\"Veneráveis Representantes da Vegetação Tropical\": médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX)

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Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 1 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

“VENERÁVEIS REPRESENTANTES DA VEGETAÇÃO TROPICAL”: MÉDICOS, CURANDEIROS E FITOTERAPIAS NA GUINÉ-PORTUGUESA (SÉCS. XIX-XX) Philip J. Havik i Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT) – Departamento de Ciências Humanas [email protected]

Resumo

A chegada de facultativos médicos e farmacêuticos na Guiné dita Portuguesa com a criação dos serviços de saúde na primeira metade do século XIX trouxe novos conceitos e práticas a uma região onde os curandeiros reinavam. Olhada com uma mistura de fascínio devido a sua natureza exótica e desconfiança pelo seu clima e doenças tropicais endémicas, a Guiné ainda era um agrupamento de presídios dispersos cercados por um interior largamente desconhecido. Médicos e farmaceuticos a um lado e curandeiros como os djambakós e murus noutro, protagonizaram um encontro difícil e hesitante a partir dos meados de oitocentos que pouco mais produziu que alguns resultados pontuais. Porém, a publicação dos primeiros dados sobre a rica flora do território e algumas das suas aplicações fito-terapeuticas no último quartel do século mostram que houve um intercâmbio de conhecimentos sobre o tratamento de diversas patologias comuns e tropicais. Após as campanhas militares e a implantação de uma administração colonial nas primeiras décadas do século XX, quando se estabelecem serviços clínicos em todo o território, a assistência médica e a farmacopeia ocidental aproximou-se aos utentes nativos. Ao mesmo tempo, administradores e antropólogos enveredaram pela procura dos costumes e tradições dos povos através de inquéritos etnográficos, incluindo as fito-terapias mais comuns utilizadas pelas populações. Neste modo fazem-se os primeiros passos para uma sistematização dos conhecimentos sobre os paliativos locais que resultam no primeiro estudo etno-botânico sobre um povo da região. O presente ensaio pretende destacar estas dinâmicas e intercâmbios, que não obstante o seu carácter ambivalente, forneceram dados novos que permitiram conhecer melhor certos aspectos fundamentais da vida diária dos habitantes. Palavras-chave: Plantas indígenas; Fitoterapias; Curandeiros; Antropologia; Etno-biologia; Guiné (Portuguesa)

1. A AMBIVALÊNCIA DA NATUREZA E O DESLEIXO DOS HOMENS

Nos relatos de observadores oitocentistas, a Guiné era descrita como terra fértil e luxuriante, “uma colónia tão florente, tão risonha e com um horizonte largo e um futuro que se delineava cheio das mais ricas esperanças” ii . Um panorama algo romantizado sobressai da literatura de viagens que surgiu nesta época difundida pelas sociedades de geografia europeias através de publicações tendo em vista a exploração do continente africano. No caso da Guiné, os oficiais da marinha francesa e portuguesa que faziam parte das Comissões de Delimitação de Fronteiras criadas pelo tratado Luso-Francês de 1886 contribuíram decisivamente para este imaginário exótico. Os seus relatos incluem uma abundante iconografia que denota 1

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em forma de gravuras, feitas com base em fotografias, uma crescente atenção a flora e fauna da região iii . Viajando por via fluvial mas agora também terrestre, abre-se o interior aos olhares dos leitores das revistas, que assim se conseguem aproximar aos “mangroves entrelaçados”, a “vegetação resplandecente”, as “poilões majestuosas”, e as “palmeiras frondosas”. iv

Nestas imagens, os homens aparecem como figuras

pequenas dominadas e cercadas pela imponente natureza ao seu redor, não escondendo contudo as núvens escuras que anunciam a chegada das tempestades da estação das chuvas (Nordeck, 1886: 292). A natureza com a sua infinita variedade de espécies ‘é assim retratada como encantadora e sedutora, mas ao mesmo tempo como indomado e ameaçadora. Os mesmos relatos também trazem os primeiros desenhos de plantas, por ex. as folhas e sementes da kola (Sterculia acuminata) e outras espécies botânicas exóticas (Ibid: 296-8), tal como a arvore de mancône (Eritrophlaeum afzelius) conhecido de relatos quinhentistas como a ‘água vermelha’ de cuja casca se extrai um veneno, muito usado nos rituais para identificar a presença de feiticeiros (Brosselard, 1889:139/40). Um membro português da mesma comissão acrescentou mais algumas espécies com propriedades curativas como por exemplo o óleo do árvore de azeite amargoso com que se tratavam colites e doenças das vias respiratórias, aparentemente com “esplêndido resultado” (Costa Oliveira, 1897-98: 82-91). Uma abordagem mais calculista e menos romantizada perpassa as observações de comerciantes, autoridades e técnicos sobre os solos e a flora da região, com o intuito de valoriza-la e fomentar a sua exploração agrícola. Tal como noutras colónias, a Guiné não escapou a regra, resultante da vontade de moldar a natureza segundo os critérios dos seus novos ocupantes, cativado pelas promessas de um ‘novo Brasil’. Segundo fontes coevas a Guiné não possuiu “riquezas, minérias,” etc., sendo os terrenos que Portugal detém, “por assim dizer meros retalhos […] e verdadeiros tiros de terra sem importância, de que só podemos tirar proveito dispendendo quantias fabulosas que nunca poderão ser compensadas’, uma observação crítica acompanhada de reivindicações imperiais acerca dos direitos de soberania v Não se conhecem nenhuns estudos sobre a flora do território antes da sua ocupação em 1915, a não ser alguns parágrafos nos relatos de viajantes e zoólogos que penetraram o seu interior em busca de espécies exóticas vi . Ainda em 1917, no seu estudo sobre a Guiné o conhecido geógrafo Ernesto de Vasconcellos não dedica mais do que uma alínea a flora do território, falando do “denso arvoredo verde negro que ao 2

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navegante se lhe afigura como tufos de verdura, emergindo sobre as aguas” que dificultava e até tornava perigosa a aproximação da costa vii , avisando pelos perigos e obstáculos que a natureza impôs ao reconhecimento e exploração de África. Os primeiros estudos agronómicos feitos algumas décadas antes, também exprimem uma atitude semelhante além de assinalar uma dimensão complementar, nomeadamente a ideia de a natureza africana ser ‘estática’ que não merecia ou justificava estudos demorados: ‘nada se tem feito, as culturas são as mesmas e os processos não se modificaram”. viii

Nesta perspectiva, a “agricultura era a primeira condição da

existência e independência das nações, a base segura e a origem mais fecunda do bemestar de cada povo” (Ibidem).

Porém, este discurso afincadamente colonial e

modernista levou o agrónomo em questão de sublinhar o facto de não existir nenhuns estudos sobre a flora da Guiné. Daí que sugere a necessidade de conhecer melhor a sua variedade, propondo a criação de uma ‘comissão executiva para a colheita de produtos vegetais’ para apreciar amostras de plantas após serem enviadas para a metrópole. “não basta ter qualquer conhecimento das espécies botânicas que n’ella vivem; é sobretudo indispensável conhecer quais as utilidades práticas que se podem tirar d’essas espécies” (Ibidem). No seu relatório constam as primeiras referências acerca da recolha sistemática de plantas com fins terapêuticas: “exemplo: se a planta (A) é uma planta arbórea, as suas folhas são medicinais, o caule depois de fendido produz goma ou resina deve colocar-se o no. (A) nos amostras de madeira, resina ou folha.” (Ibidem) Mas regra geral, autores em geral e médicos em particular, sublinham os perigos para a saúde humana associados ao material orgânico, devido a “humidade excessiva” dos solos, e a “fermentação dos detritos orgânicos e organizados, que se tornam extraordinariamente activa” ix . Estes processos exerceram uma “acção extraordinariamente notável principalmente no que diz respeito a higiene”. Desta afirmação até a condenação da “insalubre cultura de arroz” em terrenos alagados que constituem “verdadeiros caldos de culturas de micróbios” (Ibidem: 91) era um pequeno passo. Enquanto se impressionou pela exuberância do ambiente natural dava a impressão “que a Guiné é um paraíso”, acabava a mesma frase ao evocar a violência das chuvas torrenciais e das “febres biliosas e perniciosas”, transformando tudo em “tristeza” e “terror” (Ibidem: 92). Porém, esta relação de amor-ódio com a natureza transforme-se numa verdadeira elegia quando surgir o tema das praças a beira mar e rio espalhados pelo território. Estes 3

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núcleos semi-urbanos eram invadidos pelo ambiente tropical num discurso que lembrava aquele do “sepulcro dos Europeus” x , em que se associava as febres ‘perniciosas’ e ‘palustres remitentes’ e ‘-intermitentes’ ao clima tropical e a omnipresença de ‘miasmas palustres’ que o vento Leste trazia na estação seca (de Outubro até Maio), arrastando “(…) para cima da povoação […] dos pántanos circunvizinhos que os achão na actualidade quase secos, e os seus leites cobertos de animais e vegetais em adiantado estado de putrefacção” xi . Quando oficiais e médicos se debruçaram sobre a situação problemática das vilas a beira-mar, concluíram que estavam “(…) mal-situadas em relação a defesa e a higiene […] em terrenos muito baixos e pouco ventilados […] lodosos […] com uma vegetação prodigiosamente vigorosa […] e condições climatológicas [que] dão causa a insalubridade do país” xii . Porém longe de somente culpar a natureza, o mesmo autor também acusava as autoridades e os habitantes de “desleixo e incúria”, dado que “as imundícies de toda a espécie [se] encontram amontoadas nas casas, nas ruas e nas praias.” (Ibidem). Esta situação que já se começou a denunciar a partir dos anos 50 de oitocentos através de editais e posturas - contudo sem grandes efeitos práticos - era visto com o principal factor da saúde débil dos seus habitantes. Em 1891 um viajante constatava que Bissau, naquela altura o principal porto português na África Ocidental, era um local “imundo, sombrio e miasmático” que provocava “deformidades de higiene e na moral” (Martins, 1891: 253). As guerras de ocupação e campanhas punitivas que se intensificaram a partir dos anos 90 de oitocentos, sobretudo a seguir o Ultimato Britânico, provocam um crescimento da população das vilas sem ter condições para as acolher. A criação de hospitais de sangue e unidades moveis de assistência ás tropas no terreno, não melhora a situação precária das populações das ‘praças’, enquanto o avanço para o interior traz notícias sobre os povos nativos não receberam apoios para combater as pandemias que ciclicamente assolavam a região xiii . As vilas costeiras como Bissau são descritas por médicos como “lugares detestáveis” cuja “inebriante atmosfera encobre a veneno e a morte” (Costa, 1883: 98). Rodeadas por extensas superfícies pantanosas que produzem uma abundância de ‘emanações miasmáticas’, os médicos denunciam os seus efeitos sobre a salubridade pública, enquanto as fontes e poços de água estão

