TFG \"Habitação de Interesse Social em Londrina/PR\"

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Fernando Fayet de Oliveira

Habitação de Interesse Social em Londrina/PR

Londrina 2014

Fernando Fayet de Oliveira

Habitação de Interesse Social em Londrina/PR

Trabalho Final de Graduação apresentado ao Departamento de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Filadélfia - UNIFIL.

Orientador: Prof.º Lucas Raffo Souza

Londrina 2014

AGRADECIMENTOS

Agradeço principalmente aos meus pais, por terem me incentivado sempre, independentemente do caminho escolhido. Agradeço também a todos que participaram deste caminho, àqueles que foram professores para mim.

DE OLIVEIRA, Fernando Fayet. Habitação de Interesse Social em Londrina/PR. 2014. 65 f. Trabalho Final de Graduação (Graduação em Arquitetura e Urbanismo) – Centro Universitário Filadélfia – UNIFIL, Londrina, PR, 2014.

“Cela s'est passé. Je sais aujourd'hui saluer la beauté” Arthur Rimbaud

RESUMO. O OBJETIVO DO TRABALHO APRESENTADO DE PROJETO DE PESQUISA PARA O TFG É DEMONSTRAR ATRAVÉS DOS ESTUDOS E PESQUISAS BIBLIOGRÁFICAS SOBRE O TEMA HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL, ANÁLISE DE EDIFICAÇÕES CORRELATAS E ANÁLISE HISTÓRICA DESTE TIPO ARQUITETÔNICO. APRESENTAR TAMBÉM AS NECESSIDADES DESTA EDIFICAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM SEU ENTORNO. BUSCA-SE EXPLICAR COMO ESTE TIPO DE EDIFICAÇÃO DEVE RELACIONAR-SE COM A CIDADE ONDE É CONSTRUÍDO E COMO DEVE FAZER PARTE DE UM PROJETO DE CIDADE.

PALAVRAS-CHAVE.

HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL; HABITAÇÃO

SOCIAL; LONDRINA;

ABSTRACT. THE MAIN OBJECTIVE OF THIS ESSAY, A RESEARCH STATED AS GRADUATION PROJECT, IS TO SHOW, THROUGH BIBLIOGRAPHIC RESEARCH, THE THEME, SOCIAL HOUSING – BY STUDYING SIMILAR BUILDINGS AND A HISTORICAL ANALYSIS OF IT. IT ALSO INTENDS TO PRESENT THE TECHNICAL NEEDS AND THE RELATIONSHIP OF THE BUILDING AND IT’S CONTEXTO. TRIES TO EXPLAIN HOW IT MUST RELATE WHIT THE CITY WHERE IT’S BUILT AND HOW I MUST BE PART OF A CITY PLAN.

KEYWORDS: SOCIAL HOUSING; DWELLING; SOCIAL ARCHITECTURE; LONDRINA, BRASIL;

SUMÁRIO lista de imagens............................................................................................................ 7 Introdução .................................................................................................................. 10 1. CONCEITUAÇÃO TEMÁTICA ................................................................................. 12 2. ANÁLISE DE EDIFICAÇÕES CORRELATAS ........................................................... 31 2.1

Iceberg – CCEBRA, JDS, SeARCH e Louis Paillard Architects - 2013 .......... 31

2.2

Conjunto Habitacional Jardim Edite – MMBB & H+F Arquitetos – 2011........ 37

2.3

Projeto Habitação Cidade – Vigliecca & Associados – 2011 ........................ 51

2.4

Conclusão .................................................................................................... 60

3. INTERPRETAÇÃO DA REALIDADE: LONDRINA/PR ............................................... 61 4. DIRETRIZES PROJETUAIS e CONCEITUAÇÃO........................................................ 6 CONCLUSÃO ............................................................................................................. 17 BIBLIOGRAFIA UTILIZADA ........................................................................................ 18

LISTA DE IMAGENS FIGURA 1: CORTIÇO À ÉPOCA EM SÃO PAULO ................................................................................ 13 FIGURA 2: VISTA E PLANTA BAIXA DETALHADA DE CORTIÇO, EM COMPARAÇÃO COM PLANTA BAIXA DE H ABITAÇÃO LEGALIZADA. FONTE: BONDUKI (1998) .............................................................. 16 FIGURA 3: LE CORBUSIER E CROQUIS DA UNIDADE DE HABITAÇÃO. FONTE: JOANNA HELM. "LE CORBUSIER EM CORES" - 15 MAY 2013. [ARCHDAILY. ACESSADO EM 3 ABR 2014]..................................... 21 FIGURA 4: EXEMPLO DE PRODUÇÃO ARQUITETÔNICA INCENTIVADA POR FATHY. FONTE: FATHY, 1982.. 23 FIGURA 5: EXEMPLO DE PRODUÇÃO DE HABITAÇÃO SOCIAL PELO BNH. FONTE: MARICATO, 1997......... 25 FIGURA 6: EXEMPLO DE PRODUÇÃO HABITACIONAL DO PMCMV. FONTE: FERREIRA (2012)............... 29 FIGURA 7: DESENHO DE MIKKEL FROST, ARQUITETO DO ESCRITÓRIO CEBRA, FEITO APÓS O PROJETO, EXPLICANDO-O TANTO FORMALMENTE COMO CONCEITUALMENTE. FONTE: WEBSITE CEBRATOONS.BLOGSPOT.COM. ACESSADO EM 08 DE MAIO DE 14. .......................................... 31 FIGURA 8: DIAGRAMAS DE ESTUDO DE INSOLAÇÃO E VISTAS, PRINCÍPIO CONCEITUAL DO CONJUNTO. FONTE: THE ICEBERG / CEBRA + JDS + SEARCH + LOUIS PAILLARD ARCHITECTS" 07 MAR 2014. FONTE: ARCHDAILY. ACESSADO EM 8 DE MAIO DE 2014. ... 32 FIGURA 9: EDIFICAÇÕES E MALHA VIÁRIA EM CONTRASTE RESSALTAM O CONTEXTO ONDE O CONJUNTO (AO ALTO, EM MAGENTA) É LOCALIZADO EM AARHUS.. FONTE: THE ICEBERG / CEBRA + JDS + SEARCH + LOUIS PAILLARD ARCHITECTS" 07 MAR 2014. ARCHDAILY. ACESSADO EM 8 DE MAIO DE 2014. HTTP://WWW.ARCHDAILY.COM/?P=483415; GOOGLE EARTH. ACESSADO EM 8 DE MAIO DE 2014. [ORG. PELO AUTOR] ........................................................................................................... 33 FIGURA 10: COMPARAÇÃO ENTRE O EDIFÍCIO CONSTRUÍDO EM FOTO, À ESQUERDA, E A MAQUETE DO PROJETO ORIGINAL. ............................................................................................................ 34 FIGURA 11: VARIAÇÃO TIPOLÓGICA ENTRE O PAVIMENTO TÉRREO E O QUINTO PAVIMENTO. FONTE: "WOHNANLAGE IN AARHUS - HOUSING D EVELOPMENT IN AARHUS". IN: DETAIL: REVIEW OF ARCHITECTURE. SERIE 2014 - 3. ED. Nº 54. (ORG. PELO AUTOR) .............................................. 35 FIGURA 12: VARIAÇÃO ESPACIAL ENTRE O DUPLEX COM 4 QUARTOS E DUPLEX COM 5 QUARTOS. FONTE: "WOHNANLAGE IN AARHUS - HOUSING D EVELOPMENT IN AARHUS". IN: DETAIL: REVIEW OF ARCHITECTURE. SERIE 2014 - 3. ED. Nº 54. (ORG. PELO AUTOR) ............................................. 36 FIGURA 713: VISTA DO C ONJUNTO A PARTIR DO TERRAÇO. FONTE: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO.37 FIGURA 14: IMPLANTAÇÃO DA EDIFICAÇÃO E RESUMO DE SEU PROGRAMA. FONTE: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ..................................................................................................................... 38 FIGURA 15: LOCALIZAÇÃO COM RELAÇÃO AO ENTORNO - COLORIDO; FOTO ANTIGA, MOSTRANDO AINDA AS ANTIGAS HABITAÇÕES IRREGULARES. FONTE: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ..................... 39 FIGURA 16: PROGRAMA DA EDIFICAÇÃO ESQUEMATIZADO. FONTE: DO AUTOR .................................... 39 FIGURA 17: FOTO ALTERADA DE VISTA A PARTIR DA RUA. FONTE: GOOGLE STREET VIEW. ESQUEMATIZADO PELO AUTOR. ..................................................................................................................... 41 FIGURA 18: PLANTA TÉRREA E CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DO PROGRAMA. FONTE: PLANTA BAIXA ORIGINAL: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR. ................................. 42 FIGURA 19: PLANTA DO PAVIMENTO TIPO E CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DO PROGRAMA NAS DIFERENTES EDIFICAÇÕES. FONTE: PLANTA BAIXA ORIGINAL: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR. ........................................................................................................ 43 FIGURA 20: PLANTA DETALHADA DO EDIFÍCIO-TORRE E CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DO PROGRAMA. FONTE: PLANTA BAIXA ORIGINAL: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR.43

FIGURA 21: PLANTA DETALHADA DO EDIFÍCIO-LÂMINA E CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DO PROGRAMA. FONTE: PLANTA BAIXA ORIGINAL: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR.45 FIGURA 22: CORTE AA DO EDIFÍCIO-LÂMINA E CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DE PROGRAMA E ACESSOS DIFERENCIADOS. FONTE: CORTE ORIGINAL: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR. ........................................................................................................ 46 FIGURA 23: CORTE BB DO EDIFÍCIO-LÂMINA E CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DE PROGRAMA E ACESSOS DIFERENCIADOS. FONTE: CORTE ORIGINAL: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR. ........................................................................................................ 47 FIGURA 24: CORTE CC DO EDIFÍCIO-LÂMINA E CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DE PROGRAMA E ACESSOS DIFERENCIADOS. FONTE: CORTE ORIGINAL: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR. ........................................................................................................ 49 FIGURA 25: FOTOS DA CONSTRUÇÃO DO CONJUNTO HABITACIONAL. FONTE: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. .......................................................................................................................... 50 FIGURA 26:FOTOS DA CONSTRUÇÃO DO C ONJUNTO HABITACIONAL. FONTE: WEBSITE DOS AUTORES DO PROJETO. .......................................................................................................................... 51 FIGURA 27: VISTA A PARTIR DA RUA. FONTE: DOS AUTORES. ............................................................. 52 FIGURA 28: IMPLANTAÇÃO DO CONJUNTO E SUA RELAÇÃO COM O ENTORNO. FONTE: DOS AUTORES. ..... 54 FIGURA 29: IMPLANTAÇÃO E VARIAÇÃO TIPOLÓGICA. FONTE: DOS AUTORES. ...................................... 56 FIGURA 30: DIRETRIZES PROJETUAIS - MOBILIÁRIO FIXO (E CONSEQUENTE INDUÇÃO AO USO) E VENTILAÇÃO CRUZADA POSSIBILITADA. FONTE: DOS AUTORES. .................................................................... 57 FIGURA 31: DIRETRIZES PROJETUAIS - RELAÇÃO PASSIVA COM O ENTORNO, FORMULAÇÃO DE ESQUINAS CONSTRUÍDAS E USO PERTINENTE DO SOLO (EM GARAGENS A MEIA COTA). FONTE: DOS AUTORES. . 58 FIGURA 32: CORTE TRANSVERSAL - VARIAÇÃO TIPOLÓGICA ACOMPANHANDO O GABARITO E DETERMINA A VARIAÇÃO TIPOLÓGICA EM DIFERENTES NÍVEIS; GARAGENS ABAIXO DO NÍVEL DA RUA; ESQUINAS FORTALECIDAS COM DIFERENCIAÇÃO FORMAL. FONTE: DOS AUTORES. ....................................... 59 FIGURA 33: MAPA SINTETIZANDO A EVOLUÇÃO URBANA, DENSIDADE DEMOGRÁFICA, O CUPAÇÕES IRREGULARES E VAZIOS URBANOS DENTRO DO LIMITE URBANO DA CIDADE DE LONDRINA. FONTE: IPPUL (2006), COHAB – LONDRINA (2006) . ORGANIZAÇÃO GRÁFICA: DO AUTOR. ................... 56 FIGURA 34: MAPA DEMONSTRANDO A EVOLUÇÃO URBANA, DENSIDADE DEMOGRÁFICA, OCUPAÇÕES IRREGULARES E VAZIOS URBANOS DENTRO DO LIMITE URBANO DA CIDADE DE LONDRINA. FONTE: IPPUL (2006), COHAB – LONDRINA (2006) . ORGANIZAÇÃO GRÁFICA: DO AUTOR. ................... 56 FIGURA 35: TERRENOS VAZIOS OU SUBUTILIZADOS (DESTACADOS EM LARANJA) DENTRO DO CONSIDERADO CENTRO DE LONDRINA - SENDO O N ORTE AO ALTO. FONTE: BASE CARTOGRÁFICA: IPPUL (2008). ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR. ....................................................................................... 0 FIGURA 36: O TERRENO ESCOLHIDO, DESTACADO ENTRE ALGUNS PONTOS DE REFERÊNCIA E VIAS DE IMPORTÂNCIA E ACESSO. FONTE: GOOGLE MAPS. ALTERAÇÕES GRÁFICAS: DO AUTOR. .................. 1 FIGURA 37: DIAGRAMA RESUMINDO AS POSSIBILIDADES DENTRO DO ZONEAMENTO. FONTE: DO AUTOR. ... 2 FIGURA 38: DIAGRAMA-RESUMO DA LEGISLAÇÃO POTENCIALIZADA: EM CORES SÓLIDAS, OS DIFERENTES USOS; EM HACHURAS, AS LIMITAÇÕES ESPACIAIS MINIMIZADAS, PREVISTAS EM NORMA. FONTE: DO AUTOR. ............................................................................................................................... 3 FIGURA 39: CORTES ESQUEMÁTICOS DO ENTORNO DO TERRENO, COM SUAS EDIFICAÇÕES AO REDOR. O CORTE PASSA, ACIMA, PELA RUA ALAGOAS, COM VISTA PARA O NORTE, E ABAIXO PELA RUA BRASIL, COM VISTA PARA O OESTE. FONTE: DO AUTOR. ......................................................................... 4 FIGURA 40: CROQUIS ESQUEMÁTICO ACERCA DA CIRCULAÇÃO ........................................................... 9

