«Recepção de Luís de Camões em Espanha», in Vítor M. Aguiar e Silva, ed., Dicionário de Camões, Lisboa, Caminho, 2011, pp. 772-793.

May 28, 2017 | Autor: Pedro Serra | Categoria: Literatura Portuguesa, Literatura española del Siglo de Oro
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RECEPÇÃO DE LUÍS DE CAMÕES EM ESPANHA PEDRO SERRA

Os estudos que podemos reunir na rubrica dedicada a ‘Camões em Espanha’ integram um conjunto variado de investigações e investigadores. No período propriamente académico – oitocentista, novecentista e entrando já pelo século XXI – da investigação sobre a presença da obra camoniana no campo cultural de língua castelhana e sobre o influxo de Camões em poetas castelhanos, os fundamentos hermenêuticos, os intrumentos metodológicos e, mesmo, as motivações ideológicas que suplementam o labor de pesquisa, determinaram resultados com um valor científico heterogéneo. Ao ser, a de Camões, uma obra proclive à metonimização da literatura portuguesa; ao ser, Camões, um dos expoentes, senão o expoente maior, do cânone essencial da literatura portuguesa; obra e autor, nas suas relações com Espanha, têm sido objecto de eleição quer de reconhecidos camonistas, quer de diferentes investigadores que se dedicam, de modo mais ou menos sistemático, ao estudo das relações entre as línguas, literaturas e culturas portuguesa e espanhola. Neste sentido, não é despiciendo ter presente que, como campo de estudos relativamente delimitado, tanto a contrastividade de ambas as línguas peninsulares como o comparativismo das duas literaturas e culturas, portuguesa e espanhola, foram sendo determinados, nalguns casos, por valorações e juízos por vezes anacrónicos ou equivocados no que respeita a fenómenos estruturais da cultura peninsular dos chamados séculos áureos – séculos XVI e XVII – como são o bilinguismo luso-castelhano ou a literatura escrita em castelhano por autores portugueses – aquele limbo de ‘castelhanizados’ de que fala Jorge de Sena (cf. 1980: 173 e passim). A conceptualização dessa ampla fenomenologia textual, das suas particularidades sincrónicas e diacrónicas, nem sempre objecto de um cabal varejo crítico, tem condicionado tanto o estudo da vigência da obra camoniana no campo cultural espanhol como a acomodação, por parte de Camões, de paradigmas literários e latamente culturais hispânicos. É conveniente desde já destacar que a vigência rutilante da obra camoniana ocorre no cronótopo que inflacionou e deprimiu progressivamente o desígnio de um ‘Planeta Católico’: “Lentamente, se impone al espacio barroco la percepción de un decaimiento insoslayable y generalizado de la antigua Ecclesia triunfans, que deberá renunciar ahora a

su pretendido reinado planetario; a la culminación de su tarea en la forma de la consecución final de un planeta católico, tal y como lo postula en su obra homónima un Campuzano y Sotomayor” (R. de la Flor: 143-144). Por conseguinte, e como já foi recordado em diferentes ocasiões, “é de todo evidente que Camões teve dessa comunidade [peninsular], aliás expressa numa clara situação de bilinguismo literário, uma consciência plena e actuante” (Castro, 1984: 141). Acresce que, simultaneamente, alicerces hermenêuticos e procedimentos metodológicos díspares – por vezes marcados pelo biografismo ou respondendo a diferentes empenhamentos filológicos, perfilados frequentemente por um cariz histórico-literário romântico-positivista ou movidos por modelos diversos do comparativismo literário – têm como corolário o podermos afirmar que o estudo de ‘Camões em Espanha’ continua a contar com zonas foscas. Este facto, por outro lado, decorre da existência de ponderosos escolhos materiais, que se prendem, de modo lato, com o estado de conhecimento objectivo do ‘arquivo textual’ peninsular daquelas centúrias. Impõe-se constatar ainda, como consideração preliminar, que a investigação sobre a recepção da obra camoniana em Espanha, nos últimos dois séculos, não deixou de ser marcada pela cronologia das efemérides. Se observarmos brevemente a datação dos mais relevantes estudos produzidos, neste âmbito, quer em Espanha quer em Portugal, constatamos terem sido dados à estampa coincidindo com a celebração de factos editoriais ou biográficos destacados. Assim, Os Lusíadas foram amplamente comemorados nos anos de 1872 e 1972, respectivamente terceiro e quarto centenários da editio princeps do poema. Na sessão ordinária da ‘Real Academia Española’ do dia 15 de Fevereiro de 1872 foi celebrado o tricentenário da publicação do poema épico camoniano, evento em que foi parcialmente lida a tradução de Os Lusíadas da responsabilidade do Conde de Cheste, Juan de Pezuela y Ceballos – académico e director da instituição a partir de 1875 –, também tradutor de Dante, Ariosto e Torquato Tasso. D. Pedro II, imperador do Brasil, esteve presente nesta sessão, tendo ainda participado figuras como Juan Valera, assíduo correspondente de Oliveira Martins e embaixador de Espanha em Lisboa; ou Leopoldo Augusto de Cueto, académico e filólogo, também diplomata que desempenhou funções na capital portuguesa. Inaugura-se, deste modo, o que poderíamos chamar ‘ciclo comemorativo’ que culmina, claro está, em 1880. O tricentenário da morte de Camões foi a ocasião, por exemplo, para dar à estampa opúsculos como os de Goyri (Estudio crítico-

analítico sobre las versiones españolas de Los Lusíadas, 1880) ou Vidart (“Os Lusíadas de Camoens y sus traducciones al castellano”, 1880). Este é o ano, como é sabido, do Parnaso de Teófilo Braga. Por outro lado, já no século XX, 1925 é uma data que galvanizou algumas publicações, nesta oportunidade pelo ensejo de comemoração do quatro centenário do nascimento do poeta. Não se sabe ao certo a data de nascimento de Camões. Contudo, na Biblioteca Nacional de Madrid, o próprio rei Alfonso XIII interveio numa efeméride que celebrou o aniversário do poeta, reiterando os topoi – como veremos, de longa tradição – do pioneirismo de Espanha na recepção da obra de Camões e do papel de Espanha na difusão do vate português além-Pirinéus (cf. Abad, “Al margen de Los Lusiadas”, 1925). Neste mesmo ano, entretanto, são dados a lume quer volumes de homenagem – como é o caso de Llanos Torriglia, que chama a Camões “inspirado poeta castelhano” (El homenaje de España a Camoens, 1925) –, quer se publicam colectâneas que reúnem poesia em língua castelhana que, a ter sido por ela responsável, lhe foi sendo imputada (Camões, 1925; cf. Lemos, 1959). Bem mais relevante, recorde-se, foi a publicação, no ano anterior de 1924, de O Cancioneiro do Padre Pedro Ribeiro, um dos estudos de referência de Carolina de Michaëlis de Vasconcelos. Estudos tão destacados, para o desenvolvimento da matéria que aqui nos importa, como os de Dámaso Alonso e Eugenio Asensio integraram a efeméride do IV centenário da editio princeps da epopeia camoniana. Efectivamente, “La recepción de Os Lusíadas em España (1579-1650)” constituiu, na sua versão original – texto que acabaria por ser ampliado e corrigido com vistas à sua publicação impressa (Alonso, 1973 e 1974) –, uma conferência que Dámaso Alonso, ilustre filólogo espanhol, proferiu na ‘Real Academia Española’ no dia 6 de Dezembro de 1972, em sessão pública dedicada a assinalar os 400 anos da primeira edição do poema épico. Nesse mesmo ano, Eugenio Asensio apresenta em Lisboa uma palestra que publicaria posteriormente (Asensio, 1973 e 1974). Trata-se do conhecido ensaio “La fortuna de Os Lusíadas en España (1572-1672)”. O IV centenário da publicação de Os Lusíadas conglobou ainda a edição de leituras críticas como as de Mendes de Almedia (1972), Filgueira Valverde (1972) reedita Camoens, Coimbra Martins (1972). Neste momento, é fundamental ainda a reedição, prefaciada por Jorge de Sena, dos Lusíadas comentados de Manuel Faria e Sousa (cf. 1972). Enfim, nos quatrocentos anos da morte do poeta voltam a sair dos prelos importantes contributos para o conhecimento de

‘Camões em Espanha’, de entre os quais podemos destacar, por diferentes razões, Asensio (1980, 1982), Berardinelli (1980), Filgueira Valverde (1984), Gallo (1979), Marcos de Dios (1981), Pires (1982), Romero (1981), Sena (1980), Aguiar e Silva (1980), Vázquez Cuesta, (1983) ou Walters (1982). Nos últimos anos, por último, têm vindo a ser dadas à estampa contribuições valiosas para o estudo de ‘Camões em Espanha’, quer por beneficiarem de avanços no conhecimento de novos factos documentais e textuais, quer pelas focalizações teóricas perfilhadas. Continua a ser imperativo o regresso à materialidade de espécimes bibliográficos de grande relevo para o conhecimento da circulação da obra camoniana na península (cf. Infantes, 2003) e os avanços da investigação da história da leitura ampliarão sem dúvida o esclarecimento da penetração de Camões no campo cultural bilingue dos séculos áureos (cf. Bouza, 2005). Para além, obviamente, de novas contribuições no âmbito da camonologia (cf. Almeida, 2003; Anastácio, 2004; Aguiar e Silva, 2008), vale a pena sublinhar o interesse que os estudos tradutológicos têm demonstrado pela obra de Camões em Espanha. O que é decerto uma reverberação colateral do refluxo dos estudos filológicos – em detrimento da crescente projecção académica das Faculdades de Tradução – nos claustros do sistema universitário do Estado Espanhol. A recepção de Os Lusíadas em Espanha foi imediata e de notável ressonância. O poema, cuja primeira edição data, como é sabido, de 1572, conheceu duas versões diferentes em língua castelhana no ano de 1580. Este facto modula um dos lugares mais reiterados pelos estudos sobre Camões no campo cultural espanhol: a comunidade de língua castelhana é a primeira a ler Os Lusíadas (cf., entre outros, Vidart, 1880: 5; Figueiredo, “Camões e Lope”, s.d.). A primeira destas traduções, da responsabilidade de Benito Caldera, é dada à estampa em Alcalá de Henares, antes ainda do falecimento de Camões; a segunda, levada a cabo por Francisco Gómez de Tapia, é publicada, a pouca distância temporal, na cidade de Salamanca, tendo-se especulado sobre a possibilidade de Camões a ter ainda conhecido (cf. Sánchez Moguel, “España y Camoens”, 1891). Ainda, Gómez de Tapia é o primeiro anotador da epopeia camoniana, arroteando o labor de adnotatio de insignes homens de letras seiscentistas. Antes de finalizar o século XVI, concretamente em 1591, sairia dos prelos da corte madrilena uma terceira tradução vertida para a língua castelhana por Enrique Garcés.