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“permanentemente estagnadas”, que constituem “poderosas causas geradoras de tantas e tão variadas moléstias”(Da Costa, 1886). A situação noutras praças como no caso do porto fluvial de Geba 150 kms rio acima, não era melhor, apesar de não ter palissada nem muralhas: “a decomposição das plantas nos pântanos e as miasmas que produziram são a principal causa das febres que na época se desenvolvem em quase todos os habitantes.” (Ibidem). O ponto de Farim na margem direita do Rio Cacheu mais ao Norte era uma das mais insalubres da Guiné. A ‘acção perniciosa’ do clima era vista como a mais devastadora para a saúde, sobretudo no caso dos Europeus, mas apesar da suposta “constituição fraca” das “raças” africanas, a população em geral não era afectada pelo clima da mesma forma. Contudo, “viveram muito pouco tempo” devido ao abuso de bebidas alcoólicas, uma alimentação insuficiente, e o “uso de carne e peixe corrupto”. Das crianças morria a metade até a idade de dois anos, enquanto os que sobreviveram contraíram muitas vezes “lesões viscerais importantes, que mais tarde dão origem a doenças graves e incuráveis” (Ibidem). Apesar dos seus avisos, os delegados de Saúde se queixam repetidamente das ‘autoridades competentes’ se terem mostradas ‘insensíveis’ as suas reclamações, apesar de terem publicadas posturas neste sentido (Ibidem). Dez anos mais tarde, o chefe do Serviço de Saúde da Guiné confirma esta observação: “a vila de Bissau é a localidade mais insalubre das ocupadas por nós na Guiné”.

Este responsável não vê muita diferença com a alagada falta de higiene

demonstrada pelos Pepel de Intim nas povoações ao pé da vila: “a casa é uma pocilga, um chiqueiro em que promiscuamente convivem o homem e os animais domésticos” (César Gomes Barbosa, 1894: 58). No caso da povoação de Geba a higiene pública e privada inspira também as maiores preocupações a este médico, por causa das “palhoças imundas” e as ruas que classifica como “nojentas veredas” (Ibid: 59), enquanto a “primitiva higiene” em Cacheu e Farim não diferir muito dos outros pontos na região. Algumas destas povoações deviam ser deslocadas, além de propor a plantação de mangueiras, acácias e palmeiras para evitar a “nociva” e “letífera influência” dos pântanos que as circundam (Ibid: 63). No caso de Bissau esta situação vigorou até que as muralhas - erigidas em 1844 e que fecharam a vila sobre si - foram demolidas em 1912 para criar condições para a expansão e reordenamento urbano que prosseguiu a partir de 1914. O centro comercial do enclave não se comparava “as soberbas capitais” de Senegal e de Serra Leoa xiv . 5

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Apesar da sua aparência fértil e promissora, a Guiné era na viragem do século de acordo com fontes coevas uma região inóspita onde o clima, o ambiente e a atmosfera contribuíram para ainda no princípio do século XX perpetuar a ideia de a aclimatização do Europeu não seria fácil de resolver. Mas dado que tal situação já se verificava desde os primeiros contactos feitos no século XV, como é que os estrangeiros e sobretudo a população em geral se protegeram contra estas ameaças na sua vida diária? Porquê então as fontes escritas contém tão poucas referências a uma questão que certamente preocupava os habitantes assolados por epidemias de vária ordem e de doenças tropicais? E quais eram as curas que aplicavam para alivia-as? E qual o papel da flora aparentemente tão abundante do território neste sentido? Tentaremos dar algumas respostas a estas e outras perguntas através de dois estudos de caso, a primeira do século XIX antes de a Guiné ser militarmente ocupada e a segunda no século XX, já no tempo colonial.

2. CURANDEIROS E MÉDICOS: UMA RELAÇÃO COMPLEXA E DIFÍCIL

O título desta comunicação foi extraído do relatório de um médico-cirurgião que servia na época de 1870 no território na altura ainda chamada ‘Senegambia Portuguesa’ e fazia parte de um pequeno núcleo de médicos, facultativos e farmaceuticos dos Serviços de Saúde da Guiné e Cabo Verde, que fora criado nos anos 40 de oitocentos. Após meio século de existência estes não eram mais que “um simulacro de quadro de saúde” somente contando três médicos para toda a região (Gomes Barbosa, 1894: 95). Algumas vilas nem sequer médicos tinham, mas sim meras ambulâncias com ou sem botica. Apesar de existirem serviços de saúde, a primeira vista a situação não diferira muito daquela que existia desde a fundação dos portos fluviais no século XVI e XVII. A veia prosaica do médico acima referido embelezou relatórios que no fundo apresentaram um quadro muito crítico do estado de saúde da população tal como do funcionamento dos próprios serviços, embrionários até os anos vinte de novecentos. Com o passar do tempo, os seus relatos incluem cada vez mais informação acerca das condições meteorológicas, da higiene pública e da nosologia dos habitantes das vilas como Bissau, Geba, Cacheu e Farim e mais tarde a partir dos anos setenta de oitocentos também Bolama que se tornará capital da província autónoma de Guiné Portuguesa em 1879. Das suas escritas sobressai um panorama desolador sobre a região e a sua 6

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população, baseado nas suas visitas periódicas, actuando como médicos mas também como geógrafos e etnólogos in loco. Não obstante a falta de facultativos, a partir dos meados do século XIX estes começam de produzir mais pormenores acerca do estado clínico da população e as condições vigentes dos serviços médicos. A título de exemplo os chefes de serviço apresentam alguns casos clínicos de pacientes para ilustrar as patologias mais comuns como as doenças tropicais (o paludismo, a febre amarela, etc) mas também as doenças do foro respiratório (bronquites), gastro-intestinais (disenteria e diarrheia) e dermatológicos (úlceras da pele). Até o século XX, as infra-estruturas rudimentares se limitavam a um hospital militar em Bolama, a capital de então, com duas enfermarias, e o hospital militar de Bissau, estabelecida numa casa particular sem condições e algumas ambulâncias rudimentares nos postos mais afastados. O relatório acima referido descreve pela primeira vez e de forma detalhada o impacto de epidemias, neste caso de cholera morbus que varreu a região de África Ocidental em 1869 xv . No século XIX, epidemias de cólera, varíola, sarampo e febre-amarela eram frequentes, mas também certas epizootias que dizimaram o gado, sem que os serviços tinham condições, pessoal ou recursos para as combater xvi . Durante a sua visita ao interior que ainda era largamente desconhecida aos colonos, o único médico-cirurgião na região regista as fortes contrastes entre a população profundamente ansiosa e afectada e o exotismo da flora tropical, aqui na zona do Rio Grande, no Sul do território: ‘veneráveis representantes da vegetação tropical, baixas temperaturas nas planuras do oceano, carregando – ao passar - suave aroma desta luxuosa vegetação [que] veêm amenizar o clima fustigado pela rude aspereza deste sol africano.” xvii Apesar de regra geral o seu raio de acção se limitar as poucas vilas costeiras, o referido médico visita algumas pontas ou explorações agrícolas/postos comerciais no interior para se inteirar da situação, sobretudo em caso de epidemias como cólera e febre amarela, admitindo porém que ‘muito raras vezes é o facultativo chamado para tratar o indígena gentio.’ (Ibid). De facto, os serviços não estavam a par daquilo que se passava no interior, mesmo a curta distância da praça de Bissau, e o modo como que a população se tratava as patologias comuns e epidemias. “Não se sabe se a epidemia se tem extendida aos gentios limitrofes. Ouvem se em Antim e Bandim repetidas descargas de espingardaria, sinal de ter morrido algum entre eles, mas ignora-se a moléstia que os devasta” xviii . 7

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No ano anterior, na sequência de uma epidemia de febre amarela que já tinha provocado a morte do então governador da Guiné, o cirurgião-mor da província dirigiu então um pedido ao ‘rei’ de Bandim, área vizinha da vila de Bissau sob controlo dos Pepel, “licença de ir a localidade ver os doentes, mas isto da ênfase nos prejuízos daqueles povos, e não é provável que se consiga” xix . Esta observação ilustra bem que as autoridades lusas estavam dependentes dos chefes nativos ou régulos, não somente nas questões de saúde, mas em todos os aspectos da vida política, económica e social fora - e até dentro - do perímetro das praças. Este isolamento foi somente quebrado pelo facto de as vilas estarem ligadas entre eles por via fluvial e por redes comerciais ao exterior. Porém, os grandes rios como o Geba, o Cacheu e o Casamance onde as vilas se situavam, são qualificados pelos médicos como as principais vias de difusão das epidemias. Os mesmos rios de que os habitantes dependerem para a sua sobrevivência constituem ao mesmo tempo uma ameaça silenciosa ao bem-estar destes sem meios adequados para a sua defesa. Numa série de relatórios o pessoal médico dá azo a sua frustração, enumerando as patologias que afligem a região além de cólera, nomeadamente angina, varíola, sarampo, febres endémicas, febre-tifoide, febre-amarela, cachexia africana, gripe e escorbuto. Isto além de outras doenças mais comuns como por exemplo inflamação do aparelho visual, reumatismo agudo e crónico, bronchitis aguda e crónica, affecções da pele, doenças venéreas e sifilíticas, úlceras das pernas, padecimentos de figado, em geral do baixo ventre, diarreia, disenteria, doenças do sistema nervoso com epilepsia, histeria, delirium-tremens e doença do sono. Os médicos não esquecem também de referir a fome, frequente no arquipélago de Cabo Verde onde os habitantes ainda estavam a sarar as feridas de uma epidemia de fome nos mesmos anos 60 de oitocentos, para qual se importava arroz e outras culturas do continente xx . O combate as epidemias também se complicou por o pequeníssimo Quadro de Saúde não conseguir convencer a população de se vacinar, devido a grande relutância que esta mostrou recusando a vacinação dos filhos. Estas campanhas, que somente se tornaram obrigatórias no século XX, nunca chegaram a ter um impacto fora das praças, nas zonas do interior cuja população travava uma guerra cada vez mais intensa contra a tentativa das autoridades para estender o seu domínio na região, que só se veio confirmar a partir de 1915. Olhando principalmente para as doenças que afectam os Europeus, os médicos admitem que ainda pouco sabiam. Sendo a aclimatização do Europeu uma condição 8

