\" EAT, PRAY, LOVE \" : DAS CRENÇAS ÀS LITURGIAS DOS CULTOS DA CONGREGAÇÃO CRISTÃ

May 27, 2017 | Autor: Sofia Sousa | Categoria: Sociology of Religion, Religious Studies
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“EAT, PRAY, LOVE”: DAS CRENÇAS ÀS LITURGIAS DOS CULTOS DA CONGREGAÇÃO CRISTÃ Faculdade de Letras da Universidade do Porto

PORTO, 30 DE NOVEMBRO DE 2015 SOFIA ALEXANDRA RIBEIRO DE SOUSA

Licenciatura em Sociologia Ano Letivo 2015/2016 Relatório Individual de Sociologia das Religiões

CONTEÚDO Introdução ..................................................................................................................................... 2 Religião: contextualização ............................................................................................................ 3 Orar, cantar e amar: observações .................................................................................................. 4 Congregação Cristã: uma perspetiva sociológica .......................................................................... 9 Conclusão .................................................................................................................................... 14 Bibliografia ................................................................................................................................. 15 ANEXO 1 .................................................................................................................................... 16 ANEXO 2 .................................................................................................................................... 18 ANEXO 3 .................................................................................................................................... 20 ANEXO 4 .................................................................................................................................... 22

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INTRODUÇÃO

Este relatório foi desenvolvido no âmbito da unidade curricular de Sociologia das Religiões e teve como objeto de estudo a Igreja da Congregação Cristã em Ermesinde. Neste trabalho vai ser explicada um pouco a origem deste grupo, bem como os seus princípios doutrinários. Para a execução deste projeto e, com o objetivo de entender melhor este culto religioso, ou seja, como se processava e quais eram os seus principais aspetos caracterizadores, foram efetuadas observações diretas e também observações diretas participantes. Assim sendo, será feita uma explanação daquilo que foi observando, apresentando uma perspetiva sociológica, bem como uma interpretação deste culto religiosos, utilizando alguns dos conceitos e tipologias dos Sociólogos de estudaram o tema da religião, bem como uma reflexão sobre a importância da religião na Sociedade e no desenvolvimento e vida do individuo.

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RELIGIÃO: CONTEXTUALIZAÇÃO

Primeiramente, é de referir que a Igreja da Congregação Cristã é conhecida por ser um culto religioso. Este culto insere-se num dos grandes grupos religiosos estudados, que são os protestantes. Contudo, podemos afirmar-se que estes são de cariz pentecostal. A Congregação Cristã teve inicio no Brasil, em São Paulo. O pentecostalismo no Brasil nunca teve um caráter homogéneo, as igrejas pentecostais estabelecidas no Brasil foram denominadas como sendo clássicas. Mais tarde, Paul Freston foi o primeiro a dividir o movimento pentecostal por fases. Este movimento pentecostal e a sua doutrina, segue alguns dos princípios do cristianismo e da Igreja presbiteriana, apesar de existirem diferenças na forma como interpretam aquilo que está escrito na Bíblia. Por vezes, no senso comum, pensa-se que as igrejas pentecostais seguem os princípios que as igrejas neopentecostais, como é o caso da IURD, mas tal não é verdade. A Congregação Cristã não se baseia nos dízimos nem em ofertas. Ao estudarmos este culto religioso, devemos ter em conta o fenómeno da imigração, algo que foi bastante vasto e que permitiu a instalação de um tipo de religiosidade brasileiro em Portugal (Téchio; 2011). A Congregação Cristã teve as suas raízes no Brasil durante bastante tempo e, só posteriormente, é que surgiu em Portugal. Logo, hoje em dia torna-se impensável analisar certos aspetos da sociedade sem ter em conta a religião, algo que mudou radicalmente com a Globalização. A Globalização veio alargar os horizontes no que diz respeito à transmissão de informação acerca de novos tipos de religiosidade, e também, a liberdade religiosa existente, fez com que igrejas como a Congregação Cristã se pudessem instalar em países como Portugal e que, os cidadãos portugueses pudessem aderir de livre e espontânea vontade. Não é apenas um culto direcionado para comunidades Brasileiras imigradas, como seria de pensar, mas um culto que pode ser para todos. Este fenómeno veio também servir como uma chamada de atenção para o ser humano, isto é, veio alerta-lo para a diversidade de religiões e crenças existentes pelo mundo. 3

