(2004). \"Da Arqueologia Documental à Ciência da Informação\". Seminário Multidisciplinar. 12 de maio de 2004. Universidade Autónoma de Lisboa. Full Text.

July 8, 2017 | Autor: Susana Rocha Relvas | Categoria: Archivística, Ciencias de la Información, Archivistica y Gestion Documental
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UNIVERSIDADE AUTÓNOMA DE LISBOA


CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM CIÊNCIAS DOCUMENTAIS





SEMINÁRIO MULTIDISCIPLINAR
12 de Maio





DA ARQUEOLOGIA DOCUMENTAL À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: BALANÇO E PERSPECTIVAS








Susana Rocha Relvas








LISBOA









I - A CIÊNCIA ARQUIVÍSTICA - EVOLUÇÃO


Marcada pelas transformações sociais e tecnológicas, a disciplina
arquivística tem sofrido no último século sucessivas mudanças de paradigma
capazes de promover uma amadurecida reflexão no que respeita à sua teoria e
prática, ao papel do arquivista e à missão dos arquivos na sociedade
contemporânea. Até ao final do século XIX, a arquivística passa pela
chamada «fase sincrética e custodial», dada a incorporação maciça da
documentação de organismos extintos, sobretudo dos arquivos religiosos. As
tendências oitocentistas do Racionalismo, do Positivismo e do Historicismo,
colocaram a arquivística como disciplina auxiliar da história, atribuíram
ao arquivista funções de paleógrafo e reconheceram os arquivos históricos
como os únicos contemplados ao serviço da memória do Estado-Nação.
Graças ao primeiro estudo sistemático da autoria dos arquivistas
holandeses S. Muller, J.ª Feith e R. Fruin - O Manual para a classificação
e descrição dos arquivos (1898), a arquivística passa a assumir-se como
disciplina autónoma dotada de métodos específicos. Apresentando já uma
sólida fundamentação teórica, os autores entendem o arquivo como um todo
orgânico, regulado pela ordem original, alargam o âmbito do arquivo a
órgãos administrativos e a entidades privadas e definem princípios que
devem reger a conservação e a eliminação de documentos.
Outro avanço significativo surge no pós-guerra norte-americano com a
noção de «records management» que irá revolucionar inicialmente os arquivos
administrativos e redefinir as fronteiras da arquivística, sobretudo no que
respeita à teoria das três idades do documento, aplicando o princípio
metodológico que se prende, não só com a economia e a eficácia na gestão
documental, mas também com a noção integradora que respeite a ordem natural
dos arquivos e os entenda como sistemas orgânicos.
Já na década de 60, coube à Nova História transformar o discurso dos
documentos de arquivo, entendidos como prova de autenticidade e como
testemunhos científicos, de acordo com as práticas ideológicas vigentes.
Segundo Foucault: «Da História dos grandes homens e das grandes sínteses,
passou-se à História dos povos e das mentalidades, mais rica mas menos
fácil de delimitar» (1969: 9). Neste sentido, os estudos demográficos,
genealógicos e onomásticos servem-se dos registos paroquiais, como fontes
de investigação para a história local e nacional e reconhecidos como
património histórico-documental.


