UM OLHAR PSICANALÍTICO SOB A INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA NO DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO DO INDIVÍDUO Nohara Vanessa Figueiredo Alcântara Goes

July 26, 2017 | Autor: Eduardo Alcântara | Categoria: Desarrollo, Neurosis, Desenvolvimento
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UM OLHAR PSICANALÍTICO SOB A INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA NO DESENVOLVIMENTO
PSICOLÓGICO DO INDIVÍDUO[1]



Nohara Vanessa Figueiredo Alcântara Goes[2]

Resumo: A sociedade pós-moderna instituiu mudanças nas relações sociais e
familiares que provocaram uma transformação no "padrão" de família que foi
construído historicamente. Entretanto, estes novos modelos familiares, cada
vez mais presentes, não foram acompanhados, na mesma medida, de uma
preparação psico-emocional dos indivíduos. Diante das dificuldades
enfrentadas a partir destas novas relações e experiências vivenciadas no
âmbito familiar, a teoria psicanalítica traz enormes contribuições à
compreensão da influência da família no desenvolvimento psicológico do
indivíduo. Por entender que as vivências do indivíduo nos primeiros anos de
vida - justamente quando este está mais exposto ao contato e às
intervenções familiares - são determinantes na constituição psíquica do
sujeito, o olhar psicanalítico nos adverte acerca dos possíveis problemas
que emergem caso haja alguma "fixação" em uma das fases do desenvolvimento
psicossexual. A fase anal nos serve aqui como exemplo para uma reflexão
acerca das suas características e dos entraves que nela podem ocorrer, bem
como, das conseqüências do ponto de vista psico-emocional para o indivíduo
adulto.

Palavras-chave: família, desenvolvimento, fase anal, neuroses, psicanálise.



Etiquetas: La sociedad posmoderna instituido cambios en las relaciones
sociales y familiares que provocó un cambio en el "estándar" de la familia
que ha sido históricamente construido. Sin embargo, estos nuevos modelos de
familia, cada vez más presente no han sido encontrados en la misma medida,
una preparación de las personas psico-emocional. Dadas las dificultades de
estas nuevas relaciones y experiencias dentro de la familia, la teoría
psicoanalítica trae enormes contribuciones a la comprensión de la
influencia de la familia en el desarrollo psicológico del individuo.
Teniendo en cuenta que las experiencias de los distintos principios en la
vida - justo cuando este está más expuesta al contacto y las intervenciones
de la familia - son esenciales en la constitución psíquica, el estudio
psicoanalítico advierte sobre posibles problemas que surgen si uno es "la
fijación" en una etapa de desarrollo psicosexual. La fase anal nos sirve
aquí como un ejemplo para una reflexión sobre sus características y los
obstáculos que se pueden producir en el mismo, así como las consecuencias
en términos de la psico-emocional a los adultos.

Resumem: familia, desarrollo, fase anal, neurosis, el psicoanálisis.





É unânime entre os mais diversos estudiosos a máxima que afirma que o
desenvolvimento humano é determinado por uma variedade de fatores que vão
desde as variantes genéticas, perpassando pelos aspectos biológicos e
chegando até as vivências sócio-culturais e familiares. Os diferentes
estudos científicos realizados acerca deste tema tornaram incontestável o
fundamento que sustenta a constituição do sujeito como resultado da
interação e interferência destes e outros fatores que, de forma dinâmica,
vão determinar o funcionamento da mente humana, bem como, seus pensamentos,
comportamentos e emoções.

Entretanto, nenhum outro aspecto desperta maior interesse neste debate do
que a influência da instituição família neste processo, já que qualquer
"anormalidade" advinda das experiências vivenciadas no seio familiar, na
maioria das vezes, constitui-se na principal causa dos problemas
psicológicos enfrentados pelo indivíduo.

O mundo pós-moderno, juntamente com as mudanças que emergem dele, trouxe
consigo uma série de problemas que provocam uma disfunção familiar surgida
a partir de dilemas como a violência no lar, a separação dos pais, o
alcoolismo, o uso de drogas, o abuso sexual, as perdas parentais, entre
outros. Tais problemas demonstram a fragilidade e o despreparo da família
para lidar com os conflitos e com as próprias emoções.

