“A industria de Cruzeiros: negacao de hospitalidade”.

July 13, 2017 | Autor: M. Korstanje | Categoria: Sociología
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Cruzeiros Turísticos: uma perspectiva sistémica e multidisciplinar

Capítulo 7 A indústria de Cruzeiros: negação da hospitalidade Korstanje Maximiliano

Resumo O capítulo explora as concepções modernas de hospitalidade e mobilidade destacando-se por sua perspectiva crítica. Sendo a hospitalidade uma instituição que promove o contato, e o risco a partir do contato entre estranhos, os luxuosos transatlânticos de cruzeiros representam o fim da hospitalidade. Estes dispositivos não permitem um contato genuíno uma vez que reduzem o risco ao máximo possível. Não obstante, todo risco implica um perigo mínimo em relação ao outro. Quando se busca a segurança máxima ou o risco-zero, vai-se direto a uma catástrofe. É por esse motivo, que os grandes transatlânticos proporcionam um ambiente favorável para a ocorrência de um desastre quando pequenos erros não podem ser regulados. Não apenas o Costa Concórdia como o Titanic e outros desastres marítimos. Palabras Claves: Risco, Cruzeiro, Hospitalidade, Perigo, Turismo, Mobilidade.

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Objetivos do Capítulo 1. Os objetivos do capítulo abordam a exploração das raízes antropológicas da modernidade e a hospitalidade com a finalidade de assentar as bases para uma leitura crítica o contato turístico bem como fornecer uma abordagem ou modelo que supere aqueles vigentes na segurança em cruzeiros turísticos.

INTRODUÇÃO A modernidade e a globalização têm criado cidades móveis que não têm uma adscrição cultural definida, mas se articulam por meio de diversas paisagens e cenários. Em perspectiva, a mobilidade tem se transformado nos últimos anos em um termo amplamente utilizado nos mais diversos campos das Ciências Sociais. A mobilidade é, nesses tempos, um paradigma pelo qual se acessa a plataforma da modernidade. Para Oswin e Yeoh, a mobilidade está estreitamente ligada a modernidade e ao fim do Estadonação clássico. O termo mobilidade nos faz pensar em fluxos migratórios e turísticos bem como na infraestrutura necessária para suportar as viagens. Os lugares onde predominam uma alta mobilidade se encontram marcados por uma constante negociação identitária e de configuração existencial. Este movimento sempre para frente encerra a lógica do poder desterritorializado que altera substancialmente a maneira como percebemos o movimento (OSWIN e YEOH, 2010). Contrariamente, Lash e Urry consideram que a mobilidade deve ser compreendida como um produto cultural que busca por meio de uma narrativa específica, na maioria dos casos a literatura, afiança uma dependência cultural entre as diferentes nações. Na multiculturalidade, inclusive, existe uma divisão suficientemente bem definida entre países com alta e baixa mobilidade, pela qual se acede a diferentes formas de status social. Admite Urry (2001) que o automóvel e a mobilidade exterminam o espaço produzindo um vasto sentimento de 180

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enormidade e controle. Certamente, todos os impérios têm se considerado “modernos e móveis” pelo que, à primeira vista, é difícil considerar a sociedade atual como hiper móvel. Mas é certo também, que os impérios recorreram à construção de infraestrutura para uma rápida comunicação entre suas colônias. Estes canais de conexão entre as partes eram utilizados pelos exércitos, para apaziguar o sentimento de protesto, a incitação da indignação e, também pelos cidadãos em momentos de instabilidade política; fato que sugere que mobilidade, comércio e guerra têm sido aspectos da vida humana estreitamente ligados entre si (STANLEY, 2008). Os modos de transporte modificam a forma de vincular-se entre as pessoas. Os cruzeiros nos últimos anos, têm se multiplicado e por motivos econômicos têm se tornado mais acessíveis ao público em geral. Se por um lado os estudiosos sobre cruzeiros têm abordado questões econômicas, poucos esclarecem sobre a filosofia do mesmo como forma estereotipada e fechada de transporte. Neste sentido, o presente ensaio contempla um marco teórico válido para poder compreender como se dá o “encontro turístico” dentro destas cidades móveis. A cidade moderna e o cruzeiro mantêm diferenças substanciais que determinam a forma em que os consumidores se conectam entre si. O valor da propriedade privada que gera a desigualdade e a desconfiança é um fator chave para compreender porque o vínculo turístico pode ser fabricado e desnaturalizado.

MUNDO GLOBAL E MOBILIDADE E. Pastoriza (2010) relembra em seu trabalho La Conquista de las vacaciones a estranha tensão que se dá nas primeiras áreas de veraneio na Argentina em fins do século XIX, uma vez que um dos maiores desafios era adaptar as condições ambientais aos lugares de residência dos viajantes com suficiente familiaridade para não sentirem-se desprotegidos, mas poderem se harmonizar aos costumes das classes altas com respeito a um 181

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consumidor que começava a ter um perfil massivo. Os antigos padrões de distinção segunda P. Bourdieu que funcionavam antigamente como estratégias para manter a identidade de classe, estavam agora em disputa. Isto é, em maior ou menor medida, desde o seu nascimento, o turismo parece ter sido uma tendência quase contraditória na qual o encontro entre visitantes e moradores tem importância fundamental. De acordo com o seu desenvolvimento, a história da cidade argentina de Mar del Plata, inteiramente dedicada ao turismo atualmente, em suas origens testemunhou como um balneário, por meio da instauração da elegância, se transformou em um lugar seleto, onde os visitantes aspiravam um novo código de privilégio cujas particularidades e excentricidades contrastavam seriamente com as famílias de residentes locais. A vida social desses turistas necessitava não apenas de infraestrutura, butiques, negócios e até um cassino que se adaptasse as suas necessidades, oferecendo um espaço dedicado ao requinte e a distinção, mas também um forte conteúdo simbólico. Esta forma de pensar nos leva a supor que o turismo, finalmente, se consolidou por meio de três elementos essenciais: a urbanização realizada pelo setor privado e o Estado, a circulação e a “qualidade de pitoresco” que tem possibilitado a necessidade de visualizar esteticamente uma paisagem determinada consolidando assim a soberania específica. O trabalho de Pastoriza como os de Britton, são importantes em um sentido, o turismo gera um movimento entre um ponto (emissivo) até outro receptivo. Os centros receptores acomodam uma nova infraestrutura conforme as “preferências” dos turistas e suas respectivas cidades. Contratos substanciais e importações, precisamente contratadas desde as cidades emissoras se efetivam com o fim de recriar um espaço similar e familiar aos novos visitantes. Mas isso supõe um risco não contemplado uma que as condições pós-modernas de maior mobilidade e de suscitam conflitos por meio choque cultural entre receptor e emissor. O historiador sueco T. Kaiserfeld (2010) assinala o turismo como fenômeno massivo, surgido pelo arbitramento de custos em matéria de 182

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transporte, ao introduzir o avião em combinação com as férias pagas e a herança dos nacionalismos alemão e italiano, que em enfatizavam aos seus trabalhadores que visitassem “a pátria” (heimat). O turismo pode expandirse graças aos tours com tudo incluído e o nascimento dos agentes de viagens como especialistas em sua organização. Kaiserfeld está interessado em desenvolver, sobretudo, como se organizam os primeiros pacotes “all inclusive”. Estes novos dispositivos por meio dos quais o viajante não portava dinheiro consigo, obedecia não apenas a uma questão de segurança, mas também a uma tendência crescente pelo refinamento do consumo. A diferença do turismo consolidado logo na segunda guerra, em que os turistas assistiram a um processo de desancoragem ou mundialização, no período do entre guerras nos países da Europa Central, levaram à conformação de tours com todos os serviços incluídos. Inevitavelmente, esta tendência criou uma “bolha”, a qual isolou os novos visitantes das comunidades que estavam alojando-os. Nesse sentido, P. Brunt e P. Courtney indicam que o turismo pode ser definido como um evento sociocultural que modifica os valores e condutas, tanto de turistas como de residentes. Se bem que, em determinadas ocasiões, a relação entre ambos é cordial pela dependência econômica dos segundos a respeito dos primeiros. Em outras palavras, existem sérios conflitos ou problemas entre ambos. A literatura especializada tem focado seus esforços em três aspectos principais que têm relação entre visitantes e locais, o desenvolvimento da comunidade, o vínculo entre anfitrião e hóspede e os impactos culturais (BRUNT e COURTNEY, 1999). Em princípio, o encontro entre anfitriões e hóspedes tem sido explicado tanto por meio das diferenças culturais entre ambos, como pelo ressentimento que a diferença entre os estilos de vida de ambos gera (SMITH, 1992; Mc-INTOSH, GOELDNER e RITCHIE, 1995; BRUNT e COURTNEY, 1999) ou pelas dicotomias no processo de aculturação (NASH, 1992). Quando a resistência de um setor ou de uma comunidade, em receber turistas estrangeiros é evidente, a segurança dos turistas ou a probabilidade de sofrer algum ataque se torna comum. Mesmo assim, em certas ocasiões, o crime contra os turistas, por 183