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Os evangélicos caracterizam-se por serem um culto mais intimista e sentimentalistas, ou seja, está muito centrado no individualismo. Aquilo que o individuo sente é valorizado, mas não verbalmente para o resto da Assistência, mas sim numa “conversa com Deus”. É um tipo de culto que apela muito às emoções e também à espiritualidade, encarando-o como uma forma de “terapia” ou desabafo das suas frustrações. Numa conversa com o Ancião da Congregação em Ermesinde, este disse o seguinte “Não faz sentido estar a rezar dizendo sempre a mesma frase do Pai Nosso que estais no céu, Deus não é surdo. Não tem lógica ter uma coisa estudada, não é isso que ele queria. Orar é uma conversa com Deus, tal como temos com o nosso pai ou mãe, por vezes nem é preciso dizer nada, com uma lágrima Ele já sabe o que sentimos e queremos pedir”. Os evangélicos acreditam que cada um de nós tem um dom, seja ele de tocar um instrumento, cantar, ajudar os outros, basicamente cada característica pessoal é considerada e vista como algo especial. Cada um de nós é especial à nossa maneira. É ainda de referir que esta Congregação é vitima de algum estigma por parte da população, algo que também serviu de motivação ao presente trabalho, contudo torna-se interessante compreender que os evangélicos encaram este preconceito como algo normal, tal como um individuo sofre por ser demasiado baixo ou alto. Não associam o estigma à sua religião.

ORAR, CANTAR E AMAR: OBSERVAÇÕES Ao longo deste trabalho foram feitas diversas observações, de tipos de culto diferentes. Assisti a cultos diários, em diferentes horários e locais, onde participavam os adultos e os mais idosos, mas também participei de cultos de jovens, com crianças e adolescentes. Não encontrei qualquer tipo de dificuldade em me inserir no meio, os participantes gostaram até que estivesse a fazer um trabalho sobre aquela Congregação. Desde logo, com a minha primeira observação reparei que as mulheres, todas elas, usavam um lenço branco pela cabeça durante o culto, enquanto que os homens não tinham que usar nada. Este é um dos princípios da Congregação, as mulheres fazem-no como uma forma de estarem mais próximas dos anjos e para conseguirem que as suas preces sejam ouvidas. Os homens, á partida, não teriam de usar nada visto já serem considerados os que mais próximos estão à imagem de Deus. 4

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Mencionar por vezes o nome errado da Congregação, referir palavras em certos momentos, pode tornar-se complicado do ponto de vista da investigação, devemos ter um certo comportamento em consonância com o local onde estamos, por exemplo, na minha primeira observação, pediram-se que eu colocasse o véu pela cabeça enquanto estivesse dentro da “casa de Deus”. No decorrer das observações deparei-me com algo que achei muito diferenciador, os evangélicos tratam-se por irmãos, e possuem formas de cumprimentar diferentes, quer seja homem ou mulher, os irmãos/irmãs cumprimentam-se com um aperto de mão, um beijo na cara e dizem a frase “Paz de Deus”. Tal acontece antes dos cultos e quando estes terminam, mesmo que se cruzem com um irmão ou uma irmã na rua, é este o tipo de saudação utilizada. A sala de cultos é muito diferente das típicas igrejas convencionais, não possuem santos, dado que, como já foi referido, são um tipo de culto mais sentimentalista, e a arquitetura da mesma é muito simples. Possuem filas de bancos do lado esquerdo e direito, as paredes são todas brancas com candeeiros enormes pendurados – ficando a sala bem iluminada – e, na frente, virado para a assistência, existe um púlpito com as palavras “Em nome do Senhor Jesus”. No centro da sala, existe um órgão que é o instrumental usado nos Hinos, apesar de, no Grupo de jovens o violino ter um papel importante. Os instrumentos utilizados são todos de orquestra, ou seja, todos os instrumentos são escolhidos de forma a transmitirem calma, na medida em que reproduzem sons mais suaves, tal como o clarinete ou o violino já referido. Esta divisão dos bancos na sala deve-se ao facto dos homens ficarem do lado direito e as mulheres do lado esquerdo, uma vez que os homens estão mais perto de Deus. Foram analisadas algumas partes da Bíblia, com o objetivo de compreender melhor os princípios doutrinários deste culto. O primeiro principio doutrinário defendido é o de que a Bíblia é sagrada pois contém a palavra de Deus, é orientadora das condutas e é onde está o poder de Deus que permite a salvação para aqueles que nela creem. Os evangélicos são monoteístas e acreditam que Deus é o único salvador. Como principio doutrinário também é a crença no Diabo e no renascimento daquele que se converter e aceitar a palavra de Deus. Acreditam no batismo, tal como na religião católica, a diferença é que não batizam as crianças quando nascem, estas devem 5

