Utopia jornalística e mercado

July 18, 2017 | Autor: R. Machado | Categoria: Journalism, Jornalismo
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Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) Curso de Comunicação Social – Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações Públicas

Comunicação, consumo e identidade no Brasil 1ª edição Sérgio Francisco Endler Valério Cruz Brittos (Organizadores)

São Leopoldo, 2010

Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) Área das Ciências da Comunicação ADMINISTRAÇÃO REITOR: Marcelo Fernandes de Aquino VICE-REITOR: José Ivo Follmann PRÓ-REITOR ACADÊMICO: Pedro Gilberto Gomes PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO: João Zani DIRETOR DA UNIDADE DE GRADUAÇÃO: Gustavo Borba COORDENADOR DO CURSO DE JORNALISMO: Edelberto Behs

ORGANIZADORES Sérgio Francisco Endler Valério Cruz Brittos PREPARAÇÃO DOS ORIGINAIS Andres Kalikoske EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Agexcom

ISBN 978-85-98396-06-4

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Sumário Prefácio ........................................................................... 5 Edelberto Behs Introdução......................................................................... 6 Sérgio Francisco Endler; Valério Cruz Brittos

Capítulo 1..................................................................... 10 Consumo e identidade no contexto da globalização Andressa Gazzana Reis Capítulo 2..................................................................... 23 Utopia jornalística e mercado Ricardo de Jesus Machado Capítulo 3..................................................................... 36 Zero Hora e Donna: conexões midiáticas com o público feminino Anderson Fleck; Juliana Silveira; Kamila Kaiser; Luciana Cardoso Capítulo 4..................................................................... 49 Rádio e propaganda no Brasil: panorama e perspectivas Felipe Saft Eugênio; Natália de Negri; Pablo Quintana; Tiago da Silva Capítulo 5..................................................................... 65 Consumo e evangelho no subgênero do rock gospel Ursula Gabriela Brehem Capítulo 6..................................................................... 73 Internet, desenvolvimento e motivação juvenil na utilização de blogs Carolina Lenz Freitas; Guilherme Endler; Marcus Vinícius Camargo; William Kiefer

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Prefácio Edelberto Behs1*

É sintomático que estudantes e professores da atividade Iniciação ao Conhecimento Científico tenham desenvolvido o primeiro livro eletrônico produzido no curso de Comunicação Social. De certa forma, subsídios do conhecimento acumulado pela figura humana no decorrer da História são aqui expostos, em artigos, numa nova mídia aplicável a um novo suporte de comunicação, numa mídia virtual. O ato de descobrir carrega consigo a incorporação de novos conceitos a respeito de fatos e fenômenos, agregados às ideias, concepções e percepções herdadas de pensadores que tiveram percurso semelhante, certamente inovador e desafiador, no passado recente ou remoto. Fazendo diferenciações entre os tipos de conhecimento – do filosófico e teológico ao científico, passando ainda pelo senso comum -, estudantes realizam análises, recorrendo ao rigor da ciência, sobre recortes da comunicação em diversos enfoques. O estímulo, ou até mesmo a provocação, para que estudante de semestres iniciais em cursos de Comunicação desperte e desenvolva atitudes investigativas é um dos tantos propósitos que se procura alcançar, a começar por Iniciação ao Conhecimento Científico e seguindo os semestres afora. Pelo que se apresenta nesse livro virtual, a primeira parte do propósito foi plenamente alcançado. Boa leitura.

1 * Coordenador do Curso de Comunicação Social

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Introdução Sérgio Francisco Endler2* Valério Cruz Brittos3** O presente trabalho é resultado de uma coletânea de artigos desenvolvidos em sala de aula por alunos de Comunicação Social da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), respectivamente dos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações Públicas, discentes em duas turmas da disciplina Iniciação ao Conhecimento Científico, em 2009/1. Sob orientação dos professores Valério Cruz Brittos e Sérgio Francisco Endler, com a colaboração do mestrando Andres Kalikoske, estagiário docente na disciplina, os textos que integram este livro tomam a problemática comunicacional como eixo central de sua análise. A partir de uma estrutura interdisciplinar, do ponto de vista das diferentes matrizes teórico-metodológicas trabalhadas, os artigos buscam um diálogo entre si, esmiuçando uma reflexão de amplo espectro sobre as relações da mídia com a cultura contemporânea. Consumo e identidade no contexto da globalização, de Andressa Gazzana Reis, analisa o fenômeno da globalização como principal desencadeador de mudanças na sociedade contemporânea. Considerando o processo de homogeneização, especialmente a partir dos estudos de García Canclini, o artigo resgata as relações entre identidade e consumo, tendo em vista a lógica da construção de status como meio motivador para a busca de bens simbólicos. Por outro lado, em meio à heterogeneidade instaurada, o trabalho identifica a existência de códigos capazes de unificar

2 * Professor na Área de Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). E-mail: . 3 ** Professor titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), coordenador do Grupo de Pesquisa CEPOS (apoiado pela Ford Foundation), doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas, pela Faculdade de Comunicação (FACOM) da Universidade Federal da Bahia (UFBA), e vice-presidente da Unión Latina de Economía Política de la Información, la Comunicación y la Cultura (ULEPICC-Federación). E-mail: .

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estes bens, a partir do ressurgimento de identidades culturais locais em diversos territórios. Com as identidades culturais reposicionadas, a autora mostra que as diferenças sociais permanecem, quando não se tornam ainda mais fortes. Ricardo de Jesus Machado, por sua vez, resgata o papel da mídia impressa hegemônica no desenvolvimento do cenário político brasileiro, em Utopia jornalística e mercado. Uma vez que o discurso das grandes organizações apresenta-se como legitimador também entre os movimentos sociais, o autor eleva sua compreensão sobre as práticas jornalísticas iniciais, a fim de especificar que elas não devem constituir-se em uma atividade mercantilizada, mas sim se manter o mais próximo de seu ideal inicial, hoje banalizado. Não obstante, a detenção de discursos dos conglomerados de comunicação não favorece um debate aberto, sendo que a produção jornalística tampouco estabelece diálogos afinados com os interesses sociais. Nesta direção, o sistema de crenças integrado é continuamente reforçado, a partir de uma ordem coercitiva que atenda aos interesses do mercado. Em Zero Hora e Donna: conexões midiáticas com o público feminino, o caderno feminino deste jornal de ampla circulação no Rio Grande do Sul é tomado como objeto de análise por Anderson Fleck, Juliana Silveira, Kamila Kaiser e Luciana Cardoso. Com metodologia vinculada aos Estudos de Recepção, os autores buscam verificar – por meio de entrevistas, análise do conteúdo informacional e códigos de significação e discurso – como a construção da figura feminina é representada em tal leitura. Para fundar a pesquisa qualitativa, o texto toma como ponto de partida o entendimento de que a publicação se trata de uma produção midiática em escala e com alto grau generalista, que busca estabelecer uma linguagem midiática híbrida. A evolução da radiofonia comercial, até o estabelecimento dos mais diversos formatos de publicidade neste meio, é traçada por Felipe Saft Eugênio, Natália de Negri, Pablo Quintana e Tiago da Silva, em Rádio e propaganda no Brasil: panorama e perspectivas. Partindo de uma ótica epistemológica relativa às Teorias da Dependência Cultural (TDC), o trabalho resgata e critica os múltiplos formatos de música (analógicos e digitais), desenvolvidos e comercializados por agentes econômicos notórios,

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como a japonesa Sony Corporation, Os autores também se aliam a uma pesquisa de recepção de âmbito local, para pormenorizar horário, tempo e atividade exercida por uma comunidade acadêmica durante o consumo de programas radiofônicos. O artigo de Ursula Gabriela Brehem, Consumo e evangelho no subgênero do rock gospel, busca conexões entre o gênero musical rock e o consumo do evangelismo, a partir da proliferação da indústria gospel no Brasil. Nesse sentido, salienta que, como produto cultural, o chamado rock gospel torna-se motor para venda de bens simbólicos derivados, movimentando um nicho até então desprezado pelo mercado fonográfico. O artigo discorre sobre as diversas ramificações do novo estilo, compreendendo como o gênero se desenvolveu para atingir a sociedade massificada, popularizando-se enpecialmente entre os jovens. Como capítulo de encerramento desta obra, Internet, desenvolvimento e motivação juvenil na utilização de blogs, de Carolina Lenz Freitas, Guilherme Endler, Marcus Vinícius Camargo e William Kiefer, parte de uma contextualização histórica sobre as redes sociais. Do advento do telégrafo até o surgimento da internet, o artigo analisa a função social de um web blog, que tem seu desenvolvimento tecnológico aliado à proliferação da sociabilidade na rede. Paralelamente, partindo do entendimento de que a procura por blogs pelos jovens é motivada a partir de diversos fatores em diferentes contextos, o artigo utiliza-se de pesquisa qualitativa para abordar a questão da motivação juvenil, que cresce constantemente nestes espaços virtuais. Finalizando, deve-se destacar a importância de, já no início de sua fase de formação universitária, estudantes e futuros profissionais de comunicação puderem trabalhar cientificamente, apresentando, de modo próprio, alguma contribuição científico-acadêmica, fundamental para sua formação e para o próprio avanço da pesquisa no âmbito da graduação. Assim, espera-se somar também para a ultrapassagem da falsa dicotomia entre teoria e prática, que ainda impera, mas que, na verdade, não contribui para o desenvolvimento social, já que uma ilumina a outra ou a segunda é o tensionador indispensável para o avanço da primeira.

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Consumo e identidade no contexto da globalização

Consumo e identidade no contexto da globalização Andressa Gazzana Reis4* Introdução O fenômeno da globalização vem provocando mudanças na constituição da sociedade. Enquanto, de um lado, as fronteiras territoriais são discutidas levando em consideração a relação entre os territórios e as identidades, de outro, a rápida circulação de informações, em seus mais variados tipos, está provocando uma separação entre os territórios e suas culturas. Desta forma, considerando o processo de homogeneização pela qual o mundo vem passando, o presente trabalho tem como objetivo pensar até que ponto as identidades se mantém vivas no contexto da globalização. Com base nos estudos de García Canclini, pretende-se mostrar alguns conceitos relacionados a essa área de estudos, salientando a importância de entender as noções de identidade e sua relação com o consumo em sociedades tão multifacetadas. Esse estudo torna-se importante, pois com as mudanças oriundas da globalização, os meios de comunicação de massa passaram a ser fonte principal de consumo da maioria da população. Consumo e definições O ato de consumir é uma das atividades mais básicas do ser humano, pois apesar do indivíduo ser capaz de viver sem produzir, ele não consegue ficar sem consumir. Como apontam Barbosa e Campbell, qualquer pessoa, mesmo as que não produzem nenhuma forma de riqueza econômica, como é o caso de crianças e desempregados, são capazes de consumir diversos tipos de bens e serviços.5 Isso acontece porque o consumo dá-se

4 * Graduanda em Ciências da Comunicação com habilitação em Publicidade e Propaganda na Unisinos e Letras (habilitação tradutor Inglês-Português) na UFRGS. E-mail: . 5 Vide BARBOSA, Lívia; CAMPBELL, Colin. O consumo nas Ciências Sociais. Rio de Janeiro: FGV, 2006.

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de várias formas, desde o seu sentido de esgotamento, em que as pessoas o buscam para saciar suas necessidades fisiológicas, até sua capacidade de conferir status, que resulta numa nova composição de identidades e um maior distanciamento entre as pessoas. García Canclini relata que existem inúmeras teorias para caracterizar o ato de consumir, mas nenhuma teoria sociocultural a respeito do mesmo. Não há nenhuma concepção que dê sentido e ordem à vida social e, principalmente, que contemple a construção das identidades. Primeiramente, o autor parte do conceito de que “o consumo é um conjunto de processos socioculturais em que se realizam a apropriação e os usos dos produtos”.6 Uma concepção que define o consumo como uma espécie de racionalidade econômica, em que o ato de consumir acontece a partir de um simples exercício de gostos, caprichos ou atitudes individuais. Em seguida, o autor analisa outras correntes. Entre elas: o consumo como um movimento do ciclo de produção e reprodução social; os estudos marxistas que definem o consumo como uma manifestação da racionalidade sociopolítica interativa; e, os que estudam o consumo como um lugar de diferenciação e distinção entre classes e grupos. Quanto ao ciclo de produção, não são apenas as necessidade individuais que determinam o consumo, mas também o sistema econômico de determinada sociedade. Na concepção marxista, com a proliferação de objetos e de marcas, percebe-se que as regras de distinção entre os grupos, desde a expansão educacional até a moda acabam interferindo no processo de consumo. Ou seja, ele passa a ser um cenário de disputas entre aquilo que a sociedade produz e como ela utiliza-o. Já a terceira linha de trabalho chama a atenção de que, na sociedade contemporânea, a lógica de construção de status é que faz as pessoas irem em busca de novos bens de consumo. Identidades e relações García Canclini levanta a relação existente entre o consumo e o exercício da cidadania, mostrando que, na situação atual, o ato de consumir é um dos elementos que influenciam a construção de identidades.

6 GARCÍA CANCLINI, Néstor. Consumidores e Cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro: UFRJ, 1996. p. 53.

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Até certo tempo atrás, as identidades se definiam por razões históricas. Seu conceito equivalia a ser parte de uma nação, com hábitos, língua e objetos semelhantes, criando a idéia de uma cultura nacional – uma referência de identificação cultural historicamente mutável. Porém, com a globalização, estes critérios passaram a perder importância. Os referentes de identidade se formam, agora, mais do que nas artes, na literatura e no folclore – que durante séculos produziram os signos de distinção das nações -, em relação com os repertórios textuais e iconográficos gerados pelos meios eletrônicos de comunicação e com a globalização da vida urbana.7

Esses signos de distinção, no entanto, não estão relacionados apenas ao consumo dos meios de comunicação de massa. Como Baudrillard afirma em um de seus estudos, o consumo é dominado por uma lógica de significações que converte tudo em signo, até mesmo as ideologias, os estilos e as atitudes.8 Desta forma, a lógica do consumo para de ser apenas uma forma de indução de compra de bens materiais, pois qualquer coisa pode ser convertida em bens e mercadorias, podendo assim ser produzida, distribuída e consumida. Ou seja, tudo pode se transformar em signos de consumo e, assim, pode ser consumido em escala global, influenciando o modo de vida das pessoas. Isso, de fato, acontece em decorrência da internacionalização e da globalização que foram capazes de quebrar as barreiras entre as nações. Segundo García Canclini, o que as diferencia é que a internacionalização diz respeito à abertura das fronteiras geográficas, permitindo a assimilação de bens materiais e simbólicos de outras regiões, enquanto a globalização pode ser vista como uma interação funcional tanto de atividades culturais e econômicas diversas, formando uma rede de informações que prima à velocidade. Conseqüentemente, se a identidade do indivíduo se transforma, os aspectos culturais com os quais ele convive também mudam, pois ela é um dos fatores centrais da construção da subjetividade. Assim, com a am-

7 GARCÍA CANCLINI, Nestor, op. cit., p. 124. 8 Vide BAUDRILLARD, Jean. Para uma crítica da economia política do signo. Porto: Martins Fontes, 1969.

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pliação dos canais de comunicação e a variedade de signos presentes na sociedade, a cultura deixa de ser vista como sistemas razoáveis que preservam diferenças e enraizamentos culturais, para ser definida como “um processo de montagem multinacional, uma articulação flexível de partes, uma colagem de traços que qualquer cidadão de qualquer país, religião e ideologia pode ler e utilizar”.9 Esse conceito de cultura traz a idéia, proposta pelo mesmo autor10, de hibridização – culturas híbridas que servem para refletir tudo aquilo que não cabe sob os rótulos de culto, popular e massivo. Na verdade, isso diz respeito a praticamente tudo que se produz na atualidade, pois o processo de globalização abrange todos os setores da sociedade atual, não deixando de excluir as manifestações culturais. Sociedade e heterogeneidade Devido a estas inúmeras transformações da sociedade, que com o consumo é capaz de mudar a construção das identidades, vê-se que os parâmetros de classificação desses grupos também se tornam problemáticos. Isto é, em meio à heterogeneidade com a qual os seres humanos se encontram, existem códigos que são capazes de unificá-los. Porém, como se vê, esses códigos estão cada vez menos relacionados aos de etnia, de classe ou nação. Hoje, são as comunidades internacionais de consumidores que prevalecem. Neste ponto, García Canclini traz as idéias de Ortiz, que chama isso de “cultura internacional-popular”, uma memória coletiva formada de fragmentos de diferentes nações. Sem deixar de estar inscritos na memória nacional, os consumidores populares são capazes de ler as citações de um imaginário multilocalizado que a televisão e a publicidade reúnem: os ídolos do cinema hollywoodiano e da música pop, os logotipos de jeans e cartões de crédito, os heróis do esporte de vários países e os próprios que jogam em outro compõem um repertório de signos constantemente disponíveis.11

9 GARCÍA CANCLINI, Nestor, op. cit., p. 17. 10 Vide GARCÍA CANCLINI, Néstor. Culturas híbridas. São Paulo: Edusp, 2000. 11 GARCÍA CANCLINI, Nestor, op. cit., p. 63.

