Representações de gênero em publicidade e a parodização do feminino entre drag queens

August 23, 2017 | Autor: Jo Fagner | Categoria: Publicidade, Drag Queens, Gender Performative
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3er Encuentro de investigadores RELAIP

Representações de gênero em publicidade e a parodização do feminino entre drag queens 1

Joseylson Fagner dos Santos Universidade Federal do Rio Grande do Norte Resumen:

El artículo discute la parodização de la mujer por drag queens, teniendo como objeto la semántica del género por producción de publicidad. Aspectos como la estética y la construcción de la imagen gestual de la mujer se convierten en los principales elementos que sustentan el montaje del personaje drag. Al mismo tiempo, estas formas están presentes en sus estilos de actuación, definición de especificaciones artísticas a través de los diferentes créditos que traducen los códigos de género de manera ritualizada de medios de publicidad. En este sentido, categorías como trompo “top drag”, “caricata”, “transformista” y andrógino reflejan diferentes formas de la abstracción de la hembra. Entre las principales corrientes teóricas utilizadas para articular la discusión, ideas de Judith Butler (2003) sobre la performatividad del género subyacen la parodia por drag queens, mientras que estudios de Erving Goffman (1987) tratar con la cuestión de manera ritualizada de la feminidad en la publicidad de imágenes, explorar aspectos de gestos en la creación de comportamientos expresivos alrededor de este universo. En el momento en que aparece en los anuncios de una serie de información Visual, sirven como soporte para la fabricación de nuevas referencias, aunque se insertan en otro contexto – LGBT – todavía atestiguan la naturaleza artificial del género que se construye en la imaginación de dichas piezas. Palabras clave: drag queens; publicidad; género; femenino.

INTRODUÇÃO Corpos híbridos, imagens ambíguas, transformações corporais que ultrapassam as barreiras de códigos culturais prescritos: a figura da drag queen se representa no indivíduo do sexo masculino que assume o caráter artístico da travestilidade para atuar como personagem do gênero oposto.

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Mestre em Antropologia Social; professor no Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected]

Nessas circunstâncias, a experiência de “montagem2” pode ser caracterizada em cenas de espetáculos produzidos em lugares e eventos de sociabilidades LGBT, assim como em outros espaços lúdicos, como os meios de comunicação e festas privadas. Por outro viés, a prática de “fazer drag” se localiza em uma economia dos gêneros que transpõe conceitos estéticos e profissionais e se revela inscrita em subjetividades específicas às relações construídas por esses sujeitos com lógicas de identidades e categorias sociais de divisão sexual (Santos, 2012).

Dentre os procedimentos que caracterizam a “fabricação” da imagem feminina pelos atores, os principais dizem respeito a uma série de truques de maquiagem, indumentárias e próteses que são posicionadas ao corpo a fim de simular a aparência da mulher. Além destes elementos, fatores como postura corporal, entonação da voz e signos gestuais complementam a transformação, ao mesmo tempo em que remete à necessidade de referências variadas sobre o universo feminino para a constituição do novo personagem.

Os condicionantes da montagem drag queen se definem, portanto, em um esquema semântico que incorpora alusões aos códigos culturalmente conhecidos a respeito de imagens e comportamentos relacionados à mulher, e simbolizados na linguagem artificial de recursos plásticos e temporários, uma vez que duram apenas o período da performance. Nesse sentido, os meios de comunicação fornecem indicadores que auxiliam a trabalhar tal construção, especialmente quando se trabalha com figuras de artistas, modelos e celebridades interpretadas pelas drags.

1.1. Gêneros, códigos e categorias

Donna Haraway (2004) contextualiza que o conceito de “gênero” foi articulado no contexto das mulheres feministas do pós-guerra para contestar a naturalização da diferença sexual e apontar para as histórias sobre opressões marcadas por uma “ficção reguladora” na oposição entre cultura e natureza na concepção do sistema sexo-gênero. Nesses termos, as discussões sobre fatores

2 “Montagem” é um terno específico utilizado pelas drag queens e se refere às técnicas de metamorfose de gênero utilizadas na construção do personagem drag, por meio da aplicação de artefatos protéticos e recursos de maquiagem, entre outros detalhes.

biológicos e a atividade humana serviram de objeto para abordagens teóricas sobre o lugar da mulher nas hierarquias de culturas e sociedades.

