Recensão ao texto \"O Mundo-Imagem\" de Susan Sontag

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Recensão ao texto ‘O Mundo-Imagem’ de Susan Sontag Alexandre Alagôa, nº 7120 História e Teoria da Fotografia Arte Multimédia, 3º Ano, 2º Semestre FBAUL, 2014-2015 Nota Introdutória O ensaio ‘O Mundo-Imagem’ de Susan Sontag é primeiramente publicado pela autora em 1977 em The New York Review of Books. Mais tarde, o ensaio é incluído na destacada obra literária de teoria e análise à fotografia da autora - On Photography. O seguinte texto, que pretende elaborar uma breve observação e um comentário a este mesmo ensaio de Susan Sontag, acompanhará a versão e edição integradas na obra Ensaios Sobre Fotografia - uma leitura que reúne um extenso conjunto de ensaios acerca da prática, da experimentação, da história, da crítica, da teoria e das problemáticas da fotografia publicada em 2013 pela Orfeu Negro. Recensão ao Texto No início do ensaio Susan Sontag sublinha o facto de que a realidade foi sempre interpretada através das narrativas das imagens e refere que, já desde Platão, o pensamento filosófico procurava evocar uma compreensão ou absorção da realidade sem um constante recorrer à imagem como forma de moderar (ou tornar mais subtil) a nossa dependência das mesmas. Segundo Sontag, esta norma parecia alcançável pelos meados do século XIX devido ao recúo das tradições políticas e religiosas perante a ascenção e o desenvolvimento científico e humanista, contudo, afirma a autora, «a nova era de descrença fortaleceu a lealdade às imagens. O crédito que deixou de poder ser dado às realidades apreendidas sob a forma de imagens era agora conferido a realidades consideradas como sendo imagens, ilusões» (Sontag, 2013, p. 333). A nossa organização cultural e social tem-se tornado então cada vez mais dependente das imagens. Ao reflectir sobre esta ideia, Susan Sontag recorre às palavras de Ludwig Feuerbach no prefácio da segunda edição (1843) da obra Essência do Cristianismo, no qual o filósofo declara que na “nossa época” (modernidade) a imagem é preferida ao objecto real, a cópia é preferida ao original, a aparência ao ser, embora haja uma plena consciência desse mesmo acto. Parece haver um prazer pela ficção ou ilusão (talvez até pela mentira) que a

imagem proporciona e instala, servindo-se como uma aparente substituta da realidade. Como refere a autora, uma sociedade é tornada moderna quando o consumo e a produção de imagens se tornam num dos seus principais rituais. É curioso que os pensamentos de Feuerbach em torno da imagem tenham sido escritos apenas alguns anos após a invenção da própria fotografia, daí Sontag referir que Feuerbach parecia prever o impacto da mesma na actualidade. A autora menciona então que as imagens que apresentam esta autoridade ilimitada são produzidas pela câmara fotográfica (são fotografias!), sendo que é das próprias propriedades da máquina - captação, posse e substituição da realidade - que provém essa autoridade. Uma fotografia, refere Sontag, não é apenas uma imagem, uma interpretação da realidade, como a pintura, mas sim também um vestígio (material) directamente transferido do real, como uma pegada ou uma impressão digital, coisa que a pintura nunca o é. Destaca-se aqui, creio, a questão do índice que também é salientada por André Bazin no texto “A Ontologia da Imagem Fotográfica”. Deste modo, a fotografia não deve ser definida apenas como uma aparência, como algo separado da coisa real, como uma semelhança ou uma mera representação do tema (objecto/motivo/sujeito) que capta, pois ela torna-se também parte dele, torna-se numa extensão desse tema e, ao mesmo tempo, funciona como “um meio poderoso” de domínio sobre ele. Refere a autora que “a fotografia é, em várias formas, uma apreensão”, sendo uma das mais simples a posse substituta de um ente querido; outra, será a relação de consumo entre observador e acontecimento, sendo este último parte da nossa expêriencia física e real (uma fotografia de família na Serra da Estrela, por exemplo) ou meramente visual e/ou virtual (uma ida ao Japão através das fotografias do Google Earth, talvez). A terceira e última, sendo esta a mais abrangente forma de apreensão fotográfica e na qual parecem residir as reflexões fulcrais de Sontag nesta ideia da fotografia como domínio, consiste na possibilidade de absorver algo real como informação e não como experiência. Aqui, a autora discute que a fotografia vai integrar o objecto representado num sistema de informação adequado a processos de classificação e armazenamento que vão desde os álbuns fotográficos de família até ao arquivamento e documentação pormenorizados necessários ao uso da imagem fotográfica na meteorologia, astronomia, microbiologia, geologia, trabalho policial, história de arte, entre outros. Afirma Sontag numa passagem significativa a estas noções que:

A realidade enquanto tal é redefinida - como um artigo para exposição, como um registo para exame, como um alvo para vigilância. A exploração e a duplicação fotográfica do mundo fragmentam as continuidades e inserem os fragmentos num dossier interminável, fornecendo assim possibilidades de controlo nunca imaginadas com o antigo sistema de registo de informação: a escrita. (Sontag, 2013, p. 335)

A fotografia funciona então como um meio de controlo. Susan Sontag refere que o desenvolvimento tecnológico da fotografia veio enfraquecer (ou atenuar) o facto da distância entre o fotógrafo e o sujeito fotografado afectar a qualidade da imagem, ao possibilitar a fotografia de objectos muito pequenos ou microscópicos, assim como outros que se encontram demasiado distantes como as estrelas, ao reduzir o tempo que a imagem se torna visível e tocável (com o exemplo da Polaroid), ainda ao colocar imagens em movimento (com o cinema) e de as registar e transmitir simultaneamente (com o vídeo), intensificando assim o domínio pela coisa fotografada ao ponto de, não só decifrar o seu comportamento, mas também de interferir com ele. A principal particularidade que, segundo Sontag, atribui à fotografia um estatuto de sistema de imagens mais poderoso e eficiente do que outros incide no facto desta não estar apenas dependente de um produtor (autor/fotógrafo) para a criação de imagens pois o registo fotográfico é, ao mesmo tempo, “um processo óptico-quimico”, electrónico e automático. Na nossa época moderna, numa sociedade onde a imagem fotográfica - com esta sua origem mecânica aliada ao desenvolvimento tecnológico - se torna um meio de exercer poder, de domínio, de consumo, um meio pelo qual o ser humano observa e constrói o mundo à sua volta, estabelece-se uma nova relação entre imagem e realidade que afasta a noção primitiva de que as imagens possuem as qualidades dos objectos reais e torna frequente e constante a tendência para atribuir aos objectos reais as qualidades da imagem. Desta forma, original e cópia, realidade e imagem, não podem ser definidas como dicotomias, como componentes separadas, estáticas e inalteráveis, pois elas são complementares. «Quando o conceito de realidade muda, o mesmo acontece com o de imagem, e vice-versa» (Sontag, 2013, p. 338). De seguida, Susan Sontag alude para a ideia de que os povos primitivos têm receio de que a imagem fotográfica os aprisione ou roube parte do seu ser. Nadar refere que Balzac tinha também um receio semelhante. Para Balzac um corpo era composto “por uma série de imagens espectrais sobrepostas em camadas até ao infinito” sendo que, ao ser fotografado, o corpo seria roubado e separado de uma das camadas que o constituiam. Na nossa sociedade de mundos virtuais, de máquinas de luz, de ecrãs, do digital, do visual, este medo pela

