Território do associativismo

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Território do

ciati

vismo Raramente o adepto dirá “o meu clube joga hoje”. Em vez disso, dirá “hoje jogamos nós”. Este jogador número doze sabe que é ele quem sopra os ventos de fervor que empurram a bola quando ela dorme, tal como sabem os outros onze jogadores que jogar sem os adeptos é como dançar sem música1. Eduardo Galeano, El Fútbol a Sol y Sombra

1  GALEANO, Eduardo – El fútbol a sol y sombra. 2ª edição. Madrid: Siglo XXI, 2005, p. 7.

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História (  s  ) dos clubes, sociedades e associações locais anteriores ao bairro da Prodac

Uma das equipas dos primeiros anos do Oriental, em 1953. [Arquivo fotográfico do Clube Oriental de Lisboa]

João Santana da Silva historiador

Quem vê José Maria, com a sua caraterística bata branca, a passar discretamente pelos corredores do Centro de Promoção Social da Prodac, não o imagina em campo a medir forças com Eusébio. Grande erro. José Maria da Silva – Zé Maria para quem o conhece bem –, atualmente responsável pelo refeitório do Centro, aprendeu de perto a árdua tarefa de tentar travar o “Rei Eusébio”. Para além disso, viveu os tempos de ouro do Clube Oriental de Lisboa, histórico ex-líbris das coletividades de Marvila e arredores. José Maria fez parte da grande equipa do Oriental que subiu, pela última vez, à primeira divisão nacional de futebol e aí se manteve por duas épocas, entre 1973 e 1975. Um feito só antes conseguido pelo clube nos anos 1950, embora com menos impacte do que viria a ter vinte anos depois, com o bairro da Quinta do Marquês de Abrantes muito mais populoso.

O quase desconhecimento deste pormenor do percurso pessoal de José Maria, bem como o seu caráter reservado e pouco dado à publicidade dos tempos que guarda com muita estima, reflete bem a forma de estar dos marvilenses. Quem passa de carro, sem parar, pela freguesia também não se apercebe da sua história desportiva e glórias passadas. Nem descobre facilmente a abundância de coletividades que existiram e, em alguns casos, ainda existem. Os moradores da Quinta do Marquês de Abrantes e do Bairro Chinês lembram-se, no entanto, de uma outra realidade. De quando bastava caminhar algumas dezenas de metros para entrar numa coletividade ou clube, onde se encontravam amigos, partilhavam novidades e planeavam jogos de futebol ou bailes. De muitas dessas coletividades já só resta a memória ou uma casa em ruínas. Mas de todas sobrevive a marca deixada nas vidas de quem as frequentava.

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O onze inicial do Chelas Futebol Clube nos seus primórdios. Nas equipas do clube, fundado em 1911, jogavam então muitos moradores dos bairros locais. [Arquivo fotográfico do Clube Oriental de Lisboa]

SEMENTES DE PERTENÇA Os primeiros grupos desportivos do bairro

2  Chelas Futebol Clube, na página do Clube Oriental de Lisboa. Disponível em www. oriental.pt [Consult. a 19 de março de 2014]. 3  Marvilense Futebol Clube, na página do Clube Oriental de Lisboa. Disponível em www. oriental.pt [Consult. a 19 de março de 2014].

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O fim de semana é para descansar. E na zona de Marvila, Xabregas, Beato e Poço do Bispo esta regra parecia ser, durante muito tempo, uma regra de ouro. Zona operária por excelência desde o século xix, os bairros orientais albergavam muitos milhares de trabalhadores das fábricas circundantes até bem perto do final do século xx, quando a maioria dessas fábricas encerrou portas. Para compensar a longa semana que parecia não terminar e o enorme cansaço deixado pelos trabalhos pesados exigidos em muitas das indústrias, era comum o aparecimento de diversas associações, coletividades e equipas desportivas. Apesar de já não existirem, são bem conhecidos dos habitantes locais os casos do Chelas, do Marvilense e do Fósforos. Estes três clubes, que mais tarde se fundiriam para dar origem ao duradouro Clube Oriental de Lisboa – vulgarmente designado pela versão abreviada de Oriental –, são provavelmente os primeiros exemplos de grande adesão popular a grupos desportivos nesta zona da capital. Existentes num período de crescimento populacional em Marvila e arredores, bem como de profusão de novas e grandes fábricas, estes clubes preenchiam muito do tempo de lazer dos operários. A 25 de dezembro de 1911, fundou-se, pois, o Chelas Foot-Ball Grupo, considerado um dos mais antigos clubes da capital, tendo-se oficializado e inscrito na Associação de Futebol de Lisboa apenas em 1918, quando assumiu o nome de Chelas Football Club2. Tinha campo em Chelas e sede numa casa da Calçada João Gastão que viria a ser o “posto 28”, espaço de prestação de cuidados médicos. A importância deste clube é reforçada pelo atual presidente do Oriental, José Fernando Nabais. “Não dizemos que temos cem anos de idade, dizemos