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ter no mínimo doze anos para poderem decidir se querem ser batizadas ou não. O batismo é considerado uma cerimónia especial e é feita apenas uma emersão em água, em nome do Espírito Santo. Não acreditam nas promessas e nos sacrifícios a Deus, pois defendem que Deus já se sacrificou pelo povo para nós, nesta vida, não o termos que fazer, A sua principal crença é na ressurreição de Cristo e na vida eterna daqueles que seguem a palavra de Deus, os que não o fazem estarão condenados ao “tormento eterno”. É de referir que estes princípios doutrinários estão escritos num livro de Bolso, que é oferecido a todos aqueles que se convertem à Congregação. Todos aqueles que são evangélicos carregam o livro diariamente, para se lembrarem constantemente como devem viver a sua vida, não esquecendo as palavras de Deus. Se estes princípios doutrinários forem cumpridos com rigor, os crentes irão ter uma vida eterna. O mundo é visto como algo mau, cheio de vícios e que está corrompido. Como a morte é certa, os crentes devem viver uma vida em que não se deixem corromper pelos pecados do mundo, vivem quase uma espécie de ascetismo. “ Eu estava morto no pecado, Mas Jesus, com Sua voz, me despertou; Era, pelo mal, escravizado E agora liberto estou”( Hino 253. Foi alegre, ditoso o dia.) Referem até que durante a sua vida, estes não devem amar ninguém mais do que Deus. Jesus é visto como o elemento central das suas vidas, ou seja, todos os aspetos do quotidiano dos indivíduos giram em torno da vontade de Jesus e Deus. A Congregação Cristã possui um livro com os Hinos cantados durante os cultos, estes foram escritos e compostos por irmãos/irmãs que sentiram a “palavra de Deus”, inicialmente, o primeiro hinário foi escrito e impresso no Brasil e, hoje em dia, em qualquer parte do mundo, os indivíduos que pertencem a esta Congregação possuem este livro. As mensagens são as mesmas, apenas muda a língua em que está escrito. Assim, a sua doutrina é expressa através de relatos, música, orações e coros. Estes aspetos serão abordados de seguida.

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Relativamente aos cultos, é de notar que estes estão muito organizados e estruturados por momentos. Existem algumas diferenças entre os cultos diários e os cultos de jovens. Primeiramente, é de notar que nos cultos diários o número de pessoas que aparecem é superior e a maior parte dos participantes são mulheres. É ainda de fazer referência ao facto de serem pessoas mais velhas com idades entre os 40 e os 80 anos. Nestes cultos em questão, denotei que os mesmos começam sempre com os Hinos, isto é, o Ancião – que se esteve a preparar anteriormente, orando - pergunta à audiência que Hino gostariam de cantar e alguém diz um número e todos cantam. Quando os Hinos são pedidos, cantam-se sempre três inicialmente. São as pessoas a escolherem os Hinos, devido ao caráter sentimentalista da Congregação. Posteriormente, o Ancião orava por aquele que estava em missões no estrangeiro, pelos irmãos ou irmãs que se encontravam doentes e por outros problemas existentes na sociedade, na atualidade. No final destas orações toda a assistência dizia as palavras “Glória a Deus”, como uma forma de enaltecimento e agradecimento por este ter ouvido as suas preces. Neste seguimento, os indivíduos ajoelhavam-se e oravam, ao fazerem isso, a maior parte permanecia em silêncio, quase como se estivesse a ter uma conversa particular com Deus, e então, uma pessoa começava a falar mais alto e as restantes se calavam. Tal acontecia porque a pessoa em questão estava a falar pelo Espírito Santo, servia quase como um intermediário entre Deus e as restantes pessoas que ali estavam na sala. Durante estes momentos, quem quisesse ou sentisse vontade, ia ao púlpito agradecer algum “milagre” que tivesse acontecido, iam agradecer o facto das suas relações terem sido ouvidas ou, simplesmente, iam fazer pedidos. Após as orações terem terminado, cantavam-se novamente os Hinos como uma forma de agradecimento e, depois, uma pessoa dirigia-se ao púlpito para ler uma parte da Bíblia. Novamente, seguindo a lógica das orações, quem se dirigia ao púlpito estava a transmitir a palavra de Deus. Após ser lida a passagem, era feita uma interpretação da mensagem. Todos os indivíduos lá presentes, entendiam esta mensagem como algo pessoal, isto é, Jesus – nesse momento – falava para alguém em especifico. É aqui que se pode ver o caráter sentimentalista, emocional e também individualizador da Congregação, na medida em que atribuem significados a todos os momentos.

