PROCESSO ADMINISTRATIVO, CIVIL E PENAL EM MATÉRIA AMBIENTAL NO ESTADO DE SERGIPE

July 6, 2017 | Autor: Larissa Guarany | Categoria: Meio Ambiente
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PROCESSO ADMINISTRATIVO, CIVIL E PENAL EM MATÉRIA AMBIENTAL NO ESTADO DE SERGIPE LARISSA GUARANY RAMALHO ELIAS Engenheira Florestal

Profa. Dra. LAURA JANE GOMES Universidade Federal de Sergipe

1. Introdução Em 1981 foi promulgada a Política Nacional de Meio Ambiental, iniciando a consolidação da preocupação com a proteção ambiental no Brasil. Entre seus diversos instrumentos, a política traz o licenciamento ambiental e as penalidades disciplinares ou compensatórias ao não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental. Além disso, dá ao IBAMA competência de fiscalizar entidades públicas ou privadas que realizem atividades potencialmente poluidoras. Ela dá ainda autonomia ao O Ministério Público da União e dos Estados para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente1. O Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), foi criado em 1989 sob forma de autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), com a função de executar e fazer executar a Política Nacional de Meio Ambiente, fiscalizar, controlar e fomentar os recursos naturais2. Já em 1988, a Constituição Federal continua a consolidar o ideal de desenvolvimento sustentável, que ganhou popularidade nos anos 70, quando traz o já clássico artigo 225. Em seu parágrafo 3º, a Carta Magna dispõe que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”, uma inovação em se tratando de responsabilidade penal da pessoa jurídica3. No âmbito da criminalização de condutas lesivas ao meio ambiente, surgiu a Lei de Crimes Ambientais, em 1998, reafirmando a possibilidade de responsabilização penal, civil ou administrativa da pessoa física ou jurídica, sendo que a responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato. A lei traz cinco categorias de crimes ambientais, são eles: contra a flora, contra a fauna, contra a administração ambiental, contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural e crime de poluição. Consta ainda na LCA as infrações administrativas ambientais e neste momento é importante destacar a diferença entre crime e infração. O crime ambiental é uma conduta lesiva ao meio ambiente que pode ser responsabilizada nos âmbitos civil e penal, para que o crime ocorra, deve haver um fato típico, culpabilidade e antijuridicidade. Já a infração administrativa ambiental é, segundo a LCA, toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente; ela leva à responsabilização administrativa do infrator4. Em 2008 foi sancionado o Decreto 6.514 que “dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências”, unificando assim o trâmite processual das infrações

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BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 02 de setembro de 1981. 2 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 7ª edição revisada, ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. 1160 p. 3 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, 05 de outubro de 1988. 4 BRASIL. Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 13 de fevereiro de 1998.

administrativas ambientais no âmbito federal5. Como consequência, o IBAMA lançou em 2012 a Instrução Normativa número 10 que “regula os procedimentos para apuração de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, a imposição das sanções, a defesa, o sistema recursal e a cobrança de multas”6. A exemplo do exposto, o carreamento de efluentes para um manancial, prejudicando a fauna e a sanidade ambiental pode motivar: pagamento de multa, com base no Decreto nº 6.541/2008 (esfera administrativa); pena de detenção ou multa ou ambas cumulativamente, com base na Lei de Crimes Ambientais (esfera penal); e pagamento de indenização ou cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer, com base na Política Nacional de Meio Ambiente (âmbito civil). Deste modo, Milaré7 distingue de maneira clara os três âmbitos jurídicos. A responsabilidade administrativa ambiental é de caráter repressivo, assim como a penal. Na esfera administrativa, a infração, essência do regime de responsabilidade administrativa, não é caracterizada pela ocorrência do dano, mas sim pelo não cumprimento de alguma norma jurídica. A responsabilidade administrativa ambiental constitui-se num sistema híbrido entre responsabilidade civil sem culpa e responsabilidade penal com culpa, dependendo da definição da infração descrita na Lei de Crimes Ambientais. O dano ambiental isoladamente não gera responsabilidade administrativa, a menos que seja enquadrável como resultado de um tipo de infração ou provocado pela conduta comissiva ou omissiva de violação de regras jurídicas7. O ilícito penal, como o administrativo, não se pauta no dano, mas sim na potencialidade de dano. As sanções penais, como as civis, são apenas aplicáveis pelo poder judiciário; já as administrativas são aplicadas aos infratores pelos próprios órgãos da administração pública. A responsabilidade penal requer uma conduta comissiva ou omissiva que incorra numa infração, de acordo com o Código Penal e a Lei de Crimes Ambientais. A partir desta lei, além da pessoa física, a pessoa jurídica passou a ter responsabilidade penal ambiental7. A reparação de danos ou qualquer outro tipo de reparação baseia-se nas normas de responsabilidade civil, as quais pressupõem prejuízo a terceiros, ensejando pedido de reparação de dano ou indenização. A responsabilidade civil ambiental, quando regida pela PNMA, passa a ser objetiva (sem culpa) e não subjetiva (com culpa) como estava disposto no Código Civil. Segundo a ótica objetivista, para tornar efetiva a responsabilização basta provar a ocorrência do dano e seu vínculo com a atividade humanaacima7. Objetivou-se com esta pesquisa, entender os processos de responsabilização nas esferas administrativa, civil e penal praticado pelos órgãos responsáveis no Estado de Sergipe para além daquilo previsto na legislação. Além disso, buscou-se traçar um perfil de autuações por infrações administrativas ambientais desde 1990 até 2014.