que temos cem anos de história, porque a nossa história começou no dia em que foi fundado o clube mais antigo dos que deram origem ao Oriental.” O dirigente desportivo não cede quanto à importância de Chelas e do seu clube para a história dos marvilenses. “Marvila era Marvila. Não havia parte nova. Depois, com os bairros novos, é que a freguesia alargou em termos habitacionais”, diz, acrescentando com alguma tristeza que, “como o nome de Chelas ficou estigmatizado, começou a mudar-se a toponímia de orientação e denominação dos bairros. Retirou-se o nome de Chelas e começou a pôr-se por cima: Marvila; Marvila; Marvila”. Marvila também deu, muito cedo, o seu nome a um clube desportivo: o Marvilense Foot-ball Club, fundado a 7 de fevereiro de 19203. Este clube tinha a sua sede no largo do Poço do Bispo, precisamente no espaço mais tarde aproveitado para instalar a sede do Oriental.

Para além da rivalidade, as equipas locais partilhavam ainda uma caraterística que não era tão comum noutros bairros e zonas de Lisboa: uma forte identidade bairrista.

Batendo-se com os adversários inicialmente num campo em Sacavém, viria a ter o seu próprio espaço para jogos no terreno do futuro Campo Eng.º Carlos Salema, lado a lado com a Quinta dos Alfinetes e o campo do Fósforos. Este último clube, fundado a 1 de setembro de 1920 sob o nome de Grupo Desportivo do Pessoal da Companhia dos Fósforos, corporizava na perfeição o esforço de criar grupos lúdicos e recreativos que oferecessem uma forma de convívio – fora do espaço de trabalho – aos operários das fábricas, neste caso da Sociedade Nacional de Fósforos ( então chamada Companhia dos Fósforos )4. Apesar de jogar junto à Quinta dos Alfinetes, a sua sede era mais perto do rio, ao fundo da Rua Capitão Leitão, num espaço que pertencia à própria fábrica. Para a história ficam os célebres despiques entre os adeptos do Fósforos e os do Marvilense, que aos fins de semana assistiam aos jogos das suas equipas em campos contíguos e em simultâneo. Divididos por um simples tapume de madeira, os campos ofereciam aos fãs de ambas as equipas uma garantia de satisfação, permitindo espreitar os dois jogos ao mesmo tempo. A rivalidade entre os dois clubes tornara-se tão grande que os adeptos do Marvilense gritavam quando a sua equipa marcava um golo, mas também quando o Fósforos sofria outro. O contrário, é claro, também acontecia. “Era uma alegria porque, naquele tempo, cada vez que havia jogo, toda a gente saía satisfeita”, diz o presidente do Oriental. Para além da rivalidade, as equipas locais partilhavam ainda uma caraterística que não era tão comum encontrar em bairros e zonas de Lisboa com outra composição social e outros hábitos de lazer: uma

forte identidade bairrista. A identidade orientalista – seja chelense, marvilense ou de outro bairro – era partilhada por todos estes clubes, e mesmo por outros mais pequenos e pontuais. José Fernando Nabais, na sala de reuniões do seu clube, aponta para a parede onde estão dispostas fotografias dos plantéis dos três clubes fundadores do Oriental. «Se olharmos para as três fotografias que ali estão, do Chelas, do Fósforos e do Marvilense, todos aqueles atletas são daqui do sítio, não há um único que não seja. Hoje, a equipa principal sénior do Oriental tem apenas dois atletas que são de cá. Isto mudou muito», conclui. De facto, os tempos mudaram bastante. A maior parte das coletividades criadas na primeira metade do século xx foram desaparecendo, à exceção de casos como o do sobrevivente Vale Formoso Futebol Clube, fundado em 12 de julho de 1935 na rua que lhe deu o nome, nos arredores da Quinta do Marquês do Abrantes5. Mas o clube mais icónico do bairro, o Clube Oriental de Lisboa, surgiria ainda antes dos anos 1950, a partir da fusão de três coletividades locais.

4  Grupo Desportivo Os Fósforos, na página do Clube Oriental de Lisboa. Disponível em www.oriental.pt [Consult. a 19 de março de 2014]. 5  História, na página do Vale Formoso Futebol Clube. Disponível em www.valeformosofc. com [Consult. a 20 de março de 2014].

O Grupo Desportivo Os Fósforos na sua primeira época oficial, em 1920-21. [Arquivo fotográfico do Clube Oriental de Lisboa]

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Uma das primeiras equipas do Marvilense Futebol Clube, próximo do ano da sua fundação, em 1920. [Arquivo fotográfico do Clube Oriental de Lisboa]

Azulejos evocativos da história do Oriental e dos seus clubes fundadores, no Campo Eng.º Carlos Salema. [Francisco Albergaria da Silva – Memoriar, 2014]

“ U M B A L UA R T E F O R T E E I N E X P U G N ÁV E L” A criação do Clube Oriental de Lisboa

6  FIGUEIREDO, Victor – Clube Oriental de Lisboa: Histórias do Nosso Clube. Lisboa: s. n., 2013, p. 11. 7  Idem, p. 12. 8  “Uma campanha triunfante da República: o Clube Oriental de Lisboa é uma realidade!”. República. Lisboa: 1 de agosto de 1946, p. 7. Fac-similado em FIGUEIREDO, Victor – Clube Oriental de Lisboa: Histórias do Nosso Clube. Lisboa: s. n., 2013, pp. 16-17. 9  FIGUEIREDO, Victor – Clube Oriental de Lisboa: Histórias do Nosso Clube. Lisboa: s. n., 2013, p. 20.