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No que se refere aos cultos de jovens, podemos notar á partida algumas diferenças, principalmente advenientes das idades dos indivíduos que participam. Existem crianças na faixa etária dos 6 anos até aos responsáveis por estes com 25 anos. Tal como nos cultos diários, estes iniciam-se com os Hinos, a pequena diferença é que estes apenas podem pedir os Hinos destinados aos jovens, tal diferenciação acontece porque as mensagens são distintas e consideram que as crianças ainda não têm consciência nem capacidade total de compreender a “Palavra de Deus”. Novamente, cantam-se três hinos. Em seguida, o “Servo de Deus” (aqueles que ainda estão a estudar a palavra de Deus para a poderem transmitir), faz algumas perguntas, intitulando aquele local e momento como estando a ensinar a palavra de Deus através da “Escola do Senhor Jesus”. Este coloca questões relacionadas com a oração e o batismo, sendo que estes são os principais aspetos da Congregação. Outro aspeto interessante de ser observado acontece no momento da oração. As crianças mais pequenas entre os 6 e os 9 anos de idade, rezam o Pai nosso e, posteriormente, os mais velhos. Após isto acontecer, o Ancião escolhe alguém da Assistência para subir ao púlpito e agradecer a Deus por algo, neste momento todas as orações começam e acabam com a expressão “Glória ao teu nome Senhor”. Novamente, após a oração como forma de agradecimento vêm os Hinos. Mais um aspeto diferenciador concretiza-se no momento de ler a uma passagem da Bíblia. Existe cerca de quatro grupos de crianças e um de jovens, e cada um destes tem um responsável. Então, todos os grupos, um de cada vez, para a frente da Assistência e leem um versículo. O primeiro versículo a ser lido é pelo responsável que depois, passa por trás das crianças dizendo o versículo para estas o reproduzirem em voz alta. Após isto, não são feitas as interpretações nem explicações da mensagem do Salmo. Pede-se a um irmão que venha ler uma passagem da Bíblia, normalmente são os pais das crianças que vão ao púlpito, aqui a única parte da Bíblia que não pode ser lida é a dos “Cantares de Salomão”, uma vez que fala sobre o casamento e o amor e, as crianças, ainda não têm capacidade de a compreender. O culto termina com um Coro, também ele pedido pelos indivíduos. Estes Coros só são utilizados nos cultos de jovens.

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CONGREGAÇÃO CRISTÃ: UMA PERSPETIVA SOCIOLÓGICA

Após serem realizadas estas observações e, ter participado nos cultos, é possível compreender melhor esta Congregação, tornando-te até mais fácil analisa-la à luz de alguns teóricos da Sociologia e não só. Inicialmente podemos referir que os pentecostais, tal como os Luteranos, acreditam na possibilidade de viver uma vida intima com Deus. Os evangélicos possuem características de vários tipos de religiões e, neste caso, ao orarem de joelhos e com os olhos fechados é uma forma de estarem mais próximos de Deus. O pentecostalismo, ao ter sido criado no seio de uma sociedade contemporânea possui uma maior facilidade em se adaptar aos quadros sociais em vigor, contudo, hoje em dia ainda é feita uma confusão entre aquilo que é um culto religioso, uma seita religiosa e uma igreja religiosa. Se formos a analisar a tipologia de Bryan Wilson sobre seita religiosa, podemos constatar que segundo este autor seita tem uma conotação negativa a ela associada, pois implica práticas diferentes daqueles existentes no sentido ortodoxo da palavra. Sem negar o fenómeno de individualismo religioso contemporâneo, a face pública da religião passa em boa medida, pela sua faceta organizacional, isto é, pela estrutura formal dos grupos religiosos. Este foi um tema principal na história da sociologia das religiões desenvolvida pelo teólogo Ernst Troeltsch e o sociólogo Max Weber. A eles se deve o ideal tipo igreja, seita e misticismo. O interesse específico de Max Weber pela religião deve-se, em boa medida, à sua aproximação a Ernst Troeltsch. Ambos têm uma concepção de secularização com fortes afinidades. Troeltsch faz a distinção entre espiritual e secular (ou mundano) e, mais significativamente, refere a transformação de ideias com origem espiritual em noções seculares. Para os dois autores, a relação entre a colectividade religiosa e a sociedade envolvente constituem questões essenciais. A igreja caracteriza-se por ser um tipo de organização religiosa historicamente legitimada e protegida pelo poder politico, na medida em que apresenta valores comuns aos da sociedade, a seita está muito mais em tensão permanente com a sociedade, porque 9

