Públicos de cinema: do sofá para a sala.pdf

May 24, 2017 | Autor: Carla Simões | Categoria: European Cinema, Literature and cinema, Cinema Studies, Cinema and Television
Share Embed


Descrição do Produto

Mestrado em Empreendedorismo e Estudos da Cultura Recepção, Fruição e Públicos da Cultura

Públicos de cinema: do sofá para a sala. As trincheiras do filme “de autor” e “comercial” e as diferentes formas de sentar numa sala de cinema. Reflexão e contributos para uma missão quase (im)possível

Carla Alexandra Neves Simões

Orientação Professor José Soares Neves

Janeiro, 2015

ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO: Uma problemática e um programa de acção

2

2. PÚBLICOS “APOCALÍPTICOS” e “INTEGRADOS”

5

3. PÚBLICOS “PUROS” e “BÁRBAROS”

9

4. PROGRAMAÇÃO E SALAS DE CINEMA: Uma oferta desigual

13

5. METODOLOGIA

15

6. BIBLIOGRAFIA

16

7. ANEXOS: 7.1 ANEXO I - Tabela: Cinema: recintos, ecrãs, sessões e espectadores (1960-2013) PORDATA. 7.2 ANEXO II - Filmes Estreados / Exibidos por Distribuidor (Newsletter ICA, Dez. 2014) 7.3 ANEXO III - Tabela de Classificação de Distribuidores 7.4 ANEXO IV - Modelo de Questionário 7.5 ANEXO V - Guião de Entrevista

2

1. INTRODUÇÃO: Uma problemática e um programa de acção O cinema foi e é a arte popular por excelência. Aquela que liga de forma uterina a arte ao consumo da arte. Não se faz, nem nunca se fez para a gaveta. É uma actividade demasiado cara para servir apenas as necessidades estéticas e o deleite privado do autor ou para mostrar aos amigos em serões cinéfilos. Fez-se primeiro para o grande público e foi durante a primeira metade do séc. XX uma arte popular. Encheu salas e fez parte dos rituais nocturnos de muita gente, em muitas geografias. Nascido na era da reprodutibilidade técnica, o cinema está indissociavelmente ligado a condições de produção industrial e a elevados custos de realização que impõem rendibilidade. O cinema faz-se para as pessoas e precisa delas para subsistir. O cinema também é como diria

Jacques Rancière 1, em

adaptação livre, o lugar que liga o culto da arte à democracia dos divertimentos e das emoções. O cinema expande consciências e o cinema diverte. É, por conseguinte, um lugar charneira de arte e indústria, de cinefilia e entretenimento e é exactamente no cruzamento dessas abordagens nem sempre dialogantes que me interessa reflectir sobre o cinema e os seus públicos na actualidade em Portugal. Enquanto ritual de sala, o cinema é uma actividade em perda desde a década de 80. Com excepção da segunda metade da década de 90 e os primeiros anos do novo século 2, o cinema perde público (- 36% entre 2001 e 2013) e salas3. Depois da paulatina erosão nos hábitos de frequência de sala criada pela televisão, primeiro nos locais públicos e depois nas nossas casas, a partir da segunda metade da década de 50, recentemente são as novas modalidades de consumo doméstico 4 que concorrem para reter no sofá o antigo público de sala. A questão que coloco, é se será ainda possível contrariar esta tendência e recuperar algum público para as salas, e qual será o segmento mais susceptível a esse movimento, e em que condições. O público de cinema não é uma entidade homogénea, aliás, tal como não o é o próprio cinema, um híbrido de arte e indústria, que transita num contínuum entre o produto artístico tout cour e o puro entretenimento. Julgo, portanto, pertinente pensá-lo através das categorias tipo de público de filme de autor e de filme comercial, tomadas de empréstimo por homologia ao campo da produção.

1 Rancière, Jacques (2012), Os Intervalos do Cinema, Lisboa, Orfeu Negro. 2 Entre 1996 e 2001 ocorreu uma recuperação da frequência de sala, associada à reconfiguração do parque de cinemas e à abertura de recintos multiplex em centros comerciais. 3 Anexo I - Cinema: recintos, ecrãs, sessões e espectadores (1960-2013) PORDATA. 4 A partir dos primeiros anos do novo milénio multiplicam-se as modalidades de consumo doméstico de cinema: oferta variada de canais cabo, dispositivos de visionamento de televisão em diferido e à la carte, vídeo on demand, e acesso a novos meios digitais: banda larga e facilidade de downloads para computador, tablet e telemóvel.

3

Será, ainda, possível transformar público de sofá em público de sala? Para responder à questão que me interpela e que motiva a presente reflexão, entendo necessário validar teoricamente e operativizar as categorias tipo seleccionadas, isolar os valores que as enformam bem como as representações sobre o cinema que lhes estão associadas, retirar dai tendências de consumo, confrontá-las com a oferta actual em termos de programação e tipo de salas, captar eventuais desajustes entre a oferta e a procura (potencial) e perceber oportunidades a explorar. Procurando situar a minha proposta na área de análise desta unidade curricular, julgo que se enquadra sobretudo no campo da reflexão sobre formação de públicos, a partir daquilo que António Firmino da Costa define como “análise dos modos de relação das pessoas com as artes e a cultura enquanto esferas institucionais especializadas” (Costa, 2004). O que proponho não é uma abordagem sobre públicos no sentido sociográfico, nem sobre recepção, na acepção clássica da relação do individuo com a obra.

