ZEIS em Fortaleza: a insustentabilidade do instrumento diante das pressões exercidas pelo mercado imobiliário

July 27, 2017 | Autor: Lara Furtado | Categoria: Mercado Imobiliário, Geographic Information Systems (GIS), ZEIS
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Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

ZEIS em Fortaleza: a insustentabilidade do instrumento diante das pressões exercidas pelo mercado imobiliário Fernanda Cavalcante (1) Lara Sucupira (2) Naggila Frota (3) Renan Marinho (4) (1) Dep. de Arquitetura e Urbanismo da FAU, UFC, Brasil. E-mail: [email protected] (2) Dep. de Arquitetura e Urbanismo da FAU, UFC, Brasil. E-mail: [email protected] (3) Dep. de Arquitetura e Urbanismo da FAU, UFC, Brasil. E-mail: [email protected] (4) Dep. de Arquitetura e Urbanismo da FAU, UFC, Brasil. E-mail: [email protected] Resumo: O objetivo dessa pesquisa é monitorar o uso das Zonas Especiais de Interesse Social desde que foram definidas no Plano Diretor Participativo de Fortaleza em 2009. Diante de um contexto de desigualdade social e dificuldade dos governos em adquirir moradia adequada e bem localizada para todos, esse instrumento constitui uma reserva de terra urbanizada para o uso de Habitação de Interesse Social. Entretanto, ao avaliar o caso de Fortaleza, percebe-se que sua sustentabilidade é questionável, uma vez que o mesmo tem seu papel reduzido em função das pressões exercidas pelo mercado imobiliário local. Palavras-chave: ZEIS; Mercado Imobiliário; Especulação; Geoprocessamento Abstract: The goal presented in this paper is to question how sustainable a determined public mechanism is being, considering that its effectiveness has been prejudiced in face of pressures created by local real estate market. This will be accomplished by keeping track of Special Zones of Social Interest (Zonas Especiais de Interesse Social - ZEIS) since included in Fortaleza`s urban plan in 2009. Considering how difficult is has become for governments to guarantee well served housing for everyone, the ZEIS, if properly implemented, could be eficiente in such matter. Keywords: ZEIS; Real Estate Market; Speculation; GIS 1. INTRODUÇÃO No Brasil, os assentamentos precários surgiram como solução habitacional, caracterizando o mercado informal e tornando-se a forma predominante de moradia popular no país. Nas décadas de 80 e 90, diante de um cenário de crise econômica e escassez de recursos públicos para as atividades imobiliárias, o mercado imobiliário passa a produzir prioritariamente para as classes alta e média-alta. Com a aprovação do Estatuto da Cidade em 2001, o governo busca aplicar uma política de subsídios à habitação de interesse social, atraindo investimentos do mercado privado. O surgimento das Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) como instrumento da política urbana habitacional aconteceu a partir de iniciativas isoladas de alguns governos municipais que visam implantar infraestrutura adequada, regularizar áreas de assentamentos e garantir a posse da terra aos moradores. Juridicamente, as ZEIS são destinadas ao uso habitacional para a população de baixa renda, que devem ser delimitadas pelo Plano Diretor (PD) ou outra lei municipal. A inclusão desse instrumento no Estatuto da Cidade e a sua adoção por parte de alguns municípios representam um grande avanço na garantia do direito à moradia e à cidade. Na Região Metropolitana de Fortaleza, a produção referente ao mercado imobiliário formal se concentra nos bairros onde estão localizadas as faixas de alta renda, restritos à zona central e bairros adjacentes, ao vetor leste-sudeste e ao espaço litorâneo. O mercado imobiliário formal corresponde a uma parcela muito pequena da produção imobiliária do município, que tem a sua maior parte produzida de maneira informal (FREITAS e PEQUENO, 2011). 2. OBJETIVO O objetivo dessa pesquisa é monitorar o uso das ZEIS desde que foram implementadas no Plano Diretor Participativo de Fortaleza (PDPFor) em 2009. Através de estudos, busca-se avaliar a eficiência do mecanismo, abrangendo desde os trâmites na câmara na elaboração do PDPFor até o real impacto que a ZEIS causa na cidade após sua implementação, para que outros municípios usem a experiência de

Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

Fortaleza como referência. Essa pesquisa vem acontecendo há um ano e aqui serão apresentadas as conclusões dos resultados obtidos, até o presente momento, que se mostram relevantes para nortear as próximas etapas. 3. JUSTIFICATIVA O PDPFor, em processo de elaboração desde 2003, vem representando avanços ao permitir a participação popular nos processos decisórios de políticas públicas. Por outro lado, alguns dispositivos previstos não cumpriram os objetivos pretendidos, como regular o uso e ocupação do solo, garantir o direito à cidade e implementar a função social da propriedade. Ao analisar como as ZEIS estão sendo ocupadas, percebeuse em alguns casos retrocessos da concepção inicial de que o instrumento seria um potencial agente de contenção da especulação imobiliária. Um dos desafios é que os polígonos delimitados necessitam ser demarcados no PD e cada um regulamentado individualmente de acordo com as especificidades das comunidades. Esse processo de regulamentação deve ser considerado prioridade na política pública municipal, uma vez que, conforme o art. 312, § 2º da Lei Complementar 62 de 2009 que instituiu o PDPFor, as ZEIS perderão 5% de seus limites a cada seis meses que não forem regulamentadas. Para a efetiva construção de Habitações de Interesse Social (HIS) e ocupação ordenada dessas áreas, deve-se constar no PD os parâmetros urbanísticos de cada local, de modo que as tipologias tenham características e conformações para baixa renda. 4. MÉTODO EMPREGADO Para estabelecer conclusões sobre as influências exercidas pelo Mercado Imobiliário nas ZEIS, a metodologia se estruturou nas seguintes etapas: - Coleta e análise de estudos de caso, através de pesquisas de matérias publicadas em jornais locais; - Participação de audiências públicas que tratassem do assunto; - Coleta e análise de dados referentes ao valor do solo utilizando o índice FIPE ZAP; - Espacialização das modificações referentes à localização e dimensão das áreas de ZEIS durante os trâmites de elaboração do Plano Diretor, com o auxílio de uma ferramenta de geoprocessamento. 5. RESULTADOS OBTIDOS Em 2006 foi proposto no PDPFor um primeiro mapa com a delimitação de ZEIS de vazios, sendo somente em 2009 aprovados os polígonos finais. Ao sobrepor as propostas, utilizando uma ferramenta de geoprocessamento, foram constatadas algumas alterações que consistiram na subtração de polígonos de localizações centrais e infraestruturados e na adição de outros em regiões periféricas, como reflexo das pressões exercidas pelo mercado imobiliário. Na FIGURA 1, percebe-se que Fortaleza apresentava 20 polígonos em 2006, aumentando para 34 em 2009. Entretanto, isso não significa uma alteração quantitativa, uma vez que a dimensão dos aprovados demonstra um discreto aumento na área total, cerca 2,5%. A TABELA 1, composta por dados coletados do índice FIPE ZAP, indicador de preços de imóveis, compara os valores do solo dos bairros contemplados com ZEIS e comprova que o acréscimo de área se deu em regiões menos privilegiadas, enquanto as áreas localizadas nos bairros mais valorizados foram subtraídas. Nos bairros Cocó, Centro e Castelão, que apresentaram preços mais elevados, as ZEIS foram retiradas, enquanto que Cajazeiras, Montese e Álvaro Weyne, com menores preços, receberam polígonos. BAIRRO

PREÇO m² (R$)

BAIRRO

PREÇO m² (R$)

Cocó

3986,00

Cajazeiras

2236,00

Centro

3661,00

Montese

2031,00

Papicu

3011,00

Álvaro Weyne

1890,00

TABELA 1 – Preços do m² por bairros de Fortaleza. Fonte: site do FIPE-ZAP (2011, julho).

Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

FIGURA 1 – Polígonos de ZEIS de vazios antes e depois de sua aprovação. Fonte: organizado pelos autores(2012).

A ZEIS do bairro Cajazeiras é um exemplo de uma zona bem localizada que foi alterada mesmo após sua aprovação no PDPFor. Através de votação na Câmara, toda a área deixou de ser considerada ZEIS, para dar lugar à construção da Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Controle Urbano dentro de parte de seus limites, ilustrando ineficiência da própria prefeitura em garantir a sustentabilidade das ZEIS. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS O mecanismo da ZEIS tem origem na necessidade da existência de terrenos bem localizados na cidade com preços acessíveis para as classes menos favorecidas. Esta condição é capaz de diminuir a segregação urbana por meio da maior interação entre diferentes classes sociais, reduzir os custos governamentais de fornecer infraestrutura para áreas afastadas e, em última instância, promover ascensão social. A periferização das ZEIS em Fortaleza, juntamente com o dispositivo de diminuição dessas áreas com o tempo, revela uma pressão para a não instalação de HIS em regiões valorizadas evidenciando a não sustentabilidade do instrumento. A fim de acompanhar a movimentação de capital nas áreas de ZEIS, após a aprovação no PDPFor, será utilizado o Imposto sobre Transferência de Bens Imóveis que possibilitará identificar casos de compra e venda de terrenos nessas zonas, se houve redução de valor, enfim, se o instrumento está cumprindo seu propósito. Como conclusão, é possível afirmar que as comunidades, se motivadas, podem exercer papel fundamental na reivindicação da regulamentação das áreas. A comunidade do Lagamar em Fortaleza, é um exemplo positivo de organização popular na busca da correta efetivação de áreas que são de interesse local. Os órgãos municipais devem capacitar técnicos e gestores que agirão como agentes reguladores das políticas públicas. Finalmente, é importante que o poder público viabilize empreendimentos privados nessas áreas, atraindo o mercado imobiliário para obras favoráveis à comunidade que consolidem HIS no local e atendam à real demanda por habitação. 7. BIBLIOGRAFIA FREITAS, Clarissa; PEQUENO, Renato. Produção Habitacional na Região Metropolitana de Fortaleza na década de 2000: Avanços e Retrocessos. Fortaleza, 2011. FREITAS, Clarissa; PEQUENO, Renato. Desafios Para Implementação de Zonas Especiais de Interesse Social em Fortaleza. Fortaleza, 2011. CASTRO, Carolina Maria Pozzi de; SHIMBO, Lucia Zanin. O “Padrão Econômico” da Habitação: Construindo uma Trajetória de Mercado. XIV Encontro Nacional da ANPUR. Rio de Janeiro, 2011. FORTALEZA, Prefeitura Municipal de. Plano Diretor de Fortaleza (Lei 062/2009), 2009.

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