TÍTERES DISTINTOS. Sobre os fios civilizadores que animam a mobilidade acadêmica no Brasil.

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XV Congreso Internacional Procesos Civilizatórios. El legado de Norbert Elias

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TÍTERES DISTINTOS.

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Sobre os fios civilizadores que animam a mobilidade acadêmica no Brasil. Dina Maria Rosário dos Santos Universidade do Estado da Bahia-UNEB/DEDC XIII [email protected]

Resumo: Os processos de internacionalização do ensino superior no Brasil podem ser entendidos como parte das estratégias de ampliação do nível de desenvolvimento da cultura científica do Estado rumo a civilização. Neste contexto, orquestrar a produção intelectual das instituições e cooptar os sujeitos a produzir em nome da nação é estrategicamente imprescindível. Entre colonizações e neocolonizações do saber, o Brasil, país periférico, joga como colonizador e como colonizado. O Estado civilizador brasileiro, como todos os estados-nação contemporâneos, faz uso dos processos de escolarização em benefício da regulação e do controle social necessários à concretização do projeto de nação. Os governos dos presidentes Luis Inácio da Silva (Lula) e Dilma Rousseff vêm desenhando a presença do país no cenário do mercado educacional de ensino superior tanto no consumo de serviços no exterior quanto na prestação e oferta fronteiriça de serviços e na presença comercial latina e lusófona. A mobilidade acadêmica, neste contexto, se presta a colonizar, descolonizar e, acima de tudo, civilizar. Tradicionalmente entendidas como fruto da aspiração individual (sujeito e/ou família) as ações de mobilidade acadêmica e/ou internacionalização da formação vêm se normatizando, na ultima década, por meio de programas governamentais que determinam o país, a instituição, os cursos e os temas considerados importantes e necessários estratégicos - para o país. O ensino superior é signo de distinção social e a mobilidade acadêmica em nível de graduação, pós-graduação ou atuação profissional implica em distinção entre os pares. A apropriação desse mecanismo de distinção social pelo estado engendra a auto-consciência de superioridade dos que dela participam. Por distinção civilizatória os programas de mobilidade, integrantes do comércio global da educação, controlam a circulação acadêmica orquestrando a formação e a produção intelectual nacional, ao mesmo tempo em que consolidam e ampliam as áreas de atuação econômico-educacional do país através da presença e da atuação da academia brasileira nos países e instituições ‘parceiras’. As configurações presentes na teia comercial da internacionalização do ensino superior e na mobilidade acadêmica quase invizibilizam os fios que marionetam os participantes. É importante atentar ao fato de que um estado civilizador está sempre em busca da ampliação e consolidação das áreas e setores da econômica. A educação e a produção intelectual são, na contemporaneidade, caros bens econômicos. Palavras-chave: Estado Civilizador; Internacionalização do Ensino Superior; Mobilidade Acadêmica; Estabelecidos-Outsiders; Figuração.

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[…] that a task of de-colonial thinking is the unveiling of epistemic silences of Western epistemology and affirming the epistemic rights of the racially devalued, and de-colonial options to allow the silences to build arguments to confront those who take ‘originality’ as the ultimate criterion for the final judgment.(Mignolo, 2009, p. 04) A mobilidade acadêmica é hoje parte integrante da agenda de mercado educacional tanto dos países centrais quanto dos países periféricos da economiamundo. Os processos de internacionalização do ensino superior no Brasil podem ser entendidos como parte das estratégias de ampliação do nível de desenvolvimento da cultura científica da nação e inserção e participação no comercio do ensino mundial. A noção de internacionalização no campo da educação tem se atualizado na medida em que o processo ganha força na forma de resposta das instituições de ensino superior à pressão da mercantilização da educação. De acordo com Sguissard (2009, p. 209), a educação superior, do ponto de vista neoliberal, deve ser um mercado de serviços regulamentado pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Nos anos oitenta o tema fazia referência às atividades de troca de experiências e investigações. Nos anos noventa, o termo Internacionalização, passa a contemplar “múltiplas atividades, programas e serviços” (Arum & Van Der Water,1992, p. 202) podendo, então, ser definida como “qualquer esforço sistemático encaminhado a fazer com que a educação superior responda aos requerimentos e desafios relacionados com a globalização das sociedades, da economia e dos mercados” (Van Der Wende, 1997, p.18). Nos anos dois mil Knight (2003) propõe definir internacionalização do ensino superior como “o processo de integrar uma dimensão internacional, intelectual e/ou global aos objetivos, funções (ensino, pesquisa e extensão) e distribuição de educação superior” (2003, p. 02). O fato é que a internacionalização da educação superior se refere a oferta de serviços educacionais; a produção/domínio de ciência, tecnologia e patentes; a construção de um discurso sobre o mundo por meio da produção acadêmica e da mobilidade de docentes e discentes entre instituições. “Las estrategias de internacionalización no han de limitar-se al fomento de la movilidad académica, si bien la movilidad es una de las palancas más poderosas com las que contamos para fomentarla” (Arriola, 2014, p.01).