Não me interessa prioritariamente saber quem são as pessoas que vêem

cinema no sofá em termos de idade, sexo, qualificação ou categoria sócio profissional, nem tão pouco abordar o trabalho de co-produção de sentido na sua relação com os filmes. Interessa-me, sim, perceber se diferentes representações e valorações simbólicas sobre o cinema determinam diferentes formas de sentar numa sala de cinema, diferentes protocolos de consumo em sala e por conseguinte diferentes salas. Partindo da hipótese de que o público mais permeável a ser (re)conquistado para a sala será sobretudo aquele que se situa tendencialmente no polo do cinema de autor (gosto distintivo – Pierre Bourdieu), onde a oferta disponível é claramente mais escassa, não só em termos de programação, como em termos de salas atractivas para este tipo de público, que suspeito avesso ao “cinema shopping”. Este não é seguramente um programa de investigação compaginável com dez páginas de texto, pelo que o guardarei para uma eventual futura tese, procurando aqui fazer apenas uma reflexão planante e um esboço de algumas linhas de análise. Assim, procurei dar enquadramento e solidez analítica às categorias tipo que tomo de empréstimo aos contributos de quem faz e pensa o cinema, a partir de duas entradas teóricas, que obviamente estão longe de fechar o campo, mas que seguramente o integram e abrem pistas para outras abordagens e autores. O cinema, as suas formas de produção e consumo actuais, polarizadas entre a ideia de arte e industria, são herdeiros do histórico, mas ainda muito actual, debate entre detractores e defensores da cultura de massas, pelo que os procurarei pensar à luz dos contributos integradores de Umberto Eco, das

posições críticas

de Theodor Adorno, autor paradigmático do pensamento crítico, e de

apologistas como Walter Benjamin. Uma segunda linha de análise é a teoria dos campos de Pierre Bourdieu, que permitirá perceber a posição hierárquica destas duas categorias no campo cinematográfico e o seu potencial de distinção e analisá-las a partir de conceitos como gosto “puro” ou “bárbaro”, ou modos legítimos e ilegítimos de produção e recepção cultural. Confrontando ainda a sua perpectiva de distinção por

4

gosto unívoco com outras mais actuais como a de Peterson e Kern que têm detectado a partir dos anos oitenta outras estratégias de distinção da classe dominante, desta vez por gosto omnívoro. Para analisar os eventuais desencontros entre as tendências de consumo em sala e a oferta actualmente disponível será feito um breve retrato sobre frequência de cinema nos últimos anos, tipo de oferta cinematográfica e tipo de salas disponíveis. Por fim e antecipando um desenho de pesquisa, proponho um modelo metodológico e um desenho dos seus instrumentos.

2. PÚBLICOS “APOCALÍPTICOS” e “INTEGRADOS” "O cinema e a rádio não necessitam já oferecer-se como arte. A verdade de que não são senão negócio serve-lhes como ideologia que deve legitimar a porcaria que produzem deliberadamente. Auto-definem-se como indústrias". Theodor Adorno no texto "A Indústria da Cultura" 5(Adorno,1947 apud Nogueira,1998:1) As clivagens entre o cinema de autor e o cinema comercial são devedoras do conflito histórico em torno dos conceitos de arte e indústria, na era dos meios de comunicação de massas e da reprodutibilidade técnica. Sendo certo que para Theodor Adorno, um dos expoentes da “teoria crítica” da Escola de Frankfurt, o cinema não é sequer arte,6 a matriz diferenciadora que estabelece entre o produto de alta e de baixa cultura é a matriz de opostos que separa na actualidade o cinema de autor do cinema de entretenimento. Vituperado nos anos 30 como mero negócio, o cinema integrou no seu seio a dialética da arte e da indústria, quer no campo da produção quer entre os seus públicos. De um lado, a cultura autêntica, autónoma e criativa, do outro o subproduto mercantil. Os diferendos ideológicos em torno da indústria da cultura e da cultura de massas, que marcaram quase todo o sec. XX e que ainda perduram sob formas mitigadas, fazem-se basicamente em torno de quatro pares de opostos7: 1) Cultura autêntica, ascética, auto-determinada, criativa e vanguardista versus cultura de massas, hetero-determinada, mercantil e conservadora. 2) Elitismo, modelo de cultura aristocrático versus democratização da cultura. 3) Reprodutibilidade técnica ao serviço do poder económico e político versus reprodutibilidade técnica ao serviço da participação democrática e de movimentos contra-hegemónicos. 4) Receptor-consumidor passivo, manipulado pela lógica mercantil capitalista versus receptorprodutor emancipado capaz de reacção contra-hegemónica.

5 Adorno,Theodor e Max Horkeimer, Dialética do Esclarecimento (ou do Iluminismo conforme as traduções), 1947.

6 Em 1966, no texto “ Transparências sobre cinema”(Adorno, 2003) o autor revê esta posição e reconhece no Novo Cinema Alemão uma marca autoral que o distingue do cinema alemão de matriz hollywoodiana. 7 As ideias contidas em cada par de opostos não são neutras, alguns enunciados refletem as representações recíprocas negativas de cada uma das partes da contenda.

5

Quase todo o programa da reflexão conflitual em torno da cultura de massas e da indústria da cultura, sobretudo no eixo dominação/emancipação do receptor pode ser colhido em textos históricos de Theodor Adorno e de Walter Benjamin, como “A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica”, “ O autor como produtor”, “ Sobre o carácter fetichista na música e a regressão da audição” e “Indústria da Cultura”.8 . Para Benjamin, a reprodução técnica abre uma nova era no mundo das artes e há que aceitá-la em todas as suas consequências Perde-se a aura estética associada à originalidade da obra de arte, perde-se, aliás, a própria noção de original. A lógica do novo modelo é a da reprodução sem original, mas as infinitas possibilidades de comunicação geradas pela reprodutibilidade