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genericamente se caracteriza como um grupo de dissidência social. A Igreja é uma organização que controla os meios de redenção e ao mesmo tempo que proclama a verdade sendo ao mesmo tempo tolerante, isto é, inclusiva e adaptativa. É uma organização conservadora porque se acomoda à ordem social, aliás é ela própria uma parte da ordem social. Embora também proclame a detenção da verdade, contrariamente à igreja, a seita é exclusiva, tem como objetivo a perfeição dos seus membros e espera deles uma relação de fidelidade e estão em tensão com a sociedade. São uma organização de adesão voluntária onde se espera a conversão ou o “nascer de novo” dos membros. Esta característica é muito reveladora da Congregação Cristã, são um culto religioso de adesão voluntária, não fazem publicidade à Congregação nem seguem o principio de outros tipos de religiosidade – neopentecostal por exemplo - em que ao se converterem devem converter pelo menos uma pessoa. Contudo, espera-se que ao aderirem ao culto se devam converter à palavra de Deus, como é referido, renascer como um individuo novo. Gordon Melton ( sublinha que, por regra, as seitas são grupos religiosos que se destacam da Igreja principal onde estavam inseridos (por deliberação ou expulsão), em virtude de divergências doutrinárias, advogando uma necessidade de reforma, no trabalho desenvolvido denotei que a maior parte das pessoas que participavam dos cultos tinham tido algum tipo de ligação com a Igreja católica, mas, depois acabaram por sair por não concordarem com os seus ideais. Muitos não se identificavam com o facto de estarem a “adorar” uma estátua de barro. Claro que a sobrevivência dos grupos sectários obrigou, na sua maioria, à resolução desse conflito, por via da assunção de uma atitude menos radical relativamente ao contexto social envolvente, mas, por outro lado, a dissidência é também indutora de novas dinâmicas que afetam o todo social. Outro conceito que se tornou fundamental no sentido operatório para a Sociologia das Religiões é o de culto. Neste caso, a Congregação Cristã é um culto religioso. Este conceito foi criado por Becker, sendo que este autor define culto como um grupo religioso que tem um percurso de formação semelhante ao das seitas, mas que, por sua vez, segue uma orientação religiosa estruturalmente diferente da do grupo de origem, inovando cultural e religiosamente a sua doutrina.

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McGuire (1992) distingue culto de seita pela tolerância demonstrada em relação às doutrinas propostas por outros movimentos, não deixando, porém, de haver uma postura de conflito em relação à sociedade, atenuada, no entanto, pela posição mais pluralista. Os evangélicos aceitam que existam tipos de doutrinas diferentes, contudo, advogam que certos comportamentos são errados, como já foi referido anteriormente, estes condenam o facto de algumas pessoas fazerem promessas e que para isso sacrifiquem o seu corpo. Existe assim uma maior tolerância. Assim, segundo o ideal tipo de comunidade religiosa de Weber e Troeltsch, podemos concluir que na Congregação, não existe um individuo que desempenha uma função de autoridade, como a Igreja acontece com o Padre, apesar do Ancião desempenhar um papel fundamental, os indivíduos acreditam que a única figura de autoridade existente é Deus e Jesus Cristo. Podemos assim referir que existe uma autoridade carismática, na medida em que revêm no Ancião características possíveis de ser idolatradas, tal como a capacidade de pregar. A Congregação é sectária no que diz respeito à rutura com o mundo, durante os cultos era evidente que na leitura das passagens da Bíblia, é sempre feito um apelo para os indivíduos se afastarem dos pecados e tentações do mundo. Assim, o mundo é visto como uma fonte de males, sendo que os indivíduos apenas podem ser protegidos destes se seguirem a Palavra de Deus. “Se fores tentado, não deves ceder, Resiste ao pecado até o vencer; Sê mui valoroso com fé que Deus dá, Então o inimigo, de ti, fugirá.” ( Hino 247. Se fores tentado) Quanto aos modelos ideal tipo de regulação religiosa, é possível encontrar aspetos caracterizadores da Congregação, no modelo institucional ideológico, na medida em que o lugar da verdade está na mensagem, isto é, os evangélicos defendem que apenas a Bíblia contem a mensagem verdadeira, pois foi escrita pelos seguidores da palavra de Deus e contém os princípios pelos quais se devem reger os indivíduos. É feita também uma distinção de poderes, ou seja, existe o Ancião que é um dos órgãos máximos da Congregação – de Ermesinde neste caso, pois cada Congregações possui uma hierarquia – os diáconos, que são os indivíduos que trabalham com instituições de caridade (idosos