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sua vulnerabilidade e desconhecimento do ambiente, é uma moeda corrente nas grandes cidades (PIZAM, REICHEL e STEIN, 1982). O turismo é visto por muitas comunidades como “uma ameaça” por diversos motivos que se explicam pelos efeitos não desejados da atividade como: ser um processo de aculturação, prostituição, perda de laços familiares, consumo de drogas e alcoolismo, crime e exploração infantil entre outras; no entanto, a exclusão e a discriminação, são um dos fatores mais importantes para explicar o ressentimento dos residentes em relação ao turismo e aos turistas. Com efeito, Grosspietsch (2005) sugere que o turismo e sua adaptação nas sociedades receptoras segue o modelo da “bolha”. Uma combinação de efeitos socioeconômicos negativos com a presença de multinacionais estrangeiras que oferecem baixos salários, em combinação com a expropriação territorial, o uso e consumo de substâncias não permitidas pelos valores culturais da sociedade que os recebe, assim como níveis de frustração moral. Como bem explicaram Steven Britton (1982) e E. De Kadt (1992). As sociedades receptivas devem adaptar seus estilos de vida e formas de produção material aos segmentos de turistas estrangeiros que não apenas possuem um diferente poder aquisitivo, mas também demandam diferentes estilos de vida. Hotéis, negócios e butiques são adaptadas de acordo com o perfil do consumidor ao qual estão orientados. Essa lacuna cultural entre sociedade receptora e emissora, na maioria das vezes, se efetiva à custa da população local, que é excluída do contato com os turistas. Embora nos últimos anos, o turismo sustentável tentou absorver e resolver este paradoxo, a realidade diz que até mesmo os visitantes não são apenas vítimas de agressão, mas sua impotência os leva a serem privilegiados. Quando um país de economia emergente adota o turismo como sua principal atividade econômica, ele deve abrir seu mercado para o investimento estrangeiro uma vez que os bens de capital que interessam aos turistas provenientes de países industrializados, não existem na área (TURNER e ASH 1975; JIMENEZ-GUZMAN, 1986; Harrison, 2004). Esta adaptação material se encontra fundamentada na mobilidade do capital e 184

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dos mercados que criam condições de apreciação semelhante gerando um risco (fabricado) ou efeito indesejado no próprio sistema. Quanto maior a dependência da comunidade em relação ao turismo, maiores são os efeitos não desejados e a agressividade do habitante frente ao estrangeiro. Os países com uma conjuntura histórica de dependência colonial com metrópolis europeias têm maiores problemas para mitigar os efeitos não desejados do turismo em comparação com nações que não têm essa relação (KADT, 1992; HARRISON, 2004). O turista como consumidor móvel pode pagar pelos serviços, mas também o faz por segurança. Ser portador do capital o coloca em um papel privilegiado e ao mesmo tempo vulnerável. E. M. Drew elabora uma teoria muito interessante. Segundo sua perspectiva, como a literatura especializada assinala, o encontro entre duas culturas (a do visitante e do hóspede) pode ser muito problemática. Não obstante, existe pouca atenção sobre o papel que joga tanto o guia local como a comunidade no referido processo. Embora a autora admita que a ideologia dominante gerasse uma narrativa sobre a posição do nativo frente ao turista, não é menos certo que nos últimos anos essa relação tem se invertido. Em efeito, a comunidade “limpa” as ruas e absorve os riscos para que a segurança do turista seja garantida. O fazem pelo turista, mas esse feito coisifica o visitante como “outro” articulando sua própria construção histórica sobre a comunidade (DREW, 2011). A vulnerabilidade do visitante, nesse contexto, se transforma no epicentro da comoditização do outro por meio do qual o consumidor é um mero portador de dinheiro. Em uma de suas reportagens com um residente afro-americano de Chicago, Drew (2011) exemplifica como funciona o medo da hegemonia. Todo o ressentimento da população local por ser historicamente marginalizada a papéis secundários ou terciários da economia se sublimam no turismo uma vez que o nativo direciona “todo seu ódio” para assustar o turista. Segundo o exposto, J. Osmar-Fonteles afirma que o processo de globalização e o comércio tem gerado para si uma mobilidade sem precedentes de ideias, mercadorias e pessoas. A economia do turismo assume para si um papel importante na geração de capital e no processo de 185

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acumulação por meio do qual as diferenças entre os grupos humanos não se resolvem, ao contrário, se reforçam. Isso suporta a ideia de estigmatizar ou etiquetar a certos lugares como “desejáveis” (estéticos e belos) e a outros como não desejáveis (perigosos). Enquanto fenômeno multidimensional, a globalização se expande de forma irreversível a todos os pontos do planeta determinando certos hábitos de consumo e estilos de vida. Ao consumo capitalista cabe distingui-lo como um consumo móvel, de espaços esteticamente elaborados e comercializados por meio do turismo internacional, que abre as fronteiras dos Estados (OSMAR-FONTELES, 2004). Os espaços estão sendo constantemente desterritorializados e comercializados por televisão ou internet. O deslocamento físico, promovido pelo consumo virtual, permite ao cidadão conceber sua experiência inclusive antes de viajar e uma no destino reforçando o estímulo previamente adquirido. Este processo leva a uma homogeneização de produtos ou destinos turísticos conforme uma demanda única, que sem importar a nacionalidade ou cultura, requer os mesmo critérios distintivos. Hotéis, shoppings, resorts e demais atrativos apelam a uma mesma discursividade e forma estética que os define e os equiparam. Embora, existam certos benefícios por parte dos habitantes locais ao receber estes grupos em suas comunidades, cabe mencionar alguns efeitos sociais não desejados gerados pelo turismo como a: a) degradação do ambiente natural; b) privatização do espaço público; c) comoditização dos nativos; d) especulação imobiliária; e) consumo de drogas e álcool; f) degradação dos laços familiares; g) alterações no acesso a terra e as formas clássicas de trabalho; h) efeito demonstração negativo pelos quais os residentes se identificam com os costumes dos turistas que chocam com sua cultura; e por último, i) abuso infantil e prostituição entre outros tantos efeitos como o crime e/ou a segurança dos turistas. Consequentemente, globalização, sustentabilidade e risco parecem três variáveis que, embora os estudos clássicos, os abordem separadamente, têm mais em comum do que se pensa OSMAR-FONTELES, 2004). A autenticidade e o perigo parecem ligados de alguma maneira que tentaremos elucidar. 186

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TURISMO E AUTENTICIDADE: DISCUTIR A MOBILIDADE Marc Augé considera que tanto o território como as construções simbólicas em torno deste forjam a identidade de grupo; se o espaço gera sentido e simbolização que é compreensível para todos que frequentam esse espaço, então existe um espaço antropológico associado ao passado dessa comunidade. Nas palavras do autor, «el espacio de la antropología es necesariamente histórico, puesto que se trata precisamente de un espacio cargado de sentido por grupos humanos, en otras palabras, se trata de un espacio simbolizado. Esta simbolización, que es lo propio de todas las sociedades humanas, apunta a hacer legible a todos aquellos que frecuentan el mismo espacio cierta cantidad de esquemas organizadores, de puntos de referencias ideológicos e intelectuales que ordenan lo social. Estos temas principales son tres: la identidad, la relación y, precisamente la historia» (AUGE, 1996, P. 83). A modernidade redesenha não apenas as relações vinculantes, mas também o espaço. Sem história, identidade, nem vínculo mútuo, o homem moderno transita por não espaços, ou seja, não lugares. Para Augé, a (pós) modernidade “cria um passado imediato” de forma desenfreada; em outras palavras, todos os dias se vivem acontecimentos passados e históricos que redesenham a linha divisória entre atualidade e história. O constante passado imediato, gera modificações nas formas de conceber a alteridade e a territorialidade. As grandes cidades estão experimentando e seus centros, uma grande saturação de imagens que atrai milhares de viajantes e turistas por meio do espetáculo; mas por outro lado, este processo despersonaliza as relações territoriais e históricas entre os atores. Nos espaços urbanos predominam o consumo, as imagens, as redes de informação, meios de difusão e a encenação do mundo em detrimento das relações humanas e a tradição. Em parte, a aproximação despersonalizada gera temor. Em outras palavras, o estrangeiro se aproxima não como convidado, mas como personagem anônimo. A modernidade tem encontrado uma crise de sentido que não é outra coisa se não uma crise 187