abrem também

possibilidades ilimitadas de democratização e de comunicação e permitem reconquistar para a arte o sentido colectivo. Benjamin acredita no poder emancipador da nova arte e vê nela uma arma contra a estetização da política levada a cabo pelo nazismo. Nos antípodas deste optimismo, Adorno considera a cultura de massas, já patente na Alemanha dos anos vinte, um sintoma da deriva autoritária que culminaria no nazismo. Para a teoria crítica da escola de Frankfurt a ditadura política forma-se no caldo do falso consenso social e da falsa participação popular gerada pela Indústria da Cultura - o novo ópio do povo. Para Adorno e para a grande maioria dos detratores da cultura de massas, esta não é uma forma moderna de cultura popular, emanada de baixo, do cidadão comum na sua dupla condição de receptor-produtor, mas um produto dissimulado do poder capitalista. A indústria da cultura, conceito que Adorno prefere ao de cultura de massas, exactamente por este último conter em si o equívoco da produção popular, não permite qualquer possibilidade de reacção dentro do sistema. E esse totalitarismo é absoluto, não admite reacção do receptor e da massa acrítica, nem admite a dissidência interna dos agentes de produção. Todo o esforço anti-sistema, segundo Adorno, será integrado e rentabilizado por este. Sendo o autor um pensador de influência marxista é curioso verificar que não admite dialética de opostos na indústria da cultura. A única reacção possível situase fora do sistema, e Adorno encontra-a na arte auto-referencial do modernismo, aquela que vive fora de qualquer pacto, seja com o sistema económico, seja com o público. Mais tarde, nos anos 60, Umberto Eco faz uma recensão crítica brilhante dos argumentos que alimentaram ao longo do tempo a discussão entre os detractores e os apologistas da indústria e cultura de massas, tratando-os ironicamente por apocalípticos e integrados. Estes epítetos caricaturais serviram para tipificar ao extremo as posições em jogo: de um lado os que viam a cultura de massa como anticultura, um abastardamento da verdadeira cultura de matriz aristocrática, do outro os que viam nesse fenómeno a democratização da cultura e a circulação irrestrita da arte e da cultura popular. De um lado, o pessimismo militante, do outro o optimismo cândido.

8 “A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica”(Benjamin:1936:1992); “O autor como produtor”(Benjamin,1934:1992), “Sobre o carácter fetichista na música e a regressão da audição”(Adorno;1938:2003); “Indústria da Cultura” (capítulo do livro Dialética do Esclarecimento (Iluminismo) escrito por Theodor Adorno e Max Horkheimer em 1944, publicado em 1947 apud António Sousa Ribeiro (in Prefácio) Adorno:2003).

6

Eco clarifica a discussão, desmontando os equívocos e as agendas escondidas que pontificam, em ambos os lados da contenda, elenca as posições razoáveis e propõe um caminho integrador. Aos apocalípticos aponta “a desconfiança ante o igualitarismo, a ascensão democrática das multidões, o discurso feito pelos fracos para os fracos, o universo construído não segundo as medidas do superhomem, mas do homem comum.”9 Segundo Eco, a intolerância alimentada por este campo face à cultura de massas radica num preconceito aristocrático que aponta mais contra as massas e menos aos produtos da dita cultura de massas, que, aliás, mal conhece. O discurso crítico trabalha sobre um ressentimento e sobre a “nostalgia de uma época em que as valores da cultura eram um apanágio de classe e não estavam postos, indiscriminadamente, à disposição de todos” 10 . Na defesa da cultura de massas, Eco encontra falta de sentido crítico e ingenuidade

e, não

raro também, interesses inconfessados no sistema de produção. O discurso elide por completo, por inconsciência ou interesse, o facto da cultura de massas ser na sua grande maioria produzida por grupos económicos a quem interessa muito mais vender e induzir o desejo de consumo do que oferecer um produto verdadeiramente cultural. A salvo desses vícios, considera as abordagens de autores como: Gilber Seldes, Daniel Bell, Edward Shils, Eric Larrabee, Georges Friedmann. São suas as proposições que Eco nomeia como atendíveis no campo dos apologistas e que enumero em versão sumária: a) A cultura de massas não é típica de um regime capitalista, mas de uma sociedade industrial. Nasce numa sociedade em que todos os cidadãos participam, com direitos iguais, na vida pública, nos consumos e na fruição das comunicações. b) A cultura de massas não tomou o lugar da cultura superior, simplesmente difundiu-se junto de pessoas que nunca antes tiveram acesso aos bens da cultura. c) Os mass media propõem informação em fluxo contínuo, onde, muitas vezes, não se distingue o dado válido do de pura curiosidade ou de entretenimento, mas esse acumulo resolve-se em muitos casos em formação efectiva. d) À objeção de que a cultura de massa difunde produtos de entretenimento pouco dignos replica-se que desde sempre as multidões gostaram de circo. e) A homogeneização do gosto contribuiria para eliminar diferenças de casta, permitiria unificar as sensibilidades nacionais e accionar reacções anticolonialistas em muitas partes da globo. f ) A divulgação dos conceitos sob a forma de digest e a "revolução dos paperbacks"11 funcionou como estímulo cultural.

9 (Eco,1991(1964):36) 10 (Eco,1991(1964):36) 11 Difusão em massa de obras culturais canónicas a preços muito baixos e em edição integral.

7

g) Os meios de massa não são estilística e culturalmente conservadores. Ao criarem um conjunto de novas linguagens (novas gramáticas do cinema, a transmissão em directo ou a BD) introduzem necessariamente novos modos de falar, novos estilos e novos esquemas perceptivos. Do argumentário dos Apocalípicos, Eco retém como válidas as seguintes "peças de acusação": a) Os mass media dirigem-se a um público heterogéneo e nivelam-no por baixo segundo "médias de gosto", evitando soluções originais. b) Difundem à escala mundial uma "cultura" de tipo "homogéneo", destruindo as diferenças culturais de cada grupo étnico. c) Dirigem-se a um público inconsciente da dominação cultural a que é sujeito, portanto incapaz de reagir em igualdade de forças. d) Tendem a seguir o gosto existente ou consagrado, não promovendo rupturas nem renovações de sensibilidade. Mesmo quando parecem inovar, resumem-se à divulgação de modelos já há muito tempo difundidos no nível da cultura superior. e) Apelam à adesão emocional e às emoções vivas e não mediadas. f) Sujeitos à lei de mercado, oferecem ao público aquilo que ele quer ver ou pior, através dos mecanismos de sedução da publicidade, oferecem ao público aquilo que querem que veja. g) Os produtos da cultura superior só passam nos mass media em formatos digest para não implicarem esforço. h) Difundem informação em fluxo continuo sobre o presente e bloqueiam a consciência histórica. Encorajam uma visão passiva e acrítica do mundo. i) Vocacionados para o entretenimento e o lazer requerem apenas um nível superficial de atenção, criando inapetência para a concentração. j) Tendem a impor estereótipos e convidam ao conformismo no campo dos costumes, dos valores culturais, dos princípios sociais e religiosos e das tendências políticas. l) Na aparência livres e democráticos, os mass media são uma típica superestrutura de um regime capitalista, usada para fins de controlo e manipulação das consciências. Esgrimidos os argumentos de Apocalípticos e Integrados, Eco faz a sua síntese. A cultura de massas, boa ou má, é a condição inelutável do homem contemporâneo. A sociedade industrial e os meios de comunicação de massa são o ar que respiramos, portanto é um exercício estéril saber se é bom ou mau que exista cultura de massas, ela é nos consubstancial. Importa, portanto, conhecer as suas fraquezas e potencialidades e questionarmo-nos sobre qual a acção cultural possível a fim de permitir que os mass media possam veicular efectivamente valores culturais. As características atribuíveis, grosso modo, às categorias de cinema de autor e de cinema comercial, aplicadas à produção e ao consumo, são herdeiras e reproduzem em termos sintéticos grande parte do argumentário de Apocalípticos e Integrados e as noções de alta e baixa cultura de Adorno e outros autores, defensores dum modelo de arte como campo autónomo.