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e jovens), os servos de Deus, que são os indivíduos que se encontram na porta da Congregação a distribuir Véus, Bíblias e hinários a quem precisar e depois a assistência. Nesta ótica podemos concluir que os Evangélicos pentecostais são altamente conversionistas, na medida em que acreditam que o mundo está corrompido – como já foi referido anteriormente – e acreditam numa transformação profunda em cada um, que começa por ouvir e seguir a palavra de Deus. É ainda de notar que, em todos os cultos que participei enquanto observadora, era referido a importância do batismo e da conversão. Até no final dos cultos, se os indivíduos notarem que alguém novo surgiu aproximam-se e dizem que o culto foi orientado para essa mesma pessoa – “Deus falou para si”(Anónimo, sexo feminino). Apesar de não marcarem uma postura tão vincada como as Testemunhas de Jeová, e são mais permissivos do que na IURD, isto é, dão mais espaço e liberdade ao individuo de apenas participar nos cultos para experimentar, não exigem uma conversão quase compulsória. Em suma, podemos concluir que a Congregação Cristã combina vários aspetos das teorias dos principais estudiosos sobre a religião, é algo complexo com diversas dimensões de análise. As profundas mudanças ocorridas desde a II Guerra Mundial no continente europeu e no mundo ocidental em geral são outro aspeto a entrar em linha de conta. Os sucessivos fluxos migratórios, a maior facilidade de deslocação, promotora da mobilidade geográfica e o desenvolvimento tecnológico direcionado para o aperfeiçoamento dos meios de comunicação de massa são fatores que contribuíram para a diversificação das sociedades dos países centrais, em termos culturais, étnicos, religiosos e éticos. Pode dizer-se que a diversidade se tornou a norma e não uma mera situação transitória. Assim, a religião desempenha um papel cada vez mais proeminente na sociedade, na compreensão de fenómenos sociais, compreensão e análise de comportamentos individuais, já não podemos deixar de parte a vertente religiosa da sociedade. Esta deve passar a ser analisada como um fator essencial. Ao analisar diferentes formas de religiosidade, como os cultos religiosos – como a Congregação Cristã – podemos ter uma perspetiva diferente daquilo que são crenças religiosas. Podemos concluir que os evangélicos não são apenas indivíduos que participam nos cultos, leem a Bíblia e cantam hinos, são mais do que uma crença religiosa. São seres humanos tal como nós, que ouvem rock, que saem à noite e praticam desporto. 12

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São indivíduos que contribuem para o desenvolvimento da sociedade e até na esfera pública. A entrada na política dos evangélicos brasileiros, por exemplo, através da criação de partidos ou através de candidaturas individuais apoiadas por largos sectores protestantes, por regra pentecostais ou neopentecostais, constituem outro exemplo do protagonismo religioso. Logo, além da importância para a sociedade, é necessário ter em linha de conta, a importância para o individuo. É necessário compreender as trajetórias de vida dos indivíduos e os motivos que os levam a ter esta crença. Existe cada vez mais um recentramento da religião tanto na esfera coletiva como na individual, sendo assim importante compreender este fenómeno, bem como ter uma noção sobre os aspetos doutrinários e fundamentos de cada religião antes de efetuar julgamentos.