FIGURA 41: CROQUIS FEITOS PELO AUTOR DAS PINTURAS DE ALFREDO VOLPI QUE INSPIRARAM A CRIAÇÃO DOS BRISES SOLEIL ............................................................................................................. 13

INTRODUÇÃO O seguinte trabalho tem por finalidade tratar das políticas habitacionais, tendo constatado, como poderá ser verificado, pela atualidade do tema. O enfoque principal será acerca da arquitetura deste tipo clássico – tendo, no entanto, ciência da necessidade da atenção urbanística a ser dada em um tema complexo como tal. Parte-se de uma contextualização histórica para melhor compreensão do assunto: como as políticas habitacionais surgem, se tornam prioridade de governos em alguns casos - porém, nem sempre. Esta contextualização terá como condutor a história da habitação social no Brasil e o desenvolvimento de seu conceito, mutante até hoje. No entanto, partirá também para algumas experiências paralelas ao redor do mundo que achou-se necessário para comparação ou ilustração de como, arquitetônicamente, o tema é tratado em diferentes lugares. Em seguida faz-se um estudo sobre três exemplos de Habitação Social. Primeiramente, será abordado o Conjunto Iceberg, na Dinamarca, e como nem mesmo a derrocada do mundo financeiro em 2008 não fez com que o empreendimento perdesse sua qualidade arquitetônica. A seguir, se tratará do Jardim Edite, conjunto habitacional em São Paulo que chamou a atenção por seu caráter experimental dentro do contexto brasileiro. E, por último, será estudado o Projeto Habitação Cidade, uma simulação do escritório Vigglieca & Associados de como fariam

– e fazem – a redefinição de Habitação de

Interesse Social. Após o estudo destes exemplos, o foco se voltará para Londrina, fazendo então uma análise da situação habitacional em Londrina, a legislação em voga que a permeia e definindo o porque deste ser um problema na cidade – o que

realmente chamou a atenção do autor deste trabalho para fazer tal pesquisa –, partindo então para a definição de um programa e a definição de uma situação real para o Projeto da edificação que será apresentada no Apêndice, de forma a contribuir para o questionamento da produção não só do tipo arquitetônico mais elementar – o lar – daqueles que menos podem, por assim dizer, mas também da cidade que é produzida e que se quer produzir.

1. CONCEITUAÇÃO TEMÁTICA Como Le Corbusier explica em seu livro Por uma Arquitetura, em 1923, o assunto da Habitação Social, em seu capítulo Casas em Série (1998, p. 160), retratando o modo de vida operário em seu tempo, explanando assim as raízes do problema habitacional e as possíveis consequências deste. O estado de espírito não existe, diz ele; estado de espírito para a construção das quinhentas mil moradias, alojamentos baratos, para trabalhadores fabris. Protestando contra a tentativa de manutenção do status quo arquitetônico, alheio a estes problemas, reivindicando o estado de espírito da série – um modo construtivo racional, que seja, para sua época, retrato da mundança tecnológica que ocorre; utilizar da melhor maneira o concreto armado, belo por si só, que não necessita de ornamentação: é bela por ser o que há de melhor a ser feito arquitetonicamente. Em seguida, proclama: Arquitetura ou Revolução. Trinta e nove anos depois, como é contado por CAVALCANTI apud BONDUKI (1999: p. 134), Le Corbusier vem ao Brasil e impressiona-se com o Conjunto Habitacional Prefeito Mendes de Moraes, o Pedregulho, projetado por Affonso Eduardo Reidy, e diz-se “[...] admiradíssimo, nunca tive ocasião de realizar obra tão completa, dentro dos meus princípios, como vocês realizaram”. Pondo o Brasil no mapa da Arquitetura Social, Reidy e sua equipe obtiveram reconhecimento internacional e inspiraram não somente o idealizador deste tipo de habitação como também muitas gerações de arquitetos a realizar o ofício com um viés social. No entanto, para alcançar este nível de importância na arquitetura, o tema da Habitação e seu entendimento tiveram de se alterar ao decorrer do tempo. No Brasil, o tema toma importância em formato de problema, como é explicado por Bonduki em seu livro Origens da Habitação Social no Brasil, quando a

cidade - no caso, São Paulo – muda sua concepção espacial, a partir de 1850, com o fim da escravatura. O espaço da casa, antes dividido entre o homem livre e o cativo, torna-se segregado – bem como a cidade a qual ela compõe. A cafeicultura explode e com ela, a cidade (termo de ROLNIK apud BONDUKI:1998: p.18); imigrantes vêm tentar a vida no mercado brasileiro, inflando-o; a cidade é dividida de acordo com o estrato social do morador: mesmo tímido, o processo fazia parte de um projeto sempre presento no corpo de ideias urbanísticas da elite dirigente quem ao longo de todo o período em estudo (e, de certa forma, até o presente) foi lentamente se implantando (BONDUKI, 1998, p. 21). FAUSTO (2001, p.124) comenta a situação dos trabalhadores da seguinte maneira: [...] em São Paulo os empregos estáveis foram ocupados pelos trabalhadores imigrantes, relegando-se os ex-escravos aos serviços irregulares e mal pagos [...] A opção pelo trabalhador imigrante nas áreas regionais mais dinâmicas da economia e as escassas oportunidades abertas ao ex-escravo em outras áreas resultaram e uma profunda desigualdade social da população negra.

Figura 1: Cortiço à época em São Paulo

O problema habitacional é problema sanitário: disseminam-se cortiços pela cidade,

que,

epidêmicos,

são

tratados

de

forma

verdadeiramente

haussmassiana, levando ao novo Estado republicano a interferir na questão – até então a moradia era tratada na esfera do sacramentalmente privado – pondo-os abaixo e facilitando a construção de moradias para aluguel que seguissem o padrão higienista (e uma tentativa de embelezamento do centro). No entanto, como ressaltou Bonduki (1998, p.39): A construção barata era uma exigência intrínseca ao negócio, pois os níveis de remuneração dos trabalhadores não permitiam aluguéis elevados. Os cortiços e as casas coletivas eram, portanto, essenciais para a reprodução da força de trabalho a baixos custos e, enquanto tal, não podiam ser reprimidos e demolidos na escala prevista pela lei e desejada pelos higienistas. Esse conflito entre legislação e a realidade, que nunca desapareceu, decorria do processo de exploração da força de trabalho e permeou a produção de moradias populares em São Paulo. [...] Ao se chocar com as condições econômicas estruturais, baseadas nos baixos salários e em regras mercantis de produção de moradias de aluguel, o higienismo perde sua arrogância.

O mercado rentista dura até meados da década de 1930, quando o governo Vargas desistimula este tipo de habitação para adotar uma medida paternalista, fomentando a compra da casa própria, sonho da recém criada classe média. As grandes indústrias constroem vilas operárias. Por outro lado, as vilas particulares eram a grande maioria. Eram verdadeiros empreendimento, tanto de pequenos quanto grandes investidores, diversificadas em escalas. Mas, para ilustrar, Bonduki utiliza uma vila de tamanho médio, projetada pelo engenheiro Regino Aragão, localizada na rua São João, no bairro de Santa Ifigênia, construída em 1911. Nota-se: O máximo de aproveitamento dos terrenos, muitas vezes no centro do quarteirão, e a racionalização dos projetos tendo em vista a economia de materiais - com o uso de paredes comuns, áreas livres mínimas e ausência de recuos - faziam com que os investimentos fossem extremamente rentáveis em relação ao capital investido, que se beneficiava também em isenções fiscais. (BONDUKI, 1998, p.50)

Mas, no entanto, após isso, resume a estreita difereça entre a habitação legal e a ilegal: os limites são imprecisos (...) A maior diferença estava na situação dos equipamentos hidráulicos: na vilas, eles eram individuais e ficavam no fundo da casa; no cortiço, eram coletivos e localizados na área comum. E conclui-se que, inevitavelmente, o cortiço estava longe de desaparecer embora condenado, proibido e ameaçado de demolição, (...) se difundiu, tornando-se uma das formas de habitação mais comuns da classe trabalhadora.

Figura 2: Vista e Planta Baixa detalhada de cortiço, em comparação com Planta Baixa de Habitação legalizada. Fonte: BONDUKI (1998)

A este tempo ocorria o segundo CIAM em 1929, cujo tema era Unidade de Habitação Mínima, e Gropius escrevia sobre o tema da Habitação Social em As bases sociológicas da Habitação Mínima para a população das cidades industriais, refletindo sobre as novas configurações familiares, o papel da mulher mediante a condição do entre guerras, e como estes elementos influenciam no arquitetar de uma nova moradia: “Só se via a solução ideal na casa térrea, na casa unifamiliar, com jardim, e combatia-se [...] a densidade habitacional” (GROPIUS in Bauhaus: Novarquitetura: 1977: p.153). Este debate ocorre, em paralelo, enfaticamente no Brasil, envolvendo estudiosos de setores antes inimagináveis sobre o tema, tais como engenheiros e sociólogos - e, afirma BONDUKI (1998), a impressionante ausência de arquitetos nele; aqueles que projetavam à época o Conjunto Habitacional do Realengo, marcado pela formalidade modernista, debatiam dentro de seu círculo profissional, longe do grande debate, no Rio de Janeiro. Gropius intensifica sua opinião, divergindo do que é proposto pelo governo Vargas: A estrutura interna da família industrial se distancia da casa unifamiliar e busca o grande edifício de muitos andares e finalmente a grande organização de serviços domésticos. [...] Enquanto a casa térrea unifamiliar corresponde mais às necessidades de outras camdas da população, mais abastadas, [...] o grande edifício de apartamenteos corresponde hoje às necessidades sociológicas da população industrial, à emancipação sintomática do indivíduo, e à rápida separação dos filhos com respeito ao conjunto familial. (in Bauhaus: Novarquitetura, 1977, p.153)

Enfim, apesar de acompanhar o debate internacional sobre o habitar, opta-se, no Brasil, pelo modelo de casa unifamiliar, como medida política, em meio a mudanças político-sociais, quando abriu-se espaço para ideologias socialistas em meio ao aumento populacional - apesar das tentativas de mudanças, ainda predominava as subabitações e cortiço - e o fomento à Casa Própria teria utilidade política, forjando-se, assim, uma associação entre Família e Habitação: o trabalhador médio, ao conseguir sua própria residência, sentiria-se confortável com seu trabalho, morando em um ambiente doméstico com sua família: padrão que seguiria o espírito cristão-burguês; contrapondo-se a esta

ideia, ter-se-ia a habitação coletiva, sem privacidade, onde a mulher não possuiria a atmosfera de discrição e respeito que só se obtém na habitação individual (FERREIRA, 1942 apud BONDUKI, 1999, p. 86) e faz a associação, baseando-se em uma suposta ecologia urbana, a todas as “patologias sociais”. Esta nova abordagem do problema habitacional, portanto, necessitava de uma mudança de mentalidade por parte desta população e uma metodologia construtiva que fosse eficiente e estivesse dentro das possibilidade de custo do governo.