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para a colonização, nos anos 70 de oitocentos um médico recomenda fazer “um estudo acerca da influência mórbida do clima e o solo sobre os habitantes desta região”, que considera ”importante” porque permitirá recolher a “historia de doenças”, e definir quais as “patologias, e principalmente aquela para a qual tem fatal privilégio a raça branca.” xxi Reconhecem então que muitas das doenças que afectam os colonos são desconhecidas na Europa, e procuram conhecer melhor as terapias locais, começando então a procurar “substâncias medicamentosas aplicados pelos indígenas em certas moléstias.” O médico em questão confessa que sinta “(…) dificuldades acerca das segundas, já provenientes de pouco conhecida que é a flora deste pais, já do mistério que usa o selvagem quando o estrangeiro pretende entrar no conhecimento de suas práticas gentílicas’ xxii . Esta observação ilustra não só a falta de informação sobre fitoterapias entre os profissionais de saúde, mas também as relações - quase inexistentes – entre estes e os curandeiros, além de sugerir como os últimos viam os primeiros. A aparente recusa dos curandeiros de partilhar conhecimentos sobre métodos curativos com médicos, é uma constante nos relatórios médicos; mesmo assim, aparecem esporadicamente dados sobre o modus operandi de curandeiros locais, principalmente os de origem Balanta e os Mandinga. Algumas referências a certas patologias tropicais - por exemplo a doença do sono e o seu tratamento - evidenciam observações feitas in loco. A primeira descrição da chamada ‘operação da pedra’ feita por curandeiros ou murus Mandinga (der. do Port: mouro; curandeiros de povos Islamizados como os Mandinga e Fula), sugere contactos com praticantes locais xxiii . Somente nos anos setenta de oitocentos aparecem as primeiras referências acerca de “substâncias medicamentosas aplicadas pelos indígenas”, como por ex. antídotos aplicados contra o envenenamento por mordidas de serpentes. “O Balanta emprega como tópico a casca reduzida a pó de um arbusto’; usando também a seguir “o decrelo das folhas do Jatropha curcas L., sucedaneos da quina”, além de aplicar “a casca do bissilón (Khaya Senegalensis), do qual se extrai um vinóleo que ele emprega em subsituição do vinho da quina”. A casca do bissilón ou mogno africano como também é conhecido, já fora referido pela primeira vez por um médico de origem caboverdiano e director dos serviços em 1855 como base de preparados anti-inflammatórios xxiv Um dos seus sucessores, um conterrâneo, fala dos curandeiros ou djambakós Balanta que costumam também preparar pós cicatrizantes para tratar úlceras fagedemicas com o pó 9

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de raiz do mambimba (Kr. mambumba, Annona Senegalensis), enquanto no caso de resistência usavam o pó amarelo a que chamam ‘pó di massando’. Este médico também menciona o azeite de arco extraído de sementes da Croton tiglium L. como substituto para ‘os caústicos liquidos’ que os médicos europeus empregam, “com a vantagem de dar pequeno dor” xxv . Um facultativo da delegação da Junta de Saúde de Bissau cujo longo relatório anual foi publicado no Boletim Oficial da Guiné em 1886, mostra como os remédios aplicados para certas patologias já continham fármacos de origem botânica. Ao mesmo tempo faz duras criticas ao (não) funcionamento dos serviços hospitalares nas vilas devido a falta de condições, verbas, pessoal qualificado e material, que bem ilustra a importância da enumeração de dados e receituários. Para este médico goês, que também actuava como farmacêutico, o tratamento de febres biliosas hematúricas fazia-se melhora através de uma mistura de um tártaro emético com ipecacuanha (Pschotria ipecacuanha) em pó feita das folhas da planta, nativa do Brasil, em combinação com sulfato ou valerianato de quinino (Costa, 1886: 176). É o primeiro médico colocado na Guiné que reconhece, explicitamente, o valor fitoterapeutico da flora da região, lamentando a falta de informação acerca as suas variadas aplicações. “A flora guineense é riquíssima em plantas medicinais e convinha por isso e para o progresso da ciência, que fosse ela detida e escrupulosamente estudada, não me consta que de datas remotas até o presente se tenham escrito considerações mesmo ligeiras sobre tão importante assunto”. O seu principal relatório sobre o tema abrange um número “assaz limitado” de espécies, somando 41 plantas com os seus nomes vernáculos e as suas propriedades, sem contudo referir os seus nomes latinos (Costa, 1886: 183/4 & 187)

xxvi

. Na sua

maioria as entradas (ver quadros) se referem a raízes, cascas e folhas de arbustos e árvores bastante conhecidos e de uso comum na África Ocidental usados tanto por djambakós e murus como pela população em geral xxvii .. A selecção apresentada baseiase na recolha feita na Ilha de Bissau e na povoação de Geba durante um relativo curto período de permanência nestes locais, sem contudo explicar como é que foi feito. Ele exprime a esperança que os seus colegas “pela sua ilustração” e “pela sua longa permanência” continuassem o seu estudo inicial da flora, que soa a uma velada observação crítica. Dez anos antes, um dos seus antecessores, também delegado de saúde, fez observações acerca dos medicamentos usados pelos “filhos do pais” ou filhos 10

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da terra (Kr: fidjus di tchon) usam, tais como o azeite de chavé, azeite de arco etc., admitindo porém que ainda não tinha uma opinião formada sobre a sua eficácia, exceptuando resultados positivos da aplicação de azeite de arco no tratamento de úlceras no hospital de Bissau xxviii .

Quadro 1: Lista de farmacopeia guineense compilada pelo facultativo Isaac Damasceno da Costa (1886)

Nome vernáculo

Nome científico

Espécie

Partes utilizadas

Propriedades

Preparação

belenkufa (amomo)

Afromomum granum paradisi e Afromomum subsericeum

arbusto

folhas

purgante

maceração

bombatú

arbusto

raiz

tratamento de edemas

infusão

bombigentli

trepadeira

raiz

tratamento de úlceras

reduzida a pó

árvore

casca

tratamento de hemorragias uterinas e lóquios

infusão

blongojuba Mand . - biloncojeba

Morinda geminata

brai

arbusto

tratamento de cólicas associadas á menstruação.

maceração em água

sebola di lobu

semelhante a cebola albarrã,

tratamento dos panarícios

maceração

fidju di kunorga

trepadeira

raiz tuberculosa

tratamento da tuberculose linfática

maceração

ianyancufae muito comum na zona de Geba

arbusto

raiz e folhas

purgante

infusão

intulá

trepadeira

folhas

tratamento de feridas e hemostático

maceração

Jumusjungil

trepadeira

anti-reumático

infusão

Jurtu

Securidaca longipendulata

Jutú

raiz e casca

trepadeira

Kabupa

kana fistra (Fula: kunlati bangai)

arbusto

Pep:

anti-inflamatório e anti-reumático tratamento de úlceras; afugentar as cobras pelo cheiro

maceração

Mitragina stipulosa macrophyllia

arbusto

casca

purgante

infusão

Cassia sieberiana,

arbusto

folhas

tratamento de úlceras

maceração

gramínea

folhas e caule

febrífugo

infusão

arbusto

óleo das sementes

analgésico e anti-reumático

mistura com vinho tinto e gema de ovo

canafistula karta fedi ou palha alta kola (cola amarga)

Sterculiae acuminata

tratamento de doenças respiratórias, incl. bronquites

11

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos12 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

Quadro 1: Lista de farmacopeia guineense compilada pelo facultativo Isaac Damasceno da Costa (1886)

Nome vernáculo

Nome científico

Espécie

madroño maçu

Sarcocephalus latifolius.

manducu di futseru

malgeta (malagueta)

pretu

Partes utilizadas

Propriedades

Preparação

casca

tratamento de disenteria

infusão

anti-reumático

árvore parecida com a cana de açúcar Xylopia Aethiopica

árvore

sementes

analgésico, anti-reumático tratamento da cólera

e

tratamento de cólicas associadas a menstruação

óleo pó das sementes misturado com vinho tinto

mampufa

Cyperus articulatus

arbusto

raiz

prevenção das dores do ventre e tratamento de endoparasitas em crianças

mastigada

Menemenebanta Mand. menebantam-ó

Pycnanthus angolensis

arbusto

folhas

anti—reumático

infusão

nemplé

arbusto

raiz

anti—reumático

água proveniente maceração

paja di arku

arbusto

Folhas

tratamento de vermes intestinais

água proveniente da maceração

sementes

tratamento de febres intermitentes

óleo

folhas

anti—reumático

cozidas

folhas parecidas com as de papaia

analgésicos e anti-inflamatório

pasta

folhas

purgante

infusão

óleo das sementes

tratamento de úlceras

casca

febrífugo, anti-diarreico e tratamento da gonorreia

infusão / decocção

raiz

tratamento de temores e anemia

misturado com óleo de palma

casca

purgante

infusão

folhas

antídoto de diferentes venenos

infusão

folhas

anti-inflamatório gonorreia;