Marcado pela Escola Francesa, a interpretação de documento de arquivo
aliado à pluralidade de leituras a que está sujeito, estará até tarde
relacionado com os conceitos de «arqueologia documental» e de
«Palimpsesto». Ao que Le Goff chama de documento como monumento, a
arqueologia documental traduz o que Foucault afirma ser a descrição
intrínseca do monumento (1969: 13-15). A noção de arqueologia associada ao
documento não procura, neste âmbito, restituir o que se pensou, não é o
retorno ao segredo de origem, mas sim a descrição sistemática de um
discurso objecto (1969: 183), procurando definir a sua especificidade, isto
é, o domínio do saber (1969: 255).
Seguindo os parâmetros metodológicos do conhecimento histórico, a
arquivística socorre-se de ramos da ciência (ou ciências auxiliares da
história) como a Paleografia, a Diplomática e a Onomástica, para a
decifração e leitura completa do documento, mas também da história, da
literatura e da filosofia que concorrem para a sua análise e interpretação.
Aproximando-se do conceito actual de arquivo, Foucault (1972: 128) entende
os arquivos como "sistemas de pensamento", sujeitos às mutações sociais, na
medida em que estes espelham as suas crenças, valores e necessidades. O
arquivo é neste contexto entendido como o sistema que, pela aplicação de
metodologias e técnicas, permite a subsistência e a mutação dos enunciados
e rege a sua aparição como acontecimentos singulares onde se estabelecem
relações múltiplas. É o que o historiador chama de sistema geral da
formação e transformação dos enunciados (1969: 171). Sobre esta
interpretação historicista da arquivística, Malheiro da Silva considera que
«o primado da História, se por um lado contribui para a valorização dos
arquivos, por outro lado gerou um efeito perverso, provocando rupturas anti-
naturais nas estruturas sistémicas que desde há milénios se afirmavam como
entidades diacronicamente indissociáveis e com uma linha evolutiva única».
(1999: 133)
Contudo, a década de 60 é igualmente, testemunha de novas propostas
que começam a defender a arquivística como ciência vindas, sobretudo, da
Escola Anglo-saxónica que levara mais a sério o problema da «explosão
documental» nos arquivos administrativos e apostara no tratamento da
informação para dar resposta às exigências da informação científica e
técnica. Se se tinha avançado significativamente nos aspectos técnicos e
práticos da arquivística que se prendiam com questões como a avaliação e
selecção de documentos ou com a necessidade da microfilmagem como processo
alternativo de conservação dos mesmos, faltava uma teorização científica,
cuja raiz epistémica reside no fenómeno da realidade humana e social.
Um dos contributos mais válidos nesta linha, viria curiosamente, da
América latina da autoria de Aurélio Tanodi no seu Manual de Archivologia
Hispano-americana (1961) que concebe uma visão tripartida da arquivística,
estabelecendo um aparelho conceptual em torno do objecto bem como
procedimentos metodológicos que fundamentam a disciplina como ciência. Na
Teoria Arquivística, Tanodi inclui os conceitos gerais e a história dos
arquivos; na Arquivoeconomia, aspectos materiais, como a conservação, o
restauro e os edifícios; e na Arquivonomia, o autor inclui a organização,
descrição e legislação sobre a matéria. Não muito distinto, aliás, da
fundamentação teórica que nesta década se vinha fazendo em relação à
Museologia e à Museografia.


Em Portugal, na década de oitenta, a arquivística continua a ser vista
como ciência auxiliar da História. Nesta linha, José Mattoso entende o
arquivo como um «instrumento privilegiado da construção social do passado»
(1988: 90), memória comunicada ao presente através de uma «arsenal de
provas» disponibilizadas às sucessivas gerações capazes de refazer a
história ou as histórias como a história económica, a história das
mentalidades, história do direito, etc». O relevo dado ao património
arquivístico e à missão do arquivo é de tal forma significativo que José
Mattoso propõe renovar os arquivos para renovar a história, anunciando já a
revolução tecnológica e social que incidirá, sobretudo, sobre os arquivos
históricos e os arquivos administrativos. De facto, esta década assistiu a
significativos avanços no que respeita à especialização profissional do
arquivista, à gestão e normalização arquivísticas e à reformulação crítica
da noção de Fundo que corresponde, segundo Malheiro da Silva, ao termo da
«fase técnica e custodial» dos documentos que se vinha afirmando desde o
final do século XIX.