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Dos fios e dos títeres

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Na dita economia do conhecimento, orquestrar a produção intelectual das instituições e cooptar os sujeitos a produzir em nome de uma nação é estrategicamente imprescindível. Entre colonizações e neocolonizações do saber, o Brasil joga como colonizador e como colonizado. A circulação de acadêmicos e cientistas, estudantes e trabalhadores, neste contexto, se presta, ao mesmo tempo, para neocolonizar e descolonizar os conhecimentos e os saberes. A internacionalização do ensino superior e a mobilidade acadêmica são, portanto, um meio para a concretização da rede do “mercado global de ideias, cérebros e descobertas” (Hudzik, 2011, p. 8). No disputado cenário da internacionalização da industria da educação jogam os atores - Estado, universidades, organismos internacionais multilaterais, empresas voltadas para o turismo e para difusão de conhecimento, famílias, estudantes, professores, pesquisadores, profissionais qualificados etc.- e os interesses envolvidos - culturais e acadêmicos, políticos, econômicos e comerciais (Knight, 2005, p. 26). Atores e interesses produzem uma versão da movimentação dos estudantes e dos profissionais na qual existem apenas os sujeitos e instituições oficialmente autorizados por meio de acordos e programas transnacionais. No jogo da construção mítica da excelência acadêmica de pessoas, instituições e nações é inventada uma cartografia para as rotas e os fluxos de produção, disseminação e validação de conhecimentos e tecnologias onde os papeis dos estados-nação estão previamente determinados. Pretto (2008) critica o marketing da titulação acadêmica ao afirmar que “vivemos neste mundo de marcas e logomarcas que ocupam todos os espaços físicos, bem como nosso imaginário” (2008, p. 110) e, como já discutido no trabalho de Manolita Lima e Fábio Contel (2011), tem cabido ao Brasil papeis passivos na geopolítica do conhecimento. A educação superior vem passando por inúmeras transformações políticas, administrativas, econômicas e acadêmicas. Nos últimos vinte anos, essas transformações têm se acentuado, principalmente, quando se observa a dimensão que a educação superior alcança em escala planetária. A massificação do ensino superior exige que os países construam políticas e acordos capazes de contribuírem

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para o fortalecimento da educação superior e, a partir dela, promover desenvolvimento econômico e social. De acordo com Ristoff e Giolo (2006) a missão estratégica do ensino superior está relacionada a imagem de desenvolvimento e civilidade da nação. Neste sentido vigora a noção de que o lugar de cada país no ranking da produção científica corrobora, e muito, o seu papel no mercantil jogo de poder regional e mundial. El desarrollo de las naciones depende ahora más que nunca de la calidad de la formación a la que se accede en las universidades y del conocimiento que se pueda generar y acumular en ellas. El estado de los países de la región iberoamericana es, en este sentido, muy débil, y los pone en desventaja y en riesgo de exclusión respecto del progreso acelerado del mundo desarrollado, porque los avances tecnológicos generan dinámicas de exclusión aun mayores que las tradicionales (OEI, 2010, p. 137). Pode-se afirmar que, neste contexto, o processo de internacionalização da educação superior “tem a ver com as relações econômicas supranacionais, com os mercados comuns e com a ampliação e modernização das tecnologias de comunicação” (Dias Sobrinho, 2007, p. 319). Se por um lado tal processo gera “a necessidade de importantes expansões de novos tipos e áreas de serviços educacionais” (id), por outro lado o movimento de mudança está “desgraçadamente, muito restringidos pelas urgências do mercado” (id). De acordo com Salmi (2014), as universidade da América Latina representam apenas 2,6% das 500 universidades integrantes do ranking bibliom1étrico de Leiden, ‑

2,2% das 500 universidades presentes no ranking de Shangai (ARWU) e 1,5% das 400 instituições do World University Rankings2. Ainda que pese o passado e a ‑

herança colonial na construção e efetivação das políticas públicas com respeito a

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Aqui não se tem a intenção de discutir aspectos metodológicos, a validade e o valor dos rankings para a qualidade da educação. Os dados estão apresentados para ilustrar o lugar e o papel da America Latina e do Brasil no mercado mundial da educação superior e da ciência explicitando os estabelecidos (os países e instituições que produzem os rankings) e os outsiders (os países e instituições que não figuram nas listas ou o fazem nas últimas posições).

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Publicado pela revista Times Higher Education, o World University Rankings avalia as universidade a partir das dimensões do ensino, da pesquisa, da transferência de conhecimento e da internacionalização. A Universidade de São Paulo e a Universidade Estadual de Campinas são as instituições brasileiras que estão na lista da Times Higher Education. Para saber mais sobre o World University Rankings acesse:

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educação e a ciência há que ressaltar a figuração acadêmico científica que coloca a América Latina como outsider3 mesmo que representemos 8,5% da população do ‑