(palha de arco)

paja santa (palha ou folha santa

Senna ou Cassia ocidentalis?

parecida com batata doce

paja pretu (palha preta)

pó di arku (rícino)

Alchornia cordifolia,

árvore

pó di bissilón

Khaya senegalensis

árvore

pó di butonke

Fagara xantoliodes

pó di faia

Harungana madagascariens is

pó di goiaba

Scheribera chevalierii

pó di kabassera

Adansonia digitata L baobab

pó di lite

árvore

ou

Antiaris africana

e

tratamento

da

decocção

não refere a polpa da fruta que é usada para tratamento de disenteria e diarreia árvore

suco

purgante

misturado com água

12

da

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Quadro 1: Lista de farmacopeia guineense compilada pelo facultativo Isaac Damasceno da Costa (1886)

Nome vernáculo

Nome científico

Espécie

pó meladu)

Partes utilizadas

Propriedades

Preparação

casca

tratamento de úlceras

maceração

folhas

gargarejo para tratamento das úlceras da boca e de bronquites,

infusão

pó di sabon (pau de sabão,

Vernónia colorata

arbusto

folhas

tratamento da gonorreia

infusão

pó di sangi

Ptorocarpus erinaceus

árvore

folhas

tratamento de dor de dentes

água proveniente da maceração

pó di tara

Raphia sp, que pertence a família das palmae

arbusto

folhas

tratamento de úlceras

maceração

pó di veludu (Bal: N’bá, Bij: Epadu Fula: boémaio Mand: cossito

Dialium guineense Willd.

casca

anti-emético e tratamento de cólera

cozida

sapaté

Leptadenia hastata

folhas

tratamento da alienação mental

maceração

arbusto

aplicadas na cabeça

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3. MUDANÇAS DE PARADIGMAS: A ADMINISTRAÇÃO COLONIAL E A ETNOBIOLÓGIA.

Uma outra fonte coeva que descreve alguns usos e costumes da terra e um dos primeiros ensaios etnográficos sobre a Guiné, escrita por um padre católico de origem guineense, confirma a capacidade dos curandeiros locais de tratar certas doenças comuns, como “a anemia, a tísica pulmonar, e a alienação mental”, mas que não tinham curas para a lepra, as bexigas e a varíola (Marques de Barros, 1882: 714). Porém, o mesmo autor que dedicou uma parte significativa da sua obra a cosmologia dos povos da região, insurge-se contra as actividades dos curandeiros ‘fetichistas’ ou djambakós, tanto homens como mulheres, encarando-os como obstáculos a conversão e a acção civilizadora das missões (Marques de Barros, 1868, em: Dias Vicente, 1992: 441). A forte presença e influência dos sacerdotes e sacerdotizas - descritos como ‘horrorosos’ que dirigem ritos duvidosos, consultando ídolos ou chinas enquanto faziam “libações de vinho ao demónio” é contrastada com a actividade benéfica dos curandeiros islamizados, os murus. A eficácia da já referida ‘operação da pedra’ é confirmada pelo mesmo autor guineense citando numerosos casos da sua própria família (Marques de Barros, 1882: 714) e por outros médicos, mesmo que se questiona o uso de certas ‘ervas’ para tratar a ferida na fase pós-operatório. Alias, o missionário não hesita em qualificar os Mandinga como um “dos povos de toda a África mais civilizados e espertos.” (Marques de Barros, em Dias Vicente, 1992: 445). Um familiar e contemporâneo do mesmo afirma a sua admiração pelos Mandinga descrevendo-os como “a parte mais distinta, mais rica e mais civilizada da população (que) constitue por assim dizer a nobreza” (Frederico de Barros, 1885: 297). A mesma atitude perpassa as obras, tanto publicadas como de arquivo, que reflectem uma nítida distinção que lança um olhar nitidamente colonial sobre os povos da região. No caso da Guiné, esta mudança de perspectiva não é de estranhar dado a aliança política que se começa a desenhar nas últimas décadas de oitocentos entre as autoridades portuguesas e os grupos islamizadas, sobretudo os Fula e Mandinga. As referências particularmente negativas aos povos do litoral, como os Pepel, Felupe (Djola), Balanta e Bijagó e as suas crendices ‘feiticistas’ nos ‘génios sobrenaturais’ ou iran, formam um fio contínuo da literatura oito- e nove-centista. Para identificar as causas de doença associada ao feitiço ou futis através dos seus contactos com o iran, 14

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estes “feitceiros” usam o “suco de plantas altamente tóxicas” que podia provocar a morte da pessoa em questão, sendo acusados de ‘hipocrisia’ (Costa, 1886: 114) xxix . Esta distinção dicotómica entre povos mais ou menos ‘civilizadas’ ou ‘primitivas’ também caracteriza a correspondência de médicos do Serviço de Saúde, cujos ofícios estão fortemente impregnadas por noções ‘modernas’ de higiene, asseio e salubridade. O chefe de serviço de delegação da capital, Bolama, aquando disserta sobre os povos da região, sublinha que “A denominação gentio lhes e devida em toda a sua extensão da palavra, são pela maior parte idolatras, reconhecendo uns, por seu Deus, a iran, outro o Allah, estes as serpentes, aquelas (outros) animais etc.: são selvagens e (completamente) bárbaros, excepto a Mandinga, que em seus costumes mostra alguma educação.” xxx Os Mandinga, por vestirem os seus bubús, por terem uma língua escrita, por não beberem, por terem certos hábitos de higiene, por terem classes profissionais (como comerciantes, ferreiros, tecelões, carpinteiros e tintureiros, etc.) e por terem tradições imperiais na África Ocidental, são vistas como um povo ‘nobre’, ‘semi-civilizada’ e disciplinada. Além disso, são junto com os Fulas aliados no campo de batalha contra os povos ‘animistas’ e rebeldes do litoral. No que diz respeito as crenças ‘supersticiosas’ opina que “Os habitantes da Guiné, e em especial de Bolama, são indivíduos sem educação, bárbaros, e semi-selvagens, cheios de superstições, cujos costumes estão em relação com o que são e por isso preferem recorrer nas doenças a seus Irans (deuses) ou feiticeiros, do que a pessoas técnicas. Não há nada menos raro em Bolama que um feiticeiro.” xxxi A designação ‘feiticeiro’ é usada de forma indiscriminada para os curandeiros e outros agentes como sacerdotes e outros ‘grandes’ que tem um papel decisivo na vida diária das pessoas da ‘raça negra’ e lhes incutem ‘crenças supersticiosas’. Estas tomadas de posição que se tornam cada vez mais peremptórios e dominantes no discurso oficial, não inibem os autores de olhar para os Mandinga doutra forma, numa abordagem que perpassa a literatura e documentação colonial até 1974. Os preceitos da etno-biologia que já se fizeram notar nos meados do século XIX, tornaram-se regra nos relatos de médicos, missionários e funcionários coloniais nas suas descrições das tradições e modo de vida da população da região. Quanto à botânica, até a primeira década de novecentos pouco se acrescentou ás tentativas anteriores de sistematizar a botânica da região e os 15

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos16 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

seus fins fito-terapeuticas. Esta situação mudou somente após as guerras de ocupação ou “pacificação” e a implantação de uma administração colonial na Guiné, a partir de 1915. Porém, os médicos e farmacêuticos que penetram o interior da colónia, o fazem num meio que há pouco assistiu a um conflito violento onde as traumas minaram as relações entre ‘civilizados’ e ‘indígenas’ A criação das chamadas ‘residências’ ou postos administrativos em 1908 foi o primeiro passo para a implantação administrativa no interior cuja arrecadação do imposto de palhota nas zonas ocupadas levou a uma agudização destas relações. Dirigidos por militares e organizados como postos de comando, estes contudo se tornaram uma nova fonte de informação sobre as tradições dos povos sob a sua tutela. Apesar de fazer uma avaliação negativa destes devido a sua alegada “indolência inata”, os residentes se mostram optimistas acerca das capacidades de povos Islamizados como os Mandinga de se adaptarem a introdução de “novas culturas e sistemas modernos e aperfeiçoados”. xxxii Respondendo a um questionário, alguns residentes acrescentam alguns dados sobre o uso de plantas medicinais, como bissilón (febrifugo e doença de peito), senquinó ou kombetu (ou karta fede; febrifugo), chá de serruá (febrifugo), e uma erva a que os grumetes ou Kriston chamam são caetano, também febrifugo), belenkufa (purgante) além do suco do mandjambó que é usado contra a dor de dentes. Alguns residentes realçam o trabalho de curandeiros, como no caso dos Balanta, que se dedicam ao cultivo de arroz alagado, e são descritos como ‘supersticiosos’ e ‘fetichistas’, que – tal como relatado pelo facultativo quarenta anos antes - se recusam de partilhar os seus conhecimentos: “Todo o Balanta é curandeiro, tratando as doenças com beberagens de várias folhas e raízes que se negam a dizer”. xxxiii Os administradores civis que os sucedem a partir de 1917 e ocupam as sete circunscrições divididas em postos – além dos dois concelhos urbanos de Bolama e Bissau - não divergem desta abordagem ambivalente, enquanto continuam a privilegiar os povos Islamizados, com quem mantém relações mais estreitas. Pelo contrário, os povos ‘animistas’ ou ‘feiticistas’ como os Balanta, Felupe, Pepel e Bijagó são vistos como comunidades potencialmente refractários as autoridades. A chamada ‘politica indígena’ que se torna um instrumento emblemático da administração colonial a partir dos anos 20, obriga-os administradores e chefes de posto de se tornarem um espécie de ‘administradores-etnólogos’, fortemente influenciados pela chamada Escola de 16

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos17 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

Antropologia (Física) do Porto sob o égide de Mendes Correia.