Na década de 90, «fase científica e pós-custodial», emergem os
arquivos como sistemas de informação e cresce a necessidade de abordar a
arquivística numa perspectiva epistemológica, ou seja, (o estudo crítico
dos princípios, hipóteses e resultados da ciência arquivística). Partindo
do princípio que a origem dos arquivos remonta ao surgimento da escrita com
o objectivo de ordenar a informação contida nos primeiros documentos, desde
logo, a missão do arquivo se prende com, fazendo uso dos termos actuais, a
gestão da informação.


A Ciência moderna está em constante mutação o que denuncia a
fragilidade dos seus paradigmas e a necessidade de permanente reconstrução
do quadro do saber científico que se prende com a objectividade e
verificabilidade da verdade científica. Não sendo ainda unânime a plena
afirmação epistemológica da disciplina por parte da comunidade científica,
facto a que Malheiro da Silva denomina de «crucial tensão dialéctica»
(1999: 208), aquele cientista da informação avança numa nova definição da
arquivística, entendida como «uma ciência da informação social
materializada em qualquer suporte que estuda o arquivo enquanto sistema
(semi-) fechado, (...), configurado pela natureza orgânica (no que respeita
à estrutura) e a natureza funcional (concernente ao serviço/uso) através de
um dispositivo coeso, retrospectivo e prospectivo, capaz de problematizar
em torno de leis formais ou princípios gerais, a actividade humana e social
implicada no processo informacional arquivístico.» (1999: 211-214).
Segundo o mesmo autor, a formulação de uma metodologia arquivística
passa, invariavelmente, pela problematização de princípios inerentes à
informação social e à legitimidade epistemológica arquivística, ou seja, o
conhecimento arquivístico. Este, pressupõe a existência de um método e de
um objecto. Enquanto o dispositivo metodológico diz respeito às leis,
princípios e validade epistemológica; o objecto, debruça-se,
simultaneamente, sobre a natureza orgânica do arquivo (que pode assumir a
configuração de unicelular e pluricelular) e a natureza funcional (arquivo
centralizado, descentralizado e especializado).
Se a arquivística descritiva tradicional entendia que a documentação
de arquivo apenas devia compreender duas fases: a fase administrativa e a
fase definitiva; actualmente; a moderna arquivística considera o arquivo
como um sistema orgânico de longa duração, passando a sua organização por
três fases, na formulada teoria das três idades do ciclo de vida do
documento: a corrente, a intermédia e a definitiva (VIEIRA, 1991: 7). O
modelo de organização arquivística proposto pelos especialistas nacionais e
estrangeiros para a incorporação dos documentos obedece aos princípios
básicos da «homogeneidade, identidade e indivisibilidade – inerentes à
prática de respeito dos fundos e os de seriação e indexação, que devem
presidir à elaboração de instrumentos de trabalho», como defendia (SENA,
Maria Teresa, 1988: 365).
Os estudos na área da arquivística existentes em Portugal datados, na
sua maioria, dos anos oitenta, apresentam uma reflexão teórica que incide
sobre os principais problemas e apontam soluções para a arquivística até
aquela década, não muito distintas das que os modernos teóricos apresentam
hoje. Os seus especialistas aliam o renovado interesse pela historiografia,
nas suas vertentes de história da cultura e história das ideias, às
potencialidades da Ciência da Informação. Sobretudo preocupados com os
serviços de referência e a comunicabilidade da informação, os mais recentes
contributos têm centrado a sua atenção nas necessidades do utilizador,
propondo a criação de «dossiers especializados» que orientem o investigador
sobre as temáticas, a bibliografia, os fundos e colecções provenientes de
diversos organismos (P. PENTEADO, 1995: 26).
Dados que nos levam a concluir que em Portugal, a arquivística passa
por um renovado esforço de afirmação como disciplina autónoma, cuja
vitalidade se reflecte na produção científica editada. Destacam-se os
contributos de Maria de Lurdes Rosa, Pedro Penteado, Fernanda Ribeiro, o já
citado, Armando Malheiro da Silva e Pedro de Abreu Peixoto que se têm
revelado decisivos para a mudança no âmbito da teoria e prática
arquivísticas. Por sua vez, no plano internacional, destacam-se os nomes de
Elio Lodolini, Antónia Heredia Herrera, Carol Couture e Jean Yves Rousseau
com os contributos mais válidos na fundamentação teórica da disciplina,
representantes das 3 grandes escolas com tradição arquivística: a italiana,
a espanhola e a canadiense.



