UMA REVISÃO CRONOLÓGICA DA AUTORIA ATRAVÉS DA HISTÓRIA DO LIVRO NO OCIDENTE

September 30, 2017 | Autor: Verônica Birello | Categoria: Discourse Analysis, Autoria, Autorship
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21/10/2014

Birello

LL JOURNAL, VOL. 8, NÚM. 2 (2013)

“UMA REVISÃO CRONOLÓGICA DA AUTORIA ATRAVÉS DA HISTÓRIA DO LIVRO NO OCIDENTE” Verônica Braga Birello / Roselene de Fátima Coito Universidade Estadual de Maringá / Universidade Estadual Paulista (UNESP)

CHARTIER, Roger. O que é um autor? Revisão de uma genealogia. Tradução Luzmara Curcino; Carlos Eduardo de Oliveira Bezerra. São Paulo: EdUFSCAR, 2012. 90 p. ISBN 978-85-7600-285-7 O livro de Roger Chartier é fruto de uma conferência realizada por ele. Em sua fala, Chartier propôs uma revisitação ao texto O que é um autor, de Michel Foucault, originalmente proferido em 1969, na Sorbonne, Universidade francesa. Chartier faz uma explanação sobre cada tópico abordado por Foucault em 1969 e depois se aprofunda na história do copyright e dos direitos autorais, tópico abordado secundariamente por Foucault em sua fala. Para o historiador Chartier, quando se pensa em autoria é importante notar que aconteceu uma mudança na relação entre a “crítica textual” (disciplina que tem como foco a crítica, a edição e a interpretação de textos), que passa a receber mais importância, e a “história cultural” (definida como uma história dos objetos e das práticas), que promoveu um retorno a obras canônicas, até então, intimidadoras. Devido à mudança mencionada, outros tipos de questionamentos, tais como variações conceituais que versam sobre a mobilidade, a descontinuidade, a designação, a classificação e a materialidade de diferentes obras, surgiram promovendo o encontro de interesses entre historiadores de várias vertentes e filósofos. São essas inquietações que ajudam na identificação de dois grupos: a) o das variações conceituais; e, b) o que aborda a segunda historicidade, que diz respeito à materialidade da obra tratando da literatura enquanto publicação. Sendo assim, em sua conferência, Chartier delimita o lugar de onde ele enuncia em algum ponto entre a crítica textual e a história cultural e, a partir disso, o estudioso se propõe a fazer uma reavaliação do conceito “função autor” passando pela relação autor-editor. Segundo Chartier, o objeto comum de sua fala e da fala de Foucault é uma reflexão sobre o surgimento do conceito de autor como indivíduo ou como coletividade, existindo como ponto de partida, como fonte do discurso. Esse processo de construção do autor seria constituído por duas partes. Em um primeiro momento, acontece a triagem dos enunciados existentes no interdiscurso e, em um segundo momento, ocorre a seleção e a exclusão de enunciados, gesto que constitui a função autor, responsável por configurar esse outro texto, tendo como função ser o princípio organizador de discursos. O historiador aborda ainda o fato de Foucault revisitar a própria conferência por ocasião de uma reapresentação na Universidade de Buffalo, E.U.A. Para Foucault (2000), a autoria é um processo complexo que busca dar conta da rarefação da proliferação de sentidos. Por ser essa atividade complexa acontece um afastamento radical entre o nome do autor e o indivíduo real em que a autoria passa a ser uma categoria do discurso que se contrapõe com o eu subjetivo. Dessa forma, após tratar da proposta de Foucault, Chartier sugere o texto de Borges, Borges e Eu, e comenta sobre a dialogia ator versus autor que se refere à autoridade dos autores garantida pelos direitos autorais, fato que leva muitos atores a se aventurarem pelos caminhos da autoria. Essa relação continua a ser estabelecida com Borges na medida em que o escritor argentino e Foucault abordam questões em comum, como a impossibilidade de fugir da “função autor”. Borges, em seus textos literários, se vê aprisionado pelo nome próprio enquanto Foucault, em seus estudos filosóficos, também sonha com um texto sem identificação e nome próprio, como anuncia no começo de A ordem do discurso de 1970. Existe ainda, na palestra de Foucault, uma referência a uma cronologia que se torna o enfoque da revisão de Chartier, embora não fosse o ponto principal abordado por Foucault. Como Chartier estuda a fundo o copyright, a história de seu surgimento e suas implicações, ele foca seu texto na aquisição de direitos do autor e a manutenção do poderio dos livreiros britânicos. Ele diferencia property e propriety quando aborda a questão da maior parte dos processos abertos por autores no séc. XVII e XVIII a respeito da defesa da honra e reputação de seus nomes não estando relacionados à questão monetária. Observamos que a questão da autoria não estava relacionada a textos científicos, pois era comum o desinteresse pela autoria, uma vez que um sábio busca o conhecimento, não o reconhecimento. Contudo, ao se referir à cronologia apresentada por Foucault, notamos que Chartier apresenta uma considerável mudança na Idade Média e um constante vigiar, por parte dos comitês da Inquisição, ao autor empírico em suas publicações e puni-lo, caso escrevesse textos hereges e que merecessem censura. Chartier leva o leitor a uma reflexão sobre a inquisição e a obrigatoriedade da autoria para toda e qualquer publicação, visto que, o anonimato deveria ser considerado um crime. Esse vigiar da autoria impossibilita o sonho de Foucault e Borges de um mundo sem autores. O fim do texto do professor historiador Roger Chartier é marcado por uma crítica ao texto de Foucault, principalmente à genealogia apresentada por ele, visto que ela seria, de fato, muito maior, pois, além de considerar a autoria, deveria considerar também a história do livro como objeto que conhecemos hoje e que tem uma história bem maior do que a foi originalmente apontada pelo filósofo. Dessa forma, o leitor desse livro de Chartier deve obrigatoriamente ter conhecimento sobre a conferência de Foucault, bem como ser conhecedor de outros textos foucaultianos e de trabalhos do próprio Chartier, pois ao terminar esta leitura, é necessário retornar ao texto de Michel Foucault para entender esse movimento relacionado à genealogia apresentada, a qual foi alvo de duras críticas do historiador. Primeiramente, nota-se que, quando Foucault cita as datas analisadas pelo historiador, ele o faz de maneira a atentar para o acontecimento e não para o período marcado cronologicamente. Todavia, Foucault, ao responder a Maurice de Gandillac (2000), reafirma que sua apresentação não era nada mais que um plano de trabalho, não uma obra em si. Portanto, vê-se que Chartier baseia sua crítica em um recorte cronológico que é parte de um http://ojs.gc.cuny.edu/index.php/lljournal/rt/printerFriendly/1320/1487

