Vulnerabilidade dos bancos naturais de mexilhões Perna perna na Baía de Santos

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SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE CIÊNCIAS INTEGRADAS DA UNAERP CAMPUS GUARUJÁ Vulnerabilidade dos bancos naturais de mexilhões Perna perna na Baía de Santos. Nathalia de Sousa Motta Acadêmica em Oceanografia Centro Universitário Monte Serrat – UNIMONTE – Santos/SP [email protected] Julia Alves Costa Acadêmica em Biologia Marinha Universidade Santa Cecília – UNISANTA – Santos/SP [email protected] Pedro Mestre Ferreira Alves Assistente Técnico Instituto de Pesca – Santos/SP [email protected] Luiz Miguel Casarini Pesquisador Científico Instituto de Pesca – Santos/SP [email protected] Este simpósio tem o apoio da Fundação Fernando Eduardo Lee

RESUMO: O mexilhão Perna perna ocorre na zona entremarés nos Oceanos Atlântico, Índico e no Mar Mediterrâneo. Os estoques em banco natural desse bivalve podem ser afetados pela atividade extrativista e por outros fatores antrópicos. O método do fotoquadrado minimiza o esforço na obtenção de dados em campo, além do registro digital permanente. O objetivo deste estudo foi estimar, por meio de fotoquadrados e do software CPCe®, o estoque de P. perna na zona entremarés, em banco natural na Ilha das Palmas (SP) em janeiro de 2011. O estoque foi estimado através das contagens dos mexilhões, a partir das imagens dos fotoquadrados e para dimensionar os trechos ocupados pelo bivalve, foram adquiridas imagens digitais expondo régua de referência para posterior calibração do software e medição das áreas. O estoque de P. perna foi estimado em 34.191 indivíduos.m-². A mortalidade natural observada nas imagens dos fotoquadrados foi de 2.780 indivíduos, enquanto a mortalidade por extração foi de 17.599 indivíduos, resultando na mortalidade total de 20.379 indivíduos. A atividade extrativista intensa e ilegal pode afetar negativamente os estoques de P. perna. A metodologia aplicada foi eficiente na estimativa do estoque, na detecção e quantificação da mortalidade natural e aquela causada pela extração. Palavras-chave: Bivalves, Estimativa estoque, Fotoquadrado. Seção 2 – Curso de Oceanografia – Meio Ambiente

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Apresentação: oral. 1. Introdução O habitat costeiro é considerado ambiente de transição entre a zona terrestre e marinha, tornando-se um ecossistema de grande relevância ecológica e socioeconômica, além de ser um dos ambientes mais produtivos (Coutinho, 2002; Almeida, 2008). Os padrões de distribuição dos organismos nos costões rochosos levaram ao desenvolvimento de vários modelos de zoneamento (Araújo et. al., 2005). Esse zoneamento é formado a partir da capacidade adaptativa dos organismos, que podem estar relacionada a fatores bióticos (competição, predação) e/ou abióticos (dessecação, marés) (Almeida, 2008). A zona entremarés, faixa entre as marés mais altas e baixas, é a área com maior aglomeração de espécies (Garrison, 2010). Os organismos que habitam essa faixa precisam ser capazes de suportar grandes períodos de seca, variação de temperatura e a ação das ondas (Garrison, 2010; Rodrigues, 1967). O mexilhão Perna perna é originário da África e ocorre em regiões tropicais e subtropicais dos Oceanos Atlântico e Índico e no Mar Mediterrâneo (Lopes et. al., 2009). Na costa sul americana esse bivalve ocorre desde a Venezuela até o Uruguai, e habita as faixas do médio e infralitoral (Narchi e Galvão-Bueno, 1997). Silva e Coutinho (2005) observaram que em ambientes expostos, o embate de ondas aumentou a distribuição vertical dos organismos. De acordo com Masi e Zalmon (2008) o P. perna possui maior abundância e apresenta, em costões expostos a ação das ondas, maior distribuição vertical ocupando as faixas do infra e mediolitoral. Entretanto em locais abrigados, a espécie ocupa as faixas do infralitoral e possui distribuição descontínua. O extrativismo é geralmente realizado nos organismos que vivem fixados nos costões, entre eles mexilhões, ostras para alimentação; e algas utilizadas para consumo, cosméticos, além de entre outros produtos (Almeida, 2008). A mitilicultura é alternativa para pescadores que não conseguem meios suficientes para subsistência. A extração do mexilhão em bancos naturais se torna permitida para essa prática, fora do período de defeso, e quando os bivalves atingem comprimento total superior a 50 mm (Brasil, 2003). As avaliações dos estoques de P. perna nos bancos naturais geralmente são realizadas com uso de delimitadores (quadrados) seguido da extração dos bivalves para contagem e biometria em laboratório (Casarini e Henriques, 2011; Macedo et. al., 2006). O método de fotoquadrados é mais vantajoso do que o método do quadrado, por tornar a aquisição dos dados mais rápida e eficiente (Macedo et. al., 2006; Pech et. al., 2004). A praticidade e eficiência desse método proporcionam velocidade suficiente para que a estimativa do estoque de P. perna em banco natural ocorra de maneira consistente. Por ser uma ferramenta que proporciona agilidade nas estimativas, esse método, além de não ser invasivo, pode auxiliar na tomada de decisões tanto por parte das autoridades do gerenciamento ambiental como da pesca (Casarini e Motta, 2011). O objetivo deste estudo foi estimar, através do método de fotoquadrado e com o software Coral Point Count with Excel