No panorama geral das teorias feministas, os diferentes significados atribuídos a mulheres e homens nas relações de poder priorizam os últimos em detrimento às primeiras. Na articulação das ideias, o debate sobre espaços públicos e privados é acompanhado de um quadro de informações a respeito de características consideradas natas que protagonizam a segregação por meio da divisão sexual. Desse modo, os estudos contestam os dados anatômicos e biológicos como referencial único para explicar diferenças entre os sexos.

A obra de Michel Foucault (1998) contempla a análise histórica sobre a produção de discursos no interior das instituições de poder. Para o filósofo, a vida social dos indivíduos é regulada por uma matriz normativa heterossexual que orienta e disciplina as relações interpessoais dos sujeitos. Tal discurso é organizado e estabelecido pela igreja, pelo estado e pela escola no sentido de construir “verdades” a respeito das experiências sexuais e afetivas que priorizam aspectos essencialmente reprodutivos, de onde se explicam as interdições e proibições até então conhecidas.

Sendo assim, para entender “gênero” é necessário visualizar a organização de discursos sobre o corpo sexuado (macho e fêmea), por meio dos quais são atribuídos significados que acionam categorias de vivências e comportamentos (masculino e feminino) e que, socializados, manipulam e estabelecem identidades sociais (homens e mulheres). Mais uma vez, uma categoria definida culturalmente (gênero) é atribuída a um determinante biológico, da natureza (sexo), o que indica a problemática das relações construídas no modelo heterossexual a partir do momento em que se observa a linearidade obrigatória entre aspectos culturais e dados anatômicos do indivíduo.

No contexto das especificidades reivindicadas por drag queens, travestis, transexuais e outras pessoas dissidentes a tais normas, a teoria construída por Judith Butler (2003) sinaliza caminhos para compreender palavras e papéis assimilados às definições de universos masculinos e femininos.

A autora observa que as verdades sobre o gênero são construídas por meio de atos performativos, que incluem falas, gestos e a toda a produção de si em determinado universo simbólico associado a homens e mulheres. Na concepção da filósofa, o gênero está inscrito em outro campo, alheio aos determinantes fisiológicos sugeridos pela ideia de natureza que até então organizaria tais modelos em uma norma sexista.

Especificamente no caso das drag queens, Butler (2003) ainda pontua a respeito da parodização do gênero feminino por meio da estilização repetida de signos visuais, comportamentais e gestuais culturalmente atribuídos à figura da mulher, que incorporados ao corpo masculino anunciam o caráter artificial destes códigos. Uma vez que sua relação com os dados biológicos encontra-se sob a tutela da matriz heterossexual, gênero se define em caráter performativo, para afirmar um lugar social reservado a organismos sexuados em culturas e sociedades.

As técnicas empregadas no ocultamento das características masculinas e no desenho de formas femininas fabricam o corpo da drag, e desse modo o gênero é constituído na expressão e vivência do universo semântico da mulher, que superam os limites tecnológicos das próteses e indumentárias. Nesses termos, a nominação, a linguagem corporal pós-transformação e a mudança de comportamento sublinham aspectos da genderização dos sujeitos, onde se efetiva a metamorfose drag.

1.2. Goffman e a ritualização do feminino na publicidade

No âmbito das representações de gênero nos meios de comunicação, o autor Erving Goffman (1987) desenvolveu um estudo utilizando fotografias comerciais para ilustrar e discutir pequenos comportamentos que são associados ao sexo, pensando sobre como a publicidade apresenta uma visão sobre os universos feminino e masculino na produção fotográfica. No material reunido por Goffman, interessam as regras de criação de encenações para explorar arranjos sobre produção de gênero nas peças publicitárias, que posteriormente servem a fins de argumentos de venda.

Em geral, o material coletado sinaliza a hierarquia tradicional dos sexos, alheia ao sexo masculino, em posições de subordinação e em expressões de docilidade, submissão e conciliação. Outros aspectos explorados pelo autor dizem respeito a jogos de mãos, posições inclinadas do corpo, flexão do joelho, o riso, o olhar, o recolhimento da cabeça, entre outros. Todas estas observações caminham em direção a uma ritualização do gênero que se constrói em direção ao universo semântico feminino, no sentido em que são estruturadas em cenários que atendem a simulação de situações espontâneas, que findam por naturalizar tais gestos e sinais como típicos da mulher biológica, indicando também um aprendizado sobre tal gênero.