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corpus que, naquele momento, estava sendo delimitado pelo filósofo, e que tinha por objetivo analisar a formação e as regras que regem a função autor. Este fato, porém, não anula a validade da reflexão de Chartier que faz do plano de estudo que Foucault estava começando a delimitar, ponto de partida para outra reflexão, com outro olhar. Chartier se utiliza do histórico, mostrando que o discurso não é rígido e limitado; ele sempre pode ser retomado em diferentes perspectivas, em diferentes épocas e em diferentes lugares. Sendo assim, partindo do texto: O que é um autor? de Foucault (2000) e de sua revisão em O que é um autor? Revisão de uma genealogia de Chartier (2012), foi possível perceber que não é um momento histórico estanque que consolida a autoria, mas vários acontecimentos que foram moldando o conceito de autor empírico para a sociedade ocidental. Em outros termos, são diversos processos e motivações que contribuem para a instituição da autoria, algumas visíveis, como a foto do autor individual que passa a circular em seus livros a partir do séc. XVII, até a tentativa de controlar a editoração dos textos, de forma invisível para o público leitor. O constante vigiar e punir da lei, a censura de títulos, a necessidade de alguém para culpar, ou seja, uma questão jurídica também passa pela questão da autoria, principalmente nos dias de hoje que se discute muito sobre o plágio. Dito de outro modo ,é um conjunto de ações e medidas que fez com que a autoria fosse reconhecida como tal até os dias de hoje. Referências FOUCAULT, M. O que é um autor? Tradução: António F. Cascais e Eduardo Cordeiro. 4ª ed. Lisboa: Vega. 2000. _____________ A ordem do discurso. In: Série Apontamentos, n.29. Trad. Adalberto de O. Souza. Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 1995.

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