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extensions (CPCe®) o estoque de Perna perna fixado na região do mediolitoral do banco natural na Ilha das Palmas em janeiro de 2011. 2. Materiais e Métodos A área de estudo compreende o banco natural de mexilhões P. perna da Ilha das Palmas, localizada na porção leste da baía de Santos (Figura 1). As aquisições das imagens digitais do banco de mexilhões ocorreram no mês de janeiro de 2011 durante maré de sizígia, onde também foram obtidas imagens a partir de fotoquadrados.

Figura 1. Mapa da baía de Santos, em destaque a área de estudo. O fotoquadrado foi construído em cloreto de polivinil (PVC) de 0,25 m², similar a Preskitt et. al. (2004), acoplado ao suporte para câmera digital SONY® modelo Cyber-shot, 7,2 mega pixels, full HD, lente Zeiss 2,85,8/5,35-21,4. A distância focal de 0,75 m foi ajustada considerando a inclinação local no costão para determinar o melhor ângulo de visão da objetiva quando são adquiridas imagens digitais do objeto focalizado sobre a área de 0,25 m² (Casarini e Motta, 2011). A malha amostral realizada, na porção mediolitoral, com mínimo de três fotoquadrados (Figura 2), foi aleatória. Nas imagens digitais foram realizadas contagens separadas dos mexilhões vivos e mortos nos fotoquadrados de cada trecho (Santos et. al., 2005). Os mexilhões que permaneceram fixados no costão rochoso, porém estavam com as valvas abertas foram considerados como mortalidade natural devido à predação ou doença. A partir das contagens dos mexilhões, obteve-se a densidade média conforme, Casarini e Henriques (2011), padronizada em 1,0 m² com o respectivo intervalo de confiança (95%) (Henriques e Casarini, 2009). Dessa forma, a estimativa do estoque de P. perna foi obtida pelas médias dos

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indivíduos contados nos fotoquadrados e ampliada para área ocupada de cada trecho (Casarini e Henriques, 2011), como segue: Densidade Dik = (Medijk* Aik), onde: Dik = densidade total dos bivalves i, do trecho k; Medijk = média do número de bivalves i nos fotoquadrados j do trecho k; Aik = área (m2) ocupada pelos bivalves i, no trecho k.

Figura 2. Imagem do fotoquadrado com mexilhões Perna perna, no mês de janeiro de 2011. Foram adquiridas imagens digitais dos trechos, do banco natural de P. perna, em toda sua extensão a partir de pontos notáveis georreferenciados, com marcações de solo, expondo régua de referência com 1,0 m de comprimento. Posteriormente, a partir da aquisição dessas imagens digitais, foi realizada a calibração do software Coral Point Count with Excel extensions® (CPCe) (Kohler e Gill, 2006) para medir a área de cobertura pelo mexilhão em cada trecho. 3. Resultados Os valores médios do número de indivíduos, porcentagem de mortos e a média corrigida com o intervalo de confiança são apresentados na Tabela 1. A área ocupada pelo bivalve foi de 102,91 m², e o estoque estimado para todo o banco natural para o mês de janeiro foi de 34.191 indivíduos.m-². No início do mês de janeiro foi observada a ocorrência da extração dos mexilhões no banco natural pela atividade extrativista totalizando 53,84 m² de área raspada.

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Tabela 1. Média do número de indivíduos (Nº Ind), porcentagem de mortalidade natural (%M), média corrigida (Média Co), densidade (indivíduos.m-2), densidade da área raspada (indivíduos.m-2), intervalo de confiança (IC 95%), área (m2), área raspada (m²) de P. perna, em janeiro de 2011. Parâmetros Média Nº ind. %M Média Co Nº ind. Área (m2 ) Densidade Área Raspada (m2 ) Densidade A. raspada (indiv.m-2 )

Valores 84,20 1,35 83,06 102,91 34.191 53,84 17.889

IC 95% 66,81 : 101,59 65,84 : 100,28 27.102 : 41.279 14.180 : 21.597

A Figura 3 mostra a imagem gerada pelo software CPCe® para determinar a área do trecho do banco natural onde ocorreu a mortalidade por extração.