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Naquele tempo, a possibilidade de fusão entre clubes era quase um tabu. Parecia impensável que se pudessem extinguir coletividades com as quais centenas ou milhares de pessoas se identificavam tão arreigadamente. Mas, em janeiro de 1936, o presidente do Chelas Futebol Clube, Rui de Seixas, avança pela primeira vez com a ideia numa entrevista ao jornal Os Sports: e se fosse criado um clube único para Lisboa oriental? Criticada em público pelo seu aparente absurdo, a proposta cai por terra. Só alguns anos mais tarde esta mesma ideia é levada a cabo com sucesso na outra ponta da cidade. Em Alcântara e Santo Amaro, a 18 de setembro de 1942, nasce o Atlético Clube de Portugal, fruto da fusão do União Foot-ball Lisboa e do Carcavelinhos Football Clube. Estimulada por esta experiência, começa novamente a ser falada a possibilidade de fusão dos clubes orientais. Em abril de 1946, reúnem-se no Café Gelo, em Lisboa, o jornalista Artur Inês e os ex-dirigentes chelenses Rui de Seixas e José Marques de Oliveira, que reconhecem existir condições para tentar a fusão entre o Chelas, o Marvilense e o Fósforos. Argumentam que “cada um deles, isolado, vive precariamente. Ligadas num todo as três massas associativas e atléticas, está a ver o grande Clube que se poderia formar”6. Artur Inês, a partir do seu jornal República, será o grande impulsionador desta campanha de angariação de apoio popular à causa da criação de um clube aglutinador da identidade bairrista oriental, sendo considerado por muitos o grande responsável pelo nascimento do Oriental. Um dos apoiantes da ideia, Carlos Botelho, envia uma carta ao jornal República, expressando o seu agrado com esta possibilidade. “Em meu entender, a fusão do Marvilense, Chelas e Fósforos é uma necessidade para o bairro, sob todos os pontos de vista. A razão do Marvilense possuir uma boa sede, o Chelas ter a promessa de um estádio e o Fósforos ser capaz de ganhar os jogos de passagem, tudo isto podem ser factos consumados”7, defende. Assim, numa série de assembleias de sócios organizadas pelos três clubes, vence a ideia de avançar para a fusão. Na assembleia do Marvilense, a fusão é aprovada por 188 votos contra 2. Na do Fósforos, ganha por 163 votos contra 9. E mesmo na sede do Chelas, onde se levantavam mais vozes em oposição ao projeto, a proposta passa com 158 votos a favor contra 48. Diz o jornal República num

eloquente parágrafo: “Com grandes e notáveis serviços prestados à propaganda desportiva, o Chelas, o Marvilense e Os Fósforos não morrem ingloriamente. Caem de pé como os soldados de Verdun, para dar lugar à criação de um baluarte forte e inexpugnável, numa unidade soberba de esforços que há-de fazer do Clube Oriental de Lisboa uma realidade que terá de ser olhada com profundo respeito e calorosa admiração.”8 A 8 de agosto de 1946, na sede do então Marvilense e atual Oriental, no Poço do Bispo, em assembleia magna que reúne sócios dos três clubes, é oficialmente fundado o Clube Oriental de Lisboa. Escolhendo como cores o grená e o branco, a nova coletividade aprova um símbolo que reúne elementos dos três clubes fundadores: o escudo do Marvilense; ao cimo a águia do Fósforos; e ao centro a bola do Chelas, atravessada por uma faixa com as iniciais COL9. O novo campo, situado ao lado da Quinta dos Alfinetes, tomará o nome do diretor da Sociedade Nacional de Fósforos: engenheiro Carlos Salema.

A sede do Clube Oriental de Lisboa, na Praça David Leandro da Silva. Antiga sede do Marvilense, foi palco da fundação do Oriental em 1946. [Nuno Alexandre Jorge, 2014]