Porém, a sua

preparação rudimentar e o seu conhecimento existente sobre a maioria dos povos da região continua ser muito limitado e baseado em fontes antigas e casuísticos até que se realizar o primeiro inquérito etnográfico abrangente em 1946. O primeiro projecto de recolher dados etnográficos data da criação dos Serviços de Negócios Indígenas na Guiné em 1917, inclui somente uma pergunta sobre como doenças são tratadas, sem contudo haver indícios de ter sido realizado. A primeira tentativa de recolher informações etnográficas através do questionário que serviu de base para um ‘inquérito sobre as raças da Guiné e seus caracteres étnicos’ de 1927, nos primórdios do Estado Novo, foi posto em prática mas teve um percurso algo acidentado. Num sub-capítulo sobre a ‘ciência’ que se dedica a prática da ‘medicina e a cirurgia’, consta uma pergunta acerca do uso “dos feitiços como meio de cura ou preservativo de doenças”. xxxiv Nos dois relatórios publicados, administradores de circunscrição não parecem estar, regra geral, muito bem informados ou interessados nas artes da cura ou fitoterapias. Por conseguinte costumem, sobretudo no caso dos povos ‘feiticistas’, assumir a posição de estes “atribuíram a maioria das suas desgraças ao descontentamento dos espíritos dos seus antepassados e também aos feiticeiros”. Por exemplo no caso dos Balanta focam quase exclusivamente as doenças ditos “quentes” causadas por ‘feiticeiros’, acabando por dedicar-se ao fenómeno mais exótico e estereotipado xxxv . “Há grandes feitiçarias, dizendo eles que a mais usada é a de um número elevado de feiticeiros que alta noite se reúnem convertendo-se em vários bichos, e é nessa figura que vão a casa da pessoa que desejam mal. Essa pessoa a quem a alma é tirada sem dar por isso, deve morrer logo que tenha qualquer doença. Outro feitiço consiste em ir colocar um pau ou um bocado de uma penal a porta da pessoa a quem pretendem atingir; mas é indispensável que os objectos sejam fornecidos pelo dono do ‘iran’” xxxvi . Esta ênfase sobre a feitiçaria como a principal causa de quase todos os males e a distinção entre patologias europeus e nativas, bastante comum na época, perpassa a maioria dos relatórios de médicos e administradores, tanto no caso Português como noutras colónias africanas da época. Algumas teorias focaram o processo de ‘desculturação’ a que povos nativos estavam sujeitos por causa da desintegração das suas sociedades na era ‘moderna’ xxxvii . Por conseguinte, inicialmente as listas de idioma 17

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos18 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

‘étnica’ incluídos nos inquêritos etnográficos são parcas quanto a termos associados a terapias, somente incluindo alguns termos genéricos como ‘bruxa’, ‘corpo’, ‘cadáver’, ‘curar’, ‘doente’, ‘dor’, ‘ferida’, ‘feitiço’, ‘remédio’, ‘sangue’ e ‘veneno’, sem prestar atenção a patologias ou curas especificas. O pouco que se reporta aos métodos curativos de curandeiros, denota uma forte ambivalência sendo uma mistura pouco sistematizada de curiosidades circunstanciais e uma descrença quanto a capacidade nativa para diagnose e cura. No caso dos Manjacos da Costa de Baixo a medicina praticada é caracterizada como ‘charlatanismo’, por invocar ‘o poder sobrenatural, enquanto o administrador reconhece que “por outro lado meios de tratamento que factos de todos os dias denotam de resultado”. “A medicina cinge-se a aplicação de compostos vegetais que só eles conhecem. Garantem pessoas que um napena (ou curandeiro) do regulado de Caio possue remédio contra a mordedura das cobras venenosas, cuja cura presenciaram numa mulher picada por um daqueles reptis, e já quando se encontrava em estado de coma. […] Informam-me que essa mulher ainda vive.” xxxviii Sem nunca referir a espécie, o tratamento é descrito em segunda ou terceira mão, consistindo no mastigar pelo curandeiro “de folhas de uma planta posta sobre o local da picada que antes fizera sangrar a golpes de navalha”, cuja aplicação é repetida várias vezes seguidas, até que a maceração manter a sua cor clorofila. O óleo de palmeira é referido como um grande ‘medicamento’ com propriedades antiinflamatórias e anticépticas, até o ponto de ‘(…) substituirem pensos e aplicações medicamentosas feitas nas ambulâncias de sáude, por unturas de azeite de palma e quase sempre com rápidas resultados de cura”. xxxix A observação in loco de assistência a emergências pelo pessoal administrativo contribuiu nalguns casos seguramente para uma apreciação mais positiva, por ex. no que diz respeito a capacidade de curandeiros de fazer pontos de sutura, aproveitando como fio “a nervura adelgaçada das folhas de palmeira cuja ponta rija e aguçada serve também de agulha”. É de notar de o autor desta curta etnografia manjaca ter observado a grande capacidade dos nativos de suportar as dores causados por ferimentos, suturas, curativos e talamento de fracturas, que o leva a concluir que tinham uma “resistência anormal ou por “terem uma sensibilidade física enfraquecida”. xl

18

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos19 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

No novo questionário etnográfico publicado em 1934, muito mais ampla que os anteriores, dedica-se um sub-capítulo inteiro a questões de ‘saúde e higiene’, com o objectivo de fazer um inventário das patologias mais comuns e os métodos curativos nativos, além de recolher dados sobre as suas superstições e atitudes perante os serviços de saúde da colónia. O questionário cujo preenchimento estava a cargo dos administradores e chefes de posto de cada circunscrição, incluiu perguntas sobre a actividade de curandeiros, como se distinguiram do resto da população, como eram remunerados, o seu uso de plantas medicinais, a cirurgia, e se empregavam “(…) apenas meios supersticiosos” xli As primeiras publicações baseadas nos resultados do inquérito, parecem a primeira vista lançar um olhar semelhante a aquela que predominou desde o começo das campanhas militares, se limitando quase exclusivamente ao exotismo da suposta ‘feitiçaria’ e a referências muitas vezes passageira a fitoterapias. Porém, se fazem notar algumas excepções a regra que mostram uma maior atençaõ aos povos ‘animistas’ do litoral. Os djambakós são de vez em quando retratados como sacerdotes por ex. no caso dos Felupe ou como curandeiros que se dedicam exclusivamente ao exercício da medicina, por ex. entre os Manjaco (os napena) descrito como “senhores dos segredos do uso de várias plantas.” xlii

No caso dos Pepel, referem-se certas plantas como a

palha santa (Kr: paja santa), empregada como emoliente; a canafistula (Kr: kana fistra) como balsâmico e hemostático; a raiz macerada do kuntesse (Cryptolepis sanguinolenta) como cicatrizante; o buku (buço; Combretum micrantum) como diurético; e o mampataz (Parinari excelsa) como anticonceptivo e abortivo. Isto, enquanto no caso dos Fula a actividade do murádu (os curandeiros Islamizados) revela “o seu largo uso de plantas e de ervas” além de referir o emprego de um pó “resultante da redução da casca de certa árvore com que polvilham a cabeça das pessoas sob a acção de feitiçaria” (Landerset Simões, 1935: 107). No caso dos Balanta, que foram os primeiros a merecer a atenção de médicos nos meados de oitocentos, e cuja arte de curar já foi sumariamente referida no inquérito anterior de 1927 agora tem direito a um tratamento mais amplo. “[Os Balanta] praticam a cirurgia e a medicina por forma notável. Chegam a realizar operações de alta cirurgia em que substituem partes de osso por pedaços de uma madeira […] e aplicam ventosas com perícia usando chifres de boi […] e curam a varíola metendo o doente numa cova altamente aquecida “ (Ibidem: 127) 19

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos20 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

No que diz respeito a etno-botânica, os Balanta empregam várias plantas como por ex. a canafistula (Bal: senguelé; Kr: kana fistra; Cassia sieberiana), pelas suas propriedades depurativas e uma outra espécie chamada ‘firab’me’ pelos seus efeitos purgativos.

A sua reputação é tal que os curandeiros Balanta também já foram

procurados por ‘civilizados e assimilados’ para aliviar os seus males (Ibidem: 127). O ponto de exclamação é do autor, ele próprio administrador na época, que estava bem consciente dos potenciais implicações destas visitas, sobretudo no caso dos assimilados que podiam perder o seu estatuto devido ao regresso as tradições nativas. No caso de algumas comunidades a existência de curandeiros é quase apagado pelo universo predilecto do feitiço e dos iran, como no caso dos feiticeiros Nalú (babêsse) e a dança iniciática do Machol (Ibid: 137-9). Mesmo que reconhece o facto dos Nalú conhecerem “as propriedades das plantas e delas se utilize”, o autor se limite ao uso mais apelativo dos venenos mortais (Nalú; mêrafe) que se servia em caso de guerra entre sugestões de um passado antropófago acompanhado de “rituais estranhos e diabólicas” (Ibid: 139) xliii . Por fim, entre os insulares Bijagó os curandeiros (Bij: odiagué) são muito considerados por utilizar “com mestria as propriedades medicinais de certas plantas”, enquanto “pratica a cirurgia, aplica ventosas […] e prepara cataplasmas com a pasta de um fruto que denomina omango”. 5: INVENTARIAR FITOTERAPIAS: O CASO DA MEDICINA BIJAGÓ:

O período pós Segunda Guerra terá um forte impacto sobre a maneira como era encarada tanto a ‘medicina moderna’ como a ‘medicina gentílica’ Quanto a primeira, a profissão médica “a criação de um espírito sanitário novo determinando o interesse geral de todos, por uma empresa colectiva de saneamento geral”. xliv

Por encarar a

assistência sanitária como um acto colectivo em vez de individual atribuiu-se um novo papel ao médico nos trópicos, nomeadamente como “agente social mais de que de propriamente um clínico […] indo ocupar o lugar que lhe é adstrito nas outras colónias, o de agente de penetração e persuasão” xlv . A tentativa de aproximar os médicos aos seus potenciais utentes nativos, procede como a construção nos anos trinta de tabankas enfermarias na Guiné. Estas foram baseadas nas experiências com as enfermarias- senzalas em Angola e as palhota-enfermarias em Mozambique que já as experimentou nos anos 20 xlvi . Supervisionadas por médicos que tinham servido em 20