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BRASIL. Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008. Dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 23 de julho de 2008. 6 BRASIL. Instrução Normativa nº 10, de 07 de dezembro de 2012. Regula os procedimentos para apuração de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, a imposição das sanções, a defesa, o sistema recursal e a cobrança de multas no âmbito do IBAMA. Ministério do Meio Ambiente – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente, Diário Oficial da União, 10 de dezembro de 2012. 7 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 5ª edição, reformada, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. 1279 p.

2. Materiais e Métodos 2.1. População da pesquisa Para que se pudesse entender os processos nos três âmbitos de responsabilidade foram escolhidos dois órgãos, um de atuação administrativa e outro de atuação civil e penal. Por conta da facilidade de acesso a dados, o órgão da administração ambiental escolhido foi o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, através da sua superintendência em Sergipe e o órgão do sistema de justiça escolhido foi o Ministério Público Estadual - MPE, pela interação que tem com aquele instituto. Foi considerado como base para a análise dos dados o Estado de Sergipe como um todo. Sergipe possui 22.050 km2 de área territorial, o que corresponde a 0,26 % do território nacional. É limitado ao norte pelo rio São Francisco, a leste pelo oceano e a oeste e sul limita-se com o estado da Bahia. O Estado é dividido em 75 municípios, nos quais a maior parte da população é urbana, segundo o IBGE8. Seu relevo é predominantemente plano e o regime de chuvas prevalecente é do tipo mediterrâneo, com máxima precipitação no outono-inverno. As zonas climáticas são: Semiárido, que se caracteriza por grande deficiência hídrica, com precipitações anuais que raramente se situam entre 500 e 700 mm, sofrendo muita variabilidade, com dois ou três meses favoráveis às atividades agrícolas; Agreste, com precipitações entre 700 e 900 mm anuais, chegando a ultrapassar os 1.000 mm/ano; e Leste, região situada próximo ao litoral, com precipitações acima dos 1.000 mm anuais. Mesmo assim, o litoral sergipano se caracteriza pelos baixos totais pluviométricos, que declinam a partir do norte de Salvador e só voltam a crescer depois da foz do rio São Francisco, já no estado de Alagoas9. 2.2. Coleta de dados A coleta de dados para esta pesquisa se deu em duas fases diferentes. Para traçar o perfil de atuação do IBAMA no Estado, foram consultados todos os autos de infração lavrados por este órgão desde o ano posterior a sua criação, ou seja, 1990, até o ano de 2014. Os autos foram obtidos através da Consulta Pública de Autuações Ambientais e Embargos do IBAMA, disponível na seção de serviços do seu endereço eletrônico. Foram considerados para a análise da atuação a quantidade de autos lavrados por ano, o tipo de infração de cada auto e o tipo de pessoa, física ou jurídica. Outras informações como detalhes do processo foram obtidas através do Protocolo do IBAMA, e da plataforma DOCIBAMA, ambos disponíveis no sítio do instituto na web. Estas ferramentas foram utilizadas para esclarecer as infrações e os trâmites processuais quando necessário ao entendimento dos dados. Estes dados foram sistematizados com auxílio do software Excel (pacote office da Microsoft) e deram base para geração de gráficos. Para apuração dos processos administrativo, civil e penal, foram aplicados com a população pesquisada, roteiros de entrevistas semi-estruturadas, ou seja, de caráter aberto, permitindo que os entrevistados falassem livremente sobre o assunto sem desviar do foco da entrevista10. O roteiro buscou diagnosticar a relação dos órgãos públicos, tanto de competência criminal quanto IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010. Disponível em: . 9 SEAGRI – Secretaria do Estado da Agricultura, do Desenvolvimento Agrário e da Pesca de Sergipe. Caracterização do Estado. Disponível em: 10 MAY, Tim. Pesquisa Social: questões, métodos e processos. Tradução: Carlos Alberto Silveira Netto Soares. 3ª edição. Porto Alegre: Artmed, 2004. 138 p. 8