Começa então uma grande relação de amor de cada um dos marvilenses. E, em especial, daqueles que viviam junto ao campo do novo clube local, na Quinta do Marquês de Abrantes, na Azinhaga dos Alfinetes, no Bairro Chinês, na Quinta das Claras e noutros locais em redor. O aglomerado habitacional que rodeava o campo cresceu ainda mais nas duas décadas seguintes, nos anos cinquenta e sessenta do século xx. José Fernando Nabais conta como o Campo Eng.º Carlos Salema se tornara uma referência de orientação geográfica. «As pessoas quando vinham para cá, vinham morar para ao pé do campo do Oriental. Quando lhes perguntavam “onde moras?”, respondiam: “Em Lisboa, ao pé do campo do Oriental.” Não diziam Bairro Chinês, isso foi mais tarde. Ainda hoje, em diversas aldeias perto de Lamego, Castro Daire, Viseu, e por aqueles lados, a maior parte das pessoas conhece o Oriental de nome, nem que seja pela proximidade dos seus familiares ao campo”, esclarece. José Maria da Silva, responsável pelo refeitório do Centro de Promoção Social da Prodac, conta que os moradores do bairro eram pessoas de trabalho, cujo escape eram os jogos de futebol, sobretudo os do Oriental. “De resto”, acrescenta, “era trabalho, missa, trabalho, missa, e futebol”. A proximidade entre o campo do clube e o bairro circundante era tal que se abriram entradas para a Azinhaga dos Alfinetes e para o Bairro Chinês, a pensar precisamente nestes adeptos e numa ligação direta às suas ruas. Ao domingo, diz José Maria, era uma romaria de gente a afluir ao campo, vinda de Marvila, Beato, Bairro da Madre de Deus e outros. No entanto, José Cardoso da Silva, morador no Pátio do Marialva, em Marvila, adverte que em dia de jogo valia tudo para intimidar os visitantes. Jogadores e adeptos adversários “tinham de trazer ‘casacos de ferro’ quando vinham jogar ao campo do Oriental”, salvaguarda. José Fernando Nabais também refere ter ouvido muitas histórias de “paixões exacerbadas” que hoje já não se repetem, admitindo que “se perdeu essa mística, até em excesso”. Para o presidente do Oriental, “o tempo da Azinhaga dos Alfinetes, em que a rapaziada era toda do Oriental e recebia aqui o Benfica e o Sporting, e havia pedrada para a esquerda e para a direita – e ai dos árbitros que não deixassem o Oriental ganhar –, isso já acabou”. Pelo contrário, a memória que José Maria da Silva guarda desses tempos é bem mais tranquila. Mais harmoniosa. Garante que nunca houve problemas. “Podiam chamar nomes”, diz, “mas isso era em todo o lado. Subiam o Bairro Chinês com bandeiras de outros clubes e nunca houve problema nenhum”. Sublinha que muitos dos adeptos do Oriental apoiavam inclusivamente outros clubes como o Sporting e, sobretudo, o Benfica. Mais raramente, o Futebol Clube do Porto. Embora também acontecesse, como sucedeu com o pai do próprio José Maria, que delirou quando assinou pelo clube um ex-jogador do Porto: Djalma. Jogador favorito de José Maria – que à altura era

jogador da equipa sénior do Oriental –, Djalma tornou-se o seu melhor amigo, para grande orgulho do seu pai, natural de Cinfães e “portista de gema”. Apesar disto, conta José Maria, naquele tempo nunca se sentiu outra coisa que não um “apoio frenético”. Ele sabe do que fala, tendo jogado no clube desde muito novo. Após uma passagem pelos escalões jovens, chegou à equipa principal por altura da subida do Oriental à primeira divisão, em 1973, uma época de grande orgulho para os bairros orientais. “Acho que foi a melhor fase da minha vida”, diz José Maria. “O meu pai sentia aquele orgulho dele, de comprar o jornal ao fundo do Bairro Chinês. Vendiam lá os jornais na rua. Ele ia buscar o jornal e depois vinha a abri-lo, com a foto do filho, e toda a gente vinha atrás dele”, relata. De facto, o Oriental mantinha-se a um alto nível, batendo-se de igual para igual com os maiores clubes nacionais. Diz José Nabais que quando “os clubes viviam essencialmente da força dos seus sócios, quando este clube estava fortemente implantado – não havia a tal desertificação que houve nos bairros históricos do clube – e havia muita gente aguerrida, e quando as pessoas ganhavam muito pouco e toda a gente era amadora, nós levávamos sete e oito do Sporting e do Benfica porque eles eram os únicos profissionais. Mas depois os outros, daí para baixo, aquilo era renhido”. A história dos resultados conta isso mesmo. “Não me lembro do Oriental, no meu tempo, estar abaixo da segunda divisão”, acrescenta José Maria. O N T E M · PA R T I C I PA Ç Ã O

O Campo Eng.º Carlos Salema durante um treino do Oriental, na atualidade. Fundado em 1949, o recinto ocupa parte do espaço onde ficavam os campos do Marvilense e do Fósforos. [Francisco Albergaria da Silva – Memoriar, 2014]

Um jogo do Oriental contra o Alhandra, no Campo Eng.º Carlos Salema ( em cima ), e José Maria da Silva, em pé, segundo a contar da direita, como capitão de equipa num jogo entre os juniores do Oriental e do Benfica, no Estádio da Luz, em 1971 ( em baixo ). [Arquivo pessoal de José Maria da Silva]