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Desta forma, todo esse processo gera significações que se tornam parte do indivíduo, mudando a maneira como pensar a construção das identidades. Eles deixam de saber coisas relacionadas apenas a sua cultura, para saber um pouquinho de cada uma das outras, criando assim uma nova constituição. Um indivíduo heterogêneo, regido por diversas influências. Tudo isso, um resultado do consumo e da globalização. Para Giddens, a globalização é um fenômeno político, tecnológico e cultural, assim como econômico, que sofreu influências principalmente a partir do desenvolvimento dos sistemas de comunicação no final da década de 1960.12 Na verdade, o advento com das comunicações por satélite criaram uma ruptura drástica com o passado e o modo de ver o futuro. Enquanto na década de 1950 não existia nenhum cabo transatlântico, hoje a comunicação instantânea é possível de um lado a outro do mundo de diversas maneiras, criando a globalização – um fenômeno que provoca cada vez mais uma mistura cultural, quebrando as barreiras entre o local e o global. Também, ela é capaz de afetar aspectos íntimos e pessoais dos seres humanos em suas mais diversas especificidades, criando valores como os que estão mudando a própria concepção da família e o papel da mulher na sociedade. Assim, a globalização modifica a vida cotidiana, em todo o mundo, em esferas que vão do trabalho à política. Entretanto, em sua totalidade, ela não traz apenas conseqüência positivas. As nações perderam a maior parte da soberania que possuíam outrora, e os políticos perderam a maior parte de sua capacidade de influenciar os eventos. Não é de surpreender que ninguém mais respeite líderes políticos, ou tenha muito interesse no que eles possam ter a dizer.13

Com relação aos políticos, García Canclini também se questiona: por que as maiorias votam em governantes que as prejudicam? Isso acontece em decorrência às transformações das fronteiras, no caso entre o público e o privado. Com a mídia, os políticos passam a ser meros produtos da indústria cultural que as pessoas “consomem” através da televisão e

12 GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro: Record, 2000. p. 192. 13 GIDDENS, Anthony, op. cit., p. 19.

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de outros dispositivos eletrônicos. Nessa discussão, o autor cita exemplos como Menen, Fujimori e Collor, pois os candidatos a governante se expuseram na mídia não como homens públicos, mas como um apelo diretamente relacionado à sua imagem. Eles, assim, são vistos como personagens de televisão, sendo consumidos como tal. Outra mudança que García Canclini aponta como uma conseqüência da globalização é em relação aos modos como as pessoas estão consumindo a mídia nos últimos anos. Em seus estudos, em que faz pesquisas principalmente analisando os espectadores latino-americanos, ele mostra que há uma crescente substituição dos espaços de divertimento público por espaços privados. Ou seja, as pessoas vão cada vez menos a cinemas e a teatros, passando a assistir mais vídeos e a televisão a cabo. Porém, ao mesmo tempo em que a globalização cria essas disparidades, ela é também a razão do ressurgimento de identidades culturais locais em várias partes do globo. Muitas perguntas podem ser feitas a respeito de um determinado episódio ocorrido em uma parte do mundo, mas as respostas não podem ser encontradas apenas na história cultural do território. Os “nacionalismos locais brotam como uma resposta a tendências globalizantes, à medida que o domínio de estados nacionais mais antigos enfraquece”.14 Mídia e Consumo Como já foi discutido, a abertura das tecnologias e da comercialização de bens culturais enfraqueceu a importância dos referentes tradicionais de identidade. Mas foi o rádio e o cinema, na primeira metade do século XX, que contribuíram com a organização dos relatos da identidade e do sentido de cidadania nas sociedades nacionais. Principalmente com o cinema que, através de histórias clássicas envolvendo heróis e mocinhas que buscavam encontrar o amor, ilustravam os hábitos e os gostos comuns, os modos de falar e se vestir, mostrando as diferenças entre os povos. Entretanto hoje, com a globalização, há inúmeros meios de comunicação que podem atingir os consumidores. Além dos vários canais capazes de difundir as diferenças existentes na sociedade, García Canclini

14 GIDDENS, Anthony, op. cit., p. 23.

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mostra que a circulação, cada vez mais livre e freqüente, de pessoas e mensagens faz com que, em seu próprio dia-a-dia, as pessoas passem a se relacionar com muitas culturas, fazendo com que a idéia de uma comunidade nacional não seja mais aceita. Assim, para se atingir o público nas condições atuais, é necessário que a universalização seja extremada as suas potencialidades coincidentes de pensamento e gosto em todas as sociedades. A sociedade está tão híbrida, que García Canclini resgata as idéias de Ortiz, que observa que a oposição entre homogêneo e heterogêneo não tem mais importância. Na verdade, o mercado presente apresenta tantas camadas que, para se produzir ou vender é necessário que esses artefatos sejam promovidos globalmente entre grupos específicos. Ou seja, como Ortiz define o termo mais apropriado para falar sobre tal concepção é “nivelamento cultural”, pois mesmo aprendendo o processo de hibridação entre as culturas, é necessário preservar as diferenças entre os níveis sociais. Assim, como podemos ver, as identidades culturais acabam se enfraquecendo, mas as diferenças sociais ainda permanecem se não se tornam ainda mais fortes. E esse enfraquecimento das identidades nacionais e regionais é ainda maior em países em desenvolvimento devido às tecnologias da informação que são “vinculadas às tomadas de decisão, bem como aos entretenimentos de maior expansão e lucratividade (vídeo, videogames, etc).15 Isso acontece, pois a informação e o entretenimento das maiorias vêm de sistemas deslocalizados, internacionais, e não de relações advindas do território em que elas são veiculadas e dos bens que ali são produzidos. O cinema hollywoodiano é um destes produtos. Mas, ao mesmo tempo, há as telenovelas latino-americanas que se consagraram no mercado, mesmo não sendo produzidas em países considerados potenciais mundiais. Desde o início do cinema, Hollywood já criava estereótipos e lançava moda, mostrando sua maneira de representar problemas que seriam de interesse de todos os públicos. Como Benshoff e Griffin colocam, no caso dos estereótipos, os afro-descendentes, por exemplo, no início da década de 1920, eram caracterizados a partir de cinco tipos clássicos, ressaltando sua origem, a mestiçagem das raças e seu papel com escravo.

15 GARCÍA CANCLINI, Nestor, op. cit., p. 150.

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Já os latino-americanos ganharam o título de “amantes latinos”, devido à concepção cultural que os mostravam como pessoas extremamente sensuais e despojadas.16 Mas, não apenas suas características raciais eram marcadas nesta época do cinema. A diferença entre as classes sociais e entre o papel do homem e da mulher na sociedade também era explorada em seus roteiros. Quanto à moda, quem ditava as regras eram as atrizes e atores de cinema. Segundo Lipovetsky: As estrelas despertaram comportamento miméticos em massa, imitou-se amplamente sua maquiagem dos olhos e dos lábios, suas mímicas e posturas; houve até, no decorrer dos anos 1930, concursos de sósias de Marlene Dietrich e de Greta Garbo. Mais tarde, os penteados “rabo de cavalo” ou ondulados de Brigitte Bardot, as aparências descontraídas de James Dean ou Marlon Brando foram modelos em evidência. Ainda hoje, os jovens adolescentes tomaram como modelo o look Michael Jackson. Foco de moda, a estrela é ainda mais, nela mesma, figura de moda enquanto ser-para-asedução, quintessência moderna de sedução.17

Desta forma, como podemos ver, hábitos e práticas comuns da cultura norte-americana passaram a ser disseminadas já no início do cinema, causando impacto em outras culturas que os consumiam seus filmes. Na verdade, como García Canclini observa, os filmes deixam de ser apenas um investimento comercial, para se tornarem um investimento poderoso quando se diz respeito ao registro e a auto-afirmação da língua e da cultura própria, difundidas além das fronteiras geográficas. Dessa maneira, os Estados Unidos saíram na frente, pois desde o início para eles a indústria do entretenimento devia ser tratada como um negócio, em que eles exigiam a livre circulação os produtos audiovisuais, enquanto os europeus tentavam proteger os meios de comunicação, especialmente na área do cinema, pois para eles o cinema uma espécie de arte. Na América Latina, as telenovelas são os únicos produtos culturais exportados praticamente para todo o mundo, gerando grandes audiências

16 Vide BENSHOFF, Harry M., GRIFFIN, Sean. America on film: representing race, gender, and sexuality at the movies. Oxford: Hardback, 2004. 17 LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Companhia das letras, 1989. p. 214.

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trans-culturais, podendo ser um bom exemplo para mostrar como a mídia é capaz de influenciar seus telespectadores. Isso acontece, pois através de pequenos artifícios e enredos bem semelhantes elas criam certa identificação com o público, introduzindo práticas de outras culturas dentro de um mesmo cenário. Seu sucesso também se mantém, pois desde a criação da televisão, todas as suas adaptações para qualquer tipo de gênero foram baseadas em fatos do cotidiano. Segundo Martín-Barbero: A comunicação é percebida, em todo caso, como o cenário cotidiano do reconhecimento social, da constituição e expressão dos imaginários a partir dos quais as pessoas representam aquilo que temem ou que têm direito de esperar, seus medos, suas esperanças.18

Sob este aspecto, é fácil compreender que uma das fórmulas utilizadas pelos comunicadores para chamar a atenção do público e garantir a permanência da televisão foi à utilização do inconsciente do público, ao explorar seus desejos para criar um mundo imaginário, porém ideal. Ford reforça a afirmação de Martín-Barbero quando diz que mídia faz uma releitura popular capaz de realizar uma recuperação do corporal não apenas das culturas tradicionais, mas que revalorize as densidades do cotidiano e do homem comum, mídias que permitem reflexões sobre os canais de interação humana.19 Martín-Barbero ainda coloca que, a telenovela latino-americana configura um objeto de identidade plural.20 Isso acontece devido à nova tarefa do comunicador, que, para o autor, deixa de ser um manejador de técnicas, dando lugar ao mediador, quem torna explícita a relação entre as diferenças culturais e as desigualdades sociais, aquele capaz de pôr em comunicação as diversas sociedades estabelecendo uma troca em si. Assim, as telenovelas permitem a troca de culturas do cotidiano, ou seja, “o que os processos e práticas da comunicação coletiva põem em jogo não

18 MARTÍN-BARBERO, Jesús. Globalização comunicacional e transformação cultural. In: MORAES, Denis (Org.). Por uma outra comunicação: mídia, mundialização cultural e poder. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 63. 19 Vide FORD, Aníbal. Navegações: comunicação cultura e crise. Rio de Janeiro: UFRJ, 1999. 20 MARTÍN-BARBERO, Jesús. Telenovela: melodrama y identidad. Cortocircuito, Lima, n. 15, abr 1991. p. 5-7.

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são unicamente os deslocamentos do capital e as inovações tecnológicas, mas sim profundas transformações na cultura cotidiana das maiorias”.21 Com isso, Martín-Barbero mostra que além do capital gerado, toda a população é envolvida e pode ser transformada através do contato com essas diferentes culturas, ou seja, a diversidade dos gostos, pondo os meios de comunicação como um dos dispositivos mais eficazes na integração das diferentes raças. Afinal, diferentes culturas só se mantém vivas, pois se comunicam umas com as outras. Considerações finais Como se pode ver, não há como contestar que com a globalização e abertura das comunicações, o mundo terminou sofrendo modificações. Algumas positivas, outras não. Porém, é interessante perceber como a construção das identidades mudou, criando povos e culturas híbridos. Na verdade, foi esse processo de hibridização que foi capaz de fundir diferentes estruturas e práticas sociais, gerando novas estruturas em um mesmo contexto. Se essas práticas são erradas ou não, não há como saber. Porém, analisando o caso do cinema, por exemplo, é possível ver como alguns países, principalmente as grandes potências mundiais, possuem uma maior influência sobre seus consumidores. Já no caso das telenovelas, apesar delas proporcionarem certas mudanças, elas não são tão visíveis, seus maiores impactos se dão nos países em que elas são produzidas e não para onde são exportadas. Com isso, nota-se que apesar da globalização reforçar a questão das identidades culturais locais, ao mesmo tempo, ela cria em um território mais abrangente, culturas híbridas influenciadas pelos produtos dos países que detém um domínio maior na economia. A questão é, de fato, encontrar um equilíbrio entre essas forças de influências. Não bastam que só alguns países detenham o poder, todos devem ter a oportunidade de mostrar suas raízes, chamando a atenção dos demais e, assim, produzindo alguma diferença.

21 MARTÍN-BARBERO, Jesús. Globalização comunicacional e transformação cultural. In: MORAES, Denis (Org.). Por uma outra comunicação: mídia, mundialização cultural e poder. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 62-63.

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Referências BARBOSA, Lívia; CAMPBELL, Colin. O consumo nas Ciências Sociais. Rio de Janeiro: FGV, 2006. BAUDRILLARD, Jean. Para uma crítica da economia política do signo. Porto: Martins Fontes, 1969. BENSHOFF, Harry M., GRIFFIN, Sean. America on film: representing race, gender, and sexuality at the movies. Oxford: Hardback, 2004. FORD, Aníbal. Navegações: comunicação cultura e crise. Rio de Janeiro: UFRJ, 1999. GARCÍA CANCLINI, Néstor. Consumidores e Cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro: UFRJ, 1996. GARCÍA CANCLINI, Néstor. Culturas híbridas. São Paulo: Edusp, 2000. GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro: Record, 2000. LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Companhia das letras, 1989. MORAES, Denis (Org.). Por uma outra comunicação: mídia, mundialização cultural e poder. Rio de Janeiro: Record, 2004. MARTÍN-BARBERO, Jesús. Telenovela: melodrama y identidad. Cortocircuito, Lima, n. 15, abr 1991.

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Utopia jornalística e mercado

Utopia jornalística e mercado Ricardo de Jesus Machado22* Introdução Quando o político inglês Edward Burke designou a imprensa como quarto poder, nos idos de 1787, não poderia imaginar que seu termo seria recorrentemente utilizado na contemporaneidade. 23 Contudo, para um amplo entendimento de sua proposta, fatores históricos preponderantes devem ser considerados. Ainda que não se trate de uma longa revisão do jornalismo como epistemologia, dando conta de seu amplo desenvolvimento ao longo dos anos, o presente artigo pretende resgatar algumas questões pontuais sobre o lugar que o jornalismo ocupa nas Ciências Sociais. Nesta direção, faz-se um salto de quase duzentos anos e aterrissamos no início dos anos 1980. É neste momento que a Globo, a maior emissora de TV do país e um dos maiores conglomerados de comunicação do mundo, sustenta relações bem próximas com a Ditadura Militar – rompendo seus laços apenas quando o movimento civil de reivindicação por eleições presidenciais diretas no Brasil, ocorrido em 1984 e denominado “Diretas Já” se solidifica, com forte adesão popular e disposta a ganhar a queda de braço estabelecida com os militares. Falo isso porque a imprensa tem papel fundamental nesse processo, uma vez que é responsável por legitimar, através da midiatização, tais movimentos sociais. Alinhado a idéia de uma hegemonia da comunicação, outras empresas de mídia sobreviveram ao militarismo graças as suas relações próximas com os poderosos do Brasil. Uma delas é a Folha de São Paulo, um dos maiores jornais em circulação no país. Segundo o jornalista Altamiro Borges, a Folha de São Paulo foi uma das grandes incentivadoras do Golpe

22 * Graduando em Ciências da Comunicação com habilitação em Jornalismo na Unisinos. E-mail: . 23 Vide BARRERA, Carlos. Historia del periodismo universal. Barcelona: Ariel, 2004.

