PRODUÇÃO INTEGRADA DE FRUTAS PIF e a produção de Açaí (Euterpe oleracea Mart) no Estado do Pará: ameaças ou oportunidades?

June 12, 2017 | Autor: Ismael Silva | Categoria: Food Safety, Food Consumption, Indexation
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PRODUÇÃO INTEGRADA DE FRUTAS (PIF) E A PRODUÇÃO DE AÇAÍ (EUTERPE OLERACEA MART) NO ESTADO DO PARÁ: AMEAÇAS OU OPORTUNIDADES? RUBENS CARDOSO DA SILVA; PAULO CERQUEIRA DOS SANTOS; JOSÉ SEBASTIÃO ROMANO DE OLIVEIRA; MARIA CRISTINA DAS NEVES SILVA; ISMAEL MATOS DA SILVA; UFRA/UEPA BELEM - PA - BRASIL [email protected] APRESENTAÇÃO ORAL Agropecuária, Meio-Ambiente, e Desenvolvimento Sustentável

PIF e a produção de Açaí (Euterpe oleracea Mart) no Estado do Pará: ameaças ou oportunidades?

RESUMO: Este trabalho, apoiado na dinâmica de crescimento do consumo de sucos naturais, como uma das bebidas esportivas associadas à imagem de produto saudável, suscita as questões relacionadas com a aplicação do PIF junto à produção do Açaí, visto a ampliação da aceitação desse produto nos mercados nacional e internacional. Está fundamentado na aplicação da legislação específica e seus pré-requisitos frente às características peculiares da exploração do cultivo do Açaí no Estado do Pará. A produção foi “rankeada” através do Índice de Desempenho Competitivo – IDC, que serviu para classificar os 20 principais municípios produtores, a partir dos quais se realizam as análises. Os resultados indicam a necessidade de uma concertação interinstitucional e criação de mecanismos de gestão na cadeia produtiva, a fim de vencer os desafios impostos. Palavras-chave: PIF, açaí, IDC PIF and the production of Açaí (Euterpe oleracea Mart) on Pará State: threats or opportunities? ABSTRACT: This work, sustained on growth’s dynamic of natural juice’s consumption as a sportive drink associated mith an image of healthy product, suggest questions related to the application of PIF on production of Açaí, considering the enlargement of acceptation of this product on national’s and international’s market. It is purpose in front of unique caractters of Açaí cultivation on Pará State. The production was ranked by the Competitive Performance’s

2 Index, which classified the 20 main municipal district’s productors that are analysed. The results indicate the necessity of an interinstitucional agreement and a creation of management’s mechanisms on production chain, in order to overcome the enforced challenge. Keywords: PIF, Açaí, IDC

1 – INTRODUÇÃO É um fato de fácil percepção o crescimento do consumo das bebidas esportivas, associadas à imagem de produto saudável, capazes de repor sais minerais consumidos pelo esforço físico e reidratar o organismo humano. Sob essa imagem de produto saudável abrigam-se ainda os sucos de frutas, os quais estão associados ao atributo de conveniência. O suco ou vinho de Açaí (Euterpe oleracea Mart) é um desses produtos que vêm conquistando o mercado e que se firma pelas suas qualidades nutricionais. Contudo, a par da força dos atributos “conveniência” e “valor nutricional” é também crescente a preocupação do consumidor com a saúde e qualidade de vida, o que implica na pré-condição de se obter qualidade, intrínseca1 e extrínseca2, na matéria prima originária desses produtos. Assim é que vem ocorrendo a desmitificação do preconceito comum de que “natural” é sinônimo de “saudável”, considerando alimentos não processados como superiores. O consumo de ovos crus pode causar sintomas de deficiência de biotina (manchas na pele, erupções, caspas), uma vez que, a clara crua contém avidina e essa se conjuga com a biotina, daí a necessidade da desnaturação via calor; alguns tipos de feijões contêm favina e fasina que são substâncias causadoras de hemólise, enterite, dores abdominais, náuseas e, em casos mais graves, até mesmo a morte, imprescindindo do cozimento para desativar essas substâncias. Ademais, resguardada a compulsoriedade do processamento de alguns alimentos, a ocorrência lastimável de contaminação, tais como metanol em vinhos, salmonella em ovos e pimenta do reino, chumbo em leite em pó, benzeno em água mineral, dioxina em frangos, staphylococcus em “massa” de caranguejo, coliformes fecais em polpas de frutas, Trypanosoma cruzi em caldo e/ou suco de frutas, antibióticos em leite in-natura, e uso de hormônios ilegais em carne bovina, tem tornado esse consumidor cada vez mais consciente da vulnerabilidade da vida. Outra grande questão que influencia esse ambiente refere-se à falta de informações precisas e de estudos profundos que atestem a inocuidade dos produtos transgênicos à saúde humana e animal. Relata-se o potencial efeito alergênico derivado da presença do “transgene” e a possibilidade de haver alterações no metabolismo humano vis-à-vis a ocorrência de casos de morte de 37 pessoas e doenças em outras 1.500, no Japão, a partir de 1.989, presumivelmente provocadas pelo consumo de Triptofano (aminoácido) produzido com o concurso de uma bactéria geneticamente modificada. Também foi noticiado o caso de ocorrência de fortes reações alérgicas em consumidores de feijões, nos quais havia sido inserido o gene da castanha (ARAÚJO, 1999). De ressaltar que a incidência de doenças veiculadas por alimentos (DVA) pode atingir 1/3 da população (OMS, 2002). Nos Estados 1

Qualidade intrínseca - são atributos que necessitam de instrumentos (selos, certificados, marcas, rotulagens) para serem facilmente percebidos pelo consumidor. (dano ao meio ambiente, ausência de resíduos químicos, valor nutritivo, confiança no produto ou empresa, etc.). A percepção esta fortemente atrelada ao grau de confiança nestes instrumentos. 2 Qualidade extrínseca - são atributos facilmente percebidos externamente pelo consumidor (preço, aparência, cor, tamanho, forma, etc.)