A nova concepção veio de forma não oficial, não por um plano habitacional efetivamente, mas por meios alternativos de solucionar o problema, com a criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAP’s) e a Fudação da Casa Popular (FCP), como uma forma indireta de o governo Vargas investir em infraestrutura pública, como explica Bonduki. Nota-se que apesar de não ser papel dos Institutos, eles atuavam, dentro de cada categoria profissional, de diferentes formas a fomentar a habitação, seja vendendo ou locando diretamente habitações, financiando a aquisição de moradia para seus associados ou até mesmo concedendo empréstimo a terceiros para que adquirissem uma habitação, dando a estes Institutos o apelido de rentistas estatais, com aluguéis abaixo do preço de mercado – os chamados aluguéis sociais. Assim, havia quem conseguia habitar por um preço alcançável por meios injustos; o restante da população buscava meios alternativos de habitar, de forma excluída. Marginaliza-se a favela discriminatoriamente, como visto no discurso do então ministro Salgado Filho. Este período pós-guerra foi, no entanto, o período de maior produção habitacional até então; Bonduki cita os trabalhos de Rubens Porto e Carlos Frederico Ferreira para os IAP’s, consoantes ao que se produzia no exterior, seguindo a lógica corbusiana de produção habitacional, das unités, como no

caso do primeiro bloco habitacional moderno no Brasil, o Conjunto Realengo, projetado ainda na década de 1930. Tinha-se em mente que a produção habitacional, mesmo que aparentemente exígua se comparada ao problema, deveria ser desenvolvida em paralelo com os princípios urbanísticos, complementada por serviços sociais, como relata Ferreira: [...]eu não queria fazer só habitações. Habitação, na época, para eles era fazer uma casa, aquela casa 'dois quartos e sala' está acabado. Pronto, o resto vem depois! Mas eu não, queria fazer habitação mesmo, habitação como eu achava, com escola, edifício de apartamento com comércio, equipamentos. Eu previ até um circo (FERREIRA, depoimento ao autor, 1994, apud BONDUKI, 1998, p.157).

Esta curta produção em período de tempo, contudo, de extremo valor arquitetônico, exprime uma tentativa enfática de projetar de acordo com ideais os contemporâneos à época – frente às dificuldades tanto sociais quanto políticas – distorcidas, a seguir, por um ideal desenvolvimentista, focado em resultados quantitativos, como é ressaltado, [...]perdendo-se os generosos e desafiadores horizontes sociais, onde o resultado econômico não deveria se desligar da busca de qualidade arquitetônica e urbanística, e da renovação do modo de morar, com a valorização do espaço público. (BONDUKI, 1998, p.134)

Em resumo, há-se o desvirtuamento destes projetos habitacionais na busca cega e inútil pela redução de custos, em um racionalismo formal desprovido de conteúdo, com a formulação de um primeiro plano habitacional, formalmente, o Banco Nacional de Habitação, em 1964 - consequentemente, o repertorio da Arquitetura Moderna é rejeitado, como se fosse sinônimo de produção do BNH.

A concepção da Unité d’Habitation de Le Corbusier, projetada entre 1947 e 1952, é explanada amplamente por Anatole Kopp, partindo da referência explícita aos ideais do falanstério de Fourier, as dificuldades enfrentadas por seu pensamento à frente de seu tempo - bem como também por um certo xenofobismo por parte dos franceses -, impossibilitado de ser posto em prática

pela mentalitade retrógrada dos intelectuais do país. Le Corbusier, então marcado pelo acontecimento da Primeira Guerra Mundial, propõe a Segunda era da civilização maquinista, uma renovação social - do modo de viver -, partindo da ideia de tábua rasa, partir do zero, eliminando toda construção anterior à nova era para o homem novo. A célula base da nova cidade é a residência, concebida para ao mesmo tempo se adaptar às novas necessidades e para agir sobre seus utilizadores, participando assim de sua transformação: residência nova e sociedade nova - para Le Corbusier as duas coisas andam juntas: "As residências precisam de muito tempo para mudar de forma, para modificar seus princípios. Quando mudam, é porque reinam novos costumes. Os novos costumes intervêm apenas quando grandes transformações agitaram o mundo; as residências mudam apenas na última hora, quase que contra a vontade dos habitantes, contra a vontade das forças passivas de conservação (LE CORBUSIER apud KOPP, 1990, p.126)

Figura 3: Le Corbusier e croquis da Unidade de Habitação. Fonte: Joanna Helm. "Le Corbusier em cores" 15 May 2013. [ArchDaily. Acessado em 3 Abr 2014]

Segundo Kopp, as Unités basearam-se em três experiências de Le Corbusier; a primeira é sua visita ao monastério da cartuxa de Ema em Firenze: citado em Viagem ao Oriente, impressionado com a organização espacial que combina a independência e a vida individual nas células monásticas e a vida coletiva

organizada nos espaços comunitários. Concebe ali sua "célula em escala humana", com vista para a planície, no alto de uma colina, com um jardinzinho privado no nível inferior, tendo aos fundos um postigo para uma rua circular, onde ocorrem os serviços comuns. Combinar no interior de um único imóvel as residências e seus prolongamentos, ou seja, todos os equipamentos necessários à vida cotidiana: comércio, creche, escola maternal, instalações esportivas. A segunda experiência que influenciou a concepção das Unités foram os DomKommuna, ou Residências Comunitárias, da União Soviética dos anos 1920, cujos objetivos eram realizar economia em termos de ária construída, de materiasi e de créditos, de maneira a resolver o mais rapidamente possível a crise da habitação existente na URSS; conduzir seus utilizadores a uma vida mais coletiva, mais adequada aos objetivos políticos e sociais do regime: um conjunto de células individualizadas diretamente ligadas aos equipamentos coletivos - são eles: cozinha, sala de jantar e lavanderia coletiva. A rua interior satisfaz o papel de conector entre o público e o privado. Os navios transatlânticos são a terceira influência, onde Le Corbusier viveu por quinze

dias em

sua

viagem a

Buenos Aires,

em um espaço

de

aproximadamente 15m², ele percebe a divisão, ou economia do trabalho - e do espaço - que acontece ali em favor do conforto dos passageiros: exemplo da cozinha. Os equipamentos integrados à Unidade de Marselha são, é verdade, infinitamente menos completos do que os de um navio transatlântico, [...] Quanto aos equipamentos coletivos integrados à Unidade de Marselha, eles são de dois tipos: comerciais, agrupados ao longo de uma "rua interior" situada a meia altura do imóvel, e sociais: creche, escola, maternal, ginásio esportivo, etc., sem equecer os "quartos de hóspedes"(atualmente convertidos em hotel) destinados aos visitantes de passagem. (KOPP, 1990)

Por outro lado, Hassan Fathy questionava, já na metade da década de 1940, a produção arquitetônica no Egito, por ser inacessível à população; arquitetos trabalhavam na cidade para clientes particulares, produzindo uma arquitetura que seguia modelos europeus, que utilizava técnicas industrializadas, baseada nos princícios modernos. Fathy , então, abandona seu cargo de professor na Faculdade de Belas Artes do Cairo, e se aventura pelas aldeias rurais do Egito em busca da tradição que estava morrendo. Critica a arquitetura das aldeias, feitas de concreto e materiais industrializados, que eram caros demais para o bolço dos aldeões e não garantiam o mínimo de conforto para essas pessoas. Reunindo um grupo de pedreiros de Assuã, que detinham o conhecimento da construção vernacular dali, iniciou a construção de alguns exemplos com essa técnica, que baseia-se em abóbadas. Confirmou-se que casas feitas de adobe eram mais baratas, levavam menos tempo em sua construção e apresentavam maior conforto aos usuários.

Figura 4: Exemplo de produção arquitetônica incentivada por Fathy. Fonte: FATHY, 1982.

Ao fim da experiência, Fathy (FATHY, 1982) se dedica a narrar sua experiência em Gurna em seu livro. Como obstáculos que surgiram, de perseguição política, problemas técnicos e com a equipe de trabalho, de orçamento; o desinteresse do governo e dos aldeões para melhorarem sua situação - problemas comuns aos países subdesenvolvidos - o levaram ao fracasso na construção de Nova Gurna. Antes de uma proposta para a arquitetura pós-moderna, há na obra de Hassan Fathy uma proposta política para os países do terceiro mundo, que, ao seu ver, têm sua cultura e costumes cada vez mais enfraquecidos, enquanto há uma imposição de modelos europeus e estadunidenses. Além da tradição em declínio existem os problemas sociais - em sua obra ele denuncia a corrupção dos ministérios que o impediam de trabalhar e como ele pode contornar algum desses obstáculos – em um quadro um tanto similar ao que aconteceu no Brasil na mesma época.

Figura 5: Exemplo de produção de habitação social pelo BNH. Fonte: Maricato, 1997

MARICATO (1997) explica a transição política e econômica em relação à Habitação social ao início da Ditadura Militar e o fim da Fundação da Casa Popular e dos Institutos de Aposentadorias e Pensões. Destaca a importância do aumento da concentraçào de renda, o maior acesso das classes mais baixas aos bens duráveis e também a acumulação de bens duráveis, principalmente, neste panorama, a popularização dos automóveis: Em vez das políticas sociais, as obras viárias tornaram-se prioridade do investimento público em todas as cidades brasileira mais importantes. A construção da promessa de Brasília - baseada tanto no modelo desenvolvimentista quanto na ideologia do Movimento Moderno – ser uma cidade planificada socialmente, falha, sendo esta a cidade onde a segregação enter a cidade oficial e a periferia é mais forte do que em qualquer outra cidade brasileira: congela-se a

utopia no plano piloto, tombado; disseminando a ideia de cidade organizada pelos zoneamentos, ao passo que as habitações ilegais e a periferia crescem velozmente.

Com a mudança do regime político, tem-se a forte intervenção estatal; criam-se o Sistema Financeiro da Habitação e o Banco Nacional da Habitação que financiaram aproximadamente 4 milhões de moradias – no entanto, ainda se há uma enorme marginalização e o problema da habitação se agrava. Maricato ressalta a importância do SFH na construção desta grande quantidade de moradias, quase um querto da produção dasa habitações construídas no período, legais ou não, mas, no entanto, adverte que a grande maioria destas moradiam atendiam a classe média ou alta – o que dava respaldo ao regime ditatorial e teve como consequência graves problemas financeiros no Tesouro brasileiro devido à má gerência do FGTS, do qual originavam-se os recursos para

a

moradia.