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Militar de 1964, tanto que não sofreu censura e, inclusive, emprestou seus veículos, que entregavam jornais, para transportarem torturados da Operação Bandeirantes (OBAN). Caracterizada como um centro de informações, investigações e de torturas montado pelo Exército do Brasil em 1969, a OBAN coordenava e integrava as ações dos órgãos de combate às organizações armadas de esquerda que tinham por objetivo confrontar o regime ditatorial que vigorava desde 1964, no Brasil. Neste cenário, torna-se indispensável repensar aquilo que Burke chama de “quarto poder”, ou seja, é preciso repensar a imprensa, uma vez que ela tenha se distanciado daquilo que o inglês entendia por jornalismo. Considerando esses aspectos, podemos pensar que a imprensa, pelo menos a hegemônica, cumpriu seu papel de quarto poder, quando realizou trabalhos de investigação e denúncia de desvios de dinheiro público, por exemplo, embora esse compromisso social não tenha sido a tônica das atividades jornalísticas, senão por pontos de fuga como referido anteriormente. Contudo um questionamento deve ser feito: quem o “quarto poder” representava e representa? Os interesses sociais ou econômicos? Dialogar com essa problemática, ainda que não seja possível encontrar respostas concretas, é a proposta deste pequeno ensaio, que tem por finalidade pensar, sob aspectos éticos e mercadológicos, a prática do jornalismo. Utopias jornalísticas O desejo juvenil de mudar o mundo quase sempre esteve afinado aos desejos jornalísticos. No entanto, estes dois paralelos se distanciam e se aproximam na medida em que esses desejos tornamse distintos. Neste sentido, quando a imprensa se afasta do papel de mobilizador social – onde é capaz de mudar os caminhos das práticas sociais, combatendo ao lado das minorias por melhores condições de vida –, ela se distancia também deste ideal juvenil. Por outro lado, quando os jovens se comportam de maneira passiva em relação a uma mídia que é conhecida por seu discurso hegemônico, não sendo eles questionadores em relação aos conteúdos publicados, em

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grande medida com análise superficial e sem responsabilidade social, acabam entrando na mesma lógica de tais empresas. Tendo em vista tais aspectos, faz-se necessário, sobretudo quando o jornalismo torna-se uma profissão desregulamentada, 24 resgatar o conceito de utopia jornalística proposta por Karam. Não obstante, é preciso mais que isso: resgatar a função social do jornalismo, que jamais deveria ter sido perdida. Nesta direção, o jornalismo se apresenta como uma utopia que faz da resistência também um projeto. Em outras palavras, lutar para tanto é lutar em favor da profissão; e ao defendê-la, faz-se a defesa de que ela, como quaisquer outras, deve ser favorável à humanidade, e não contrária. 25 Nesta perspectiva é que as práticas jornalísticas precisam ser pensadas, uma vez que, resgatando o problema que orienta esse diálogo, refaço a pergunta: o jornalismo se interessa por quem afinal, pela sociedade ou pelas empresas? É evidente que dentro de um sistema capitalista os jornais necessitem de dinheiro para se manterem, o que não deslegitima a função do jornal, no entanto, isso não serve como argumento para o descompromisso social e, sendo assim, alguns aspectos devem ser levados em conta. Não é prudente que a imprensa fuja das discussões sociais, uma vez que é a voz da sociedade e do interesse público, ou deveria sê-la. No entanto, ao que parece, é que este quarto poder está alinhado mais às questões econômicas do que às sociais, o que não causa surpresa tendo em vista o histórico das grandes corporações. É descabido o pretexto de que a mídia é apenas o observatório do mundo e que em busca da imparcialidade e isenção não toma partido de um ou de outro lado. Aliás, o discurso de “imparcialidade” é tão hipócrita quanto dizer que as empresas dialogam com os problemas sociais. Antes de empresas e jornalistas defenderem a imparcialidade, ainda que isso me pareça mais utópico que a

24 O Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 17 de junho de 2009, desobrigou a exigência do diploma de jornalismo para exercer a profissão, registrando oito votos favoráveis à desregulamentação e um voto contra. BARBOSA, Adauri Antunes. Depois de derrubar obrigatoriedade do diploma de jornalista, STF pode fazer o mesmo com outras profissões. O Globo, Rio de Janeiro, 19 jun. 2009. Acesso em: . Acesso: 19 jun. 2009. 25 KARAM, Francisco José Castilhos. A ética jornalística e o interesse público. São Paulo: Summus, 2004. p. 251.

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própria utopia jornalística citada nesse trabalho, penso que seria adequado pensar eticamente seus discursos. O filósofo alemão Jünger Habermas explica esse processo quando propõe uma “ética do discurso”, discutiva por Karam como: Extremamente relevante à defesa de uma “ética do discurso” habermasiana como moral mínima para que a sociedade perceba a complexidade em que atua e, nela, a mídia e o jornalismo exercido. Assim, haveria a tendência para a formação de uma totalidade ou sistema em que os indivíduos estariam representados tanto em sua individualidade como coletivamente, gerando possibilidades de juízos mais imparciais e autônomos, geradores de um espaço em que uma vontade racional comum pudesse expressar-se de forma mais democrática.26

Sintonizados com essas perspectivas, os meios de comunicação, principalmente as grandes empresas de mídia, que são as detentoras da maior audiência, poderiam ampliar a qualidade do jornalismo desenvolvido, pautados, então, por uma lógica mais humana, comprometida com questões sociais. Pois mesmo considerando todas as pressões que o jornalismo está submetido, sejam elas econômicas ou políticas, é preciso perseguir o desejo utópico da prática jornalística, sobretudo, por uma questão moral. Ainda que ele não seja alcançado, faz-se necessário buscá-lo, assim como se busca a democracia plena ou a plenitude da felicidade pessoal. Mercado, deontologia e novas tecnologias Pensar o jornalismo e suas práticas em um sistema capitalista requer, necessariamente, pensá-lo como um produto. Portanto, neste sentido precisamos pensá-lo no âmbito das “megafusões empresariais”, que, para Karam, tornaram o jornalismo uma prática pautada economicamente, além do que, reduz os discursos jornalísticos a poucas empresas. A essas poucas empresas, que detêm o controle das mídias, ele utiliza a frase de Ben Bagdikian27, para classificá-las como “Ministério Privado da Informação e Cultura”. Dentro desta lógica, o agrupamento de grandes conglomerados midiáticos, torna-se, segundo Karam, uma

26 KARAM, Francisco José Castilhos, op. cit., p. 246. 27 Vide BAGDIKIAN, Ben H. O monopólio da mídia. São Paulo: Maggioli, 1993.

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“sociedade civil mundial”. O negativo disso tudo habita nos interesses públicos, que são deixados de lado em relação aos econômicos, como explica o autor: Os conglomerados da mídia que atuam em diferentes ramos da economia colocam em jogo bilhões de dólares. Por isso, dentro de sua lógica particular, torna-se muito difícil atender ao interesse público se este lhe causar problemas financeiros ou ideológicos que comprometam seu futuro.28

Além disso, Karam traz para a discussão os códigos deontológicos e éticos do jornalismo, em que o jornalista tem à sua mão uma infinidade de possibilidades de pauta, que podem ser baseadas na universalidade humana, mas na maioria dos casos são desprezadas. O jornalismo, neste sentido, além de cumprir muitas pautas parecidas, ou seja, sem uma variedade significativa, tem nas relações de intimidade com suas fontes um problema ético, o que para Chomsky e Hernan29 é negativo, pois mantém um viés conservador no resultado de seus produtos midiáticos. Tais hábitos contribuíram para uma desvalorização do jornalismo, fazendo com que alguns autores, como Martínez, afirmassem que “as novas tecnologias tornarão o jornalismo desnecessário e as pessoas simplesmente não precisarão ou simplesmente se desinteressarão dele”.30 Nesta direção, concorda-se com a questão tecnológica, quando se considera que as novas tecnologias contribuem para o desaparecimento da especificidade do jornalismo, e que grande parte dos jornalistas está se tornando relações-públicas. No entanto, ao mesmo tempo, entende-se que isso não é um fenômeno social e, sim, mercadológico: A globalização dos mercados, dos circuitos financeiros e dos conjuntos de redes imateriais conduziu uma desregulamentação radical, com tudo isso que significa de deterioração do papel do Estado, e dos serviços públicos. É o triunfo da empresa, de seus valores, do interesse privado e das forças do mercado.31

28 KARAM, Francisco José Castilhos, op. cit., p. 231. 29 Vide Chomsky, Noam; Herman, Edward. Los guardianes de la libertad: propaganda, desinformación y consenso en los medios de comunicación de masas. Barcelona: Crítica. 2000. 30 MARTÍNEZ ALBERTOS, José Luis. El ocaso del periodismo. Barcelona: CIMS, 1997. p 236. 31 KARAM, Francisco José Castilhos, op. cit., p. 240.

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O que acontece, diante dessa realidade, é que o trabalho jornalístico tende a ser desvalorizado para, em seu lugar, crescer o mediador de interesses privados no espaço público. Voltando para a questão da ética do discurso, precisamos entender que a recorrência deste tema tornase importante a medida que os discursos são construídos retoricamente e que, por sua vez, operam pautados por determinados interesses. E é justamente a retórica umas das responsáveis pela exclusão de determinados assuntos, embora os produtos de mídia se vendam como discursos “pluralistas”. Karam considera que a retórica não opera em um sentido de inclusão, pelo contrário, exclusão, que, por meio da retórica, as pautas de interesse público são excluídas do processo de midiatização. Tal sistema é responsável pela deslegitimação de movimentos civis ligados a valores sociais e humanos:

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, o Movimento Zapatista, os lutadores legítimos contra a ordem legal, em qualquer continente, parecem estar imbuídos da descrença na representação pública e na participação social sonegada, particularizadas pela privatização do Estado. Por isso, nessa tensão permanente, encontram-se a voz que não foi ouvida, o fato não entendido, o acontecimento não tratado jornalisticamente, o princípio subscrito e não cumprido, o desmentido factual e cotidiano da ordenação do tempo e da violência simbólica da mídia.32

Tem-se, atualmente, a falsa idéia de que “mais volume de informação nos torna mais informados”. Evidentemente isso não pode ser considerado verdadeiro, por diversos fatores, mas destacarei apenas dois, pois os considero mais relevantes: não é possível que consigamos captar todas as informações; e mais informação, em termos de quantidade, não significa mais qualidade de informação. Neste âmbito podemos pensar aquilo que Karam chama de “ciberdemocracia” e que tanto suscita discussões sobre o futuro do jornalismo. Tais discussões são geradas por culpa práticas jornalísticas que, como explicado anteriormente, na maioria dos

32 KARAM, Francisco José Castilhos, op. cit., p. 249.

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casos, foge de sua responsabilidade social, que deveria ser a balizadora das atividades profissionais, e acaba entrando num discurso raso sobre o aquilo que é de interesse público: Estratégias retóricas que beiram o cinismo apontam para a antiética profissional, embora a subscrição crescente de manuais, códigos e princípios defendam procedimentos morais específicos para o exercício do jornalismo.33

Contudo, a proliferação de meios tecnológicos não nos dá a esperança de um crescimento de qualidade nos conteúdos jornalísticos, ainda que eles aparentem tal possibilidade. Pelo contrário, os meios tecnológicos nos dão a impressão de participação, quando, na verdade, a tecnologia, segundo Carey e Quirk,34 é uma maquiagem de interesses políticos e de poder. Traz dentro dela as mesmas sementes dos fracassos que historicamente têm acompanhado as inovações nas comunicações. Em lugar de criar um ‘novo futuro’, a tecnologia moderna convida o público a participar de um ritual de controle no qual a fascinação pela tecnologia esconde os fatores subjacentes de política e poder.35

Jornalismo como comunicação política As práticas jornalísticas têm caminhado em um sentido mais afinado com o trabalho de Relações Públicas, conforme havia mencionado anteriormente, que com o propósito do jornalismo. Não há juízo de valor quando faço a comparação, sobretudo porque são atividades de naturezas diferentes, que, embora as duas pertençam à comunicação, não podem ser tratadas como uma mesma coisa, justamente por suas funções opostas. O que se percebe ao longo deste pequeno estudo e que, então, poderia ser considerado uma espécie de conclusão, embora o trabalho não

33 KARAM, Francisco José Castilhos, op. cit., p. 243. 34 CAREY, James W.; QUIRK, Jonh J. A história do futuro. Comunicação & Política, Rio de Janeiro, v.3, n.1, p. 102-123, jan./abr. 1996. 35 KARAM, Francisco José Castilhos, op. cit., p. 250.

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se proponha a dar respostas, pelo contrário fomentar as discussões, é um distanciamento significativo de valores humanos com a prática jornalística. Faz-se a ressalva de que as empresas são as maiores responsáveis nesse processo, já que os jornalistas vivem, por assim dizer, dentro da lógica capitalista em que necessariamente precisam de empregos para a própria subsistência e, portanto, submetem-se às regras das empresas, muito embora discordem de suas políticas. Contudo não há aqui a isenção dos jornalistas de suas responsabilidades, que é de buscarem o “ideal de jornalismo”, pautarem suas atividades focados numa visão rigorosamente humana, antenados a esses valores, ainda que não consigam alcançá-los, haja visto os interesses opostos das empresas de comunicação. Em toda parte o controle de grandes empresas jornalísticas é realizado por representantes políticos ou por homens de influência no cenário político. José Sarney e sua família, por exemplo, são donos de empresas de comunicação filiadas à Rede Globo, no estado do Maranhão. Contudo, isso não é exclusividade brasileira, já que na Itália, Silvio Berlusconi, primeiro ministro do país, é dono de vários jornais, revistas e emissoras de televisão. Nesse sentido, vários aspectos precisam ser levados em conta, e esses aspectos vão desde a produção até a recepção. Por conta da produção, a detenção dos discursos por tais conglomerados econômicos, não favorece o debate aberto, o que explica, em certa medida, uma imprensa que não estabelece diálogos afinados com interesses sociais: longe de favorecer o pluralismo, reforça um sistema de crenças, integrando todos em uma ordem coercitiva. Já no que corresponde à recepção, há um interesse muito maior pelas imagens, sejam elas sensacionalistas ou sensuais, o que, de alguma forma, ilustra uma sociedade que se pauta pelo espetáculo ou pelo erótico, mas que é pouco preocupada com discussões éticas e valores humanos: A civilização atual é da imagem e é ela [...] que forma as pessoas. Nesse caso, a apreensão imediata da imagem e do saber por ela proporcionado, em escala mundial, minimiza a capacidade do ser humano de pensar abstratamente e compreender conceitos. Por isso, contrapõe ao Homo Sapiens uma nova espécie de ser que estaria surgindo, o Homo Videns.36

36 KARAM, Francisco José Castilhos, op. cit., p. 238.

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Por um lado não há interesse em debates ligados a questões sociais, sobretudo, porque isso implica numa questão política, que por sua vez está ligada diretamente a incompetência das políticas editoriais das grandes empresas de comunicação no exercício de suas atividades públicas. Assim, as mazelas sociais, tanto as relacionadas à corrupção, quanto as de interesse social e púbico, não são midiatizadas numa medida que contribua para a construção de uma sociedade mais crítica e atuante na busca dos próprios direitos. Considerações finais As emissoras e veículos de comunicação públicos não têm a audiência das emissoras privadas, justamente porque andam na contramão da lógica de mercado, propondo conteúdos com uma reflexão social maior que os demais veículos. Há, então, uma questão de cidadania nesse contexto, pois as detentoras de grandes audiências não discutem temas sociais, porque não é de interesse de seus donos e porque não há o habito na recepção desse tipo de debate, o que diminui ou elimina o papel legitimador da mídia nos movimentos sociais. O mercado tem papel relevante nesse processo, pois é o responsável pelo enfraquecimento de instituições sociais como o Estado, por exemplo. Em uma sociedade cada vez mais globalizada e capitalizada, o liberalismo impera sobre as questões sociais. O jornalismo, por sua vez, mergulha nesse “mar capitalista” e é pautado por ele. Faz-se indispensável para a compreensão deste estudo, destacar que a mídia tem papel fundamental na legitimação do capitalismo. Não se trata aqui de analisar um sistema político-econômico, até porque não há referenciais teóricas para tanto, mas sim de relacioná-lo com a comunicação, a fim de entender que papel ele exerce dentro da mídia: O mercado, epicentro moral e financeiro dos Estados “supranacionais” privados, dispõe de uma rede composta de uma “constelação” de entidades formadas pelo FMI, pelo Banco Mundial, pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Essa constelação é amplificada na mídia, que dela se beneficia e nela se integra por meio de megafusões e associações midiáticas e por um circuito que conta com empresários da mídia, parlamentares, governantes, empresa de marketing

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e jornalistas, crentes de cumprir (cinicamente ou não) as premissas do interesse público.37

Levando todas essas considerações em conta, é possível ampliar, de algum modo, a compreensão sobre as práticas jornalísticas. Não se trata de “demonizar” o capitalismo, tampouco a mercantilização das empresas de mídia, contudo, o papel social da imprensa não pode ser mercantilizado, deve lutar para manter-se o mais próximo do ideal jornalístico. Sendo assim, os jornalistas tem papel fundamental nesse processo, a medida que há a necessidade de uma luta diária pela utopia jornalística, considerando, é claro, que não se pode vencê-la sempre. Em uma palestra na Universidade do Rio dos Sinos (UNISINOS), a jornalista Eliane Brum, da revista Época, disse que a forma como olhamos o mundo, muda o mundo. É exatamente este aspecto que deve ser levado em conta, uma vez que Brum trabalha em uma grande empresa de comunicação e, mesmo assim, trava o duelo diário entre utopia jornalística e mercado. Não há desculpas para os acomodados, pois, seguindo colocações de Karam, enquanto eles forem a maioria, continuará havendo um triunfo da empresa, seus valores, do interesse privado e das forças de mercado. Referências CAREY, James W.; QUIRK, Jonh J. A história do futuro. Comunicação & Política, Rio de Janeiro, v.3, n.1, p. 102-123, jan./abr. 1996. BARBOSA, Adauri Antunes. Depois de derrubar obrigatoriedade do diploma de jornalista, STF pode fazer o mesmo com outras profissões. O Globo, Rio de Janeiro, 19 jun. 2009. Acesso em: . Acesso: 19 jun. 2009. KARAM, Francisco José Castilho. A ética jornalística e o interesse público. São Paulo: Summus, 2004.