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levando-os a concentrar as suas predileções nos melhores executantes e nos clubes mais mediáticos, incomparavelmente mais divulgados por esse meio de comunicação10. Extintas algumas modalidades icónicas, como o xadrez ou o ténis de mesa feminino, José Nabais, presidente do Oriental, volta as suas atenções para as outras atividades que o clube sempre desenvolveu com grande sucesso: triatlo11; natação; ginástica; kickboxing; andebol; basquetebol; voleibol. Mas do que mais gosta é dos escalões de formação. “Eu sou incapaz, quando acaba um jogo, de perguntar qual foi o resultado, quem é que ganhou. O meu gozo é ver que os putos vêm todos contentes”, revela. O Oriental sobrevive, assim, na atualidade. Com cerca de 2200 sócios, 800 atletas e 120 funcionários e colaboradores. Sempre de forma sustentável. É esse o lema de Nabais: “Com os pés bem assentes na terra, um dia chegaremos ao céu.”

O pátio do Palácio do Marquês de Abrantes, na segunda metade do século XX. Durante décadas, viveram aqui dezenas de famílias. [Arquivo fotográfico da Sociedade Musical 3 de Agosto]

A Rua de Marvila vista de dentro do pátio do Palácio do Marquês de Abrantes ( à esquerda ) e o mesmo pátio com a sede do 3 de Agosto ao fundo ( à direita ). [Nuno Alexandre Jorge, 2014]

O ex-líbris do 3 de Agosto, no entanto, não deixa dúvidas a ninguém. É a responsabilidade de organizar a marcha de Marvila, todos os anos desde 1952. Uma iniciativa que, logo em 1963, conseguiu um primeiro lugar nas Marchas de Lisboa, tendo repetido o feito várias vezes nos últimos cinquenta anos. O atual presidente da coletividade, Marco Silva, nascido em 1984, olha para este legado com orgulho, mas também com o sentimento de que carrega mais do que paixões bairristas. A marcha “é um produto social muito valorizado e enriquecido pela partilha da comunidade em si”, diz.

O 3 de Agosto Centenário da Sociedade Musical ( 1885/1985 ) Nasceste num mês tão lindo É o mês de que mais gosto Por isso te batizaram Com o nome 3 de Agosto.

U M A I L H A I S O L A DA N A M A R V I L A H I S T Ó R I C A A Sociedade Musical 3 de Agosto

Escondido no meio da zona histórica de Marvila fica o Palácio do Marquês de Abrantes, que antes demarcava o início da quinta com o mesmo nome. Com o desaparecimento do bairro de barracas da encosta que ia do edifício palaciano até ao campo do Oriental, o solar seiscentista passou a estar praticamente isolado dos novos bairros da freguesia, separados pelo espaço das antigas quintas e da linha de comboio. É dentro desse palácio que se pode encontrar, quase disfarçado pelo horizonte de ruínas em redor, o espaço da vetusta Sociedade Musical 3 de Agosto de 1885, cuja saudável longevidade é denunciada pelo nome ( ver caixa ). Esta coletividade nasceu precisamente em 1885, a par de várias outras sociedades musicais e filarmónicas lisboetas que então surgiram para oferecer um espaço lúdico e de convívio aos moradores dos respetivos bairros. Mais importante do que essa dimensão lúdica, enraizavam o espírito associativo. Afirma o presidente do Clube Oriental de Lisboa, José Fernando Nabais, também ele frequentador da coletividade há muitos anos: “Eu nasci e vivi sempre na Rua de Marvila. Frequentei e fiz-me homem em termos associativos na Sociedade Musical 3 de Agosto de 1885 – que é a organizadora da marcha de Marvila. É a terceira sociedade mais antiga de Lisboa e, claramente, a mais antiga de Marvila e até da zona oriental da cidade.” 130

A Sociedade Musical 3 de Agosto de 1885 – conhecida vulgarmente como o 3 de Agosto – tornara-se um local habitual da zona, de conhecimento obrigatório para qualquer marvilense ou chelense orgulhoso da sua história. Para além de conhecida, era frequentada por quase toda a gente que morava nos arredores. Da Rua de Marvila, da Quinta do Marquês de Abrantes ou Bairro Chinês, da Azinhaga dos Alfinetes e de vários outros bairros, quintas e pátios em volta. Era frequentada, sobretudo, por gente do próprio Pátio do Colégio, nome pelo qual era também conhecido o pátio do Palácio do Marquês de Abrantes, residência de dezenas de famílias e onde chegou a estar instalada uma escola no século xix. Hoje, ainda ali vivem duas famílias, à espera de realojamento. Facto pouco conhecido é que o famoso carrossel do Bairro Chinês – equipamento de diversão popular com presença regular no hoje extinto bairro – também chegou a funcionar no Pátio do Colégio, à porta do 3 de Agosto. Antes de nascer o hábito de ser montado no Largo do Carrossel, funcionava todo o ano no pátio do palácio. Inicialmente em terra batida, o pátio começou por ser o sítio do carrossel e, após a passagem deste para o novo local no Bairro Chinês, tornou-se um espaço privilegiado para os bailaricos organizados pela coletividade. Há cerca de quarenta anos, construiu-se aí um rinque, que ainda existe atualmente.