Segundo Baltasar e Moretti (2003):

O estudo da família e sua importância na estruturação de
sintomas em seus membros tem sido abordado por vários
estudiosos que acreditam que as condições nas quais ocorre
o desenvolvimento da criança determinam uma intrincada
série de relações intersubjetivas, estruturadoras de redes
de fantasias e de significados que só podem ser
corretamente avaliadas se forem incluídas em uma
psicodinâmica familiar. (p.128)[3]


No âmbito desta discussão, a teoria psicanalítica, desde os primeiros
postulados de Freud, trouxe grandes contribuições no entendimento do papel
e da importância da família no processo de estruturação psíquica da
criança. A psicanálise sempre reconheceu as relações vividas pela criança
durante seus primeiros anos de vida como um alicerce para o seu
desenvolvimento e atribuiu um papel de destaque à mãe devido ao forte
vínculo que se estabelece com o filho, principalmente durante o período de
amamentação. O pai também tem sua relevância reconhecida principalmente na
fase em que o complexo de Édipo é instituído, onde o mesmo ganha do filho
uma posição subjetiva inconsciente proveniente da diferença sexual.

Vale lembrar que a família, enquanto estrutura social básica, constitui-se
na primeira instância responsável pela formação e constituição do
indivíduo. As primeiras manifestações de afeto, a aprendizagem da língua, a
transmissão de valores e condutas, e os comportamentos referenciais
transmitidos fazem parte das relações cultivadas pela família que
estabelecerão as estruturas fundantes da psique humana.

Entretanto, é no estudo das fases do desenvolvimento psicossexual que a
Psicanálise evidencia o importante papel desempenhado pela família. A
partir do estudo destas fases, Freud aponta que o pleno desenvolvimento
psíquico do indivíduo depende da forma que ele vivenciará cada fase e
qualquer problema emergente em uma delas, ocasionará numa "fixação" nesta
fase particular, o que se configurará possivelmente numa fonte de futuras
neuroses.

No decurso do crescimento infantil, novas áreas de tensão e gratificação
surgem em cada fase e chegam ao nível da consciência provocando mudanças no
desejo da criança e no respectivo objeto de desejo. Na fase anal, por
exemplo, que ocorre entre os 2 e 3 anos de idade, o desejo está ligado ao
controle dos movimentos esfincterianos relacionados à evacuação e à micção.
Além de descobrir o ânus e a uretra como novas fontes de prazer, a criança
percebe a atenção que lhe é dedicada na busca dos pais pela higiene do
filho e na valorização das fezes e da urina como um "presente".

O controle autônomo do esfíncter vai conferir à criança nesta fase a
percepção da mudança de uma postura passiva para uma postura ativa. Este
momento caracteriza-se pela busca por independência, pela fuga do controle
dos pais. Ter o controle do esfíncter vai significar para a criança,
primeiramente, ter o controle sobre o seu próprio corpo e, posteriormente,
do mundo. Por outro lado, esta autonomia provoca a incerteza de que é
amada, levando-a a confrontar os pais e, muitas vezes, testar a autoridade
deles.

Desta forma, a postura e o comportamento da família serão primordiais à
normal evolução do desenvolvimento da criança. Uma boa resolução nesta
fase, por exemplo, resultará na base de uma conduta independente e
autônoma, numa postura de iniciativa, na capacidade de autodeterminação, de
cooperação e num comportamento centrado.

Por outro lado, algum conflito ou entrave na fase anal podem levar
futuramente a quadros psicopatológicos caracterizados por uma elevada
ambivalência afetiva, tendências sados-masoquistas, desordem, etc., podendo
até culminar numa neurose obsessivo-compulsiva.

Na escola, além de problemas de desorganização e limpeza, a criança poderá
apresentar dificuldades de adaptação ao ambiente escolar, insegurança ao
fazer as atividades e uma constante dependência do professor.

DOLTO (1971) reitera as conseqüências psicoemocionais no indivíduo advindas
da fixação nesta fase:

na fase anal, registra-se a formação de caracteres
conscienciosos, sóbrios, regulares, trabalhadores,
sérios e científicos naqueles indivíduos que sentiram
prazer em conformar-se às novas exigências que lhe
foram pedidas; nos outros, os obstinados, os
rabugentos, os teimosos, encontraremos os que se
comprazem em escandalizar ou causar sensação pelo seu
desalinho, sua sujeira e sua indisciplina, ou ainda
aqueles que uma ordem meticulosa e próxima da
obsessão torna insuportáveis aos que com eles
convivem. (p. 36)




A partir deste entendimento, e da compreensão do que ocorre em cada fase, a
família terá maior facilidade para lidar com os comportamentos da criança,
de forma a aceitá-los e percebê-los como uma etapa normal do seu processo
de desenvolvimento. Sujar as mãos de fezes ou brincar oferecendo-as de
presente a seus pais, serão vistos, a partir deste entendimento, como
comportamentos naturais que não deve ser reprimidos.