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de alteridade. Hoje a identidade se impõe a alteridade? São as grandes cidades de hoje espaços alienados de consumo? Que papel tem o turismo nesse processo? Em seu trabalho intitulado El viaje imposible: el turismo y sus imágenes Augé expressa toda sua capacidade e argumentação retórica dirigindo sua crítica as “formas estereotipadas” da viagem comercializada do qual o turismo é sua fiel expressão, ficcionalizando o mundo e pessoas em espetáculos. As empresas turísticas “quadriculam a terra”, criando diversos roteiros, formas de estadias em espaços reservados para o contato. As agências de viagens são (segundo Augé) “las primeras responsables de convertir a unos en espectadores y a otros en espectáculos. Quienes se equivocan de papel, como es sabido, se ven prontamente estigmatizados y si es posible se los envía de vuelta en charters a sus lugares de origen” (AUGE, 1998, p. 15). O consumo entra pelos olhos. Augé sugere que é necessário reaprender a viajar para começar a ver novamente; isso implica que viajamos cegos? É claro que uma coisa é realmente viajar e outra fazer turismo. O turismo cria sobre realidades produzidas pela ficção; este espetáculo que põe qualquer realidade pronta para ser observada sem mais esforço que somente olhar um folheto ou uma tela, criando visões “instantâneas”; em analogia a ao Disneyland o turismo pode visitar o “inexistente”. A acessibilidade aos destinos turísticos, como uma praia, está subordinada as diferenças e desigualdades próprias da sociedade; mas nesses cenários a imaginação e a memória se fundem sob certas memórias que um passa o tempo, e o tempo transcorrido somente se recupera ali. Que fatores coadunam na formação dessas cenas? A resposta do autor a esta pregunta é, o primeiro deles é o turismo, seguido do crescimento das imagens, a ecologia, a luta de classes e a demografia entre outros. A privacidade está posta ao serviço do não conflito, ou melhor dizendo, da segregação entre diferentes grupos: os ricos vivem em suas residências distanciados dos pobres, os idosos reclusos em casa de idosos isolados de suas famílias, etc. Os centros turísticos (ficcionalização) serão o futuro do mundo real. Nesta tese, Augé inverte (talvez em concordância com 188

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Sêneca) o sentido da verdadeira viagem, da viagem turística contínua. Se a modernidade criava o sentido de pertença, e a viagem adquiria um sentido relacional entre os homens; o turismo e a sobre modernidade se isolam sobre o falso. Portanto, se compreende o turismo como um processo de ficcionalização da viagem (autêntico) e da criação de “alteridade” (AUGE). Igualmente a M. Augé, Virilio está concentrado em analisar o papel da imagem na modernidade e como esta afeta, de uma ou outra maneira, a vida cotidiana dos homens. Mesmo quando ambos partem de uma preocupação análoga, diferentes serão seus correspondentes desenvolvidos sobre a causa dos problemas sobre os quais meditam. O homem tem uma capacidade natural para comunicar-se com outros, como também há uma habilidade para adaptar-se e sobreviver em seu entorno. A distinção entre o que criamos realmente e o que não é implica a ação de colocar-se no lugar do outro; esta proximidade audiovisual une os homens dentro de um mesmo território, com signos compartilhados e experiências comuns. No entanto, a midiatização da imagem através das cadeias de consumo industrial produz o efeito inverso, massificam a heterogeneidade em termos de um único observador; sem ir mais adiante, no teatro, cada espectador vê sua própria obra, enquanto no cinema todos vêm e interpretam o mesmo. Consequentemente, para Virilio não se pode falar de informação se não de complexo informacional. Estas constantes sobrecargas de virtualidade geram no homem, solidão, reclusão e mal estar. A aproximação das distâncias e a revalidação do segredo, inventam o outro-inimigo. A naturalização do real e sua imposição criam hegemonia e controle; mas por que afirmas que demonizam o outro? Ou não deveria gerar um efeito contrário? Se a distância conserva a história e os costumes, isto é, os povos mais longínquos ainda parecem mais singulares e “congelados no tempo”, então a aproximação fará que os homens se criem mais contemporâneos que cidadãos. As publicações e diários pessoais de viagens têm dado lugar aos jornais e informativos; a crônica privada passou para a publicação massiva. Ao mesmo tempo que se adotam tecnologias que aceleram o tempo das publicações, também o fazem nos transportes e na forma de 189

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viajar; portanto, em Virilio deslocamento espacial e transmissão informacional são verso e reverso de um mesmo problema (VIRILIO, 1997). Caso se examine cuidadosamente a proposta de Virilio, identificará a existência de uma estreita relação entre os meios técnicos, movimento e guerra. O processo de conflagração militar resultou no surgimento da informação sistematizada, bem como novas inovações no transporte. Todo o movimento envolve uma cegueira temporária. O mundo que olha, está em movimento e o deslocamento com a aceleração do mesmo, se perde o olhar. Esta forma de ligação entre a aceleração e observação une (parcialmente) o pensamento de Virilio e de Augé. Virilio está interessado em um desenvolvimento diferente e se concentra na máquina como uma forma de arte. Velocidade está a serviço daqueles que podem pagar; Os viajantes de primeira classe conectam duas cidades em três horas, enquanto o terceiro fez o mesmo percurso em seis. Os primórdios da era industrial trouxe a diminuição do tempo nas sociedades, bem como uma grande mortalidade por esforços físicos diários. Se o espaço se esgota no tempo, então existe mais tempo, como ele é usado? Nesse sentido, Virilio sugere que esse ser no tempo que sobra, é utilizado inutilmente em ocupações alienantes e absurdas. O excesso de velocidade implica um sentimento de inferioridade e angústia sobre o qual se recorre à ideia de poder “dominar o próprio destino” por meio de mecanismos que distorcem a realidade em si (como drogas) (VIRILIO, 1996) As grandes cidades podem ser para algumas pessoas, lugares desconhecidos os quais temem. No entanto, as cidades de meados do século XX tem se transformado em uma aglomeração “memorial de um passageiro objetivado”. O hábito de descobrir, por um lado orienta, mas também promove a cegueira temporária. A sistematização de conhecer evita o reconhecimento; a busca frenética por encontrar evita o reencontro. Na era do “conformismo midiático” e da “estandardização da produção”, os homens tendem a configurar seu mundo em tempo real. A lógica da modelação da globalização leva a demagogia do acidente por acidente (seja este, local ou global). Observa-se que o acidente subverte a 190

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condensação do presente em detrimento do passado e a sincronização das emoções humanas. Tal como pensou Max Weber quando postulou a profecia da “jaula de ferro”, existe uma dinâmica industrial que tende a relegar e controlar as emoções e sentimentos. As guerras e os conflitos, são convertidos em temíveis dramas passionais com novos episódios a cada “três horas”; a velocidade de propagação das diferentes imagens chega com minutos as casas dos espectadores com o fim de criar um “mistério de medo”. O medo passa a ser não apenas um mecanismo de controle político, mas também um bem de consumo ou “fetichismo da subjetividade” (VIRILIO, 2007). O transporte nos faz esperar. Estar à espera é se relacionar de alguma forma. A velocidade do transporte veicular tem crescido exponencialmente nas últimas décadas até o ponto de ofuscar a tradicional espera. Sem espera, não tem viagem e sem viagem a velocidade faz do movimento controlador o não-movimento. Segundo Virilio, não será estranho observar os viajantes pós-modernos viajarem sem se moverem. Assistimos, sem lugar para dúvidas, a uma aristocracia da velocidade que se move no campo do transporte da mesma forma que o fazem na semiótica da mensagem. Como a viagem, a mensagem tem um interlocutor e um receptor – saída e destino – pelo qual se relacionam mutuamente e se conectam. Não obstante, o mundo da mensagem total, transmitida 24 horas por dia sobre qualquer fato de significado planetário, a conexão com esse outro que nos assusta e se desvanece, e o mediador, nesse caso, a máquina se transforma em receptor e emissor ao mesmo tempo. O cidadão do mundo se transforma em utopia uma vez que não habita mais que em um eterno transbordo, as cidades tornam-se lugares de trânsito, aeroportos, salas de espera ou lugares de aglomeração transitória. Os cidadãos do trânsito ocupam o lugar do ar ao invés do território. Sua viagem os leva a uma constante irrealidade no espaço aéreo. Em seu des-habitar, o cidadão-viajante do futuro provocará a abolição de todas as fronteiras, de todas as diferenças, e com elas a ideia de um “terno retornar” pelo qual sempre se volta ao ponto de partida, em que nós mesmo somos nosso próprio desconhecido (VIRILIO, 2007). 191

