SÃO PAULO: FALTA DE ÁGUA OU DE AÇÃO GOVERNAMENTAL?

September 28, 2017 | Autor: Cirineu Costa | Categoria: Public Administration
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São Paulo: Falta de Água ou de Ação Governamental? ítulo do documento]

Cirineu José da Costa Eng - MSc

ETE BARUERI

1. INTRODUÇÃO

Na história recente do Estado de São Paulo não existe registro de uma situação hídrica tão precária como a que o Estado vive atualmente. É claro que a situação populacional e consequentemente de consumo de água aumentaram substancialmente. São Paulo recebeu o maior fluxo migratório vindo de todas as regiões do país e uma forte imigração que trouxe para o Estado um número precioso de mão-de-obra especializada. O adensamento populacional foi uma consequência natural do afluxo de pessoas, mas faltou o planejamento urbano para acolher as pessoas e supri-las dos bens essenciais necessários para uma vida digna no meio urbano: moradia e saneamento básico. Por moradia devemos entender não só o lugar para morar, mas também todos os acessórios necessários para viver bem e em harmonia com o meio-ambiente. Inclui-se terreno urbanizado com água e esgoto tratados, coleta e processamento do lixo, energia elétrica, transporte público, saúde, educação, esporte e lazer. Mas, pobres de nós brasileiros, colonizados que fomos pelos portugueses com uma colonização exploratória que não objetivava o aparecimento de um país novo e sim a manutenção de curral fornecedor de ouro, pedras preciosas, açúcar e outros produtos básicos que a Coroa Portuguesa trocava na Europa pelos produtos de luxo que demandava e por isso nossos povoados, nossas vilas e nossas cidades nasceram, cresceram e envelheceram com o velho hábito de jogar todo o esgoto e tudo que não servia nos riachos, rios, lagos e praias. Já tivemos tempo o suficiente (1822-2014) para aprendermos por nós mesmos. Já deveríamos ter uma “escola” própria de ciência ambiental tendo em vista que somos (ou éramos) proprietários de um dos maiores bancos genéticos de flora e fauna do mundo e da maior reserva de água doce do planeta!!!....e estamos passando falta de água....ou será falta de AÇÃO?

2. A URBANIZAÇÃO

As vilas e os povoados nasceram sempre às margens de um curso d’água, de um lago ou no litoral. Isso facilitava o acesso das pessoas à água para beber, lavar roupas e outras necessidades. Facilitava também o descarte de detritos que eram lançados diretamente no curso d’água, a jusante do povoado, pois assim não prejudicava o uso da água pelos moradores locais. Foto:http://www.casaemercado.com.br/noticiasExibir.php?FhIdNoticia=2609

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Os portugueses desembarcaram em São Vicente. A Capitania de São Vicente foi fundada por Dom João III em 1534 visando o povoamento e a defesa territorial. Teve como donatário Martim Afonso de Sousa e progrediu economicamente devido ao cultivo de cana-de-açúcar. Logo após a fundação da Vila de São Vicente foram criados outros povoados como Santos, São Paulo e Santana de Mogi. A colonização irradiou-se para o interior à procura de índios para escravizar, riquezas naturais e minerais. O objetivo era encontrar riquezas e leva-las para a Europa. O Colonizador não tinha a preocupação de fundar cidades, urbanizar, sanear e desenvolver. A maioria sonhava em ficar rico e voltar para a Europa. Assim as vilas e povoados foram criados como se fossem provisórios e transformaram-se em permanentes com estrutura de provisórios. Nosso povo, oriundo deste matiz, cresceu sem desenvolver o espírito de construir cidades definitivas e estruturadas. Elas nasciam provisórias, cresciam e iam adaptando-se às crescentes demandas daqueles que chegavam e ficavam. Passaram-se anos, décadas e séculos e não aprendemos a planejar nossas cidades urbanisticamente e elas estão até os dias de hoje, pagando um preço muito alto pela falta de estrutura básica, incluindo-se a deterioração dos cursos d’água devido à poluição constante causada pelos esgotos primários residenciais, comerciais e industriais.

Rua típica de São Sebastião-SP onde notamos a forma característica das ruas inclinadas para a vazão da água de chuva sobre a superfície e a falta de galerias para águas pluviais e de esgoto.