Simultaneamente,

as

obras

de

infraestrutura

e

empreendimentos públicos atenderam aos interesses dos empresários da contrução e questiona a qualidade e finalidade destas obras, bem como cita a grande frequência de superfaturamento e corrupção. Acerca da habitação propriamente dita, Maricato ressalta a grande perda do mercado rentista, que diminui de 64% para apenas 16% em 50 anos – fruto da ideologia para criar o sonho da casa própria – e revela que a queda pronunciada do número de moradias de aluguel se dá, concomitantemente, ao aumento da população moradora de favelas. Findo o regime militar, alguns problemas se mantém, outros se agravam: a Caixa Econômica Federal herda do BNH uma gigantesca dívida, os interesses políticos se maximizam, lançando alianças clientelistas com empresários e distribuindo apartamentos em troca de votos – e, finalmente, não se há ainda uma política habitacional séria. E, concluindo, resume a situação geral das políticas habitacionais para as camadas mais baixas da população, que

[...]recorre à compra do terreninho irregular, ou constrói no terreno de parentes, ou invade terras que em geral são publicas. A dimensão da ocupação ilegal de terras e imoveis no Brasil é realmente gigantesca, chegando a quase 50% do território em muitas cidades. [...] as saídas para a crise habitacional não apontaram para a produção capitalista da miradia, mas sim para uma imensa produçào atrasada e ilegal (favelas, loteamentos clandestinos), o que desobrigou o Estado e o capital dessa despesa. [...] Muitos dos conjuntos habitacionais contruídos em todo o país trouxeram mais problemas para o desenvolvimento urbano do que soluções. A má localização na periferia, distante das áreas já urbanizadas, isolado e exilando seus moradores, foi mais regra do que exceção. (MARICATO, 1997, p.51)

No entanto, indo no sentido contrário a Maricato, Maria Alice Junqueira Bastos afima que desenvolve-se um pensamento tanto arquitetônico quanto urbanístico neste período, dando ênfase a alguns Conjunto Habitacionais. À década de 1970, se há a preocupação com a demanda de massa (BASTOS, 2003, p.28), baseada na técnica, chegando-se a soluções nem sempre convencionais – característica do pensamento desenvolvimentista -, mas com a nobre finalidade de responder a um problema que é uma necessidade social. Predomina a linguagem técnica, as análises de dados; a humanidade é ausente, tanto no desenho urbano como na arquitetura de edificações, como espantosamente acontece no projeto do Conjunto JK, em Belo Horizonte, por Oscar Niemeyer, onde planejou-se um programa completo para 1100 famílias, com direito até mesmo a boate – ao mesmo tempo, não havia infraestrutura para comportar tal demanda de água e esgoto; como é explicado pela autora, a revista Projeto analisou à época a edificação, sintetizando que [...] ao comentar o temor que se experimento ao percorrer os corredores do Conjunto JK, os autores ilustram o caráter experimental da obra: “É praticamente certo que o arquiteto nunca tinha visto um corredor de 70m sem saída no final” (CORDEIRO, Renato et al. Apud BASTOS, 2003)

Por fim, Maricato conclui afirmando que, com o fim do Banco Nacional de Habitação em 1986, o clientelismo e corrupção acerca da Habitação Social somente aumenta, mesmo tendo-se iniciado, durante o governo Collor, uma

nova fiscalização por parte do FGTS e a Caixa Econômica – incubidos de fazer o papel do extinto Banco. E conclui: “Diferentemente dos países capitalistas centrais, as saídas para a crise habitacional não apontaram para a produção capitalista da moradia, mas sim para uma imensa produção atrasada e ilegal (favelas, loteamentos clandestinos), o que desobrigou o Estado e o capital dessa despesa” (MARICATO, 1997, p.52)

Sobre a próxima política habitacional a ser iniciada, o Minha Casa Minha Vida, iniciado em 2008, visando a construção de 1 milhão de residências, João Sette discute a qualidade arquitetônica das habitações construídas por conta da pouca especificidade da legislação que regula o tema. Em seguida, questiona o papel e responsabilidade do Estado, do Mercado e – principalmente – do arquiteto dentro deste jogo de forças. O MCMV atualmente é dividido em duas fases, diferenciados, principalmente, por na primeira os contratos de licitação entre governo e empreiteiras limitavam-se à construção de moradias. A partir de 2013, iniciada a segunda fase, corrigiu-se o erro e inclui-se nos contratos a infraestrutura urbana que deveriam acompanhar a construção das habitações. O Jardim Vista Bela, em Londrina, para ilustrar, é um exemplo claro de contrato fechado durante a primeira fase de licitação.

Figura 6: Exemplo de produção habitacional do PMCMV. Fonte: FERREIRA (2012)

Houve um tempo em que a profissão tinha papel bem mais atuante na construção civil. [...] Porém, mesmo com arquitetos atuando nas construtoras, veremos neste livro que as restrições impostas pela busca de produção em grande escala e de lucratividade impõem lógica que despreza os elementos da boa arquitetura. [...]Reproduz-se um modelo que, em longo prazo, é insustentável e cobrará seu preço das próximas gerações, mesmo que hoje seduzam o consumidor pela sua aparência. (FERREIRA, 2012, p.30)

Desta forma, o autor questiona o objetivo central do Programa, que visa somente quantitativamente a construção de habitações – que toma como normal a baixíssima qualidade arquitetônica, localizada em periferias, desprovido de serviços complementares assistenciais.

2. ANÁLISE DE EDIFICAÇÕES CORRELATAS

2.1 Iceberg – CCEBRA, JDS, SeARCH e Louis Paillard Architects - 2013 Iceberg (Isbjerget) / Escritórios CEBRA, JDS, SeARCH e Louis Paillard Architects/ Concurso e projeto realizados em 2007 (alterações em 2008); construção entre 2011 e 2013 / Aarhus, Dinamarca / 19.050m² de terreno / 21.600m² de área construída / Custo total de 32.6 milhões de Euros

Figura 7: Desenho de Mikkel Frost, arquiteto do escritório CEBRA, feito após o projeto, explicandoo tanto formalmente como conceitualmente. Fonte: website CEBRAtoons.blogspot.com. Acessado em 08 de maio de 14.

O projeto é o pontapé inicial da reurbanização de um antigo complexo portuário em Aarhus, na Dinamarca, uma área de 800.000m² que será ocupada por 7.000 moradores e 12.000 escritórios. Aarhus é a segunda maior cidade dinamarquesa, funciona principalmente em torno da atividade portuária e uma grande parcela de sua (crescente) população é universitária; sendo nomeada a capital cultural da Europa em 2017, percebeu-se a necessidade de adequá-la aos frutos que se espera deste, variando a atividade e paisagem portuária. Deste modo, quatro diferentes escritórios dinamarqueses unem-se para realizar este conjunto que daria a cara nova para o habitar na região. Originalmente, participaram, desde as primeiras reuniões, em 2006, somente os escritórios JDS e CEBRA; no entanto, abriu-se espaço para o Louis Paillard Architects e o SeARCH participarem.

Figura 8: Diagramas de estudo de insolação e vistas, princípio conceitual do conjunto. Fonte: The Iceberg / CEBRA + JDS + SeARCH + Louis Paillard Architects" 07 Mar 2014. Fonte: ArchDaily. Acessado em 8 de maio de 2014.

O projeto teve como premissa, segundo os arquitetos, aproveitar a vista da Baía de Aarhus a partir do terreno, de forma a maximizar as vistas e a potencialidade de insolação, ao mesmo tempo que deveria respeitar o contexto urbano. Deste

modo, dizem, chegou-se à proposta de quatro blocos em L que intercalam picos, conformando ângulos; a marcante e icônica forma triangular abre precedentes para acomodar diferentes tipologias e usos – o que era previsto pelos autores, assegurar um ambiente urbano com uma diversidade social de pessoas de diferentes idades rendas e relações familiares em convivência.

Figura 9: Edificações e malha viária em contraste ressaltam o contexto onde o conjunto (ao alto, em magenta) é localizado em Aarhus.. Fonte: The Iceberg / CEBRA + JDS + SeARCH + Louis Paillard Architects" 07 Mar 2014. ArchDaily. Acessado em 8 de maio de 2014. http://www.archdaily.com/?p=483415; Google Earth. Acessado em 8 de maio de 2014. [Org. pelo autor]

Originalmente, percebe-se que o projeto contava com um número maior de janelas – principalmente as triangulares -, uma menor quantidade de sacadas – que, originalmente, eram triangulares (as sacadas tipo Titanic, triangulares, do

escritório BIG, parceiro dos escritórios que envolvem o projeto); também o sistema de fundação era diferente, no entanto, por precaução, os novos empreiteiros consideraram pertinente reforça-la com uma plataforma sob os estacionamentos. Estas alterações ocorreram por conta da crise financeira que abalou o projeto, em conjunto com a mudança programática. Mikkel Frost, do escritório CEBRA, responsável por monitorar os aspectos construtivos da obra, declarou que em um projeto econômico desta forma, não se trata de monitorar todos os detalhes – proteger o conceito é a prioridade, tendo a certeza de que o edifício entregue coincide com as expectativas.

Figura 10: Comparação entre o edifício construído em foto, à esquerda, e a maquete do projeto original.

Estruturalmente, o conjunto foi montado com placas pré-moldadas de concreto aerado não autoclavado com espessuras que variam de 80 a 200mm, intercaladas com isolantes. As paredes externas chegam a ter a espessura de 500mm, dependendo de contar com a estrutura em seu interior ou não – esta, feita com perfis de alumínio dobrado – sendo revestidas com gesso gypsum em seu interior ou com Kalzip em suas fachadas. Sobre a variação tipológica, escolheu-se o quinto pavimento e o térreo para demonstrar a variação tipológica possibilitada pela solução formal encontrada pela equipe de arquitetos. Seis diferentes tipos de apartamentos se intercalam,

dando forma ao Iceberg; a solução se mantém ainda na circulação vertical (em branco) provavelmente pré-arranjada, que conta com duas variações de duplex com acesso exclusivo por um dos pavimentos (tipologias número 5 e 6), sendo que a mancha 4 é a parte inacessível desta tipologia. A solução é muito bem feita, priorizando sempre a ideia original que resultou na forma atual: a maior variação possível em vistas e a maximização da insolação, conformando a diferenciação tipológica entre 51,5 e 204,3m².

Bloco A

Bloco B

Bloco C

Bloco D

Figura 11: Variação tipológica entre o Pavimento Térreo e o Quinto Pavimento. Fonte: "Wohnanlage in Aarhus - Housing Development in Aarhus". In: Detail: Review of Architecture. Serie 2014 - 3. Ed. nº 54. (org. pelo autor)

Acerca da espacialidade de cada tipologia, percebeu-se que as mais críticas encontravam-se nos vértices de cada bloco; destacando-as, percebe-se que são seguidos os mesmos princípios: apartamento dividido em dois níveis,

conformando duplex, onde cada pavimento tem uma função diferente – o de acesso direto, social, e o secundário, privativo. Destaca-se as sacadas existentes nos dois níveis, que são desencontradas, de modo a permitir a comunicação entre diferentes níveis.

Figura 12: Variação espacial entre o Duplex com 4 quartos e Duplex com 5 quartos. Fonte: "Wohnanlage in Aarhus - Housing Development in Aarhus". In: Detail: Review of Architecture. Serie 2014 - 3. Ed. nº 54. (Org. pelo autor)

2.2 Conjunto Habitacional Jardim Edite – MMBB & H+F Arquitetos – 2011 Conjunto Habitacional Jardim Edite / MMBB & H+F Arquitetos / 2011 / São Paulo/SP, Brasil / 25.700m² de área construída

Figura 713: Vista do Conjunto a partir do terraço. Fonte: website dos autores do projeto.

Partiu da ideia conceitual de desenvolver uma arquitetura que não se isolasse de seu contexto, que levasse em conta sua natureza econômica e participasse, não se segregasse, da paisagem e contexto econômico. Para se integrar ao setor financeiro de São Paulo, os escritórios postularam que deveria haver a verticalização da moradia, enquanto que os equipamentos públicos – restaurante-escola,

unidade

básica

de

saúde

e

creche



seriam

horizontalizados, de forma que se voltassem ao público da própria moradia como para o público das grandes empresas próximas, inserindo o conjunto na economia e cotidiano da região. Propôs-se um espaço mínimo para estacionamento – uma forma de desincentivar o uso de automóveis particulares. A cobertura destes equipamentos públicos torna-se, em terraço, o térreo da comunidade que ali habita, reservando-se das ruas, mas fortalecendo a conexão desta. Conta com 252 Unidades Habitacionais de 50m², distribuídas em 3 edifícios-torre de 17 pavimentos e dois edifícios-lâmina de 5 pavimentos – sendo que o corredor de cada um destes funciona como extensão do apartamento, sob a proposta de integrar o relacionamento dos moradores e suas crianças em seu uso, além de proteger o interior da chuva e sol. Antes da construção do edifício, havia ali a Favela Jardim Edite, onde habitavam cerca de 800 famílias. Notificada a demolição e desocupação desta pela prefeitura, havia-se pouca expectativa por parte dos moradores de continuar na região, tendo em vista o grande boom imobiliário e o alto valor dos imóveis da região. No entanto, declarou-se o terreno como Zona Especial de

Interesse Social, relegando ao mercado imobiliário, buscando, então, uma fora de habitar includente ao contexto e diferenciada da anterior, por ser formalizada. Localizado junto ao Setor Financeiro de São Paulo, no cruzamento entre as Avenidas Engº Luis Carlos Berrini e Jornalista Roberto Marinho, junto à ponte estaiada.

Figura 15: Localização com relação ao entorno - colorido; foto antiga, mostrando ainda as antigas habitações irregulares. Fonte: website dos autores do projeto.