3 Unidos, por exemplo, são registrados 76 milhões de casos de DVA, com 325.000 hospitalizações e 5.000 mortes a cada ano. No mundo há cerca de 2.1 milhões de casos fatais (NEVES, 2006). Por tudo isso e pela complexa rede de inter-relações em que se envolve a produção de alimento, é que se faz necessário o compartilhamento de informações, evitando-se a ocorrência de assimetrias, sobre os atributos específicos de produtos ao longo de uma cadeia produtiva, da origem de seu processo de produção até o consumidor final, a fim de que sejam evitadas as não conformidades capazes de impedir o atendimento das expectativas e requisitos ditados pelo consumidor, sobretudo àqueles relacionados à biossegurança. O significado prático da biossegurança pode ser resumido pelas “ameaças à segurança do alimento percebidas pelos consumidores”, conforme o que explicita a Food Marketing Institute (1990) apud Spers (2000, p. 289): Deterioração/microorganismos; Pesticidas/resíduos/inseticidas/ herbicidas; Embalagem imprópria/latas; Químicos em geral; Fraude; Manuseio inadequado pelos agentes do varejo; Conservantes; Aditivos em geral;

Manuseio inadequado por compradores nos pontos de vendas; Poluição/poluição ambiental; Processamento/preparo de alimentos; Insetos/pestes/ratos; Coloração artificial; Antibióticos; Radiação.

Processualmente, portanto, pode-se afirmar que a produção de um alimento resulta de um conjunto de operações (ou tarefas), interligadas, interdependentes e seqüenciadas, voltadas para o alcance de um determinado resultado capaz de lhe adicionar valor, numa sucessão de cadeias cliente-fornecedor, a fim de atender ao consumidor final com um alimento seguro 3. Assim, é que instrumentalmente as firmas sintonizadas com as exigências de saúde e qualidade de vida de seus clientes, notadamente aquelas do ramo agroindustrial, estão incorporando nos seus processos de produção as boas práticas de gestão do padrão International Standard for Quality Management Systems (ISO) e os princípios do Harzard Analysis of Critical Points (HACCP), traduzido como Análise de Risco dos Pontos Críticos de Controle. A adoção dos princípios do sistema HACCP4 constitui-se numa pré-condição para que as firmas agroindustriais exportem para a União Européia (EU) e Estados Unidos (EUA), e a aplicação da ISO revisa sob nova ótica, as diferentes atividades econômicas das firmas e, mais que isso, todo o ciclo de vida dos seus produtos/serviços, mensurando os impactos ambientais deles decorrentes, através do Sistema de Gestão Ambiental (SGA/ISO – Série 14000), buscando permanentemente minimizá-los e/ou evitá-los.

3

Alimento seguro não oferece risco à saúde e está isento de perigos físicos, químicos e microbiológicos. Segundo os princípios do sistema de gestão da qualidade, todos os empregados, em suas tarefas específicas, são responsáveis pela qualidade. A antiga separação entre as funções de “produtor” e de “controlador da qualidade” estão sendo substituídas pela concepção de “qualidade assegurada”, onde todos têm responsabilidade pelas suas próprias ações. Assim, a aplicação do conceito de HACCP significa que o sistema de controle de qualidade deve estar concentrado nos chamados Pontos Críticos de Controle. 4