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R. Barthes (1997) também mantém uma linha de pensamento semelhante a de Augé ou Virilio em que a mobilidade deve ser compreendida como uma forma de ordenação da lógica de trabalho e da lógica burguesa. O turismo tem suas origens no desejo profundo que a burguesia sentia ao comprar o esforço e manter, por sua vez, a imagem desse esforço. Neste sentido, a humanidade, lentamente, dá lugar ao surgimento de monumentos por meio dos quais tipificam valores culturais. Os guias turísticos que fomentam a mobilidade criam estereótipos que imobilizam a diversidade humana que é reduzida a uma lógica de encenação capitalista cuja função é o esforço da assimetria de classes. Para D. Maccannell as atrações turísticas, por seu simbolismo, guardam certa analogia com as religiões primitivas. Como consequência, sua tese principal é que a expansão material e ideologia do capitalismo e da modernidade se encontram vinculadas a massificação do lazer e do turismo. A metodologia utilizada é uma combinação da postura levistraussiana acerca da comparação de estruturas mitológicas e a micro sociologia goffmaniana. Maccannell está interessado em uma teoria que explique o turismo e a turistificação por meio do prazo e vínculo social. Desde a sua perspectiva, “a experiência turística” se compõe de três elementos: a) uma parte frontal montada exclusivamente para a interação artificial entre turista e residente (denominada modelo), b) as emoções internas e subjetivas chamadas influências, tais como o medo, a ternura e as ilusões, e por último, c) o agente é a confluência entre o fator “a” e “b”. Desta maneira, no consumo turístico se alternam as expectativas criadas pela estrutura, como necessidades individuais do agente. Por exemplo, um destino turístico funciona como cenário hipotético na mente dos potenciais viajantes, enquanto os agentes de transportes (agentes) combinam essas necessidades na prática concreta. A experiência forja na mentalidade do viajante um retorno ao seu lugar (influências). No entanto, estes lugares exóticos apesar de estarem ligados a natureza, são construídos com um condicionamento alienante que não vincula o viajante a uma experiência real. O turista não se encontra comovido nem pela miséria nem pelos anfitriões, 192

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são movidos pela sua curiosidade. O estudo do lazer urbano como uma manifestação social da alienação moderna implica a emancipação do turismo da rotina do trabalho, não é uma ruptura senão um nivelador que permite ao trabalhador estar em condições de ser reintegrado à linha de montagem. Se o mundo racional do trabalho se caracteriza por uma supressão substancial das emoções humanas, o turismo se contrapõe exacerbando-as. No entanto, ambos os mundos são parte integrante do mesmo fenômeno. Tal e como se deu a encenação do trabalho nas fábricas de automóveis do século XIX e XX, o turismo está de acordo com a modernidade em detrimento da autenticidade do vínculo (manipulado e convertendo-se em um fantoche do consumo) (MACCANELL, 2003). Ao contrário, para George Amar (2011), a mobilidade por si só não representa uma característica negativa para o homem. A mobilidade é somente instrumento de valores mais arraigados na cultura. Se a mobilidade é compreendida como um processo que cria relações, o princípio da “religancia”46, permite criar novas tecnologias para inovação. Em nossa mobilidade é cada vez mais imprescindível, uma que se constitui no paradigma que modifica constantemente o futuro. Ela, a mobilidade, tem substituído o transporte introduzindo uma nova dinâmica que transforma o nosso estar no mundo desde várias perspectivas: 1) Converte o sentido de lugar valorizando certos espaços; 2)Altera nosso tempo de recreação e descanso; 3)Tenta prolongar a vida das pessoas aludindo ao paradigma da mobilidade; 4) O tempo de espera tem acelerado significativamente; e 5) Tem se criado um novo cidadão-móvel, criativo, inovador e coprodutor de mobilidade. 46 Criação de laços e sinergias entre redes de fluxos urbanos de naturezas muito diferentes: fluxos de viajantes, de informação, de energias, de mercadorias, de calor, de resíduos, de serviços, de formas culturais.

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A partir de uma metodologia, Amar enfatiza que o problema da mobilidade moderna, para ser devidamente compreendido, deve ser examinado em três níveis específicos, a) uma passagem do transporte à mobilidade e do tráfego à religancia, b) uma passagem de hardware para software informativo que sustenta o alto grau a de movimento, e c) uma transformação radical na mentalidade dos atores sociais. De todos os temas e subtemas abordados, o livro de referência trata de um que é muito interessante: o paradoxo tecnológico e sua ligação com a imprevisibilidade. Particularmente, intervimos em todas as coisas para compreender os fenômenos. Como um resultado desta argumentação, é difícil entender que os bons projetos não podem ser bem sucedidos. Este suposto paradoxo leva a repensar os horizontes da previsibilidade. Aplicando-o ao transporte, podemos observar o surgimento de novas formas híbridas de transporte público e individual que rompe as tradições clássicas. Para a inovação é necessário discutir a importância do método prospectivo, entendido como uma releitura dos paradigmas emergentes e as relocalizações sobre as ideias básicas de um campo de estudo. De acordo com o seu desenvolvimento, a mobilidade como uma maneira de pensar, deverá contribuir para a inovação de novas tecnologias mais sustentáveis e menos poluentes. Confrontados com o problema da poluição ecológica, o homem não pode se contentar com destruir seu sistema de mobilidade uma vez que constitui a oportunidade de viver uma mudança realmente sustentável. O problema ecológico tem influenciado a mudança de paradigma, e difundido uma nova maneira de pensar. Se o sistema de transporte evidenciava uma mudança em que o viajante exercia um papel passivo, a mobilidade moderna exige novos estímulos para co-criar uma realidade. Um “smartphone” permite conectar não apenas realidades dispersas, mas paisagens conferindo uma nova estética de construção de lugares e o desenho de experiências. Os modelos teóricos racionais que vêm do viajante para um agente capaz de maximizar lucros, caíram em desuso para dar lugar a mobilidade pró-criativa em que o viajante é o protagonista na criação de sua própria experiência. A 194

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segmentação da viagem torna-se individual ajustando-se, desta maneira, aos desejos do consumidor (AMAR, 2011). Cada cultura fundamenta e determina as próprias experiências relacionadas ao ato de viajar. Mesmo quando a globalização parece exercer o papel de tábula rasa nas principais capitais do mundo, parece que os povos continuam marcando diferenças nas formas e nos termos no momento de exercer seu direito à mobilidade. Uma das características que definem o pensamento de Amar é a dicotomia entre tempo-distância e tempo-substância, talvez sua contribuição mais produtiva. O primeiro explica como o tempo dedicado a viajar, um tempo perdido para deslocarse de um ponto a outro. À medida que a inovação tecnológica tornou mais confortável viajar e em menor tempo, criou-se um excelente tempo genuíno. Se o tempo-distância se apoia sobre o cálculo racional que leva a otimização, o tempo substância adquire uma natureza mais humana, pois permite ao viajante compreender seus sentimentos na viagem. Na era da mobilidade, há um apelo mais significativo ao tempo-substância fabricando certas experiências que implica relação. Não é estranho então, observar os verdadeiros meios equipados com tudo o que o viajante necessita para sua recreação. Verdadeiros hotéis móveis como os cruzeiros, darão lugar a novas formas de praticar o turismo nos próximos anos. Estes mecanismos tornam a converter o tempo clássico de espera no tempo utilizado e aproveitado. Amar trabalha os conceitos de mobilidade e religancia assim como as novas estratégias para renovar a sustentabilidade do transporte. Posteriormente, nas seções subsequentes, se examinam como a religancia modifica o tempo, o lugar e o caráter das pessoas. Sua tese central indica para a seguinte reflexão. Ele pode ser acusado de ser muito otimista sobre os efeitos que a mobilidade exerce sobre a sociedade, transformando nações ou explorando regiões inteiras (AMAR, 2011). Entretanto, é a mobilidade uma boa ou má alternativa? Enfocar o problema nestes termos é uma questão de difícil resolução, admite Amar. A mobilidade é boa à medida que ganha religancia, e torna sustentável de acordo com uma dicotomia entre o virtual e o real. Aos 180 graus para a tese de P. Virilio, 195