mundo e 8,7% do PIB mundial. Na busca pelo giro dos papeis no jogo mercantil o mundo iberoamericano vem implementando, nos últimos dez anos, reformas nas suas universidades à luz das “lições” da OCDE. A esses processos de “difusão” de valores, processos e procedimentos Elias (1994) denomina de “difusão da civilização” e, sobre ele, adverte: Essa difusão dos mesmos padrões de conduta a partir de 'mães-pátrias do homem branco' seguiu-se à incorporação de outros territórios à rede de interdependência políticas e econômicas, às esferas das lutas eliminatórias entre nações do Ocidente e dentro de cada uma delas. (Elias, 1994, p. 212) A partir do texto de Salmi (2014, Pp.11-13) pode-se afirmar que hoje o Brasil 'aprendeu' das reformas dos países da OCDE o seguinte: a) estabelecimento e consolidação de agências nacionais de avaliação e acreditação; b) constituição de programas de bolsas para a formação de capital humano no exterior; c) medidas financeiras de apoio aos estudantes de baixa renda; d) programas de mobilidade acadêmica nacional e internacional e) medidas financeiras de promoção de equidade; f) aumento (ainda insuficiente) dos recursos públicos destinados ao setor. Estão pendentes as lições referentes a aspectos como o planejamento estratégico para o futuro da educação superior, a autonomia institucional, os observatórios de acompanhamento laboral de egressos, o sistema nacional de créditos acadêmicos transferíveis e o reconhecimento das competência adquiridas fora do sistema formal de ensino. Está claro que o propósito de tais reformas é o de ampliar a participação na produção científica, no quantitativo de patentes requeridas e na transferência de tecnologia para atingir posições mais 'promissoras' nos diversos rankings aumentando a competitividade de suas instituições e, por consequência, a fatia de poder econômico, tecnológico, laboral e ideológico na contemporaneidade.

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O conceito de estabelecidos e outsiders (Elias & Scotson, 2000) surge na obra elisiana a partir do estudo de uma comunidade inglesa ficticiamente denominada de Winston Parva. Os estabelecidos são sujeitos, grupos, instituições, regiões, nações que outorgam a si características de superioridade humana e, consequentemente, social com relação a outros e, nesta relação de poder, os que não estão na pertinência do primeiro grupo são estigmatizados e subjugados.

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De acordo com Laus e Morosini (2005) o desempenho brasileiro em suas estratégias de internacionalização da educação superior pode ser considerado insuficiente. Ainda que pululem projetos, programas e ações a implantação, implementação carecem de acompanhamento. O Brasil ainda engatinhando, tropegamente, corre. La acción conjunta con instituciones internacionales ha crecido de una manera desorganizada, con bajos estándares de calidad, con frecuencia como un resultado de las tendencias del mercado y no una planeación estratégica institucional deliberada (Laus & Morisini, 2005, p. 123). Desconfio de uma outra lição não confessa que ouso apontar. Essa lição tem relação direta com o que Elias e Scotson (2000) escrevem na obra Os estabelecidos e os outsiders acerca da “[...] necessidade de se destacar dos outros homens, e com isso de descobrir neles algo que se possa olhar de cima para baixo” (2000, Pp. 208-209). O Brasil aprendeu e vem implementando uma geopolítica de colonização acadêmico-científica no âmbito da América Latina e dos países africanos de língua portuguesa. Nesse sentido Lessa (2002) adverte sobre a “[…] política sistemática que considera a cooperação como um padrão que poderia facilitar ao Brasil estabelecer e consolidar influência cultural e política sobre as elites de outros países” (2002, p. 105). A internacionalização da educação superior e a mobilidade acadêmica - sua face mais midiática – vêm operando uma mudança na formação dos sujeitos na medida em que outros valores e práticas são introduzidos na formação acadêmica e no projeto educativo da nação a partir da sua inserção nos fluxos da globalização e na economia de mercado capitalista. Para além dos títulos e diplomas, as ações implementadas pelo estado brasileiro provocam conseqüências na subjetividade dos indivíduos e dos grupos. Outras figurações4 de estabelecidos e outsiders, no âmbito ‑

da academia brasileira se vão estabelecendo. As relações de interdependência e hierarquias de saber e poder entre instituições (nacional e internacionalmente) ganham novas formas e sentidos. Na medida em que todo Estado-nação se pensa, se inventa, se imagina, se faz e ! 4

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Figuração ou configuração pode ser definido com “a rede de interdependência entre seres humanos é o que os liga. Elas formam o nexo do que é aqui chamado de configuração, ou seja, uma estrutura de pessoas mutuamente orientadas e dependentes” (Elias, 1994, p. 249).

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se vive como “comunidade”, também constrói um conjunto de “qualidades” que definem seus mitos e projetos, seu tempo e seu espaço, sua natureza e seu povo. (Goettert, 2012, p. 240) O fenômeno a que Norbert Elias (1990) chama de Processo Civilizador não se restringe ao espaço europeu, tampouco ao período entre os séculos XVI ao XVIII. Como processo de mudança estrutural das configurações estatais de uma sociedade, o processo civilizador de cada nação se desdobra no tempo a ritmos distintos. O processo civilizador das nações opera a transição dos establishments. A Internacionalização da educação superior produz

novos establishments (Elias &

Scotson, 2000) inserido em uma outra figuração social que coaduna o projeto civilizador contemporâneo do Estado. Estamos assistindo a uma ressignificação das concepções nacionais acerca do conhecimento e do saber e, consequentemente, das relações de poder. A oferta educativa em espaços supranacionais ganha sustentação legal no inicio dos anos

90 (noventa) por meio da incorporação da

educação superior como área de comércio internacional no âmbito do GATS e do WTO. No momento em que a educa56ção superior passou a ser um produto da área ‑



de comércio internacional controlada pelo GATS o seu processo de internacionalização vem crescendo em progressão geométrica. No Brasil, o processo vem sendo construído a passos largos com planos e ações do governo federal. Os governos dos presidentes Luis Inácio da Silva (2003 - 2010) e Dilma Rousseff (2011 - 2014) vêm geo-estrategicamente desenhando a presença do país no cenário do mercado educacional de ensino superior em consonância com as orientações do WTO e do GATS. O governo brasileiro vem legislando em direção a internacionalização dos bens e serviços educacionais em nível de consumo de ! 5