Festejas os teus cem anos Com amor, com alegria Estás velhinha, quem diria Que a beleza em ti perfila O teu ninho é Marvila.

“Quando chega esta altura das marchas, toda a gente da freguesia de Marvila se envolve e gosta. Há um aumento de autoestima enorme”, assegura. No fundo, as pessoas “acabam por andar mais felizes, mais alegres, têm uma ocupação maior. Começam a envolver-se mais nas relações que têm umas com as outras”, adianta. Por isso, este é um dever que nunca poderá ser descurado, mesmo perante a perda de apoios das empresas, muitas delas em maiores dificuldades atualmente. “Porque o dinheiro é cada vez menos, temos cada vez menos patrocínios”, revela. Entre o 3 de Agosto e os moradores do Bairro Chinês houve sempre um clima de grande proximidade. Para além do carrossel, da marcha, dos bailes e mesmo do mercado – que se realizava praticamente ao lado –, fazia-se naquele espaço todo o tipo de eventos e desportos. Marco Silva, muito antes de ser presidente, conheceu de perto a coletividade enquanto crescia, nos anos 1980 e 1990. “A minha mãe entrava na marcha era eu bebé. Comecei a vir e a participar nas festas que se faziam aqui”, diz, enumerando basquetebol, badminton, teatro ou karts entre as atividades aí realizadas. Os próprios sogros viviam no Pátio do Colégio.

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10  COELHO, João Nuno; TIESLER, Nina Clara – “O paradoxo do jogo português: a omnipresença do futebol e a ausência de espectadores dos estádios”. Análise Social. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Vol. XLI, n.º 179 ( 2006 ), p. 542. 11  O Clube Oriental de Lisboa organizou, em 2014, pela quinta vez, o Lisbon International Triathlon, uma competição internacional com lugar na zona oriental de Lisboa.

Porém, a passagem dos tempos trouxe a erosão de muita da massa associativa que dava esse apoio incontornável ao Oriental. Sem nunca ter esmorecido a forte ligação entre os adeptos e o clube, são já menos os sócios que acompanham a equipa. E ainda menos os jovens que se sentem atraídos pelo clube. O encerramento de muitas fábricas que patrocinavam e apoiavam a coletividade afetou a capacidade financeira e, consequentemente, também a desportiva. Mas, segundo José Maria, também os realojamentos afastaram as pessoas dos seus clubes. “Muitas das pessoas que estão nestes bairros próximos não eram daqui. Já vieram de outros bairros, que estavam ligados a outros clubes. Não tinham nada que ver com isto”, assegura. Por outro lado, saíram da zona antigos habitantes do Bairro Chinês e arredores ou faleceram os sócios mais antigos. Segundo os investigadores João Nuno Coelho e Nina Clara Tiesler, o próprio “fator televisão” afastou os jovens adeptos dos campos dos seus bairros,

Folheto de uma peça de teatro organizada pelo 3 de Agosto, por volta da década de 1970. Estes folhetos, entregues ao público no início das representações, foram impressos na Federação dos Estudantes Marxistas-Leninistas. [Arquivo da Sociedade Musical 3 de Agosto]

Cantinho de tradições Oh quantas recordações Tu a teus sócios tens dado Marchas, arcos e balões Teatro, bailes e fado. Tua casa é a cultura De todos quantos lá vão 3 de Agosto é o brasão Da pureza, da virtude És o lar da juventude É nosso teu coração. Eu tanto te queria dar, Dar-te aquilo que não tens Mas só te posso ofertar Meus sinceros parabéns. antónio flores

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A marcha de Marvila no ano da sua fundação, em 1952. Organizada pela Sociedade Musical 3 de Agosto até à atualidade, ficou várias vezes em primeiro lugar nas Marchas Populares. [Arquivo Municipal de Lisboa – António Castelo Branco, PT/AMLSB/ /ACB/000018]

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Peça de teatro de e para crianças da Quinta do Marquês de Abrantes, no início dos anos 1970, na antiga sede do Oriental Recreativo Clube ( em cima ), e associados a jogar cartas e conviver na atual sede ( em baixo ). [Arquivo pessoal de Mário Pinto Coelho; Nuno Alexandre Jorge, 2014]

O associativismo assumiu várias faces e vários nomes, muitos deles reminiscentes das origens beirãs e nortenhas dos moradores.