8

Entenda-se, assim, cinema de autor como uma categoria tipo que reúne um conjunto de indicadores como: uma marca autoral; uso de fórmulas distintas e não padronizadas no campo da fotografia, do texto ou da estrutura; sobreposição do valor da liberdade criativa ao valor do mercado e sedução de públicos; propostas tendencialmente mais literárias ou complexas e por conseguinte também tendencialmente menos comunicantes; legitimação no reconhecimento inter pares em festivais internacionais e junto da crítica. Entenda-se cinema comercial ou de entretenimento, a oferta cinematográfica com os mesmos eixos de análise em negativo: realizador de tipo indiferenciado ou “ tarefeiro”; recurso a modelos já testados e a fórmulas consagradas na conquista de públicos; propostas mais emocionais, comunicativas e populares e por conseguinte mais comerciais; legitimação na bilheteira. Por homologia, o público do cinema de autor será aquele que valoriza um cinema artístico, criativo, reflexivo, transgressor e de “mudança de horizonte” 12

e o público do cinema comercial

aquele que valoriza o entretenimento, propostas mais comunicativas em modelos reconhecidos, portanto um cinema de tipo “culinário”.13 3. PÚBLICOS “PUROS” e “BÁRBAROS” Outra chave de entrada no entendimento e configuração das categorias tipo de cinema de autor e cinema comercial é nos dada pela reflexão de Bourdieu sobre o campo da cultura e as estratégias de distinção que o atravessam. “À hierarquia socialmente reconhecida das artes - e, no interior de cada uma delas -, dos géneros, escolas ou épocas, corresponde a hierarquia social dos consumidores. Eis o que predispõe os gostos a funcionar como marcadores privilegiados da "classe"”. 14 Para Bourdieu, a cultura, na acepção de arte e de consumo artístico, desempenha mais que qualquer outra dimensão uma função de legitimação das diferenças sociais. A cultura, nos seus vários campos, seria um sistema hierarquizado, um campo de lutas entre grupos, com o objectivo de manter determinados privilégios distintivos. As práticas culturais, na modalidade de produção e consumo, tenderiam a identificar pertenças sociais. Permitiriam, portanto, distinguir dominantes de dominados. Bourdieu disseca os mecanismos da imposição cultural das classes dominantes, expondo os mecanismos ocultos de criação dos modos legítimos de produção e recepção cultural. Contrariando a ideologia carismática, que atribui a um dom da natureza a vocação artística e a apetência estética pela obra de arte legítima e pela cultura erudita, Bourdieu atribui esse “milagre” a um processo de aprendizagem e socialização que de tão natural e integrado se torna muitas vezes verdadeiramente obscuro e inconsciente até para os seus próprios agentes. A comunicação entre o campo da produção e o da recepção supõe uma partilha de códigos, um mesmo habitus, um mesmo sistema de disposições 12 Conceito de Hans Robert Jauss que remete para a ideia de expansão de consciência a partir dum consumo artístico significante e inovador relativamente às referências artísticas e à mundividência do receptor, ou seja relativamente ao seu “ horizonte de expectativa”. 13 “Arte culinária”, conceito de Hans Robert Jauss que remete para a obra que não acrescenta valor e que apenas confirma as referências culturais e as representações sociais do receptor. 14 (Bourdieu; 1968:9)

9

permanentes e duráveis, ou seja, formas incorporadas de sentir, pensar e agir, que o autor descreve de modo mais eloquente como Habitus de Classe “ (...) forma incorporada da condição de classe e dos condicionamentos que ela impõe; (...) condicionamentos homogéneos e produzindo sistemas de disposições homogéneas, próprias a engendrar práticas semelhantes, alem de possuírem um conjunto de propriedades comuns, propriedades objetivadas, às vezes, garantidas juridicamente - por exemplo, a posse de bens ou poderes - ou incorporadas, tais como os habitus de classe - e, em particular, os sistemas de esquemas classificatórios.” 15 A definição da nobreza cultural é pretexto de lutas simbólicas desde o sec XVII entre grupos que esgrimem ideias diferentes de cultura e de relação legítima com a cultura e com as obras de arte e sobre as suas condições de aquisição. O gosto ou o olhar estético dominante na actualidade é portanto um produto da história e da luta de classes. O modo de percepção artístico que se impõe actualmente como legítimo é o do olhar “puro”. A disposição estética para apreciar a arte pela arte, pela forma e não pela função. Este modelo dominante de percepção estética é historicamente correlato de um modelo igualmente dominante de produção artística autónoma. Um modelo de verdadeira autarcia artística que impõe o primado da forma sobre a função e do modo de representação sobre o objecto representado. Passou-se de “uma arte que imita a natureza para uma arte que imita a arte” 16 e que não reconhece qualquer outra necessidade para além da inscrita na sua própria história e tradição enquanto disciplina artística, com as suas experimentações, transgressões e rupturas. Este fechamento da arte pela arte, decreta como legítima apenas a percepção estética dotada de uma competência cultural específica: a capacidade de distinguir os estilos, modos de expressão característicos de uma época ou escola, portanto a capacidade de identificar os traços distintivos, e apenas estes, face a um conjunto dado de obras. Como refere Bourdieu este é um saber de elite, adquirido pela simples frequência e convivialidade inconsciente com as obras, num contacto de familiaridade despreocupada, portanto natural, incorporado mas não “escolarizado”. Dai o reconhecimento ser feito sem regras nem critérios explícitos e nem sempre ser fácil a enunciação dos traços constitutivos da originalidade da obra. O olhar “puro” distingue-se do “impuro”, o dito gosto “bárbaro”, não só por essa competência de classificação da obra, mas também pela recusa de tudo o que é “ordinário”, por oposição a “distinto”, como as emoções ou as paixões experimentadas pelo homem comum na sua vida igualmente comum. O olhar “puro” é determinado por um princípio de liberdade que se opõe ao princípio de necessidade do gosto “bárbaro”. “Os intelectuais acreditam mais na representação literatura, teatro, pintura - que nas coisas representadas, ao passo que o "povo" exige, antes de tudo, que as representações e as convenções que as regulam lhe permitam acreditar "naivement" nas coisas