câmara fotográfica não é tão frequente, apesar de, como refere a autora, alguns indícios da magia inerente à imagem continuarem presentes, como a oposição em destruir ou danificar uma fotografia de um familiar, principalmente já morto ou distante de nós, seria “um gesto brutal de rejeição”, quase idêntico ao de causar sofrimento à própria pessoa, de a martirizar. Contudo, a sociedade industrializada considera que a realidade está cada vez mais próxima do que nos é revelado pela câmara fotográfica, esta máquina de produção de imagens. Aqui, Sontag menciona um exemplo curioso: que hoje em dia, perante um acontecimento invulgarmente agressivo, comentamos que “parecia um filme” para afimar o quão real foi essa experiência. Enquanto nos países menos desenvolvidos há uma certa inquietação perante a imagem fotográfica, nas sociedades mais desenvolvidas há um prazer, uma procura, um desejo em ser colocado em frente a uma câmara e em estar presente na imagem fotográfica. Há uma tendência para nos tornarmos em imagens e sentirmo-nos reais através da fotografia. Seguidamente, Susan Sontag diz que: (...) as fotografias são uma forma de aprisionar a realidade (...), de a imobilizar. (...) Não podemos possuir a realidade, podemos possuir (ou ser possuídos) por imagens (...), não podemos possuir o presente mas podemos possuir o passado. (...) a fotografia significa um acesso instantâneo ao real. Mas os resultados desta prática de acesso instantaneo são outra maneira de criar distância. Possuir o mundo sob a forma de imagens é, precisamente, reviver a irrealidade e o afastamento do real. (Sontag, 2013, p. 340)

Após esta passagem, Sontag descreve a desvalorização que Proust apresenta perante esta noção da imagem, subestimando então o seu poder, ao considerar a fotografia somente como um auxiliar de memória irrelevante em comparação a todo um profundo leque de experiências revelado pelos próprios sentidos humanos. Contudo, alerta a autora, a fotografia não é meramente um instrumento da memória, mas sim uma invenção ou um substituto da mesma. A realidade torna-se portanto inacessível através da imagem fotográfica. Sontag alude que, na actualidade, é possivel conhecer o aspecto de alguns parentes mais velhos em crianças através das imagens, enquanto que, antigamente, antes da invenção da fotografia, esse conhecimento era inacessível, mesmo através dos retractos em pintura. A função da pintura era apresentar um ideal, uma imponência e um embelezamento do sujeito, daí não haver a necessidade para possuir inúmeras pinturas de uma mesma pessoa; com a introdução da máquina fotográfica torna-se frequente possuir uma imensidão de retractos, visto que esta vem permitir um registo biográfico de um indivíduo. A fotografia, ao contrário da pintura, é

informativa, ela afirma que a pessoa existe! Porém, a fotografia não oferece unicamente um registo do passado, uma visita histórica ou genealógica ao tempo antigo dos avós. Da mesma forma que as fotografias de épocas passadas transmitem e constróiem dentro de nós uma imagem mental, uma percepção, uma informação, uma mensagem de como a realidade era antigamente, também na actualidade a fotografia introduz uma nova maneira de lidar com o próprio presente, transformando-o, simultaneamente, numa imagem mental, criando assim, por conseguinte, uma nova forma de experienciar e reflectir a realidade. «As máquinas fotográficas criam uma relação inferencial com o presente (a realidade é conhecida pelos seus vestígios) e proporcionam uma visão da experiência instantaneamente retroactiva» (Sontag, 2013, p. 343). Mais adiante, Susan Sontag alude para a função narcísica da fotografia e a de despersonalizar a relação entre observador e realidade: a fotografia como uma actividade de alienação viciante. Neste ponto, a autora remete para o facto de a guerra, a agressividade e os eventos catastróficos - estes ecos à morte - atrairem as máquinas fotográficas, sendo que a sensação que estimula a visualização dessas imagens é, justamente, a de estarmos alheios à atrocidade representada. «Isto acontece, por um lado, por estarmos «aqui» e não «lá» e, por outro, devido ao carácter de inevitabilidade que todos os acontecimentos adquirem quando são transmutados em imagens» (Sontag, 2013, p. 344). Diria-se até que há um certo prazer quase involuntário na observação da natureza infortuna de um indivíduo, não que esse prazer incida na condição infeliz do outro, mas sim no facto de não nos encontrarmos nessa mesma situação, ou noutra que seja semelhante. Sendo que as imagens nos oferecem um vasto conhecimento do mundo à nossa volta, menciona Sontag, há uma inclinação para, ao experienciarmos algo inicialmente através da imagem fotográfica, privar de sentimento e diminuir o impacto da realidade, visto as sensações suscitadas pela imagem serem diferentes da coisa verdadeira e real, resultando então numa certa desilusão para com esse acontecimento ou essa coisa real. É, por vezes, mais habitual sermos perturbados por uma imagem do que pela coisa real. Interligada a esta questão, a autora faz uma analogia entre realidade e cinema, ao mencionar uma operação cirúrgica a que assistiu sem sentir necessidade de desviar o olhar mas que, ao ver a operação que aparece no documentário de Michelangelo Antonioni sobre a China, Chung Kuo, já se sentiu algo perturbada pelas imagens que eram até menos sangrentas que a experiência real. Nesta parte do ensaio, a ideia central aos argumentos de Sontag é que