Levando em consideração o aspecto estudado e ilustrado por Goffman (1987), as codificações predominantes na mídia publicitária são estilizadas e repetidas, da mesma forma que os atos performáticos pelas drag queens constatados por Butler (2003), e que aqui sinalizam a percepção de um idioma ritual padronizado em relação ao gênero. Assim também é observado quando se isola a figura do homem, principalmente na estetização da força, da racionalidade e de indícios de dominação, algumas das características ao campo semântico da masculinidade.

A pesquisadora Selma Garrini (2008) traz elementos para pensar acerca das significações dos valores culturais ressaltados nos ideais de beleza do corpo feminino na publicidade. A autora menciona que, a partir do final do século XX e início do século XXI, a tentativa de controle sobre o corpo e domínio sobre a natureza é central na definição da forma física feminina. O destaque dado ao corpo ultramedido é enfatizado nas mensagens que classifica como sucesso os aspectos de beleza, juventude e erotismo veiculado nas imagens de mulheres de corpo magro e firme, ao mesmo tempo em que o corpo desmedido – caracterizado especialmente pela presença de gordura e flacidez – simboliza a indisciplina e o fracasso contra a natureza.

Os estudos acima articulam conceitos à aparência física e pequenos comportamentos expressivos que são comumente associados à mulher na publicidade. Considerando a lógica de oferta e consumo na qual se inserem estes elementos, as observações pontuadas pelos autores servem à reflexão sobre como se constitui o idioma ritual na mídia publicitária em acordo ao sistema de produção semântica dos gêneros. Tais aspectos remetem não somente à reprodução de

estereótipos culturais, mas fundamenta a construção e disseminação de linguagens que fortalecem a regulação de imagens hegemônicas a respeito do ideal de mulher, utilizado pelas drag queens.

1.3. Estilos, performances e diferentes femininos

Ao interpretar personagens femininos, as drag queens tomam como principal referência o meio artístico e de celebridades. A imitação de cantoras, modelos e atrizes é um recurso comumente adotado na concepção de dublagens e espetáculos em seus locais de atuação profissional. Ao mesmo tempo, tais referências auxiliam na concepção dos elementos cênicos, que caracterizam desde a maquiagem até as possibilidades variadas de números especializados.

Exemplo disso é a subcategorização das drag queens de acordo com seus estilos de montagem e apresentação. Nesse quesito, são importantes a aparência, a postura, a linguagem e todos os demais aspectos que caracterizam a constituição do personagem, e o conjuntos destes elementos irá caracterizar tipos de performance drag queen, a saber: top drag, caricata, transformista, andrógino e outras variações culturais observadas em questões regionais e temporais.

A sensualidade da mulher é essencialmente explorada na formulação da imagem da “top drag”. Semelhantes às modelos internacionais, elas geralmente são magras, deixam a maior parte do corpo exposta em sua indumentária, desfilam e “fazem carão3” para o público. São ultrafemininas e exploram tal hipérbole nos traços que compõem o rosto (sobrancelhas finíssimas, acabamento no contorno dos olhos, volume da boca, definição de outros traços da face), assim como na simulação das curvas do corpo (cintura fina e quadris largos, seios e cabelos volumosos) e na composição da gestualidade (movimentos delicados, principalmente nas mãos e no pescoço, além do andar).

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A expressão nativa “fazer carão” indica uma expressão facial rígida que consiste em ficar séria e autoritária, como nas capas de revistas de moda internacional, transmitindo a ideia de poder.

O oposto da “top drag” é encontrado na imagem da “caricata”, que explora um perfil mais cômico, voltado para a estetização do grotesco. Humoristas por excelência, elas apresentam formas propositalmente desconsertadas e desproporcionais (maquiagens borradas, traços, cores e contornos extravagantes), apropriação de elementos que representam a feiura (olhos vesgos, próteses dentárias incompletas ou salientes, perucas com cabelos desgastados e ressecados) e a postura deselegante e engraçada (gestos mecânicos, comédia no tratamento do vocabulário, na definição da linguagem corporal que explora os detalhes da aparência). Todos estes aspectos anunciam a formulação da caricata tendo como referencial principal a contradição aos elementos de beleza comumente aprendidos pelas “top drags”.