15 (Bourdieu, 1968:97) 16 (Bourdieu, 1968:11) 10

representadas”17 Com efeito, a estética dita popular subordina a arte à vida e a forma à função. Nenhum experimentalismo formal se pode interpor entre o espectador e as personagens. Nenhum dispositivo de distância é bem vindo e “toda a imagem deve exercer explicitamente uma função, nem que seja a de signo”.18 Por oposição à estetização da vida, ao despreendimento e agnosticismo moral da estética “pura”, o gosto popular é marcado por juízos morais, obedece a um princípio ético e subordina a arte aos valores da arte de viver. Onde o carácter sagrado e separado da cultura legítima coloca a solenidade dos museus, óperas e teatros, a censura do conteúdo expressivo, o distanciamento inerente à experimentação formal, a comunicação pouco comunicante, a estética popular coloca a participação no espectáculo, a festa colectiva, o circo, o teatro de Boulevard, a opereta ou o filme de grande espectáculo, tudo manifestações culturais menos formalizadas que oferecem satisfações mais directas e imediatas. 19 O gosto “bárbaro", nos antipodas da estética dominante, reconhece apenas a representação realista - ou fantasiosa, mas não ambígua - de objetos que se destacam pela sua beleza ou importância social. A correspondência e a coincidência histórica entre o modelo de produção artístico dominante (e por conseguinte legítimo) e o modelo perceptivo dominante – o gosto “puro,” é explicada pela já referida partilha de um habitus de classe e pela “a homologia, mais ou menos perfeita, entre os campos de produção especializados em que se elaboram os produtos e os campos das classes sociais ou da classe dominante em que se determinam os gostos(...)”. 20 Todos os campos de produção cultural, do cinema, ao teatro, da literatura à alta costura, tendem a organizar-se segundo uma mesma lógica de conflito em torno do capital específico possuído por cada um dos seus agentes e subcampos e da antiguidade desse capital, gerando-se lutas simbólicas entre dominantes e dominados, consagrados e emergentes, entre tradição e vanguarda. Lutas, que homólogas entre os vários campos da produção artística, são também homólogas daquelas que atravessam o campo das classes sociais e o campo da classe dominante entre os grupos instalados e os aspirantes. O gosto selará depois esse acordo e encontro entre classe de produtos e classe de consumidores. Através do gosto, o consumidor procura os bens adequados à sua posição e que estão também eles situados em posições sumariamente equivalentes nos seus respectivos campos. O intelectual procura o filme culto e o cidadão comum procura o blockbuster, a elite procura o romance clássico e o assalariado procura o policial. Bourdieu parece estar um tanto ou quanto desactualizada face a fenómenos mais recentes de circulação de públicos que têm posto em causa a ideia de uma directa articulação entre

17 (Bourdieu, 1968:13) 18 (Bourdieu, 1968:12) 19 (Bourdieu, 1968:37) 20 (Bourdieu, 1968:215)

11

posicionamentos na estrutura social e práticas culturais. Autores como Richard A. Peterson e Roger M. Kern21 detectaram nos anos oitenta e noventa uma mudança de paradigma na estratégia de distinção da classe dominante - da exclusão snob à apropriação omnívora. No entanto, esta apropriação não opera de forma indistinta e comparável aos modos de consumo e recepção de outras classes. Os consumidores de alta cultura com comportamento omnívoros apreciam e criticam formas culturais ditas menores à luz do seu conhecimento dos géneros, dos seus intérpretes mais eminentes, e das suas ligações a outras formas artísticas. Aplicam, portanto, nos seus consumos “bárbaros” a matriz de análise distanciadora que Bourdieu reconhece no modelo de arte dominante. Os autores lançam a hipótese de que a mudança do registo snob para omnívoro se relaciona com políticas de manutenção do estatuto de grupo decorrentes de mudanças na estrutura social, nos valores, na dinâmica do mundo da arte e no conflito geracional. Portanto, não se trata da abolição de diferenças de status entre grupos sociais e as suas produções artísticas apenas uma alteração no modus operandi de distinção das classes dominantes22

face a um mundo, apesar de tudo, mais democrático, onde o modelo de valores

etnocêntrico se encontra em perda para um modelo de relativismo cultural. Cabe notar que o próprio Bourdieu também dá conta e admite esse consumo omnívoro “distintivo”, quando, a dado passo, para sublinhar a força da matriz de percepção estética “pura” refere que quando o esteta se apropria dos temas ou géneros de gosto popular, como o Western ou a BD, tende a recusar uma adesão de primeiro grau e a introduzir uma distância em relação à trama e aos personagens, focando-se preferencialmente nos aspectos artísticos e na singularidade da obra por comparação com outras do mesmo género. De regresso ao cinema, nesse campo, como em qualquer outro campo cultural, verifica-se igualmente a existência de clivagens de ordem estética e conflitos simbólicos entre modelos de produção com mais ou menos capital específico a que correspondem produtores e públicos distintos entre si. Também eles com diferentes capitais de prestígio. No campo cinematográfico português, apesar da perda crescente de terreno nas políticas públicas, o cinema de autor detém ainda um papel dominante em termos simbólicos, exactamente por ser aquele que encarna as tradições estabelecidas pelas artes consagradas da alta cultura. O modelo dominante da arte pela arte, marcado pela inovação formal e por uma maior autonomia face ao mercado consegue ainda atribuir foros de nobreza aos seus autores e aos seus cada vez mais rarefeitos públicos, mesmo quando falamos do cinema de autor tout court e não apenas nacional.