Houve, de início, a separação natural do terreno em duas quadras: uma maior, com dois edifícios-torre, um edifício-lâmina, o restaurante-escola e a unidade básica de saúde; outra com somente um edifício-lâmina e edifício-torre e, além destes, a creche. O acesso aos equipamentos públicos e à moradia são

diferenciados, feito diretamente a partir da rua aos primeiros e aos segundos por átrios entre as edificações. A comunicação entre estes se dá de forma elevada, por terraço. O terreno é circundado pelas avenidas Jornalista Roberto Marinho – da Ponte Octávio Frias, espraiada - e Engenheiro Luis Carlos Berrini, vias estruturais para a cidade; além destas, é, ao Norte e a Leste, tem ao seu redor as ruas Charles Coulomb e Araçaíba, respectivamente. Fez parte do projeto a continuação da rua George Ohm, antes descontinuada formalmente pela favela que ocupava seu espaço. Ao Norte se tem uma grande quantidade de edifícios altos que fazem parte do Setor Financeiro de São Paulo (um grande número possui heliporto), localizados principalmente entre a Avenida Berrini e a Marginal Pinheiros. Ao Nordeste, no entanto, se tem uma grande zona residencial composta por sobrados, em sua maioria – com alguns pontuais edifícios altos. Ao Sul da Avenida Roberto Marinho a cena se repete, diferenciando-se, no entanto, por ter, a Sudeste, ao invés dos pontuais edifícios altos, grandes galpões ou edificações comerciais.

Figura 17: Foto alterada de vista a partir da rua. Fonte: Google Street View. Esquematizado pelo autor.

Contou-se mais de quinze praças em um raio de 1,5km; em torno de 10 escolas de ensino fundamental ou infantil num raio de 2km; oito subestações de ônibus em 1km;

Nível +06.00

Figura 18: Planta térrea e configuração espacial do programa. Fonte: Planta Baixa original: website dos autores do projeto. Alterações gráficas: do autor.

A implantação se destaca por levar em conta a malha viária do entorno, mantendo a ortogonalidade e havendo, assim, a diferenciação do programa em dois blocos separados, voltados para a área residencial de menor densidade. Há também a diferenciação de usos e acessos por diferentes planos de níveis, em semipúblico e privado, bem como a conformação da organização dos blocos em L e em U é relevante, se tratando de um tipo arquitetônico geralmente relacionado à monotonia – onde a repetição do programa geralmente impera por questões de custo. Esta diferenciação ainda se deu na densidade dos edifícios refletindo, portanto, em suas alturas. Neste sentido, a implantação dos edifícios-lâmina peca ao estar no sentido da via, tendo, assim, um aproveitamento inadequado da iluminação natural, voltando-se para o Norte. Ao mesmo tempo, no bloco da quadra menor, o edifício-torre tem sua implantação diferenciada dos outros edifícios, com seu corredor de cada pavimento voltado para fora da quadra, a Oeste.

Nível +06.00 Figura 19: Planta do pavimento tipo e configuração espacial do programa nas diferentes edificações. Fonte: Planta Baixa original: website dos autores do projeto. Alterações gráficas: do autor.

Quanto aos equipamentos públicos presentes no Conjunto, não se pôde obter informações precisas. Por outro lado, a integração destes e das unidade habitacionais é feita, dentro do possível, de forma a complementar-se com a sobreposição de planos e diferenciação de circulação. Nota-se a interessante organização dos usos por cores das fachadas das edificações – uma solução simples que é, por sua vez, marcante. O conjunto por vezes peca no quesito

acessibilidade, não dando opção de acesso direto por rampa – este é feito em nível diferente da rua por meio de escadas. No entanto, uma vez dentro do edifício, este oferece rampas de acesso aos átrios e escadas e elevador aos pavimentos mais altos.

Percebe-se, no edifício-torre, duas tipologias distintas: uma paralela ao hall, que se estende em direção ao sentido inverso, concentrando as áreas molhadas, como cozinha - que, particularmente, forma um corredor em conjunto com a sala de estar – sanitário e área de serviço; esta última, voltada para o hall, que fornece ventilação e iluminação. A sala, como dito, sugere a forma de corredor, separada em dois ambientes: sala de TV e jantar. Os quartos encontram-se aos fundos, sendo um deles para casal e outro para duas crianças, segundo o programa. A segunda tipologia segue também uma disposição linear, porém diferente da primeira, por abranger a largura inteira do pavimento; tem-se a área de serviço em um extremo, ao lado da cozinha, que dividem parede com o hall externo – desta vez a área de serviço encontra-se imediatamente junto à face externa do prédio. O acesso à unidade se dá por um pequeno corredor formado pela parede da cozinha, conformando já a sala, desta vez quadrada, mas, mesmo assim, dividida entre sala de estar e jantar. O sanitário faz o papel de separar os quartos, todos voltados para a face oposta da edificação. O Hall, nestas tiplogias, tem papel fundamental como centralizador e delimitador e caracteriza a principal fachada do edifício, com elementos vazados verticalizados intercalados. No plano horizontal, ele é alargado, em dois níveis, de forma que este desnível forme um banco para a relação dos moradores neste espaço. A escada, o elevador e o espaço anterior a este centralizam a funcionalidade da edificação, tendo ali locados os shafts, equipamentos de bombeiros e algumas

paredes hidráulicas do pavimentos – as demais são dispersas nas faces externas do edifício.

Figura 21: Planta detalhada do Edifício-Lâmina e configuração espacial do programa. Fonte: Planta Baixa original: website dos autores do projeto. Alterações gráficas: do autor.

Quanto aos edifícios-lâmina, se tem somente uma tipologia por pavimento, sendo que cada par de apartamento tem acesso exclusivo pelas escadas – uma edificação possui 4 jogos de escadas e a outra 5 – espelhando-se a partir destas. Estes apartamentos seguem também a funcionalidade espacial ortodoxa regida pela economia da construção: tendo acesso pela sala, que, dividindo o mesmo ambiente com a cozinha, atravessam o pavimento de fora a fora; a parede da cozinha é dividida novamente com sanitário e área de serviço – esta última com acesso exclusivo pela cozinha e totalmente voltada para o

exterior. O sanitário tem seu acesso voltado tanto para a sala quanto para os quartos, sendo, novamente, um para casal e outro para um casal de crianças. Os quartos, desta vez, dividem parede com o apartamento vizinho. No entanto, o vizinho tem acesso a seu apartamento por outra escada – o que não é tão interessante quanto a ideia do hall com banco, porém, pode ser vista como uma forma de estimular o uso frequente do átrio para relação entre vizinhos – distante, no máximo, a cinco lances de escada.

Percebe-se, pelo Corte AA o acesso feito pelos moradores, por meio de rampas, ao átrio ao alto e ao usuário comum o acesso ao restaurante-escola por um átrio térreo.

Figura 23: Corte BB do Edifício-Lâmina e configuração espacial de programa e acessos diferenciados. Fonte: Corte original: website dos autores do projeto. Alterações gráficas: do autor.

Pelo Corte BB, se tem noção de escala e do desalinhamento do edifício-lâmina em relação à torre, bem como a iluminação zenital realizada por clarabóia para a Unidade Básica de Saúde, cuja laje conforma o espaço de convivência dos moradores.

Figura 24: Corte CC do Edifício-Lâmina e configuração espacial de programa e acessos diferenciados. Fonte: Corte original: website dos autores do projeto. Alterações gráficas: do autor.

Percebe-se também que, diferentemente do Restaurante-Escola, esta Unidade é nivelada, com o provável propósito de acessibilidade. Em relação à Habitação, fica claro o desenvolvimento tectônico voltado para o usuário no detalhe do espaço entre as esquadrias de janela e a fachada de alvenaria, que forma um nicho que pode ser utilizado para armários.

Nota-se, no Corte CC, o plano horizontal em nível único da Creche, o acesso por escadas desta para o Átrio descoberto. Aparentemente, o corte pretende mostrar diferentes níveis da Habitação, aparecendo ora cozinha e sala, ora lavanderia, sanitário e sala. Fica claro, no entanto, o tratamento diferenciado da fachada, feito com vazados de alvenaria verticalizados permeados pelos gradis metálicos no Hall.

Figura 25: Fotos da construção do Conjunto habitacional. Fonte: website dos autores do projeto.

Quanto à construção, no Memorial dos autores consta a utilização de a utilização de materiais convencionais, como concreto moldado in loco e alvenaria, o que pode ser justificado, tendo em vista o experimentalismo da obra como um todo, como uma forma cautelosa da edificação ser aprovada pelo próprio usuário.

Figura 26:Fotos da construção do Conjunto habitacional. Fonte: website dos autores do projeto.

2.3 Projeto Habitação Cidade – Vigliecca & Associados – 2011 Habitação Cidade / Vigliecca & Associados /projetado em março de 2011/ São Paulo/SP, Brasil / não construído / 40.507m² de terreno /68.463m² de área construída total / 887 unidades habitacionais / 788,44 hab./ha

Figura 27: Vista a partir da rua. Fonte: dos autores.

O conjunto faz parte de um estudo que o escritório participou em conjunto com o LabHab/USP para desenvolvimento do livro Produzir Casas ou Construir Cidades, de 2012. Esta simulação buscou seguir uma tipologia comum aos empreendimentos do tipo, sendo classificado como empreendimentos verticais sem elevador; tendo, no entanto, seu terreno escolhido na Região Metropolitana de São Paulo, em área urbanisticamente consolidada, próximo a equipamentos públicos, com vias estruturais de transporte, junto a uma grande área verde – tendo em vista as condicionantes levada comumente pelo mercado empreendedor deste tipo, tentando maximizar a densidade bruta e, assim, diminuir o custo do terreno por unidade habitacional. Propôs-se, portanto, uma nova costura urbana, como consequência da junção de diferentes terrenos acidentados e interrompidos, adequando-se à malha viária, saturando o tecido urbano, reestruturando as vias e ruas internas, eliminando os pontos cegos e estabelecendo com legibilidade as conexões e

continuidades. Sobre pilotis, os edifícios abrem as quadras para as calçadas, definindo-se em eixos com usos variados por conta dos pavimentos térreos comerciais. Deste partido e da premissa de não interferir na topografia original, aproveitou-se

o

meio-nível

para

configuração

de

estacionamentos

semienterrados, de forma menos onerosa tanto economicamente quanto para o local da implantação. A qualidade de vida urbana também é um dos pontos chave do projeto; levando em conta a questão das áreas verdes vizinhas ao terreno, criou-se pátios internos para atividades de lazer que, tendo a edificação sobre pilotis, liberam a circulação a nível do solo. Na questão da implantação, tentou-se realizar uma conexão com a malha urbana estrutural da cidade e o transporte público, de forma a saturar o tecido urbano por questões de legibilidade deste; ao mesmo tempo, faz-se uma leitura da malha viária e da geografia presente, conformando-as gerando, de certo modo, a forma final do conjunto – ortogonal, porém, não monótono. Buscou-se também levar em consideração a área verde e os equipamentos de lazer projetados, de forma a fortificar a centralidade e hierarquia destes - e transformar em pontos de referência – não somente local como regional, voltando-se também para a comunidade ao redor. Outro ponto abordado foi a inserção de edificações de uso misto, chamados vetores comerciais, indutores ao uso, segundo o escritório, que ativam e dinamizam a urbanidade, estabelecendo centralidades abertas ao uso público.

Figura 28: Implantação do conjunto e sua relação com o entorno. Fonte: dos autores.

A

variedade

tipológica

em

quatro

apartamentos



sendo

três,

de

aproximadamente 50m², com três dormitórios e outra de 40m², de dois dormitórios – configuram espacialmente a simplicidade deste tipo de habitação, que tem em vista a racionalização estrutural – em blocos estruturais – em conformidade com as possibilidades espaciais deste tipo estrutural e a possibilidade de formalizar um ambiente necessariamente harmonioso.

Figura 29: Implantação e variação tipológica. Fonte: Dos autores.

A criação de mobiliário fixo induz ao morador usos específicos, bem como a determinação de dentes entre planos abertos e fechados, que induzem à instalação de armários – em paredes onde a insolação é maior, de forma a melhorar o conforto térmico por indução.

Figura 30: Diretrizes projetuais - Mobiliário fixo (e consequente indução ao uso) e ventilação cruzada possibilitada. Fonte: dos autores.

Formalmente, buscou-se, com a criação de pátios internos, fortalecer a esquina construída, elemento tradicional urbano, considerando, em seus extremos, as construções vizinhas, em solidariedade com estas, em uma ação ética, propondo os volumes de forma que não gerassem sombras indesejadas sobre estas edificações existente ou espaços tridimensionais residuais. Também solucionou-se, desta forma, a questão do uso pertinente do solo, evitando ocupa-lo com estacionamentos, exclusivamente, tornando-o permeável; a questão da insolação e ventilação também é resolvida: por ter duas fachadas

opostas, pôde-se realizar ventilação cruzada. Ainda em relação à questão da sustentabilidade, implantou-se um sistema de drenagem para armazenamento de água, de forma a prevenir alagamentos e fazer o reuso em irrigação e limpeza; definiu-se, da mesma forma, tubos de vidro a vácuo na cobertura para provimento de água quente a custo zero.