administrativa, com as informações por eles recebidas acerca de denúncias sobre crimes ambientais no Estado de Sergipe. Buscou-se, portanto determinar a existência de sistemas de informação acerca de denúncias de crimes ambientais em cada um dos órgãos públicos pesquisados. A aplicação dos roteiros iniciou-se em 23 de janeiro de 2013 e foi finalizada em 22 de fevereiro de 2013. Os resultados são apresentados de forma descritiva, e também através dos gráficos produzidos. 3. Resultados e Discussão A partir da análise dos autos de infração lavrados pelo IBAMA no Estado de Sergipe desde o primeiro ano após a criação deste órgão, ou seja, 1990, até o ano de 2014, foi possível produzir gráficos que permitem avaliar qualiquantitativamente as autuações por infrações ambientais durante estes 24 anos no Estado. Ao total foram avaliados 2789 autos de infração. Abaixo é apresentado um gráfico que exibe a lavratura destes autos em números absolutos durante o período de tempo estudado.

Série histórica de lavraturas de auto de infração pelo IBAMA em Sergipe 400

Nº de autos de infração

350 300 250 200 150 100 50

2014

2013

2012

2011

2010

2009

2008

2007

2006

2005

2004

2003

2002

2001

2000

1999

1998

1997

1996

1995

1994

1993

1992

1991

1990

0

Ano

Gráfico 1 – Distribuição quantitativa de autos de infração. O Gráfico 1 mostra um aumento significativo na quantidade de autos de infração lavrados no ano de 1996, com valores mantidos altos até o ano de 2002. Não há marco legal para o ano de 1996 que leve a inferir um possível motivo para este grande aumento. É evidente que diversos fatores podem afetar a intensidade das atividades do IBAMA, como investimento em infraestrutura e equipamentos, contratação de pessoal, entre outros. No sistema de consulta pública do instituto, utilizado como fonte de dados desta pesquisa, é possível observar também um aumento significativo de autos lavrados de 1995 para 1996 em outros Estados, como Alagoas e Pernambuco, o que indica que este aumento está relacionado ao órgão como um todo e não às superintendências estaduais; é possível que seja uma questão de cadastramento, já que

a lei que obriga à publicidade dos autos de infração lavrados pelo IBAMA só foi promulgada em 200311. Porém, é importante destacar, que pela análise dos processos disponíveis no protocolo online do IBAMA, muitos autos lavrados em 1996 estão relacionados a Autorização Para Transporte De Produtos Florestal – ATPF, instituída em 1993 e muitos outros à destruição de manguezal pela ocupação urbana. Segundo Fonseca et al.12, bairros como Coroa do Meio, Atalaia, Inácio Barbosa, Jabotiana e Santa Maria, tiveram grande crescimento a partir de 1996 e suas localizações são nas margens dos rios (área de preservação permanente, não edificável por lei) onde a vegetação predominante é a de mangue. A próxima queda no gráfico se estabelece em 2011, ano em que foi publicada a Lei Complementar 140, a qual determinou as competências de atuação sobre a proteção ambiental de cada ente federado13 e assim transferiu diversas responsabilidades que antes eram da União, na figura do IBAMA, para o Estado, em Sergipe na figura da Administração Estadual de Meio Ambiente - ADEMA, o que explica a queda na lavratura de autos. A leve alta em 2013 está relacionada à grande quantidade de autos relativos ao Cadastro Técnico Federal, mostrando um esforço do IBAMA na regularização deste instrumento. O gráfico a seguir apresenta a participação de cada tipo de infração administrativa ambiental em relação ao total de autos lavrados em cada ano, desde 1990 até 2014.