4 Esse processo, entretanto, não é autônomo. Empurrado não somente pelas mudanças na ordem econômica que propiciam abertura gradual dos mercados fechados, rompimento de fronteiras, formação dos grandes blocos econômicos, com conseqüente globalização da economia mundial, mas pela crescente conscientização e grau de exigibilidade do consumidor final, esse processo impõe desafios aos diversos setores da economia nacional/estadual. Tais desafios somente serão vencidos se esses setores tiverem uma perfeita compreensão das forças de mercado, sinalizando que cada vez mais será valorizado o aspecto qualitativo e o respeito ao meio ambiente na produção de qualquer produto, e dos condicionantes de tendências que neles atuam e que afetam sua competitividade. Neste cenário ganha importância a produção de produtos adequados às normas reconhecidas, que tornam possível a padronização dos sistemas de produção, processamento e armazenamento dos alimentos. Como observa Ambrosini (2003), esses padrões possibilitarão auferir os riscos potenciais em cada etapa do processo e trabalhar no controle e prevenção dos riscos ao longo do processo de produção. É assim que o fórum internacional de normalização sobre alimentos, criado em 1962 sob a chancela conjunta da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) e da Organização Mundial da Saúde (OMS), estabelece através do Programa Codex Alimentarius as normas de proteção à saúde da população, assegura práticas eqüitativas no comércio regional e internacional de alimentos e cria mecanismos dirigidos à remoção de barreiras tarifárias. Além disso, o Brasil vem aderindo aos acordos da Organização Mundial do Comércio e Tratado de Barreiras Técnica, realizando discussões em parlamento, negociações internacionais, na própria OMC, no Mercosul, na Alca e na EU, incorporando leis e regulamentos setoriais e se ajustando às inovações introduzidas pelo Código de Defesa do Consumidor. Sob esses aspectos, é crescente o requerimento de selos de certificação, por compradores, importadores, broker, traders e redes varejistas, que comprovem a qualidade e sanidade dos produtos alimentícios vis-à-vis a globalização dos mercados que possibilita o acesso a alimentos provenientes das mais diversas partes do mundo. É nesse contexto que emergem os padrões e os certificados, exigidos nas importações, que podem ser de natureza global ou privada. Como por exemplo: Boas práticas agrícolas (BPA) – padrão de regulamentação internacional cujo com o objetivo de reduzir riscos associados ao uso de pesticidas; Hazard analysis and critical control point (HACCP) – sistema de qualidade que objetiva detectar num processo produtivo os principais pontos de contaminação; Eure-Retailer Produce Working Group (EurepGap) - descreve os requisitos essenciais, de acordo com as BPA/GAP - Boas Práticas de Agricultura, padrões globais de segurança do alimento, preservação do meio ambiente e bem estar dos trabalhadores; Produção integrada de frutas (PIF) – sistema de produção baseado na sustentabilidade, aplicação de recursos naturais e regulação de mecanismos para substituição de insumos poluentes. Dessa feita, o presente trabalho suscita as questões relacionadas com a aplicação do PIF junto à produção do Açaí, visto a ampliação da aceitação desse produto nos mercados nacional e internacional, a compulsoriedade de adequação às normas, padrões e certificações

5 e a grande repercussão social dessa atividade, uma vez que o Estado do Pará é o maior produtor mundial dessa fruta, que segundo Santana (2006) gerou, no ano de 2004, o valor de R$ 317,83 milhões, exportou cerca de US$ 3,87 milhões, empregou diretamente 5.650 pessoas e ocupou em algumas fases da cultura (plantio ou manejo, tratos culturais, colheita e comercialização) 150 mil pessoas, envolvendo 45 mil famílias. Como a produção se distribui por três mesorregiões, foi desenvolvido um Índice de Desempenho Competitivo – IDC, a fim de hierarquizar os principais municípios produtores e melhorar os procedimentos de análise das questões apresentadas. 2 - METODOLOGIA 2.1 – Área de estudo e fonte de dados O Estado do Pará é o 2º. maior em área territorial, com 1.253.164,5 Km² que corresponde a 14,66% do território brasileiro. É constituído por 143 municípios distribuídos em 6 mesorregiões e 22 microrregiões homogêneas e possui pouco mais de seis milhões de habitantes. Reconhecidamente é o Estado maior produtor mundial de Açaí, com mais de um milhão de hectares de açaizeiros em área de várzea do estuário paraense, seu habitat natural. Os dados básicos utilizados nesse trabalho são oriundos de duas fontes secundárias: os correspondentes ao Açaí, série histórica 1990 a 2005, foram obtidos junto ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE/Produção Agrícola Municipal (Sistema SIDRA), no mês de maio de 2007, considerando-se apenas a série histórica compreendida no período de 1994 a 2005, a fim de evitar possíveis distorções por conta de mudanças no padrão monetário ocorridos no período anterior a 1994. As informações sobre o PIF foram cotejadas junto aos sites das organizações oficiais envolvidas diretamente com sua operacionalização.

2.2 – Referencial teórico e procedimentos analíticos O Marco Legal da Produção Integrada de Frutas do Brasil está fundado na Instrução Normativa nº 20 – Diretrizes Gerais e Normas Técnicas – PIF, de 27 de setembro de 2001, na Instrução Normativa MAPA/SARC nº 12 – Definições e conceitos de palavras ou expressões técnicas utilizadas nas DGPIF, de 29 de novembro de 2001, na Instrução Normativa nº 005 – Comissão Técnica – CTPIF, de 2 de maio de 2002 e na Portaria nº 144 – Regulamento de avaliação da conformidade para Processo da PIF – RAC, como principais elementos de seu arcabouço institucional. A Produção Integrada de Frutas é uma exigência dos mercados importadores, principalmente da Comunidade Européia, rigorosa em requisitos de qualidade e sustentabilidade, enfatizando a proteção do meio ambiente, segurança alimentar, condições de trabalho, saúde humana e viabilidade econômica. A Organização Internacional para Controle Biológico e Integrado contra os Animais e Plantas Nocivas (OILB) define a Produção Integrada como “o sistema de produção que gera alimentos e demais produtos de alta qualidade, mediante a aplicação de recursos naturais e regulação de mecanismos para a substituição de insumos poluentes e a garantia da sustentabilidade da produção agrícola; enfatiza o enfoque do sistema holístico, envolvendo a totalidade ambiental como unidade básica; o papel central do agro-ecossistema; o equilíbrio do ciclo de nutrientes; a preservação e o desenvolvimento da fertilidade do solo e a

6 diversidade ambiental como componentes essenciais; e métodos e técnicas biológico e químico cuidadosamente equilibrados, levando-se em conta a proteção ambiental, o retorno econômico e os requisitos sociais” (INMETRO, 2007). O modelo preconizado obedece a princípios, conceitos e normas técnicas contemplados nas Diretrizes Gerais para a Produção Integrada de Frutas - DGPIF, que serão adotadas por produtores e empacotadoras do segmento frutícola, por meio da livre adesão. Contempla as seguintes áreas temáticas: Capacitação de Recursos Humanos; Organização de Produtores; Recursos Naturais; Material Propagativo; Implantação de Pomares; Nutrição de Plantas; Manejo e Conservação do Solo; Recursos Hídricos e Irrigação;

Manejo da Parte Aérea; Proteção Integrada da Planta; Colheita e Pós-colheita; Análise de Resíduos; Processo de Empacotadoras; Sistema de Rastreabilidade e Cadernos de Campo; Assistência Técnica.