Cabe salientar que algumas atitudes devem ser evitadas, como por exemplo,
perguntar excessivamente se a criança quer fazer coco, ou depreciar as
fezes alegando mau cheiro, mesmo que de brincadeira, já que podem despertar
na criança algum tipo de desespero que poderá se culminar num bloqueio.

Desta forma, fica explícito a influência da família no desenvolvimento
psicológico e emocional do indivíduo, entretanto várias outras demandas
surgem a partir desta constatação. Preocupa-nos admitir a real situação das
famílias nos dias de hoje que, transformadas ao longo da história pela
globalização, pelo avanço tecnológico e pelas mudanças sócio-político-
econômicas, atravessa um momento paradigmático de mudança na sua dinâmica,
nos seus valores, nas suas relações e na sua estrutura.

O padrão familiar instituído tradicionalmente vem sendo substituído por uma
organização diferenciada calcada na ausência ou na substituição de um ou
mais sujeitos. Com o aumento do número de divórcios, a revolução feminista,
o aumento dos direitos dos homossexuais, entre outros, a família que
historicamente era constituída de pai, mãe e filhos, vem dando lugar a
outros modelos onde entra a figura do padrasto, da madrasta, da babá, entre
outros. A tríade pai x mãe x filho passa por um processo de ruptura
modificando significativamente as experiências e relações na família, que
na maioria das vezes encontra-se despreparada para lidar com as separações,
as perdas e os conflitos emocionais.

A partir do estudo das fases e da etiologia das neuroses, é possível
constatar que pequenos gestos ou palavras proferidas de maneira inoportuna,
mesmo sem uma intencionalidade violenta ou depreciativa, podem provocar no
indivíduo seqüelas, muitas vezes irreversíveis. As vivências do indivíduo
nos primeiros anos do seu desenvolvimento infantil, vão estabelecer, quase
sempre, as bases de suas futuras relações.

Diante desta discussão, cabe-nos refletir acerca do pensamento de BOECHAT
(2003):

O homem conquistou tudo o que sonhou e vive assustado
com a dimensão da própria obra. A sociedade necessita
de alfabetizadores emocionais, urgentemente. É
necessário ensinar ao homem desta era, que ousa
brincar tão ardentemente de Deus, a ler, interpretar
e administrar as próprias emoções. Procuram-se
digitadores da informática humana, técnicos capazes
de ensinar a auto-estimulação dos hormônios que
formam o padrão químico do bem estar. (p. 40)




Esta demanda imposta pela sociedade pós-moderna exige, desta forma, uma
resignificação do papel da família na constituição do indivíduo. Este papel
que muitas vezes é transferido a outrem (cuidadores, creche, escola, etc.)
acaba muitas vezes, sendo mal desempenhado, principalmente porque, não
somente a família, mas a sociedade de modo geral, está mal habilitada para
lidar com as situações de conflito que lhe são apresentadas. Este fato
acaba por configurar-se num ciclo vicioso que, ao longo do tempo, perpetua
e acentua os comportamentos neuróticos dos indivíduos.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



BALTASAR, José Antônio e MORETTI, Lúcia Helena Tiosso. As Relações
Familiares, a Escola, a sua Influência no Desenvolvimento Infanto-juvenil e
na Aprendizagem. In: Revista eletrônica Terra e Cultura, ano XX, n 39.
Disponível em:
http://web.unifil.br/docs/revista_eletronica/terra_cultura/39/



BOECHAT, Ivone. A Família no Século XXI. 2ª ed. Rio de Janeiro: Reproarte,
2003.



DOLTO, Françoise. Psicanálise e Pediatria. Rio de Janeiro: Zahar Ed. 1971
-1980.







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[1] Artigo apresentado em cumprimento à disciplina Teoria Psicanalítica do
curso de Formação em Psicanálise Clínica do CEAPP (Centro de Estudos e
Acompanhamento Psicanalítico e Psicopedagógico) ministrada pelo professor
Abacuque Pereira
[2] Aluna do curso de Psicanálise Clínica do CEAPP, Licenciada em Pedagogia
pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Pós-graduada em Psicopedagogia
Institucional e Clínica pela Faculdade de Artes do Paraná (FAP),
Pratticcioner e Master em Programação Neurolinguística e Coordenadora
Pedagógica da Prefeitura Municipal de Salvador.
[3] Disponível em:
http://web.unifil.br/docs/revista_eletronica/terra_cultura/39/Terra%20e%20Cu
ltura_39-11.pdf
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