Figura 3. Trecho do banco natural de mexilhões P. perna. A – trecho sem a mensuração com o software. B – quantificação (8,03 m²) da mortalidade por extração. O valor de 1,35% da mortalidade natural contada nas imagens dos fotoquadrados corresponde a 2.780 indivíduos para toda ilha (Tabela 2). A

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mortalidade por extração foi cerca de oito vezes superior à mortalidade natural. Tabela 2. Mortalidades em números indivíduos ocorridas em janeiro/2011. Mortalidades Natural Extração Total

de

Indivíduos 2.780 17.559 20.379

4. Discussão Além de ser mais eficiente que o método convencional, o método do fotoquadrado permite estimativas mais precisas e o registro permanente dos dados possibilita análises futuras (Macedo et. al., 2006; Preskitt et. al., 2004). Outra vantagem é não ser um método invasivo ao ambiente. O CPCe® aumenta a eficiência e facilita nas análises de imagens digitais (Kohler e Gill, 2006). A aplicação do software com essas características possibilitou que o dimensionamento do banco natural fosse obtido de maneira prática e eficaz. Casarini e Motta (2011) utilizaram o CPCe® para comparar a diferença da área ocupada pelo P. perna, no inverno e primavera. Esses autores observaram diferença de densidade de, aproximadamente, três vezes entre as estações, possivelmente causada pelo embate de ondas de grande intensidade e frequência. De acordo com a Tabela 1, o estoque estimado para a Ilha das Palmas foi de 34.191 indivíduos/m², enquanto Casarini e Henriques (2011) estimaram para a mesma espécie, 49.364.656 indivíduos, fixados em aproximadamente 5% dos costões rochosos localizados no lado leste da baía de Santos. Henriques e Casarini (2009) observaram que a densidade média do P. perna, na Ilha das Palmas, variou de 1.625 a 3.875 indivíduos.m-², com comprimento teórico máximo (L∞) de 146,4 mm para mexilhões do mediolitoral. A mortalidade natural do mexilhão P. perna ocasionada pela predação do gastrópode Stramonita haemastoma tende a ser menor em locais com maior ação das ondas (Masi e Zalmon, 2008). Esse gastrópode poderia ser o agente causador de parte da mortalidade natural obtida nesse estudo, pois em várias imagens dos fotoquadrados foi possível observar pequenos orifícios arredondados nas valvas abertas. A Instrução Normativa nº105 (Brasil, 2006) considera que a extração de mexilhões com comprimento total inferior a 50 mm (sementes), principalmente para atender a demanda de cultivos, tem gerado a depredação os estoques naturais de mexilhões P. perna. A má utilização das sementes, pela falta do manejo adequado de malacocultores, aumenta a demanda pela obtenção das mesmas nos bancos naturais (Brasil, 2006), gerando maiores taxas de mortalidade por extração.

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A extração de 53,84 m² (Figura 3 e Tabela 2), mesmo fora do período de defeso (1 de setembro a 31 de dezembro), pode ser prejudicial para a manutenção dos estoques naturais. Casarini et. al. (2010) encontraram picos de contaminação bacteriológica nas análises de água e carne do mexilhão P. perna da baía de Santos. A contaminação das águas somada a atividade extrativista são fatores causados pela ação antrópica que podem ser prejudiciais para os estoques desse bivalve. Para o estabelecimento do período de defeso também devem ser considerados, além dos aspectos reprodutivos, os efeitos causados pelo ambiente nos bancos naturais (Casarini e Motta, 2011). Seria interessante que outros estudos avaliassem os efeitos do clima e do ambiente nos estoques naturais de P. perna. O efeito negativo causado pela extração excessiva, sem o gerenciamento adequado, pode afetar negativamente a recuperação dos estoques. Por esse motivo a rápida estimativa dos estoques, a partir do método de fotoquadrado, se torna necessária para o gerenciamento adequado da espécie. 5. Conclusão A estimativa do estoque de P. perna utilizando o método do fotoquadrado e a aplicação do software ocorreu de forma rápida e eficiente. A mortalidade dos mexilhões pela atividade extrativista foi aproximadamente oito vezes maior do que a natural. A extração excessiva e ilegal pode ser danosa na recuperação dos bancos naturais, que provavelmente já são afetados pelos agentes ambientais. 6. Referências Bibliográficas Almeida, V. F. 2008. Importância dos Costões Rochosos nos Ecossistemas Costeiros. Cadernos de Ecologia Aquática 3 (2). Araújo, R., I. Bárbara, I. Sousa-Pinto e V. Quintino. 2005. Spatial Variability of Intertidal Rocky Shore Assemblages in the Northwest Coast of Portugal. Estuarine, Coastal and Shelf Science 64.658-670. Brasil. 2003. Portaria nº 9, de 20 de março de 2003. Brasília: Ministério do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Brasil. 2006. Instrução Normativa nº105, de 20 de julho de 2006. Brasília: Ministério do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Casarini L. M., M. B. Henriques, R. Graca-Lopes e M. R. Souza. 2010. Chemical and bacteriological evaluation of the water and mussels from Santos bay, São Paulo, Brazil. Rev. Inst. Adolfo Lutz. São Paulo. 69(3):297303. Casarini L. M. e M. B. Henriques. 2011. Estimativa de Estoque do Mexilhão Perna perna e da Espécie Invasora Isognomon bicolor em Bancos Naturais da Baía de Santos, São Paulo, Brasil. Bol. Inst. Pesca, São Paulo, 37(1): 1 – 11. Casarini, L. M. e N. S. Motta. 2011. Estimativa da Mortalidade Natural de Mexilhões Perna perna Associada as Frentes Frias na Baía de Santos. V Simpósio Brasileiro de Oceanografia. Santos-SP. Brasil.

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