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Amar acredita que haverá mais mobilidade nos próximos séculos e, também, um maior apego dos homens por seus locais (coesão). O critério conceitual entre ambos os filósofos parece ser o papel que exerce na inovação e no processo evolutivo. Em Amar, “la mobilidade, criadora de riqueza pero también de daños y de amenazas para el medio ambiente, será sustentable sólo si maximiza la primera reduciendo los segundos. La mobilidade será sustentable sólo si es innovadora” (AMAR, 2011, p. 164). Como corolário, podemos acrescentar, o conceito de inovação permite confiar que o tempo excedente, produzido pelo avanço técnico, será emancipador e necessariamente opressor, como inferia Virilio. Escrito de uma maneira impessoal, clara e convincente, este trabalho é o fiel reflexo da ideia que um livro não se mede pelo volume ou a quantidade de folhas, senão pela profundidade e clareza do pensamento difundido nele; uma obra amplamente recomendada em temas ou discussões sobre questões relacionadas a mobilidade e a modernidade. P. Vannini argumenta que qualquer viagem desperta emoções e expectativas em quase todas as pessoas e culturas. Além de representar um movimento para fora, a viagem possibilita experimentar novas sensações que se caracterizam por ser única. Durante muito tempo se criticou insistentemente a teoria da percepção do risco aplicada ao turismo por considerá-la efémera, circunstancial e anglo-cêntrica. Posturas que de uma ou outra forma, ignoram a riqueza de conteúdo que uma viagem tem para a mente humana. Desde pequenos aprende-se que as viagens compõem-se de partidas e chegadas, mas isso depende de muitas questões de interpretação. Em certas ocasiões, a partida pode ser o ponto de chegada e vice-versa. Consequentemente, toda chegada deve ser concebida circunstancialmente no mundo moderno uma vez que não depende da chegada, mas da expectativa. Este livro concentra-se em uma série de 400 entrevistas para diferentes usuários de ferries na Costa Oeste do Canadá. As relações humanas condicionam os signos e as interpretações sobre os fatos. Desde tempos passados, o homem recorre às máquinas para tornar o trabalho mais rápido e fácil. Com a industrialização e logo o maquinismo, 196

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as sociedades têm alcançado um alto grau de mobilidade que está em constante negociação com todas as construções e instituições como a nação ou a ideia de soberania. Vannini se dá conta que a mobilidade é funcional para que o sistema social possa regular a expansão do capital. Todo discurso a respeito da mobilidade recai sobre a imobilização de certos grupos humanos. Quando se admite que o grupo A é móvel, todos aqueles que não podem aceder aos seus critérios de distinção ficam sujeitos a imobilidade. Por esse motivo Vannini explica que apenas a “teoria das representações” permite enfocar as significações que se entrelaçam a biografias específicas dos sujeitos. A superestrutura das viagens condiz com a ideia de uma construção social que por si só não pode explicar, muito menos responder às perguntas anteriormente fixadas. Nesse sentido, a mobilidade pode ser realizada por meio da integração entre homem e máquina. Na verdade, a tecnologia deve ser considerada incluindo uma diferenciação entre técnicos (especialistas), técnicas (instrumentos) e metodologias (formas de aproximar-se do conhecimento) (VANNINI, 2012). De certa forma, o aumento da mobilidade gera maiores conflitos nos encontros. Estas clivagens ou conflitos são em muitas ocasiões dirimidas por instituições antigas como a hospitalidade. Portanto, falar de novas formas de mobilidade implica referir-se à hospitalidade. Não tem turismo, nem encontro turístico sem hospitalidade.

A HOSPITALIDADE COMO CONCEITO FILOSÓFICO Para Derrida, a hospitalidade é possível apenas, se subordinada por um patrimônio e nome (sobrenome). Neste ritual convergem o limite e a proibição. Em outras palavras, no anonimato ninguém pode receber hospitalidade porque não tem lugar de nascimento, nem história, nem patrimônio, nem referência alguma. Um imigrante é recebido em uma terra subordinado ao princípio da hospitalidade condicional. Se lhe perguntam: quem é e de onde vem? Raramente o Estado permite a entrada livre de 197

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estrangeiros sem uma verificação prévia. De acordo com o autor, a hospitalidade condicional é o primeiro ato de violência (coação) por meio do qual o Estado se fundamenta face aos xenos, face aos estrangeiros. Por outro lado, a hospitalidade absoluta exige que abra minhas portas não apenas a diferença que é finita, mas a outros e ao outro absoluto, o qual não se deve nenhum tipo de reciprocidade. A verdadeira hospitalidade insiste Derrida, não exige nada de mudança. Por outro lado, entre hóspede e o parasita existe uma diferença abismal. O hóspede está condicionado pela lei e ao direito que lhe dá sustentabilidade ao patrimônio e a identidade. O direito de asilo, desta maneira, se dá a quem se estabelece na “casa” com uma história prévia e uma origem; nisso se distinguem os convidados dos hóspedes ilegítimos. Mas na hospitalidade, inclusive, o viajante segue sendo um estrangeiro, e mesmo quando a recepção seja calorosa se deve, ao princípio da autoridade de quem da proteção, a suas leis e a sua língua. O poder de policia, em principio é destinado a perseguir e encarcerar os hóspedes cuja hospitalidade é ilimitada (fora de todo direito) como são os imigrantes ilegais. Os estrangeiros com hospitalidade condicionada encontram um receptáculo para certas demandas que lhes são funcionais em seu papel. Em outras palavras, enquanto um viajante está protegido pelo princípio da hospitalidade, o soberano põe todos os seus esforços para que este não seja danificado, mas sempre e quando se mantenha como um estrangeiro em trânsito; se por algum motivo nosso viajante decide se estabelecer, outras forças e mecanismos entrarão em vigor. É certo que os Estados intolerantes em relação aos xenos (estrangeiros) enfocam a diferença de linguagem e substituem o princípio básico da hospitalidade (visto, geralmente nos movimentos nativistas), no entanto, o viajante leva consigo, sua língua materna como marca de nascimento (mesmo se se encontra condenado a morrer em terras estrangeiras como bem examina Derrida en Édipo). É importante também, mencionar que se a língua, é tomada no sentido mais estrito, a nacionalidade impera por e sobre a divisão do trabalho. Em outras palavras, um trabalhador francês tem mais em comum com um empresário francês do que um trabalhador 198

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palestino: ambos falam o mesmo (ou parecido) francês. Ao contrário, se a língua é compreendida desde um ponto mais amplo, um burguês intelectual palestino tem mais em comum com o mesmo Derrida do que um trabalhador francês. O autor descreve aqui o princípio marxista da solidariedade de classe relacionando-a com hospitalidade e a língua materna. Esta relação puramente conceitual é importante quando se estuda o fenômeno da hospitalidade por duas razões principais; o organismo nacional se impõe na hospitalidade como na linguagem restrita. Quando o francês é homogêneo ao francês sem importar a classe, a linguagem torna-se restrita, mas, paradoxalmente sucumbe à hospitalidade incondicional quando a relação entre um estrangeiro e um nacional se perde. As normas impostas pelo Estado ao estrangeiro é um princípio limitado a hospitalidade. Como já haviam proposto os pensadores marxistas, a “solidariedade de classe” rompe não apenas a lógica do capital burguês e a ideologia (falsa consciência), mas o princípio da hospitalidade. Implicitamente, poderíamos afirmar que a hospitalidade se baseia na lei específica da diferença e similitude própria dos processos de etno-gênese. A lei geral, se choca com a lei particular, como o imigrante se defronta com o cidadão e o “hóspede com o parasita”. Por que o autor convida a compreender ou interpretar a mesma desde a interrupção? De fato, a hospitalidade (absoluta) existirá sempre quando houver subordinação; o Ocidente por sua vez conhece outra hospitalidade, aquela outorgada condicionalmente (estrita). A hospitalidade – como a ética – não existe sem uma cultura que lhes dê alojamento e também sentido de ser; mas a hospitalidade ocidental condicionada exige retribuição, reclama a lei impondo prêmios e restrições a quem a segue ou desobedecem-na. O princípio de soberania burguês, no sentido de M. Foucault, é parte da hospitalidade (Foucault, 2000). O fato de não perguntar a origem e tampouco o nome, de acordo com a ideia de uma hospitalidade aberta em J. Derrida refere-se a uma disposição ética da igualdade. O sujeito se constitui como um agente moral 199