O General Agreement on Trade and Services – GATS (em vigor desde janeiro de 1995) compõe os invisíveis fios que orquestram as relações de comercio e serviço no mundo. O GATS, um acordo do World Trade Organization (WTO) ou Organização Mundial do Comércio (OMC), age por meio das regras que desenham as obrigações dos atores envolvidos no comércio dos bens e serviços e do setor comerciail; e por meio das condições para a liberalização de cada membro da OMC. Para conhecer o GATS acesse: .

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Como fruto do Acordo de Marrakech, a Organização Mundial do Comércio (OMC) vem atuando desde janeiro de 1995 como a principal instância para administrar o sistema multilateral de comércio. Criada com o objetivo de estabelecer um marco institucional para regular as relações comerciais entre os diversos países do mundo e estabelecer um mecanismo de solução das controvérsias comerciais a organização tem se mostrado basilar para acordos comerciais multilaterais e plurilaterais contemporâneos. Para saber mais sobre o WTO acesse: .

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serviços no exterior, prestação e oferta fronteiriça de serviços e presença comercial. Neste contexto foram implantandos, para a oferta e consumo de serviços, o Programa de Mobilidade Acadêmica Regional em Cursos Acreditados (Marca), o Ci7ências sem Fronteiras, o Projeto Milton Santos e o Programa Desenvolvimento ‑

Acad89êmico Abdias Nascimento. Na mesma esteira foram criadas a Universidade ‑



Federal da Integra10ção Latino-Americana/UNILA (2008), a Universidade da ‑

Integra11ção Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira/UNILAB (2010) e a ‑

Universidade Federal da Fronteira Sul/UFFS (2009) que garantem a presen1213ça ‑



comercial no âmbito latino e lusófano. La universidad es, más que ninguna otra institución, internacional por naturaleza. Las universidades de más alto nivel y sus académicos y científicos están directamente incluidas dentro de la red internacional. Los que están en la periferia, en cambio, pueden no estar incluidos directamente, pero de todos modos resultan ! 7

Participam do programa cursos de graduação avaliados e aprovados pelo Sistema de Acreditação Regional de Cursos Universitários do Mercosul (ARCU-SUL) pertencentes a instituições dos quatro países membros (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) e dos países associados Bolívia e Chile. Para mais informações acesse: .

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Segundo o portal do programa Ciências sem Fronteiras é “[...]um programa que busca promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por meio do intercâmbio e da mobilidade internacional. A iniciativa é fruto de esforço conjunto dos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e do Ministério da Educação (MEC), por meio de suas respectivas instituições de fomento – CNPq e Capes –, e Secretarias de Ensino Superior e de Ensino Tecnológico do MEC.” Para mais informações acesse: .

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De acordo com o MEC o “Projeto Milton Santos de Acesso ao Ensino Superior (Promisaes) tem o objetivo de fomentar a cooperação técnico-científica e cultural entre o Brasil e os países com os quais mantém acordos – em especial os africanos – nas áreas de educação e cultura”. Para mais informações acesse: < h t t p : / / p o r t a l . m e c . g o v. b r / i n d e x . p h p ? option=com_content&view=article&id=12284&Itemid=546>.

! 10 O Programa Desenvolvimento Acadêmico Abdias Nascimento vai ser desenvolvido em parceria com Universidades e Instituições Comunitárias de Ensino Superior Historicamente Negras nos Estados Unidos.Para maiores informações acesse: e ! 11 Para conhecer a Lei Nº 12.189/2010 que dispõe sobre a criação da universidade acesse: . ! 12 Para conhecer a Lei Nº 12.289/2010 que dispõe sobre a criação da universidade acesse: . ! 13 Para conhecer a Lei Nº 12.029/2009 que dispõe sobre a criação da universidade acesse: 8

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afectados por ellas. En un mundo en el cual las relaciones internacionales en el comercio, la ciencia y la tecnología se consideran fundamentales para la 'competitividad', el papel internacional de la academia es aún más importante. (Altbachi, 2009, p. 253-4) As ações dos governos brasileiros coadunam o Espaço Iberoamericano do Conhecimento (EIC) que tem como propósito a criação de um “auténtico ecosistema basado en la cultura de la cooperación y la complementariedad” (Arriola, 2014, p. 01) formado por instituições públicas e privadas diretamente ligadas a educação ou não e governos. O quadro sinóptico produzido pelo relatório 'Políticas de educación superior en Iberoamérica, 2009-2013' destaca as ações do estado brasileiro no que se refere às políticas de: a) Financiamento do sistema: criação do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES)/1999, do Programa Universidade para todos (Prouni)/2004, do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni)/2007; b) Medidas para assegurar a qualidade: criação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes)/2004, Criação do Exame de Desempenho de Estudantes (ENADE)/ 2004 ; c) Organização acadêmica: Criação do Ciência sem fronteiras/2011 e; d) Equidade: criação do sistema de quotas étnicoraciais e medidas afirmativas para o ensino superior em 2011 e quotas (50% das vagas nas universidades públicas) para estudantes oriundos de escolas públicas. O cenário atual no Brasil, pressionado pela institucionalização do Setor Educativo do Sul (SEM), dicotomiza-se entre a garantia e a concretiza14ção da concepção da ‑

