser próxima, deve falar diretamente com todos os envolvidos (eleitores, principalmente). A estratégia de sempre gerar relevância com seu público é, provavelmente, o melhor modo de conseguir deixar tudo local e “de verdade” (que seja humana).

Sense of community (Senso de comunidade)

Quando se diz que a campanha de Obama foi a primeira a usar redes sociais como diferencial, talvez seja esse daqui o principal motivo – e por “rede social”, não me refiro a Twitter, Google+, Facebook ou Instagram; me refiro à criação de um contexto em que diversas pessoas se sintam unidas, próximas, iguais e motivadas por um mesmo objetivo. A partir do momento que MyBO.com cria um ambiente favorável ao compartilhamento de informações, amigável e completo para interessados em colaborar e que facilite a interação e aproximação dos membros com a causa e seus dirigentes, cria-se uma rede social. Vamos à descrição das ferramentas que estavam ao alcance do eleitorado de Obama – apesar de serem diversas, seis são aquelas que se destacam:

1 - Seja voluntário

Como dito, a principal estratégia do MyBO.com durante a candidatura, após as prévias, é exatamente o crowdsourcing. O site disponibilizava diversas ferramentas que estimulassem e facilitassem o trabalho do eleitor. O principal objetivo da equipe de Crump era incentivar seus aliados a divulgar Obama para todos os seus próximos – ou seja, integrar o mundo on-line com o off-line. Na seção de

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voluntariado, havia a disponibilização de arquivos para impressão de materiais publicitários, além de cartilhas e dicas para quem se interessasse;

2 - Bater de porta em porta

Especificando ainda mais o trabalho do voluntário, essa ferramenta trazia dicas de como fazer um “marketing de guerrilha caseiro”. Essa estratégia é bastante oportuna para o contexto americano, onde é comum esse tipo de abordagem e não há nenhuma desconfiança. Caio Túlio Costa, coordenador da campanha de Marina Silva em 2010, destaca que isso não chegou a ser testado no Brasil por conhecer a cultura nacional e acreditar que essa não seria uma estratégia eficiente.

3 - Fazer ligações

Essa estratégia era simples e talvez tenha sido a mais eficiente para a campanha. A plataforma do site disponibilizava uma listagem com telefones que pudessem ser de eleitores indecisos, republicanos ou democratas descontentes; a partir dessa listagem, o voluntário poderia usar o próprio sistema de voz do site para ligar gratuitamente para o número e, assim, tentar convencer o interlocutor a votar em Obama. Ora, imaginem o esforço dedicado por quem topas se voluntariar – para chegar a esse ponto, o eleitor deve estar muito engajado com a causa.

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4 - Participação em eventos

Era bastante comum que, em cidades maiores, onde o Partido Democrata Federal vê importância regional, houvesse microrreuniões ou eventos partidários, onde correligionários e eleitores democratas se encontravam para debater as demandas da região, bem como compreender as propostas do candidato Obama. Esses eventos eram recorrentes, frequentes e de diversos tamanhos – desde pequenos encontros até discursos oficiais da agenda do candidato. Marina Silva, em sua campanha de 2010, tinha uma estratégia similar a essa que foi relativamente funcional nos grandes centros urbanos. Em São Paulo, por exemplo, era comum que Ale Yousseff, então dono de uma casa de shows na Rua Augusta e correligionário de Marina, abrisse seu estabelecimento para rodas de discussão ou eventos do PV. Essa é uma maneira simples de aproximar os cidadãos à candidata, dando a impressão de “campanha feita para mim”.

5 - Doação

A campanha de Obama era tão robusta quanto cara. Apesar das diversas empresas apoiadoras do democrata, a liderança da campanha pensou que seria interessante expandir o crowdsourcing que já existia nas demais ferramentas para também o crowdfunding, obtendo doações financeiras de voluntários. O montante total ultrapassa a barreira dos milhões – a campanha de Marina Silva em 2010 contava com uma estratégia similar e obteve resultados bastante inexpressivos se comparados com os de Obama.

6 - Fóruns

Formato mais que conhecido das mídias sociais on-line, os fóruns são ambientes de discussão livre para quem se interessar. No MyBO.com, isso tinha uma dupla função: (1) fazer com que o candidato conhecesse seus eleitores, suas necessidades e seus interesses, bem como (2) criar a sensação de poder e proximidade do eleitor com Obama. Em um desses fóruns, havia um movimento contrário ao posicionamento de Obama quanto ao monitoramento de ligações telefônicas para fins de segurança pública (o FISA), tal grupo de discussão envolvia 23 mil membros que tinham doado um total de US$726mil.