Foto:http://brazilian-coast.com/cms2/sites/default/files/imagepicker/1/sao-sebastiao_10.jpg

Com o crescimento das principais cidades, as autoridades passaram a construir galerias de água pluviais e rede para coleta de esgotos, pressionadas pelo desenvolvimento da indústria de construção civil que trouxe inovações para a população mais abastada como os banheiros com vasos sanitários e descargas de água com um simples apertar de um botão, chuveiros elétricos que favoreciam o banho várias vezes ao dia. A demanda por vias de descarte da água usada nas cozinhas e banheiros forçou a instalação da coleta, mas não forçou os administradores públicos a instalar estações de tratamento dos efluentes que foram e ainda são jogados “in natura” nos nossos rios, lagos, represas e praias.

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3. A HIDROGRAFIA DE SÃO PAULO

São Paulo possui uma rica hidrografia e podemos destacar: a. Bacia do Rio Paraíba do Sul - compreende os rios: Paraibuna, Paraitinga, Jaguari, Uma, Buquira-Ferrão, Embaú-Piquete, Bocaina e Pitangueiras-Itagaçaba. Abrange uma área de drenagem de 14.444,00 km² e abriga uma população de aproximadamente 1.992.381 pessoas (dados de 2011). b. Bacia da Vertente Litorânea – compreende os rios: Pardo, Camburu, São Francisco, Grande, Itamambuca, Cubatão, Mogi, Quilombo, Jurubatuba, Itapanhau, Guaratuba, Mamabu, Aguapeu, Preto, Guarau, Branco, Ribeira, Açumgui, Capivari, Pardo, Turvo, Juquiá, São Lourenço, Jacupiranga, Itapirapuã, Uma, Aldeia e Itariri. Abrange uma área de drenagem de 21.834,00 km² e abriga uma população de aproximadamente 2.308.773 pessoas (dados de 2011). c. Bacia do Rio Tietê – compreende os rios: Atibaia, Atibainha, Cachoeira, Camanducaia, Capivari, Corumbatal, Jaguari, Jundiaí, Piracicaba, Tietê, Pinheiros, Tamanduateí, Claro, Paraitinga, Jundiaí, Biritiba-Mirim e Taiaçupeba, Sorocaba, Sorocabuçu, Sorocamirim, Pirajibu, Jundiuvira, Murumbu, Sarapui, Tatuí, Guarapó, Macacos, Ribeirões, Peixe, Alambari, Capivari, Araqua, Jacaré-Guaçu, Jacaré-Pepira, Dourado, São Lourenço, Batalha, Ribeirão dos Porcos, Paraná, Água Fria, Oficinas, Patos, Santa Bárbara, Ferreiros, Mato Grosso, Lajeado, Baguaçu e Baixotes. Possui área de drenagem de 72.361,00 km² e uma população de 29.165.263 pessoas (dados de 2011).

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d. Bacia do Rio Paranapanema – compreende os rios: Santo Inácio, Jacu, Guarei, Itapetininga, Turvo, Itararé, Taquari, Apiá-Açu, Paranapitanga, Almas, Capivara, Novo, Pari, Pardo, Santo Anastácio, Paranapanema e Paraná. Possui área de drenagem de 51.833,00 km² e uma população aproximada de 1.865.517 habitantes (dados de 2011). e. Bacia do Rio Grande – compreende os rios: Sapucaí-Mirim, Prata, Sapucaí-Guaçu, Capivari, Inocêncio, Cachoeira, Lajeado, Melos, Paiol Velho, Paiol Grande, Bernardos, Pardo, Canoas, Araraquara, São Pedro, Tambaú, Verde, Fartura, Canoas, Carmo, Grande, Bagres, Mogi-Guaçu, Peixe, Jaguari-Mirim, Grande, Velho, das Perdizes, Agudo, Indaiá, Rosário, Baranhão, Areias, Pitangueiras, Turvo, Palmeiras, Santana, Anhumas, Sucuri, Cruzeiro, Água Limpa, Jacaré, Barro Preto, Pedras, São Domingos, Cachoeirinha e Ribeirão da Onça. Sua área de drenagem é de 56.961,00 km² e uma população de aproximadamente 4.856.062 habitantes (dados de 2011). f. Bacias do São José dos Dourados e Aguapeí/Peixe – compreende os rios: Aguapeí, Tibiriçá, Caiquanques, Marrecas, Peixe, Garça, Mandaguari, Veado, São José dos Dourados e Paraná. A área de drenagem é de 30.748,00 km² e abriga uma população de aproximadamente 1.035.687 habitantes (dados de 2011). Apesar de ser rica, a hidrografia paulista apresenta sérios problemas causados tanto pelo adensamento populacional quanto pelo desenvolvimento agrícola e industrial. A poluição e assoreamento dos rios tem sido um problema constante para as autoridades que estudam e para aquelas que são responsáveis pela manutenção da boa qualidade dos recursos hídricos. A água deixou de ser considerada um BEM INFINITO. Hoje a água é considerada como uma matéria-prima indispensável para o desenvolvimento econômico e social de qualquer sociedade. Pessoas e empresas necessitam de água e, se nada for feito para a recuperação da qualidade dos mananciais, deverão pagar cada vez mais caro por um bem que se tornará cada dia mais raro.