educação superior como de direito e dever do Estado e a sua comodificação. A internacionalização da educação superior, a democratização (acesso e permanência) desse nível educativo e a ampliação da presença da iniciativa privada na oferta do ensino superior estão, hoje, na mesma esteira. La internacionalización fue primero un intento por revolucionar las instituciones y más tarde y más efectivamente para fortalecer la educación de posgrado. Sólo en las últimas décadas el proceso se ha convertido en una unión de fuerzas y acciones para tratar de dar un carácter internacional a las funciones académicas en una esfera más amplia de acción.

! 14 O Setor Educativo do MERCOSUL (SEM) foi criado em dezembro de 1991 por meio do Tratado de Assunção com o propósito de colaborar com o o processo de integração educacional no cone sul. 9

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Al iniciarse el siglo XX, las universidades se dedicaron a programas de desarrollo internacional que más tarde se convirtieron en proyectos de investigación y esfuerzos para fortalecer las instituciones. Estos programas fueron orientados hacia el fortalecimiento de la base de conocimientos y hacia la educación de líderes que desarrollarían el país. (Laus & Morisini, 2000, p. 122) A criação do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) promoveu um acelerado crescimento da internacionalizac 15̧ão da educação superior com um fluxo cada vez ‑

mais intenso de estudantes, professores e cientistas entre os espaços das universidades dos países membros. Dividindo o papel com a Argentina, no âmbito do MERCOSUL, o Brasil vem construindo uma internacionalização da educação superior de caráter transoceânico por meio de asiáticos e africanos.

acordos com países europeus,

Acevedo Marin e Brasil (2004, p.15) consideram que os

acordos e cooperações internacionais bilaterais e multilaterais realizados pelo Brasil, diretamente relacionadas à educação, valorizam tais serviços no MERCOSUL. Desconfio que o maior beneficiado é o próprio país na medida em quem que constrói uma teia de relações hierárquicas entre países e regiões, estando no posição de mando, no que se refere a formação intelectual da população e a produção científica. A colonização do saber parece assumir a denominação de valorização de serviços. O SEM vem se concretizado, segundo Santos e Donini (2010), em três etapas: 1) referente a construção das estruturas operativas; 2) promulgação de políticas para os sistemas educativos e; 3) por meio da aprovação do Setor Educativo do MERCOSUL para garantir a formação de uma consciência de integração através da mobilidade acadêmica e dos intercâmbios educativos com vistas ao desenvolvimento da justiça social e respeito à diversidade étnico-cultural na região. A União Europeia, desde as declarações de Sorbonne (1998) e Bolonha (1999) e com a criação do Espaço Europeu de Educação Superior (EEES) pode ser considerada expoente hodierno da internacionalização da educação superior. Criado com o propósito de favorecer a empregabilidade dos seus cidadãos e a competitividade internacional do sistema de educação superior o EEES pode ser

! 15 O MERCOSUL é uma União Aduaneira, criada em 1991 através do tratado de Assunção que, por meio da integração econômica, pretende constituir um Mercado Comum entre os países membros - livre movimento do capital e do trabalho. São países membros do MERCOSUL: Membros plenos - Brasil, Argentina, Paraguai, Venezuela, Uruguai; Países associados - Chile, Bolívia, Peru, Colombia e Equador; Estados observadores: Nova Zelândia e México. 10

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considerado como referência para outros espaços semelhantes como o SEM. No âmbito do MERCOSUL o SEM, de forma semelhante, se apresenta como arauto para a proteção e empregabilidade dos cidadãos dos países membro e alavanca para a internacionalização do ensino superior e competitividade dos seus serviços. Guardadas as diferenças histórico-culturais, os países membros do MERCOSUL estão constituindo ações de integração no setor educativo. É importante ressaltar o caráter economicista das ações implementadas como enfatiza Goin (2009) ao afirmar que Em termos regionais, a política social ocupa um lugar marginal em relação à política econômica, pois na medida em que há o aprofundamento dos vínculos econômicos, os transversais e complementares – como o social – atuam como alavanca ao crescimento da economia e, neste sentido, como fator produtivo. (2008, p. 26) As marcas do passado colonial na implantação de uma educação voltada para as elites ecoam ainda hoje na nação e se amplificam no palco das ações neoliberais da 'democracia' brasileira. De acordo com o Censo Demográfico 2010 do IBGE, naquele ano, numa população total de 190.755.799 de cidadãos, o Brasil possuía 110.586.512 (57,9%) de pessoas com com 25 anos ou mais. Entre estas apenas 6,5% das mulheres e 4,7% dos homens tinham pelo menos o nível superior completo naquele ano. No âmbito dos estudantes, 10,4% da população brasileira (6.197.318 homens e mulheres) frequentava o ensino superior em nível de graduação; 1,1% (666.613 cidadãos) estavam cursando a especialização. Os Excelidos brasileiros que podem aceder ao strictu sensu perfazem 0,3% (177.472 pessoas) em nível de mestrado e 0,1% (77.763 sujeitos) em nível de Doutorado. Segundo o Censo do Ensino Superior 2012 do Inep/MEC de 2002 a 2012, o n16úmero de alunos na educação superior dobrou, passando de 3,5 para cerca de 7 ‑