E-mail A campanha de Obama, como vimos, contemplava uma série de ferramentas e opções para os eleitores que estivessem dispostos a participar ativamente da rede social construída ao redor da “marca” do candidato. Além dela havia, ainda, outra

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estratégia on-line que visava engajar os eleitores “sumidos” ou que tivessem sua atividade no site mais restrita ou acanhada: uma régua de relacionamento por e-mail extremamente ousada. Caio Túlio Costa, coordenador da campanha da candidata Marina Silva em 2010, arrisca dizer que é nessa régua de relacionamento que se embasava toda a estratégia de campanha, pois era ali que se dava início à sensação de comunidade e de proximidade com o candidato, que estaria presente nos demais contatos do eleitor com Obama. Rahaf Harfoush, uma das analistas envolvidas na campanha montada por Crump e autora do livro Yes, We Did It!, destaca os 4 benefícios da estratégia por e-mail:

A - Mobilizar

Como maneira de passar a sensação de importância de cada leitor dos e-mails, geralmente era enviado conteúdo relacionado às diretrizes da campanha, assim como estratégias para solucionar possíveis riscos. Stephen Geer, um dos responsáveis pela estratégia de e-mail marketing, diz que essa estratégia dá aos eleitores a sensação de pertencimento do processo como um todo;

B - Mostrar consistência

Ora, não adianta ser um e-mail hoje, outro daqui cinco dias e mais um daqui 10 dias. É importante manter consistência no envio de e-mails, pois assim o eleitor não perde o senso de urgência e o “ritmo” da campanha. Dessa maneira, o leitor dos e-mails continua motivado a participar e acompanhar o que tem sido feito na campanha;

C - Motivar

Imagine receber um e-mail assinado pelo próprio candidato Obama, ou então pela primeira dama Michele Obama. Eram esses os autores da grande maioria dos e-mails que você receberia se estivesse na régua de relacionamento de e-mails do MyBO. com. Havia, ainda, uma série de campanhas feitas exclusivamente para os leitores de e-mails, incentivando-os a participar como voluntário (ou como doador) – uma das campanhas, inclusive, sorteava um encontro com o candidato no dia da eleição;

D - Enviar conteúdo relevante

E-mail marketing é quase sinônimo de spam, certo? Geer queria tirar completamente esse “trauma” do interlocutor. Os e-mails deveriam ser relevantes e não poderiam ser confundidos como conteúdo de comunicação de massa – e mudar o “Hello, [username]” não era suficiente. Informações como horário e

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localização eram levados em conta no momento de personalizar o conteúdo, além disso, havia uma avaliação sobre o tipo de interlocutor – um eleitor que havia doado e havia feito algumas ligações pelo site receberia um e-mail diferente de um eleitor recém-adicionado ao mailing do MyBO.com. Ora, sabe-se que essa estratégia robusta foi a responsável pela vitória de Obama em 2008. Rahaf Harfoush, em seu livro, menciona os seis aprendizados que obteve com sua experiência em 2008, que são: A - Saiba onde está seu eleitor e esteja presente ao seu lado; B - Opte por um discurso personalizado e modular para cada público e cada mídia; C - Muito mais que KPIs relacionados a tamanho de comunidade, dê preferência para o número de eleitores engajados – esses são os que darão a vitória para você; D - O candidato deve saber como agir em cada um dos canais de comunicação que usar; E - Use a rede social que montar a seu favor como um palanque eleitoral; F - Faça bom uso do cross-media (leve seu eleitor do e-mail para a rede social, da rede social para as ruas, do site para o aplicativo mobile, do celular para os eventos, etc).

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Marina “Obama” Silva, o primeiro caso brasileiro Não há um profissional de marketing brasileiro que não admire a campanha de Marina Silva para as eleições presidenciais em 2010. Twitaços rotineiros, participação ativa em todas as redes sociais pertinentes à época e uma saúde de marca exemplar no mundo on-line são apenas algumas das características que marcaram essa campanha e a deram o título de primeiro caso nacional de campanha eleitoral on-line bem feita. Há quem arrisque dizer que foi graças às estratégias on-line que Marina conseguiu os quase 20 milhões de votos – e que levou consequentemente a eleição de 2010 para o segundo turno. Cientistas políticos e sociólogos são mais céticos, mas admitem a capacidade de marketing da equipe de Marina Silva.