a câmara substitui o próprio olhar do observador e sintetiza em poucos minutos um processo que na realidade demoraria horas a ser experienciado, olhado, observado. A câmara nega qualquer escolha ou acção ao olho do espectador pois a imagem a ser contemplada, a ser olhada, já foi previamente seleccionada e construída. Posto isto, Sontag apresenta-nos a recepção negativa da imprensa chinesa a este mesmo documentário de Antonioni como forma de esclarecer o significado da fotografia para o Ocidente em contraste, precisamente, com o da China. Na China, o mundo-imagem é entendido de forma essencialmente diferente do nosso: enquanto para nós a fotografia está interligada a modos descontínuos de observar, na China ela tem apenas uma coerência contínua com o real. Na China, ao contrário de cá onde fingimos não reparar quando estamos a ser fotografados por um desconhecido, a intrusão fotográfica é considerada um acto de desrespeito para com o indivíduo. Para eles, a fotografia é um ritual que requer consentimento e uma pose adequada, sendo que a maior parte das imagens são desprovidas de qualquer movimento, e, geralmente, têm ou uma finalidade de propaganda para os líderes políticos ou uma de carácter privado (retracto de famílias). Os Chineses afastam-se então da noção da fotografia como uma desintegração imagética da realidade; eles não procuram que a imagem fotográfica possua um significado intrinsecamente profundo ou sequer interessante. O moralismo que lá vigora não abre espaço à sensibilidade estética; a imagem fotográfica só pode ser reproduzida em determinados espaços, só pode captar determinadas coisas posicionadas de determinadas maneiras, ou seja, está sujeita a regras específicas. Sontag afirma: Temos uma noção moderna de adorno - a beleza não é inerente a nada; está à espera de ser encontrada através de outro modo de ver -, bem como uma ideia mais vasta do significado que as inúmeras utilizações da fotografia ilustram e reforçam poderosamente. Quanto mais numerosas as variações de qualquer coisa, mais ricas as possibilidades de significado; por conseguinte, as fotografias no Ocidente transmitem mais coisas do que na China. (...) as imagens de Antonioni têm simplesmente mais significado do que as imagens que os Chineses divulgam de si mesmos. (Sontag, 2013, p. 347)

Sontag reflecte que a sociedade Chinesa assenta sobre um observador único e ideal, e considera que os limites impostos à fotografia reflectem claramente o carácter da mesma uma sociedade marcada por uma ideologia de conflito constante e que trata o passado de um modo pouco curioso -, ao passo que a sociedade moderna Ocidental - marcada pelo elevado e infinito consumo e produção de imagens fotográficas que, por sua vez, a constróiem e lhe dão