37 KARAM, Francisco José Castilhos, op. cit., p. 233.

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Zero Hora e Donna: conexões midiáticas com o público feminino

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Zero Hora e Donna: conexões midiáticas com o público feminino Anderson Fleck38* Juliana Silveira39** Kamila Kaiser40*** Luciana Cardoso41**** Introdução O presente artigo reflete sobre a relação com o público feminino do caderno Donna, encartado aos domingos no jornal Zero Hora, de Porto Alegre. Assim, busca-se analisar como suas leitoras se identificam com a figura feminina representada em tal leitura. O trabalho desenvolvido fundamenta-se na observação e análise do caderno, procurando delimitar os aspectos de sua linguagem, de sua apresentação ao leitor, de sua identidade visual e, especialmente, da sua temática ou, nesse caso, da pautas de suas matérias jornalísticas, crônicas, etc. Outra forma de proceder desenvolvida durante a realização deste artigo baseia-se em uma pesquisa qualitativa. Por iniciativa dos autores deste texto, resolveu-se aplicar um questionário com cerca de doze perguntas subjetivas, a fim de pesquisar e traçar um perfil das leitoras do Donna, e, desta forma, contribuir de maneira decisiva para chegar até uma resposta satisfatória sobre a identificação das mulheres com relação a essa publicação. Nesta direção, também se procura desenvolver o embasamento teórico, por esse motivo, determinou-se a necessidade de uma pesquisa bibliográfica, a fim de conhecer as obras já existentes, cujos temas se

38 * Graduando em Ciências da Comunicação com habilitação em Jornalismo na Unisinos. E-mail: . 39 ** Graduanda em Ciências da Comunicação com habilitação em Publicidade e Propaganda na Unisinos. E-mail: . 40 *** Graduanda em Ciências da Comunicação com habilitação em Relações Públicas na Unisinos. E-mail: . 41 **** Graduanda em Ciências da Comunicação com habilitação em Relações Públicas na Unisinos. E-mail: .

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relacionassem com esse tema de estudo. No decorrer deste texto, serão utilizados conceitos, noções e percepções de outros autores que contribuíram para a fundamentação e desenvolvimento da discussão do problema de pesquisa. Resgata-se, ainda, uma discussão sobre um produto midiático e suas representações para o universo feminino, tentando descobrir se há um processo comunicacional efetivo entre as leitoras e os autores do caderno, ou seja, se elas se identificam com a figura feminina apresentada se representada pelo Donna. Produto midiático O que chama a atenção, em uma primeira observação, é o nome do caderno, cujo título tenta criar uma identidade ou, pelo menos, expressar uma ligação direta com o mundo das mulheres. A expressão “dona”, em português, representa a senhora, a proprietária e até mesmo a dona-decasa, assim como também pode dar a entender que se refere à dona de sua própria vida, ou seja, a mulher independente, moderna e profissional. Através das crônicas de Luiz Fernando Veríssimo, Moacyr Scliar e Martha Medeiros, programação de cinema, literatura, música, beleza, moda, entre outras matérias e reportagens, Donna procura expor aquilo que considera essencial em termos de informação, comportamento e cultura para suas leitoras. O caderno cria seu próprio estilo de linguagem midiático e tenta moldar sua identidade comunicacional à realidade das mulheres. Entretanto, até que pondo o Donna é capaz também de moldar o comportamento e os hábitos de suas leitoras? Essa pergunta está inserida ao longo desse artigo e procura ser respondida. Um caderno de noticias encartado em um jornal de ampla circulação tem a vantagem de atingir um grande público, mas o direcionamento para o público feminino ou sua segmentação de mercado propicia uma comunicação mais eficiente. Isso quer dizer que o jornal ZH procura atender os desejos e as necessidades de seu público feminino, nada melhor do que editar o caderno Donna: Com sua retórica amena, amigável, solidária, mensageiros do mercado e peritos midiáticos assumem, em certa medida, o papel das tradições culturais, no sentido de oferecer pontos de referência para a identidade pessoal e social,

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tentando sinalizar a cada um quem ele é ou pode (e deve) vir a ser na vida.42

Um conceito importante para essa análise sobre o caderno Donna está na idéia no segmento da indústria cultural, onde, através de uma “produção midiática” contínua, concebe-se um produto jornalístico que procura atender satisfatoriamente às necessidades do público feminino, ao mesmo tempo em que tenta estabelecer uma linguagem compreensível para tal, ao ponto de criar vínculos e influenciar o comportamento das mulheres. Donna também pode, por meio de conteúdo informacional, criar significações para suas leitoras e provocar uma percepção sobre seus estilos de vida, seus comportamentos e hábitos. As temáticas das reportagens, crônicas e entrevistas tentam representar as perguntas, os interesses e as curiosidades das mulheres. As dicas de literatura, cinema e música procuram trazer assuntos e artistas femininos. Tudo isso para cativar e despertar a atenção desse público específico. As revistas femininas veiculam o que é considerado do “mundo feminino” pelos seus contemporâneos. Seu conteúdo é marcado pela história. Nunca surgem com ideias revolucionárias, não abrem caminhos, mas também não podem ficar muito distantes das transformações de seu tempo, pois correm o risco de perder seu público leitor.43

Nesse ponto da discussão, é necessário compreender e, acima de tudo, definir esse tal “mundo feminino” encartado nas páginas do jornal ZH, e perceber o conteúdo social no qual está inserido. Primeiramente, deve-se perceber que o cotidiano das mulheres modernas é marcado por diversos interesses, desde moda, beleza, dicas de etiqueta até mesmo assuntos relacionados ao mercado de trabalho, educação, políticas sociais, etc. A mulher contemporânea (pós-feminista) atua em diversas áreas, tem liberdade de escolha e poder de compra, enfim, têm diversos papeis so-

42 FREIRE, João Filho. Em cartaz, as garotas superpoderosas: a construção discursiva da adolescência feminina na revista Capricho. Fronteiras-Estudos Midiáticos, São Leopoldo, v. 7, p. 102–111, ago. 2006. p. 104. 43 BASSANEZI, Carla. Virando as páginas, revendo as mulheres: revistas femininas e relações homem-mulher. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996. p. 15.

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ciais. Ela pensa e age dentro de um mundo capitalista, no qual exerce influência e é influenciada.44 O consumo define seu estilo de vida, seus gostos e interesses. E o veículo de comunicação torna-se um amigo, um conselheiro e um formador de opinião dentro desse sistema. O Donna ZH, sendo um produto midiático, cujo principal objetivo é ser vendido (proporcionar lucro), busca apenas representar as ideias dessa ordem social e tenta entrar em consenso com os interesses femininos. Não quer provocar discussões e inquietações na mente de suas leitoras, quer manter o sistema tal como se apresenta: As revistas não só devem parecer justas e neutras como também precisam mostrar-se amigas das leitoras, dando-lhes uma sensação de bem-estar, correspondendo de certa forma aos seus interesses e inquietações, levando em conta suas expectativas.45

O Donna está atento a esta fatia do mercado, por esse motivo direciona sua linguagem e seu conteúdo às mulheres das classes A e B, de modo que sua narrativa apresenta-se ao público de forma atrativa, explorando o mundo das celebridades da moda atual e do consumo de um estilo de vida idealizado. Outra forma inteligente para cativar o público feminino baseia-se em textos de ótimos colunistas, sendo que boa parte deles consagrados pela crítica e pela opinião pública, como o caso de Veríssimo, Scliar e Martha Medeiros. Esse fator dá credibilidade ao caderno Donna e desperta o interesse de alguns perfis femininos mesmo aqueles, avessos a assuntos ditos mais banais. Sendo assim, ao ampliar o conteúdo de seus discursos, também amplia as possibilidades de identificação com diferentes nichos do mercado das publicações. Metodologia de pesquisa Esta pesquisa é classificada como qualitativa de caráter exploratório, tendo como objetivos descobrir o perfil dos leitores do caderno Donna

44 Vide FREIRE, João Filho, op. cit. 45 BASSANEZI, Carla, op. cit., p. 16.

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de Zero Hora. Para sua realização foi utilizado o método de coleta de dados através de entrevista em profundidade, que consistiu em entrevistas semi-estruturadas, diretas e pessoais em que um único respondente foi pesquisado de cada vez. Foram utilizadas amostras de consumidores classificadas como não-probabilísticas intencionais. Portanto, os resultados não são generalizáveis para todas as populações, porém dão uma visão ao pesquisador para que este destaque aspectos importantes para o esclarecimento do assunto em questão. Os leitores observados foram 34, porém apenas 24 pessoas são leitores do caderno Donna, com idade entre 18 a 55 anos. Estes foram convidados a participar da pesquisa através da marcação de entrevistas individuais, realizadas no local e data de maior conveniência para os pesquisadores e entrevistados. As entrevistas foram importantes para que se aprofundasse o conhecimento sobre quem é o leitor do caderno Donna, e se o mesmo possui uma identificação com as matérias apresentadas. Gênero feminino e cotidiano Sendo encartado no jornal Zero Hora de domingo como uma estratégia de marketing para mulheres, verificou-se um resultado satisfatório onde as mulheres dão total credibilidade as informações e anúncios expostos neste caderno. Traçando uma tipologia das mulheres que lêem esse caderno, podemos enquadrá-las como uma consumidora pessoal, pois os anúncios e matérias relatadas nesse caderno são de uso final do indivíduo, como por exemplo, os anúncios de estética. Este encarte afeta o comportamento da consumidora feminina, tal comportamento é relacionado ao processo de decisão de compra que possuem variáveis como socioculturais, psicológicas, individuais e situacionais.46 A família criada pela sociedade era aquela em que o marido saía para trazer sustento a casa e a mulher cuidava do lar, com as diversas tendências modernas, que afetam principalmente as mulheres esse papel de sair para trabalhar se dividiu nas famílias contemporâneas e isso trouxe

46 Vide SAMARA, Beatriz Santos; MORSCH, Marco Aurélio. Comportamento do consumidor: conceitos e casos. São Paulo: Pearson Education, 2005.

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um novo papel para a mulher na sociedade. Essa nova tendência de mulheres que trabalham e compram coisas para sua auto-estima, ou para sua sobrevivência, traz à tona esse modelo de encarte que estamos discutindo nesse artigo, pois através dele ocorre a decisão da compra ou a instigação pelo produto desejado pela mulher, seja ele uma roupa executiva ou até mesmo uma plástica. A mulher desse novo século se tornou mais forte e autoritária capaz de decidir o processo de seu comportamento de consumidora, as mulheres vêm assumindo a cada dia em seus trabalhos postos mais confiáveis no que faz seu rendimento financeiro aumentar e com isso ela decidir o processo de sua compra, através do caderno Donna onde é feito uma jogada até mesmo de diagramação nos deparamos com anúncios, matérias totalmente sugestivas para o consumo e isso torna a figura feminina de forma mais apelativa e rentável. O caderno Donna explora o universo feminino como um prazer que se torna um prazer mercadológico. Ainda de acordo com Samara e Morsch, o mundo da publicidade introduz o consumidor em um universo imaginário estabelecendo seus próprios valores estéticos a busca por uma beleza perfeita e isso faz com que as mulheres queiram se consumir, movida por esse impulso incontrolável à busca da perfeição. Essas questões nos refletem que o caderno Donna é colocado nesse veículo como uma forma de estratégia visual, mas também informativa que vem persuadir o publico feminino, não como uma necessidade de compra mas sim para satisfação de um desejo.

Pesquisa de satisfação Foram entrevistadas 34 pessoas, nas quais 24 são leitores do Caderno Donna, e 10 não são leitores do Caderno. Dentre essas pessoas que lêem 22 são do sexo feminino e 2 do sexo masculino, de diferentes classes sociais e cidades. As perguntas feitas foram: (1) (2) (3) (4)

Você tem acesso aos jornais? Quantas vezes por semana você lê jornal e em quais dias? Você lê Zero Hora no domingo? Você lê o caderno Donna?

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(5) Qual parte do caderno Donna lhe chama mais atenção? (6) Você se identifica com as reportagens de Donna? (7) Qual colunista de Donna chama mais sua atenção e por quê? (8) Quais assuntos deveriam ser abordados nas matérias do caderno Donna? (9) No espaço comercial do Donna, algum tipo de anúncio lhe chama mais atenção? (10) Você gosta do “visual” do Caderno Donna e da forma como é encartado no jornal Zero Hora? (11) Você prioriza a leitura do Donna ou prefere ler os outros cadernos da Zero Hora anteriormente? Quais? (12) O que você mudaria ou melhoraria no caderno Donna?

Perguntado qual é a parte que mais lhes chama a atenção no Caderno Donna, às respostas mais citada foram às crônicas de Martha Medeiros e matérias sobre moda, empatadas em primeiro lugar. Outras partes que foram citadas foi horóscopo, entrevistas, crônicas, e todos os assuntos da pauta. Além de ser uma das mais citadas na parte que o chama mais atenção aos leitores, Martha Medeiros, é a mais mencionada para colunistas preferidos do Caderno Donna, segundo as pessoas entrevistadas. Ela se destaca, pois seu texto é atual e interessante, escreve sobre o dia a dia, traz leveza e simplicidade na leitura: Com toda a certeza Martha Medeiros, já que aborda fatos do cotidiano, analisando-os de forma clara e objetiva, sempre com uma opinião forte e atual. André, 25 anos.

Na pergunta, você se identifica com as reportagens do Caderno Donna, metade das pessoas entrevistadas disseram que sim, se identificam, principalmente quando o assunto é moda. Uma parte falou que às vezes, outros disseram que nunca se identificam: Me identifico, pois gosto de saber sobe moda, tendências, essas coisas. E o caderno Donna sempre mostra esse tipo de matéria. Adriana, 21 anos. Não me identifico, porém gosto de ler, porque são assuntos bem atuais. Acho as matérias bem interessantes, mesmo não me identificando com o estilo. Marli, 43 anos.

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Dentre os assuntos que deveriam ser abordados no Donna, ficou em primeiro lugar: a saúde da mulher, vindo em seguida, etiqueta no dia a dia, conforto para os pés (sapatos), moda para todas as ocasiões, festas, atualidades, família e educação dos filhos, consumismo em geral, crônicas sobre comportamento e relacionamento interpessoais, direitos da mulher (como a aposentadoria), assuntos voltados aos homens, matérias sobre maternidade, papel feminino no dia de hoje e o que já foi moda antigamente: Além das tendências de roupas pra próxima estação e o que está na moda. De repente colocar o que já foi moda antigamente, e artistas vestindo roupas da moda antiga e comparando com a moda atual. Camile, 21 anos. “Gostaria que tivesse matérias que sobre saúde, principalmente se tratando da saúde da mulher.” Marli, 43 anos.

Ao serem questionados qual anúncio da parte comercial chama mais a sua atenção, 13 das 24 pessoas entrevistadas, responderam que nenhum anúncio lhes chama a atenção, o restante respondeu estética, salão de beleza, anúncios relacionados à moda, produtos cosméticos, saúde, cirurgia plástica, lojas em geral, beleza: Tem uma página que acho que tem vários anúncios pequenininhos. Eu, particularmente, não gosto. Mas sei que a maioria é de mega hair. Camile, 21 anos. Não me chamam a atenção. Elisa, 46 anos.

A maioria que respondeu a entrevista gosta do “visual” do Caderno Donna e da forma como é encartado no jornal Zero Hora. Para alguns dos entrevistados o visual do Donna é colorido e atraente sem deixar de ser claro e limpo: Sim, gosto muito, ele é bem colorido e atraente. É muito bem elaborado. Adriana, 21 anos. Sim, é próprio para o seu conteúdo. Camila, 19 anos.

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Indagados se priorizam o Caderno Donna, ou se preferem ler os outros cadernos da Zero Hora anteriormente, a maioria respondeu que não prioriza o Donna, que preferem ler primeiramente outros cadernos como, por exemplo: classificados, caderno da TV, notícias, esportes, show, ou seguem a seqüência da Zero Hora. Porém outros dão prioridade ao Donna: Prefiro ler cadernos de empregos e oportunidades, imóveis, e veículos, e caderno principal primeiro, depois o caderno Donna. Adriana Fonto’. Sempre leio primeiro o caderno normal, o de notícias. Mas o Donna é minha preferência de segunda leitura e o TV+Show de terceira. Camile, 21 anos.

Por fim, quando perguntado o que você mudaria ou melhoraria no caderno, muitas respostas foram “nada”, pois gostam da forma como Donna é encartado. Mas muitos sugeriram melhorias, como mudar o formato na parte das entrevistas; colocar mais informações sobre celebridades e atualidades; inserir mais humor; abordar assuntos mais relevantes e interessantes; diminuir a publicidade; ter mais assuntos para diversas classes sociais; melhorar a coluna da Célia Ribeiro, pois suas perguntas são boçais; colocar mais matérias sobre educação; dar mais destaque para as matérias e crônicas; tornar o caderno mais amplo e abrangente; fazer o caderno Donna durante a semana, e não só aos domingos; colocar mais matérias sobre saúde; trazer matérias ditando a moda antiga; desvincular-se da imagem fútil; criar uma ponte entre o leitor e o Donna: Mesmo havendo um espaço de cinema e literatura no TV+show, acho que haveria como acrescentar tais temas de forma original ao Donna. E também deveria criar-se uma ponte entre o leitor e Donna, mas teria de ser algo que não caia no popularesco. Algo onde se prioriza talentos ainda não descobertos que não tiveram a oportunidade, nem espaço de expor seu “dom”, tais como publicações de crônicas de leitores (diamantes brutos). André, 25 anos. Gostaria que publicassem o Caderno Donna durante a semana também. Patrícia, 27 anos. Muita coisa, primeiro daria alegria ao caderno, e teria que transformar em algo interessante, e não tão sério com assuntos chatos, como sapatos, bolsas, etc. Daiana, 20 anos.