Anote-se, enfim, a menção feita por Faria e Sousa a outras duas traduções da responsabilidade de Francisco de Aguilar e Manuel Correa Montenegro. Permanecendo inéditas e tendo-se extraviado, datariam presumivelmente de 1609 e 1625. Em trabalhos de investigação recentes, ambas as versões continuam a ser dadas como perdidas (cf. Micó, 2004: 197, n. 36). Entretanto, Anastacio Rojo Veja, num levantamento de manuscritos arrolados nos Libros de Relaciones do Archivo General de Simancas, recolheu uma referência a Manuel Correa Montenegro, que solicitou licença de impressão dos seguintes volumes: “de Lusiadas de Luis de Camoes, uno en lengua portuguesa en que compuso, el otro en lengua castellana en que fue traducido en octava rima” (apud Rojo Vega, 1994: 153). A menção, nos Libros de Relaciones, integra a rubrica referente ao ano de 1588, isto é, o pedido de licença de edição destes manuscritos corresponde a essa data. Perguntamo-nos, pois: será esta tradução em oitava rima uma cópia da ‘versão de Manuel Correa Montenegro’ a que fez referência Faria e Sousa? São poucos os dados de que dispomos sobre as biografias dos três tradutores quinhentistas de Os Lusíadas cujas versões impressas chegaram até nós. Há que sublinhar, perante esta escassez informativa, o facto de dois deles, Benito Caldera e Enrique Garcés, serem oriundos de Portugal. Apenas Luis Gómez de Tapia provém de famílias castelhanas. De Caldera sabemos que residiu na corte madrilena, que terá estudado em Alcalá de Henares, e que acabaria por entrar na vida religiosa, ou no convento madrileno de San Felipe el Real, ou no convento dos agostinhos em Salamanca. Quanto a Gómez de Tapia, natural de Antequera, cursou humanidades. Garcés nasceu por volta de 1525 no Porto, estudou já em Espanha e, tendo viajado para a América Hispana, foi descobridor do mercúrio no Perú, onde vive – concretamente em Huamanga y Huancavelica – até 1589. De Garcés deixaria dito Cervantes, reservando-lhe um lugar no poema “Canto de Calíope”, que integra La Galatea: “De um Enrique Garcés, que al peruano / reino enriquece, pues con dulce rima, / com subtil, ingeniosa y fácil mano, / a la más ardua empresa en él dio cima, / pues en dulce español al gran toscano / nuevo lenguaje há dado y nueva estima”. Entretanto, o autor do Quijote destinou também significativos versos, no mesmo lugar, a Benito Caldera: “Tú, que de lujo el sin igual tesoro / truxiste en nueva forma a la ribera / del fértil río a quien el lecho de oro / tan famoso le haze adonde quiera: / con el devido aplauso y el decoro / devido a ti, Benito de Caldera, / y a tu ingenio sin par, prometo honrarte, / y de lauro y de yedra coronarte”. Sabemos, aliás,

que Cervantes dispôs de um exemplar da versão de Caldera na sua biblioteca (cf. Tejeiro Fuentes, 2006: 689). A tradução de Benito Caldera conta com um corpus paratextual que congrega colaborações de figuras próximas dos círculos poéticos de Lope de Vega e Miguel de Cervantes. Para além de Pedro Laínez, responsável pela “Epístola al lector”, o volume integra contributos de Francisco de Garay, Luis Gálvez de Montalvo e do Maestro de Venegas. Por seu turno, no elenco de universitários que colaboraram no volume de Gómez de Tapia – dedicado a Ascanio Colonna, mecenas e prelado italiano –, figuram nomes como Álvaro Rodrigo Zambrano, Diego de Venegas ou Pedro de la Vega. Os contributos mais destacados são os de Francisco Sánchez, o Brocense, responsável pelo texto prologal, e Luís de Góngora. Por um lado, é no prólogo desta tradução que o Brocense critica as Anotaciones de Herrera, questão de grande relevo poetológico que foi estudada por Asensio (1984). Por outro lado, os versos de Góngora constituem a primeira publicação que se lhe conhece. Foi pouco o tempo que mediou entre a impressão dos dois livros, que de resto não terão deixado de motivar uma pugna pela prioridade na edição (cf. Asensio, 1980: 115). Ambos os volumes carecem das preceptivas aprovações da censura, o que teria permitido objectivar uma datação ainda mais precisa. Este é, seja como for, um indício suficiente de terem sido editadas com alguma premura – interpretada e justificada, por alguns estudiosos, como resultado da intervenção pessoal de Felipe II, pouco antes de ser aclamado monarca das duas coroas peninsulares. No corpus paratextual do volume produzido no âmbito universitário salmantino, podemos encontrar informação explícita sobre a prioridade editorial da edição de Alcalá de Henares, facto que por vezes passou inadvertido (cf. Almeida, 1972). Efectivamente, num dos textos preliminares do volume, concretamente num poema de Pedro de la Vega ad libellum, diz-se que “Por la primera impression / Señor libro vuestras quexas / No muestren tanta passion”. Alude-se ainda, no mesmo texto, à juventude do tradutor, Batto – nome que identifica Benito Caldera, também grafado em certos lugares como Bento Caldeira –, empenhado em “Ilustrar su nombre y suelo / Y de su lengua paterna”. O poema de Pedro de la Vega indicia-nos mesmo, como podemos constatar, a existência da já mencionada rivalidade entre os tradutores e respectivas traduções. Pedro de la Vega, neste sentido, privilegia a versão de Gómez de Tapia em detrimento da de Caldera, chegando mesmo a ironizar com o nome do tradutor: “Pues no es esta la caldera / Que llaman

de Aljubarrota”. A ironia vale-se do facto de Benito Caldera ser, como já foi frisado, de origem portuguesa, não assim Luis Gómez de Tapia. Por último, e ao contrário das anteriores, a tradução de 1591 dispõe de escassos textos preliminares, apenas um soneto de Diego de Aguilar y Córdoba e quatro sonetos do próprio tradutor. Todavia, é oportuno destacar que Enrique Garcés foi também tradutor de Petrarca. Neste sentido, Bertomeu Masiá recordou não há muito ser, a de Garcés, “la única traducción completa de las rimas de Petrarca que hemos tenido desde el siglo XVI hasta la segunda mitad del siglo XX, y que el verdadero valor del texto reside en que abrió paso a la influencia de la literatura italiana, y sobre todo de Petrarca” (cf. 2007: 460-461). Apesar de ter sido editada em Madrid, a versão de Os Lusíadas de Enrique Garcés obedecia ao propósito de difundir o poema camoniano no âmbito do chamado ‘Parnaso Antártico’. É o que, de resto, no-lo manifesta o soneto final da responsabilidade do próprio tradutor, onde podemos ler: “Mas porque no quedassem sepultados hechos y versos / tanto soberanos en solo Portugal, mis toscas manos / los dan al nuevo mundo trasladados”. Ora, o valor destes factos textuais e editoriais, cuja colação e atestação são incontroversas, tem sido enquadrado por diferentes modelos interpretativos. Revela esta imediata recepção – depois da editio princeps, as restantes edições portuguesas quinhentistas são posteriores a 1580 –, fraguada em espaços académicos diferentes, uma ampla disseminação da leitura do poema no campo cultural de língua castelhana? Apoiando-se em estimativas das primeiras décadas do século XVII – concretamente de Pedro de Mariz (Os Lusíadas, 1613) e Manuel Severim de Faria (Vários Discursos Políticos, 1624) – Aguiar e Silva pôde anotar que os milhares de volumes camonianos que terão circulado de 1572 até à segunda década da centúria de seiscentos, indiciam a consagração de Camões como “o poeta canónico por excelência da poesia portuguesa” (2008: 60). Vanda Anastácio, por seu turno, também equacionou o alcance do ‘estalo’ que supôs a publicação de Os Lusíadas. Neste sentido, é verdade, como recorda a estudiosa, que as versões castelhanas devem ser avaliadas contra o pano de fundo editorial do poema que significou, nesse último quartel do século XVI, a publicação de quatro edições: a editio princeps, de 1572; a edição emendada, dita dos “Piscos”, de 1584; a edição de 1591; e, enfim, a edição de 1597. Todavia, este rol de edições “não [pode] considerar-se um grande êxito editorial” (2004: 160-161). O que é certo é que, nesse relativamente curto intervalo de tempo, Camões passsa a ombrear com Homero, Virgílio ou Torquato Tasso