Mesmo assim, como observa Andrigueto (2004) os princípios básicos que regem a Produção Integrada de Frutas – PIF, estão amparados, principalmente, na elaboração e desenvolvimento de normas e orientações de comum acordo entre os agentes da pesquisa, ensino e desenvolvimento; extensão rural e assistência técnica; associações de produtores; base produtiva; e autoridades do país, por meio de um processo multidisciplinar, objetivando com isto, assegurar que a fruta produzida encontra-se em consonância com um sistema que garante que todos os procedimentos realizados estão em conformidade com a sistemática definida pelo Modelo de Avaliação da Conformidade adotado. A PIF teve início no Brasil no final dos anos de 1990 e hoje já é aplicada em 17 culturas, envolvendo 40 mil hectares (cerca de 1,8% do total da área ocupada com a fruticultura no Brasil). Em outubro de 2006 o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento – MAPA, através da Instrução Normativa nº 56, recomendou que as empresas que exportam frutas para a Europa, devem fazer adesão ao Sistema de Produção Integrada de Frutas – PIF. A PIF tem que ser vista de forma holística, com seus 04 pilares de sustentação (organização da base produtiva, sustentabilidade, monitoramento do sistema e informação) e os componentes que consolidam o processo, conforme a figura 1.

7 PRODUÇÃO INTEGRADA: VISÃO HOLÍSTICA Organização Manejo Integrado de Pragas

Monitoramento Ambiental Monitoramento do Sistema

Manejo Integrado de Nutrientes

Sustentabilidade

Manejo Integrado da Colheita e Pós-Colheita

Manejo Integrado Solo e Água Manejo Integrado de Cultura

Informação (Banco de Dados) “Aprender a trabalhar o sistema como um todo, minimizando efeitos antagônicos entre as práticas holística da PIF efetuadas”.

Mudança:

Figura 1 – Visão

Fonte: Andrigueto (2004)

JRA/ARK

O Açaí, designação do fruto da palmeira “açaizeiro”, originária da região do delta amazônico onde cresce abundantemente neste ecossistema de várzea, constitui-se há muito tempo uma fonte alimentar, tanto para os povos indígenas que juntamente com a caça, o peixe e a farinha de mandioca o consideravam como o principal meio de subsistência, quanto para a população ribeirinha e para alguns centros urbanos regionais, como Belém. Vários autores como Nascimento (1992) e Santana (2003; 2006) observam que o hábito alimentar de consumir o suco/vinho de açaí desencadeia uma atividade produtiva econômica e socialmente relevante na economia informal do estado do Pará, por ser responsável pela geração de um grande número de empregos informais diretos e ocupações produtivas indiretas, que se distribuem desde o espaço de localização dos plantios (extração do fruto, tratos culturais, etc.), da intermediação do transporte da produção até aos mercados, da comercialização dos frutos nas feiras, do transporte das feiras até os pontos comerciais do vinho, da produção e comercialização de produtos derivados pelas cooperativas e agroindústrias, até o consumidor final. Ademais, como mencionamos anteriormente (item 1, p. 6), Santana (2006) evidencia os valores da exportação de Açaí mostrando que a partir de 2004 esse produto alcançou a posição de principal fruta do Estado do Pará, em termos de renda, emprego e ocupação de mão-de-obra. Atualmente existem cerca de 40 agroindústrias operando no estado com o processamento dos frutos e estima-se que só na Região Metropolitana de Belém, o número de “batedeiras” de Açaí exceda há 3.200 no período de safra. O crescimento das exportações para vários estados das Regiões Sul, Sudeste e Nordeste do Brasil, assim como para os Estados Unidos, União Européia e Japão, vêm impulsionando a melhoria gradual no funcionamento da cadeia produtiva do Açaí que vai passando da comercialização de produtos in natura para produtos beneficiados, como polpas e produtos acabados como doces, geléias e bombons. O surgimento de novas agroindústrias propicia o aumento gradativo do elenco de produtos derivados do Açaí. A cadeia produtiva que está inserida no contexto do agribusiness é interpretada por Davis & Goldberg (1957), apud Batalha (1999), como o conjunto de todas as operações que englobam a produção e distribuição de insumos para a atividade rural, operações em nível da