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Vejamos o contexto político de 2010: dois mandatos seguidos do petista Lula, com aprovações recordes de 80% dos brasileiros e um momento econômica e socialmente de sucesso e segurança para o povo; isso tornava a eleição de 2010 desfavorável para qualquer candidato que não tivesse a “benção” do ex-presidente Lula. O cientista político André Singer, professor da FFLCH-USP, estudou a movimentação eleitoral das eleições presidenciais das décadas de 1990 (a partir de 1994) e de 2000 (até 2006) e publicou, em novembro de 2009, um artigo intitulado “As Raízes Sociais e Ideológicas do Lulismo”11 no qual previa a dinâmica eleitoral para eleições majoritárias que viriam a partir do segundo governo de Lula.

Gráfico 113 - Pobreza no Brasil 50 40 30 20 10 0 1976 1977 1978 1979 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1992 1993 1995 1996 1997 1998 1999 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

Percentual da população considerada pobre segundo o IPEA

O cientista político da UCLA Perry Anderson diz que Lula foi o mais hábil político de seu tempo12 , por ter criado uma receita de sucesso sustentada por (A) política social voltada para o estamento social de baixo poderio econômico (as chamadas “classes D e E”) e (B) a busca pela contenção inflacionária, conhecido monstro da economia nacional desde sempre. Essa combinação de fatores econômicos ajudou na diminuição percentual da população enquadrada sob o estamento de pobreza – caindo cerca de 10 pontos percentuais durante o mandato de Lula, como aponta a tabela abaixo, obtida no site do IPEA e utilizada por Perry Anderson:

11 Disponível, em PDF, no link http://www.scielo.br/pdf/nec/n85/n85a04.pdf. Para quem se interessar especialmente por política, recomendo a leitura do livro “Os Sentidos do Lulismo”, do mesmo autor, vendido no site da Companhia das Letras, no link. 12 Comentário escrito em seu artigo para a London Review of Books, intitulado “Lula’s Brazil” e disponível no link http://www.lrb.co.uk/v33/n07/perry-anderson/lulas-brazil 13 Gráfico obtido no link http://anticap.files.wordpress.com/2011/04/brazil-poverty.jpg

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A transformação social que Lula obteve com o aquecimento do mercado interno – dando ao povo mais carente economicamente falando mais acesso à renda – teve um impacto robusto nas eleições de 2006. André Singer, em seu artigo mencionado acima, demonstra que o PT em 2006 movimentou, pela primeira vez na história da democracia moderna brasileira, o eleitorado das chamadas classes D e E que eram, até então, eleitores de partidos de direita. Singer aponta isso com base em dados eleitorais das décadas de 1990 e 2000, para não extrapolar o espaço para descrição do ambiente que aguardava Marina Silva, seguem duas tabelas indicativas dessa mudança. A tabela a seguir descreve o eleitorado no segundo turno das eleições de 1989:

Tabela 1 Collor Lula Branco/nulo

Até 2 De 2 a 5 salários mínimos salários mínimos

51% 41% 8%

43% 49% 8%

Até 5 a 10 salários mínimos

Mais de 10 salários mínimos

40% 51% 9%

40% 52% 8%

A próxima, por sua vez, aponta como o eleitor se comportou em 2006, na reeleição de Lula:

Tabela 2 Lula Alckmin Heloísa Helena Cristovam Outros Banco/nulo

Até 2 De 2 a 5 salários mínimos salários mínimos

55% 28% 6% 1% 1% 8%

41% 38% 9% 3% 1% 9%

Até 5 a 10 salários mínimos

Mais de 10 salários mínimos

30% 45% 14% 4% 0,3% 7%

29% 44% 11% 5% 2% 9%

É clara a inversão que houve: se, num primeiro momento, a base eleitoral do PT e de Lula se concentrava nos estamentos economicamente mais favorecidos (e, também, menos populosos); a partir de 2002, o “pai dos pobres” se aproximou das parcelas mais carentes. Essa inversão, de acordo com André Singer, é o que gerou o fenômeno chamado de “lulismo” – que dará uma base eleitoral fiel aos sucessores de Lula (ou de políticos que seguiram as políticas similares a de Lula, como o governador de Pernambuco Eduardo Campos, provável presidenciável para 2014).