no ‘Parnaso Peninsular’. Finalmente, Eugenio Asensio chamou a atenção para o facto de a natureza altamente alusiva de Os Lusíadas supor uma competência de leitura apenas ao alcance de um círculo restrito de leitores: um núcleo cortesão próximo, ademais, de uma alta formação letrada. Numa outra ordem de indagação, Vanda Anastácio defrontou ainda a vexata quaestio das motivações de uma tão imediata tradução do poema épico para o castelhano. Sobre esta matéria, os estudos de referência de Dámaso Alonso e de Eugenio Asensio sobrelevam fundamentalmente o interesse estético e literário que Os Lusíadas indiscutivelmente suscitaram, sem deixar de averbar uma provável motivação política. A estudiosa portuguesa propõe uma leitura que complexifica e, ao mesmo tempo, abre novas vias de interpretação. Substanciando um alvitre de Ivana Gallo, assevera que ambas as traduções respondem por uma “estratégia política de sedução e intimidação conduzida, ao mesmo tempo, pelo herdeiro castelhano da coroa portuguesa” (2004: 168). Daí que o propalado apoio de Felipe II a ambos os projectos editoriais – monarca que se especulou teria manifestado o desejo de conhecer o poeta português (cf. Viqueira, 1972: 98-99), interesse noticiado por Faria e Sousa, nos Lusíadas comentados, e Nicolás Antonio, na Bibliotheca Hispana Nova – obedeça a uma ampla estratégia política. Para Teófilo Braga, que inclui o monarca castelhano no elenco de imitadores de Camões (cf. 1889), e numa leitura marcadamente ‘patriótica’, essa teria sido uma “suspeitosa homenagem” (1889: 5). Enfim, uma política pela tradução, uma política da tradução. Traduzir Os Lusíadas terá significado, então, duas coisas: sublinhar a vinculação de um imaginário imperial à ‘nação’ portuguesa; anexar, à língua castelhana, este património simbólicocultural. Aguiar e Silva registou também a motivação latamente ‘política’ que terá movido ambas as traduções (cf. 2008: 66), não deixando de constatar que “foi o génio épico e lírico de Camões a merecer o reconhecimento por parte dos mais importantes poetas espanhóis” (ibidem: 63). Assim, não parecem ser produtivos os termos da tese que considera que traduzir o poeta português supõe uma “domesticação” espanhola de Os Lusíadas, como já foi sugerido (cf. Dasilva, 2006: 121; e Dasilva, 2009). Por um lado, os critérios estético-literários, na sua relativa autonomia, foram também determinantes (cf. Ortiz Armengol, 1971: 64). Por outro, os processos de identificação naquela Península galvanizada, sob o signo da melancolia, pelo refluxo do ‘Planeta Católico’, não permitem validar uma leitura a que subjaz a equação nação/monolinguismo literário. Por último, como mostrou Vanda Anastácio, o móbil político que terá determinado a

tradução de Os Lusíadas, ao contrário do que se pensaria de uma apropriação ‘domesticadora’, tem como efeito a ‘naturalização’ portuguesa do poema camoniano. As traduções quinhentistas do poema não gozaram de uma subsequente apreciação crítica favorável. Encetou esta valoração negativa Faria e Sousa, que as considera, na sua conhecida edição comentada de Os Lusíadas, “tan malas que exceden la infelicidad de toda traducción que se hace de escritura en verso”. Podemos afirmar, com alguma segurança, que continuam ainda hoje a ser objectos que requerem um estudo mais aprofundado. O que foi sendo publicado não tem um carácter sistemático, nem obedece a uma interrogação crítica dos fundamentos hermenêuticos e dos procedimentos metodológicos que subjazem a um trabalho de investigação. Nicolás Goyri, no último quartel do século XIX, encetou a comparação das três versões (cf. 1880). Mais recentemente, Ivana Gallo defrontou-se com um problema que encerra a sua complexidade: que ‘original’ serviu de base para a primeira versão espanhola de Os Lusíadas, a tradução de Caldera? (cf. 1979). Para Eugenio Asensio, por seu turno, “ninguna de las traducciones numerosas en esta lengua es poéticamente satisfactoria” (1982: 51), ecoando o juízo de Faria e Sousa. Ainda assim, acrescenta que “A pesar de esta pérdida de matices, galas y colorido, las versiones castellanas de 1580 y 1591 dan una idea bastante fiel del original” (ibidem: 55). Os três tradutores mantiveram a ottava rima, respeitando ainda o esquema rimático – rima cruzada nos primeiros seis versos; rima emparelhada nos dois últimos –, e optando, genericamente, por uma tradução literal (Asensio, 1973: 309-310). Vanda Anastácio também sublinhou que “ambos os tradutores – refere-se a Caldera e Tapia – se mantiveram extremamente próximos do original” (2004: 170). O actual conhecimento das peculiaridades das traduções qua traduções é relativo. Não foi ainda levado a cabo um estudo sistemático e exaustivo, de base tradutológica sólida, destas três versões castelhanas do século XVI. Neste sentido, cabe sublinhar que Dámaso Alonso e Eugenio Asensio, entre outros, centraram os termos básicos deste estudo, apontando dominantes que valerá a pena investigar com uma maior acuidade. Para Asensio, por exemplo, e numa valoração genérica, “Caldera, Tapia y Garcés, con matices y graduaciones diferentes, procuraron camonizar el castellano, ser fieles a la letra y sabor del texto” (1973 [74]: 306). Observam-se, em diferentes lugares da tradução de Benito Caldera, interferências da língua portuguesa. Foram já coligidos alguns casos, integrando uma casuística que cobre os níveis fonético, morfológico, sintáctico, lexical e semântico (cf. Camões, 1986: 52-

54). Ainda, verifica-se, como nas restantes versões quinhentistas, um uso mais moderado de cultismos do idioma castelhano. Contudo, falta objectivar, mediante um estudo comparativo rigoroso, quais os parâmetros daqueles ‘matizes’ e ‘graduações’ singularizadores a que se refere Asensio. Por outro lado, como perspectivaram, os tradutores, o seu labor? Para iluminar brevemente esta questão, vale a pena citar o início da epístola prologal de Pedro Laínez integrada na versão de Benito Caldera: “De las dificultades que se ofrecen en el traducir, y de los provechos que resultan de la buena y fiel traducción se pudiera hacer largo discurso, siendo cualquier de las dos partes tan necesaria y digna de consideración, en tiempo que por muchos se estima en tampoco lo que tanto estimarse debría”. Assim, para Laínez, traduzir não é apenas “romanzar”. A tradução é um trabalho árduo feito de ‘estudo’ e ‘engenho’ que tem como corolário a possibilidade de usufruir dos benefícios que proporcionam as melhores obras – dignas de imitação – dos Antigos e dos Modernos. Ao mesmo tempo, Laínez considera que Caldera, apesar da sua juventude, se regeu pelas “verdaderas reglas de Horacio”; assim, “no ha ido tan atado a la letra, cuanto a lo más esencial de la sentencia”. Quanto às dificuldades, soube “huir versos agudos em la lengua castellana” e, ainda, “variar los números y consonantes que en el primer autor tantas veces se hallan repetidos”. Enfim, conclui formulando a ideia de que Caldera é o “segundo autor” do poema, pela manifesta proficiência do trabalho de tradução. Não é este o lugar, obviamente, para um desenvolvimento da complexa questão – com delicadas especificidades teóricas e históricas – que obriga a distinguir entre tradução, imitação e versão nos séculos áureos. Mais ainda, e pensando especificamente na obra camoniana, por tratarmos de poetas peninsulares “órfãos de Petrarca”, como já foram chamados (cf. Navarrete, 1994). Neste sentido, vale a pena sublinhar que “Bastaría echar una ojeada al petrarquismo del siglo XVI en cualquiera de las lenguas europeas (incluyendo, obviamente, el latín) para comprender la dificultad de distinguir entre traducciones, adaptaciones e imitaciones” (Micó, 2002: 84). A tradução de Il Cortegiano de Baldassare Castiglione por Juan Boscán (1534) inaugurou um novo paradigma tradutológico, de que deu conta Garcilaso de la Vega. Ora, as observações de Pedro Laínez recordam algum lugar do louvor de Garcilaso à tradução de Juan Boscán daquele importante tratado. Também aí se valoriza uma tradução que não seja mero “romanzar”, isto é, mera versão ad literam, do texto original. Boscán, assevera Garcilaso, “no se ató al rigor de la letra, como hacen algunos, sino a la verdad de las

sentencias”. Traduzir ad sententiam devolve-nos, pois, o modelo tradutológico humanista que, respeitando o original, procura recriar o texto na “língua alheia” para a qual foi vertido como se nela tivesse sido criado. Um dos acontecimentos culminantes da entronização de Camões como “Príncipe dos Poetas das Espanhas” – o topónimo entendido dentro do “esquema da Monarquia Dual” que, como já o assinalou Sena (1980: 176), define uma área geo-cultural diferenciada no contexto europeu coevo que não significa que obras de portugueses escritas ou traduzidas em castelhano sejam menos monumentos portugueses – viria a ser a publicação póstuma da edição profusamente comentada de Os Lusíadas de Manuel Faria e Sousa, em 1639. Obra dedicada a Felipe IV, inclui ainda a primeira tradução em prosa, para o castelhano, do poema. Faria e Sousa, “camonista vesânico” como lhe chama Jorge de Sena, é o autor dos conhecidos “fluviais volumes”, no dizer de Eugenio Asensio, que foram e continuam a ser estação obrigatória dos estudos camonianos, fons et origo de muita informação sobre Os Lusíadas. Um exercício hercúleo que enfrentou instigado pelo comentário prologal de Francisco Sánchez de las Brozas que integra a tradução salmantina de 1580. A epopeia camoniana acumulava já, quando é publicada a edição de Faria e Sousa, importantes anotações e comentários interpretativos. Gómez de Tapia, como vimos, encetara a anotação do poema – visando clarificar lugares obscuros no que toca aos factos históricos, ao aparato mitológico, à informação genealógica e às referências geográficas (Asensio, 1980: 116 e 1982: 44) –; o já mencionado prólogo do Brocense detonara o comento; enfim, na edição de Os Lusíadas de 1613 seriam incluídos comentários do licenciado Manuel Correia e a primeira biografia do poeta, da responsabilidade de Pedro de Mariz. Entretanto, uma nova Vida de Camões integra os Discursos Políticos de Severim de Faria, publicados em 1624, origem aliás da notícia do já mencionado interesse de Felipe II por conhecer Camões em 1580: “desejava – diz-nos Severim de Faria – de o ver por sua fama e fazer-lhe mercê”. A colossal adnotatio do poema levada a cabo por Faria e Sousa só terá, talvez, um termo de comparação na Micrologia Camoniana, de João Franco Barreto, cujas licenças datam de 1672 mas que permanecerá inédita até ao século XX. Como é sabido esta obra distingue-se do comentários de Faria e Sousa “por um critério de arrumação mais fácil, prático e útil” (Castro, 1982: XXVII); ambas constituem, enfim, uma ‘massa crítica’ de grande fôlego que