Fonte: Iritani e Esaki, 2009

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Os rios Tietê/Pinheiros/Tamanduateí que atravessam a área urbana da região metropolitana de São Paulo são o exemplo clássico do descaso com o saneamento básico. Desde a sua nascente em Salesópolis na serra do Mar o Rio Tietê atravessa o Estado de São Paulo, banhando 62 municípios. É considerado o rio mais poluído do Brasil por receber o esgoto doméstico e industrial dos municípios por onde passa e principalmente o esgoto da região metropolitana da Capital paulista. Dos 34 municípios que compreendem a região metropolitana de São Paulo 19 não possuem uma única estação de tratamento de esgotos, lançando todos os seus dejetos diretamente nos córregos e rios que deságuam no Tietê. São lançados diariamente cerca de 690 toneladas de esgoto no rio mais importante do Estado. As obras de despoluição do Rio tem se concentrado em ações de desassoreamento visando única e exclusivamente o aprofundamento da sua calha para diminuir os efeitos das enchentes que causam enorme dano à imagem dos políticos governantes. O Estado de São Paulo recebeu vultosos recursos a fundo perdido de governos estrangeiros para investir na despoluição do Rio, mas o dinheiro virou pó. Plantaram grama nas suas margens e a enchente levou e depois concretaram as suas margens deixando todas as bocas de esgoto que lançam enorme volume de carga poluidora sem nenhum controle das autoridades fiscalizadoras. Dentre as águas das represas que abastecem a Grande São Paulo, a Billings mostra valores mais altos de DBO (demanda bioquímica de oxigênio) média anual, excedendo o limite CONAMA em alguns anos, enquanto a Guarapiranga apresenta valores dentro dos padrões. As situações mais críticas são observadas nos rios Tietê (zona metropolitana de São Paulo). A contaminação de rios por efluentes doméstico e industrial e resíduos sólidos encarece o tratamento de água para abastecimento público e começa a gerar situações de escassez de disponibilidade de água de qualidade em áreas com abundantes recursos hídricos. A expansão do saneamento básico, especialmente da coleta e tratamento de esgotos e a proteção de nascentes, mananciais, várzeas e áreas no entorno dos rios, são ações urgentes e necessárias para a conservação dos recursos hídricos e uma das saídas para a crise de abastecimento de água que vive hoje o Estado de São Paulo. Com dois rios de tamanha envergadura atravessando o Município de São Paulo (Tietê e Pinheiros) a cidade está sem água para fornecer à população. Motivo: não fizemos a lição de casa. Continuamos, como os nossos descobridores portugueses, a jogar toda a nossa sujeira nos rios!(Fonte: http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/recursosnaturais/ids/ids2010.pdf).

O mapa abaixo mostra o Índice de Qualidade da Água Bruta para fins de abastecimento público das águas interiores do Estado de São Paulo, publicado pela CETESB. Vemos que a situação, já em 2010, não era muito boa.

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4. A COBERTURA FLORESTAL DE SÃO PAULO

Fonte: SMA/IF, 2010)

O desmatamento objetivando a agricultura e a pecuária foi o responsável pela destruição da quase totalidade da cobertura vegetal original de São Paulo. O Estado possui uma área total de 248.222,801 km² e 23.056,00 km² de remanescente de Mata Atlântica (9,29%) e aproximadamente 24 km² são desmatados por ano (0,01%) (dados de 2008). (Fonte: http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/recursosnaturais/ids/ids2010.pdf)