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e pode ser descentralizado de sua própria visão de mundo e restringir seus desejos, em função dos outros. Este processo de auto descentralização determina a possibilidade de adotar e aceitar um ponto de vista alheio, e, graças a ele, que dispomos de uma racionalidade universal. Em pleno exercício das suas competências, o sujeito entra no mundo da linguagem (com os outros), cenário (igual a uma terra distante) desconhecido para eles. Precisamente adere o autor, é neste ponto de reflexão que a hospitalidade e a ética se encontram. Talvez por temor ou intolerância, regularmente, pode-se fechar as fronteiras, mas esta medida não trás mais segurança uma vez que nega a própria liberdade de ser. O argumento central de Innerarity pode ser examinado nas seguintes ideias centrais: 1) A mobilidade gera distanciamento do homem frente as suas instituições; 2) As empresas de seguros e de crédito se esforçam para mitigar os riscos da vida cotidiana devido à fragmentação do homem com suas instituições; 3) A hospitalidade se constitui na base de uma relação dialética entre o hóspede e o anfitrião em que há azar e contingência; 4) A linguagem, por sua vez, narrativa social, determina a consciência moral do sujeito; e 5) A hospitalidade surge do princípio da estranheza, o qual pode despertar horror ou admiração. A relação entre hóspede e anfitrião é uma metáfora para o funcionamento do risco na sociedade moderna. O princípio da sacralidade sobre o qual repousa a hospitalidade se corresponde à estranheza. Os deuses aparecem na terra em formas que não se pode reconhecer, pedindo proteção e misericórdia na maioria das mitologias. Todos eles possuem protetores. Não apenas para os estrangeiros, mas para aqueles que se encontram in intinere, fora de sua casa. Para o filósofo espanhol, quatro 200

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ordens diferentes têm lugar no rito da hospitalidade, o longínquo, o divino, o ilimitado e o inconcebível. A rotinização da ordem social é destruída pelo aparecimento inesperado e repentino do hóspede. A hospitalidade só é possível graças à contingência e ao perigo que desperta no ambiente, a ambiguidade, a contingência. As políticas modernas dos Estados-nação tendem a aumentar o nível de segurança em suas sociedades, mas geram um risco grave, porque os anulam também os limites de adaptação ao inesperado.

A HOSPITALIDADE COMO INSTITUIÇÃO HISTÓRICA Como esclarece Innerarity, o risco e a hospitalidade têm estado intrinsecamente ligados na história humana. E Amuquandoh (2010) examina o caso da hospitalidade em Gtema considerando o papel sagrado que joga o estrangeiro dentro da cultura e da mitologia basin (região astemti) e com eles a hospitalidade. Para o autor, os deuses se transformam e visitam a região em forma de viajantes estrangeiros a quem se deve servir com todas as honras. Maltratar um estrangeiro é, possivelmente, fazer o mesmo aos deuses. Os desastres naturais e a fome são considerados pelos astemti como um sinal da ira dos deuses pelos maus tratos destinados aos estrangeiros. No entanto, existem dois tipos de pessoas de fora, estrangeiros que são turistas europeus afro-americanos e um grupo de pessoas do Quênia e Burkina Faso. Enquanto no primeiro a hospitalidade torna o turismo uma indústria sustentável, o segundo é o estereótipo negativo. Além disso, os jovens da região têm uma propensão maior para aceitar os turistas que os mais idosos. O outro pode assustar ou atrair dependendo das variáveis econômicas (redistribuição da riqueza local gerada pelo turismo como um negócio) e social (educação e manuseio crítico da informação sobre efeitos negativos na população) da população, bem como o seu grau de etnocentrismo (tolerância). Achados semelhantes foram feitos pelos arqueólogos a respeito dos deuses nórdicos e celtas na Europa antiga: existe 201

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uma relação significativa entre o cosmos, ordem natural, hospitalidade e estrangeiros (GRIMAL, 2002; BALBIN-CHAMORRO, 2006; GYGAX, 2007). Em trabalhos anteriores Korstanje (2010; 2011), alertou sobre as assimetrias de poder da hospitalidade entre os estados. A hospitalidade tem sido um termo proveniente da Europa antiga (derivado do latim hospitium) invocando dois significados diferentes. Do ponto de vista religioso, o pacto da hospitalidade obrigava as tribos receptoras a dar segurança aos viajantes de outras tribos signatários (no âmbito do direito consuetudinário), enquanto a partir de um ponto de vista político, a hospitalidade garantia uma defesa conjunta entre duas tribos no caso de ataque externo. A hospitalidade das tribos indo-ariana contrastava com o direito do patronato que tentava impor o Império Romano pelo qual a cidade teria um protetor exclusivo. O patronato foi funcional ao espiral centrífugo do Império e a extração de petróleo e minerais preciosos para as grandes metrópoles que garantia uma administração centralizada. A hospitalidade, no entanto, evocava um princípio de administração descentralizada cuja razão e força repousava sobre o caudilho guerreiro e os seus nobres. Em resumo, a hospitalidade significava mais do que um pacto de não-agressão, era uma rede complexa de parcerias e alianças. Atualmente, o princípio da hospitalidade não desapareceu completamente, mas se transformou em novas formas, tais como visto (princípio temporal de acolhida). Além de ser bilateral (reciprocidade equilibrada), o visto implica um pacto recíproco de colaboração similar ao das tribos indo-europeias antigas. A diferença de capital e acumulação entre as nações tem gerado ao longo dos anos divergências na forma de conceber os vistos. Por exemplo, enquanto os argentinos precisam de visto para entrar nos Estados Unidos (reciprocidade negativa), os americanos não precisam de visto para entrar na Argentina (reciprocidade generalizada). A hospitalidade, como instituição, cumpre uma função mais importante que ordenar e distribuir os laços de solidariedade e reciprocidade entre os atores sociais. Na Antiguidade quando as tribos celebravam 202

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(hospitium) hospitaldiade se obrigam mutuamente para dar asilo em épocas de paz e prestar ajuda militar na guerra. Esta rede intrincada de alianças permitia assumir uma estratégia de defesa para as cidades. Na atualidade, os programas de visto (vistos temporários de entrada) funcionam como “resorts” da solidariedade outorgada aos estrangeiros (KORSTANJE, 2011). Com o exposto, podemos afirmar que toda viagem, necessita de uma infraestrutura que permita certa estabilidade, seja uma companhia de seguros, um agente de viagens, ou a hospitalidade, que também gera certo grau de incerteza (risco), por meio do qual a aventura torna-se atraente (ELIAS e DUNNING, 1992; DOLNICAR, 2005); uma viagem aborrecida é tão descartável como um café malfeito. Escreve Schluter (2008), todo o consumo turístico necessita de segurança, pois se nutre da recordação como eixo simbólico de distinção. Em outras palavras, uma “boa viagem” é aquela que se recorda positivamente e assim pode-se expressá-la a quem a não viajou. Não obstante, R. Fletcher sugere que a atratividade de um destino turístico repousa sobre o discurso ambíguo pelo qual se nega o risco (tentando conferir segurança aos consumidores), mas ao fazê-lo enfatiza-o. Simultaneamente, um cenário de perigo controlado que dá ao sujeito maior status e reconhecimento (FLETCHER, 2011). E. Falconer examina como se estrutura o risco nas narrativas de mulheres mochileiras e suas diferentes experiências em uma sociedade global em que o móvel é sinônimo de status e prestígio. O discurso da aventura, de certa forma, está conectado com um arquétipo de masculinidade em que as mulheres devem adotar e elaborar uma posição diferente de sua condição habitual. A história construída em torno da viagem evoca a necessidade de obstáculos e riscos não apenas para ser atrativa, mas credível. Às vezes, a narrativa do risco e o medo desempenham um papel ambíguo gerando um sentimento de culpa nos mochileiros, especialmente, quando o contato com o outro deve ser uma maneira de superar o etnocentrismo. No entanto, como entender que, às vezes, o outro, desperta temor radicalizado. Falconer não se equivoca quando afirma 203

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que o fato de evitar o outro-perigoso suscita um sentimento de culpa difícil de lidar. Os guias e os mapas, neste contexto, se apresentam como dispositivos eficientes para dirimir a contradição entre segurança e culpa uma vez que os mochileiros não viajam para lugares completamente desconhecido, mas por roteiros pré turísticos em que um falso sentimento de liberdade e de encontro podem ser explorados (Falconer, 2011). Neste contexto, tanto o destino como o motivo da viagem são duas variáveis importantes ao analisar as reações a determinadas ameaças. De acordo com o antropólogo espanhol A. Santana-Talavera, a viagem de turística se define com base em quatro pilares fundamentais: a) a comercialização da hospitalidade, b) um agente democratizador dos direitos sociais, c) um intercâmbio cultural e étnico e d) um processo constante de aculturação que, por vezes, gera dependência econômica (SantanaTalavera, 2006). Uma das características, nesse sentido da viagem turística é a residência temporária fora de casa bem como o retorno subsequente. Enquanto na primeira, o viajante (turista) procura um meio diferente do que lhe é habitual, movido geralmente por curiosidade (motivação turística), demanda por sua vez, um grau controlado de segurança evocando a casa (motivação nativista). Quando a necessidade turística é menor que a nativista, o sujeito empreende o regresso a casa (GEORGE, INBAKARAN, e POYYAMOLI, 2010). Às vezes, esse grau de risco controlado se desdobra dando lugar a situações de tensão as quais limitam a demanda do turismo.