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Considerações finais Embora o grupo RBS tente criar um espaço para o “universo feminino” dentro do seu jornal, é impossível não perceber a criação e divulgação de um estereótipo, como acontece em algumas outras publicações, especialmente revistas destinadas ao público feminino. É importante para todo veículo de comunicação estar atento ao que acontece na sociedade, tendências, desde moda até o mercado de trabalho e o Caderno Donna acaba tentando fazer isso em alguns momentos mas acaba nem sempre conseguindo e entrando na velha máxima de que a mulher se interessa meramente por moda, estética, culinária e “fofocas”. Na verdade, o papel da mulher vem mudando na sociedade desde a década passada e especialmente a partir da virada do século, então, não é o bastante oferecer apenas o “pão e circo” por assim dizer, pois isso acaba sendo pouco para o crescimento da mulher tanto como chefe de muitas famílias como na quebra de diversos tabus e criando espaço em “mundos” que eram exclusivamente masculinos, consequentemente é importante oferecer algum diferencial para esta nova mulher, senão há o risco de perder sua atenção e fidelidade à publicação. Algo perceptível é que boa parte das leitoras do Caderno Donna lêem o jornal por causa dos colunistas, especialmente por causa da colunista Martha Medeiros, que, como visto no artigo, atrai até mesmo leitores do sexo masculino, que claramente não é a proposta do jornal, porém, por ser uma colunista bastante conhecida, atrai diversos públicos diferentes, desde gênero até faixa etária. Além disso, como visto na pesquisa, as leitora acham que o caderno deveria ter menos publicidade, que é excessivamente explorada no caderno, e todos os anúncios incentivam e pregam o estereótipo da mulher que se preocupa com a beleza , pois a imensa maioria dos anúncios são de estéticas, clínicas de emagrecimento, cabelereiros, e uma grande quantidade de cirurgiões plásticos, algo que não é muito comum de vermos nos jornais, porém, como este caderno é dedicado às “pacientes”, acabaram surgindo os anúncios. Mais uma razão para tais anúncios é justamente o fato de o jornal Zero Hora ser dedicado a um público mais elitizado, portanto, leitores que teriam a condição de uma cirurgia plástica ou mesmo outras opções extravagantes que podem ser vistas nos anúncios publicitá-

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rios do caderno. Ao longo do artigo procuramos estudar a relação entre o Caderno Donna com o público feminino, e, com as entrevistas pudemos chegar a uma série de conclusões, talvez até o próprio grupo RBS devesse fazer uma pesquisa nesse sentido, pois é praticamente o único grupo de comunicação que tem um caderno dedicado à esse público, então, se conseguir estruturar melhor o jornal, trazer exatamente o que as leitoras querem, a tendência é de contentamento total, tanto dos profissionais do jornal, quanto das leitoras, caso contrário, pode abrir um leque de possibilidades para concorrentes e ver sua supremacia abalada, supremacia essa que, com certeza durará por muito tempo. Referências BASSANEZI, Carla. Virando as páginas, revendo as mulheres: revistas femininas e relações homem-mulher. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996. FREIRE, João Fi FREIRE, João Filho. Em cartaz, as garotas superpoderosas: a construção discursiva da adolescência feminina na revista Capricho. Fronteiras-Estudos Midiáticos, São Leopoldo, v. 7, p. 102–111, ago. 2006. SAMARA, Beatriz Santos; MORSCH, Marco Aurélio. Comportamento do consumidor: conceitos e casos. São Paulo: Pearson, 2005.

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Rádio e propaganda no Brasil: panorama e perspectivas

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Rádio e propaganda no Brasil: panorama e perspectivas Felipe Saft Eugênio47* Natália de Negri48** Pablo Quintana49*** Tiago da Silva50**** Introdução Configurando-se como uma mídia de baixo custo e grande alcance, o rádio é um dos mais populares meios de comunicação no Brasil. Desde seu surgimento, a característica que mais chama atenção é sua portabilidade, que em comparação a outros meios – como TV ou internet –, permite ao ouvinte executar diversas tarefas conjuntamente, desde dirigir até afazeres domésticos. No decorrer dos anos, as empresas aprenderam a incrementar as campanhas de divulgação dos produtos radiofônicos. O próprio objeto rádio, que no seu início era enorme, e exigia estar próximo ao aparelho para usufruí-lo, evoluiu. Na década de 1970, a japonesa Sony Corporation lançou o pressman, um gravador semi-portátil que abriu caminho para o walkman. Na contemporaneidade, o walkman já é visto como um eletrônico ultrapassado, sendo que existe uma imensa variedade de aparelhos que tocam formatos digitais, como o mp3, mp4, além dos próprios telefones celulares. No que diz respeito aos formatos da propaganda, os meios de divulgação no rádio são diversos. Inicialmente chamados de reclames, eram lidos pelo próprio locutor. Depois passaram a ser gravados, ganhando melodias e efeitos sonoros. Os mais conhecidos

47 * Graduando em Ciências da Comunicação com habilitação em Publicidade e Propaganda na Unisinos. E-mail: . 48 ** Graduanda em Ciências da Comunicação com habilitação em Publicidade e Propaganda na Unisinos. E-mail: . 49 *** Graduando em Ciências da Comunicação com habilitação em Publicidade e Propaganda na Unisinos. E-mail: . 50 **** Graduando em Ciências da Comunicação com habilitação em Jornalismo na Unisinos. E-mail: .

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e utilizados hoje são o jingle e o spot. Este último trata-se de uma mensagem de fácil memorização, aliada a uma melodia, sendo o formato mais conhecido e o mais fácil de ser lembrado. O presente trabalho busca pormenorizar o horário, o tempo e o que as pessoas fazem enquanto ouvem um programa radiofônico. Para delimitar a pesquisa, os entrevistados são estudantes de Comunicação Social da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), no turno da noite. Nesta direção, este estudo objetiva definir que tipo de propaganda e produto deve ser anunciado em determinado horário, a fim de melhor atingir os ouvintes. E onde o rádio se enquadra perante a evolução tecnológica contemporânea? O rádio acabará? Qual será o seu futuro e de sua publicidade? Evolução e desenvolvimento Uma publicação da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT), no início dos anos 1990, elucida que a radiodifusão é a primeira invenção humana a realizar o milagre da presença à distância, a qualquer distância. No Brasil, o rádio nasceu oficialmente no dia sete de setembro de 1922, como parte das comemorações do centenário da Independência. O discurso do então presidente da República, Epitácio Pessoa, foi ouvido no Rio de Janeiro e também nas cidades de Niterói, Petrópolis e São Paulo, graças à instalação de uma retransmissora e de aparelhos de recepção.51 Já na década de 50 chega o transistor, que livrou o aparelho de fios e tomadas, proporcionando a criação de uma nova linguagem, apropriada para um veículo com alta mobilidade, que acompanha o ouvinte onde quer que ele esteja. Nos anos 60, com a Rádio Excelsior, em São Paulo, com o início da programação musical, começam a operar as primeiras FMs como “música ambiente”. Somente na década de 70, elas se tornam canais abertos voltados exclusivamente para programação musical. Devido à expansão e ao conteúdo da radiodifusão sonora, o Governo mostra sua preocupação criando, em 1976, a Radiobrás – Empresa Brasileira de Radiodifusão, para

51 PRATA, Nair. Tecnologia, um divisor de águas na história do rádio. In: V Congresso Nacional de História da Mídia, 2007, São Paulo.

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“organizar emissoras, operá-las e explorar os serviços de radiodifusão do Governo Federal”. Um divisor de águas para a história do rádio foi a criação de um aparelho que revolucionou a maneira de escutar música no mundo. Em 1977 a Sony tinha lançado o Pressman, um pequeno gravador portátil mono-oral direcionado a utilizações jornalísticas. Devido às suas reduzidas dimensões, não era possível incorporar componentes do som estereofônico no aparelho. Devido a isso, sua qualidade sonora nunca conseguiu atingir os elevados padrões de exigência dos técnicos da empresa. A combinação do leitor de cassetes sem capacidade de gravação com os fones de ouvido deu origem a um novo produto, que permitia a uma só pessoa ouvir som de alta qualidade. A noção de música individualizada contrariava os hábitos de audição da época e não era claro que o mercado estivesse receptivo a um produto tão diferente. A estratégia de marketing persistia em posicionar o aparelho para o segmento dos jovens e adolescentes, o que implicava estabelecer um baixo preço de venda. Só que a produção do protótipo era muito dispendiosa. Para tornar o walkman acessível ao segmento-alvo foi ainda decidido simplificar o seu design e manter as despesas promocionais sob controle, visando reduzir os custos de fabricação e comerciais. A data de lançamento foi 1º de Julho de 1979. Após o sucesso do walkman, a Sony continuou inovando, introduziu constantemente novos conceitos nos mercados globais: câmaras de vídeo de pequena dimensão, o digital áudio tape (DAT), o compact disc (CD), o minidisc, o digital vídeo disc (DVD) e, mais recentemente, um leitor de músicas gravadas em MP3 a partir de downloads gratuitos na web chamado de RIO. Não obstante, dentre todas as inovações da Sony, a que mais alcançou êxito junto ao consumidor final, em escala mundial, foi o popular walkman. Em 1987, o Institut Integrierte Schaltungen, da Alemanha, juntamente com a Universidade de Erlangen, começou a trabalhar numa codificação perceptual de áudio para Digital Audio Broadcasting, ou seja, transmissão digital de áudio. Todo o trabalho resultou num algoritmo de compressão de áudio chamado MPEG Audio Layer-3, que, tempos depois, passa a ser popularmente conhecido como mp3. Um dos objetivos da criação deste formato era conseguir reprodu-

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zir áudio com qualidade de CD, somado a uma taxa de compressão razoável. Para gravar um CD, a taxa de gravação (bit rate) é de cerca de 1,4 megabit por segundo. Em MPEG Audio Layer I e II, estes valores passam a ser de 348 KB/s e 256-192 KB/s respectivamente. O MP3 conseguiu abaixar a taxa para 128 e 112 KB/s. Frente a isso, a qualidade sonora foi mantida quase que totalmente, algo que só possível graças às técnicas de codificação perceptual, que não se trata de uma simples compressão de dados, mas sim de um método que consiste em utilizar somente as freqüências sonoras que são captadas pelo ouvido humano. Uma vez que um padrão de freqüência tenha sido definido para a audição humana, as demais freqüências – que não são captadas pelo homem – podem ser descartadas, já que não há razão para gastar espaço ao armazenar esses dados. No final dos anos 90, o norte-americano Shawn Fanning desenvolveu o Napster, um software que permitia aos internautas o compartilhamento de arquivos mp3 pela internet. O programa facilitou a tarefa de encontrar e baixar áudio pela rede, possibilitando que o usuário formasse seu próprio acervo de música digital. A tecnologia utilizada pelo Napster não armazenava nada em seus servidores, apenas um index (índice), necessário para a busca de canções. Uma vez que a música desejada tenha sido localizada, o download passa a ser feito a partir dos computadores de usuários do próprio serviço, que tenham a referida música armazenada em seu computador. Esta tecnologia transformava cada computador cadastrado em cliente e servidor. Como o Napster proporcionou uma enorme facilidade para encontrar arquivos mp3, o serviço logo se consagrou entre os usuários da internet. Prejudicada, a indústria fonográfica iniciou uma série de disputas judiciais contra o Napster. A banda norte-americana de heavy metal Metallica, inclusive, com ações lideradas pelo baterista do grupo, Lars Ulrich, entrou com processos contra o serviço, assim como o cantor de rap Dr. Dre. Após diversas batalhas judiciais – com o Napster sempre derrotado –, a empresa teve que retirar de seu índice todas as canções protegidas por direitos autorais, ação que praticamente tirou o serviço de funcionamento.52 As novas tecnologias promoveram uma verdadeira revolução na ra-

52 ALECRIM, Emerson. MP3: o que é e como surgiu? Infowester, São Paulo, ago. 2009. Disponível em: . Acesso em: 7 ago. 2009.

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diofonia. A principal delas é a digitalização, tanto no âmbito da produção quanto da transmissão e recepção. No mundo inteiro há uma intensa movimentação em torno do rádio digital e das novidades que a nova tecnologia traz consigo. Questões como linguagem, preço do aparelho receptor, readequação do trabalho do jornalista, novos gêneros digitais e novas formas de interação com o público, entre muitas outras, são debatidas pela sociedade, especialmente pelos profissionais de comunicação. O advento da internet faz surgir uma nova forma de radiofonia, onde o usuário não apenas ouve as mensagens transmitidas, mas também as encontra em textos, vídeos, fotografias, desenhos e hipertextos. A web, na realidade, provocou uma gigantesca transformação nos sistemas de troca de informações conhecido até agora. Segundo Silva, a última década do século XX caracteriza-se como a chamada geração virtual, quando acontece uma revolução no mundo da informação, com o surgimento da comunicação mediada por computador, ou via internet. De acordo com o autor, “na era da globalização a tecnologia destrói barreiras de tempo e distância, e torna possível a troca de informações entre pessoas por meio de redes de computador, informações essas que variam desde textos verbais até vídeos”.53 Neste sentido, com a web, surge uma nova modalidade de discurso, o chamado discurso eletrônico. Souza também explica que o discurso eletrônico pode assumir formas que guardam extrema semelhança com o discurso oral, “sendo, portanto uma modalidade de uso da linguagem que freqüentemente escapa a um enquadramento que se sustente em noções convencionais sobre a escrita e a oralidade”.54 Poder escutar uma música a qualquer hora e em qualquer lugar é algo que o homem descobriu ser prazeroso ainda na década de 1960, quando apareceram os primeiros aparelhos de rádio AM de pequena dimensão. Os produtos, que aumentaram sua popularidade na década seguinte, antecipavam o verdadeiro responsável pela primeira febre da música portá-

53 SILVA, Renato Caixeta da. Discutindo a interação em sala de aula via internet: análise de interações por correio eletrônico. In: PAIVA, Vera Lúcia Menezes de (Org.). Interação e aprendizagem em ambiente virtual. Belo Horizonte: UFMG. 2001. p. 207-229. p. 214. 54 Vide PAIVA, Vera Lúcia Menezes de (Org.). Interação e aprendizagem em ambiente virtual. Belo Horizonte: UFMG. 2001.

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til, o walkman. Os aparelhos walkman ficaram populares a partir de 1981, momento em que demais fabricantes lançaram seus produtos para a nova categoria de eletrônicos. Alguns exemplos são o stereo salky, da Toshiba, e o stereo-to-go, da Panasonic. A partir de então apareceram os hits, como WM-2 da Sony, que vendeu cerca de 2,8 milhões de unidades. Novas características também iam sendo adicionadas, como capacidade de gravar cassetes, ouvir rádio, converter o sentido de execução sem precisar virar a fita. Surgiram acessórios, como alto-falantes, adaptadores para conexão de dois pares de fones, bem como fones sem fio. Os sinais do fim da era Walkman só começaram a aparecer na segunda metade da década de 80, quando uma nova mídia, o CD, surgiu, colocando a fita cassete entre as quinquilharias do porão. Os questionamentos sobre os danos que a sensação eletrônica da década de 80 poderia causar também se tornaram freqüentes. O Walkman poderia causar acidentes de trânsito? Ou o atropelamento de pedestres distraídos? Algum tipo de dano cerebral? Enclausuramento do indivíduo? As respostas não apareceram com precisão, mas as vendas do dispositivo só aumentavam. Publicidade radiofônica O rádio é um dos meios de comunicação mais populares no Brasil, seja por seu baixo custo ou pela portabilidade, sendo muito utilizado por empresas para fazer publicidade. São várias as formas de propaganda no rádio, entre elas: (a) spot advertising, que é uma mensagem informativa locutada, acompanhada ou não por efeitos sonoros; (b) sketch, mensagem dramatizada como no teatro, que causa nos ouvintes a sensação de já estarem utilizando o produto; (c) vinheta, peça de dois a quatro segundos que tem a intenção de sinalizar o nome do anunciante; (d) texto foguete, que conta com locução do próprio apresentador do programa, sem gravações; e (d) jingle, peça musical que facilita e estimula a retenção da mensagem pelo ouvinte.55 Existem mais formatos em outros países, no entanto, como não há uma classificação formal, nem muitas pesquisas sobre a publicidade em rá-

55 GOMES JUNIOR, José. A publicidade no rádio: origem e evolução. In: Intercom – Sociedade Brasileira de estudos interdisciplinares de Comunicação, 2000, São Paulo, Anais Eletrônicos... São Paulo: USP, 2000. Disponível em: . Acesso em: 22 jun. 2009.