nos devolve o lugar central que a obra camoniana ocupa nas letras peninsulares dos séculos áureos. Ora, Manuel Severim de Faria constatava nos mencionados Discursos Políticos que o poeta é louvado pelos “melhores Poetas, Históricos e Oradores, de maneira que sua gloriosa memória durará igualmente com os séculos vindouros”. A exaltação do épico português por parte do escol letrado é o garante da memória ou, por outras palavras, da Fama. Por conseguinte, como se foi forjando e sedimentando o prestígio de Camões no ‘Parnaso Peninsular’, a que devemos aliás juntar o ‘Parnaso Antártico’? Sendo momento álgido do processo, Faria e Sousa não esteve sozinho na consagração do poeta português. Foi determinante o concurso dos poetas e preceptistas castelhanos. Não poderia ser, de resto, de outro modo. Reportamo-nos, como já foi destacado, a um cronótopo em que o modo de perfazer a imaginação das comunidades, refractar nas línguas, literaturas e culturas essa imaginação, e materializar essas comunidades imaginadas, não são processos subsumidos por singularidades ‘nacionais’ cuja diferenciação fosse absoluta. O primeiro encómio dedicado a Camões em Espanha foi formulado pelo poeta Fernando de Herrera. Fê-lo, concretamente, nas Obras de Garcilaso de la Veja con anotaciones de Fernando de Herrera, que vieram a lume em 1580, data, como vimos, das primeiras traduções para o idioma castelhano do poema épico camoniano. Este dado referente a Herrera é ainda importante porque prova que o poeta castelhano lera Os Lusíadas em língua portuguesa. Efectivamente, a data da respectiva licença, de 3 de Setembro de 1579, revela que Herrera inseriu as alusões a Os Lusíadas antes de 1580, ano do ‘estalo’ da difusão da obra traduzida em Espanha. Aliás, em rigor, a própria existência de duas traduções publicadas na mesma data – duas edições que, ademais, como já foi dito, disputaram entre si méritos e, talvez mesmo, prioridade – é sintoma de que o conhecimento de Os Lusíadas em Espanha é anterior à data de 1580. A alusão de Fernando Herrera ao poema épico nas suas Anotaciones corrobora este indício, atestando ainda que esse conhecimento não encontrou na língua portuguesa, nos círculos cultos cortesãos, um obstáculo. Aliás, temos uma refracção literária deste facto no Quijote, um lugar significativo, entre outros, onde se manifesta que Camões era lido em língua portuguesa: “Traemos estudiadas dos églogas, una del famoso poeta Garcilaso, y otra del excelentísimo Camoes, en su misma lengua portuguesa, las cuales hasta ahora no hemos representado”. Uma língua que é modelada, em Cervantes, pelo estereótipo de língua “melosa”,

como podemos ler na peça de teatro La Gran Sultana. Sabemos também, neste sentido, que Felipe IV terá lido Camões em português. Como sublinhou Fernando Bouza, o monarca contava com exemplares de Os Lusíadas e das Rimas no acervo da biblioteca da Torre Alta (2005: 39-40). Seja como for, e voltando ao divino Herrera, um dos atributos essenciais que reconhece no poema camoniano é a “elegância”. Esta valoração herreriana foi destacada por Dámaso Alonso (1974: 11): para o autor das Anotaciones trata-se de uma “hermosa i elegante obra”. Aguiar e Silva argumentou recentemente sobre o valor poetológico que a noção de “elegância” desempenha no ideário herreriano, arguindo a hipótese de a “vestustidad” do divino Herrera ter encontrado no sintagma “versos doutos e venustos” de Os Lusíadas – canto V, estrofe 65 – uma correspondência (cf. 2008: 65). O de Herrera é apenas o primeiro de múltiples elogios com que a obra camoniana foi sendo laureada. Efectivamente, um dos aspectos que tem solicitado os estudiosos que investigam a presença da obra camoniana em Espanha é o das menções encomiásticas ao vate português, o que supõe não apenas atestar o ter sido lido por autores de língua espanhola, como também objectivar o processo de ‘canonização’ de Camões. Este último conceito foi proposto por Aguiar e Silva, que o equaciona na sua vinculação com uma outra noção operatória: a de “comunidade interliterária luso-castelhana” (Aguiar e Silva, 2008). Os seguintes elogios são, entretanto, os que podemos coligir nas duas traduções de 1580. Assim, do volume publicado em Alcalá de Henares, sobreleva os sonetos paratextuais de Francisco Garay – para quem o poema “hará que vuestra gloria el aire rompa” –, Gálvez de Montalvo – que chama à obra camoniana “inmortal tesoso / de los heroicos hechos lusitanos”, Vergara – que atreve a comparação de Camões com Ariosto, dizendo “no el son y canto fue menos divino / del Lüis raro vuestro soberano” – e Pedro Laínez – para quem o “célebre Camoens cantó primero / con voz süave y bien templada lira / el gran valor del pecho lusitano” –, este último também responsável pela “Epístola al Lector”. Da tradução publicada no âmbito da comunidade universitária de Salamanca, por seu turno, destaca-se, pela tonalidade elogiosa que ostentam, o prólogo de Francisco Sánchez de las Brozas, o Brocense, e o poema de Luis de Góngora, o primeiro publicado por um jovem poeta que nesse momento contava apenas com dezanove anos. Asensio sobreleva, por seu turno, a própria dedicatória de Luis Gómez de Tapia, lugar onde se exalta “tan alta poesía que se llega a la Eneyda, vence la Thebaida, y es poco

menos que la Illiada o Odisea de Homero”. Ainda, de Sánchez de las Brozas sobressai a aferição do poeta em função de um modelo de alta excelência e dignitas. Camões, para o Brocense, merece o nome de poeta pois os seus “subtil ingenio, doctrina entera, cognición de lenguas, muestran claramente no faltar nada para la perfección de tan alto nombre”. Por outras palavras, apenas aquele que se encontre munido “de letras Griegas y Latinas, y sobre todo muy buen ingenio y natural vena, este tal se podrá llamar poeta”. Vale ainda a pena respigar outros casos da laudatio seiscentista a Camões e a Os Lusíadas. Trata-se de uma matéria cujo estudo, na verdade, é encetado nessa mesma centúria, concretamente por Faria e Sousa na edição comentada de Os Lusíadas comentados a que já foi feita referência (cf. Faria e Sousa, 1972). Uma investigação retomada por Dámaso Alonso, e que veio a conhecer posteriormente diferentes desenvolvimentos no âmbito académico do Estado Espanhol (e.g. Extremera Tapia, 1999). Interessa sobrelevar, neste momento, o que move o ensaio de Dámaso Alonso. Não se trata apenas de fazer o elenco de referências ao poema camoniano. Alonso, na esteira de Faria e Sousa, colige lugares laudatórios de Herrera, de Cervantes, Bartolomé Cairasco de Figueroa, Sebastián de Covarrubias, Antonio de León, Tomás Tamayo de Vargas, Pellicer, Salcedo Coronel, Salas de Barbadillo, Saavedra Fajardo, Pedro Calderón de la Barca, Baltasar Gracián e Lope de Vega – mas esta acumulação não é a de um antiquário que juntasse indiscriminadamente loci citati. O desforço do ilustre filólogo visa, na verdade, mostrar como Os Lusíadas chegaram a ser uma obra que integra “a mais restrita Weltliteratur”, um processo em que o campo cultural de língua castelhana desempenhou um papel preponderante. Ao escolher “grandes” e “pequenos” autores documenta que a lição camoniana reverberou no sistema literário peninsular no seu todo. A fortuna de Os Lusíadas perfila-se, assim, como um modo de objectivar a influência estrutural e estruturante de Camões na poesia espanhola de 1579 a 1650, respectivamente terminus a quo e ad quem do seu estudo. Por conseguinte, congregar epítetos encomiásticos como “hermosa i elegante obra de sus Lusiadas”, de Fernando de Herrera, “sin igual tesoro”, como consignado por Cervantes no seu “Canto de Calíope”; recolher lugares em que Camões é comparado com outros modelos épicos, antigos e modernos, como o faz Cairasco de Figueroa na “Canción a la Magestad del Rey Don Phelippe III. N. S. Por el autor”, do seu Templo Militante, em que diz “Ni muestre Lusitania sus Lusiadas, / En tanto que resuena el Canto insolito / De las santas Chilliadas”; ou coligir epítetos que coroam o poeta português como

“grande ingenio en lo lírico y en lo épico”, tal como encastoa Saavedra Fajardo na República Literaria; ou recordar o lugar de A secreto agravio, secreta venganza, de Pedro Calderón de la Barca, em que se consgra o “gran Luis de Camoens, / escribiendo lo que obró, / con pluma y espada muestra, / ya em el ingenio, ya en el valor / en esta parte”; conglobar fórmulas como a do “divino Camões”, “postrando Eneidas y venciendo Ilíadas”, banhando “pluma de fénix tinta de oro”, de Lope de Vega no Laurel de Apolo; ou destacar sintagmas do mesmo Lope como “portugués cisne canoro”, referida a Camões na égloga “Amarylis” de La Vega del Parnaso; coligar todos estes loci é um modo de documentar a presença viva do estro poético camoniano na poesia peninsular dos séculos áureos. Eugenio Asensio cunhou uma eloquente imagem para significar esta presença da obra camoniana em Espanha, imagem que, enfim, vale a pena reproduzir: “Camões ha entrado em el torrente circulatorio de la poesía castellana” (1982: 63). Seja como for, o estudo proficiente desta presença viva de Camões a partir das últimas décadas do século XVI e ao longo do XVII não deixa de ser um desafio para âmbitos de conhecimento como o dos estudos de literatura comparada – disciplina filha da sociedade e cultura oitocentista, com desenvolvimentos e avatares que acompanharam o processo de afirmação e legitimação dos modernos estados-nação – e o dos estudos literários em geral, levados a cabo nos sistemas universitários português e espanhol. Dámaso Alonso, por exemplo, não articula o seu importante ensaio tendo em conta a noção de que a fenomenologia textual, nas suas determinações sistémicas e históricas, se inscreve num quadro geopoético de referência plurilingue. No recente estudo “Camões e a comunidade interliterária lusocastelhana nos Séculos XVI e XVII (1572-1648)”, Aguiar e Silva adopta este ponto de vista. Note-se, neste sentido, que o terminus a quo que baliza a sua investigação coincide com a primeira edição de Os Lusíadas e não com 1579, como em Dámaso Alonso, ou 1580, como no ensaio de Eugenio Asensio “Los Lusiadas y las Rimas de Camões en la poesía española (15801640)”. De igual modo, o terminus ad quem do processo de “canonização” de Camões no sistema interliterário peninsular, em Aguiar e Silva, não é 1640, ano da Restauração, mas sim 1648. Esta data assinala não um facto político, mas um acontecimento literário, a publicação de Agudeza y arte de ingenio de Baltazar Gracián. Neste ponto, Dámaso Alonso havia seguido, igualmente, um critério literário: a data de 1650 funciona, no seu estudo, como marco simbólico que referencia o ponto arquimediano da publicação daquele tratado de Gracián – cuja segunda versão data de 1648 – e do