8 propriedade rural, armazenamento, processamento e distribuição de produtos e subprodutos agrícolas, e é necessário estudá-la como um todo. Aduz ainda, o referido autor, que a Cadeia Produtiva (CP) é o conjunto de operações físicas e comerciais que envolve: (i) a fabricação e fornecimento de insumos e serviços (segmento antes da porteira ou a montante da produção): (ii) a produção nas unidades agropecuárias e florestais (dentro da porteira ou local de produção), e (iii) o processamento, armazenamento, embalagem, distribuição e consumo desses produtos (depois da porteira ou a jusante). Por conseguinte, a CP constitui-se em uma ferramenta de aplicação na análise e formulação de políticas, na descrição técnica e socioeconômica e na análise de estratégias das empresas, como é o caso da aplicação do PIF em sua adequação à cadeia produtiva do Açaí. Empregada como uma ferramenta privilegiada da Escola Francesa de Economia Industrial - analyse de filières, Morvan (1988), citado por Batalha (1999), enumerou três séries de elementos que estariam implicitamente ligados a uma visão de cadeia de produção: A cadeia de produção é uma sucessão de operações de transformação dissociáveis, capazes de ser separadas e ligadas entre si por um encadeamento técnico; A cadeia de produção é também um conjunto de relações comerciais e financeiras que estabelecem, entre outros, os estados de transformação e um fluxo de troca situado de montante a jusante, entre fornecedores e clientes; A cadeia de produção é um conjunto de ações econômicas que presidem à valorização dos meios de produção e asseguram a articulação das operações. A Figura 2 é ilustrativa da estruturação de uma cadeia produtiva, evidenciando o sentido dos fluxos de comunicação e apoio e o condicionamento funcional dos ambiente institucional e organizacional. Essa modelização, face algumas características peculiares do funcionamento da cadeia produtiva do Açaí, servirá de contraponto para o levantamento das questões relacionadas com a aplicação do PIF. Ambiente Institucional Cultura, Tradições, Educação, Costumes, Regras, Aparato Legal Comunicaçõ es Insumos

Produtor Rural

Produtos + Serviços Agroindústria

Indústria de Alimentos

Atacado

Pedidos + $

Varejo

Consumidor

Informaçõe s

Ambiente Organizacional Informação, Associação, P&D, Finanças, Serviços

Figura 2 – Arquétipo de uma cadeia produtiva1 Fonte – Os autores

De fato, como observado em SECTAM (200) e CEPAL/GTZ/FAO (1998) o comportamento atual e futuro dos componentes de uma cadeia produtiva, entendo as relações formais e informais entre eles, afetam o desempenho do conjunto e isso, em termos da PIF,

9 exige uma concertação em torno de uma comunidade de interesses e objetivos e uma efetiva governança que garanta o atendimento às conformidades do programa. Os procedimentos de tratamento dos dados referentes ao Açaí seguem a análise fatorial - técnicas de análise de fator e componentes principais, a fim de avaliar quais dos municípios paraenses são mais expressivos na formação dos fatores estudados e, a partir dos quais se calcular o IDC. 2.2.1 Análise de Fator Os modelos fatoriais procuram explicar o comportamento das variáveis observadas em função do comportamento de um conjunto de variáveis não observadas (MARDIA, 1979; REIS, 2001; SEBER, 1984; BARROSO & ARTES, 2003). Assim, o modelo pode ser T expresso como a seguir. Considere-se X  X 1 ,..., X p  , o vetor de variáveis observadas e E(x) = µ = (µ1 ,…, µp)T, o vetor das médias de X. Então um modelo para a análise fatorial pode ser expresso da seguinte forma: X1 - µ1 = 11F1 + … + 1m Fm+1 X2 - µ2 = 21F1 + … + 2m Fm+2 . . . . . . Xp - µp = p1F1 + … + pmFm+p

(1)

Onde: F1, ..., Fp são os fatores comuns. 1, ..., p são os fatores específicos. ij, i = 1, …, p e j = 1, …, m são as cargas fatoriais. Em termos matriciais tem-se que X    f   ,  11 12  1m    T T f  ( F1 ,..., Fm ) ,   ( 1 ,...,  p )  21 22  2 m  com e   



   p2  p1

     pm 

(2)

No modelo usual de análise fatorial ortogonal, são feitas as seguintes suposições sobre f: E( Fi ) = 0 e Var(Fi) = 1, i = 1,...,m. Além do mais, num modelo ortogonal admite-se que: a) Cov(f) = Im, onde Im é a matriz identidade de ordem m, b) E() = 0, c) Cov() =  = diag{ 1,..., 1}, d) Cov(f ; ) = 0. 2.2.2 Análise de componentes principais O objetivo principal do método é transformar um grupo de variáveis X 1, X2,..., Xp (pdimensional) correlacionadas em um novo grupo de variáveis não correlacionadas, digamos, Y1,Y2,...,Yp, para melhor entender suas características. Essas novas variáveis são combinações lineares das variáveis originais e são derivadas em ordem decrescente de importância, tal que, o primeiro Componente Principal explica a maior variação possível dos dados originais. Pode-se dizer também que a transformação acima constitui uma rotação ortogonal, isto é, as distâncias no espaço p-dimensional são preservadas.