1. – O documento de arquivo
Em termos gerais, o documento escrito tem sido entendido como objecto
da cultura material da actividade humana, que serve de fonte de
conhecimento, com valor probatório e legal. Fernando Ruiz, da Universidade
de Múrcia, distingue dois tipos de documento: o documento entendido como
fonte narrativa, artística, informativa e científica, produto da
imaginação, da criação e da investigação: (tal é o material de Biblioteca,
de museus e de centros de documentação); e o documento de arquivo, de
carácter administrativo e jurídico, reflexo das relações e actividades do
homem e da sociedade, com valor de autenticidade e objectividade. O
documento de arquivo não só tem valor informativo, como constitui
testemunho científico e eleva-se a fonte de informação.
Se nos detivermos numa reflexão mais aturada sobre o documento de
arquivo à luz dos paradigmas actuais, teremos forçosamente que contemplar
especificidades externas e internas. Do ponto de vista formal, o documento
de arquivo apresenta-se em qualquer língua, forma ou suporte (forma oral ou
escrita, textual ou gráfica, manuscrita ou impressa) e em linguagem natural
ou codificada. Do ponto de vista de conteúdo, o documento de arquivo é
único e autêntico, inserido num conjunto orgânico e intimamente relacionado
com a entidade produtora, resultado de um processo natural da actividade e
gestão de uma pessoa ou identidade pública ou privada, conservado como
prova e como informação. (Francisco Fuester Ruiz, 1999)[1].

2. – Definição de arquivo


Segundo o Dicionário de Terminologia Arquivística (1993), a definição
de arquivo apresenta-se como «um conjunto orgânico de documentos,
independentemente da sua data, forma e suporte material, produzidos ou
recebidos por uma pessoa jurídica, singular ou colectiva, ou por um
organismo público ou privado, no exercício da sua actividade e conservados
a título de prova ou informação». A referida definição remete ainda, para a
«instituição ou serviço responsável pela aquisição, conservação,
organização e comunicação dos documentos de arquivo» (1993: 7).
A última definição portuguesa, datada de 2002 da autoria de Malheiro
da Silva, reza que o arquivo é definido como um «sistema de informação
(semi-) fechado, em que predomina o factor de organicidade. O seu estudo
científico absorve uma parte substancial do trabalho desenvolvido no
domínio da Organização e Métodos e não pode prescindir da convocação
interdisciplinar de várias ciências sociais (História, Sociologia, Direito,
Administração, etc).» (Malheiro da Silva)
Dada a complexidade e ausência de unanimidade quanto a uma definição
válida de arquivo, avançamos com os seguintes subsídios para elaboração de
uma definição mais abrangente:
O arquivo é...
1 – Instituição produtora de documentos administrativos, jurídicos ou
científicos.
2 – Espaço físico e intelectual da memória
3 – Os seus suportes: papel, audiovisual e digital.
4 – Conjunto orgânico de documentos produzidos na instituição ou recebidos
de outras entidades.
5 – Depósito de arquivo
6 - Os seus recursos humanos especializados
7 – Tarefas científicas e técnicas que passam pela avaliação, organização,
conservação e disponibilização da documentação
8- Tipologias arquivísticas: arquivo de empresa, arquivo de família,
arquivo público, arquivo distrital.

Na esteira dos modernos especialistas como Lodolini e Franscisco
Fuster Ruiz, podemos afirmar da necessidade de coesão e unidade destes
itens como um conjunto de elementos interrelacionados que tornam o arquivo
uma unidade integral, ou seja, como um SISTEMA.
νAnálise de νAnálise de


II – O ARQUIVISTA COMO MEDIADOR ENTRE A CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO E A
SOCIEDADE.