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Bem, até 2009, quando Singer cunhou o termo “lulismo” e previa essa inversão eleitoral, tudo não passava de uma teoria embasada em uma série de tabelas e pesquisas. Os dados, contudo, apontavam para um cenário claro: o PT, da iniciante eleitoral Dilma Rousseff, contava com a parcela mais numerosa da população. Cabia aos concorrentes – José Serra (PSDB), Marina Silva (PV), Plínio de Arruda (PSOL) e os demais – lutarem pelo eleitorado restante, em especial da tradicional classe média urbana, estamento social populoso que sustentava uma parcela dos votos ao PT e que ficara órfã politicamente durante o primeiro mandato de Lula, principalmente após os escândalos do movimento chamado de mensalão. Ora, José Serra, candidato escolhido pelo partido que, historicamente, é o principal opositor ao PT, seria a aposta óbvia para a pergunta: quem colherá os votos do eleitorado de classe média? Sua coligação garantia-lhe uma vantagem considerável em relação a Marina Silva no que diz respeito a marketing: seu tempo em rádio e TV era de 7 minutos e 18 segundos, contra 1 minuto e 23 segundos da ambientalista. Para quebrar a lógica, a campanha de Marina Silva precisava, portanto, de estratégias que atingissem a tradicional classe média urbana de uma maneira tal que fugisse das tradicionais mídias off-line, pois competiria deslealmente com os dois principais jogares em 2010. E aí é que surge a oportunidade de marketing em mídias sociais. E era essa a aposta de Caio Túlio Costa, estrategista da campanha de Marina Silva. Nome conhecido dos jornalistas, ele foi idealizador e fundador do maior portal jornalístico on-line em língua portuguesa, o UOL. Ele também se destaca recorrentemente no mundo digital, sendo pioneiro em diversas estratégias on-line. Para o estrategista, as eleições de 2010 seriam as primeiras a ter a internet como protagonista na formação da opinião do eleitorado14, ainda que de modo bastante incipiente, se comparado com a realidade americana nas eleições de Obama em 2008. Caio Túlio e o corpo dirigente da campanha de Marina Silva desenharam uma estratégia que atingisse a tradicional (e órfã politicamente) classe média urbana. Essa parcela da sociedade esperava um candidato que falasse aquilo que queria ouvir: um discurso de aparente repúdio ao cenário de corrupção que aparentemente tomou os políticos. Para isso, a campanha de Marina Silva tinha uma tétrade de premissas: 1 - Discurso Modular: para cada tipo de público e cada tipo de ferramenta social, havia um discurso, um tom de voz, um público-alvo, etc. E isso não servia 14 10% dos brasileiros consideram a internet a principal ferramenta informativa, perdendo apenas para a TV, com 56% e o boca a boca entre amigos, com 18,5%. Esses dados foram extraídos do artigo “O Papel da internet na conquista dos votos de Marina Silva”.

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exclusivamente para a comunicação on-line – se estendia para o off-line também. Ora, para o Facebook, reduto da chamada “classe B” à época, havia temas e modos de falar que divergiam daquilo que seria postado no Orkut, por exemplo. Parece óbvio e básico demais. Mas em 2010, foi um caso completamente ímpar dado o tamanho da campanha; 2 - Transparência: ora, se Marina Silva queria falar com um eleitorado descrente politicamente, a estratégia que Caio Túlio e sua equipe montaram era de tratar de todos os assuntos de maneira clara e translúcida ao interlocutor. Rumores que pudessem causar estranhamento ou dúvidas sobre a integridade da candidata eram rapidamente monitorados e esclarecidos. De uma maneira bastante madura, isso significa dizer que é melhor admitir erros e explicá-los a negar e escondê-los. Ainda hoje, há muitos profissionais de mídias sociais que optam por estratégias diferentes dessa; 3 - Terceirização de voz: aqui é um efeito colateral da premissa de transparência. Ao contrário do que outros candidatos faziam15, quem estava falando era de fato Marina Silva – e quando não era, a equipe deixava isso claro “assinando” a postagem. O fato de não seguirem o tradicional ghost writing aponta para uma escolha por pessoalidade ante automação, escalabilidade ou velocidade; 4 - Discurso propositivo: ora, se a candidata queria se manter distante do “tradicional” e do “estabelecido”, uma boa estratégia era parar de criticar especificamente um ou outro candidato ou políticas feitas por seus partidos. Por sua vez, Marina Silva optou por comunicar-se de modo propositivo, encontrando as qualidades e oportunidades. Essa tétrade permeava as rotinas da equipe de marketing – tantoon-line quanto offline. Diariamente, Caio Túlio e sua equipe coordenadora da campanha se reuniam com Marina Silva para fazer um sumário dos dados obtidos na véspera e guiar as decisões feitas no dia corrente. Essa reunião diária tinha como objetivo integrar e otimizar os esforços de comunicação – já que há uma restrição legal bastante grande no que diz respeito à divulgação da campanha em mídia. Como não é permitida a compra de espaço publicitário em veículos de mídia, Caio Túlio e sua equipe optam por guiar os esforços na mesma direção, atingindo um objetivo por dia – lembrando que era mandatório divulgar a causa da candidata, retomando a tétrade mencionada acima.