21 Peterson, Richard A. e Roger M. Kern (1996), "Changing highbrow taste: from snob to omnivore", American Sociological Review, 61(5), pp. 900-907.

22 Estratégia de distinção feita pelo gosto omnívoro que só as classes dominantes verdadeiramente podem ter, dado que aos outros grupos sociais faltarão as ferramentas e a disposição estética para consumir os produtos da alta cultura.

12

Julgo que sem ferir o espírito da teoria dos campos de Bourdieu, poderia dizer que ao modo de produção “legítimo” do cinema de autor corresponde um público de gosto “puro” e distintivo, que entende o cinema como arte e que será tendencialmente conhecedor da sua história e das suas principais fases e modelos (cinema mudo, expressionismo, neo-realismo, film noir, novelle

vague, o movimento Dogma 95, entre outros), e também tendencialmente conhecedor da obra de realizadores de referência, e de cinematografias de diferentes países, assim como de diferentes formatos cinematográficos como o documentário ou a curta metragem. Arriscaria também dizer que esse público valorizará o visionamento de filmes no seu suporte original – o ecrã da sala de cinema, sem pipoca e eventualmente fora do centro comercial. Por antítese, ao modo de produção menos nobre do cinema comercial corresponderia um público de gosto dito “bárbaro” que se relaciona com o cinema de forma mais lúdica e dessacralizada, valorizando a emoção, as sensações e a adesão imediata à trama, sem filtros estéticos. Público, esse, mais propenso a consumir filmes em várias plataformas e adepto do modelo de sala dominante :o multiplex “pipoqueiro” do centro comercial.

4. PROGRAMAÇÃO E SALAS DE CINEMA: Uma oferta desigual Segundo dados do anuário Cinema de Portugal (2014) do ICA e da Newsletter ICA de Dezembro, em 2013 frequentaram as salas de cinema 12,5 milhões de espectadores, menos 9,2% do que em 2012 e menos 36% que em 200223 . Os espectadores contabilizados até novembro de 2014 – 10,6 milhões, registam uma nova descida, em período homólogo, de 3,9%.

Entre janeiro e novembro deste ano estrearam comercialmente em Portugal 292 filmes, 43,5% proveniente da Europa, desses 10,6% nacionais, 42,8% dos EUA (entre os quais se incluem co-produções com países não europeus), 9,9% co-produções EUA/UE e 3,8% de outras proveniências. Em termos de espectadores os filmes americanos representam 70,2% do mercado e os filmes europeus apenas 13,8% (quota de 4,4% para os filmes portugueses). Em 2013 contabilizam-se em todo o país 158 recintos e 544 salas, (reduzidas para 529 em 2014), 178 salas em recintos multiplex ( 32,0% do total), que acolhem 6,1 milhões de espectadores (48,4% do total). Tomando como referência a cidade de Lisboa, onde vivo e frequento cinema, de um total de 27 recintos do “circuito comercial”, apenas 3 correspondem a cinemas de bairro 24 – Cine City 23 Ano com mais espectadores do último período de recuperação da frequência de sala, que ocorreu entre 1996 e 2002, fruto da reconfiguração do parque de salas com a multiplicação de complexos multiplex em centros comerciais. 24 Lisboa perdeu em 2013 duas salas históricas de cinema de bairro, o cinema Londres e o Cinema King.

13

Alvalade, Nimas e Cinema Ideal, os restantes estão integradas em centros comerciais. Destaco desse universo, as salas Medeia Monumental e Medeia Fonte Nova que se distinguem em programação e protocolo de sala (não se come em sala) do modelo que identifiquei como “Cinema Shopping” e do qual se aproximará mais, apesar de tudo, o cinema de bairro Cine City Alvalade. Quanto a programação, e na ausência de tratamento estatístico deste dado, adoptei um procedimento empírico e exploratório de classificação das distribuidoras que operam no país, e por inerência da sua oferta, a partir da informação disponível nos respectivos sites, recorrendo às categorias de análise que orientam esta reflexão (Anexo II e III) 25. Desta operação exploratória resultam os seguintes dados, com as ressalvas expressas em nota 26:

2013

2014

CINEMA COMERCIAL

82,48%

73,63%

CINEMA de AUTOR

17,52%

26,37%

Este breve retrato mostra um cinema em quebra de popularidade, mas também uma oferta de salas e de programação sobretudo direccionada para um público pouco diferenciado. Face à definição que procurei fazer do público de cinema comercial e de cinema de autor, julgo que o mercado português responde às necessidades do primeiro e muito pouco às do segundo. A hipótese que motivou esta reflexão, de que o público mais permeável a ser (re)conquistado para a sala seria sobretudo aquele que se situa tendencialmente no polo do cinema de autor poderá agora ser completada com as condições prévias e o cenário que considero necessário (mas talvez não suficiente), e que tem vindo a ser aplicado em algumas salas do “circuito comercial”, mas sobretudo em festivais com aparente sucesso: salas de bairro com programação adequada de estreias; programação de ciclo; reprise de clássicos; filmes seguidos de debate com os realizadores (no caso dos filmes nacionais) ou de discussões temáticas; exibição de filmes em formato de digressão na rede de cineteatros nacionais, mais uma vez e sempre que possível com a presença dos realizadores ou enquadrados por debate temático.