Criticón, de 1655. Cabe aqui tão-sómente recordar o lugar proeminente que ocupa Gracián na teorização da poetologia barroca peninsular. Daí a importância que reveste, pelo muito que encarece a obra camoniana, para sua consagração, sobretudo para a objectivação do lugar paradigmático que ocupa o Camões lírico. Neste sentido, a abundante citação de Camões na Agudeza y arte de ingenio por parte de Baltasar Gracián não deve ser lida apenas em termos quantitativos. O preceptista aragonês, na lição de Aguiar e Silva, perfila-se mesmo como um leitor sensível ao lugar axial ocupado por Camões no devir do processo estético da comunidade interliterária lusocastelhana dos séculos áureos. Assim, ao pressupor, a sua, uma leitura da lírica camoniana que sobreleva o seu lado ‘conceptista’, Aguiar e Silva conclui: “não terá Gracián lido modernamente algumas facetas do maneirismo de Camões?” (2008: 92). Antes ainda de ampliar a questão essencial da influência que Camões exerceu em diferentes poetas castelhanos, vejamos alguns outros factos da recepção do vate português posterior à centúria de seiscentos. Assim, é verdade que o século XVIII significou um decréscimo na atenção concedida, em Espanha, a Camões (cf. Camões, 1982: 178). O momento cultural crítico, como se sabe, determinou que também Camões passasse pelo crivo da Razão legiferadora. Aquela centúria que, com Verney, é também pouco cara à música das esferas e não ouve a língua do vate como lugar de “consenso”, modo de ser muito investido pelo arcadismo setecentista. Para o barbadinho, recorde-se, é uma questão atinente ao tamanho das “orelhas”: “Quem disser que estes versos [de Camões], e outros que podia apontar, são harmoniosos e enchem bem a orelha, é necessário que tenha orelhas mui compridas. São poucos os versos de Camões que não tenham algum defeito de dissonância. A obscuridade ninguém lha pode negar, quando queira examinar as suas composições”. Falamos, pois, de uma centúria pouco cara à musicalidade do “cisne canoro” que encantara um Lope de Vega. Se esmorece a presença viva de Camões por razões que se prendem com a mudança de paradigmas culturais e das materialidades que determinaram o fulgor seiscentista da sua obra no ‘Parnaso Peninsular’, tal não significa que o poeta português não seja lembrado, nem sequer que não fossem envidados esforços de continuar a traduzi-lo. Assim, Francisco de Lara, no seu El sol máximo de la Iglesia S. Geronymo. Poema heroyco en octavas rithmas, de 1726, faz uma referência pouco lisongeira a Camões, reconhecendo muito embora ter sido uma leitura que esteve no horizonte de elaboração do seu poema épico religioso: “Miraba de una parte en los extraños la inventiva

peregrina de Tasso; la arrogancia Portuguesa de Camoes. Miraba de otra parte en los nuestros tanto Castellano Virgilio”. Segue-se um elenco de nome em que inclui Lope de Vega, Alonso de Ercilla, Silveira, Rufo, Jáuregui, Bocángel, Montalbán, Zárate, Valdivieso e o príncipe de Esquilache. É ainda possível congregar diferentes lugares que provam que o século XVIII dá continuidade à consideração de Camões como uma das figuras centrais do ‘Parnaso Peninsular’. É assim, aliás, que é representado fora da geografia ibérica. Em Itália, por exemplo, Saverio Lampillas, no Ensayo histórico-apologético de la literatura española contra las opiniones preocupadas de algunos escritores modernos italianos, publicado em Espanha entre 1782 e 1786, contradita a opinião do Abade Betinelli, expressa em Il Risorgimento d’Italia, segundo a qual não haveria literatura digna de menção fora de Itália. Ora, quando tem a necessidade de estabelecer comparações entre autores italianos e espanhóis, socorre-se de Camões, considerando que “el suspirado Virgilio amaneció antes en España en la persona de Luis de Camoens, que en Italia con la de Torquato Tasso”. Por outro lado, pelos mesmos idos, o abade Juan Andrés, jesuíta, na sua Historia de la vida del hombre, coloca o poeta português ao lado de Milton e Voltaire, um grau abaixo de Ariosto e Tasso: “Se siguen después Camoens portugués, Milton inglés, Voltaire francés, y Alfonso de Ercilla español”. Entretanto, o também jesuíta Juan Francisco Masdeu – que traduziu para o italiano vários poemas de Camões incluídos no volume antológico Poesie di veintidue autori spagnuoli del Cinquecento, de 1786 – faz menção a Camões na sua Historia crítica de España y de la cultura española, afirmando ter sido leitura de Torquato Tasso: “antes de componer su Gerusalemme liberata, se dedicó a la lectura del poema épico de Camoens para calentar su fantasía, y revestirla del estro de aquel Portugués”. Se, pelos casos sumariamente respigados, não podemos ser categóricos quanto ao silêncio, de meados do século XVII até às primeiras versões oitocentistas, em relação a Os Lusíadas, o certo é que se verifica uma certa exautoração do entusiasmo inicial pelo poema épico. Seja como for, não é verdade que não se conservem cópias de traduções desse período de interregno, como já foi afirmado – para Sousa Viterbo, “passaram-se dous seculos sem que tornasse a apparecer nova tradução ou sem que se reproduzisse alguma das traduções antigas” (“Henrique Garcês, tradutor d’Os Lusíadas em Espanhol”, 1891; cf. ainda Dasilva, 2006: 120 e 2009: 162, col. I), pois chegou até nós uma versão setecentista do poema. Justino

Mendes de Almeida deu a conhecer a cópia manuscrita da tradução de Luis Gómez de Tapia levada a cabo no século XVIII. Trata-se, muito concretamente, de um manuscrito setecentista – o nº 13811 do Museu Nacional de Arqueologia e Etnologia, pertencente ao espólio de Leite de Vasconcelos – que não chegaria a ser publicado. Mendes de Almeida pôde datar aproximadamente o manuscrito em virtude da referência feita no “Prólogo del Editor” às traduções francesas de Duperron de Castera, de 1735, e La Harpe, de 1776. O paratexto do editor anónimo é bem revelador da continuação da fortuna de Os Lusíadas no século XVIII em Espanha. No prólogo é sublinhado o tópico do carácter pioneiro de Espanha na recepção do poema épico: “España, así como fue la primera em conocer el mérito del Virgilio Portugués, lo fue igualmente en traducir su Lusiada, comunicándola por este medio a toda Italia y a las demás Naciones, que en aquel siglo se preciaban de la lengua Castellana como ahora de la Francesa”. Enfim, este espécime bibliográfico suscita ainda a seguinte questão: trata-se de uma simples cópia da tradução de Tapia ou é, antes, uma tradução baseada na versão de Tapia? Justino Mendes de Almeida exemplifica as divergências entre ambos os textos com o cotejo das duas primeiras estrofes do poema. A partir de um contraste que decerto não se terá limitado a estas duas estâncias, conclui: “Verificando-se tantas e tão profundas alterações em relação à tradução quinhentista, creio que o manuscrito de que nos ocupamos, deverá ser referenciado como contendo uma tradução baseada na de Luys Gomez de Tapia e não numa cópia desta” (ibidem: 96). Por estas razões, considera tratar-se da “única tradução castelhana conhecida d’Os Lusíadas feita no século XVIII” (ibidem: 97). Uma análise exaustiva das alterações introduzidas pelo tradutor setecentista permitiria, sem dúvida, concretizar esta asserção. Como já foi frisado em múltiples lugares, há que esperar pela centúria de oitocentos para encontrar as primeiras versões em língua castelhana das Rimas. A tradução que se singulariza no século XIX foi levada a cabo por Lamberto Gil e data de 1818, tendo sido novamente editada em 1887. No campo finissecular espanhol, circularão ainda traduções avulsas de poemas camonianos, integradas em colectâneas como a que compilou Lamarque de Novoa (Poesías Líricas, 1895). Simultaneamente, o interesse pela elaboração de novas versões traduzidas de Os Lusíadas volta a ser retomado de forma expressiva no século XIX. Desta centúria são conhecidas tanto traduções em prosa como em verso da epopeia camoniana. A primeira delas data de 1818 e é, novamente, da responsabilidade de Lamberto Gil. Teve