A FILOSOFIA DOS CRUZEIROS Os diversos estudos em matéria de cruzeiros parecem mais interessados em ressaltar os fatores ou benefícios econômicos do que compreender o desenho das verdadeiras fortalezas flutuantes. Historicamente, os analistas do turismo têm visto no cruzeiro uma forma de mobilidade que não ajuda a sustentabilidade do destino turístico posto que por seu caráter semi nômade, oferece toda uma série de produtos 204

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dentro do mesmo navio rompendo assim a conexão entre o hóspede e o anfitrião. O cruzeiro como forma de consumo total, não permite aos destinos que abram as portas para receber o impacto do consumo turístico (DWYER e FORSYTH, 1996; PEISLEY, 1992; FORSYTH e DWEYER, 1995; LESTER e WEEDEN, 2004). Desde seu início, os investigadores têm dado ao cruzeiro um tom negativo, medido exclusivamente por seu impacto na economia local. Nos últimos anos, esta postura começa a mostrar novas abordagens (no original algumas betas) e a mudar, por influência da imposição do paradigma ecológico. Por meio do cruzeiro, muitos observam um meio não contaminante que permite respeitar e preservar a ecologia de destinos como a Antártida ou Austrália. O paradigma verde começa a transformar a maneira que se viaja, se consome e se reordena o produto turístico. Alguns especialistas enfatizam no cruzeiro não um fator de fuga de capitais, mas um meio de transporte que cuida do destino (DOWLING, 2006; STEWART e DRAPER, 2006). Analisando a indústria dos cruzeiros, Tarlow, Korstanje, Amorin e Gândara (2012) sugerem que a diferença de outros meios de conexão, os cruzeiros assumem o sentido da segurança em sua forma total. Seu hermetismo se acompanha com medidas de segurança tendentes a anular todo risco. No entanto, quando o impensado acontece, as características do cruzeiro como cidade móvel, fechada aos limites da alteridade torna muito difícil qualquer tipo de evacuação, gerando maior vulnerabilidade aos consumidores. O segmento de cruzeiros combina o velho paradigma do controle hierárquico pelo qual o mundo se torna racionalmente ordenado com novos temores pós-modernos. Se o mundo moderno se torna mais hostil, não é estranho observar viagens com tudo incluído, ou viagens tipo cruzeiros em que o turista está completamente protegido do contato com o diferente. Uma forma de transporte que reduz o risco, mas também o contato com outros. Ademais, se um espaço de consumo “conspícuo” em termos de Veblen, os cruzeiros destroem o evento casual, como afirma Innerarity a anti-hospitalidade pela natureza. Se a hospitalidade generalizada ou aberta sugere que a contraprestação e intercâmbio sejam abolidos; isto é, que somente se ofereça hospitalidade 205

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sem pedir nada em troca, a hospitalidade restringida se ativa com o uso do dinheiro. Nos espaços turísticos comercializados, a diferença dos hospitais, a forma de mediar com o outro fica fechada. O desconhecido se faz completamente conhecido pela imposição das fronteiras fechadas, em que o consumidor pode desfrutar consumir e explorar o serviço pelo qual já pagou. A diferença de outras formas de transporte, o cruzeiro é hotel e meio ao mesmo tempo. Mas apenas isso, a administração do tempo dentro destes espaços fica sujeita a um cronograma pré-fixado. A diversidade de produtos é tão grande, que em comparação a uma cidade, o cruzeiro oferece tanto entretenimento como segurança. Em termos filosóficos, na cidade, o dinheiro vale e uma pessoa pode através dele comprar diversos bens para consumo pessoal. A acessibilidade do turista à cidade fica restrita a quantidade de dinheiro que pode transportar. Se o turista tenta obter um objeto a partir de uma gôndola em um mercado público, deve primeiro pagar por ele. Ao contrário, nos cruzeiros (como nos supermercados) existem limites bem estabelecidos em que qualquer pessoa pode obter qualquer objeto ou mercadoria. À diferença da cidade, no cruzeiro não se dispõe de dinheiro a que todos os direitos de consumo têm sido pré pagos antes de embarcar. O pacote “all inclusive” confere ao consumidor de cruzeiros uma segurança total e consequentemente, muda a forma de relacionar-se com os outros. A desconfiança e o temor desparecem. Os turistas podem relacionar-se com outros de forma aberta, ainda que, nem por isso seja uma relação sincera, conforme as atividades dispostas pela tripulação. Na cidade, ao contrário, o temor em ser roubado faz com que uma pessoa não possa se relacionar de forma aberta, mas paradoxalmente, isso o faz mais autêntico. Se analisarmos as estruturas mitológicas veremos que no “paraíso” o dinheiro não vale nada, uma pessoa pode dispor de diversos recursos sem trabalhar e, isto é precisamente o que emula a viagem-cruzeiro. É a curiosidade do homem que o leva a desafiar os deuses, e em vista disso submeter-se ao sacrifício e ao trabalho como formas de castigo. Desde Caim, até Prometheus, os anti-heróis são, em parte, um reflexo da nossa necessidade de trabalhar. Se o espaço urbano é um local 206

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de trabalho, o cruzeiro emula “o paraíso perdido”. Mas o que realmente significa a palavra paraíso? Escribe J. Campbell, o termo “éden” significa prazer ou espaço de prazer, enquanto que a palavra paraíso vem do persa, Pairi (ao redor) e Daeza (recitno fechado) o qual em seguida da expulsão do homem pela queda original fica vedada pelos Anjos. O exclusivo, a grandes características, cuja raiz é símbolo de prazer fica por sua própria natureza proibida para todos aqueles quem desde suas “mnentes conscientes” queiram disfrutar do prazer eterno. Impera a ideia de prazer se a considera de acordo com o não prazer, não pode auto realizar-se por sua conta. O prazer necessita da dor ou do sacrifício para poder ser apreciada, buscada e perdida. O prazer eterno está sujeito a contradição absoluta, pois é incompleto em sua própria natureza. Aqui nasce uma pergunta muito interessante, é o consumo um mecanismo que tendem a perpetuar o prazer no consumidor de cruzeiros? T. Veblen argumenta que à medida que uma sociedade passa da “Fase de selvageria” mudam as condições de vida aumentando os incentivos de emulação. A atividade dos homens adquire um “caráter de realização” e se substitui a produtividade pelo prêmio, os despojos, a honra e os troféus. Tomando esta mesma obra, Veblen distingue o “trabalho produtivo” dos “serviços”. Uma classe ociosa surge (brevemente) da concatenação de diversas variáveis, mas todas elas ligadas ao direito de expropriação. Em primeira instância, há uma substituição e incorporação do princípio de propriedade por meio do qual se cria um ato consumidor (ostentação de riqueza), combinada com um aspecto da transferência simbólica. Se na antiguidade, a propriedade repousava sobre o princípio da guerra e, consequentemente, se dava uma comparação entre os ricos e os despossuídos ao longo dos séculos, mas, principalmente, na era moderna, os homens tentaram manter a hegemonia interna por meio de um critério de reconhecimento. A riqueza de certa maneira, confere honrar a quem a possui e esta última é legitimada por ele (Veblen, 1974). O consumo conspícuo gera um signo sobre as mercadorias que não é utilitário ao 207

