Recencao de livro: Esteves, J. P. (Ed.). (2008). Comunicação e Identidades Socais: diferença e reconhecimento em sociedades complexas e culturais pluralistas. Lisboa: Livros Horizonte.

May 22, 2017 | Autor: Paula Ribeiro | Categoria: Representações Sociais, Ciências da Comunicação, Identidades
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Recensão crítica de livro João Pissara Esteves (Org) (2008) Comunicação e Identidades Sociais - Diferença e Reconhecimento em Sociedades Complexas e Culturais Pluralistas. Lisboa: Livros Horizonte. 220 pp. por

Paula Campos Ribeiro PhD em Ciências da Comunicação Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS) da Universidade do Minho (Braga) [email protected]

O livro Comunicação e Identidades Sociais: Diferença e Reconhecimento em Sociedades Complexas e Culturais Pluralistas é uma obra coletiva de sete investigadores de língua portuguesa, doutorados ou mestres em Ciências da Comunicação, seis dos quais portugueses e uma autora brasileira. Os doutoramentos ou mestrados foram realizados quase na totalidade na Universidade Nova de Lisboa, exceto um deles, na Universidade da Beira Interior. A obra, de 2008, tem a coordenação do professor João Pissarra Esteves e a edição dos Livros Horizonte (na coleção "Media e Jornalismo", organizada pelo CIMJ - Centro de Investigação Media e Jornalismo). Este centro de investigação é uma associação sem fins lucrativos, interuniversitária, e reúne investigadores, docentes e profissionais dedicados aos média e ao jornalismo em Portugal. O conjunto de ensaios, investigações e reflexões, agora publicados, abordam os fenómenos da comunicação, identidade e representações sociais. Em contexto de mudanças profundas sociais e humanas, o homem social vê-se imerso num mundo de identidades fragmentadas, misturadas, criando novas identidades, realidades e formas de representação. Que identidades estão a surgir? Como se pode perspetivar a identidade? Poder-se-á falar de identidade ou de múltiplas identidades? De identidades próprias, nacionais, percebidas, de representações de identidade, ou de outras? E ainda, qual o papel dos média e da comunicação na construção dos fenómenos identitários? Todas estas interrogações estão nas 7 partes do livro, abordadas pelos autores João Pissarra Esteves, Gil Baptista Ferreira, Maria João Silveirinha, João Carlos Correia, Clara Roldão Pinto Caldeira, Lídia Marôpo e Maria Lucília Marcos. As diferentes perspetivas de análise (de natureza filosófica, sociológica, da psicologia social, da semiótica) ajudam a compreender este fenómeno. A riqueza dos olhares dos investigadores de comunicação disseca um mesmo objeto sob pontos de vistas diferentes, conferindo complementaridade e abrangência de estudo. Segundo João 1

Pissara Esteves, este livro apresenta uma "perspetiva comunicacional sobre as identidades sociais (…), o modo como as identidades se expressam nos nossos dias: os nacionalismos e os estrangeiros, as mulheres e diversas minorias culturais (de sexualidade, etnia, religião e outras), as novas condições de cidadania". A primeira parte, Comunicação, Media e Identidades: Sobre Políticas de Reconhecimento, Novas Identidades e Movimentos Sociais, da autoria de João Pissarra Esteves, professor da Universidade Nova de Lisboa, desenvolve um ensaio na perspetiva das identidades individuais e das identidades coletivas, sobre "a importância que a dimensão simbólica hoje em dia assume para a afirmação do indivíduo e definição das identidades em termos gerais a nível social"(p: 15). Ambas as identidades coexistem e fazem parte da individualidade do ser humano: a própria identidade -self - e a identidade resultante da interação com o mundo social. O autor prossegue a linha de investigação de procura dos efeitos do individualismo sobre o espaço público. A segunda parte, de Gil Baptista Ferreira, professor do Instituto Politécnico de Coimbra e da Universidade Católica, intitulada A Definição da Identidade Europeia. Comunicação, Memória e Cidadania alarga o estudo da identidade ao campo das identidades nacionais, sobretudo, à questão da identidade europeia, e especificamente, à questão de fundo: como se constrói a identidade europeia que nasce da multiplicidade de identidades nacionais. Gil Ferreira pretende, em termos gerais, “averiguar as condições de possibilidade de articulação de pertenças plurais e complexas dos indivíduos, dos grupos e dos povos, com um nível identitário superior, supranacional – uma articulação que suscite um outro tipo de identificação para além do Estado-nação, e que, no caso específico deste estudo, defina a Europa enquanto espaço político de pertença, ação e reivindicação” (p: 85). A Representação das Mulheres nos Media: dos Estereótipos e «Imagens de Mulher» ao «Feminino» no Circuito da Cultura, da autoria de Maria João Silveirinha, da Universidade de Coimbra, desenvolve um estudo relacionado como os média representam a Mulher. Para compreender esta realidade, a investigadora baseia-se no conceito de estereótipo, um recurso amplamente utilizado para compreender as representações dos grupos sociais. Segundo Maria João Silveirinha, "desde Water Lippmann a Adorno que os media eram vistos como veiculadores de imagens cristalizadas e caricaturais de pessoas e de grupos sociais". Dentro das teorias dos estereótipos sociais de Mulher, os autores mais citados são: Rothenberg, Rakow, Durham e Kellner, Van Zoonen, Kevin Williams, Tuchman e Molotch. A análise dos estereótipos, na sua maioria, centra-se nos conteúdos da publicidade de imprensa e de 2