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A falta de cultura conservacionista ambiental fez com que quase toda a cobertura vegetal original fosse destruída para dar lugar à agropecuária, agricultura (principalmente o café, cana-de-açúcar, soja e algodão), instalação de parques industriais e novos assentamentos populacionais. A falta de proteção às nascentes, o assoreamento de cursos d’água, a descarga de agrotóxicos oriundos da atividade agrícola e a poluição industrial e urbana trouxeram como consequência a escassez de água e a sua má qualidade. Falta ação fiscalizadora e punitiva sobre os agentes poluidores e sobre as autoridades que se recusam a fazer a lição de casa. Falta política de reflorestamento impositiva, obrigando o cumprimento do mínimo legal. Falta coletar e tratar os efluentes industriais e domésticos, pois os usuários pagam a devida taxa à concessionária que por sua vez não consegue cumprir com sua obrigação de coletar e tratar o esgoto.

5. A SITUAÇÃO POPULACIONAL DE SÃO PAULO

DISPONIBILIDADE PER CAPITA DE ÁGUA

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No mapa acima vemos que a situação da região que engloba a área metropolitana de São Paulo já apresentava uma situação crítica em 2010 em relação à disponibilidade perca pita de água para consumo humano. Medidas urgentes deveriam ter sido tomadas levando-se em conta também as previsões meteorológicas e o nível dos reservatórios que atendem a demanda da grande São Paulo. Nada foi feito esperando-se um milagre dos deuses que não aconteceu. A crise hídrica paulistana estava prevista em todos os relatórios oficiais que desde 2010 alertavam as autoridades para o caos que se aproximava com as água poluídas, falta de chuva, demanda crescente e falta de obras de infraestrutura para obter mais água e estancar a degradação dos mananciais existentes e em uso. Nas áreas 5, 6 e 10 do mapa a disponibilidade hídrica chega a menos de 1500 m³/ano/habitante. A população instalada no Estado de São Paulo, de acordo com o IBGE: Capital População estimada 2014 População 2010 Área (km²) Densidade demográfica (hab/km²) Número de Municípios

São Paulo 44.035.304 41.262.199 248.222,801 166,23 645

O Estado mais populoso do país também gera o maior volume de esgotos e de lixo que ainda não possuem destinação correta. No mapa abaixo vemos a situação do tratamento de efluentes domésticos. As áreas em vermelho e amarelo indicam situação péssima e regular.

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Se os serviços de fornecimento de água e tratamento de esgotos estivesse à disposição de toda a população e das empresas e se o lixo tivesse a destinação final ambientalmente correta com certeza o Estado de São Paulo não estaria passando por uma situação tão crítica em relação à sua disponibilidade hídrica e risco ambiental.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Unfortunately, humans have proved to be inefficient water users. (The average hamburger takes 2,400 liters, or 630 gallons, of water to produce, and many water-intensive crops, such as cotton, are grown in arid regions.)” Fonte: http://environment.nationalgeographic.com/environment/freshwater/freshwater-crisis/

Vamos apresentar algumas fotos que mostram a situação atual do Rio Tietê, como ele era antes de ser poluído e como está hoje.

Regata do Clube Espéria – na Marginal do Tietê – Velhos tempos...

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Fonte: http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-jundiai/noticia/2013/05/imagens-mostram-espuma-formada-pelapoluicao-no-rio-tiete.html

Fonte: http://meioambientesjp.no.comunidades.net/index.php?pagina=1925142142

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Rio Tietê, na Região de Salto – Imagem de um rio morto! Fonte: http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2014/09/18/trecho-morto-do-rio-tiete-encolhe70.htm

A despoluição de um rio não é feito impossível. Abaixo mostramos algumas fotos que exemplificam casos de sucesso ocorridos em outros países.

Rio Sena em Paris

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Rio Tamisa em Londres

Rio Cheonggyecheon em Seul

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Solução existe e necessita ser buscada pelas autoridades paulistas se quiserem realmente solucionar a denominada “crise hídrica”. Não existe falta de água, Existe falta de água de boa qualidade. A água não é de boa qualidade porque nós, dignos habitantes do Estado, não estamos fazendo o dever de casa. Que se faça o devido esclarecimento à população e que o trabalho seja iniciado de maneira séria retirando todo o esgoto lançado nos rios com a devida coleta e tratamento. Que seja feito o lançamento nas contas. Que cada um pague a sua cota e que o Governo faça a sua parte com seriedade senão morreremos de sede afogados num mar de esgotos!

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