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos21 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

outras colónias portuguesas, a criação destas novas infra-estuturas também teve razões de ordem económico, a seguir a crise mundial de 1929. Estas enfermarias que imitavam as palhotas das aldeias africanas aparecem assim como uma solução expediente mas também a uma tentativa de aproximação dos cuidados primários de saúde às populações. Porém, é de notar que o discurso oficial que as apresentava como um modelo para atrair os nativos a medicina ‘moderna’, também as viu como uma barreira contra a acção dos curandeiros. O governador da Guiné de então, um fiel seguidor do Estado Novo, enveredou por um discurso optimista dizendo que estas enfermarias: “[…] que prestam todo os serviços de enfermagem gratuitos ao indígena, que vendo-se curados contribuem grandemente para voluntariamente se apresentarem a receber curativo” xlvii . Nesta óptica “muitos preferem o médico aos mesinhos que lhes ministram os mouros”, para neste modo conseguir “salvar vidas de indígenas que estão obcecados por um fatalismo retrógado”. Nesta filosofia “[…] os seus antigos processos de curativos ministrados pelos seus “mouros” e “curandeiros” eram vistos como sendo “sempre perniciosos”. Longe de ser entendido como uma aproximação entre as duas medicinas, as tabankas enfermarias a primeira dos quais fora construída em 1933, simbolizavam o combate contra as superstições e as más práticas dos “charlatães” (Ibidem). A transformação destas tabankas-enfermarias em 1945 no principal palco da assistência prestada pela Missão do Combate a Doença do Sono, tutelada pelo Instituto de Medicina Tropical em Lisboa, serviu para aumentar a sua visibilidade e popularização, atraindo um número cada vez maior de doentes, mais de 300 mil 1952. Naquela altura, catorze tabankas-enfermarias já estavam operacionais com uma capacidade de hospitalizar 1000 doentes. Ainda nos anos 40 um relatório de inspecção louva o trabalho desenvolvido pela Missão “por ser na sua pequena e reduzida verba […] a melhor organização de estudo e trabalho que encontrei.” xlviii Ao mesmo tempo, o inspector constata que os próprios serviços de saúde organizadas em delegações sanitárias eram muito deficientes, sobretudo no interior onde muitos postos sanitários nem sequer tinham médicos ou enfermeiros mas meros serventes, cujas intervenções eram qualificadas como “mais prejudiciais que benéficas”. Uma das zonas mais remotas e menos servidos por estas enfermarias eram as Ilhas Bijagós, cuja população continuava a fiar quase exclusivamente nos seus próprios 21

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos22 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

curandeiros xlix . Curiosamente foram precisamente os Bijagós, vistos como “um dos povos menos civilizados da colónia” que se tinham mostrado muito relutante de aceitar a hegemonia colonial, cuja arte de curar foi reconhecida numa comunicação feita na ocasião da Conferência Internacional dos Africanistas Ocidentais que teve lugar em Bissau em 1947 l . O autor, o médico-antropólogo, António de Almeida, era ao mesmo tempo o inspector que produziu o relatório de inspecção acima referido que lhe permitiu conhecer melhor o território, a administração e os seus habitantes. Uma das primeiras visitas sanitárias feitas as Ilhas Bijagós nos fins do anos vinte ainda é dominado pelo contexto omnipresente do feitiço ou futis que se acaba por sobrepor a uma avaliação do trabalho preventivo e/ou curativo dos curandeiros. “O Bijagó tem os seus médicos, geralmente mulheres, mas a terapêutica é rudimentar e muito incompleta. Não lhes cura certas doenças, nem mesmo pretende curá-las. A influência dos deuses é grande na cura, como a dos feiticeiros o foi na patogenia. Não tentam curar um doente que um feiticeiro condenou. Doentes repelentes, miseráveis, nos passaram ante os olhos, vítimas inermes do poder sobrenatural do feitiço. Aí daquele que as malhas do feiticeiro prenderam e condenaram a uma doença perpétua; expiará, resignado, toda a vida, o facto pecaminoso que fez dele um farrapo mórbido” li . Num contraponto a esta abordagem, o António de Almeida cuja comunicação é o primeiro estudo antropológico sobre a fitoterapia guineense, apresenta o seu estudo como sendo “novo”, tanto “no método como nas finalidades” e o segundo crê ser “o primeiro da sua índole” que obedece a um “plano de investigação” lii . O “estudo completo da medicina popular” exigia na sua opinião a “colaboração dos clínicos, e pessoal de enfermagem das colónias portuguesas e do concurso dos seus funcionários administrativos”. Este estudo teria de ser feito em prol do “progresso da ciência, do bem-estar dos naturais e proveito dos facultativos recém-colocados nas terras ultramarinas que estavam menos familiarizados com a pratica da vida profissional no interior” liii . Aqui perpassa claramente uma noção bem diferente daquele que tanto marcou o período das campanhas militares e das primeiras décadas da actuação da administração colonial, profundamente influenciada pelo conceito da soberania politica e a antropologia física liv . Alias, o autor se posiciona claramente como defensor da ‘antropologia cultural’ que se enquadra dentro da mesma esteira ‘modernista’ do Inquérito Etnográfico de 1946. 22

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos23 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

O ensaio procede a um inventário das patologias, a etiologia e a farmacologia Bijagó, fornecendo receituários para a sua administração, realçando a colaboração de antigos governadores, administradores, chefes de posto e facultativos. Não desvaloriza os conceitos “animistas-feiticistas” e questões “mágico-religiosas” dos Bijagós que são responsabilizadas por “toda uma casta de morbos que possa possui-los”, sobretudo associados a presença de cobras venenosas nas ilhas e as lendas existentes acerca da sua acção – que alias é partilhada por muitos povos da África sub-Saariana (Almeida, 1952: 255). Contudo, tal como os seus antecessores, o autor sublinha o ‘segredo profissional’ mantido pelos curandeiros. “Os brancos da Guiné desconhecem as qualidades terapêuticas de muitas espécies florais, que os curandeiros, os ‘grandes’ e os velhos guardam no maior segredo, tão eficazes por vezes, elas se revelam me casos clínicos de prognostico reservado.” (Ibidem: 257). Não obstante estes segredos, o autor produz um inventário da farmacopeia Bijagó, enumerando 30 remédios naturais ou botânicas com os nomes vernáculos (em Bijagó mas também em Kriol) das plantas (ver quadro 2 abaixo). Fundamental para a sua percepção destes contextos culturais é a distinção entre doenças frios (medicina) e quentes (feitiçaria) que está explícito neste discurso, e que é fundamental na percepção africana – e guineense – e para uma melhor contextualização das patologias e das terapias aplicadas. “Repartem-se em dois grupos os medicamentos (unukañe) usados pelos Bijagós: remédios materiais e remédios espirituais. Entre os primeiros […] contam-se as substâncias vegetais mais comummente empregados, sob a forma de infusão, maceração, poção, afusão, loção, fricção, emplastro […]”, regra geral misturadas com água ou óleo de palma (Ibid: 257). As ditas ‘mezinhas’ como são chamadas em Kriol (o Crioulo da Guiné), não são somente aplicadas pelos odjaki ou curandeiros, mas também pelos grandes e os velhos “que os guardam no maior segredo”. O autor conclui que além da fitoterapia, os Bijagó também usam ‘remédios espirituais’ baseadas em orações (rónias em Kriol) e sacrifícios ás ‘entidades divinas’ para obter protecção e curar-se que varia tal como as ‘mezinhas’ de ilha para ilha (Ibidem: 266/7). Enquanto os odjaki são sempre do sexo masculino, as okinka ou as sacerdotizas conhecedoras também actuam com curandeiros.Porém, o autor identifica casos pontuais em que pessoas praticavam tanto a medicina curativa do facultativo como a função de sacerdote, mantendo que 23

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“sacerdotes são sempre curandeiros, jamais se verificando o inverso” (Almeida, 1947: 289)]. Nos quadros que seguem são enumerados as plantas medicinais que constam no seu relatório incluindo o seu receituário, completados com os nomes científicos e os vernáculos em Bijagó e/ou Kriol lv .

Quadro 2: Lista de farmacopeia bijagó compilada pelo médico-antropólogo António de Almeida (1947)

Nome vernáculo

Nome científico

Espécie

Banana-sancho

Uvaria chamae P

arbusto

Partes utilizadas

Propriedades

Preparação

Casca

tratamento de ténia, helmintíases

macerada e seca, em forma de pó misturado com leite

tratamento de bronquite; febrifugo.

infusão

folhas

Botango-erañá

Fagara xanthoxyloides

raiz

analgésico sobretudo caso de dores cervicais

Buku

Combretum micranthum G

folhas

diurético; tratamento de da biliosa hemoglobinúrica

Duocélio

Lippia citriodora,(P: limonete)

folhas

tratamento de diarreias em crianças.

aplicadas sobre a zona abdominal afectada

Ébèdó

Voandzeia subterranea

folhas

tratamento das cefaleias

aplicadas na cabeça e seguras com pano

folhas e flores

tratamento de diarreias sanguíneas em adultos

folhas

purgante

folhas

laxante

arbusto

no

(Mankara bijagó) Goiaba di mato goiaba

Euclinia longiflora

Jéjan-kufai

arbusto

Kabailí Kàdinùou

videira

Kadjana Kápó

Elaeis guineensis

Kamundo-kokôto

Acacia albida

árvore

Manihot esculenta C

árvore

Malgeta (Kr: pé di malgeta (malagueta)