milhões de estudantes. No que tange a distribuição espacial dos 7 milhões de universitários do país, o Censo demonstra que a região sudeste concentra 45,9%. A região Norte representa 7,7% dos alunos; a Centro Oeste contribui com 9,5% de estudantes e o Sul com 16,5% e a região Nordeste concentra 20,4% dos ! 16 Para maiores informações sobre as estatísticas do ensino superior no Brasil é possível consultar os dados disponíveis na pagina do Instituto Nacional de Pesquisa e Estudos Educacionais Anísio Teixeira - INEP . 11

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universitários do país. As condições de produção para a formação superior no Brasil apontam para uma assimetria no acesso e permanência dos brasileiros a este nível de escolarização expressa por hierarquias espaciais (classe social, região do país, tipo de instituição) que vêm sendo historicamente perpetuadas e alimentadas por 'rivalidades nacionais e sociais e conflitos' (ELIAS, 1981, p. 221). No entanto, é fato que as luzes do século XXI parecem apontar para possibilidades de mudança em tal cenário. Com relação a superação das condições de produção e o empoderamento das classes e regiões subalternas, faz-se necessário acompanhar os caminhos civilizadores do Estado brasileiro.

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Dos títeres e dos fios

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Brasil fue uno de los últimos países latinoamericanos que estableció universidades. Como sus clases dirigentes fueron educadas en Europa durante el período colonial (1500-1822), las primeras facultades universitarias surgieron solamente al comienzo del siglo XIX, según el modelo napoleónico para la capacitación profesional en ingeniería, medicina y derecho, en escuelas aisladas de algunas ciudades capitales. (Laus & Morisini, 2005, p. 113) A circulação da elite brasileira por meio de períodos de estudo no exterior como forma de socialização internacional das classes superiores data do período colonial. A mobilidade acadêmica no Brasil, todavia, vêm se normatizando, na ultima década, por meio de programas governamentais que determinam o país, a instituição, os cursos e os temas considerados importantes e necessários - estratégicos - para o país. Deleuze e Guattari (1980) chamam atenção para a orquestração da produção científica exercido pelo estado sobre os intelectuais ao afirmar que: O Estado não confere um poder aos intelectuais ou aos conceptores; ao contrário, converte-os num órgão estritamente dependente, cuja autonomia é ilusória, mas suficiente, contudo, para retirar toda potência àqueles que não fazem mais do que reproduzir e executar. (Deleuze & Guattari, 1980, p. 35)

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No Brasil, o ensino superior é signo de distinção social e, portanto, acessado por poucos ainda que o discurso oficial faça crer que está disponível para todos. A mobilidade acadêmica em nível de graduação, pós-graduação ou atuação profissional é alcançada apenas pelos excelidos. Nogueira (2008) e Prado (2004) apontam para o crescente investimento das famílias médias brasileiras na formação internacional dos filhos em função da experiência no exterior como símbolo de distinção formacional. Está claro para as elites brasileiras que “la mobilité académique [...] semble être devenue incontestablement une composante des paysages éducatifs de la plupart des pays du monde” (Dervin & Byram, 2008, p. 09). As famílias e os sujeitos, movidos pela lógica neoliberal do manager internacional, creditam o valor do investimento ao desenvolvimento pessoal, ao sucesso escolar, a inserção laboral e, sobretudo, a sua livre circulação já que alçados a condição de trabalhadores qualificados. Não é fácil definir internacionalização. No entanto, isso sempre existiu. Não tem nada de original (…) O que é novo agora é a dimensão global que há a respeito desse tema. Antes, a mobilidade acadêmica era um ato individual do estudante. A instituição não tinha nada a ver com isso. Agora isso não acontece mais. (Rendas, 2014) De acordo com Ballatore e Bloss (2008) a mobilidade discente pode ocorrer de forma espontânea ou de forma institucionalizada. A mobilidade espontânea se refere ao movimento de 'livre' escolha 'individual' na qual a movimentação do estudante ocorre a revelia dos acordos institucionais ou governamentais e, portanto, sem suporte administrativo ou financeiro. Já a mobilidade estudantil institucionalizada se insere no rol dos deslocamentos previstos por acordos, convênios e parcerias dos governos e instituições educacionais na qual o apoio administrativo e financeiro supõe também a definição dos destinos, dos cursos e temas para produção científica. O estado-nação moderno, porque fundamentado num conceito rígido e estático de fronteiras e territórios, compõe-se de homens e mulheres sedentários. A movimentação espacial (física e simbólica) dos citadinos é rigorosamente controlada. O espaço estatal é estriadamente hierarquizado em papeis, funções, relações e zonas de poder. Interessa ao Estado o controle absoluto sobre as pessoas e os seus deslocamentos. O processo de captura e domesticação de todos os tipos de fluxo