10 Algebricamente, o primeiro componente é uma combinação linear das X 1, X2,...,Xp, isto é: Y1 = a11X1 + a12X2 + ... +a1pXp. (3) Da mesma forma que o primeiro, os demais componentes Y2, y3,..., Yp, podem ser representados através de combinações lineares das variáveis originais. A derivação dos componentes não requer qualquer suposição sobre as variáveis, exceto, que sejam expressas numa mesma unidade. A única exigência que o método faz é quanto a existência do vetor médio () e da matriz de covariância (). Suponhamos que XT = [ X1, X2,...,Xp], é um variável aleatória de dimensão p com média  e matriz de covariância . Como já foi citado, o propósito do método é encontrar variáveis, digamos, Y1, Y2,...,Yp, cujas variâncias decrescem da primeira à última. Cada Y j, passa a ser uma combinação linear dos X's, tal que Yj = a1jX1 + a2jX2 + ... + apjXp = aTjX (4) T Onde a j= [ a1j, a2j,...,apj] é um vetor de constantes denominado de vetor latente ou simplesmente autovetor. A equação acima contém um fator de ponderação arbitrário e, por essa razão, deve-se impor a condição de que aTjaj =a2kj = 1. Esse processo de normalização assegura que as transformações sejam ortogonais, ou seja, que as distâncias no p-espaço sejam preservadas (RESIS, 2001; CHATFIELD, 1997; DUNTEMAN, 1986). 2.2.3 Índice de Desenvolvimento Competitivo – IDC O Índice de Desenvolvimento Competitivo - (IDC), proposto do por Santana (2005), é definido como uma combinação linear dos escores fatoriais e a proporção da variância explicada por cada fator em relação à variância comum. A expressão matemática é dada por: p    j IDCi    FPij  ,   j 1    j 

em que  é a variância explicada por cada fator e

(5)



é a soma total da variância explicada

pelo conjunto de fatores comuns. Os escores foram padronizados para se obter valores positivos dos escores originais e permitir a hierarquização dos municípios, uma vez que os  F  Fmin   , valores do IDC situam-se entre Zero e 1. A normalização é feita através FPi   i  Fmax  Fmin  onde Fmin e Fmax são os valores mínimos e máximos observados para os escores fatoriais associados aos municípios. Valores do IDC  0,70 são considerados altos, valores entre 0,35 e 0,69 são intermediários e valores menores que 0,35 são considerados baixos.

11 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO A produção de açaí no Estado do Pará, referente ao período de 1990 a 2005 foi responsável por cerca de 92,54% da produção nacional, considerando-se tanto a produção extrativa quanto a manejada, o que atesta ser o Estado do Pará o seu principal produtor. A produção do fruto de açaí foi de 1.692.685 toneladas, concentradas basicamente em três mesorregiões como mostra a Figura 3. Mesmo com a forte demanda pelos frutos do açaí propriamente dito e seus derivados, a produção estadual vem declinando nestes últimos anos e caso se mantenha essa tendência de queda, pode ocorrer comprometimento da oferta do produto nos próximos anos (Figura 4). 67,03% 70,00 60,00 50,00 40,00

19,43%

30,00 20,00

9,16%

4,38%

10,00 0,00 Nordeste

Marajó

Metrop.

Dem ais m eso

Figura 3: Mesorregiões produtoras de açaí – Pará – 1990/2005 Fonte: Elaborado pelos autores a partir de dados do SIDRA/IBGE

160000

Produção de açaí(t)

140000 120000 100000 80000 60000 40000 20000

2005

2004

2003

2002

2001

2000

1999

1998

1997

1996

1995

1994

1993

1992

1991

1990

0

Anos

Figura 4: Evolução da produção de açaí no Estado do Pará – 1990/2005 Fonte: Elaborado pelos autores a partir de dados do SIDRA/IBGE

Além disso, essa tendência pode indicar uma intensificação no esforço de extração do Açaí nativo e gerar não conformidades com o que preceitua as Diretrizes Gerais para a PIF, particularmente às ligadas aos Recursos Naturais, Nutrição de Planta e Manejo e Conservação de Solo. A criação de um ranking dos municípios produtores de Açaí - Tabela 1, mostra os 15 maiores produtores de açaí do Estado do Pará em função da quantidade produzida. Note-se

12 que nestes municípios está concentrada mais de 90% da produção de açaí no Estado, sendo portanto os alvos principais de ações de conscientização básica, para a implantação da PIF.

Tabela 1 - Produção acumulada de açaí, segundo os municípios e participação no Estado, acima de 1% - 1990 a 2005. ORDEM Municípios QP % 1 Cametá 400458 23,66 2 Limoeiro do Ajuru 290656 17,17 3 Ponta de Pedras 244008 14,41 4 Igarapé-Miri 112780 6,66 5 Abaetetuba 108760 6,42 6 Mocajuba 77861 4,60 7 Muaná 57145 3,38 8 Barcarena 56560 3,34 9 São Sebastião da Boa Vista 42373 2,50 10 Oeiras do Pará 41254 2,44 11 São Miguel do Guamá 33899 2,00 12 Cachoeira do Arari 32143 1,90 13 Afuá 28718 1,70 14 São João da Ponta 20861 1,23 15 Magalhães Barata 19083 1,13 TOTAL 92,54 Fonte: Elaborado pelos autores a partir de dados do SIDRA/IBGE

Para as variáveis quantidade produzida (QP), valor da produção (VP) e PIB, trabalhadas conjuntamente através das técnicas multivariadas, os resultados mostraram ser pertinente o emprego da análise de fator aos dados, visto que o Teste KMO (Kaiser-MeyerOlkin Measure of Sampling Adequacy) apresentou um valor em torno de 0,5 e o Teste de esfericidade de Bartlett's (Test of Sphericity) um valor qui-quadrado (  32  298,054 ) altamente significativo. Os resultados mostraram ainda, utilizando-se o critério de Kaiser (≥1), que apenas o fator 1 é suficiente para representar o grupo de dados (Tabela 2). Note-se que somente esse fator responde por aproximadamente 66% da variação total dos dados. Por outro lado, se não tivesse sido utilizado o critério de Kaiser e fossem tomados os fatores com as maiores variações, o primeiro e o segundo fatores responderiam por 99,137% da variação total dos dados. Tabela 2 - Solução inicial e rotacionada para os três fatores Solução inicial Solução rotacionada Componentes Total % VAR Total % VAR 1 1,977 65,915 1,977 65,915 2 ,997 33,222 3 2,589E-02 ,863