Capsicum frutescens

Massêti

Terminália macrocoptera

arbusto

laxante

folha da palmeira

para tratar tosse e dores do peito (tal como o pó di bissilón

amarrada em volta do tórax

casca

tratamento de mordeduras de cobras

reduzida a pó

folhas

tratamento de inflamações dos olhos, conjuntivite

água da maceração

frutos vermelhos

tratamento oftálmicas

folhas lançadas dentro de água e esfregadas nos olhos

Sarcocephalus latifolius

árvore

de

doenças

aplicadas afectadas

nas

zonas

tratamento de úlceras leprosas

aplicada nas úlceras previamente incisadas com uma faca através de fricção

folhas secas

febrífugo (paludismo) e tratamento de dores corpo

Infusão, regra geral misturado com buku

raiz

Tratamento de dores do

partida em pedaços e

(Bij: Ebude) Cachamiñam

água

suco do fruto

Manihot glaziovii

Madí-pili

infusão em misturado com sal

purgante

folha Kòmandonge, komandiuke ou mandiakó (Orango) ou mandioka (Kr.)

maceração

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Quadro 2: Lista de farmacopeia bijagó compilada pelo médico-antropólogo António de Almeida (1947)

Nome vernáculo

Nome científico

Espécie

Partes utilizadas

Propriedades

Preparação

abdómen e do foro renal

seca (em infusão)

folhas

tratamento de oftalmias, catarros, febres, e inflamações da garganta, diarreias infantis, cefalalgias e como analgésico geral / de largo espectro e antiinflamatório, e também como febrifugo através de fricção

infusão

água da maceração

Kr: Madroño

Nassanó ou nòmó-kòkátè (Ilha de Uno)

Senna ou Cassia ocidentalis

planta herbácea

Kr: paja santa ou palha santa

Náxanon

Sida acuta

folhas

febrifugo infantil

Nèkená, nékènó (Kr: pau pretu ou pau preto

Dalbergia latifolia

casca e folhas

analgésico

Nopôroto (Kr: kunô di caçur

Cnestis ferruginae

folhas

tratamento de cefaleias

folhas

sudoríferos

casca

tratamento menstruais

Okanañe-okoto

dores

Khaya Senegalensis

árvore

casca

Tratamento de orquites

maceração

Oprègará (Ilhas de Caravela & Caraxe) Kr. kana fistra

Cassia sieberiana

arbusto

folhas

analgésico

maceração

Otampe (Kr: tagara P: tagarra

Alstoia congensis

casca

tratamento de gonorreia

maceração

Pó di kana (cana de bambú

Arundo donax

casca

tratamento de bubas

maceração

Pó di limón (limoeiro

Citrus limonum

folhas

tratamento oftálmicas

sumo do fruto

de

doenças

tratamento de boubas Umparanda (papaia)

Carica papaya

árvore

Uñande

de

infusão de

Okodu (Kr: bissilón

peq. árvore

forma

sumo de limão misturado com a massa fervente das raspas de cana de bambu e lama do mar

raiz

tratamento gonorreia

casca

fumigação

maceração

Untunkó (untongue)

Bridelia micrantha

arbusto

folhas.

tratamento cefaleias

infusão

Urutó (urudo

Neocarya macrophilia

árvore

casca

purgante

mascada ou chupada

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CONCLUSÃO:

O processo acima descrito de mudanças na óptica tanto de médicos como de administradores e antropólogos e as suas consequências em termos de conhecimentos de fito-terapias e a sua difusão, mostra que preceitos geo-climatologicas, etno-biologicas e médicas mas também politicas e administrativas tiveram um impacto assinalável sobre as práticas e atitudes relativa a farmacopeia nativa. As três fases aqui delineadas, passaram pelos primeiros contactos furtivos entre médicos e agentes locais na sequência da criação dos serviços de saúde nos meados do século XIX; pelas guerras de ocupação e a implantação da administração colonial nas primeiras décadas de novecentos e a introdução da medicina dita moderna, e pela fase pós-1945 quando se inicia o estudo aprofundado das sociedades africanas e a etno-botânica se começa a afirmar como uma área complementar de estudo. Enquanto a primeira é fortemente impregnada pelas tentativas de exploração e reconhecimento do território ainda sob o controlo africano, a segunda ficou marcada pela afirmação da soberania e a organização do domínio colonial, e a imposição de regras e conceitos metropolitanos. É na última fase que se fazem sentir os efeitos da mudança tanto nas ciências médicas como sociais, quando a questão da saúde começa a ser considerada como um serviço público e se torna uma parte integral dos inquéritos etnográficos. Tanto médicos e farmacêuticos, como funcionários coloniais e metropolitanos produzem progressivamente dados novos sobre regiões e povos quase desconhecidos, não sem exibir uma certa ambivalência perante costumes que chocam com certos (pre)conceitos. A desconfiança e até reticência mostrada em relação aos contactos com agentes locais, com destaque para os curandeiros, parece ter sido mútua, e é repetidamente invocada pelos funcionários como razão pela falta de informação. Também se nota uma tendência de focar nos aspectos mais exóticos, tanto da natureza tropical como da percepção das noções mágico-religiosas difundidas entre as populações nativas. Estas eram classificadas segundo distinções associadas às diferenças hipotéticas entre os seus níveis de civilização, dos povos ‘Islamizados’ e ‘fetichistas’, que por sua vez foram fortemente influenciadas pelas alianças entre as autoridades coloniais e estas últimas que se desenharam nos fins de oitocentos e o início do século XX durante as campanhas militares de ocupação.

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Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos27 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

Contudo houve excepções a regra que se destacaram pelas suas abordagens inovadoras e arrojadas, como as listas de espécies botânicas e as suas aplicações terapêuticas elaboradas em épocas diferentes pelos médicos e antropólogos acima citados. As suas contribuições denotam uma certa abertura a recolha e análise de dados no terreno, fornecendo algumas pistas valiosas acerca de patologias e fitoterapias locais. Em ambos os casos a atenção especial dada a farmacopeia africana se insere numa perspectiva ampla e pluralista perante a cultura das comunidades em questão além de um interesse profissional e pessoal pela fitoterapia. Se bem que os seus autores não revelam os métodos de investigação, o uso de nomes vernáculos para as espécies em questão e as receitas das mezinhas denota um intercâmbio com intermediários e informantes locais com conhecimento de causa.. Para tal a conhecimento do Kriol (o Crioulo da Guiné), línguas étnicas ou os serviços de intérpretes eram imprescindíveis. No caso de facultativos caboverdianos estes contactos eram facilitados pela sua língua materna, o Crioulo das Ilhas algo parecido - sobretudo no caso do dialecto de Santiago com a sua congénere guineense. O médico goês autor da primeira lista de preparações fitoterapeuticas que tal como os seus colegas do arquipélago provavelmente se sentia mais a vontade num clima tropical, contorna esta questão reproduzindo simplesmente nomes vernáculos sem adiantar mais sobre o seu significado, a difusão das espécies botânicas ou os tratamentos seguidas na região ou até como se inseriam no contexto da medicina nativa, escusando-se de “proceder a classificação científica” (Da Costa, 1886: 183). O médico-antropólogo que se inteirou da farmacologia Bijagó, reconhece estes problemas quando refere ao “dialecto muito difícil de aprender e variável na fonética e nas palavras consoante as Ilhas”, que obstaram a “colheita de elementos interpretativos ou denunciadores de conceitos” dos nativos sobre o corpo e a saúde humana lvi . Porém ao contrário do médico oitocentista, o antropólogo também fornece uma listagem do das patologias comuns, do idioma corporal na língua Bijagó, da clínica cirúrgica da obstétrica da higiene e profilaxia até sobre a deontologia profissional dos curandeiros. Além do Inquérito Etnográfico de 1946, as missões católicas, e sobretudo missionários Italianos, recolheram dados sobre as práticas dos curandeiros (por ex. Bijagó, Manjaco, Mancanhe Balanta, Fula, Felupe), de que resultaram alguns textos de valor científico lvii . A investigação na senda da chamada “etno-medicina” teve também o intuito de aprofundar o conhecimento do “pensamento nativo” e chamar atenção a sua “perspicácia e inteligência” relativo a etiologia e a arte curativa popular. Outros 27

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos28 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

investigadores, por ex. agrónomos,

recolheram nomes vernáculos da rica flora

guineense numa tentativa de actualizar e sistematizar a etno-botânica, enquanto disponibilizaram uma taxonomia científica das espécies lviii . A eclosão das guerras ultramarinas nos princípios dos anos 60 do século passado interrompeu novamente um processo de uma certa aproximação entre a ciência médica dita ‘moderna’ e ‘africana’ que só seria retomada nos anos noventa com os trabalhos de antropólogos, médicos e botânicos, por ex. a investigação desenvolvida pela equipa do IICT.

Todos os

intervenientes nestes processos complexos de recolha, taxonomia e identificação do seu uso, sublinharam o facto de a flora guineense ser ‘riquissima em plantas medicinais’ que merecem um estudo aprofundado em prol do “progresso da ciência” e para aproveitar o valor terapêutico destes remédios para os cuidados primários de saúde às populações.