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dio, fica impossível uma padronização. Nesta direção, é o jingle, popular forma de propaganda cantada, com melodia simples e refrão forte, a mais fácil de ser memorizada. Com o tempo, o jingle sofreu alterações, acompanhando a evolução do rádio e mudanças políticas e tecnológicas. No ano de 1931 os chamados reclames foram autorizados no Brasil, para garantir a sobrevivência do rádio. Nessa década, o preço dos aparelhos de rádio baixou drasticamente, o que fez com que o veículo caísse nas graças do povo. Quanto a seu formato, o jingle se caracteriza por uma mensagem de venda, musicada com melodia, de forma que o ouvinte memorize com facilidade. Pode ser de 15, 30, 45 e 60 segundos. A tarefa de criar uma melodia para um texto publicitário que seja fácil de cantar e memorizar não é tão fácil ou simples. O processo de criação do jingle divide-se em: (a) criação, que é a definição de estilo, duração, linguagem e mensagem a ser transmitida; e (b) letra e música, surgidos no briefing, com arranjo, interpretação e locução. Por lei, o jingle está autorizado a ser veiculado no período de seis meses. Após este prazo, a produtora deve receber 501% do valor pago a cada seis meses para continuar a veiculação. O jingle é uma ferramenta de marketing com custos elevados e um retorno que pode demorar a chegar, mas que pode durar anos. Há jingles marcantes, inesquecíveis, que mesmo tendo sido veiculados em nossa infância, lembramos até hoje, sendo que a evolução do jingle acompanhou a do rádio. Podemos perceber, então, que a evolução das propagandas acompanhou a evolução do rádio e foi altamente influenciada pelo contexto social da época. No início, apenas grandes anunciantes tinham acesso aos jingles, já que era uma ferramenta muito cara. Hoje em dia, com a modernização da tecnologia, ficou bem mais acessível essa forma de publicidade que, quando bem feita, tem ótimos resultados. Prova disso são os jingles que nunca esquecemos, que lembramos da época de nossa infância, e perpetuam a marca. Recepção Dentre as pesquisas que trabalham com rádio, um dos métodos de pesquisa é a pesquisa de recepção radiofônica. O objetivo dessa pesquisa costuma ser sobre uma abordagem sócio-cultural, entendida como uma visão ampla e complexa sobre o processo de recepção de produtos midi-

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áticos, neste caso, a programação radiofônica, levando em consideração, várias relações sociais e culturais. Os trabalhos de recepção têm uma função muito maior em problematizar e pesquisar, em um ponto de vista teórico ou empírico, a sua inserção social e cultural, do que simplesmente o fenômeno da recepção. Segundo Jacks e Franke, as pesquisas de abordagem sociocultural podem ter duas tendências teórico-metodológicas: a Hermenêutica de Profundidade de Thompson e os Estudos Culturais, na vertente latino-americana, onde os principais autores são Martín-Barbero, García Canclini e Orozco Gómez. O rádio é pensado como um meio essencialmente prático, barato e abrangente, tanto do ponto de vista do emissor como do receptor, o que lhe atribui um caráter democrático. A pluralidade do rádio é diretamente dependente de sua popularidade, pois para ser plural é necessário atingir tantos os públicos organizados como os não organizados. Desde seus primórdios, caracterizou-se como um fenômeno essencialmente popular. Para a pesquisa de recepção, o processo de comunicação não é mais visto como um fenômeno de mão única como propunham as teorias funcionalistas e críticas, e sim como um processo de mão dupla e complexo, pois há expressão e produção de sentido tanto do lado dos emissores quanto dos receptores. A compreensão do processo de comunicação só é possível por meio de uma aproximação com o cotidiano e com a realidade social e histórica dos receptores, pois é no dia-a-dia que revelam às mediações culturais que dão significado a recepção. Nesta direção, realizou-se uma pesquisa, que consistiu em entrevistar estudantes de Comunicação Social da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). Escolhemos entrevistar apenas esse grupo para dar um foco a pesquisa. Ela foi formada pelos seguintes dados: (a) idade; (b) ouvinte de rádio; (c) freqüência selecionada (AM ou FM); (d) horário e tempo da recepção; e (e) atividade realizada enquanto ouve rádio. Frente às respostas, descobrira-se que rádios FM possuem um público maior, de 75%, contra os 25% da freqüência AM. Quanto ao que fazem enquanto ouvem rádio, etade dos entrevistados escutam rádio no carro ou ônibus, metrô, enquanto estão no trânsito. Os que escutam rádio enquanto estudam ou trabalham compreendem 30% do total. Como escutam rádio enquanto estão no trânsito, o horário mais

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freqüente é entre 7:00 e 8:00, 11:30 e 13:00, 18:00 e 19:30 e 22:00 e 23:00h. Nesses horários estão dirigindo ou em algum transporte, portanto, da mesma forma que o rádio os diverte, eles não direcionam toda a sua atenção para ele. Assim, as propagandas precisam ser diretas, claras e objetivas. De preferência de fácil memorização. A repetição é uma das formas de se “gravar a marca na mente dos ouvintes”. Então, as propagandas podem ser programadas para repetir em determinados horários. Esse é o mesmo sentido do jingle: melodia e letra fácil de serem memorizadas. Dividindo estrategicamente as propagandas em horários pré-estabelecidos, e repetindo elas semanal ou diariamente, se consegue disseminá-las. Futuro do rádio Este tópico não tem a pretensão de constituir um exercício de futurologia, mas apenas discutir algumas tendências que vão ficando evidentes, mas que, por vezes, não são apreciadas na correria do dia a dia. Embora constituam uma discussão muito interessante para os profissionais de comunicação, sobretudo para aqueles que têm consciência que o fazer prático deve se alimentar da teoria. Torna-se ainda mais relevante à medida que o rádio é uma área que ainda é marcada pela ausência de publicações. Tem por base o livro Desafios do Rádio, uma coletânea de pequenos estudos realizados por pesquisadores do Grupo de Trabalho de Rádio da Intercom, agora chamado Núcleo de Pesquisa Mídia Sonora (NPMS). Atualmente a revolução da informática e digitalização dos mais diversos tipos de informação - voz, dados, som, textos, imagens, vídeos, animações, abrem caminho para a convergência dos meios de comunicação. Nesse contexto, o rádio terá de se atualizar tanto em seus processos de produção de conteúdo quanto em seus sistemas de transmissão e recepção, diante da implantação do sistema de transmissão digital e interface com a internet e outras mídias sem fio. O veículo rádio precisa se reciclar e se rejuvenescer. O rádio precisa preocupar-se em renovar os seus ouvintes, pois, quando a audiência não se renova, é inevitável que decaia. Não se pode viver para sempre de um público formado hoje, porque os ouvintes não são eternos. Pode-se sobreviver com saudosistas durante certo tempo,

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mas a audiência do rádio desapareceria se o hábito não fosse passado para as gerações sucessoras. E para que as novas gerações tenham interesse, o rádio necessita ser revitalizado. Terá de oferecer programação ainda mais segmentada e especializada. Mesmo com a chegada da TV e da internet, o rádio provou que pode sobreviver atuando no imaginário do ouvinte e explorando sua capacidade de abstração, de formação de imagens mentais. Porém, é preciso ter cuidado, porque a velocidade na veiculação de uma notícia e a qualidade na mesma nem sempre andam juntas. Todo momento de transição traz consigo uma série de incertezas. A pesquisa de audiência no Brasil é historicamente falha por não levar em consideração dois ambientes: o carro e o trabalho. Baseia-se em hábitos domiciliares. O rádio digital com qualidade som de CD, tanto para recepção móvel quanto fixa, pode trazer mais valorização na percepção dos anunciantes e do público, principalmente o das emissoras FM. Em 1999 as fabricantes americanas de carros, Ford e General Motors anunciaram investimentos na criação de automóveis com rádios capazes de captar mais de 100 canais de música com qualidade digital, em tempo integral, sem comerciais ou notícias, por meio de um sinal de satélite com cobertura para todas as regiões dos Estados unidos.56 Segundo Del Bianco, no futuro o projeto é utilizar a conexão via satélite pra transmitir dados e outras opções aos consumidores, que pagarão pelo serviço, como acontece com as emissoras de TV a cabo. Para a autora, no ambiente de rádio digital projetado para o início do próximo século, a audiência será capaz de ler mensagens em tela de cristal líquido, ver imagens fixas e ouvir áudio com qualidade de CD. O rádio precisará ser reinventado pelo desaparecimento da audiência massiva e dar lugar a uma muito mais segmentada que agora. Há ainda o problema da queda da fidelidade da audiência a uma emissora. Haverá integração com outras plataformas de mídia pra distribuição de informação - organizadores pessoais, telefones móveis, leitores eletrônicos e a internet. Há também o problema das rádios sem comerciais: os anunciantes historicamente sustentavam o meio; como se fará agora sem eles?

56 Vide DEL BIANCO, Nélia; MOREIRA, Sônia V. (Orgs.). Rádio no Brasil: tendências e perspectivas. Rio de Janeiro: UERJ, 1999.

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O sistema Eureka147 DAB, fruto de pesquisas franco-alemãs, oferece canais pay-per-listen, e também listen on-demand, como nas televisões a cabo ou com recepção direta por satélite. O ouvinte, mediante pagamento pelo serviço, pode optar por uma programação especial ou um canal específico, sem interferência de comerciais. Aí se resolve a questão financeira: sem comerciais não há anunciantes, mas quem precisa de anunciantes se o canal é pago e o custo de produção, em comparação com uma rádio analógica, é bem reduzido? O rádio, para se tornar mais competitivo, oferecerá uma série de serviços adicionais. Os receptores de sinal digital, fortemente difundidos pela Europa, vêm com uma antena tipo chicote para captar o sinal digital e uma tela pequena pra a exibição de dados - informação visual - mapas meteorológicos, mapas da cidade, etc. Como possuem um computador incorporado, conseguem exibir na tela o nome da estação. Não se sabe se continuará sendo chamado de rádio um veículo que junta som com imagem em movimento, textos, gráficos, etc. Pode se mover o texto que surge na tela para cima e para baixo com um botão, e ver detalhes sobre a programação da rádio. Se o radiodifusor permitir, também serão informados através da tela, dados como nome dos autores das músicas, intérpretes, título e até letra. Até os comerciais poderão ser textos escritos, anúncios como em jornal e com os telefones para contato em exibição. Estando aí, a solução para o problema da publicidade. Ainda não há certeza se a mudança do sinal analógico para o digital aumentará a audiência a curto prazo, e menos ainda no que diz respeito ao faturamento. O que gera uma insegurança e hesitação das emissoras. E como ainda não há tradição por parte dos consumidores/audiência nesses novos aparelhos digitais em desenvolvimento, a população terá de ser treinada para utilizá-los. A própria linguagem terá de passar por revisões e reinvenções, porque a informação não poderá mais ser produzida apenas para ser falada, mas também para ser lida nas telas de cristal líquido. Nesse caso, teremos de parar para ler o conteúdo do rádio. Os automóveis, antes terreno quase que exclusivo do rádio, já está sendo dividido e quase que cedido para os CD-players. O rótulo de mídia de massa dá lugar à mídia segmentada,

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um serviço com destinatário definido, buscando também anunciantes adequados a estes ouvintes específicos. A princípio, pensando racionalmente, esse corte na audiência, esse afunilamento, não deve preocupar os anunciantes, já que fará o meio ir de encontro ao seu público-alvo “puro”. Uma das razões para o mimetismo existente entre os anunciantes e as novas mídias é o fato de que aqueles pensam que vale mais a pena anunciar em veículos cujo poder aquisitivo pessoal da audiência é mais elevado. Ora, pessoas com esse rendimento tão elevado a ponto de poderem estar na vanguarda da compra dos produtos de tecnologia de ponta, devem ter também receita para investir mais. Voltando a ser um bem “elitista” novamente, da “moda”, o rádio, além de oferecer informações diferenciadas, músicas com qualidade de CD, deve reconquistar esses anunciantes. Apesar de assumir uma cobertura global, espera-se que o conteúdo do rádio não perca a sua característica dinâmica, responsável pelo seu sucesso. Nenhum outro meio nunca havia dado tanta importância aos buracos da sua rua como o rádio fez, isto é, nenhuma mídia nunca tinha se aproximado tanto da sua audiência e feito uma cobertura de fatos tão pertinente a ela, tão do seu interesse e criado, assim, tanta empatia. Sempre ouve a interatividade, desde que havia como alguém ligar para os estúdios das emissoras. Mas agora essa possibilidade foi potencializada pelos avanços tecnológicos, trazendo mais instantaneidade. Mas ao mesmo tempo que a implementação de telas de cristal líquido dá um up grade no rádio, também o afasta da proposta de “distrair na medida certa”, razão do sucesso do meio. Ouvir rádio enquanto se dirige não é proibido porque ao fazê-lo o motorista não perde o foco no trânsito. Mas como será quando além de informações sonoras, o motorista dispor também de informações visuais na tela? Isso não irá atrapalhá-lo? Logo a qualidade de som não será mais diferencial entre AM’s e FM’s. Talvez as rádios agora, a exemplo do que fizeram as revistas, passem a se segmentar por assunto, faixa etária e região. Os novos sistemas vão transmitir programação digital por meio de satélites em órbita no espaço diretamente para o carro. Na terra, satélites, darão suporte à transmissão do sinal, para que prédios e acidentes no terreno não acabem por interferir nas transmissões.

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Como se pode verificar também na televisão, cada vez mais as pessoas querem participar, querem tomar decisões e até aparecer. No Fantástico, por exemplo, existem pelo menos cinco ocasiões durante o programa em que são exibidos vídeos enviados pelos telespectadores. Parece que a tendência da web 2.0 incidiu também sobre a televisão. E com o rádio não é diferente. Felizmente as novas tecnologias potencializam essa participação por parte dos ouvintes. As novas tecnologias não irão devorar o rádio, é o rádio que irá englobá-las, assimilar suas características mais convenientes e se fortalecer com isso. Divulgação através de afiliadas, e a proximidade, estreita vinculação? Como fazer para que o perfil dos ouvintes continue local, ainda que com uma inserção global? Como fazer para que a proximidade, o grande trunfo do rádio, não se perca? Ao mesmo tempo, o saudosismo é aliado, pois se sou gaúcho e estou em viagem ao Japão, posso acompanhar de lá a transmissão de um Gre-nal. Os anunciantes ficam receosos, também, em virtude de não disporem de dados confiáveis sobre a audiência e perfil dos consumidores. Mas é uma questão de tempo até que seja desenvolvido um método eficiente de apurar essas informações. Existe ainda o problema técnico ligado à baixa velocidade de acesso à rede. O rádio depois de seus áureos tempos nos anos 50 e 60 busca novamente uma identidade. Considerações finais O rádio é, então, o meio de comunicação mais abrangente do Brasil. Suas vantagens em relação aos outros veículos de comunicação são: seu preço acessível, não exigir habilidades especiais, como saber ler, por exemplo, e seu grande diferencial é a sua portabilidade. Para a publicidade são características que interessam muito. No início do rádio no Brasil, quando só existiam os aparelhos enormes e que ficaram fixos em algum local, apesar de não ser ainda utilizado para publicidade, ele era como a televisão, porém com menor importância. A televisão tem seu diferencial pelas imagens, não exigindo saber ler, como jornais e revistas, estimulando basicamente a visão. Já o rádio não possui esses elementos visuais, apenas a voz, por isso precisou desenvolver uma linguagem que fosse acessível a todos, além de uma publicidade que atingisse aos ouvintes, tanto quanto a viabilizada por outros meios.

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Passou, então, a desenvolver anúncios que passassem a fazer parte do dia-a-dia dos ouvintes, de alguma maneira. Usando a criatividade, dos enfadonhos reclames surgiram os primeiros jingles, muitos que lembramos da época de nossa infância. São aquelas “musiquinhas” engraçadas e fáceis de memorizar que você escuta nos intervalos entre os blocos musicais, nas FMs, ou então no intervalo do jogo de futebol, nas AMs. Fazer propaganda em rádio hoje em dia é bem mais acessível financeiramente. E, quando bem feito, tem duração ilimitada. Já na área de recepção, concluiu-se que o rádio é um processo de mão dupla, que tanto emite quanto recebe informações. Hoje já é possível ao ouvinte interagir com o rádio, alterando a programação, participando de promoções, expressando a sua opinião, etc. O Rádio, além de ser dividido em AM e FM, ainda é subdividido. Podemos encontrar diversas classificações somente entre as FMs devido ao estilo musical que reproduzem. Cada estação tem as suas características e seus anunciantes específicos. Com isso, o rádio tornou-se mais próximo de seu público, adaptando-se aos gostos de seus ouvintes. Essa será a solução para que o rádio acompanhe essa evolução tecnológica: segmentar e especializar-se. O rádio precisa se reciclar, rejuvenescer, tendo a preocupação de renovar o seu público ouvinte. E, para manter o interesse das novas gerações, o rádio precisa ser revitalizado. O único caminho para essa revitalização é a segmentação e especialização. Referências ALECRIM, Emerson. MP3: o que é e como surgiu? Infowester, São Paulo, ago. 2009. Disponível em: . Acesso em: 7 ago. 2009. GOMES JUNIOR, José. A publicidade no rádio: origem e evolução. In: Intercom – Sociedade Brasileira de estudos interdisciplinares de Comunicação, 2000, São Paulo, Anais Eletrônicos... São Paulo: USP, 2000. Disponível em: . Acesso em: 22 jun. 2009. PAIVA, Vera Lúcia Menezes de (Org.). Interação e aprendizagem em am-

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biente virtual. Belo Horizonte: UFMG. 2001. PRATA, Nair. Tecnologia, um divisor de águas na história do rádio. In: V Congresso Nacional de História da Mídia, 2007, São Paulo. SILVA, Renato Caixeta da. Discutindo a interação em sala de aula via internet: análise de interações por correio eletrônico. In: PAIVA, Vera Lúcia Menezes de (Org.). Interação e aprendizagem em ambiente virtual. Belo Horizonte: UFMG. 2001. p. 207-229. p. 214. DEL BIANCO, Nélia; MOREIRA, Sônia V. (Orgs.). Rádio no Brasil: tendências e perspectivas. Rio de Janeiro: UERJ, 1999.