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BRASIL. Lei nº 10.650, de 16 de abril de 2003. Dispõe sobre o acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do Sisnama. Diário Oficial da União, 17 de abril de 2003. 12 FONSECA, Vânia; JÚNIOR, Antonio Fernando Cabral Gonzaga; FERRO, Sandra Regina O. P. B.; e SOARES, Ana Célia G. M. Mapeamento sócio-ambiental como ferramenta para análise das relações espaciais: os bairros de Aracaju. GEONORDESTE, Ano XXII, n.1, 2011. 13 BRASIL. Lei Complementar nº 140, de 08 de dezembro de 2011. Fixa normas, nos termos dos incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora; e altera a Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981. Diário Oficial da União, 09 de dezembro de 2011.

Tipos de infração constantes nos autos avaliados 100,0 90,0 80,0 70,0

%

60,0

FLORA

50,0

CONTROLE AMBIENTAL

40,0

PESCA

30,0

FAUNA

20,0

OUTROS

10,0

2014

2012

2010

2008

2006

2004

2002

2000

1998

1996

1994

1992

1990

0,0

Ano

Gráfico 2 - Porcentagem de participação de cada tipo de infração no total de autos lavrados pelo IBAMA no período estudado. É possível perceber a partir do gráfico que apenas a partir de 1998, com a sanção da Lei de Crimes Ambiental que surgiu uma classificação mais diversificada para as infrações, cabendo ressaltar que “controle ambiental” diz respeito às atividades potencialmente poluidoras e está relacionado com questões de licenciamento e Cadastro Técnico Federal, o qual teve um grande aumento de ocorrências a partir de 2010, com pico em 2013, como comentado acima. Fica claro, ao analisar o Gráfico 2 que crimes contra a flora foram predominantes nos autos de quase todos os anos avaliados, apresentando uma queda a partir de 2011, provavelmente por conta da transferência de competência favorecida pela LC 140. É interessante destacar que, como pode ser visto no gráfico a seguir, a massiva maioria de autos de infração lavrados durante estes 24 anos no Estado de Sergipe foi em nome de pessoas físicas.

Tipo de Pessoa nos Autos de Infraçao 120,0 100,0

%

80,0 60,0

PESSOA JURÍDICA PESSOA FÍSICA

40,0 20,0 0,0 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014

Ano

Gráfico 3 - Distribuição dos autos de infração por tipo de pessoa (física ou jurídica) em cada ano do período avaliado. Lemos14 ao avaliar a eficácia da aplicação da LCA no sul da Bahia determinou que no ano de 2010, foram registrados 136 autos de infrações pelo IBAMA de Ilhéus, dentre eles, 77% foram de pessoas físicas e 23% de pessoas jurídicas, um índice alto, assim como o de Sergipe. O mesmo autor identificou ainda que 71% foram autuados em crimes contra a flora, 7% fauna, 22% em outros crimes ambientais, como atividade ambiental sem licença, perfil parecido com o encontrado em Sergipe. A lavratura de um auto de infração, que decorre do exercício de poder de polícia do órgão ambiental, leva à instauração de processo administrativo para responsabilização de pessoa física ou jurídica pelo ilícito cometido, é possível também que sejam abertos processos civis e penais, mas esta ação está fora da alçada do órgão ambiental. A seguir estão detalhados os processos nestes três âmbitos de responsabilidade. 3.1. Processo administrativo: o caso do IBAMA O processo administrativo federal para apuração das infrações administrativas ao meio ambiente só foi unificado a partir da publicação do Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008. O IBAMA, por sua vez, segue a sua Instrução Normativa Nº 10/2012 sobre os procedimentos para apuração de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, a imposição das sanções, a defesa, o sistema recursal e a cobrança de multa ou sua conversão em prestação de serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente para com a Autarquia” Com a aplicação de questionário semiestruturado, foi possível entender como a superintendência do IBAMA em Sergipe tramita seus processos administrativos por infrações ambientais. 14

LEMOS, Reinaldo Martins; UEZU, Alexandre; ZAKIA, Maria José Brito; e PÁDUA, Cláudio Benedito Valladares. A eficácia da aplicação da lei de crimes ambientais para a proteção do meio ambiente no litoral sul da Bahia. Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM, v. 8, n. 2, 2013.