No que respeita ao papel do arquivista, diferentes têm sido as
leituras apresentadas ao longo dos tempos: desde o arquivista entendido
como historiador e arqueólogo, fiel guardador de vestígios escritos do
passado até ao arquivista como técnico da informação, conhecedor da gestão
integrada de informação: responsável pelas três fases da produção de
documentos e «expert» nos diferentes suportes que as novas tecnologias
oferecem. Hoje, o arquivista é entendido, quase, por unanimidade, como um
mediador entre a ciência da Informação e a Sociedade onde, com mais
premência, se colocam questões relacionadas com a ética profissional, com o
conceito de democratização do saber, agora, mais do que nunca, relacionado
com os suportes digitais e com a disponibilização de informação via
Internet.
A sua responsabilidade pelo tratamento, avaliação, conservação e
comunicabilidade exige conhecimentos teóricos e técnicos específicos que
tornam imprescindível uma constante formação e adaptação às novas
realidades. Quando o arquivista, por exemplo, se depara com a
desorganização e o mau estado dos documentos, vítimas da incúria dos
próprios produtores, é a criatividade do arquivista, a par dos seus
conhecimentos técnicos, que transformam um «arquivo morto» num arquivo
vivo: organizado e disponibilizado ao público.
A investigação, como desenvolveremos mais adiante, deve ser entendida
como especialização do arquivista que acumula o papel de colaborador
administrativo com o de intérprete de documentos. É este o desafio que se
coloca às Universidades portuguesas que apostam nas Ciências da Informação
nos seus diferentes graus académicos: licenciatura, pós-graduação, mestrado
e doutoramento – a garantia da produção de conhecimento na área, à
semelhança do que vem acontecendo há décadas com os especialistas formados
nas grandes escolas francesa, austríaca, espanhola e italiana. Como
afirmava Leopoldo Sandri em 1966, o trabalho arquivístico tem assegurado a
sua autonomia científica em relação ao trabalho histórico. Contudo, para a
elaboração dos principais instrumentos de descrição documental em arquivo –
o Guia Geral e o Inventário dos fundos da instituição, continua a ser
pertinente um enquadramento teórico de identificação da instituição que
reflicta a produção documental, isto é, a estrutura orgânica, a evolução e
as competências da instituição. Este estudo, disponibilizado em suporte
papel ou no site da instituição, torna-se um instrumento imprescindível ao
utilizador no processo inicial da sua investigação, à semelhança do que
sucede com o Arquivo Contemporâneo das Finanças, cujos textos de
contextualização histórica estão a cargo de um historiador e de duas
técnicas superiores de arquivo.

Todos ansiamos pelo reconhecimento da profissão, pela estabilidade e
remuneração justa pelas funções desempenhadas. Pilares decisivos na
organização da documentação administrativa e histórica, os arquivistas
confrontam-se com a dura realidade: a total ausência de sensibilidade e
falta de consciência da sua importância para a administração central e
local e para a sociedade em geral. As instituições estatais, a braços com
os cortes orçamentais, recebem os estagiários sem lhes auferir qualquer
espécie de remuneração, vivemos, por isso, uma situação semelhante àquela
que existia na Grécia antiga em que os trabalhos arquivísticos eram
efectuados por escravos públicos qualificados (COUTURE; ROUSSEAU, 43).
Penso que nem tudo está perdido. Ao contrário, as empresas já
perceberam a necessidade de contratar gestores de informação para o
desempenho de funções de «RESEARCHER» (investigadores, pesquisadores ou
documentalistas) especializados em recursos informacionais com a tarefa de
pesquisar, no âmbito nacional e internacional, dados informacionais que
melhor se adequam às necessidades da empresa. Ideal seria que os candidatos
a esta nova profissão fossem sobretudo arquivistas e não informáticos,
sinal de que os arquivistas estariam hoje mais apetrechados para assumirem
este desafio.