As drags “transformistas” arquitetam outra representação feminina. Apesar da proximidade com o ideal das “top drags”, estas primeiras utilizam recursos de hipérbole da aparência de forma moderada, buscando maior semelhança com o ideal de mulher biológica, menos artificial. Na interpretação de divas da música ou do cinema, estes personagens assimilam códigos que estão mais presentes na indumentária (vestidos longos, roupas elegantes, perucas de cabelos naturais, maquiagem sóbria e sem contornos, formas, cores ou contrastes exagerados) e se diferenciam das “tops” especificamente pela escolha da música e do figurino, uma vez que se dedicam à interpretação das divas mais na questão de imitação do personagem do que de dublagem da música, onde também se percebe menor importância à dança.

No exemplo dos andróginos (também conhecidos como “ciberdrags” ou ainda como “go-go drags”), a ambiguidade masculino-feminino é construída de forma mais efetiva na justaposição dos códigos de gênero, uma vez que o corpo do homem não é totalmente ocultado na hora de assumir os signos da imagem da mulher. Nesse modelo, o destaque às formas masculinas é dado na concepção visual (ausência de peruca, ou de próteses do seio – deixando o peito masculino descoberto – ou até mesmo o uso de barba), bem como no outro arsenal linguístico-corporal (voz, andar, postura).

Todas estas possibilidades refletem diferentes conceitos sobre o gênero feminino na apropriação da personagem drag queen. O exame de tais especificidades permite analisar que a imagem

hegemônica da mulher antes funciona como um modelo para a construção de novas subjetividades do que um referencial que causa detrimento às outras concepções femininas. No caso da publicidade e de outras mídias de comunicação, a exploração excessiva de um corpo ultramedido em detrimento aos sinais do corpo desmedido (Garrini, 2003) auxilia no discurso sobre múltiplas feminilidades que são acionadas pelas drags. Uma vez que até o sistema de produção sexo-gênero se apresenta como um processo artificial e performático, o ideal de mulher simbolizado pelos estudos sobre a mídia publicitária sofre o mesmo impacto, sugerindo a existência de femininos plurais, ricos em especificidade e subjetividade. Conclusão Uma relação principal entre os estudos sobre drag queens e as questões sobre gênero na mídia publicitária é construída: quando os personagens drag atuam de forma política, questionando a fixidez do sistema heterossexual na produção de indivíduos, as pluralidades encontradas na constituição de suas subcategorias indicam possíveis falhas nos ideais estéticos e de consumo hegemônicos para mulheres. Ao mesmo passo que os artistas incorporam ambos os sinais (de beleza e de feiura) em personalidades fortes e espetáculos de luxo, tais conceitos são interpretados e ressignificados contemplando, principalmente, a valorização das multiplicidades de comportamentos e estéticas que podem ser assumidas por diversos tipos de mulheres. Referências Bibliográficas

BUTLER, Judith (2003): “Problemas de gênero: femininos e subversão da identidade”, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira. FOUCAULT, Michel (1985): “História da Sexualidade I. A vontade de saber”, Rio de Janeiro, Graal. GARRINI, Selma (2008): “Do corpo desmedido ao corpo ultramedido. Reflexões sobre o corpo feminino e suas significações na mídia impressa”, em MACHADO, M. B.; QUEIROZ, A. e ARAÚJO, D. C. (Orgs.), História, Memória e Reflexões sobre a Propaganda no Brasil, Novo Hamburgo, RS, Feevale. GOFFMAN, Erving (1987): “Gender advertisements”, New York, HarperTorchbooks.

HARAWAY, Donna (2004): “‘Gênero’ para um dicionário marxista: a política sexual de uma palavra”, em Cadernos Pagu, vol. 22, 2004, pp. 201-246. SANTOS, Joseylson Fagner dos (2012): “Femininos de montar: uma etnografia sobre experiências de gênero entre drag queens”. Dissertação de mestrado, Natal, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil.

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