O processo administrativo inicia-se a partir do conhecimento da ocorrência da infração ambiental, que pode ocorrer a partir da aplicação do poder de polícia do IBAMA ou de denúncias que chegam ao órgão pelo seu Sistema Linha Verde da Ouvidoria (Sisliv). Quando determinada denúncia é recebida pelo IBAMA, uma interlocutora cadastra os dados informados no Sisliv, a partir de então, ela avalia se a responsabilidade de apuração da denúncia é do IBAMA ou de outra instituição. Sendo do IBAMA, a denúncia é enviada via ofício para a Divisão de Controle de Fiscalização (DICOF). Sendo atribuição de outro órgão, um ofício é encaminhado ao Ministério Público Estadual, no qual consta o número de cadastramento da denúncia no Sisliv; em seguida o MPE então redistribui essas denúncias para os órgãos competentes. O DICOF por sua vez faz a fiscalização in situ. Constatada a infração, é lavrado, como prevê a legislação, o auto de infração e então o infrator responderá a processo administrativo de acordo com os trâmites da IN nº 10/2012. Em fevereiro de 2012 foi assinado um Acordo de Cooperação Técnica entre o IBAMA e o Ministério Público Estadual de Sergipe com o objetivo de permitir que o MPE tenha acesso ao Sistema Linha Verde do IBAMA, o Sisliv, o qual cadastra ocorrências/denúncias de competências dos órgãos ambientais estaduais e municipais (BRASIL, 2012). Com o Sisliv, pretende-se melhorar a qualidade do serviço prestado a sociedade, compartilhando informações e evitando assim ações sobrepostas entre as partes do acordo, fortalecendo os mecanismos de proteção ambiental no Estado (BRASIL, 2012). Como divulgado na página do IBAMA na internet, “A Linha Verde existe desde 2005 e surgiu da necessidade do IBAMA ter um canal direto com a sociedade e agilizar o processo de apuração de demandas enviadas pela mesma”; é um serviço largamente utilizado pelo cidadão e recebe, em média, 50 denúncias por dia de todos os tipos de crimes ambientais. 3.2. Processo civil e penal: o caso do MPE A Política Nacional de Meio Ambiente atribui ao Ministério Público (MP) o poder de propor ações judiciais de natureza civil para reparar ou prevenir danos ao meio ambiente. Já a Lei 7.347/85 que “disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meioambiente, ao consumidor” confere ao Ministério Público Federal ou Estadual poder de instaurar ação civil pública15 e inquérito civil16 com o objetivo de apurar a ocorrência de danos ambientais7. Para tanto, foram criadas dentro do Ministério Público promotorias de proteção ao meio ambiente. O fato do promotor de justiça atuar na esfera cível não exclui sua competência criminal no combate à degradação ambiental7. A partir do exposto, apresentam-se dois processos distintos obtidos na entrevista com o técnico da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente e Urbanismo de Aracaju (Ministério Público Estadual): um civil e outro penal. O início dos dois processos é o mesmo: a denúncia é recebida pela ouvidoria, protocolo ou triagem e aquelas relacionadas a questões ambientais são enviadas à Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, que por sua vez classifica a denúncia como reclamação (dados da denúncia não documentais), procedimento preparatório de inquérito civil – PPIC (dados documentais, menor tempo para finalizar – 90 dias) ou inquérito civil (dados documentais, maior tempo para 15

Na Constituição Federal, artigo 129, é tida como função institucional do Ministério Público a execução de ação civil pública e inquérito civil para proteção, entre outras coisas, do meio ambiente (ANTUNES, 2004). 16 O inquérito civil é uma investigação administrativa de caráter inquisicional instaurado e presidido exclusivamente pelo Ministério Público com o objetivo de apurar a ocorrência de danos efetivos ou potenciais a direitos ou interesses difusos, coletivos ou individuais ou outros que lhe incuba defender (Artigo 2º do Ato Normativo Paulista 484/2006 apud MILARÉ, 2007; MACHADO, 2006).