III – ARQUIVOS, BIBLIOTECAS E MUSEUS – NECESSIDADE DE OPERAR EM REDE.


Arquivos, bibliotecas, centros de documentação e museus, são hoje
entendidos como espaços de sociabilidade, vocacionados para o meio em que
estão inseridos. Biblioteconomia, museologia e arquivística, como ciências
sociais e de acção entendidos como sistemas orgânicos interligam-se numa
unidade concreta a que António Hespanha e Malheiro da Silva chamam de
«sistema patrimonial complexo» que a Lei do Património Cultural procura
regular (1999: 40). A Missão do arquivista, do bibliotecário, do
documentalista e do museólogo, no contexto informacional, não difere nas
grandes questões de fundo. Todos se devem pautar pelo rigor no cumprimento
das técnicas específicas, na avaliação, selecção, tratamento e
disponibilização de informação contida nos respectivos sistemas orgânicos a
que pertencem. É necessário abrir as fronteiras das diferentes disciplinas
e procurar as afinidades, os pontos de contacto, assimilar a evolução
histórica que percorreram e os desafios que se colocam às 3 áreas do saber,
para uma efectiva «sociabilização» das mesmas.
De entre os serviços de documentação, o arquivo foi sempre considerado
o «parente pobre» entre as bibliotecas, cobiçadas nas últimas décadas como
elemento de propaganda autárquica, enquanto os Museus continuam, em muitos
casos, a ser considerados equipamentos simbólicos e de luxo.
Teremos forçosamente de observar o trabalho realizado noutros países
percebendo que não se pode conceber separadamente o que faz parte de um
todo patrimonial. No nosso entender, é tão válido e viável o cruzamento de
dados dos arquivos correntes da administração pública como no que respeita
ao património histórico, dando a possibilidade ao utilizador de navegar num
vasto e ilimitado universo informacional, nacional e estrangeiro. O
Congresso Norte-americano criou o Programa METS que reúne bases de dados
relativas a bibliotecas, arquivos e museus e, no âmbito inter-
universitário, a Rede ALFA, radicada no Peru, – reúne universidades
europeias e latino-americanas em torno de um projecto de investigação nas
áreas das ciências sociais e humanas que reflectem sobre realidade das
mulheres da América Latina ao longo da sua história.
A nível europeu, alguns esforços têm sido empreendidos por
instituições reguladoras como a UNESCO e a CIA. Em Portugal, a Biblioteca
Nacional tem a seu cargo o projecto MALVINE que visa desenvolver uma rede
integrada de informação sobre arquivos e espólios literários na Europa, com
nove países envolvidos e o projecto GABRIEL no respeitante à Rede de
Bibliotecas Europeias. Começamos tarde e hoje, ainda por implantar na sua
totalidade o projecto PARAM, não se vislumbra para tão cedo a desejada
criação da Rede Municipal de Arquivos. Ao sabor da criação e extinção de
ministérios e direcções gerais, continua a faltar uma política concertada
de arquivos a julgar pelos processos judiciais repetidamente encontrados em
contentores na beira de estrada.

IV – A INVESTIGAÇÃO E O MÉTODO ARQUIVÍSTICO


Como já referimos, para a evolução da disciplina arquivística e para o
seu efectivo reconhecimento social e científico, é indispensável a prática
de investigação que reúna conceitos epistemológicos viáveis para o seu
desempenho. Segundo Robert Garon, «quer se trate de investigação empírica,
estimulada ou planificada, verifica-se uma constante: dados os primeiros
passos, o desenvolvimento de um povo, de um grupo social, de uma empresa ou
de uma área de conhecimento passa pela investigação» (Apud COUTURE,
ROUSSEAU, 1998: 274).
Nesta linha, Louise Gagnon-Arguin apresenta um plano estratégico de
desenvolvimento da investigação que se prende com os conteúdos da
disciplina arquivística, tais como os princípios e os métodos, o
vocabulário e a terminologia; o ciclo de vida dos documentos de arquivo; a
aplicação do princípio da proveniência; a normalização; a tipologia da
informação contida nos arquivos; a pedagogia arquivística e as relações
entre a teoria e a prática (Apud Ob. Cit., 1998: 275).

