TV pública na Argentina: limitações e potencialidades

July 18, 2017 | Autor: Yamila Heram | Categoria: Television Studies, Public TV
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TV pública na Argentina: limitações e potencialidades
"O Canal 7 continua repetindo vícios antigos, que estão fincados ali desde
a sua própria origem como porta-voz oficial. Esta é uma questão diretamente
contraditória a um dos símbolos da Lei: a democratização de vozes."
Yamila Heram * / Argentina, maio de 2015
Español"Portugués
Já se passaram mais de cinco anos desde a aprovação da Lei de Serviços de
Comunicação Audiovisual (LSCA) na Argentina, e ainda há muito que ser
revisto. Uma das perguntas que podem ser feitas é: o que acontece com
o Canal 7?
Mesmo que a pergunta seja muito genérica, o interesse aqui é pensar na TV
pública – tal como o nome já diz – a partir, precisamente, das implicações
que surgem da indagação. O que deveria apresentar o Canal 7? O que
aconteceu com a sua programação, cinco anos depois da Lei ter sido
aprovada?
Isto nos faz pensar em termos de conteúdos, e precisamente um dos pontos
que Lei explicitamente não trata é este. Foi uma decisão inquestionável, já
que intervir sobre conteúdos seria um componente bastante autoritário. O
interesse pelo Canal 7 traz consigo a pergunta sobre o poder, já que o
canal que poderia e deveria ser marcadamente diferente do resto da
programação comercial é exatamente aquele que não está ligado aos
interesses do mercado e, por sua vez, tem os recursos econômicos para ser
diferente; recursos estes muitas vezes ausentes nos meios sem fins
lucrativos. Pensar no Canal 7 como TV pública nos interpela a refletir
sobre mais qualidade, diversificação de vozes, pluralidade informativa e
independência do governo.
No entanto, se realizamos algum tipo de análise, vemos que o Canal
7 continua repetindo vícios antigos, que estão fincados ali desde a sua
própria origem como porta-voz oficial. Esta é uma questão diretamente
contraditória a um dos símbolos da Lei: a democratização de vozes.
Um programa que cumpre – só que ao inverso – com todas as características
do que deveria de fato ser é o 6,7,8. O contexto proposto, de duplas
dinâmicas em meio a uma "guerra midiática", se apresenta como um espaço
para desmantelar a manipulação dos grandes meios de comunicação. O
principal oponente sobre o qual se organiza o discurso é o
oligopólio Clarín.
De acordo com as características do que deveria oferecer uma TV pública, é
pouco válido ter um programa de metalinguagem televisiva com as
particularidades do 6,7,8, pelos seguintes motivos:

1) É um porta-voz da ideologia do governo; isso não teria nada de mais se
fosse uma voz a mais entre tantas outras que circulam na TV pública.
Lembremos que o inciso b do Artigo 121 expressa como um dos objetivos
da Rádio e Televisão Argentina Sociedade do Estado: "Respeitar e promover o
pluralismo político, religioso, social, cultural, linguístico e étnico".
Quanto à questão do pluralismo político, dos nove programas jornalísticos
transmitidos atualmente – Nadia 6:30,Visión 7 mañana, Visión 7
mediodía, Visión 7 central, Visión 7 Resumen, Visión 7
internacional, Visión 7 sábado, Visión 7 domingo y 678 – mesmo que certos
matizes possam ser vistos, em linhas gerais é pouco o que se promove de um
real pluralismo político.
2) É a produtora privada Pensando para a Televisão (PPT) que o produz.
Mesmo que a Lei deixe claro no Artigo 123, destinado à programação, que a
"Rádio e Televisão Argentina Sociedade do Estado" deverá difundir no mínimo
sessenta por cento (60%) de produção própria e vinte por cento (20%) de
produções independentes em todos os meios de comunicação a seu encargo",
não devemos nos esquecer que a produtora privada que realiza o 6,7,8, por
sua vez, tem também outros programas de metalinguagem televisiva – o TVR e
o Duro de domar – em um canal privado, e muitos dos conteúdos transmitidos
são demasiadamente similares nos dois canais – o que significa lucro em
dobro [para a produtora].
3) As transmissões são de terças a sextas-feiras e aos domingos, ou seja,
tem uma forte carga horária, o que se opõe à diversificação da programação
(isso sem contar as reprises depois da meia-noite).

4) É organizado a partir da propaganda oficial e da publicidade, chegando
ao cúmulo de apresentar blocos de poucos minutos (até o final do programa),
cuja única função é a inserção de uma propaganda oficial.

Porém, frente a estes velhos vícios do canal, a mesma Lei prevê a
existência de um Conselho Consultivo Honorário dos Meios de Comunicação
Públicos. Uma de suas funções é controlar o funcionamento da Lei pela Rádio
e Televisão Argentina do Estado e denunciar os casos de incumprimento, além
de atuar como órgão consultivo. Sendo assim, os temas relacionados à
ausência de pluralismo político poderiam ser trabalhados, evitando-se assim
alguma discordância entre o texto da Lei e o que efetivamente é proposto
como linha editorial.
O Canal 7 tem a obrigação de incluir em sua programação "conteúdos
educativos, culturais e científicos que promovam e fortaleçam a capacitação
e a formação de todos os setores sociais". É verdade que eles transmitem
documentais bastante interessantes sobre temas vinculados aos direitos
humanos do passado – os temas atuais são bem pouco abordados. O programa
"Uma tarde qualquer" é o que melhor propõe a diversificação de vozes. Os
filmes transmitidos de madrugada nos convidam a ver um outro cinema de
qualidade. No entanto, não se trata de fazer uma antologia de tudo aquilo
que supostamente seria a função da emissora. Não é o que já foi
conquistado, mas tudo o que falta para a questão pouco promissora do que se
chama "diversificação de vozes".
* Doutora em Ciências Sociais pela Universidade de Buenos Aires e
integrante do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas
(Conicet), ambos na Argentina.
Links relacionados:
Meios de comunicação públicos: o desafio de superar a orfandade (em
espanhol).
Meios de comunicação públicos no centro do debate (em espanhol).
Argentina cinco anos depois da Lei Audiovisual: no conflito
interminável (artigo disponível em português, inglês ou espanhol).
Regularizar o setor sem fins lucrativos: uma dívida ainda pendente depois
de mais de cinco anos da sanção da Lei Audiovisual da Argentina (artigo
disponível em português, inglês ou espanhol).
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