Figura 31: Diretrizes projetuais - relação passiva com o entorno, formulação de esquinas construídas e uso pertinente do solo (em garagens a meia cota). Fonte: dos autores.

Figura 32: Corte transversal - variação tipológica acompanhando o gabarito e determina a variação tipológica em diferentes níveis; garagens abaixo do nível da rua; esquinas fortalecidas com diferenciação formal. Fonte: dos autores.

O projeto é, enfim, uma busca pela quebra do paradigma da Habitação Social em um exercício simulado de forma realista, com apresentação de previsão de custos para comprovar esta possibilidade, e de forma positiva influenciar um pensamento arquitetônico sobre o tema – tão em voga na realidade atual quanto em estudos teóricos nacionais e internacionais. Mas que são executados, infelizmente, sem este pensamento e mal visto, por vezes, como uma má arquitetura – e não uma possibilidade.

2.4 Conclusão Dos projetos apresentados, pode-se destacar principalmente o otimismo com que este tipo arquitetônico tem sido tratado; isto por conta da efetivação de um plano habitacional que leva em conta a arquitetura envolvida, como visto no caso do Iceberg; e no Brasil, especificamente, o desenvolvimento de estudos e a tentativa da quebra do paradigma de que habitação popular não possui qualidade arquitetônica, como visto nos casos do Jardim Edite e do Habitação Cidade, em que escritórios reconhecidos por projetos diversos de tipos arquitetônicos diferentes abrem o campo da experimentação arquitetônica na Habitação de Interesse Social em um momento – histórico – de reconhecimento do problema.

3. INTERPRETAÇÃO DA REALIDADE: LONDRINA/PR O projeto de conjunto habitacional tem como premissa localizar-se na área central do município de Londrina, cidade que surge, conforme afirma o website da Prefeitura, como empreendimento rural na década de 1920, pela Companhia de Terras Norte do Paraná, que buscava terras para plantar algodão, mas, tendo suas expectativas frustradas, tornou-se então um projeto imobiliário – tendo sua fundação oficial somente em 1934. A partir daí, fomenta-se o comércio por quase uma década, até sua consolidação, firmando Londrina em posição de destaque neste sentido no cenário nacional. Ao mesmo tempo, desenvolve-se

na cidade o primeiro plano urbanístico, devido ao salto

populacional em torno de 50 mil habitantes. Deve-se a estas condições a vinda de profissionais da arquitetura e urbanismo, segundo SHIGEHARU (2011), sendo necessários novos loteamentos e, consequentemente, ao fim da década de 1950, põe-se em destaque a avançada urbanização na região em relação à média de urbanização nacional. A partir da década de 1960, junto com a retirada do pátio ferroviário do centro da cidade, inicia-se um boom de verticalização na área central, conforme CASTELNOU (2003) e dá-se o pontapé no processo de descentralização das habitações populares, conforme, ainda, afirma o website da Prefeitura, que estariam sendo implantados entre 6 e 7 quilômetros de distância do centro da cidade,

em conjuntos habitacionais edificados pela COHAB. A produção

habitacional tem seu auge no início da década de 1980, quando entrega 7 mil unidades em somente um ano, de acordo com MARTINS e FRESCA (2005). Ainda segundo o autor, este tipo de habitação em Londrina, desta data até os dias de hoje, teve sua área média diminuída de 40m² para 20m². Existem favelas localizadas a menos de 01 Km do centro da cidade em decorrência desta configuração natural. Nas áreas nobres da cidade, estes fundos de vale atendem aos moradores como área de lazer, enquanto grande parte dos demais se encontram

abandonados, servindo como depósito de lixo e entulho ou foram ocupados com residências gradativamente e de forma irregular. (website da CML)

Tendo-se alterado pouco o consolidado centro da cidade – com exceção do traçado viário alterado para criação do Calçadão - , e surgido novos subcentros, como na Zona Norte, SILVA (2003), constata: “O surgimento dessas novas áreas delibera a concorrência e a disputa por consumidores, modificando a própria estruturação do espaço urbano de Londrina, bem como, as áreas que conferem “status” para o consumo e para a função residencial.”

Desta forma, houve, a partir dos anos 2000, o deslocamento desta massa consumidora, com maior potencial econômico, para a região Sul, agora consolidada e, novamente, se tem confirmado o projeto imobiliário iniciado há quase 80 anos, voltando a atenção imobiliária desta vez para a região Leste, como pode ser constatado em notícia recente: A região Leste tem sido apontada como principal vetor de crescimento de Londrina para os próximos anos, impulsionada por investimentos públicos a instalação da Universidade ecnológica Federal do Paraná (UFPR) e o asfaltamento da Estrada dos Pioneiros - e privados - como a instalação de um shopping center. Essa pujança tem feito as construtoras voltarem seus olhares para a região, com investimentos de variados portes. (FRANÇA, Cecília.“Os olhares se voltam para o Leste: investimentos imobiliários apontam para a região, mas Gleba Palhano ainda mostra fôlego” in: Jornal Folha de Londrina, edição de 27 de março de 2014.)

Em outra notícia, registra-se o aumento de ocupações irregulares em Londrina, totalizando 11 destas, envolvendo mais de 500 famílias no problema. Destacase a solução para a equação-problema dentro de si mesma, como apresentada na própria reportagem: “Pesquisadora na área de habitação de interesse social, a professora de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Madianita Nunes da Silva também avalia que o preço dos terrenos aumentou e começou a inviabilizar empreendimentos para a faixa 1 do Minha Casa. Ela ressalta que pesquisas mostram que desde a década de 1990 o número de domicílios em situação de informalidade crescem no país. A

ocupação de novas áreas e o adensamento de antigas, pontua ela, deveria levar o poder público a reorganizar as políticas voltadas para o setor. Para Madianita, construiu-se no Brasil a ideologia da casa própria, como se as pessoas precisassem ser “proprietárias” para ter acesso à moradia. Em outros países, como a França, há adoção do modelo de locação social, em que imóveis pertencentes ao governo são locados a preços diferenciados.” (LUCIANO, Antoniele.“Ocupações irregulares crescem em Londrina - Número de áreas invadidas passou de 7 para 11 nos últimos dois meses. Famílias dizem que não podem arcar com aluguel” in: Jornal Gazeta do Povo, edição de 14 de abril de 2014.)

Figura 33: Mapa sintetizando a Evolução Urbana, Densidade Demográfica, Ocupações Irregulares e Vazios Urbanos dentro do limite urbano da cidade de Londrina. Fonte: IPPUL (2006), COHAB – Londrina (2006) . Organização gráfica: do autor.

Ainda sobre o tema, há uma terceira notícia, ainda mais recente, que relata a possibilidade de expansão do limite urbano da cidade para possibilitar a criação de mais habitações populares – neste caso, chegando a 12km de distância do centro da cidade. Entrevistado pela reportagem, o professor de Arquitetura e Urbanismo da UEL Gilson Bergoc, defende que deve-se decretar áreas de interesse social, para que haja a diminuição do valor do terreno, contrariamente à ideia de expansão do limite urbano: “Tem que levar a infraestrutura para lá e tem todos os serviços que serão redimensionados para atender a situação” Esses custos são diluídos entre todos, aumentando os custos de manutenção da cidade. Por outro lado, Bergoc lembrou que isso cria “bolsões de vazios urbanos que geram custos [para a cidade]”. “Esses terrenos não vão baixar de preço, só aumentam. A cidade toda paga pela valorização desses espaço.” (SILVEIRA, Fábio; FRAZÃO, Marcelo (colab.) .“Especulação força aumento da área urbana para abrigar casas - Novos conjuntos habitacionais, como os do programa federal Minha Casa, Minha Vida, estão cada vez mais distantes do centro da cidade[...] ” in: Jornal de Londrina, edição de 22 de abril de 2014.)

A definição de Habitação de Interesse Social dada por LARCHER (2005) é comparativa e restritiva, enquadrando-a em termos políticos, sociais, ambientais e econômicos, com relação a outros termos comumente utilizados – tais como “Habitação Popular”, “Habitação de Baixo Custo” e “Habitação de Mercado Popular”. Diferencia-se, portanto, das demais, por ser um tipo habitacional baseado em um plano de governo, parte de um processo, resultando em serviços urbanos, infraestrutura urbana e equipamentos sociais. A forma de construção e financiamento é outro ponto caracterizador, por ser financiado pelo poder público, mas não necessariamente produzido pelos governos, o que não inclui, por exemplo, a autoconstrução – presente na conceituação dos termos acima citados -, mas, sim, empreiteiras e construtoras. Destinada à faixa de renda de até 3 salários mínimos, de forma a incluir este estrato populacional; Larcher estima que o valor da moradia seja quatro vezes a renda anual do proprietário.

A Habitação de Interesse Social trata também de situações de risco não relacionadas diretamente à economia, como situações extremas ambientais, quando uma população ocupa irregularmente uma zona protegida ambientalmente, por exemplo, ou situações culturais, como, por exemplo populações quilombolas. Larcher ressalta, enfim, a relação entre Habitação de Interesse Social, Plano Diretor e Estatuto da Cidade, que, em conjunto com o conceito de Zona Especial de Interesse Social, são a base para o desenvolvimento deste tipo de habitação, previstos legalmente, a fim de garantir o direito à moradia. No entanto, somente sua previsão não garante eficácia. O Estatuto da Cidade, redigido em 2001, é derivado da Constituição Federal de 1988, tratando de regulamentar e explanar, em especial, o planejamento participativo e a função social da propriedade. Este Estatuto tornou obrigatório que cada município com mais de vinte mil habitantes – em geral, dentre outras especificidades - criasse seu Plano Diretor, cuja finalidade é tratar de forma legal, dentro do âmbito municipal, o uso e os direitos ao solo urbano em cada cidade – e deveriam ser revistos a cada decênio. Dentre os instrumentos regulados no Plano estão as ZEIS – Zonas Especiais de Interesse Social, que tem por fim a regularização fundiária, de forma a incluir a moradia irregular, urbanizando-a, bem como o reconhecimento da diversidade de ocupações existentes, propondo a possibilidade de construção de uma legalidade acerca destas ocupações. A implementação destas Zonas repercute na concepção sócio espacial das cidades, reduzindo sua homogeneização – em relação às legislações de uso e ocupação do solo, que, seguidas à risca, delimitam de forma extremada os padrões de ocupação da cidade – e ao mesmo tempo reduzem-se as diferenças de preços entre as terras, diminuindo o contraste entre a qualidade das edificações. Em conjunto com o Plano Diretor Participativo, as ZEIS corroboram a introduzir mecanismos de participação direta dos moradores no processo de definição dos investimentos públicos em urbanização.

Em Londrina, as ZEIS estão previstas no Plano Diretor Participativo de 2008 dentro do capítulo de Política Municipal de Habitação em seus princípios, diretrizes e ações estratégicas, ressaltando-se uma de suas diretrizes que trata destas e da infraestrutura já existente: Art. 41: XI - priorizar, quando da construção de moradias de interesse social, as áreas já devidamente integradas à rede de infraestrutura urbana, em especial as com menor intensidade de utilização;

No entanto, para sua consolidação e eficácia, faz-se necessária a aprovação das Leis Complementares ao Plano, dentre elas, a de ZEIS, redigida em 2013. No processo de redigir estas leis, houveram conferências abertas à participação popular entre 2008 e 2010. Segundo o site da Câmara Municipal de Londrina, desde então, revisões se fizeram sobre revisões de diferentes partes da administração pública, provocados por diferentes fatores, como consta, tornando as leis inconsistentes, que, então, foram arquivadas. Desde então, novos debates foram realizados, novas conferências foram abertas ao público e novas audiências marcadas. No Projeto De Lei acerca das Zonas Especiais de Interesse Social, são escaladas três formas de ZEIS, a primeira tratando da regularização fundiária de ocupações informais, a segunda de regularizar conjuntos não regulados e a terceira de espaços não edificados, não utilizados ou subutilizados localizados prioritariamente em áreas onde há infraestrutura urbana. Ressalta-se, mais além, em seus objetivos: Art. 4º - VII: Induzir o repovoamento das áreas centrais ociosas e vazias para produção de Empreendimentos Habitacionais de Interesse Social, de modo a ampliar a oferta de terra para moradia dos segmentos populacionais socialmente vulneráveis e otimizar a infraestrutura urbana existente;

Dentro destas possibilidades, o seguinte projeto enquadrar-se-ia na terceira forma de ZEIS, a fim de contribuir para diminuir o déficit habitacional em Londrina, que, é estimado pelo Plano Municipal de Habitação em 15.500 famílias. Dentro das perspectivas do projeto de fornecer 37 unidades habitacionais, isto representaria 0,25% do déficit, sendo a densidade do conjunto de 275 habitantes por hectare. Além, se levarmos em conta o dado levantado anteriormente de que há na Região Central de Londrina – dentro do perímetro levantado pelo autor – 12 hectares de área de terrenos inutilizados ou subutilizados, pode-se inferir que, dentro da mesma densidade média, poder-se-ia resolver 3% do déficit habitacional de Londrina sem a necessidade de infraestrutura, por localizar-se na Região Central.