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(pessoas, mercadorias, comércio, tecnologia, conhecimentos) em direções e sentidos pré-definidos integra as funções do Estado. Assim, o estado cria rotas e fluxos de movimentação por meio dos quais podem, imóveis, circular os seus cidadãos. A escolarização contida nos sistemas oficiais de ensino é uma delas. [...] as mobilidades são simultaneamente produtos e elementos de produção de relações de poder. Do mesmo modo que as abordagens mais sedentaristas do mundo definem o poder em termos de território, fronteiras, inclusões e exclusões um foco móvel deve manter um olhar constante sobre quais as mobilidades que são encorajadas e aceitáveis e quais as que são desencorajadas e inaceitáveis. (Simões & Carmo, 2009, p.37) Uma sociedade é formada pelas suas figurações. Se o estado configura as relações de interdependência de grupos específicos então estrutura a sociedade. Se as mudanças dos sujeitos promovem mudanças na estrutura das sociedades, então as mudanças na organização da estrutura das sociedades, por interdependência, gera mudanças nas atividades humanas. O que está institucionalizado está sob o jugo estatal. os Estados-nações,

o

Mercado e os grupos se constituem no processo de produção de suas normatividades e as normalidades. Ao normatizar a mobilidade acadêmica o Estado controla os fluxos e os conhecimentos produzidos, inventa as 'nomias' e 'anomias' para a mobilidade e, consequentemente, reconquista o poder sobre o deslocamento dos sujeitos e seus saberes. Este movimento engendra uma figuração estabelecidos-outsiders no processo de internacionalização da educação superior que garante de um lado as hierarquias internas entre os sujeitos e as instituições e de outro as hierarquias externas, entre distintos estados, para o comércio externo dos serviços superiores. Mais ampla que as querelas entre acadêmicos e universidades está a criação do mito de superioridade entre nações que comanda o modo de produção capitalista. Os que se movem segundo as normas e nomias estatais são títeres que se julgam superiores – estabelecidos. A figuração estabelecidos-outsiders no âmbito da internacionalização da educação superior produz uma fronteira simbólica que polariza os sujeitos, as instituições, as nações e os conhecimentos em nível de veracidade, importância e qualidade.

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poder, daí oriundo, estria as relações por sobre a fronteira definindo e tipificando os

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papeis e as posições que promove a auto-imagem de superioridade para uns e a de inferioridade para outros. Está claro que os sujeitos, instituições e nações não assumem passivamente tais papeis e, justamente por isso, Elias e Scotson (2000) esclarecem que a “ peça central dessa configuração é um equilíbrio instável de poder, com as tensões que lhe são inerentes” (Elias & Scotson, 2000, p. 23). Toda verdade é uma invenção, toda importância é relativa e toda qualidade é dependente dos parâmetros que a definem. O alcance de uma posição privilegiada entre os estabelecidos na fronteira geo-político-científica implica numa hegemonia cientifica nascida do controle dos processos de produção, validação, apropriação e disseminação dos conhecimentos. Alcançar o topo da cadeia de interdependências científico-tecnológica possibilita a pertinência ao grupo dos que manipulam a avaliação e validação dos conhecimentos, posto que, necessitam garantir “monopolisticamente para seus membros o acesso recompensador aos instrumentos de poder” (Elias & Scotson, 2000, p. 39). Assim, são criadas as condições para a produção de um tipo de conhecimento que retroalimenta e acirra as diferenças que fazem de alguns outsiders e de outros estabelecidos. Tais condições são geridas por 'especialistas' alçados a condição de estabelecidos e baseados em um “fundo específico de representações simbólicas” (Elias, 1982, p. 43). A interdependência na construção do prestígio científico está assentada na forte coesão interna dos grupos que definem a lógica e os critérios que julgam e organizam a publicação e a citação em revistas científicas assim como as qualifica como prestigiosas ou não; os processos de patentes; a qualidade das instituições, dos cursos e programas assim como dos grupos de pesquisa e suas produções; a veracidade e importância dos pesquisadores e das suas descobertas. Não sem motivo os rankings universitários se baseiam nos mesmo critérios e perpetuam os papeis na hierarquização da ciência, da tecnologia e do poder. As contemporâneas relações estabelecidos-outsiders se fundamentam na configuração dos Estados-Nação. Se todo grupo estabelecido constrói o seu outsider isso não muda para os Estados-Nação. As nações, ainda que condicionadas por relações de dominação, criam e recriam periferias na medida em que reinventam, em nível regional, novas fronteiras para o poder. Mundo Ibero-Americano, mundo lusófano, cooperação Sul-Sul, comunidade Latino-Americana... ao mesmo tempo em