15 Essa estratégia é diferente da adotada pela equipe da Dilma Rousseff, por exemplo. Logo em seu segundo tweet, em 11 de abril de 2010, a candidata petista diz que “alguns amigos vão ajudar” na atualização do canal, como pode ser visto no perfil, em http://twitter.com/#!/dilmabr/status/12010772550

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Uma vez definido o que fazer dia a dia, Caio Túlio repassava as decisões da cúpula da campanha para sua equipe de comunicação que, no que diz respeito a marketing on-line, era segmentada em 12 núcleos distintos: 1 - Site: que foi ao ar em julho, logo no momento de oficialização da candidatura de Marina Silva; 2 - Blog: foi o segundo canal digital criado como estratégia de campanha. Nasceu em fevereiro de 2010, um mês após o evento do “batismo digital” da candidata; 3 - Twitter: símbolo do “batismo digital”, primeiro contato oficial da candidata com o mundo on-line foi feito durante a Campus Party de janeiro de 2010. Inicialmente usado como ferramenta particular de Marina Silva, o perfil a acompanhou desde então até hoje – mantido ativo inclusive em períodos não eleitorais. Tanto essa conta quanto o blog têm caráter pessoal, já que a legislação eleitoral do país impede que sejam feitos canais de divulgação da candidata antes da convenção partidária que oficializa a candidatura. Caio Túlio considera que o lançamento praticamente concomitante do Twitter e do Blog foi fundamental para a sinergia da imagem que queriam fazer de Marina Silva como candidata, o que gerou uma inevitável vantagem em acessos ao blog ante os outros candidatos. No Twitter, Marina focava nos early-adopters e nos formadores de opinião; 4 - Orkut: comunidade oficial da candidata, em que ela se relacionava com o público de estratos sociais mais baixos (C e D), característicos dessa mídia social à época, e o público evangélico. 5 - Facebook: fanpage oficial da candidata, que não era o principal canal, haja vista que o Twitter e o blog detinham maior concentração de atividades e resultados. O público-alvo eram mulheres e os membros da “classe média iluminista” (apelido de Caio Túlio para “petistas desiludidos”); 6 - YouTube: canal oficial da candidata, servindo de hub (repositório) de vídeos que seriam compartilhados em outros canais; 7 - Flickr: canal oficial da candidata. Do mesmo modo que o YouTube, o Flickr tinha a função de repositório de conteúdo multimídia para os outros canais sociais; 8 - Social Game: o conceito de gamification ainda é novo para o mercado brasileiro. Mas Marina Silva deu um pontapé inicial interessante nessa área. O objetivo de seu social game era alcançar um público mais jovem (ainda assim,