13 Método de Extração: Componentes Principais

Outro aspecto de extrema importância diz respeito ao fato do fator 1, em termos de serem as variáveis com os maiores pesos no fator – quantidade produzida (QP) de açaí e o valor da produção (QP) o que sugere que tal fator pode ser nominado como um fator ligado à produção e comercialização do açaí no Estado do Pará, ou seja, Y1  0,992 QP 0,993 VP  0,083 PB . Observe-se que o PIB além de ser numericamente inexpressivo diante das outras variáveis, caminha no sentido oposto das mesmas, indicando de certa forma que o PIB dos municípios ainda é pouco influenciado pela produção e comercialização do açaí nos municípios avaliados. A Tabela 3 mostra as cargas fatoriais e o ranking dos 20 primeiros municípios que estão atrelados à produção e comercialização do açaí e do PIB. Assim, pode-se inferir a ocorrência de manifestação de desinteresse no ambiente institucional, reconhecidamente marcado por um conjunto de regras e valores individualistas e alheias à problemática do desenvolvimento rural, visto que do ponto de vista formal a produção e comercialização do açaí internaliza um nível muito pequeno de renda nos municípos, visto que o processo de transformação ocorre geralmente fora do município. Ademais, como analisa Santana (2003) a margem total de comercialização do Açaí é extremamente elevada, situando-se em torno de 85,71% e isso significa que de cada R$100,00 gastos pelo consumidor final apenas R$14,29 ficam com o produtor da matéria prima. Note-se que dos municípios produtores de açaí do Estado do Pará, nenhum apresentou um alto grau de competitividade no que diz respeito à produção e comercialização do açaí (município com IDC ≥ 0,7) no estado. Apenas os municípios de Cametá e Limoeiro do Ajuru apresentaram IDC intermediário. Os demais, mesmo os que apresentaram IDC acima do IDC médio, situam-se muito aquém desse padrão de competitividade e reforça a tese de que o setor ainda não atingiu um nível de especialidade que possa garantir essa competitividade.

Tabela 3: Escores fatores e ranking dos municípios produtores de açaí – Pará – 2004 ESCORES ESCORES FATORIAIS NORMAL. RANKING MUNICÍPIOS F1 F1 Ord. MUNICÍPIOS IDC Abaetetuba 1,54 0,265 1 Cametá 0,659 Acará -0,27 0,020 2 Limoeiro do Ajuru 0,555 Afuá 0,42 0,113 3 Ponta de Pedras 0,227 Alenquer -0,28 0,018 4 Igarapé-Miri 0,198 Almeirim -0,34 0,010 5 Abaetetuba 0,175 Altamira -0,21 0,027 6 Mocajuba 0,150 Anajás -0,19 0,030 7 Muaná 0,114 Ananindeua -0,27 0,020 8 Oeiras do Pará 0,108 9 São Sebastião da B. Anapu -0,35 0,009 Vista 0,088 Augusto Corrêa -0,27 0,019 10 Afuá 0,075 Aurora do Pará -0,28 0,018 11 Barcarena 0,070 Aveiro -0,27 0,019 12 Cachoeira do Piria 0,068 Bagre -0,27 0,020 13 São Miguel do Guamá 0,054

14 Baião Barcarena Belém

-0,01 0,37 -0,17

0,055 0,106 0,032

Belterra Benevides Bonito Bragança

-0,31 -0,28 -0,28 -0,27

0,015 0,019 0,019 0,019

14 15 16 17 18 19 20

São João da Ponta Magalhães Barata Baião São Domingos do Capim Inhangapi Marapanim Curralinho

0,050 0,045 0,036 0,033 0,030 0,025 0,023 0,037

Fonte: Elaborado pelos autores a partir de dados do SIDRA/IBGE

Num quadro como esse é de se esperar encontrar dificuldades para a implantação da PIF, pois não teríamos um município com perfil capaz de liderar o processo e servir de efeito emulativo para os demais. Na verdade, a grande dispersão de unidades produtoras pelos municípios paraenses poderá dificultar o cumprimento de alguns pré-requisitos para a implantação da PIF, como por exemplo: (i) localização – cujo procedimento visa identificar, definir e selecionar um local, sua adequação edafo-climática e as condições do ecossistema, e (ii) organização – que mobiliza, identifica e treina lideranças a fim de organizar um núcleo de massa crítica, compreendendo a configuração da motivação institucional, caracterização e diagnose da base produtiva e o estabelecimento de linhas de ação estratégica e operacional para viabilização da PIF, dentre outros.