forma - é unificada pela negação de conflito. Com isto, a autora alerta que a nossa visão de um mundo único é como uma panorâmica fotográfica: o mundo é tornado num só, numa falsa unidade, porque os seus conteúdos são convertidos em imagens. «As imagens são sempre compatíveis, ou podem ser tornadas compatíveis, mesmo quando as realidades que retractam não o são» (Sontag, 2013, p. 348). Susan Sontag continua as suas ideias e pensamentos ao apontar para duas aplicações (ou funções) da fotografia - como arte (função estética - olhar) e como documento (função instrumental - registo) - que geralmente são definidas como dicotomias opostas entre as quais é colocada, erroneamente - diz a autora -, uma barreira, considerando então que são ambas extensões lógicas da fotografia. Aqui, Sontag alude para o exemplo de Nadar que, não só realizou uma série de retractos célebres, como também foi o primeiro fotógrafo a obter imagens aéreas, apercebendo-se da utilidade destas últimas para um futuro militar. Estas duas funções aliadas à fotografia começam por desencadear uma série de ideias contraditórias - «as fotografias de reconhecimento militar ajudam a extinguir vidas; as radiografias ajuam a salvá-las» (Sontag, 2013, p . 349) - e, portanto, a imagem e a câmara fotográfica são transformadas, por um lado, numa ferramenta adequada à centralidade do poder dos Estados e das organizações políticas, por outro, num meio expressivo da vida social e privada do indivíduo e das multidões. Esta seria então uma atitude adoptada e manipulada pelo capitalismo industrial a fim de impôr uma cultura e uma organização social assente na produção, no consumo e na dependência da imagem. O objectivo seria fornecer uma infinita quatidade de entretenimento para estimular a compra, e reunir quantidades ilimitadas de informação para aumentar a produtividade, levando a um ciclo vicioso, supérfluo e consumista. Numa parte significativa a estas noções, Susan Sontag declara que: As máquinas fotográficas definem a realidade de duas maneiras essenciais ao funcionamento de uma sociedade industrial avançada: como um espectáculo (para as massas) e como um objecto de vigilância (para os governantes). A produção de imagens propicia igualmente uma ideologia dominante. A mudança social é substituída por uma mudança de imagens. A liberdade para consumir uma pluralidade de imagens e de bens é equiparada à própria liberdade em si. A redução da liberdade de opção política à liberdade de consumo económico exige a produção e o consumo ilimitados de imagens. (Sontag, 2013, p. 351).

O consumo constante de imagens torna-se cada vez mais rápido, mais acessível. Um exemplo caricato: agora nas estações de metro têm sido colocadas umas máquinas algo estranhas, uns ecrãs gigantes, que revelam imagens e informações da cidade e tiram

fotografias que podem ser instantaneamente colocadas online. Um outro exemplo, algo muito mais marcante, será o do actor de Hollywood (a celebridade, a estrela) que deixa de ser apenas um actor - uma pessoa - e torna-se, precisamente, numa estrela - algo distante e intocável, tornado mítico pelo poder da fotografia e da câmara. O actor de Hollywood é convertido quase num objecto de consumo que, através dos vários sistemas de comunicação os media (as revistas da Life por exemplo) -, se torna mais próximo e acessível ao público que o consome. O actor é considerado célebre não apenas por actuar, por representar, mas por fazê-lo em frente a uma câmara. Daí que os ecrãs de luz gigantes, transmissores constantes de imagens, também venham impôr um maior fascínio às massas em relação, por exemplo, ao teatro. A imagem, ao serviço de uma sociedade consumista como a nossa, tem o poder para tornar uma celebridade de Hollywood mais facilmente reconhecida e visível, torna-a tema de conversa entre o cidadão comum, contudo, ela tem, contraditoriamente, o mesmo poder para a sujeitar ao desaparecimento. Assim como Balzac referia que a fotografia ao captar um corpo roubava as camadas que o compunham, as imagens e as máquinas fotográficas, como diz Sontag, consomem a realidade, elas são simultaneamente a cura e a doença, “um meio de nos apropriarmos da realidade e um meio de a tornar absoleta”. Como reflexões finais ao Mundo-Imagem, Susan Sontag sublinha o facto de que o poder da imagem fotográfica deu origem a uma ruptura com a nossa concepção Platónica de observar e compreender a realidade, levando-nos a considerar e reflectir a experiência e vivência do mundo de um modo isento à distinção entre cópia e original. Apesar de Platão comparar as imagens a sombras, conteúdos sem informação, elas são, na sua génese, provas materiais e informativas do real. Assim, se é possível que haja um equilíbrio entre o Mundo-Imagem e o Mundo-Real, ele incide, de acordo com Susan Sontag, numa ecologia tanto da imagem como da coisa real.

Referências Sontag, Susan (2013) ‘O Mundo-Imagem’ In Ensaios Sobre Fotografia: de Niépce a Krauss. Lisboa: Orfeu Negro, 1ª Edição. (Introdução, selecção e organização de Alan Trachtenberg; Tradução de Luis Leitão, Manuela Gomes e João Barrento). ISBN: 978-989-8327-19-2

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