Dentro deste contexto histórico e atual, considerado no momento de escolha de um terreno para a prática projetual, tinha-se em mãos três fatores a serem considerados: i) o surgimento de um projeto imobiliário específico com a área Leste da cidade – não deixando de citar as potencialidades com a revitalização do Calçadão dos chamados Colossinho e Cadeião; ii) as ocupações irregulares, que tomam espaços dentro do Centro da cidade e fora dele, e possivelmente terão, na região Leste, que ser desocupados; e iii) os Vazios Urbanos, como citado por Bergoc, que são um problema também dentro e fora do Centro da cidade. Primeiramente, fez-se um levantamento de terrenos vazios ou subutlizados no Centro de Londrina. Para tanto, considerou-se o espaço dentro de um raio de 1,5km que parte do cruzamento entre as Avenidas Higienópolis e Juscelino Kubistchek – por ser considerada uma região de grande demanda e oferta de empregos, serviços e, possivelmente, mais moradias – e constatou-se a existência de 35 terrenos deste tipo somente nesta área, que, somados, totalizariam a área de 12 hectartes.

Figura 35: Terrenos vazios ou subutilizados (destacados em laranja) dentro do considerado centro de Londrina sendo o Norte ao alto. Fonte: Base cartográfica: IPPUL (2008). Alterações gráficas: do Autor.

Dentro desta realidade, percebeu-se a possibilidade de projeto em diversas escalas. No entanto, dentro do contexto apresentado, percebeu-se necessário direcionar a escolha do terreno para a região Nordeste, aproximando-se da Catedral metropolitana e da Região Leste de Londrina, de forma a aproximar-se tanto de uma população que será possivelmente deslocada, proveniente das ocupações

irregulares

apresentadas

e

dos

novos

empreendimentos

imobiliários, bem como estar inserido na área central.

Figura 36: o terreno escolhido, destacado entre alguns pontos de referência e vias de importância e acesso. Fonte: Google Maps. Alterações Gráficas: do autor.

Assim, dentre os terrenos apresentados, escolheu-se o maior, localizado entre as ruas Brasil e Uruguai e as ruas Espírito Santo e Alagoas. Este terreno é configurado, de acordo com a Lei 7485 de 1998, inicialmente, como Zona Comercial 4, que visa a estimular a concentração de usos variados, fortalecendo a centralidade. Desta forma, com seu Coeficiente de Aproveitamento Máximo potencializado, segundo o artigo 23 da norma, a área possível de ser construída chegaria a quase 12.000 metros quadrados. No entanto, seu uso torna-se equivalente ao Residencial 3, tendo seu potencial construtivo reduzido a no máximo em torno de 5,2 mil metros quadrados. Expõe-se a limitação pelo artigo 15, parágrafo 5º, de que o uso não residencial deste tipo de zona é estrito a 15% da área total do terreno -

neste caso, 595m². Dentro deste universo, maximiza-se o gabarito de altura para um máximo de 19,5 metros, tendo, assim, seus recuos determinados como 2,5m de lateral mínimo e frontal mínimo de 5,7m – conforme os artigos 43 e 44 da lei. Para a quantificação de unidades habitacionais, o parágrafo primeiro do artigo 15 recomenda 125m² para cada unidade em razão da área total do terreno, chegando-se então à possibilidade de construção máxima de 31 unidades. Ainda sobre a legislação, conforme o artigo 63, estipula-se a taxa de ocupação escalonada, de acordo com os pavimentos, de 100% para o térreo, 70% para o segundo pavimento e 50% para os demais. Abaixo, resumiu-se a legislação em um diagrama:

Figura 37: Diagrama resumindo as possibilidades dentro do zoneamento. Fonte: do autor.

No entanto, questiona-se as limitações expostas pels legislação, tendo em vista a potencialidade de um projeto de interesse social ser tratado meramente como habitacional, a questão do valor do terreno e a limitação do uso diverso do residencial – o que poderia gerar, urbanisticamente, uma revaloração da área de implementação do projeto, bem como economicamente como socialmente – que reduz a viabilidade do projeto por ter o custo total da obra dividido entre no máximo 31 famílias, além da área de 595m², que, a priori, poderia ser dez vezes maior. Resume-se, em um diagrama, a potencialidade do empreendimento que deve ser levado em consideração, tratando-se de um problema sócioeconomico:

Figura 38: diagrama-resumo da legislação potencializada: em cores sólidas, os diferentes usos; em hachuras, as limitações espaciais minimizadas, previstas em norma. Fonte: do autor.

No entanto - especulações à parte - o terreno sendo configurado como Zona Especial de Interesse Social, em especial no Centro da cidade, deverá ser utilizado da melhor forma a valer o suposto investimento e garantir, por meio da

arquitetura, a qualidade de vida e distinção da produção de moradias que é feita. É desta forma, como ZEIS, que ele será considerado no exercício projetual deste trabalho - respeitando, ainda, seu entorno e os coeficientes de densidade demográfica explanados no Projeto de Lei 1907 de 2013, acerca das ZEIS, que estipula o mínimo de 50 habitantes por hectare. Acerca do entorno, pode-se ressaltar a nítida divisão de usos e sua conformação com a diferenciação de gabaritos de altura das edificações, sendo predominante a existência de edificações majoritariamente comeciais verticalizadas e algumas residenciais; edificações de baixo gabarito de uso misto - sobrados com comécio ao nível da rua e residências acima; este padrão pode ser percebido a Oeste da rua Brasil. Enquanto ao Leste desta rua há presença majoritária de residências de baixo gabarito. No geral, o uso é diversificado,

com certa

concentração

de

edificações

institucionais e

educacionais, mas, como explica SHIGEHARU (2011) : Nota-se ainda que, para a transição na Avenida Dez de Dezembro, existem grandes conflitos de travessia e entendimento local, ou seja, não se reconhece pelos usuários, um ponto seguro para se transpor até a área solicitada, após a avenida.

Isto se dá, provavelmente, como é explicado pela autora, pela falta de pontos de refência na região, que pode causar sua baixa legibilidade.

Figura 39: cortes esquemáticos do entorno do terreno, com suas edificações ao redor. O corte passa, acima, pela rua do autor. rua Alagoas, com vista para o Norte, e abaixo pela ruarua Brasil,brasil com vista para o Oeste. Fonte:

uruguai

rua alagoas

rua espírito santo

O terreno em geral tem seu aclive em direção a Oeste, condizente com a ventilação predominante na cidade, no sentido Leste-Oeste, como de acordo com o Atlas de Londrina. Este aclive se dá em média de 5%, ou seja, é de alta caminhabilidade. No sentido transversal, se tem o terreno quase que planificado, com suas curvas no sentido das quadras. De certa forma, estas informações já fornecem algumas diretrizes de implantação do projeto, como será explanado a seguir.

4. DIRETRIZES PROJETUAIS E CONCEITUAÇÃO O projeto é embasado conceitualmente em dois preceitos: nas moradias populares, na autoconstrução, onde os espaços públicos e privados são permeáveis, não se caracterizam formalmente de um modo explícito, seja pela priorização de aberturas e fechamentos ou marcos monumentais, e a informalidade, esta sim, é explicitada. Esta ideia formalizou-se no projeto em uma praça que une as habitações e a cidade, estando aberta a ela, e a circulação é delimitada de forma subliminar em sua maioria, sendo utilizados fechamentos totais, como muros, somente por questão de segurança. Também faz-se referência à construção informal em outros elementos e decisões de projeto, que serão citados adiante, como por exemplo, a fachada de elementos cerâmicos,

dispostos

em

45º.

O

segundo

aspecto

que

determinou

conceitualmente o projeto é a arquitetura moderna brasileira de habitações coletivas - elogiada por Le Corbusier, como explicado no início deste trabalho que sempre buscou a qualidade arquitetônica de uma forma prática, mas afetiva, onde a modulação e a produção em larga escala não foram limitadores criativos, mas sim impulsores, seja utilizando o repetitivo do estrutural, por exemplo, uma forma poética, ou superando dificuldades técnicas em favor da qualidade arquitetônica.

Ao início do projeto, foram estipuladas quatro Tipologias diferentes, todas obedecendo as limitações modulares impostas pelo sistema steel frame e, excetuando a tipologia 4, as normas de acessibilidade – por ser duplex. Todas, também de acordo com o sistema construtivo, possuem alta mutabilidade em sua configuração espacial, levando-se em conta que é uma moradia para uso de boa parte da vida do proprietário. A definição projetual destas iniciou-se com as recomendações do Código de Obras de Londrina quanto a metragem, distâncias e ventilação, passando para uma adaptação deste mínimo ao sistema modular, para então sua diferenciação e especialidade, de acordo com o usuário pensado para cada uma. As três primeiras Tipologias, presentes nos Blocos Leste e Oeste, possuem duto de ventilação e iluminação, para troca de correntes de ar mais eficazes em suas áreas úmidas (banheiro, cozinha e área de serviço), bem como favorecer a ventilação natural para os outros cômodos por diferença de pressão. Se priorizou a concepção espacial e suas aberturas de modo que a ventilação cruzada seja maximizadas – com pé direito de quase três metros, pode-se especificar janelas que chegam quase à altura de 2,10m, com este fim. A Tipologia 01, de 41.10m², possui somente um quarto, porém possui espaços sociais maiores; sua sala chega a ser 3m² maior que as demais e sua varanda possui área de quase um dormitório pequeno. Como nas outras tipologias, sua cozinha e sala dividem o espaço, bem como a sala de estar e jantar. A circulação é mínima e dá acesso ao único banheiro e quarto. A lavanderia divide parede com a cozinha, e possui ventilação cruzada por estar entre o duto e o corredor externo. A Tipologia 02, de 42.85m², possui dois quartos de tamanhos diferentes; no menor, há uma varanda mínima que serve para a circulação de ar tanto do quarto quanto do banheiro. Sua sala é menor e os espaços foram concebidos de modo que minizem os corredores e sua inutilização. A Tipologia 03, a maior, de 57.10m², diferencia-se das demais por possui três quartos e um depósito; os quartos tem acesso a varandas mínimas, também com o intuito de amortizar a insolação direta e amenizar a temperatura interna.

As varanda diferenciam-se das demais tipologias por sua cobertura ser composta de cobertura verde, também com o fim de amortizar a temperatura geral do apartamento. Os quartos possuem espaços que induzem ao uso de mobiliários específicos, como armários. A Tipologia 04, projetada em forma de duplex, foi concebida assim a fim de minizar a circulação e a área total ocupada em planta, totalizando a área do pequeno apartamento em 56.75m², divididos quase que em áreas iguais nos dois pavimentos. Estes estão divididos por uso; embaixo há a sala de jantar/estar, cozinha e área de serviço; acima há o quarto com varanda, banheiro e um pequeno escritório. A varanda e o quarto projetam-se para fora do corredor que o pavimento inferior conforma, a fim de formar bolsões de ar que ventilem tanto os duplex como a praça e o bicicletário logo abaixo deles. Projetou-se a varanda com cobertura verde, para que amenizem a temperatura do ambiente interno e a luz refletida para dentro deste. A escada ocupa um total de 5.72m² em planta, porém, tem de inutilizável somente 2.57m² deste total.

O acesso ao conjunto e dentro dele acontece todo por rampas de inclinação 5%, de forma que seja acessível, ao mesmo tempo que acompanha a declividade média do terreno. Ele se dá pelas duas ruas; o principal, pela rua Alagoas, é dividido em três: o primeiro, que dá acesso ao nível 0m, e às moradias nos Blocos Oeste e Norte – em formato de L, onde conforma-se uma Praça e Área De Convívio, que tem como eixo uma árvore já existente. Para o Bloco Norte, com os duplex dispostos no sentido Leste-Oeste, há uma segunda rampa que sobe 0.60m, dando acesso ao seu corredor coberto. Para as moradias do Bloco Oeste acima do nível 0m, dois lances de rampa por pavimento vencem o pé direito de 3m (e da mesma forma acontece no Bloco Leste, exceto no primeiro pavimento, onde o pé direito é de 4,50m e, portanto, possui dois lances e meio) sempre a Oeste das moradias, protegido por brises. Ainda sobre o acesso pela rua Alagoas, a segunda rampa desce à cota -3.1m, onde encontram-se o Bicicletário e uma segunda Praça. O terceiro acesso pela rua Alagoas desce ao nível -4.50m, onde se encontram as Lojas, o acesso às

moradias nos pavimentos superiores (como já foi explicado) e o Acesso pela rua Uruguai – também este feito por meio de rampa, que desce 0.50m à rua.