“ EU ERA SÓCIO DE TODOS” O bairro do associativismo

Quem desce do campo do Oriental para a linha de comboio, em direção ao rio, percorre uma pequena estrada alcatroada no meio de um descampado. Mas esse espaço nem sempre esteve vazio. Esse caminho era a via principal do Bairro Chinês, onde milhares de famílias viviam e faziam as suas vidas. Muitos dos moradores saíam apenas para trabalhar e, frequentemente, os trabalhos eram muito próximos de casa, nas várias fábricas e serviços em redor. Quase tudo o que precisavam podia ser encontrado dentro do bairro. Um mercado, um jogo de futebol, um café, um amigo. Tudo à distância de poucos minutos a pé, quer para o lado da Azinhaga dos Alfinetes quer para a via conhecida por Cano d’Água. Mas havia algo que era garantidamente fácil de descobrir: uma associação, uma coletividade ou um clube onde se encontravam caras conhecidas, um jogo de cartas ou um baile para descontrair. Num relatório do início dos anos setenta do século xx sobre o realojamento da população da Quinta do Marquês de Abrantes, do Bairro Chinês e da Quinta das Claras, eram referidas coletividades como o Oriental Recreativo, a Sociedade Musical 3 de Agosto, o Clube Oriental de Lisboa, o Vale Formoso Atlético Clube ou o Clube Braço de Prata12. Mas o número destes clubes e associações, que nasciam da organização espontânea de pequenos grupos de pessoas, era bastante maior. Para além disso, muitas das vezes era preciso pagar uma quota à coletividade para se utilizar as instalações e participar nas atividades. Henrique Neves, hoje morador no bairro da Prodac, lembra-se bem. “No Bairro Chinês havia várias sedes. Era o Alhões, o Rossão, os Magriços”, enumera. “Eu era sócio de todos, porque antigamente isto era mais rigoroso. Só podia entrar para beber a bica quem fosse sócio e pagasse a quota”, salienta. De entre esta multiplicidade de coletividades localizadas em pleno Bairro Chinês – na sua maioria, tinham sede dentro do bairro –, destaca-se uma, com mais associados, transversal, que reunia gente com raízes em quase todas as terras da Beira e do Norte do país. Falamos do Recreativo. Ou seja, do Oriental Recreativo Clube, fundado no dia 2 de dezembro de 1955. A sua importância foi inclusivamente reconhecida pela Prodac, que planeou e construiu um espaço para a coletividade no novo bairro de autoconstrução. Segundo José Maria da Silva, responsável pelo refeitório do Centro de Promoção Social da Prodac – que testemunhou a fase de realojamento –, como o Recreativo era “o clube mais representativo – já estava federado – acabaram por lhes arranjar este espaço aqui no bairro para terem uma sede, continuarem e poderem projetar-se”. O atual presidente do clube, José Natalino, tem apenas a idade do bairro da Prodac, mas sabe quão importante foi o surgimento do espaço do Recreativo. Inicialmente, a coletividade foi fundada por cinco ou seis amigos para criar a privacidade que não encontravam noutros locais quando se queriam juntar em grupos maiores, devido à presença constante da PIDE. Para além disso, ainda pouca gente tinha televisão no bairro. Por isso, “juntaram uns trocos e foram comprar uma televisão para as famílias irem para lá”. E não era só o acesso à televisão que motivava os sócios. Era também o desejo de criar um balneário, face à escassez de casas de banho modernas. Aleixo Martinho, de 75 anos, é sócio do clube desde 1960 e um frequentador assíduo desde então: “Quando se formou o clube, não havia mais nada e juntávamo-nos lá.” Mas lembra que o esforço tinha de ser de todos. “Pagava-se 25 tostões para se tomar

banho e 20 tostões para se ver televisão, porque era preciso comprar o gás”, explica. Mesmo hoje, com cerca de trezentos sócios – menos do que já chegou a ter –, o Recreativo mantém a sua importância, embora com novos desafios. “Temos muitos jogadores com 19, 20, 22 anos, que são miúdos de bairros problemáticos”, diz José Natalino. “São miúdos que precisam e têm o nosso apoio, o nosso carinho”, adianta. Retirar os jovens das ruas e dar-lhes apoio, motivação e um sentimento de pertença passou a ser mais central na missão do clube. Sobretudo através da crescente importância das suas equipas de futsal. A ligação e respeito pela sua história é uma parte central da forma de estar da coletividade, cujas decisões passam sempre pelos sócios. “Se há qualquer coisa na coletividade, são os sócios que decidem. Não é o presidente que tem de decidir”, remata José Natalino. Este espírito parecia estar presente em todo o Bairro Chinês, numa época em que não era preciso passar por um labirinto burocrático para se criar uma coletividade. O associativismo assumiu, por isso, várias faces e vários nomes, muitos deles reminiscentes das origens beirãs e nortenhas dos moradores. O Grupo Desportivo e Recreativo Os Alhões ( fundado a 3 de maio de 1964 ), cuja sede só recentemente foi demolida, chegou a formar “bons campeões de atletismo”, segundo António Silveira, de 66 anos. Este morador na Quinta do Chalé sublinha ainda o peso do Futebol Clube Recreativo do Rossão ( fundado a 3 de maio de 1969 ) na vida das pessoas do bairro. Um peso que se reflete na atual sede, no seio do bairro Marquês de Abrantes, após ter estado sediado na barraca do primeiro sócio e fundador, Mário Costa, no Largo do Carrossel e ainda próximo do bairro das Salgadas. No solar da Quinta das Fontes, hoje em ruínas e escondido pelos modernos prédios em altura do bairro Marquês de Abrantes, instalara-se ainda o Futebol Clube Recreativo “Os Azinhagas”, no início dos anos 1980, tornando-se palco de muitos bailes e jogos de cartas dos habitantes locais. O seu nome evocava o do arruamento da Azinhaga dos Alfinetes, que marcava um dos limites do Bairro Chinês. José Maria da Silva, um adolescente do Bairro Chinês nos anos 1960, é um exemplo vivo da participação transversal que subsiste