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que podem se constituir lócus de descolonização do conhecimento e reconfiguração do poder podem se constituir em novos espaços neocolonização e opressão. Há sempre o risco de que os novos estabelecidos sejam outsiders em outros âmbitos reproduzindo a máxima do oprimido que se revela opressor na hierarquia das sujeições modernas. A figuração estabelecidos-outsiders acadêmico-científica do Estado Civilizador brasileiro torna “calculável, em primeiro lugar, as pessoas e as chances de prestígio como instrumentos de poder” (Elias, 2001, p. 127) na medida em que vem perpetuando mitos nacionais da relação saber/poder no seio da academia que almeja internacionalizar-se. E tem-se mais uma vez o já descrito por Goettert (2012) Os estabelecidos: os paulistas trabalham; os gaúchos desbravam; os agropecuários produzem. Trabalho, desbravamento e produção, sob os auspícios da ordem, rumam o Brasil ao futuro, ao progresso... Os outsiders: os nordestinos desqualificados; os baianos lentos; os indígenas preguiçosos. Trabalho braçal, ausência de espírito empreendedor e preguiça, desordenadores do Brasil Gigante, devem se qualificar, ter o futuro como destino e produzir mais, muito mais... (Goettert, 2012, p. 240) A internacionalização da educação superior e mobilidade acadêmica institucionalizada vem criando a nova/velha classe (pessoas, instituições e regiões) de estabelecidos estatalmente manipulados para produzir o saber considerado necessário para mudança de posição do Brasil no mercado mundial da ciência, tecnologia e do ensino superior. Servidores da lógica da competição e acumulação e temerosos da perda do status, os estabelecidos concebem a si como estandartes do progresso, do desenvolvimento e da civilidade para a nação – grandeza e superioridade. A sujeição às práticas discursivas que sustentam as formações sócioespaciais do capitalismo faz a mobilidade acadêmica do Estado, no âmbito do processos civilizador, corroborar a construção de subjetividades rigidamente hierárquicas e duais nas quais

se espelham “os brasileiros o seu outro não-

brasileiro, os latino-americanos o seu outro não-latino-americano, os americanos o seu outro não-americano, os ocidentais o seu outro não-ocidental...” (Goettert, 2012, p. 240) na briga pelas migalhas da fatia do poder. Pari passu ocorre a imposição de outsiders para instituições e regiões (nacional e internacionalmente) o conhecimento e o saber se submetem ao capital.

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Pari passu ocorre a internacionalização da educação superior corremos o risco de nos neocolonizar. Pari passu ocorre a submissão ao capital o Brasil civiliza-se. Civiliza-se? O outsider é o excluído das esferas do poder. O outsider por ser minoria pode constituir-se Menor. É Menor toda forma de produção de existência que assume a marginalidade em sua gênese. É Menor todo saber que faz emergir os estranhamentos minoritários que os papeis representativos majoritários silenciam explicitando o caráter mítico dos discursos de homogeneidade, padrão, estabilidade, permanência. É Menor todo processo de resistência que agencia-se em máquina de guerra. Menor para Deleuze e Guattari é acontecimento17 - porque gesta a ‑

novidade. Menor, na perspectiva deleuzo-guatariana é devir18 - porque atravessado ‑

de desejo em movimento e transformação. Poderiam advir, dos supostos outsiders, vanguardistas contribuições para a descolonização do pensamento e a emancipação dos saberes? Existem pessoas que não estão inseridas nos programas estatais de mobilidade acadêmica e se deslocam por estudo. São Nômades do Saber e, porque outsiders, fazem da mobilidade máquina de guerra e produzam trajetórias e saberes Menores. O Nômade, ao alisar o estriado espaço estatal, movimenta-se em linhas de fuga. Para além das viagens, o nômade cria territórios reivindicando para si uma oximorônica liberdade. Suas andanças são formas de desenvolvimento pessoal. Suas migrações são formas de exercício de livre arbítrio. Nomadizando-se criam espaços fora da organização, fora do controle, fora da prévista caminhada desenhada para si ou para o grupo social do qual faz parte. A vida Nômade é marcada pelo movimento e pela mudança. O nômade desloca-se no espaço em movimento de resistência e, justamente por isso, emancipa-se. [...] o espaço sedentário é estriado, por muros, cercados e caminhos entre os cercados, enquanto o espaço nômade é liso, marcado apenas por traços que se ! 17 O acontecimento não é o que acontece (acidente), ele é no que acontece o puro expresso que nos dá sinal e nos espera. (Deleuze, 2011, p.152) ! 18 Devir é, a partir das formas que se tem, do sujeito que se é, dos órgãos que se possui ou das funções que se preenche, extrair partículas, entre as quais instauramos relações de movimento e repouso, de velocidade e lentidão, as mais próximas daquilo que estamos em vias de tornarmos, e através das quais nos tornamos. É nesse sentido que o devir é o processo do desejo. Esse princípio de proximidade ou de aproximação é inteiramente particular, e não reintroduz analogia alguma. Ele indica o mais rigorosamente possível uma zona de vizinhança ou de co-presença de uma partícula quando entra nessa zona. (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p.64) 17

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apagam e se deslocam com o trajeto (...) O nômade se distribui num espaço liso, ele ocupa, habita, mantém esse espaço, e aí reside seu princípio territorial. (Deleuze & Guattari, 1980, p. 52) Para além do pensamento abissal estão os nômades. O nômade encarna uma maneira de estar no mundo marcada por uma forma de apropriação e uso do espaço que resiste a sujeição do Estado. São os nômades e suas subjetividades que trazem à tona o fato de que o Estado, vez por outra, “[...] encontre dificuldades com esse corpo de intelectuais que ele mesmo engendrou, e que no entanto esgrime novas pretensões nomádicas e políticas” (Deleuze & Guattari, 1980, p. 35) No contexto da internacionalização das universidades brasileiras e da profusão de programas para a mobilidade acadêmica dos estudantes do ensino técnico e superior considero profícuo pensar para além do Estado Civilizador e assumidamente atravessados pela avocação à heterogeneidade, pela chamamento à contínua variação, pelo caráter infinitesimal e pelo estruturante devir emanciparmo-nos.

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