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consumo, mas meramente simbólico. Uma espécie de habitus, nos termos de Bourdieu, que definem círculos de identidade. A visita a museus e obras de arte em busca de “autenticidade”, próprias do gosto legítimo, se corresponde diretamente com certificações de grau acadêmico alto, universitários preferencialmente. A titulação acadêmica constitui as bases para selecionar os critérios de distinção e os diversos estilos de consumo cultural por meio da “alocação”; isto significa a designação a uma seção ou disciplina por meio da qual o sujeito se identifica gerando uma acumulação futura de capital cultural para reforçar tal imagem de si. As expectativas sobre o sujeito e sua vida profissional abrem caminho, segundo Bordieu, para a criação de diferentes formas de existência que legitimam e reproduzem a divisão que as antecede. Dessa forma, o sistema social confere uma dupla função para a certificação, a eficiência técnica diante de um problema e de pertença. O princípio geral da distinção no autor fundamenta-se no processo educativo. A percepção estética de uma qualidade ou obra de arte dependem previamente de uma sistematização de princípios específicos que legitimam essa percepção. Seguindo este raciocínio, a distinção visa impor uma estética particular, com o objetivo final de gerar um “consumo ostentativo” cuja natureza é separar da vida comum. A ideia de contemplação se aplica a uma forma de classificação que esquiva o encontro por meio do qual somente um grupo de “dotados” pode ser merecedor do puro prazer (Bourdieu, 2000). Desde Veblen e Bordieu em diante, poucos economistas têm proporcionado estudos sobre a sociologia do consumismo de forma crítica. A maioria das abordagens aumentam a produção de bens como formas estereotipadas do desenvolvimento. Diz a doutrina, maior desenvolvimento, maior bem-estar e felicidade. C. Hamilton precisamente questiona este paradigma por considera-lo incompleto em muitos sentidos. O capital se replica sem intervenção ou controle humano, alguns criando um grande vazio entre as pessoas, transformando-as, inclusive, em mercadorias, como o exemplo do turismo e da indústria cultural. Quando 208

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esse vazio existencial que demanda o crescimento não é preenchido, os economistas assumem que falta mais crescimento. Com uma gestão de fontes estatísticas de diversos países, Hamilton demonstra que o dinheiro abre um canal de necessidade de maior acumulação de dinheiro, que longe de trazer felicidade gera problemas sérios na sociedade. Devemos então, considerar o crescimento como um objeto de fetiche, vazio em seu conteúdo, mas dirige todas as diretrizes das economias após um bem-estar social prolongado. À medida que os ricos deixam de ganhar menos, os pobres poderão acender a novas posições dentro da pirâmide organizacional da sociedade. Ainda assim, se isso ocorresse, admite Hamilton, existiria outro problema pior. O aumento sistemático nos ingressos leva, a médio e longo prazo, a que os beneficiários deixem de perceber esse ingresso como uma ganância e somente se deixam levar pelo consumismo. Longe de ser uma sociedade igualitária, o capital somente transforma as mentalidades insensibilizando o mundo que os circunda. Em outras palavras, a ganância, o aborrece. Por outro lado, a perda desse capital acumulado, também os faz infelizes, pois sentem que não podem mudar a realidade e que tampouco podem se permitir certos luxos já que o dinheiro está em constante movimento. A desigualdade entre as sociedades não obedece a um fator econômico, senão, político. Essa tem sido a falha mais importante na aplicação dos programas sociais da Socialdemocracia. Dar mais dinheiro aos trabalhadores não os faz melhores, nem mais eficazes, muito menos mais felizes. Tecem-se estratégias de conflito pelas quais os grupos políticos não têm margem de manobra contra os sindicatos que a cada dia reclamam um novo ponto, ou querem negociar um novo salário. Para solucionar o problema, é necessário evoluir de uma sociedade pós consumo, pós crescimento em que se introduz as normas éticas como guias essenciais da conduta humana (HAMILTON, 2006).

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A MODO DE CONCLUSÃO Nas cidades a insegurança permite um aumento regulado das mercadorias a se consumir, tanto que predomina a fronteira aberta (as pessoas podem entrar e sair sem que sua identidade seja verificada todo o tempo) dentro de um tipo de hospitalidade generalizada. Mas este tipo de hospitalidade aberta nos faz desconfiar do desconhecido e reservamos nossas relações a esfera privada. A reação que tipifica o comportamento do homem na cidade moderna é a proteção e a preservação. Em vista disso, o sentido de mobilidade nos dá liberdade para eleger e interatuar em um ou outro círculo com determinadas pessoas. A contingência e o risco regulam a vida social até o ponto de transformar as formas de produção. O risco e o perigo são anulados por meio do dinheiro. Pagando um prêmio o cidadão regulariza o limiar de incerteza que não o deixava decidir com racionalidade. Ao contrário, no mundo dos cruzeiros a mobilidade é a própria cidade, enquanto o sujeito consumidor perde sua cidadania porque sua liberdade de mover-se se vê restringida dentro dos limites do cruzeiro. O dinheiro como tal não tem validade muito menos é mediador entre as pessoas. A mobilidade do cruzeiro está sujeita a imobilidade de seus consumidores, que vive dentro dela como um cidadão em seu hábitat urbano. Mas nesses espaços de entretenimentos os riscos e a contingência ficam reduzidos a sua expressão mínima. Paradoxalmente, o turista se vincula com outros sem pensar em sua própria segurança (já que esta se encontra ao cidadão da tripulação), mas esse encontro longe de ser autêntico se faz mediado pela ilusão. O sujeito já não decide com quem interatuar, mas fá-lo-á com todos, e como o faz com todos, então não faz de forma profunda com ninguém. A esfera privada se faz totalmente pública e não é estranho em alguns cruzeiros observar as portas das peças individuais completamente abertas. O roubo e o temor desaparecem e com eles também, a natureza humana.

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A seguinte tabela ajuda a compreender as diferenças e similaridades entre a cidade e o cruzeiro. Cruzeiros Turísticos e Navios Escassamente povoados Não existe propriedade privada Abertura temporal para o outro Hospitalidade fechada Mobilidade interna reduzida

Cidades ʹ Centros Urbanos Densamente povoadas Prima pela propriedade Desconfiança no outro Hospitalidade Aberta Mobilidade interna acrescentada

Segundo as observações precedentes, existem paralelos e conclusões que equiparam o turismo de cruzeiros às grandes cidades, seja por coincidência ou oposição. As formas de conectar-se com os outros em um lugar ou outro, se encontram determinados por cinco variáveis bem definidas, a saber: tipo de população, propriedade privada, forma de conectar-se ao outro, hospitalidade e tipo de mobilidade. Todos estes fatores fazem que a vida social em um cruzeiro ou em uma cidade sejam diferentes. Este ensaio teve como objetivo principal não apenas aportar certa luz, desde uma perspectiva filosófica, à forma de compreender os cruzeiros, mas prover ao leitor um marco conceitual válido com a finalidade de ser abordado empiricamente. Parte-se da base que a forma de interação entre os membros de uma comunidade se associam e se constroem as fronteiras. Os homens têm a tendência de imitar espaços de não trabalho em que a propriedade no têm razão de ser, verdadeiros espaços de consumo hedonista similares a um éden, mas estas práticas têm um risco escondido que é a desnaturalização do vínculo entre os homens. Maccannell, Virilio e Augé se equivocaram ao assinalar que a urbanidade é indicador de alienação pelo simples fato de que os interlocutores não se conhecem. Se a relação é autêntica ou não, se corresponde ao grau de desconfiança que gera a urbanidade que leva ao homem eleger com quem vincular-se e com quem não fazê-lo. Quando essa desconfiança natural se anula, o contato se desnaturaliza. 211

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Questões para ampliar o debate 1. O que se entende por hospitalidade? 2. A hospitalidade pode ser móvel? Questões para avaliação do conteúdo do capítulo 1. O que é risco de turista? 2. O risco é resultado da interação de contato? 3. Quais são o paradoxo da sociedade de risco zum de zero? Para saber mais PLOG, S. Por que as áreas de destino subir e descer em popularidade. O Cornell Hotel and Restaurant Administration Quarterly, 13 (3), 1973, pp. 13-16. Este estudo explora a natureza psicológica do nosso risco, assumindo que dois tipos principais de superfície, alocêntrica e sócio-centric. Dependendo de como a socialização evoluiu, as pessoas toleram mais ou menos os riscos percebidos. Korstanje, M. OLSEN, D. O Discurso do Risco no pós 9/11 Filmes de terror: hospitalidade e hostilidade em perspectiva. Int. Journal of Tourism Antropologia, Vol 1 (3-4), 2011, pp. 304-317. Este é um reserch Prime avaliações em que examinar em que medida o filme de terror são influenciados por terrorismo na América. LARSEN, S. Aspectos de uma psicologia da experiência turística. Scandinavian Journal de Hotelaria e Turismo. Vol. 7 (1), 2007, pp. 7-18. Ele se conecta em um novo modelo para compreender o risco e segurança. Autores dividido Concern medo de item. Enquanto o primeiro envolve a emoção interior de si mesmo, o último é definido pela percepção cognitiva sozinho.

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