“[…]man can not live without meaning. And traditional social science can not provide this meaning” (Becker, 1979)

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CONCLUSÃO

Em suma, com este trabalho podemos concluir que existem diversos tipos de religiosidade, bem como diversas formas de analisar e interpretar a religião. É necessário ter em conta, na análise da religião fenómenos sociais como a globalização e a migração. Assim podemos esclarecer alguns dos aspetos e mitos associados à Congregação Cristã, e ainda compreender melhor os significados atribuídos pelos indivíduos a esta religião, a sua importância na história e em Portugal. Este é apenas um dos muitos tipos de cultos e formatos religiosos existentes, alertando assim para a diversidade religiosa bem como para a tolerância religiosa. A religião pode então ser vista como uma forma de expressão e libertação, como foi referido na Congregação Cristã que apresenta um caráter mais sentimentalista.

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BIBLIOGRAFIA CABRAL, Manuel Villaverde (2001). Prática religiosa e atitudes sociais dos portugueses numa perspectiva comparada. In: J. Machado Pais; M. Villaverde Cabral & Jorge Vala (Orgs.). Religião e bioética (Atitudes sociais dos portugueses, vol. II). Lisboa: Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. DOBBELAERE, Karel (1999). Towards an Integrated Perspective of the Process Related to the Descriptive Concept of Secularization. Sociology of Religion, 60: 229-249. (1981). Secularization: a Multi-Dimensional Concept. Current Sociology, 29 (2). Número especial. DURKHEIM, Emile (2002) [1912]. Formas elementares da vida religiosa: o sistema totémico na Austrália. Oeiras: Celta Editora. FURSETH Inger & REPSTAD, Pål (2006). An Introduction to the Sociology of Religion: Classical and contemporary Perspectives. Aldershot: Ashgate. GIDDENS, Anthony (1991). The Consequences of Modernity. Cambridge: Polity Press. MCGUIRE, Meredith B. (1992). Religion: The Social Context. Belmont: Wadsworth. WEBER, Max (1983). A ética protestante e o espírito do capitalismo. Trad. Ana Falcão Bastos e Luís Leitão. Lisboa: Editorial Presença. WILLAIME, Jean-Paul (1995). Sociologie des religions. Paris: Presses Universitaires. WILSON, Bryan (1996). Religious Toleration, Pluralism and Privatization. In: Påll Repstad (Ed.), Religion and Modernity – Modes of Co-existance. Oslo: Scandinavian University Press, p. 11-34. WILSON, Bryan (1988). Religion in Sociological Perspective. Oxford-New York: Oxford University Press. BECKER, Ernest (1979). Cultural Hero systems and religious beliefs. Department of sociology George Mason University. Review of Religious Research, vol.21.No1: 62-70 TÉCHIO, Hedeny Kachia (2011). Transformando a água em sangue:uma análise sobre a exportação evangélica brasileira através de performances da IPDA. Lisboa. Faculdade de Ciências sociais e Humana. Universidade Nova de Lisboa.

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ANEXO 1 Grelha de observação- registo número 1

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Data: 30 de Outubro de 2015 Atividade: Culto semanal – Sexta, 15h00 Duração: 2h00

Momentos do culto Antes

Durante

Depois

Formas de estar A sala estava cheia. A maior parte das pessoas que participam no culto chegam antes da hora marcada. Homens e mulheres cumprimentam-se e falam, mas, mal entram dentro da sala vão para sítios opostos. Nota-se que as pessoas que foram lá são habituais naquele local e àquela hora. Muitas pessoas tinhas sítios específicos para se sentarem e, enquanto esperavam pela chegada do Ancião, umas começavam a orar e outras conversavam sobre assuntos banais. Durante o culto, ouvia-se sempre burburinho de fundo e telemóveis a tocar, vi muitas pessoas a bocejarem, algo que achei que não fosse acontecer. Ao meu lado e à minha frente estavam pessoas a chorar e outras comentavam a rapariga que estava no órgão, apreciando as suas capacidades. Quando cantavam os Hinos de Louvores e Súplicas a Deus, notava-se que não havia uníssono e, durante os momentos de oração, quando uma irmã começou a falar da assistência, é que as restantes pessoas fizeram silêncio para “ouvir a palavra de Deus” O culto termino com um Hino, e a assistência começou a dar beijos na cara das pessoas que lhes eram próximas. No fim do culto, várias pessoas vieram ter comigo dizer que o culto foi direcionado para mim porque o sentirão. Grande parte das pessoas, no fim, dirigiuse ao Ancião para fazer pedidos de orações pelos entes queridos ou casos que lhes fossem próximos e, no exterior, cumprimentavam-se novamente e ficavam reunidos a comentar os “milagres” que tinham acontecido.