Figura 40: croquis esquemático acerca da circulação

O uso de rampas além de ser uma questão de acessibilidade é útil por criar espaços e distâncias de locomoção entre a rua e os corredores dos apartamentos – está sempre à mostra, à vista de todos os moradores. Hector Vigliecca recomenda que o acesso a conjuntos habitacionais sempre se dê por meio de praças e espaços abertos, a fim de que dificulte um fechamento deste espaço, tornando-o um condomínio fechado, propriamente dito.

Partindo do princípio de que a ventilação natural flui predominantemente no sentido Leste-Oeste, aproveitou-se da declividade natural do terreno de forma que ela atingisse os diferentes blocos. Os quartos das tipologias 01, 02 e 03 estão voltados para leste, de forma a serem iluminados pela manhã e terem um grande volume de corrente de ar. Os corredores internos, de acesso aos apartamentos, estão voltados para o Oeste, protegidos por brises-soleil; nesta face que se encontram as lavanderias e as cozinhas. Entre as faces das cozinhas e dos quartos encontram-se os dutos de ventilação, para completar a ventilação cruzada e sua indução por troca de pressão. A praça, bem arborizada, funciona como amortizadora da temperatura da massa de ar, não restringindo a ventilação natural a somente um bloco, mas completando o microclima do conjunto habitacional como um todo. O programa do projeto reduz-se à proposição do número máximo de moradias e uma área mínima destinada a espaços comerciais, cuja finalidade é contribuir para a vivacidade do conjunto, integrar a esquina à vizinhança e ao público em geral. Acredita-se que, por sua inclusão na área central de Londrina, a oferta de emprego e serviços deverá ser vasta, bem como a mobilidade e o acesso a eles. Considerou-se, enfim, desnecessária a presença de estacionamento para uso dos moradores - levando em conta a tentativa de quebra de alguns paradigmas do projeto, fazia-se necessária esta, por estimular o uso transporte público e meios alternativos, como a bicicleta (este meio, sim, presente no programa). Enfim, o programa resume-se a 37 apartamentos (14 da Tipologia 01; 11 da Tipologia 02; 7 da Tipologia 03; 5 da tipologia 04), 5 lojas, bicicletário, 2 praças e 8 ambientes de uso comum internos. A diferenciação de programática entre os Blocos Leste e Oeste é evidenciada formalmente pelo pé direito de 4.50m das Lojas do Bloco Leste e proposta estética diferenciada, verticalizada, e destacada do solo em seu acesso. Os brises móveis de madeira em sua fachada forçam o contraste com a estética das habitações acima, que espalham-se sobre as lajes, havendo, assim, o contraste vertical x horizontal. Elementos semelhantes foram utilizados para

ressaltar e cercear o Bicicletário, com a mesma finalidade estética, indicando função diferente daquela que está acima deles. Nas fachadas Oeste dos dois Blocos maiores e na fachada Sul do Bloco Norte os brises-soleil funcionam de forma parecida. Além de proteção da incidência solar direta em fins de tarde, os brises nestes casos denotam as moradias para quem observa a edificação a partir da região central da cidade. No Bloco Oeste, apesar das aberturas, conformam um volume fechado, maciço - se comparado aos dos outros blocos, fechando-o. As aberturas citadas posicionam-se de forma a não interferir na privacidade dos moradores, gerando vistas nas circulações; seu posicionamento se deu também de modo que não se criassem barreiras para a ventilação – o que poderia até mesmo causar a necessidade de um reforço em contraventamento. A Fachada Leste do Bloco Leste diferencia-se da anterior por ser mais permeável, voltada para dentro do conjunto, de modo a assegurar quem utilize as Praças esteja sempre à vista mesmo dentro da edificação. Uma criança pode pensar que algumas peças do brise desta fachada soltaram-se de sua estrutura e foram utilizadas para fazer o banco ao redor da Praça junto ao Playground. Bem como que foram acabando as peças para o Bloco Norte. A continuidade estética, ou seu compartilhamento, se deu de forma a preservar a denotação de funções de forma subliminar – mesmo não cumprindo a função de proteger do sol, por se tratar de uma fachada Sul. O concretismo de Alfredo Volpi foi inspirador na concepção dos brises-soleil, por ser contemporâneo à arquitetura moderna brasileira e à era de ouro dos IAP’s, que visava, como explica CUNHA: [...] aspiração a uma linguagem de comunicação universal; integração do trabalho de arte na produção industrial; função social utilização, tanto no suporte como na matéria prima, de materiais industrializados produzidos em série; rigor geométrico na matemática, que estruturou ritmos e relações; eliminação do gesto, do sinal da mão [...]

Partilham, portanto, alguns princípios. No entanto, as formas presentes nas pinturas de Volpi que chamaram a atenção por sua simplicidade e conteúdo geométrico complexo. A modulação tem forte presença nesta concepção, ao propor que os brisessoleil sejam simples triângulos, que no entanto, em seu conjunto, construam formas complexas. A ideia de movimento destas formas foi ressaltado pela forma côncava destes triângulos em seu centro – que servem tanto para gerar diferentes sombrar ao decorrer do dia, quanto para a fixação destes triângulos – placas cimentícias pré-moldadas em sua cor e acabamento natural; enquanto a estrutura, em aço galvanizado, receberia em torno de si um perfil circular de alumínio azulado, da mesma forma que os pilares estruturais. As placas medem em suas arestas 1.40x2.00m, enquanto a estrutura metálica é dividida em módulos de 1.00x2.00m.

Figura 41: Croquis feitos pelo autor das pinturas de Alfredo Volpi que inspiraram a criação dos brises soleil

Como revestimento e acabamento foram especificados materiais simples, por sua durabilidade ou por manutenção fácil, que ressaltassem e simplificassem as formas geométricas das edificações, minimizando texturas. Os materiais são comumente encontrados em habitações populares e fazem parte do imaginário popular sobre estas - sem ter sido um ponto determinante no projeto a busca do mais refinado novo material de acabamento; enfatizou-se, no macro, a geometria como um todo e a solução do problema habitacional, como releva

GONZALEZ (2006) - questionando que os projetos de habitação coletiva propostos atualmente reduzem sua inovação a um acabamento:

Estos dos ejemplos suponen la búsqueda y la experimentación con nuevos materiales, incluyendo a la naturaleza, en tanto que componente de la arquitectura. Este trabajo de investigación a futuro está enfocado por completo hacia el re-vestimiento de la vivienda, en el que la tipología se ha reducido a la simple reconducción del modelo estándar[...] Como si existiera un pacto tácito, se produce una ruptura en el proceso de producción del hábitat, un reparto de las competencias entre un interior escondido, dominio controlado por el promotor y un exterior visible, soporte de la “etiqueta de la marca” atribuido al arquitecto. [...] El arquitecto ha perdido su ambición social y la ha convertido en poco más que un decorado, un guardarropa, un producto del marketing con unos objetivos comerciales claramente identificados.

Para tanto, as cerâmicas em cinco cores diferentes têm o intuito de gerar a apropriação do usuário na disposição das 4 tipologias de apartamentos, de forma que ele reconheça o seu próprio. Dispostas em 45º, têm assim o intuito de assimilar-se ao imaginário popular em certo tom kitsch. Suas dimensões de 60x60cm de certa forma acompanham o desenvolvimento do espaço interno. A caiação é uma pintura natural à base de cal facilmente executado e barato. Também faz referência ao imaginário popular. Em elementos pré-moldados de concreto ou metálicos, como as rampas, lajes e escadas, preferiu-se deixá-los em seu acabamento natural a fim de destacar sua origem industrializada. O cobogó cerâmico é um elemento que faz referência tanto à produção em escala quanto ao referencial popular. Para os pisos, tentou-se reduzir sua diferenciação quanto a determinados usos, inferindo-os, diferenciando, por exemplo, sala de cozinha, espaço interno do externo, etc. Os pilares em aço galvanizado foram revestidos por um perfil circular de alumínio azulado a fim de destacar a estrutura e, ao mesmo tempo, protege-la. Designou-se cobertura metálica para os grandes vãos por sua leveza e necessidade de baixa inclinação. Nos Blocos Leste e Oeste, platibandas de 175cm vencem a altura total e reforçam a composição da geometria em geral, de forma alongada, no sentido horizontal. Dela, destacam-se os fossos de

ventilação e iluminação em 25cm, a fim de captar melhor a ventilação. Em pontos específicos foram utilizadas coberturas verdes para, além da melhoria térmica, haver captação de água pluvial e evitar lajes expostas diretamente à chuva quando há um ambiente habitado abaixo dela. Para fornecimento de água dos 37 apartamentos, lojas e manutenção em geral, foram designados dois sistemas: o primeiro, por fornecimento da rede pública, previu-se uma necessidade de 8 caixas d’água de 5000 litros – prevendo a autonomia de dois dias para uma população de aproximadamente 110 pessoas (considerando-se, em média, três pessoas por apartamento); além disso, previu-se também uma cisterna de 5000 litros – dimensionada a partir da área dos maiores telhados, de 595m² cada, e a pluviosidade média de 130mm/mês em Londrina; localizada ao Nordeste do terreno, em sua cota mais baixa, para fins de manutenção e não-potável, como de acordo com a NBR 5626/98. Para fornecimento de GLP – Gás Liquefeito de Petróleo, reservou-se espaço próximo à cisterna, junto à divisa do terreno, na cota mais baixa, a fim de facilitar a manutenção e trocas necessárias. A Central Predial de GLP seguiu as normas e especificidades do Corpo de Bombeiros do Paraná, bem como

os

distanciamentos mínimos em relação ao alinhamento predial especificados pelo mesmo. Considera-se o uso da tecnologia steel frame como a mais apropriada para este tipo de edificação, pela movimentação do terreno, sua construção ser em ritmo acelerado e haver pouco desperdício de material - contrapondo-se à ideia da autoconstrução comumente vista em habitações populares. Para este tipo construtivo, necessitaria-se de um estudo e planejamento avançado junto aos moradores, bem como explicá-los seu o funcionamento e suas diferenças em relação à construção em alveraria e concreto. No entanto, a superação tecnológica faz parte de projetos deste tipo, devendo-se quebrar preconceitos – como já foi feito há 70 anos atrás, quando os Conjuntos Habitacionais modernistas foram construídos e introduziram uma nova relação do morar para seus usuários. As tipologias habitacionais partiram da modulação imposta por

esta tecnologia construtiva, sendo determinante o espaçamento estrutural destas em uma grelha 1.20x1.20m e de paredes internas em outra grelha de 040x0.40m, ambas a fim de gerar o máximo de economia de perfis metálicos e placas de revestimento e preenchimento. A modulação, como dito, contrapõese à ideia de autoconstrução, porém, a dinâmica dos espaços internos das habitações é inevitável e no sistema steel-frame, se bem explanado ao usuário, pode ocorrer facilmente.

CONCLUSÃO Concluída a explanação sobre Habitação de Interesse Social e apresentado o projeto, chega-se à conclusão de que a produção que ocorre atualmente segue-se de forma insustentável para a cidade, chegando ao ponto de ter-se de aumentar o limite urbano da cidade para pessoas terem onde habitar. Percebe-se um movimento cíclico na história brasileira do tema, construindo habitações na periferia em momentos oportunos, ao mesmo tempo que a habitação irregular é uma constante nas cidades brasileiras, incluindo Londrina. Também percebeu-se que os projetos de habitação deste tipo tem enraizados em si a segregação espacial – que ocorre com uma finalidade supostamente econômica, mas que podem ser contornados, se pretendo-se ter um real projeto de cidade que seja - talvez – mais densa, mas também com maior diversidade de usos, mais voltada para si, que conforme, enfim, um sistema sustentável. Por fim, cita-se o poeta Augusto de Campos, por lembrar que toda abstração é uma ideia e, nesta, existe sempre um mínimo de propósito, ao dizer que temos direito permanente ao fracasso da utopia.

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