25 Anexo II -Tabela Filmes Estreados / Exibidos por Distribuidor (Newsletter ICA, Dez. 2014), Anexo III Tabela de Classificação de Distribuidores 26 A classificação foi feita a partir da informação disponível nos sites dos distribuidores. Sendo uma operação rápida e necessariamente pouco rigorosa, adoptei uma bateria sumária de indicadores (Anexo II) e o critério de >50% (da oferta na Cat. Comercial ou Autoral) para uma classificação em valor absoluto (não ponderado). Sendo as pequenas distribuidoras de tendência autoral muito mais sensíveis a uma oferta mista, os valores apurados para o cinema autoral estarão sobredimensionados.

14

5. METODOLOGIA Para uma eventual tese e numa abordagem ainda amadora e exploratória dum desenho de pesquisa, consideraria adequada a combinação de técnicas quantitativas e qualitativas. A primeira para despiste de públicos, a segunda para aprofundar representações, práticas culturais e predisposição para novos comportamentos. O universo de trabalho seria a cidade de Lisboa por ser, senão a única das poucas, onde existe actualmente, oferta de sala para ambos os públicos e onde se pode falar de conversão de público potencial em público efectivo de cinema de autor sem se cair no absurdo de trabalhar uma procura sem oferta. Este universo é também pertinente por essa oferta existir ai de forma continua ao longo do tempo, onde o público de cinema de autor teve oportunidade de se formar de forma natural, vendo cinema em sala (na Cinemateca, nos cineclubes, nos ciclos da casa da Imprensa ou da Gulbenkian, no São Jorge, no Apollo 70, no Quarteto, Fórum Picoas no King, no Ávila, no Nimas ou no Cine 222), e não como acontece em quase todas as outras partes do país de uma forma mais “escolar” e obstinada, a consumir dvds ou sacando cinematecas inteiras da net. Em paralelo, trabalharia o universo restrito do público do Cinema Ideal. Esta escolha funda-se no facto deste cinema configurar o modelo que considero adequado para a (re)conquista de público de sala e por ser recente (abriu em agosto de 2014) e estar ainda numa fase de sedução e conquista de público, fornece a oportunidade ideal, passe o pleonasmo, para perceber se consegue formar novos públicos ou se apenas rouba mercado à concorrência. Quanto ao desenho da pesquisa, numa primeira fase aplicaria um inquérito por questionário ao universo escolhido

para despiste dos públicos em análise: público efectivo (público de sala) e

potencial (público de sofá) e dentro deste o público de filme de autor e o público de filme comercial. Este questionário geral, seria combinado com um questionário particular, aplicado ao público do Cinema Ideal, para isolar no campo do cinema de autor, público efectivo e público ocasional/novo público. O questionário no Cinema Ideal seria aplicado mensalmente, durante seis meses, em número proporcional à evolução mensal de espectadores, para despiste da conquista de novos públicos Numa segunda fase, com o objectivo de isolar representações sobre o cinema, modos de consumo, e predisposição para novas práticas

aplicaria uma entrevista a inquiridos do questionário

geral que reúnam as seguintes condições: tenham autorizado a realização de entrevista,

que se

enquadrem no público potencial e que representem o protótipo de público das duas categorias tipo. Aplicaria também uma entrevista aos inquiridos no Cinema Ideal que se enquadrem na categoria de público ocasional/novo público. A entrevista seria seguida por uma monitorização mensal de frequência de sala feita por contacto telefónico e teria por objectivo desagregar o público ocasional e o novo público.

15

6. BIBLIOGRAFIA Adorno, Theodor W. (1938), "Sobre o carácter fetichista na música e a regressão da audição", in Adorno, Theodor W. (2003), Sobre a indústria da cultura, Coimbra, Angelus Novus, pp. 21-56. Adorno, Theodor W. (1967), "Breves considerações sobre a indústria da cultura", in Adorno, Theodor W. (2003), Sobre a indústria da cultura, Coimbra, Angelus Novus, pp. 21-56. Adorno, Theodor W. (1966), "Transparências sobre o cinema", in Adorno, Theodor W. (2003), Sobre a indústria da cultura, Coimbra, Angelus Novus, pp. 21-56. Benjamin, Walter (1936), “ A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica” in Benjamin, Walter (1992) Sobre Arte, Técnica Linguagem e Política, Relógio d` Água, pp. 72-113 Bourdieu, Pierre (1979), “Les trois états du capital culturel”, Actes de la Recherche en Sciences Sociales, 30 Bourdieu, Pierre (2010[1979]), A Distinção - Uma Crítica Social da Faculdade do Juízo, Lisboa, Edições 70 Costa, António Firmino (2004), “Dos públicos da cultura aos modos de relação com a cultura: Algumas questões teóricas e metodológicas para uma agenda de investigação” em AAVV, Públicos da Cultura, Lisboa, OAC. Conde, Idalina (coord.) (1992), Percepção Estética e Públicos da Cultura, Lisboa, ACARTE/FCG. Eco, Umberto (1991[1964]), Apocalípticos e Integrados, Lisboa, Difel. Freire, Susana Alexandra (2009), "As práticas de recepção cultural e os públicos de cinema português", (OBS*) Observatório, 8, Garcia, José Luís (org) ICS-UL, Mapear Recursos, Levantamento da Legislação, Caracterização dos Actores, Comparação Internacional, Relatório Final, 2014, GEPAC-SEC INE (2013), Estatísticas da Cultura 2012, Lisboa, INE. Mantecón, Ana Rosas (2009), "O que é o público?" Poiésis, 14, pp. 175-215. WARNER, Mendes, João Maria (org), Novas & Velhas Tendências no Cinema Português Contemporâneo, Centro de Investigação em Artes e Comunicação (CIAC), 2011 Peterson, Richard A. e Roger M. Kern (1996), "Changing highbrow taste: from snob to omnivore", American Sociological Review, 61(5), pp. 900-907. Pinto, Madureira (2004), "Para uma análise sócio-etnográfica da relação com as obras culturais" em AAVV, Públicos da Cultura, Lisboa, OAC, Silva, Augusto Santos e José Madureira Pinto (coords.) (1990[1986]), Metodologia das Ciências Sociais, Porto, Afrontamento. Shils, Edward (1961), "Mass society and its culture" em Jocobs, N. (ed.), Culture For the Millions: Mass Media in Modern Society, Princeton, D. Van Nostrand, pp. 1-7.