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aegfvswegwegwegwegwegwegewgwegwes Consumo e evangelho no subgênero do rock gospel

Consumo e evangelho no subgênero do rock gospel Ursula Gabriela Brehem57* Introdução O rock pode ser definido como um gênero musical popular, surgido a partir da década de 1950, nos Estados Unidos. Originado de uma mistura de tantos outros gêneros, ganhou batimento de bateria e um forte som de guitarra elétrica, hoje sua principal característica. Seu berço foi cercado por jovens, atraídos pelo novo ritmo que os fazia dançar freneticamente, mas não apenas por isso, pois tal embalo caracterizava-se como algo mais do que acordes ou dança, podendo ser considerado um estilo de vida. Conforme Corrêa, o gênero musical do rock rompeu com os padrões sonoros da época, propondo uma ruptura do tradicional ao mesmo tempo em que provocava na juventude, então movida a desafios e sedenta por fazer diferença na sociedade, o desejo de libertar-se. Nas palavras do autor: O rock tem muito que ver com rebeldia. Daí talvez porque todos os seus representantes ostentam a marca da juventude. Uma juventude descomprometida com tradições, valores estáveis, padrões e moldes permanentes da música, do mundo ou da vida.58

Os efeitos do rock na sociedade foram muito adiante de tudo isso. O mercado descobriu o quanto ele era rentável, não apenas no mercado fonográfico, mas no de instrumentos musicais, roupas, sapatos, etc. Tudo que o astro do rock usava, era alvo de desejo dos fãs, assim, venda certa para quem fosse inteligente o bastante para oferecer esses produtos. Assim, observa-se que o objetivo do sistema capitalista sempre foi e continua sendo o lucro, uma vez que não lhe interessa se o que está sendo

57 * Graduanda em Ciências da Comunicação com habilitação em Publicidade e Propaganda na Unisinos. E-mail: . 58 CORRÊA, Tupã Gomes. Rock nos passos da moda: mídia, consumo x mercado cultural. Campinas: Papirus, 1989. p. 39.

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produzido é necessário ou não. Desta forma, percebe-se o quanto este mercado cresceu e segue alongando seus tentáculos para todos os segmentos. Chegando, então, ao ponto onde nasce a questão que gostaria de abordar nesse artigo. Origem e desenvolvimento Desde seu surgimento, o rock vem se renovando e originando diversos estilos e subgêneros. Sua veia de rebeldia rendeu aos jovens a oportunidade de conhecer o uso de álcool, cigarro e drogas, uma vez que a oferta e o uso de tais substâncias corriam livremente entre os adeptos do som, agitando as batidas do coração e dispersando alucinógenas noções mentais. Isto, sem contar a prática libertina do sexo, antes inexistente na sociedade. Logo, o ritmo animador passou a mostrar um caminho tortuoso e, por diversas vezes, sem volta para seus fãs. Paralelo aos acontecimentos que giravam em torno do rock, a música gospel prosseguia dentro das igrejas, tendo sua origem no movimento da black music. Movida pelo amor ao ritmo e à complexidade de sua batida, a música gospel passeia pelo mundo do rock em meados dos anos 1960. Desde que passou a influenciar diretamente a música religiosa, o chamado rock gospel ainda gera algumas polêmicas no meio cristão e mais que isso, motiva também um mercado que cresce a cada dia. A definição de rock gospel pode ser dada da seguinte forma: é a junção da musicalidade do rock com letras de temática cristã. A palavra gospel, advinda do inglês, significa evangelho, e é justamente essa sua missão: levar o evangelho de Cristo. O rock cristão surgiu acompanhando as tendências musicais de idos dos anos 1960 e o movimento hippie. Muitos dos primeiros grupos eram integrantes do Jesus Movement, movimento que surgiu no rastro da contra-cultura hippie e que buscava oferecer uma perspectiva de vida cristã aos jovens desestimulados com as propostas de paz e amor baseados em drogas e sexo livre. As primeiras bandas foram mal recebidas pelas igrejas protestantes, pois o rock era concebido como “música do diabo” e associado a um comportamento socialmente repreensível. Com o tempo, a música foi ganhando credibilidade por, entre outros motivos, ser meio de aproximação dos jovens ao cristianismo. As bandas do Rock cristão, a partir dos anos 80, foram gradualmente se

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contextualizando e conquistando uma aceitação do público protestante cada vez maior. Começaram a atrair o interesse da mídia e de gravadoras seculares, conseguindo grandes contratos, maior exposição e sucesso internacional. Muitas bandas novas surgiram e continuam surgindo, consolidando o gênero e o distanciando cada vez mais do seu ambiente eclesiástico original. Consumo e evangelismo Desligando-se da vertente rebelde do rock, o rock cristão leva em sua essência uma mensagem de vida e de amor. Aliando-se ao poder indiscutível da música, o estilo busca provocar mudança no pensamento, no caráter e na forma de viver de seus ouvintes. Corrêia relata que exitem vários elementos que intervém no processo de “identidade da música jovem e renovadora do rock com a audiência e, por decorrência, com o mercado de produtos para a juventude”, sendo o artista ou grupo que interpreta esse gênero um desse elemento. Nas palavras do autor: Há um vínculo obrigatório entre a corrente ou estilo do rock e quem o representa, muito mais do que em outros gêneros e formas de música. E nesses casos, o vínculo é acentuado em razão de uma certa personalidade desses representantes imposta à maneira como se vestem, ensejando uma espécie de moda que, aos poucos, pode ser transformada em produto para consumo em larga escala.59

O livro de Corrêia aborda o consumo e a mídia desencadeados a partir do rock. Aqui, no discurso sobre o rock gospel, venho expor alguns conceitos, fundamentados em obras e artigos, para provar que esse gênero precisa estimular mais do que o consumo e a mídia para se manter ativo em seu propósito. O elemento apresentado pelo autor faz sentido pleno também no contexto do rock cristão, porque se a música que o representante canta ou toca não é uma verdade em sua vida, ela não surtirá o efeito devido. O intérprete tem papel fundamental para criar a identidade da música e da filosofia que prega. Para isso, é necessário que a letra das canções que cantam, não sejam apenas boas rimas encaixadas em uma bela melodia, mas sejam resultados de um modo de vida que ex-

59 CORRÊA, Tupã Gomes, op. cit., p. 30.

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plode para que todos vejam. No que diz respeito à música religiosa, é importante buscar a fonte mais adequada para essa categoria: a Bíblia Sagrada. São diversos os episódios em que a música aparece na Bíblia, mas nenhum personagem está envolvido com ela tanto quanto Davi. O capítulo 16 do livro de I Samuel, nos versículos 15 até 23, diz: Diga, pois, nosso Senhor a seus servos, que estão na tua presença, que busquem um homem que saiba tocar harpa, e será que, quando o espírito mau da parte de Deus vier sobre ti, então ele tocará com a sua mão, e te acharás melhor. Então disse Saul aos seus servos: Busca. [...] Então respondeu um dos moços, e disse: eis que tenho visto a um filho de Jessé, o belemita, que sabe tocar e é valente e vigoroso, e homem de guerra, e prudente em palavras, e de gentil presença; o SENHOR é com ele. [...] E sucedia que, quando o espírito mau da parte de Deus vinha sobre Saul, Davi tomava a harpa, e a tocava com a sua mão; então Saul sentia alívio, e se achava melhor, e o espírito mau se retirava dele.60

A música religiosa não é poderosa em si mesma, mas Deus, presente na música de Davi, ganha espaço para agir pelo poder que está nEle. E por esse motivo, toda música que se chama cristã, deve carregar algo que vai além de notas musicais, deve carregar poder. Isso só se torna possível, se o representante que leva essa música para o público estiver apto para ser esse tão importante veículo. No livro O rock na evangelização, do teólogo e baterista Flávio Lages Rodrigues, ele diz: “Não importa a nação, raça ou cultura, desde que a vida agrade ao Senhor”.61 E este é um dos princípios pelo qual ele faz uso do rock para alcançar grupos urbanos atuais. Nas palavras do autor: As tribos urbanas – e, neste caso mais especícifo, os roqueiros – têm toda uma característica peculiar cultural: os cabelos longos, as tatuagens, os piercings, as roupas pretas e camisas de bandas de rock, assim como a maneira totalmente diferen-

60 GOSPEL +. Bíblia on line. Tradução de João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999. Disponível em: . Acesso em: 1 ago. 2009. 61 RODRIGUES, Flávio Lages. O rock na evangelização. Belo Horizonte: MK Music, 2003. p. 12.

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te de falar, usando gírias e jargões que só quem está inserido na tribo consegue entender. Precisam ouvir o evangelho de forma contextualizada. A mensagem deve ser transmitida de forma que eles, em sua maneira de viver, pensar e sentir, consigam entendê-la. Na evangelização, sob uma visão teológica, não como desconsiderar a cultura. Portanto, não há como negar que haverá choques, já que a Bíblia será o filtro para o confronto das culturas e costumes, e essas têm elementos negativos e positivos.62

O confronto entre o rock, enquanto produto cultural e motor para venda de artigos sem fim, e o rock gospel, enquanto produto transcedental, sendo divulgador e propagador de um modo de vida cristão, é brusco. Ainda que, muitos, através de suas más ações, contradigam esse objetivo, o rock gospel existe para ser um meio de alcance de corações quebrados pelo estilo de vida do rock raíz. Mas, sendo assim, muitos atingidos pelo novo modo de vida, empregam-se em conhecer mais a música gospel e buscam meios de interagir com ela. E essa é a alavanca que torna o rock gospel, também um produto de consumo. A indústria de produtos e serviços para cristãos movimenta por ano mais de R$ 1 bilhão, num país com mais de 30 milhões de evangélicos – a projeção é de que essa população aumente para 50 milhões até 2020. Em todo o Brasil existem mais de 200 mil igrejas evangélicas. A cada ano surgem cerca de 10 mil novos templos e 300 mil pastores e líderes, além de aproximadamente 500 escolas de ensino teológico. No mercado fonográfico, segundo a Associação Brasileira de Produtores de Discos (ABPD), a música gospel nacional ocupa a segunda colocação entre os gêneros musicais campeões em venda, atrás somente do pop-rock. Em 2005, o segmento movimentou mais de R$ 40 milhões do total de R$ 615,2 milhões adquiridos no mercado musical (6,5%), com a venda de mais de 52 milhões de unidades de CDs e DVDs no Brasil. Existe alguma dúvida de que o rock gospel estimula mais do que mudança de comportamento? Assim como o rock secular, ele faz com que as pessoas queiram mostrar-se inseridas naquele estilo. Como diz Corrêia:

62 RODRIGUES, Flávio Lages, op. cit., p. 24.

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A idade, o sexo, o espaço onde se vive, aquilo que se faz podem não ser atributos qualitativos transparentes na roupa que se veste, ao contrário, por exemplo, daquilo que se pensa. Isto sim pode determinar a maneira de se vestir e de se comportar: uma identidade que se quer!63

Assim, pode-se definir que o fator que movimenta o mercado gospel é a identidade que cada um deseja transmitir.

Considerações finais No presente estudo foi possível destacar uma das diversar ramificações do gênero musical rock, compreendendo como ele atingiu e ainda atinge a sociedade. A resposta para a questão proposta no início desse artigo foi buscada, abrindo um mundo de possibilidades, de fontes e de obras sobre o assunto. Frente às pesquisas realizadas, a resposta é que o subgênero gospel é capaz de ser um produto de mercado, já que estmula um mercado grande, mas também é um meio de ação para a propagação do evangelho, objetivo para qual se propõe desde seu surgimento. Nenhuma das duas faces interfere uma na outra, mas, através de relatos e experiências vividas por muitas pessoas, o rock gospel enquanto produto espiritual, movimenta muito mais o mercado do que se fosse apenas música com letras que ensinam a ter boa conduta. Referências CORRÊA, Tupã Gomes. Rock nos passos da moda: mídia, consumo x mercado cultural. Campinas: Papirus, 1989. GOSPEL +. Bíblia on line. Tradução de João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999. RODRIGUES, Flávio Lages. O rock na evangelização. Belo Horizonte: MK Music, 2003.

63 CORRÊA, Tupã Gomes, op. cit., p. 42.

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Internet, desenvolvimento e motivação juvenil na utilização de blogs

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Internet, desenvolvimento e motivação juvenil na utilização de blogs Carolina Lenz Freitas64* Guilherme Endler65** Marcus Vinícius Camargo66*** William Kiefer67**** Introdução Partindo de uma contextualização histórica da tecnologia e sociabilidade em rede, o presente artigo se propõe a explicar o surgimento e a função social de um web blog, tal como os modelos de blogs existentes e os gêneros mais acessados. Para tanto, traça-se o perfil dos seus leitores e de quem os escreve. Nesta direção, utiliza-se um blog, para pesquisar as funcionalidades deste tipo de página virtual. A partir da questão “O que motiva os jovens a procurarem por blogs?” foi realizada uma análise sobre a procura destes espaços virtuais sob o aspecto local, traçando freqüência, horário e dias da semana em que são acessados. É mostrado quais são os tipos de blogs mais acessados, assim como quem são as pessoas que realizam a produção e o acesso a esses conteúdos. Como forma de compreender a transição do telégrafo no século XIX até a chegada da internet no século XX, tais aspectos históricos são abordados a partir da periodização proposta por Eric Hobsbawm, somando ainda as contribuições de Alan Turing para o estabelecimento da ciência da computação. Nestas vias, o presente trabalho busca, acompanhar o surgimento e crescimento dos blogs. Assim como a sua importância na sociedade atual como meio de comunicação entre usuários da internet.

64 * Graduanda em Ciências da Comunicação com habilitação em Publicidade e Propaganda na Unisinos. E-mail: . 65 ** Graduando em Ciências da Comunicação com habilitação em Jornalismo na Unisinos. E-mail: . 66 *** Graduando em Ciências da Comunicação com habilitação em Jornalismo na Unisinos. E-mail: . 67 **** Graduando em Ciências da Comunicação com habilitação em Publicidade e Propaganda na Unisinos. E-mail: .

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Do telégrafo à internet Uma mensagem levava nove horas para ir de Londres chegar a Tóquio e depois retornar a Londres. Tudo isso em pleno século XIX. Assim Eric Hobsbawm apresenta para o leitor de Era dos Impérios um dos grandes fascínios daqueles tempos, o telégrafo e seus cabos cruzando os oceanos formando a primeira teia da era elétrica que acabava de nascer. O uso do telégrafo no mesmo século XIX foi um dos elementos responsáveis por boa parte da campanha de expansionista de Napoleão Bonaparte na Europa assim como os trens. As mensagens eram despachadas e instantaneamente estava na fronte de batalha diminuindo a distância entre o alto comando e o pelotão. No entanto, o telégrafo apresentou um problema: sua forma de ligação entre emissão e recepção. Tudo era ligado por linha direta, bastava derrubar a linha que ligava duas cidades e a eficiência do telégrafo deixava de existir, por ser uma ligação de pontos diretos bidirecional.68 Ou seja, não havia caminho alternativo para que a mensagem pudesse desviar-se e chegar ao seu destino. O conceito de comunicação elétrica multidirecional ficou hibernando até a chegada do século XX. Um britânico chamado Alan Mathison Turing, matemático é o responsável pela maior revolução ocorrida no século XX, ao conceber sua máquina a partir de um modelo teórico virtual de um computador restrito a seu aspecto lógico do seu funcionamento, memória e processamento. Numa máquina de Turing pode-se modelar qualquer computador digital. Mais uma vez ela, a guerra, foi responsável pelo impulso da informática. Os combates da Segunda Guerra Mundial não limitaram-se apenas aos bombardeios, combates com submarinos, combates aéreos e a infantaria. Foi na primeira guerra onde ocorreu uma disputa virtual, entre a Enigma e Colossus. Enigma era uma máquina alemã que gerava códigos ultra-secretos e que mudavam muito rapidamente e humanamente impossível de serem quebrados. Aí entra em ação o projeto secreto Colossus da Inglaterra, onde uma outra máquina através do conceito de Turing passou a quebrar os códigos da Enigma e os Aliados de pose de tais informações puderam dar um outro desfecho para o conflito. Colossus foi um projeto tão secreto que o grande público só ficou sabendo da sua existência em 1975.