i

Instituto de Investigação Cientifica Tropical, IICT, Lisboa, com apoio da Fundação para a Ciência e para a Tecnologia (FCT). ii Cartas do Ultramar, Bolama, Outubro de 1888; em As Colónias Portuguezas, ?. iii Ver Coffinières de Nordeck Voyage aux Pays dês Bagas et du Rio Nuñez, in: Le Tour du Monde, 51, 1886: 273-304, e também H. Brosselard, Voyage dans la Sénégambie et la Guinée Portugaise, in: Le Tour du Monde, 57, 1889: 97-144. iv Ver por ex. Coffinères de Nordeck, Voyage au Pays du Baga e du Rio Nunez, in: Le Tour du Monde, 51, 1886: 273-304 e H. Brosselard, Voyage dans la Sénégambie et la Guinée Portugaise, in: Le Tour du Monde, 57, 1889: 97-144. v Teixeira de Aragão, Cabo Verde, 23-6-1890, in: As Colónias Portuguezas, 3ª série, VIII, 25-7-1890. vi Veja por ex. o relato de um zoólogo alemão das suas viagens pela zona Sul da Guiné-Bissau actual: Cornelius Doelter, Ueber die Capverden nach dem Rio Grande und Futah-Djallon (Leipzig: Paul Frohberg, 1884). vii Ernesto de Vasconcellos, Guiné Portuguesa: estudo elementar de geografia física, económica e politica, Lisboa¨Tip. Da Cooperativa Militar, 1917: 53/4. viii António José Sacramento Monteiro, Relatório Agrónomico do Distrito da Guiné Portuguesa, 18921893, in: Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 20, 19-5-1894 ix António José Sacramento Monteiro, Relatório Agrónomico do Distrito da Guiné Portuguesa, 18921893, in: Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 20, 19-5-1894 x Esta expressão foi pela primeira vez usada por um diplomata português ao serviço da Comissão Mixta de Sierra Leone para verificar os acordos entre Portugal e o Reino Unido para a abolição do tráfico de escravos ao Norte do equador; ver Figanière de Mourão, . J. César Figanière e Mourão, Descrição de Serra Leoa e Seus Contornos (...)’, (Lisboa, Imp. João Baptista Morando, 1822: 38). xi Of. 253, Francisco Frederico Hopffer, Director da Delegação, Junta de Saúde, Praia, 23-4-1858; AHU, CV, Serviços de Saúde, Cx. 130. xii Januário Correia de Almeida, Um Mez na Guiné, Typ. Universal, 1859: 14/5. xiii Sobre estas campanhas e os serviços de saúde, ver Philip J. Havik, Boticas e Beberagens: a criação dos Serviços de Saúde e a colonização da Guiné, in: Africana Studia, 10, 2007: 235-70. xiv Ver António Augusto de Santa Clara, Serviço de Saúde da província de Cabo Verde, Delegacia da Junta de Saúde Publica, Bissau, 20-2-1871, AHU, Cabo Verde, Cx. 132. xv Relatório sobre a epidemia de cholera morbus que no ano de 1869 grassou no distrito da Senegambia Portuguesa, António Augusto de Santa Clara, cirurgião de 2a classe do Quadro de Saúde da Província de Cabo Verde, Bissau, Fevereiro 1877; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, Cx. 132. xvi Na altura da apresentação da comunicação que servia de base a presente ensaio, outra epidemia de cólera assolava a Guiné, sendo recorrente nesta região mas também noutras zonas da África sub-Saariana

28

Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos29 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

xvii

Ibidem (ver nota 13). Nesta região do Rio Grande se cultivava naquela época a mankara ou amendoins para exportação nas chamadas pontas, parcelas de terra a beira-rio desde os anos cinquenta de oitocentos. xviii Custódio Duarte, director do Serviço de Saúde, para o presidente do Conselho de Saúde Naval e do Ultramar em Lisboa, Praia, 6-6-1868; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 132. xix Custódio Duarte, (op. cit.?) Director do Serviço de Saúde, para o presidente do Conselho de Saúde Naval e do Ultramar em Lisboa, Junta de Saúde, Praia, 6-6-1868; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 132. xx Sobre as fomes nas Ilhas de Cabo Verde, ver António Carreira, Cabo Verde: aspectos sociais, secas e fomes do século XX, Lisboa: Ulmeiro, 1984. xxi António Augusto de Santa Clara, Relatório do Serviço de Saúde da Senegambia Portuguesa, dependência de Província de Cabo Verde, Bissau, Janeiro 1872; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 132. xxii Circular (Ibidem). xxiii Ver o uso de termos locais (sinó djangali em Mandinga; ‘númú em Crioulo de Bissau para as glândulas inchadas), até reproduzir o nome dado a intervenção em Mandinga (bero abondim a cam oló, ou ‘tirar a pedra da garganta’). ] xxiv Francisco Frederico Hopffer, Bissau, 2-4-1855, para o físico-mor da Província; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 130. Infusões de folhas e pós da casca da Khaya senegalensis foram em tempos recentes clinicamente testados, confirmando a sua apliçação como remédios para tratar disenteria e tecidos cancerígenas (refs?) xxv xxv António Augusto de Santa Clara, Relatório do Serviço de Saúde da Senegambia Portuguesa dependência de Província de Cabo Verde, Bissau, Janeiro 1872; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 132. xxvi De algumas espécies cujas nomes vernáculos (em Crioulo) constam no relatório não se conseguiu verificar os nomes científicos, q.d. no caso bombygently, fidju di kunorga, intulá, nemplé, brai, cebola do lobo, jumusjungil, menemenebanta, jutú,e ianyancufae. xxvii Fontes de referência e comparação para identificação das espécies: Pe. P.A. Biasutti Vokabulari Kriol-Purtugis, Bubaque: Missão Católica, 1987; Quintino Bancessi, Identificação de Descricção de Leguminosas e Gramíneas da Guiné Bissau, Bissau: INEP, 1991; e M.A. Diniz & E.S. Martins, Nomes Vernáculos de Plantas da Guiné Bissau: I Contribuição, in: Garcia de Orta, Série Botânica, Lisboa, 15, 1, 2002: 17-53. xxviii Domingos Joaquim de Menezes, delegado de Saúde, Relatório Anual do Serviço de Saúde Publica em Bolama no ano de 1872, Bolama, 6-3-1873; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 133. xxix O juramento com água vermelha, feita com a casca de mancône (Erithropleum guineensis), para identificar feiticeiros, é já referido em relatos de viagens do século XVI, por exemplo no ‘Tratado Breve’ de André Álvares de Almada (1594). xxx Domingos Joaquim de Menezes, delegado de Saúde, Relatório Anual do Serviço de Saúde Publica em Bolama no ano de 1872, Bolama, 6-3-1873; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 133. xxxi Ibidem, Domingos Joaquim de Menezes, P. 133. xxxii José António Castro Fernandes, Relatório da Residência de Buba,in: Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 2, 30-9-1911. xxxiii Sebastião Luís de Miranda Pereira, Relatório, Posto Militar de Goly (Porto Gole), 6-2-1910; Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 27-4-1912 (Anexo 1). xxxiv Questionário de inquérito sobre as raças da Guiné e os seus caracteres étnicos, Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 17, 26-3-1927. Apesar de se ter publicado um questionário em 1917, não se encontrou até agora vestígio algum das respostas nos arquivos. xxxv Sobre estas abordagens antropológicas das sociedades africanas que se centraram nas várias formas de feitiçaria, ver E.E. Evans Pritchard Witchcraft, Oracles and Magic among the Azande (Oxford: Oxford University Press, 1937). xxxvi Alberto Gomes Pimentel, Resposta ao Questionário de inquérito sobre as raças da Guiné e seus caracteres étnicos […] acerca da Circunscrição Civil de Mansoa’, Julho 1927; Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 50, 10-12-1927: . xxxvii Sobre esta corrente de pensamento, ver Megan Vaughn, Curing their Ills: colonial power and African illness (Londres: Polity Press, 1991): 100-28. . xxxviii Vítor Hugo de Menezes, Resposta ao Questionário de inquérito sobre as raças da Guiné e seus caracteres étnicos […] acerca da Circunscrição Civil de Costa de Baixo, 10-9-1927; Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 3, 21-1-1928.

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Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos30 Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) ____________________________________________________________________________________________________

xxxix

Vítor Hugo de Menezes, op cit. Vítor Hugo de Menezes, op cit. xli Questionário Etnográfico, Jorge Frederico Velez Caroço, Direcção dos Serviços e Negócios Indígenas, Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 20 (Apenso), 14-5-1934. xlii Landerset Simões, Babel Negra, Ed. do autor, 1935: 34 & 49. . xliii Sobre a medicina Nalú numa perspectiva pós-colonial, ver Amélia Frazão Moreira, Apropriação Social da Natureza entre os Nalú da Guiné, tese de doutoramento, ISCTE, Lisboa, 1999. xliv Eurico de Almeida, Da Assistência Médica as Indígenas na Colónia da Guiné Portuguesa, Bolama: Imprensa Nacional, 1935. xlv Ibidem. xlvi Ver Philip J. Havik, Potions and Politics: Indigenous Practices, Health Services and Colonial Administration in Portuguese Guinea’ (no prelo) xlvii Colónia da Guiné, Relatório referente ao 4º trimestre do ano económico 1933-34, Bolama, 12-121934; AHU, DGCOcd, 400 xlviii Relatório do Inspector Superior, Dr. António de Almeida, Lisboa, Maio de 1949; AHU, ISAU. xlix Um dos primeiros estudos antropológicos das Ilhas, foi feito pelo etnólogo austríaco Hugo Bernatzik que publicou os resultados das suas deslocações na Guiné como Aethiopien dês Westens: forshungsreisen in Portugiesisch Guinea (Vienna: Seidel & Sohn, 1933) l António de Almeida, Da Medicina Gentílica dos Bijagós, in: Conferência dos Africanistas Ocidentais, 2ª Conferência, Lisboa: Junta de Investigações Coloniais, 1952: 243-92. li José Vitorino Pinto, Relatório sobre uma visita sanitária feita aos Bijagós, Direcção dos Serviços de Saúde e Higiene, Bolama: Imprensa Nacional, 1928. lii António de Almeida, Da Medicina Gentílica dos Bijagós, in: Conferência dos Africanistas Ocidentais, 2ª Conferência, Lisboa: Junta de Investigações Coloniais, 1952: 243-92. liii Relatório do Inspector Superior, Dr. António de Almeida, Lisboa, Maio de 1949; AHU, ISAU. liv Ver por ex. J.A. Pires de Lima, C. Mascarenhas & J. Santana Barreto, Contribuição para o Estudo Antropológico da Guiné Portuguesa, Coimbra: Imprensa da Universidade, 1932. liv António de Almeida Da Médica Gentílica dos Bijagós: 250 liv Ver por ex. António Scarpa, Pratiche Mediche di Alcune Tribú della Guinea Portoghese, in: Estudos sobre a Etnologia do Ultramar Português, Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1960: 157-81. liv Ver J. do Espírito Santo, Nomes Vernáculos de algumas Plantas da Guiné Portuguesa, Estudos, Ensaios e Documentos, Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1963. liv Por vezes as mesmas plantas tem vários nomes, tal como certas partes da mesma espécie, além dos informantes não usaram termos uniformes e a terminologia não ser igual em toda a região; ver Diniz et al (2002): 17. xl

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