como referente, segundo no-lo informa o próprio tradutor, as três versões de finais de quinhentos, seguindo de perto soluções textuais da tradução de Luis Gómez de Tapia (cf. Extremera Tapia/Sabio Pinilla, 1990: 179). Nicolás Goyri, no finais do século XIX, elogiou o trabalho de Lamberto Gil (cf. 1880: VIII) e, há umas décadas, no importante estudo Camoens, Filgueira Valverde realçou também a tradução de Lamberto Gil como sendo a melhor versão castelhana do poema camoniano (cf. 1972: 336). Testemunho do prestígio que alcançou esta versão em Espanha é a posterior reedição oitocentista (Camões, 1887), as várias reproduções novecentistas e a sua recente edição integrada num amplo volume com outras obras camonianas (Camões, 2007). O Conde de Cheste, D. Juan de la Pezuela, foi também responsável por uma versão de Os Lusíadas em castelhano, dada à estampa em 1872 no contexto da celebração do tricentenário da editio princeps. Elena Losada Soler, num recente ensaio sobre esta tradução oitocentista do poema épico, vinculou o trabalho do Conde de Cheste ao momento florescente do ideário iberista (cf. 2008: passim). Testemunho conspícuo desta ambiência iberizante, no que se refere aos estudos filológicos e literários, foi sem dúvida a publicação, em 1890, do Catálogo razonado biográfico e bibliográfico de los autores portugueses que escribieron en castellano, de Domingo Garcia Peres, ano em que Sousa Viterbo publica o opúsculo Camões em Espanha. Na sequência dos diferentes fastos que, como já se anotou, tiveram lugar nos idos de 1872, e que culminarão com o tricentenário da morte de Camões – com ampla cobertura jornalística na capital madrilena, como estudou Pilar Vázquez Cuesta (cf. 1983) –, duas novas traduções serão dadas à estampa, desta feita apresentando o poema em versão prosada. Em 1873 é publicada em Badajoz a versão de Carlos Soler y Arqués, tendo sido reeditada em 1878 na mesma cidade. Por seu turno, em 1874, em Barcelona, sai a tradução em prosa de Manuel Aranda y Sanjuán (cf. Peláez, 1979). Registe-se, por último, a tradução manuscrita de Gabriel García Tassara, espécime que integra o amplo catálogo do IV Centenário de ‘Os Lusíadas’ de Luís de Camões (1572-1972), da responsabilidade de António Coimbra Martins, e já, entretanto, sumariamente descrita (cf. Extremera Tapia/Sabio Pinilla, 1990). Os séculos XX e XXI mantiveram um certo interesse por continuar a publicar Os Lusíadas traduzido para o castelhano. Por um lado, reeditaramse as traduções ‘clássicas’, em determinados casos uma oportunidade para produzir investigação sobre Camões em Espanha. É o caso da versão de Benito Caldera, reproduzida por diferentes chancelas de grande tiragem em

1986 e 1996. A última edição desta tradução quinhentista data de 2007, tendo sido anotada por Elena Losada e Isabel Soler, integrando um volume que inclui a lírica de Camões traduzida por Lamberto Gil, o Filodemo e a epistolografia camoniana. A versão de Luis Gómez de Tapia foi editada apenas uma vez, em 1913. O mesmo acontece com a tradução de Enrique Garcés, parcialmente publicada em 1945, volume organizado por Martín de Riquer. Uma das traduções com um maior número de reedições nas primeiras décadas da centúria de novecentos foi a da responsabilidade de Lamberto Gil. Depois de 1887, ano em que foi publicada pela segunda vez – a editio princeps é de 1818, como vimos –, voltou a ser dada a lume em 1907, 1911 e 1921. Todavia, é superada em número de reedições pela tradução oitocentista de Manuel Aranda y Sanjuán, dada à estampa no Estado Espanhol em 1932. Mas também em 1972 e 1997, depois de três edições que saíram em Buenos Aires em 1946, 1947 e 1952, esta última com prólogo de Fidelino de Figueiredo. Outros tradutores do século XX incluem Manuel Vallvé – responsável por uma versão adaptada para crianças, com várias reedições – Pedro González Blanco e Ildefonso Manuel-Gil. Finalmente, no que toca à lírica camoniana, o panorama novecentista das versões para o castelhano não foi especialmente fértil. Para além da reprodução da tradução de Lamberto Gil, para além de versões esporádicas que integram volumes antológicos, é digno de menção o trabalho de José María Cossío (cf. Dasilva, 2006). É verdade que utilizou para os textos de Camões incluídos em 97 Sonetos Portugueses a edição do Visconde de Juromenha. Contudo, Cossío foi consciente da necessidade de levar a cabo o escrutínio desta problemática edição (cf. 97 Sonetos Portugueses, 1933). Por último, registe-se que versões em castelhano de outros genera camonianos são muito esporádicas (cf. Camões, 1934a, 1934b, 1999 e 2007). Façamos, então, e para concluir, uma entrada na indiscutível influência de Camões na poesia castelhana dos siglos de oro. Ares Montes, muito embora reticente em relação ao labor de Faria e Sousa no que toca ao varejo de influências camonianas no campo poético espanhol, reconheceu de modo algo timorato: “En cuanto a España nuestros autores apreciaban en mucho a Camões; su nombre aparece constantemente citado por poetas y prosistas del s. XVII y su huella en bastantes de ellos” (1956: 35). Referindo-se especificamente a Os Lusíadas – embora reconhecendo que a lírica foi ainda mais elogiada em Espanha –, Dámaso Alonso assentou: “Hay uma larga tradición española de admiración por el poema, ya de la más restringida Weltliteratur, que escribió Camoens, admiración manifiesta em grandes y

pequeños escritores de nuestra lengua, sólidamente basada en el testimonio de nuestros nombres más afamados” (1973: 40). Por seu turno, Eugenio Asensio resumiu de forma lapidar o ponto de partida para o estudo da imitação de Camões pelos poesia castelhanos: “Hubo en la imitación de Camões dos fases sucesivas: la fase épica iniciada em 1572, y la lírica, avivada, si no creada, por la publicación póstuma de sus Rimas” (1982: 60). Mais além da menção encomiástica e da imitação poética centrada em ‘casos’ individuais, Aguiar e Silva avançou com uma valoração da presença de Camões em Espanha em que a lição camoniana constitui um ponto de articulação do processo poético peninsular. Quer no que se refere à épica, quer no que respeita à lírica. Assim, “Camões, através sobretudo d’Os Lusíadas, é também um elo relevante da tradição poética culterana que tem em Góngora a sua mais alta expressão” (2008: 90). Os primeiros poemas épicos em língua castelhana que revelam a influência do opus magnum camoniano, são da responsabilidade de portugueses que escreveram no idioma de Cervantes. Concretamente, Jerónimo Corte-Real, Manoel de Gallegos, Duarte Dias e João Mendes de Vasconcelos, entre outros. Figuras que integram uma “quinta coluna literária” (Asensio, 1980: 120) de autores que escreveram em língua castelhana, e cuja colacção foi encetada por Domingo Garcia Peres no seu já mencionado Catálogo. Contudo, a influência de Os Lusíadas na poesia espanhola do século XVII excede este âmbito. Recorda precisamente Garcia Peres que “A pesar de no pertenecer los Lusíadas al Parnaso Castellano, alcanzó para su autor el dictado de Príncipe de los Poetas de las Españas” (Catálogo razonado: 87). De facto, foi já estabelecida a tipologia da ampla casuística de apropriações do poema épico camoniano. Camões, como magister da “trompa bélica” em Espanha, foi por diversos modos imitado, sendo possível objectivar traços marcantes de Camões em poemas de múltiples poetas castelhanos. Foi entretanto Eugenio Asensio quem distinguiu três fenómenos principais de impregnação de Os Lusíadas na épica seiscentista espanhola: o poema potenciou a épica de índole histórica; episódios como a Ilha dos Amores ou o Velho do Restelo tornaram-se paradigma de núcleos narrativos de vários poemas; a obra projectou, na linguagem poética espanhola, diferentes estilemas (cf. Asensio, 1980: 119 e 1982: 58-60). Uma matéria a que, de resto, o ilustre lusitanista dedicou especial atenção em vários ensaios, para além de perscrutar também o rasto da lírica camoniana na poesia espanhola maneirista e barroca (cf. 1973 e 1980) e, dentro de uma perspectiva imagológica, estudar as modulações da

representação de Espanha na épica portuguesa durante a Monarquia Dual (cf. 1974). Trabalhos mais centrados em estudos de caso foram, entretanto, sobrelevando o rasto do poema camoniano noutros genera, como é o caso do teatro (cf. Extremera Tapia, 1985). Neste sentido, Roger Bismut investigou a influência de Camões na Nise Laureada de Jerónimo Bermúdez (1984), e Carlos Romero o vínculo entre Camões e Vélez de Guevara (1981). No trânsito do século XVI para o século XVII, são múltiples a obras de perfil épico que na ‘comunidade inter-literária luso-castelhana’ imitam Os Lusíadas, com maior ou menor proficiência, nalguma das rubricas mencionadas. Respigando alguns exemplos sem o propósito de ser exaustivos, temos, por um lado, o já mencionado Jerónimo Corte-Real e a sua Felicísima victoria, de 1578, escrita em castelhano, em verso solto, e elogiada por autores espanhóis como Francisco Cascales, Juan de Solórzano Pereira ou Quevedo (cf. Alves, 1998: XVII e ss.). Ainda, o andaluz Luis Barahona de Soto, poeta que se moveu no círculo antequerano, em Las lágrimas de Angélica, de 1586, poema que segue a lição de Ariosto, conta com o concurso da epopeia de Camões para a modelação do exotismo geográfico (cf. Lara Garrido, 1978). Alonso de Ercilla, cujo poema La Araucana é anterior à editio princeps de Os Lusíadas, imitaria pontualmente na segunda parte do poema, publicada em 1589, a epopeia camoniana. Todavia, como formula Eugenio Asensio, os dois poemas, sendo ambos epopeias ultramarinas, encontram-se em “órbitas poéticas alejadas” (1980: 124; cf. Sánchez Moguel, 1894 e Nicolopulos, 2000). O rasto camoniano na Mexicana, de 1594, poema sobre matéria da Índia Ocidental de Gabriel Lasso de la Vega, demonstra porventura a disseminação do esforço tradutor de Enrique Garcés. Camões, aliás, terá sido também um catalizador do petrarquismo peninsular no ‘Parnaso Antártico’, com influxo em poetas novohispanos, de que Francisco Terrazas é um exemplo emblemático (cf. Herrera, 1988). Lope de Vega, amigo de Faria e Sousa, na sua Jerusalén conquistada, de 1609, tem uma nova oportunidade para mostrar a sua incondicional admiração por Camões (cf. Fernández Almuzara, Relaciones de la épica de Lope de Vega y la de Camões, 1936). A este respeito, Fidelino de Figueiredo, que deixou um bem documentado ensaio sobre “Camões e Lope” (s.d.), coligiu múltiples lugares em que Lope elogia a obra camoniana, tanto lírica como épica. Por último, tenha-se presente Mosquera de Barnuevo, cuja Numantina, de 1613, é um caso, entre outros, do “florescimiento inaudito de poemas históricos” (Asensio, 1980: 60) movido pela epopeia do poeta português. “Postrando Eneidas y venciendo Iliadas” é