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ANEXO 2 Grelha de observação- registo número 2

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Data: 1 de Novembro de 2015 Atividade: Culto do grupo de jovens – 10h00 Duração: 1h30 Momentos de culto Antes

Durante

Depois

Formas de estar Não houve nenhum convívio entre os jovens antes do culto começaram, á medida que iam chegando entravam para a sala. Não houve atrasos e vinham todos acompanhados pelos pais, pelo menos até à entrada. Os rapazes ficavam do lado direito e as raparigas do lado esquerdo. Todas usavam lenço e alguns dos rapazes traziam fato. O ancião teve que os repreender algumas vezes, os rapazes estavam a fazer muito barulho e estavam desconcentrados, não diziam “Amén” no fim e isso foi alvo de discussão. Fiquei com a sensação que alguns dos jovens que ali estavam, era por obrigação e não por vontade própria. Quando o culto terminou, todos os jovens vieram embora e, apenas os pais que acompanhavam alguns, foram à beira do ancião. No exterior, não ficaram a falar como eu esperava, foram logo embora para casa o mais depressa possível.

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ANEXO 3 Grelha de observação- Registo número 3

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Data: 8 de Novembro de 2015 Atividade: Culto do grupo de jovens – 10h00 Duração: 1h30 Momentos de culto Antes

Durante

Depois

Formas de estar Não houve convívio antes do culto começar, os jovens mal chegam ao culto dirigem-se aos seus lugares. Desta vez, denotei que os mais pequenos costumam chegar atrasados, ao contrário dos mais velhos – os responsáveis – que já se encontram nos seus lugares. Antes do culto começar estes conversam e os mais velhos brincam com os mais novos, havendo um ambiente muito familiar. Houve bastante barulho durante o culto, os mais pequenos estavam constantemente a conversar e levantamse com bastante frequência para ir à casa de banho. Os adolescentes participaram mais ativamente no culto, principalmente no momento das orações e dos louvores a Deus. Notava-se algum desconforto quando o Ancião questionava os adolescentes relativamente a aspetos da doutrina, estes mostravam-se reticentes em responder ás questão, enquanto que os mais jovens respondiam com mais à vontade e naturalidade, sem medo de serem corrigidos caso dessem a resposta incorreta. Fora da “Casa de Deus”, os pais dos jovens estavam à sua espera, sendo que ficaram algum tempo a confraternizar. Estes falavam sobre os problemas pessoais e problemas que estavam a incomodar os filhos. Alguns dos adolescentes, como os pais não podiam vir buscar os filhos, foram acompanhar a casa os miúdos que estavam nos seus grupos, havendo assim um ambiente familiar e de preocupação, quase como uma família em que eles eram os “irmãos mais velhos”. Alguns dos pais que estavam presentes no culto, estiveram a falar com os seus filhos sobre o comportamento que estes tiveram, repreendendo-os. 21

Licenciatura em Sociologia Ano Letivo 2015/2016 Relatório Individual de Sociologia das Religiões

ANEXO 4 Grelha de observação- Registo número 4

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Data: 14 de Novembro de 2015 Atividade: Culto diário – 19h30 Duração: 1h30 Momentos de culto Antes

Durante

Depois

Formas de estar Há medida que as pessoas iam chegando, ficavam cá fora a conversar um pouco sobre o seu dia. Depois entravam todos juntos mas ocupavam lugares diferentes, uns sentavam-se mais à frente e outros mais atrás. Apesar de haverem mais pessoas no culto, quase não havia barulho na igreja, as pessoas estavam todas concentradas e prestavam atenção à orquestra e, todos cantavam os hinos. Reparei que só as mulheres se levantavam na parte dos louvores a Deus, enquanto que os homens só se levantavam na leitura de uma passagem da Bíblia. Quando o culto terminou, todos os indivíduos que lá se encontravam foram agradecer ao Ancião. Todos se cumprimentavam e estavam bastante emocionados, todos diziam que tinham ali entrado muito nervosos e depois estavam calmos – fenómeno coletivo.

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