nestas coletividades. Muitas delas sem sede e com uma existência quase informal. Nos jogos de futebol ao domingo, no campo do Ferroviário, José Maria alinhava, entre outros, pelo Futebol Clube Duriense, pelo Cutelo, pelo Gralheira, pelo Rossão e pela Associação Recreativa e Desportiva Magriços do Norte. Estes últimos, representantes de Castro Daire e São Pedro do Sul, aliás, foram uma das últimas coletividades a desaparecer, precisamente porque não estavam no meio do bairro que viria a ser demolido – mas sim ao cimo da Rua José do Patrocínio. O atual responsável pelo refeitório do Centro de Promoção Social da Prodac, no entanto, admite que “todos eles representavam essas zonas, apesar de nunca conseguirem fazer equipas só com pessoas lá da terra. Iam buscar os miúdos que tinham mais habilidade para jogar nas equipas deles, nos torneios que faziam”, relata. O que importava era o convívio e a participação nas iniciativas do bairro. Mesmo que, para ganhar ao clube rival, se completasse uma equipa de beirões com um ponta de lança nascido e criado em Lisboa. No final do dia, o que ficava era a lembrança de um tempo bem passado. Lembrança que, em muitos casos, é já tudo o que resta. “Foram-se embora os mais velhos para a terra e os mais novos não quiseram agarrar nisso”, diz António Silveira, morador na Quinta do Chalé, sobre o Alhões. “Ainda se pensou fazer uma nova sede, para eles e para os outros clubes todos, mas depois não havia dinheiro e acabou-se tudo”, conclui. Nem tudo. Como podem testemunhar as coletividades que continuam ativas e presentes nas vidas destas pessoas.

O N T E M · PA R T I C I PA Ç Ã O

12  EVANGELISTA, Mons. João; ÁLVARO, José Reis; DIAS, Manuel Matos; COELHO, Mário Pinto – Realojamento de 1300 Agregados Familiares Residentes em Barracas na Quinta Marquês de Abrantes, Bairro Chinês e Quinta das Claras, relatório apresentado no I Colóquio Luso-Brasileiro de “Desenvolvimento Integrado”, agosto de 1972, pp. 22-25.

Essa proximidade parece ter sido ameaçada pelas drásticas mudanças urbanísticas, que afastaram fisicamente os frequentadores habituais da coletividade. Os parcos ou inexistentes esforços de conservação do edifício também não auguram um futuro sem problemas. Para José Nabais, “a própria continuidade e futuro da coletividade estão ameaçados, porque não há coletividades sem pessoas”. O encerramento da passagem para peões na linha ferroviária, numa zona que ligava diretamente a zona do antigo Bairro Chinês à Rua de Marvila – a área mais antiga da freguesia –, também acentuou o distanciamento entre as pessoas e o 3 de Agosto. O próprio presidente desta coletividade admite que o afastamento físico e o emocional andam de mãos dadas. “Tudo isto são obstáculos físicos que vão prejudicar as relações pessoais e aquilo que é importante para a coletividade, que é a aproximação das pessoas”, afirma. Para Marco Silva, o grande desafio é continuar a levar esta coletividade em direção aos objetivos que sempre a orientaram: aproximar as pessoas. Sobretudo numa zona bastante envelhecida da freguesia, em que muitos moradores não saem de casa. E os que saem “passam o dia todo a olhar para a televisão e a pedir à pessoa que está responsável pelo bar para fazer uma chamada ao filho, para ler uma carta, para conversar um bocadinho. Estão muito isolados, muito abandonados”, alerta. Quebrando a caricatura de algumas antigas coletividades que “tendiam mais a vender álcool e a jogar às cartas”, Marco Silva luta por chamar as gerações mais jovens para este trabalho de dar resposta ao crescente isolamento e aos preocupantes níveis de pobreza que se verificam na Marvila histórica. O número de sócios reflete esse esforço, tendo aumentado para 240. Mas quando se lhe pergunta se a marcha de Marvila poderá deixar de ser organizada pela Sociedade Musical 3 de Agosto, responde categoricamente: “Sempre foi. E, se Deus quiser, sempre será.”

Equipa de futsal do Recreativo no início da década de 1980, num torneio no pavilhão do Sacavenense. [Arquivo fotográfico do Oriental Recreativo Clube]

Inauguração de uma das antigas sedes do Rossão, próxima da antiga zona do Bairro Chinês. [Arquivo fotográfico do Futebol Clube Recreativo do Rossão]

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