televisão. Entre os estudos em Portugal, destacam-se os seguintes: Neto e Pinto, 2008; Bebiano e Silva, 2004; Vilas-Boas e Alvim (2005); e Silvana Mota Ribeiro, 2005 (p:116). Outros estudos teriam igualmente importância, mas apenas surgem mencionados na bibliografia, como são o caso dos artigos “Processos Cognitivos, Cultura e Estereótipos Socias”, de Rosa Cabecinhas e “Access of womem and construction of feminity in the discourse of the portuguese press”, de Zara Pinto Coelho e Silvana Mota-Ribeiro. João Carlos Correia, da Universidade da Beira Interior, na quarta secção, Identidades e Realidades Múltiplas: Os estranhos no Meio de «Nós», introduz o conceito “mundo de vida” enquanto modo para a compreensão dos fenómenos identitários. O autor propõe “uma abordagem baseada na teoria das realidades múltiplas (…). Tal proposta implica a diferenciação entre a atitude natural, própria do mundo da vida social e a atitude crítica, própria do espaço público” (p: 131). Nesta secção do livro mais uma vez se aborda a interação e os efeitos entre os média e as identidades. Na quinta parte do livro, intitulada A Representação Noticiosa das Minorias Sexuais. Um Contributo Para a Questão Identitária, é apresentado um estudo (no âmbito da tese de mestrado) de Clara Roldão Pinto Caldeira, sobre o processo de construção das identidades das minorias sexuais - lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros -, através da leitura que os média e, mais concretamente, a televisão portuguesa, faz destes grupos. O estudo é feito com base na análise de conteúdo das notícias produzidas no canal de televisão privado SIC, no período de 1995 a 2000. Clara Caldeira especifica o âmbito do estudo, o porquê da designação de minorias sexuais, a hostilidade religiosa judaico-cristã, o modelo socialmente dominante em relação à sexualidade e as explicações psicológicas do fenómeno. Como campo teórico para analise do impacto dos média enquanto produtores de discurso sobre a realidade, a autora segue a teoria social de John B. Thompson que estuda as mudanças introduzidas pelos meios de comunicação de massa na circulação de formas simbólicas, destacados nas questões da visibilidade, novas formas de interação social e a formação do «eu» (p: 159). Em seguida, debruça-se sobre os estudos de representação noticiosa das minorias sexuais. E, neste contexto teórico, desenvolve o estudo empírico em Portugal, mostrando o carácter noticioso, os temas mais frequentes, os eixos de representação e os discursos tradicionais, entre outros, concluindo que os fenómenos do associativismo têm vindo a ter um papel muito importante na aceitação social do fenómeno e que os discursos utilizados nas notícias televisivas acerca das minorias sexuais tendem a ser integradores e não discricionários. 3

Na sexta secção do livro desenvolve-se outro estudo, As Crianças como Sujeitos de Direito: O Processo de Construção de uma Nova Identidade Social, por Lídia Marôpo (doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade Nova de Lisboa e professora da Universidade de Fortaleza no Brasil). A autora estuda a identidade das crianças e dos adolescentes no Brasil através da influência dos movimentos sociais de defesa das crianças e a forma como tornaram públicas as suas posições e se relacionaram com os meios de comunicação social. A autora faz referência a estudos de investigadores portugueses: “Crianças em Notícia”, de Cristina Ponte, “A Infância como Construção Social”, de Manuel Pinto e “A Criança: de anjinho a cidadão”, de Lígia Aquino e Maria Leão. Lídia Marôpo considera que a teoria da identidade de Manuel Castells, enquanto construção de significados com base num atributo cultural, ou ainda num conjunto de atributos culturais inter-relacionados cujos significados precisam de prevalecer sobre outras formas de significação para se constituírem como uma identidade dominante (p: 173), traduz os resultados deste grupo. Ou seja, a identidade não é criada pelas próprias crianças, mas foi sendo gerada por outros. A identidade em torno da representação da Criança tem sofrido bastantes alterações ao longo da história. Neste artigo são apresentadas as diversas etapas da identidade da criança. Desde a antiguidade e modernidade onde a representação da criança não tinha qualquer papel expressivo, até ao ganho de poder da criança e ao funcionamento da sociedade em função da criança. É interessante notar a diferença de identidades segundo a posição social em que a criança se insere, e as diferentes representações e papéis sociais. Conclui o estudo, entre outros pontos, que “os movimentos de defesa da infância elaboram os seus discursos com base numa mesma linguagem, utilizando expressões como «cidadão em fase especial de desenvolvimento», «exploração do trabalho infantil», «adolescente em conflito com a lei», «exploração sexual», «criança em situação de risco» (p: 187). Por último, Maria Lucília Marcos, professora da Universidade Nova, faz uma dissertação filosófica, intitulada: «Fim do Sujeito». Liberdade Individual e Responsabilidade Social Num Tempo de (Novas) Redes. Esta reflexão expressa a identidade humana na imagética da pintura de Francis Bacon e na descrição sociológica de Weber. Enquanto Bacon representa o homem numa “cortina”, Weber vê-o numa “gaiola de aço”. Estas representações mostram uma tendência atual para expressar a condição humana em queda e imersa no vazio. Segundo Maria Lucília “o sujeito pareceu sair de cena e a cortina pareceu fechar-se. No lugar do sujeito, aparece o indivíduo, tendencialmente a-social e indiferente” (p: 198). Com o advento das 4

tecnologias digitais e das redes de comunicação globais como se repensa o homem neste contexto? Uma questão simples cujas respostas complexas são tomadas pela autora. Em suma, este livro constitui uma obra de referência para quem estuda ou se interessa por identidades e representações sociais. Também é um contributo para as pesquisas científicas das Ciências da Comunicação em Portugal, mostrando o trabalho ativo dos atores sociais nesta problemática do conhecimento.

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