finalizar – 01 ano). A denúncia categorizada como reclamação será apurada caso haja informação suficiente para tal e seguirá o mesmo percurso do PPIC e inquérito civil. Para apurar a ocorrência do crime ambiental, o Ministério Público Estadual (MPE) notifica, na forma de ofício, o órgão ambiental responsável pela fiscalização ambiental, podendo então ser a ADEMA no âmbito estadual ou o IBAMA no âmbito federal. O relatório de vistoria do órgão fiscalizador é enviado à promotoria como resposta e é então avaliado se cabe apenas processo administrativo para resolução do problema, apenas aplicação de multa ou se é necessário, além do processo administrativo um processo civil. Sendo necessário o processo civil, é marcada audiência com o responsável pela irregularidade. Pelo baixo potencial ofensivo atribuído à maioria dos crimes ambientais e ainda a existência de circunstâncias atenuantes, o promotor tenta resolver a irregularidade conversando com o infrator, aconselhando-o a se regularizar para então notificar o reclamante, que representa uma das partes no processo. Se o reclamante afirma que a situação foi solucionada, o processo é arquivado; Caso contrário, são feitas outras inspeções e audiências nas quais é proposto um Termo de Ajuste de Conduta, o TAC17. A ação civil pública pode substituir o TAC. Este tipo de ação tramita na justiça e difere da ação penal pública ao requerer a reparação do dano causado. A preferência do TAC sobre as ações civis públicas se dá pela morosidade dos trâmites das ações contra a celeridade de execução do TAC. No processo penal, é determinada dentro da promotoria a necessidade de instauração de inquérito policial18 através da avaliação das informações recebidas. Sendo instaurado, é necessário que as partes sejam ouvidas pelo delegado (Delegacia de Proteção ao Consumidor e ao Meio Ambiente) e que haja vistorias técnicas realizadas pelos órgãos ambientais competentes. A partir do conjunto de documentos produzidos, o Ministério Público entra com ação penal pública, o que podemos chamar de oferecer denúncia, que será julgada pela vara criminal ou pelo juizado especial criminal para crimes de menor potencial ofensivo, com pena máxima prevista de 02 anos. Fonseca19, ao analisar ações impetradas pelo Ministério Público Federal de crimes contra a flora, descobriu que das 135 de crimes contra a flora encaminhadas para o Ministério Público Federal ajuizar ação penal, 53 eram procedimentos administrativos encaminhados pelo IBAMA, o que mostra a importância da cooperação entre estes dois órgãos. 4. Conclusões 

17

Desde 1990, predominou em Sergipe infração ambiental contra a flora cometidos por pessoa física, até 2011 com grande diferença em relação aos outros tipos de crime. Esta queda muito provavelmente remete à consequência da LC 140 e não ao menor cometimento de crimes desta natureza no Estado;

TAC compromete o infrator a solucionar a questão dentro do prazo estipulado no próprio documento, caso contrário executa-se a media cabível ao caso. 18 Princípio da intervenção mínima do Direito Penal: Este ramo do direito tem o poder/dever de incidir sobre caso concreto apenas quando as instâncias de responsabilização civil e administrativa, que são menos gravosas, se mostrarem insuficientes para coibir a conduta infracional (MILARÉ, 2007). 19 FONSECA, Anne Michelle Tavares; VALENTE, Luciana Montenegro; e LOPES, Marcileia Couteiro. Diagnóstico dos crimes contra a flora a partir das ações impetradas pelo Ministério Público Federal. Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM, v. 8, n. 1, 2013.

   

Há uma unificação do processo administrativo federal através de legislação federal e institucional, este padrão deveria ser replicado para os órgãos estadual e municipais de meio ambiente em Sergipe; O Sisliv confere interação e cooperação entre o IBAMA e o MPE, permitindo não só maior celeridade nos trâmites processuais, como também a responsabilização civil e penal do ilícito que já passa por processos administrativo; A fabricação e divulgação de informações acerca de crimes ambientais é importantíssima no auxílio ao seu combate e deveria ser replicada para os órgãos seccionais e locais do SISNAMA; O MPE é o operador do sistema de distribuição de apuração de responsabilidades no Estado de Sergipe.

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