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eleitores). À época, Social Games como Farmville, no Facebook, e Colheita Feliz, no Orkut, faziam sucesso. Com essa estratégia, a equipe de Caio Tulio pretendia abordar a causa de Marina Silva de modo lúdico; o “Um Mundo” – nome do game – era uma metonímia do foco social da campanha on-line; 9 - SEO: fazer SEO hoje é mais do que uma obrigação. Sem ele não há bons resultados em internet (lembrando que mídias sociais são essenciais para uma melhoria em SEO). O Search Engine Optimization era impactado diariamente; dia a dia o sound bite da campanha era alterado, o que implica no modo como a candidata será encontrada na internet. E, como todos os leitores sabem, SEO é conteúdo. Conteúdo é Rei. Caio Túlio sabia disso; 10 - SRM: o termo é inventado para a campanha de Marina Silva. É conhecido dos publicitários, jornalistas e vendedores o CRM (Costumer Relationship Manager). O SRM (Social Relationship Manager), por sua vez, é um banco de dados de todos os interlocutores da Marina Silva, baseado em seus perfis em redes sociais (em especial pelo Twitter). Dessa maneira, a coordenadoria da campanha sabia qual era seu público de modo personalizado, gerando conteúdo específico para cada um; 11 - Arrecadação: essa foi a primeira vez que se usou a arrecadação de pessoas físicas por meio de uma plataforma on-line. Sabe-se que campanhas eleitorais alcançam montantes milionários, provenientes principalmente de empresas e grupos comerciais de interesse. Ainda assim foi considerado bom o total de pouco mais de R$170mil obtidos durante o período de campanha. O significado disso é: o brasileiro está disposto a doar para campanhas pelas quais se importam; 12 - Monitoramento: particularmente, considero que essa deveria ser a sessão mais central na estratégia digital. Era a partir dos encontrados no monitoramento que se decidia o sound bite do dia; graças a esses dados de monitoramento, a “marca” Marina Silva se debruçava sobre determinada comunicação em detrimento a outras. É inevitável observar a estrutura da campanha de Marina Silva e não fazer o paralelo com o que Barack Obama fez em 2008. Ambas são consideradas icônicas e exemplares (lógico que a segunda tem mais visibilidade, pelo país em que ocorreu e o resultado positivo, contrariamente aos insuficientes 20 milhões de Marina Silva). O paralelo, contudo, é rechaçado por Caio Tulio em alguns aspectos. Obama e Marina, apesar de serem relativamente desconhecidos no cenário federal, discordavam na relevância do partido chefe da chapa: o primeiro era candidato do gigante Partido Democrata, acostumado a campanhas majoritárias e que dedicou mais de US$800mi, a segunda liderava a chapa do coadjuvante e “amador” eleitoral ideas.scup.com . @scup . facebook.com/scupbrasil facebook/scupbrasil

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Partido Verde, que investiu pouco mais de “irrisórios” R$24mi. Além das divergências no referente à estrutura das campanhas, há uma legislação eleitoral completamente destoante em cada país: no EUA, a campanha começa com as prévias, totalizando praticamente dois anos de contato com o eleitorado (632 dias), não só de proximidade física, como publicitária (incluindo propaganda em espaços comprados, como TV, SMS e mailing). No Brasil, como já vimos, proíbe-se a compra de espaços de mídia (restringindo a campanha de Marina Silva aos poucos 83 segundos na TV e suas tradicionais peças off-line), além de limitar a campanha em 242 dias (contando desde a criação do Twitter/blog da candidata) e a arrecadação, permitida apenas após a oficialização da candidatura, totalizando em 58 dias. De todo modo, o sucesso de Marina Silva é inquestionável. Os resultados comparativos com os principais candidatos (Dilma Rousseff e José Serra) no que diz respeito ao mundo on-line são extremamente expressivos. O site de Marina continha conteúdo suficiente para atender a praticamente todas as necessidades informativas do eleitor – e isso é o que importa para SEO. Prova disso é essa tabela que apresenta o volume de acessos nos sites de cada um dos candidatos:

Gráfico 2: Volume de acessos nos sites dos candidatos 600 500 400 300

dilma13.com.br minhamarina.org.br serra45.com.br

200 100 0

fev/10 mar/10 abr/10 mai/10

jun/10 jul/10 ago/10

set/10

Ora, mas acessos no site e buscas em buscadores são sinônimos de votos? É evidente que não – ainda mais fazê-lo em real time no decorrer da campanha. Contudo, Caio Túlio conseguiu, após os resultados das eleições, realizar uma pesquisa paralela que demonstrou que as cidades onde Marina Silva detinha os

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maiores percentuais de votos (60%+) coincidiram com aqueles que traziam mais acessos ao site. Estima-se que a campanha on-line gerou, diretamente, 12,5 milhões de eleitores: pouco mais de 60% do total. Imaginem só se 100% da população brasileira tivesse igual acesso à Internet...

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