o modo como Lope de Vega, no Laurel de Apolo, assinalava a irrupção de Os Lusíadas. Enfim, esta amostragem da épica do ‘Parnaso Peninsular’ sob o efeito percutivo da lição camoniana, como se pode observar, integra diferentes grandezas poéticas. Outra rubrica dos estudos referentes à repercussão de Os Lusíadas nas letras castelhanas incide sobre a importância que o poema revestiu na introdução de cultismos tanto na poesia coetânea como na poesia subsequente. A investigação desta matéria, encetada por Vidart (1880), teve desenvolvimentos renovados da responsabilidade de Ares Montes (1981), de Sabio Pinilla (1983 e 1994) e de Extremera Tapia/Sabio Pinilla (1989a, 1989b e Camões, 1986). Eugenio Asensio asseverou que “Por vía indirecta Los Lusíadas han enriquecido el vocabulario poético castellano” (1973: 310) e Vanda Anastácio, recentemente, aludiu, por seu turno, à “introdução de numerosos cultismos e de alguns lusismos na linguagem poética do tempo” (2004: 169-170). Finalmente, Aguiar e Silva concentrou-se na transfusão de latinismos e cultismos camonianos em Góngora (2008: 68-70). Apenas a acumulação de trabalhos de investigação centrados nas obras dos diferentes poetas que reverberaram a lição camoniana permitirá objectivar a amplitude deste influxo. Uma investigação que, seja como for, esbarra com duros escolhos, como são a necessidade de ser prosseguida fazendo uso, apenas, de edições críticas fiáveis do ponto de vista ecdótico e de corpora poéticos estabelecidos. A lírica de Camões, como é sabido, e em virtude das materialidades que determinam o campo literário dos séculos áureos, circulou de forma anónima. Ainda, o prestígio que granjeou no Parnaso da Hispania foi magnetizando a atribuição espúria de poemas que, na verdade, lhe não pertencem. Por todas estas razões, o mapa da presença de Camões em Espanha continua a ser, em grande medida, uma zona fosca. Seja como for, é um ponto assente que a fama de Camões se deveu fundamentalmente à lírica, apesar do peso específico que Os Lusíadas tiveram, como vimos, na sua coroação como “Príncipe dos Poetas das Espanhas”. O conhecimento fidedigno da presença de Camões em Espanha tem também um entrave na poesia que circula anónima ou erradamente imputada em cancioneiros miscelânicos, impressos ou manuscritos, catrapácios, florilégios de finais do século XVI e do século XVII. O rigor filológico que exige o estudo de espécimes bibliográficos desta natureza fica patente no facto de no último quartel do século XIX, como é sabido, colectâneas como o Cancioneiro de D. Cecilia de Portugal, o Cancioneiro de Luís Franco Correia, ms. FG4413 da

BNL, ou o ms. ou Cancioneiro Juromenha, conservado na ‘Library of Congress’ com a cota D 87 270, terem determinado a ampliação acrítica do corpus camoniano (cf. Aguiar e Silva, 1999: 37-100). Eis alguns conhecidos exemplos de manuscritos e cancioneiros que importam, por diferentes motivos, para o caso camoniano: Flores barias de poesía, cuja compilação é encetada por volta de 1577 e circulou manuscrito na península a partir de 1612; a Primera Parte de las Flores de Poetas Ilustres de España, da responsabilidade de Pedro Espinosa, publicado em 1605; o Cancioneiro de Cristóvão Borges; o ms. D-199 da ‘Real Academia de la Historia’ de Madrid; o ms. III-Ç-22 da ‘Biblioteca del Escorial’; o Cancioneiro Fernandes Tomás, compilado no trânsito do século XVII para o século XVIII; o ms. CXIV-2 da ‘Biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Évora’, o chamado Cancioneiro de Cortes e de Magnates, de aproximadamente 1608-1610, editado, como é sabido, por Askins (Cancioneiro de Corte e de magnates, 1968); o Códice Riccardiano nº3358; o ms. 3795 da ‘Biblioteca Nacional de Madrid’; o ms. 693 da ‘Biblioteca da Academia das Ciências de Lisboa’; o ms. arm, XXXVII, nº32 da ‘Hispanic Society of America’; o Cancioneiro de Oxford, ms. 189 do ‘All Souls College’; o ms. 4 da ‘Biblioteca Nacional de Madrid’; o chamado Cancioneiro devoto quinhentista, códice 3069 da ‘Biblioteca Nacional de Lisboa’. A investigação sobre ‘Camões em Espanha’ implica directamente o estudo aturado desta complexa tradição de manuscritos e cancioneiros hispano-portugueses. Vejamos alguns exemplos do que acaba de ser afirmado. Ainda recentemente, Víctor Infantes descreveu de modo aturado o Liuro de Sonetos y octauas de diuersos Auctores, de 1598, ms. III-Ç-22 da ‘Biblioteca do Escorial’, já conhecido no âmbito da camonologia (cf. Cruz, 1971; Aguiar e Silva, 2008: 79), manuscrito anónimo, ‘livro de mão’ copiado por mão portuguesa, que contém sonetos de Camões. Singular cancioneiro bilingue, recolhe os sonetos “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, “Busque Amor novas artes, novo engenho”, “Sete anos de pastor Jacob servira” e “Alma minha gentil que te partiste”, entre outros de autoria atestada e atribuída (cf. Infantes, 2003: 186 e Cruz, 1971: 195-198). Neste sentido, sublinhe-se que inclui como anónimos os sonetos em língua castelhana atribuídos a Camões “Cuitado que en un punto lhoro y rio” e “Mil veces entre sueños tu figura”. Assinale-se, entretanto, que os estudos que foram sendo levados a cabo, ao longo do século XX, sobre o Liuro de Sonetos y octauas de diuersos Auctores são um exemplo possível da perspectiva

analítica que não tem em conta o carácter orgânico do bilinguismo nos séculos áureos. Ora, como sublinha Infantes, depois de mencionar dois elencos de investigadores, uns portugueses, outros espanhóis, que investigaram o manuscrito: “Ambas visiones han desatendido –en algunos casos excusablemente– su propia organicidad, su particular topografía poética, su constitución bifronte en el contexto literario en el que se gestó; atentos –en ciertos casos no muy atentos, dicho sea al paso– exclusivamente a los estudios periféricos de su textualidad” (2003: 187). Ainda, dois casos ponderosos mostram como a questão da influência camoniana se entrelaça com a necessária inquirição dos sonetos de atribuição controversa. Um deles trata-se do soneto cujo incipit é “Cuitado, que en un punto lloro y río”, que soneto circulou tanto em castelhano como em português, quer na Península Ibérica quer na Nova Espanha. Aguiar e Silva enumerou já e explicitou as possíveis vias de chegada do poema às costas americanas do Atlântico (2008: 78-82 e ss). Ora, há indícios de o poema ter sido originalmente escrito em português. As versões portuguesas que circulam apresentam uma lição mais próxima do soneto de Bembo imitado. Todavia, Carolina Michaëlis (1900: 98-118) e Roger Bismut (1970) inclinaram-se por um original em língua castelhana. O segundo exemplo é o do soneto “Horas breves de mi contentamiento”, dado como sendo de Camões no florilégio compilado por Pedro Espinosa Flores de Poetas Ilustres de España. Trata-se de um soneto que circulou em português, quer anónimo quer atribuído a diferentes poetas, por exemplo D. Luís (cf. Amaral Jr., Cancioneiro devoto quinhentista da Biblioteca Nacional de Lisboa, 2000) no Cancioneiro Devoto Quinhentista. Em tempos, Roger Bismut descartou a possibilidade de Camões ser o seu autor (1970: 323), a questão foi estudada por Aguiar e Silva (1971: 76-77) e revista recentemente pelo mesmo camonista (2008: 85), que se inclina para que seja efectivamente atribuído a Camões. Assim sendo, a versão em língua castelhana que integra as Flores de poetas ilustres de España redefine o seu valor como testemunho que importa para o estabelecimento do cânone lírico camoniano. Seja como for, e sendo ponto assente que a poesia camoniana se dissemina já pelo corpo poético peninsular, e também da Nova Espanha, antes mesmo da publicação das Rimas, em 1595 e 1598, a complexa matéria da percussão da lírica camoniana nos poetas castelhanos foi arroteada por Eugenio Asensio, que se centrou fundamentalmente na sonetística (1982: 78 e ss.). Contudo, e com outras chaves de leitura, há que destacar o papel que desempenhou Luis Rosales, cujos ensaios “La poesía cortesana”, de 1966, e

“Garcilaso, Camões y la lírica española”, de 1972, abriram instigantes perspectivas de interpretação do papel da poesia de Camões no devir da poesia da chamada ‘escola cortesã’. Apesar dos problemas inerentes ao facto de ter aceite de forma acrítica os corpora camonianos de Faria e Sousa e do Visconde de Juromenha, a importância da leitura de Rosales foi já por diversas vezes assinalada (cf. Aguiar e Silva, 2008: 89-90). Foram sendo perfilados, entretanto, três tipos genéricos de trabalhos de pesquisa, por vezes entrelaçados num mesmo ensaio: i. trajetória de sonetos concretos em Espanha (réplicas ou imitações, tanto ao nível temático como estilístico); ii. influência de Camões em poetas maiores, como Luis de Góngora, Lope de Vega ou Francisco Quevedo; iii. condição paradigmática da lição poética camoniana – catalizadora do petrarquismo e do neoplatonismo – nos poetas cortesãos andaluzes, como o conde de Villamediana; Diego de Silva y Mendoza, conde de Salinas; ou o príncipe de Esquilache, Francisco de Borja y Aragón. Comecemos por passar brevemente em revista alguns termos mais salientes do ‘caso’ representado por Góngora. Robert Jammes, já há algumas décadas, asseverou: “Il n’est pas question de nier l’influence de Camões sur Góngora, influence qui méritrait à elle seule une étude approfondie” (1967: 143). Góngora, vimos já, publicou o seu primeiro poema na versão de Os Lusíadas de Luis Gómez de Tapia. De entre os textos preliminares da versão salmantina de Os Lusíadas destaca-se o poema laudatório de um Góngora por esses idos estudante em Salamanca. Trata-se, como já foi dito, do primeiro poema publicado por aquele que virá a ser o ‘Homero de Espanha’. Deste texto tem vindo a ser realçado o uso da rima esdrúxula, enquadrável no marco genérico de imitação de modelos poéticos e poetológicos italianos. Também Camões n’Os Lusíadas reverberou o recurso aos sdruccioli. Teria, assim, influenciado directamente o poeta cordovês de apenas dezanove anos? José María Micó, revendo alguns lugares de Dámaso Alonso a este respeito, interpreta o poema laudatório dos autor das Soledades nos seguintes termos: “Creo muy posible que Góngora, compelido por la precipitación, envuelto en el vértigo de la competencia com los poetas de Alcalá, se limitase a cubrir el expediente. Buscó un autor de fama y um artificio em boga” (1990: 27). Insiste, pois, no carácter “automático”, no “modismo” em suma, do uso cultista dos versos proparoxítonos. Seja como for, os primeiros versos do poema paratextual devolvem-nos a alta estima que nutria pela lição camoniana: “Suene la trompa bélica / del castellano cálamo, / dándoles lustre y ser a Las Lusíadas, / y con su rima angélica / en el celeste tálamo, /