16

7. ANEXOS

17

7.3 ANEXO III TABELA DE CLASSIFICAÇÃO DE DISTRIBUIDORES

DISTRIBUIDOR

TIPO DE OFERTA

Nª Filmes 2013

Nª Filmes 2014

NOS LUSOMUNDO AUDIOVISUAIS

COMERCIAL

196

149

LEOPARDO FILMES

AUTOR

16

24

BIG PICTURE 2 FILMS

COMERCIAL

14

21

ALAMBIQUE

AUTOR

18

18

PRIS AUDIOVISUAIS

COMERCIAL

21

18

LANTERNA DE PEDRA FILMES

AUTOR

6

10

OUTSIDER FILMS

COMERCIAL

6

9

MIDAS FILMES

AUTOR

8

7

LEGENDMAIN FILMES

AUTOR

0

7

VENDETTA FILMES

AUTOR

7

6

COLUMBIA TRISTAR WARNER

COMERCIAL

22

4

OUTROS

?

12

19

TOTAL

326

292

TOTAL ( S/ OUTROS)

314

273

2013

2014

CINEMA COMERCIAL

82,48%

73,63%

CINEMA de AUTOR

17,52%

26,37%

CINEMA de AUTOR Indicadores: Realizador Cinematografias minoritárias Referência critica CINEMA COMERCIAL Indicadores: Filme de acção / Comédia Romântica Filme “sequela” Participação de actores do star system Referência critica

18

7.4 ANEXO IV QUESTIONÁRIO 1.Sexo Masculino Feminino 2.Idade:__________ 3. Área de residência: Concelho: ___________________ Freguesia:___________________ 4. Situação perante o trabalho Empregado Trabalhador doméstico Estudante Desempregado Reformado Outra situação 5. Situação parental Tem filhos com menos de 15 anos? Sim Não 6. Escolaridade Não sabe ler nem escrever Ensino primário 9º ano completo 12º ano completo Formação Técnico profissional Curso Superior 19

Qual?________________________

7. Quantas vezes foi ao cinema nos últimos 12 meses? Nenhuma Menos de 6 vezes Mais de 6 vezes 7.1 No ano em que frequentou mais o cinema, foi quantas vezes? Menos de 6 vezes Mais de 6 vezes 8. Assinale as três formas em que vê cinema com mais frequência. Sala de cinema (circuito comercial) Festivais de cinema Televisão Vídeo Computador Tablet Telemóvel 9.Que frase define melhor aquilo que o cinema é para si? O cinema é uma arte O cinema é entretenimento O cinema é arte e entretenimento

20

10. Assinale os três géneros de cinema que mais aprecia: Acção Aventura Animação Comédia Comédia Romântica Documentário Drama Erótico Ficção Cientifica Filme de Autor Musical Terror 11. Costuma ver, com mais frequência, filmes: (assinale um máximo de 3 respostas) Chineses Franceses Indianos Ingleses Italianos Norte-Americanos Portugueses Romenos Outras cinematografias:_________________________________________________

21

11. Da seguinte lista de filmes assinale aqueles que já viu, em sala ou qualquer outro suporte. Avatar de James Cameron A Dupla Vida de Veronique de Krzysztof Kieślowski A Guerra das Estrelas de George Lucas A saga Twilight: Lua Nova de Chris Weitz Harry Potter E O Cálice De Fogo de Mike Newell Mamma Mia! de Phyllida Lloyd Matrix dos irmãos Wachowski Notting Hill de Roger Michell O Acossado de Jean-luc Godard O Mundo a Seus Pés de Orson Welles O Sétimo Selo de Ingmar Bergman Piratas das Caraíbas de Gore Verbinski Roma Cidade Aberta de Roberto Rossellini Titanic de James Cameron Uma Abelha na Chuva de Fernando Lopes Vale Abraão de Manoel de Oliveira Verdes Anos de Paulo Rocha 8 ½ de Frederico Fellini 12. Identifique os três melhores filmes que viu até hoje. (Escreva o que se lembrar do título, nome do realizador e ano aprox.) ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________

22

13 Quais as salas de cinema que mais frequentou ou frequenta ? (Assinale no máximo três) Alvaláxia Amoreiras Cinema Ideal Cinemateca Cinema City Alvalade Cinema City Campo Pequeno Colombo Fonte Nova Londres King Monumental Nimas Quarteto São Jorge UCI Corte Inglês Outros:____________________________________________________________________ Perguntas acrescentadas ao questionário aplicado no Cinema Ideal 14. Quantas vezes já veio ao Cinema Ideal?________________ 14.1 Pretende voltar? Sim Não Pretende-se aprofundar os resultados do presente questionário com a realização de entrevistas a alguns dos inquiridos em fase posterior. Caso esteja disponível a colaborar, deixe-nos o seu nome e contacto. Nome e Contacto: ----------------------------------------------------------------------------------------Grata pela colaboração

23

7.5 ANEXO V 1) ENTREVISTA Qual foi o filme que mais o marcou e porquê? Qual foi o último filme que viu numa sala de cinema? Em que sala? Quantos filmes vê em média por mês e em que plataformas? ( TV, Vídeo, PC, Tablet) Como escolhe os filmes? (realizador, tema, género) Quando e porquê deixou de frequentar as salas de cinema? O que o faria voltar a frequentar o cinema com mais regularidade? O que é para si ir ao cinema regularmente? As salas que a cidade oferece satisfazem-no? Entre o modelo multiplex em centro comercial e o de sala de bairro, como o Nimas ou o Cinema Ideal, qual prefere e porquê? Uma sala com as condições que considera ideais e com uma programação que lhe interesse pesaria, de alguma forma, na decisão de voltar ao cinema? Frequenta festivais de cinema? O modelo aplicado nos festivais, de sessões de cinema seguidas de conversa com o realizador ou de debate, agrada-lhe? Poderia fazer a diferença entre ir ou não à sala de cinema? Alguma vez frequentou ciclos de cinema na cinemateca, num cineclube ou numa sala de arte&ensaio? Um ciclo dum realizador ou dum género da sua preferência poderia levá-lo a uma sala de cinema?

24

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.