68 Vide DILL, Luís. Todos contra Dante. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

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Com o fim do armistício e o mundo divido em dois blocos e sob ameaça de uma guerra nuclear, foi preciso pensar um novo conceito de transmitir informações mesmo que o planeta fosse arrasado. A partir do conceito da máquina de Turing desenvolveu um teste que consistia em um operador não poder diferenciar se as respostas a perguntas elaboradas pelo operador eram vindas ou não de um computador. Caso afirmativo, o computador poderia ser considerado como dotado de inteligência artificial. Sua máquina pode ser programada de tal modo que pode imitar qualquer sistema formal. A idéia de “computabilidade” começou a ser delineada. Devido a todos esses feitos, Alan Turing é tido como o pai da ciência da computação. Alan Turing nunca pode usufruir do prestígio que sua teoria posteriormente conferiu ao mundo no período posterior a Segunda Guerra Mundial. Ele, homossexual declarado, sofreu humilhações públicas foi impedido de dar continuidade sobre computadores, julgado por “vícios impuros”, foi condenado a uma terapia à base de estrogênio, hormônio feminino como uma castração química para que mudasse de comportamento. Entre os efeitos colaterais foi o surgimento de seios e a depressão. Em sete de junho de 1954, Turing cometeu suicídio após ingerir uma maçã envenenada. Os anos 1960 foram sacudidos por uma série de eventos: assassinato do presidente Kennedy, protestos contra a guerra do Vietnã, à contracultura, golpe militar no Brasil, captura morte e “santificação” da imagem de Che Guevara, além das idéias do sociólogo canadense Marshall Mcluhan.69 E o MIT no interior dos seus laboratórios criava uma nova rede de comunicação multidirecional onde qualquer mensagem pudesse circular por vários nós e desviar-se em caso de falha de um dos nós do caminho não estiver ativo (destruídos pela guerra nuclear). A guerra não ocorreu e nos anos 1970 o Pentágono liberou o uso da ARPANET, rede na qual militares se comunicavam com os pesquisadores, e os mesmos com o passar do uso da rede perceberam como as pessoas a utilizavam. Nasce uma série de protocolos de utilização da rede, entre eles, o TCP/IP, a grande virada. Graça a sua utilização pode se interligar várias outras redes, a ARPANET

69 Vide MCLUHAN, Marshall. Comprender los medios de comunicacion: las extensiones del ser humano. Barcelona: Paidos, 1996.

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separou-se da rede militar. Nasce a Internet, que ganhou uma interface gráfica em 1991. O Brasil ingressa na rede em 1988, com a interligação das universidades brasileiras com as norte-americanas. Logo em seguida surge o IBASE que utilizou o ALTERNEX, onde não-acadêmicos poderiam usá-la.70 Nos anos 1990 foi instalado o primeiro backbone, espinha dorsal, que liga o país ao restante do mundo. A Embratel passou a liberar o uso da rede que cresceu a partir do processo de privatização da telefonia. Nascem os portais: UOL, TERRA, só para citar dois, e uma nova mídia de comunicação onde concentra inúmeros itens. Com ela outra plataforma de realizar negócios, B2B entre empresas, B2C, empresa diretamente com o consumidor, internet banking; a forma de se comunicar também foi alterada por esta nova mídia, cartas passaram a serem digitais, cartões postais, idem. Programas de mensagens instantâneas, como o pioneiro ICQ, surgem e todo mundo está diante um do outro com apenas um clic do mouse. E sem esquecer a cultura hacker, anterior a tudo isto, a troca de conhecimento. Um escambo eletrônico que colidiu com os direitos autorais, por que a virtualização criou um novo padrão de consumo desta nova mídia. Conceito e funcionalidade Um novo comportamento passou a reger a maneira como as pessoas se relacionam. Agora há uma máquina entre elas. Para uma cultua como a nossa, há muito acostumada a dividir e estilhaçar todas as coisas como meio de controlá-las, não deixa de ser um tanto chocante lembrar que, para efeitos práticos e operacionais, o meio é a mensagem. Isto apenas significa que as conseqüências sociais e pessoais de qualquer uma das extensões de nós mesmos constituem o resultado do novo estalão introduzido em nossas vidas por uma nova tecnologia ou extensão de nós mesmos. Hoje parecem banais as palavras de Mcluhan. Mas não há como as pessoas saírem à rua sem sua extensão, o telefone celular, por exemplo. E como os meios de comunicação são extensões do homem, entre estas extensões está o blog. A cultura elétrica que

70 Vide SANTAELLA, Lucia. Navegar no ciberespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo. 2. ed. São Paulo, 2007.

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decolou com os telégrafos, agora age sob a forma narrativa do final do século XX e qual será sua forma no século XXI. O web log, popularmente conhecido como blog, é um site de atualização rápida por meio de pequenos artigos, chamados “posts”. Existem inúmeros tipos de blogs, alguns servem como uma espécie de “diário eletrônico” do autor, outros visam difundir informações como intuitos comerciais. Também é possível achar blogs de diversos temas, como humor, política, blogs com cunho cultural, que falam de cinema, música, literatura, ou simplesmente feitos para que o autor (ou os autores) possa dar sua opinião sobre o que quiser. Mais do que tudo, os blogs são um meio de se expressar e ser ouvido por milhares de pessoas ao redor do mundo quase que instantaneamente. Uma das principais características dos blogs é a capacidade dos leitores interagirem com o autor por meio de comentários deixados em cada post, o que torna o blog um modo de comunicação importante, pois é possível a troca de idéias entre pessoas de diversas nacionalidades, de raças e sexos diferentes. Os primeiros blogs foram criados por pessoas com conhecimentos de informática suficientes para criarem um site como qualquer outro, já que não existiam ferramentas de criação automática ou de alojamento e gestão de blogs como existem hoje. Para alguns, Tim Berners-Lee, o inventor da internet e criador do primeiro website é também considerado o criador do primeiro blog.71 Os blogs começaram a se expandir em 1999, com a criação do blogger, uma ferramenta de internet que permite que o usuário atualize seu blog de uma forma fácil e simples, sem se preocupar com a instalação de programas ou qualquer tipo de complicação. Segundo estudo feito pelo motor de busca de internet especializado em blogs, Technorati, até a criação do blogger, o número de blogs não passava de 50, e hoje existem bilhões. Cerca de 120 mil são criados diariamente ao redor do mundo. Jovens e motivação A procura por blogs pelos jovens é motivada por muitos fatores e em diversas ocasiões. A princípio, o acesso é feito nos horários livres,

71 Gomes, Maria João (2005). Blogs: um recurso e uma estratégia pedagógica. In Actas do VII Simpósio Internacional de Informática Educativa, Portugal: ESSE. p. 311-315. Disponível em: . Acesso em: 7 ago. 2009.

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quando as pessoas não estão trabalhando ou estudando, ou, até mesmo, nos intervalos de almoço do trabalho. Os acessos a blogs são bem distribuídos entre os dias da semana. Entretanto, os finais de semana apresentam uma quantidade um pouco maior de visitas. Embora sábados e domingos sejam os dias livres das pessoas, em geral, hoje em dia os jovens ocupam bastante tempo de seus dias semanais na internet. Os jovens acessam variados conteúdos de blogs. Iremos apresentá-los e falar sobre os principais assuntos procurados. A começar por blogs humorísticos. Os brasileiros em geral, costumam dedicar grande parte de seu tempo na internet em sites de humor. O ramo humorístico é inicialmente representado por grandes blogs famosos de humoristas, programas televisivos e de rádio. Inspirados nesses, surgiu uma grande quantidade de outros blogs menores, mas também muito acessados. Os sites formam redes de indicações entre si e, assim, são melhores divulgados. A maioria dos blogs voltados para o humor possui, em suas páginas, listas de outros sites que contém, geralmente, o mesmo tipo de conteúdo. Outro seguimento de blogs que há em grande número são os pessoais. Nesse ramo as pessoas criam suas páginas para contar de seu dia-a-dia, escrever contos, enfim, falar sobre suas vidas pessoais. Esse tipo de blog cresce a cada dia e também é bastante visitado. Contudo, é um número reduzido de pessoas que acessa cada blog, em geral são amigos e parentes da pessoa que escreve. A internet tem feito com que amizades tornem-se menos pessoais e mais virtuais. Todavia, os blogs pessoais são uma ferramenta para driblar a impessoalidade entre os jovens. As pessoas acessam os blogs pessoais de amigos, lêem seus posts (textos publicados) e se interam das suas idéias e opiniões. Também é possível deixar comentários nos textos e, assim, acontece a interação entre leitores e autores de blogs.72 Há também outra categoria muito popular na internet, que são os blogs direcionados a interesses em comum e hobbies. Entre eles estão as páginas sobre esportes, times, desenhos animados, programas de TV, filmes, livros, bandas, etc. Essa é uma categoria bastante ampla e abran-

72 Vide SIBILA, Paula. O show do eu: a intimidade como espetáculo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.

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gente e que tem um vasto número de adeptos e interessados na internet. É comum encontrar pessoas que criam páginas na internet para compartilhar com o mundo as suas crenças, idéias, interesses. Dentro desse universo destacam-se os blogs criados pelos jovens (maioria) que costumam ser voltados para seus interesses pessoais, como esportes, games, humor, animes, etc. Os blogs sobre tecnologia também são campeões de acesso. Uma grande parcela dos jovens procura esse tipo de conteúdo para se interar das novidades do mundo tecnológico. Novas pesquisas e avanços costumam sair primeiro em blogs, mesmo que em forma de boatos. A mídia tradicional passa por um pequeno atraso na divulgação dessas notícias, em relação à internet. Os próprios profissionais do jornalismo utilizam os blogs como fonte de pesquisa para suas matérias e reportagens. Muitas vezes a mídia convencional não tem acesso a certas informações e novidades que os blogs divulgam. Além disso, as páginas pessoais da web não têm censura, falam de assuntos variados sem tabus. Isso se torna uma rica fonte de inspiração para os jornalistas. Sabe-se que a maioria desses profissionais visita uma série de páginas diariamente à procura de novas informações e inspirações. O avanço dos blogs já chegou até às instituições de ensino, como forma de incentivo aos estudantes. Muitos colégio e faculdades utilizam a criação de blogs como ferramenta de auxílio ao ensino. Alguns professores solicitam a criação de páginas para divulgar e debater as matérias ensinadas em sala de aula. Em outros casos os próprios professores criam blogs para as suas matérias, inovando os meios e facilitando o acesso dos alunos à informação, já que, estes, costumam estar em contato com a internet. Em uma rápida pesquisa que levantamos, algumas pessoas nos deram as suas opiniões sobre o que as motivavam a acessar blogs. A maioria estava interessada em diversão, passatempo. Também foi comentado o fato de conhecer a opinião de outras pessoas a respeito de assuntos variados, como filmes, livros, CDs, etc. Muitos dos entrevistaram também comentaram que visitam essas páginas quando querem baixar filmes, músicas, aprender algum trabalho artesanal, ou saber como funciona algum equipamento. Sites direcionados a interesses pessoais também foram citados, como os que tratam de photoshop, direito, futebol, entre outros.

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A motivação para a busca por blogs, portanto, é feita por vários fatores. Prioritariamente as pessoas procuram por lazer e informação. Esses motivadores variam para cada pessoa, de acordo com seus interesses. Sendo o nosso foco os jovens, sua motivação é, principalmente, o entretenimento, seguido de informações sobre inovações. Dentro da procura por lazer encontra-se um campo muito grande de blogs, como os humorísticos, pessoais, musicais, esportivos, etc. Os jovens também buscam os blogs como auxiliares nos estudos. Muitos assuntos pedidos em trabalho escolares e de faculdade são encontrados em páginas voltadas para a educação. A motivação para navegar na internet em busca de blogs vem de várias partes. Hoje encontramos páginas direcionadas para os mais variados assuntos, assim mudando os objetos motivacionais dos jovens. Entretanto, o maior fator motivacional é a busca por entretenimento, conforme observado em pesquisa do portal Blogosfera Brasil.73 Tabela 1. Segmento dos blogs Você acha que blog é... Diversão/Entretenimento .................................................70,2% Imprensa Alternativa .......................................................61,4% Suporte de informação ....................................................57,1% Diário Virtual ................................................................51,5% Moda passageira ............................................................. 2,2% Tabela 2. Freqüência de acesso Quantos blogs você lê diariamente? De 2 a 5 blogs ........................................................ 39,7% De 6 a 10 blogs ..........................................................23% Pelo menos 1 blog ......................................................11% De 11 a 20 blogs ..................................................... 10,6% Mais de 20 blogs .......................................................8,8% Não leio blogs diariamente ..........................................6,6%

73 BLOGSFERA BRASIL. Relatório de Pesquisa – 2006. Disponível em: . Acesso em: 7 ago. 2009.

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Tabela 3. Tempo dedicado para leitura Que tempo é dedicado para esta leitura? Entre 30 min e 1 hr .................................................28,8% Entre 15 e 30 min ...................................................24,2% Entre 1 e 2 hrs .......................................................19,7% Mais de 2 hrs .......................................................... 9,5% Até 15 min ............................................................. 9,2% Tabela 4. Motivação de leitura Qual sua motivações de leitura? Diversão/entretenimento ..........................................82,6% Ler opiniões diferentes sobre vários assuntos ................80,2% Informação/notícias .................................................64,3% Poder comentar e discutir assuntos que acho relevantes . .50,0% Saber como estão e o que andam fazendo os amigos/família . ......................................................39,0% É importante para meus estudos .................................11,3% É importante para o meu trabalho ...............................10,2% Tabela 5. Motivo de acesso O que o leva a acompanhar determinado blog? Temática ................................................................ 86,4% Relação próxima com o autor (amigo, familiar, colega de trabalho etc) ......................... 60,0% Indicação de amigos e outros blogueiros ......................... 46,6% Porque o autor também visita meu blog .......................... 25,1% Leio blogs aleatoriamente, não acompanho um específico .....1,0% Porque o blog está bem colocado em ranking, prêmios etc ....1,7% Tabela 6. Segmentos e temáticas Quais temáticas o(s) seu(s) blog(s) aborda(m)? Idéias soltas / introspecções ........................................ 17,3% Relatos ou comentários sobre minha vida/meu dia-a-dia ..... 14,2% Crítica e opinião sobre cinema, música, programas de TV, cultura, arte etc ....................................................... 12,1%

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Humor ..................................................................... 9,0% Costumes .................................................................. 8,7% Internet/blogs ............................................................ 8,7% Literatura (crítica e opinião) .......................................... 6,2% Divulgação da minha produção literária ............................5,8% Política e economia ..................................................... 5,7% Trabalho ................................................................... 4,5% Esporte .................................................................... 2,0% Religião .................................................................... 2,0% Sexo ........................................................................ 1,9% Colégio / pesquisas e estudos acadêmicos .........................1,2% Games ...................................................................... 0,6%

Considerações finais A análise da evolução da internet e dos blogs, bem como quem são as pessoas que os acessam e quais seus motivadores, contribui para os estudos, ainda raros, que envolvem as páginas pessoais na internet. Atualmente, numa sociedade tão avançada tecnologicamente, é admirável o pequeno número de estudos envolvendo o universo virtual. Nesta direção, o presente estudo abordou o avanço das comunicações na era tecnológica, partindo da invenção do telégrafo. Os computadores foram inicialmente usados como armas na Segunda Guerra Mundial e foi assim que toda a humanidade começou a ter acesso às novas tecnologias. Com o advento dos blogs na internet, começaram sutilmente a surgir páginas de pessoas que trabalhavam com criação de sites. Entretanto, foi a partir do surgimento do Blogger, ferramenta de criação rápida de páginas virtuais, os blogs passaram a ser populares. Com ferramentas como o blogger foi possível aumentar rapidamente o número de páginas pessoais em todo o mundo. É impressionante a quantidade de blogs desenvolvidos a cada dia. O foco do presente estudo, entretanto, foi descobrir o que motiva os a procurarem blogs. Soube-se, então, que os principais blogs acessados atualmente são os destinados ao humor, entretenimento, novas tecnologias e interesses pessoais. Os jovens utilizam os blogs para diversas finalidades, como pesquisas estudantis, download de músicas e vídeos,

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debates, opiniões de especialistas em diversas áreas, etc. Não obstante, foi realizada uma pesquisa virtual, feita em um blog, para saber a opinião dos próprios internautas sobre o que os atrai para os blogs. Assim, evidencia-se que são inúmeras as utilidades dessas páginas, como saber a opinião das pessoas sobre livros, filmes, buscar informações sobre diversas áreas de interesses, aprenderem coisas novas e, principalmente, entreter-se. Referências Ajuda aí, gente! – Blog 7 Oitavos, São Leopoldo. Disponível em Acesso em: 3 jun. 2009. CASAGRANDE, Tiago, GEJFINBEIN, Leandro. Pesquisa Blogosfera Brasil. Porto Alegre: Verbeat, 2006. Disponível em: . Acesso em: 7 ago. 2009. DILL, Luís. Todos contra Dante. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. Gomes, Maria João (2005). Blogs: um recurso e uma estratégia pedagógica. In Actas do VII Simpósio Internacional de Informática Educativa, Portugal: ESSE. p. 311-315. Disponível em: . Acesso em: 7 ago. 2009. SANTAELLA, Lucia. Navegar no ciberespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo. 2. ed. São Paulo, 2007. SIBILA, Paula. O show do eu: a intimidade como espetáculo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.

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