4 – CONCLUSÕES De uma maneira geral, pode-se inferir que está em curso um rol de transformações na a agricultura no Estado do Pará que podem indicar o avanço da especialização e a integração da produção ao mercado. Não obstante, vive-se num ambiente institucional débil e de grandes assimetrias de interesses vis-à-vis o conjunto de ações que são requeridas no processo de desenvolvimento rural. A maioria das cadeias produtivas, a exemplo da cadeia do Açaí que além de envolver um expressivo contingente da população tem a sua base produtiva assentada, segundo a caracterização de Conway (1987), em agroecossistemas de baixos níveis de in puts e de grau de equanimidade, é incompleta e/ou mal estruturada e não se observa a manifestação de uma vontade substitutiva que seja capaz de mobilizar os milhares de atores envolvidos com o “negócio” Açaí, muitos dos quais se encontram desprezados e dispersados como é o caso dos extrativistas ribeirinhos que colhem os frutos do Açaí. A PIF, como o primeiro selo brasileiro que normatiza a certificação dos sistemas de produção frutícola, diferenciando-os e ampliando a sua inserção no mercado mundial, já atua em 17 diferentes cultura, mas nenhuma delas com as especificidades assemelhadas às da produção do Açaí, face à dispersão dos cultivos, as condições edafoclimáticas dos múltiplos ecossistemas, o número de atores envolvidos e o baixo grau de instrução formal, a cadeia de intermediação, a perecibilidade do produto e o arraigamento aos aspectos culturais que condicionam a assimilação de iniciativas inovadoras, dentre outras.

15 Desse modo, as conclusões buscam suscitar algumas questões que podem ser tratadas como ameaças ou como oportunidades para o desempenho competitivo do agronegócio do Açaí no Estado do Pará, e são as seguintes: A recorrência de contaminação por coliformes fecais ou por Trypanosoma cruzi, pode destruir o mercado externo do Açaí e gerar altos custos de transação em toda a cadeia com perdas socioeconômicas significativas; O fato do PIB se apresentar com o sinal negativo na equação estimada, pode indicar a precarização dos empregos gerados nessa atividade (informalidade, mão-de-obra infantil e trabalho da mulher não remunerados) que estão em desacordo com as barreiras técnicas constantes do EurepGap (UE), do APHIS (EU) e do PIF (BR), exigindo um grande esforço de políticas públicas sociais de longo prazo; A intensificação do esforço de extração fragiliza os agrecossistemas impingindo-lhes baixa estabilidade o que compromete a sua sustentabilidade; A apropriação das margens de comercialização, bem como do valor adicionado pós industrialização, conferem um baixíssimo grau de equanimidade nos agroecossistemas, o que passa a exigir um enorme esforço de organização da base produtora, a interiorização para os município da agroindustrialização e a criação de um número significativo de mecanismos de gestão regionalizada, dessa base, sob o regime da PIF; O PIF representa a necessidade compulsória de incorporação de inovações tecnológicas ao longo da cadeia produtiva (CP) e isso poderá resultar em rupturas que afetarão não só o desempenho da CP, mas, sobretudo, em exclusão de atores e de elos fracos, como os agricultores familiares e os extrativistas ribeirinhos; Tais rupturas podem decorrer da necessidade das firmas agroindustrializadoras verticalizarem o processo de produção e/ou se integrarem para trás, a fim de garantir a execução do PIF, sobretudo a rastreabilidade; Inserida na indústria de alimentos, a produção de açaí decorre de inúmeros processos que alteram física e quimicamente o produto natural, o que exige rigoroso controle, evidenciando que tanto os elos da cadeia produtiva quanto os ambientes organizacional e institucional, devem aprender, com o mínimo de tolerância ao erro, quais os pré-requisitos, da matéria-prima à mesa do consumidor final, a fim de cumprir com a PIF; Em face da dispersão da produção e heterogeneidade entre os elos da CP do Açaí (proprietários de áreas de várzeas, extrativistas posseiros, meeiros, arrendatários, atravessadores, “aviadores”, barqueiros, atacadistas igualizadores, varejistas, agroindústrias, transportadores, importadores, broker, traders, dentre outros), com níveis tecnológicos e culturais diferentes, os custos para viabilizar o rastreamento serão de grande monta e envolverão processos logísticos, ativos dedicados e inovações organizacionais entre segmentos distintos, imprescindindo de instrumentos institucionais para sua efetivação; Essa dispersão implica na produção de um produto genérico – AÇAÍ – sem marca, sem se constituir em um ativo valioso e que dificulta o rastreamento; A criação de marcas (açaí Pará; açaí-marajoara; açaí das ilhas), em diferentes modalidades, que facilitará o rastreamento, poderá ser um ativo valioso que necessitará ser resguardado por todos os envolvidos na CP; O “negócio Açaí” por estar assentado em vantagens relativas (abundância de matériaprima; abundância de mão-de-obra e localização geográfica estratégica), configura-se na panacéia para a endêmica falta de emprego e de renda; uma armadilha que fará

16 sucumbir esperanças, caso um conjunto de políticas públicas e setoriais não desenvolvam vantagens competitivas sustentáveis. Por fim, ao se reconhecer por um lado a expansão do mercado do Açaí e por outro os pré-requisitos de segurança desse alimento, concluímos que os “certificados” são positivos; nesse caso O PIF. No entanto, ao se constituírem em barreiras à entrada (saída) de produtos “não conformes” propiciam a que produtores sem poder de agency e com baixa capacidade tecnológica, organizacional e financeira, passem a ser uma franja residual sem inserção em cadeias produtivas de âmbito nacional e/ou global. Essa parece ser uma situação anunciada que merece ser considerada a fim de não favorecer a transformações das oportunidades em ameaças.

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