encumbre su valor sobre las Híadas, / Napeas y Hamadríadas”. Aguiar e Silva suplementa a leitura dos paratextos desta tradução incidindo também sobre a canção em rimas esdrúxulas do jovem Góngora, retomando a possibilidade – seu alcance e limites – de o autor das Soledades ter potenciado o uso dos versos proparoxítonos a partir de Os Lusíadas, sem perder de vista que este recurso poético vinha tendo outras lições. Modelado na poesia italiana, tem um conspícuo praticante peninsular em Bartolomé Cairasco de Figueroa, que segundo Dámaso Alonso seria o referente maior do poeta cordovês neste particular. A importância do vocabulário proparoxítono e dos casos de rimas esdrúxulas n’Os Lusíadas, estribam no facto de responderem por um “significado cultista que torna a epopeia camoniana um dos elos fundamentais da poesia cultista espanhola” (Aguiar e Silva, 2008: 69). Enfim, Asensio ampliou a linha de investigação que incide sobre acidentais tranferências temáticas: “Pero mucho más que los préstamos temáticos menudos, nos interesaría la influencia de Camões sobre las intenciones estéticas y la técnica de Góngora. Junto a aspectos divergentes cualitativamente, muchos rasgos comunes invitan a considerarlos como dos fases del desarrollo de una común tradición” (1980: 125). Ora, Eduardo Lourenço ensaiou, neste sentido, uma aproximação de Camões e Góngora nos seguintes termos, alinhando precisamente o Polifemo com a lição poética da epopeia camoniana: “O que Don Luis apreciará em Camões é a forma, esse grau até ele desconhecido na Península de autonomia verbal que acaba por se sobrepor ao significado, mesmo excelso, que motiva o canto épico. O que lhe pode interessar em Os Lusíadas é o encadeado metafórico a que ele retirará todos os andaimes visíveis, o referente mitológico tratado como condensação da experiência e seu substituto, as duplas metáforas, o intenso latinismo com uso e abuso do hipérbaton, em suma, todos os sinais de uma autonomia do significante a caminho daquela, inimitável, que no Polifemo parece repousar apenas no gozo da sua íntima luminosidade lúdica” (1980: 10). Por seu turno, Lope de Vega nas suas Rimas, publicadas em 1602, inclui a imitação de um conhecido soneto de Camões que versa uma tópica de ampla inscrição na lírica áurea penisular. Trata-se de “Sirvió Jacob los siete largos años”, composição incluída na mencionada colectânea. Recorde-se que para Edward Glaser este topos bíblico “holds an important place in the Iberian Motivgeschichte of the Golden Age. This widely diffused theme may be traced for its origin to Luís de Camões’ sonnet Sete Anos, wherein the Portuguese poet, by a skillful modernization, transformed the Biblical story

into a paean of constant love. However great the appeal of Camões’ sonnet, later poets were not content merely to follow his path” (Glaser, 1955: 524). Efectivamente, Lope desenvolve em leitura muito própria de “Sete anos de pastor Jacob servia” (cf. Marcos de Dios, 1998b). Ainda, Lope é autor de um soneto afim ao camoniano “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”. Trata-se de “Ir y quedarse, y com quedar partirse”, composição que, para além de constar no mencionado volume, foi incluída na comédia El Príncipe Perfecto – com cenas bilíngues, tal como acontece em diversas peças de Lope –, onde aliás se encastoam outros versos camonianos (cf. Figueiredo, “Camões e Lope”, s.d.; e Glaser, 1954). Aguiar e Silva (cf. 2008: 88) colige ainda outros poemas do poeta ‘Fénix de los ingenios’, como foi conhecido, que replicam sonetos de Camões, entre os quais se encontram “Com uma risa entre los ojos bellos”, que dialoga com “Quando da bela vista o doce riso”. Luis Martín de la Plaza é um poeta destacado do ‘grupo poético antequerano’ que muito importa para o estudo da recepção de Camões em Espanha. Antequera, conhecida como ‘Nova Florença’ pelos idos a que nos reportamos, é um lugar importante da geografia lírica andaluza em que a ressonância dos versos camonianos foi francamente expressiva. Martín de la Plaza, representado na Segunda Parte de las Flores de Poetas Ilustres (1611) – compilada por Juan Antonio Calderón (1896), dando continuidade cancioneiro de Pedro Espinosa já mencionado, “libro de oro, el mejor tesoro de la poesía castellana” segundo o bibliófilo Bartolomé José Gallardo (Ensayo de una biblioteca española de libros raros y curiosos, 1863) – traduziu ou imitou versos camonianos, tendo utilizado a edição de 1598 das Rimas (Aguiar e Silva, 2008: 91). Carolina de Michaëlis estudou o influxo camoniano neste poeta (cf. 1910), considerando que o soneto “Subido en la mitad del cielo ardía” segue “Na metade do Céu subido ardia” de Camões; também “Si cuando te perdí, dulce esperanza” segue “Si quando vos perdi, minha esperança” . Ainda, “Si contra mí, señora, os conjurasteis” imita “Males, que contra mim vos conjurastes”. Jesús M. Morata, na edição da obra completa do poeta andaluz (Martín de la Plaza, 1995), recolhe ainda outros versos com indícios de imitação ou tradução, descartando alguma possibilidade entretanto alvitrada. É o caso do soneto “¡Oh clara fuente, que en pequeño río”, que segundo Fucilla (Estudios sobre el petrarquismo en España, 1960) seria imitação de “Ó claras aguas deste blando río”. O soneto cujo incipit é “Ocasión de mis penas, Lidia ingrata” imita muito de perto, segundo Morata, “Se as penas que por vós, donzela ingrata”; Aguiar e Silva,

por seu turno, vincula-o a outra variante: “Se as penas com que Amor tão mal me trata”. Eis, enfim, outros dois capoversi de sonetos de Martín de la Plaza de conspícuo influxo camoniano, a que aludem tanto Morata como Aguiar e Silva: “Elisa los vestidos revolvía” imita o poema “Os vestidos Elisa revolvia”; e “Memorias tristes de la dulce gloria”, o soneto “Doces lembranças da passada glória”. Por último, no que se refere a Francisco de Quevedo, abordaram o tema das influências camonianas na obra do autor de El Buscón Lida (1939), Alonso (1941) e, mais recentemente, Marcos de Dios (1981). São vários os poemas quevedescos a que tem sido atribuído influxo de Camões. Pela importância que veio a granjear ao poeta, sobreleve-se o caso do soneto “Es hielo abrasador, es fuego helado, / es herida que duele y no se siente, / es un soñado bien, um mal presente, / es un breve descanso muy cansado”, que imita o conhecido “Amor é um fogo que arde sem se ver” (cf. Smith, 1987: 101-104). Cabe destacar, ainda, o soneto de Quevedo cuja primeira quadra reza “Después de tantos ratos mal gastados, / tantas oscuras noches mal dormidas; / después de tantas quejas repetidas, / tantos suspiros tristes derramados”, conspícua versão do soneto camoniano cujo capoverso é “Depois de tantos dias mal gastados”. Walters, ainda, considerou haver um vínculo camoniano no soneto de Quevedo cujos primeiros dois versos são “¿Qué imagen de la muerte rigurosa, / qué sombra del infierno me maltrata?” (1984: 111-112). Morros Mestre, enfim, observou recentemente a existência de confluência no tratamento do mito de Diana e Actéon em Quevedo e Camões (cf. 2007: passim). A publicação póstuma das Rimas, em 1595 e 1598, redimensionou a presença da lírica camoniana no contexto peninsular. Em rigor, o néctar petrarquizante de Camões, nutrido, entre outros, de Bembo, Boscán ou Garcilaso, vinha polinizando a lírica áurea luso-castelhana desde meados da década de setenta do século XVI. Camões é um acontecimento determinante na vigência da aristocracia poética dos “órfãos de Petrarca”. Obra que imita a lição das Rime sparse e que é, por seu turno, fonte de imitação. Obra que é, por conseguinte, singularidade e paradigma. O estudo da presença da lírica camoniana em Espanha ressente-se da modelização quinhentista e seiscentista desta tensão aporética, problematizando a noção de ‘influência’ – sobretudo se entendida com o sentido agonista que a modernidade poética lhe conferiu. Isto porque o ‘trabalho da poesia’ é, como tinha formulado Petrarca, o ‘trabalho do mel’. Seja como for, uma das áreas mais instigantes dos estudos camonianos – que, enfim, devem objectivar um espaço

geopoético e geopolítico plurilingue – prende-se precisamente com a circulação da lírica de Camões no aparelho circulatório peninsular, para retomar a bela fórmula de Eugenio Asensio. Como foi sendo dito, a matéria mobiliza de modo decisivo diferentes problemas, que vão desde o estabelecimento do cânone da lírica camoniana até à investigação da ampla casuística de textos de autores castelhanos que imitam o vate português, modelo petrarquizante e neoplatonizante de fundo enraizamento na formação e leituras de múltiples poetas dos séculos áureos.

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