O método arquivístico é imprescindível no exercício da investigação.
Das novas tendências nesta área, destaca-se a dinâmica quadripolar de
investigação qualitativa na esteira de Paul de Bruyne (1974), Jacques
Herman e Lessard-Hébert. Este método visa um aperfeiçoamento constante do
conhecimento e assenta na interacção de quatro pólos essenciais: o pólo
epistemológico (no plano teórico e institucional que diz respeito à
comunidade científica dos arquivistas e aos seus referentes políticos,
ideológicos e culturais), o pólo teórico (que se prende com conceitos
operatórios, hipóteses e teorias), o pólo técnico (procedimentos técnicos
que assentam: a) observação casuística, ou seja, elaboração de fichas e de
registos informáticos; b) avaliação retrospectiva e prospectiva) e o pólo
morfológico (que assenta na análise dos dados recolhidos).


A investigação em arquivística pode ser entendida a dois níveis,
cobrindo duas necessidades diferentes:
1 – a investigação, levada a cabo pelo cientista da informação, que se
prende com a teoria, gestão e fundamentos da arquivística, cujos estudos
contribuem para o efectivo avanço da ciência arquivística
2 – a investigação (pesquisa), entendida como recurso informacional
produzido no contexto do serviço de referência da instituição pelo técnico
superior de arquivo, de apoio ao utilizador que procura informação sobre a
história da instituição ou bibliografia de referência sobre uma determinada
área do saber. Em ambos os casos, o arquivista deve ter o mesmo
procedimento, desde seleccionar a informação pretendida até à tomada de
conclusões com vista à produção de conhecimento e à sua aplicação, a que
Urdaneta e outros teóricos designam por produção de inteligência.
A investigação, neste contexto, prevê o contributo multidisciplinar
para o tratamento e recuperação intelectual da informação para o qual o
arquivista necessita de se socorrer de novas fontes, como a Internet e de
técnicas como a análise de conteúdo, a indexação, etc. como foi o caso dos
trabalhos realizados no âmbito da disciplina Investigação Arquivística, nas
áreas da Saúde e da Educação.


Para ambos os níveis de investigação, o profissional da informação,
seja ele arquivista, bibliotecário ou museólogo, deve partir dos seguintes
pressupostos:


1 – Procurar, reunir e seleccionar a informação pretendida
2 – tratar intelectualmente essa informação
3 – estudar, reflectir, comparar dados informacionais
4 – Tirar conclusões com vista à produção de conhecimento
5 – Aplicar o conhecimento: produção da inteligência (URDANETA – Gestão da
Inteligência, 1992)

A investigação, iniciada no contexto de formação universitária, deve
ser uma das prioridades do Estado, enquanto sustentáculo fundamental do
desenvolvimento. De igual modo, as empresas devem estar informadas e
motivadas para a contratação de jovens licenciados e pós-graduados com
aptidão para o exercício da investigação. Segundo os autores Leydesdorff e
Etzkowitz (1998) deve existir um comum esforço entre as Universidades, as
empresas e o Estado, no que designam de «Tríplice élice» para formação dos
seus técnicos, valorização das carreiras através de acções de formação ou
formação contínua com vista ao aperfeiçoamento, e criação de projectos
modernos de acordo com as necessidades. Na prática, esta Universidade já o
faz, tendo estabelecidos protocolos com arquivos e bibliotecas onde os
alunos de Ciências Documentais podem realizar os seus estágios.

4.1. - Da arquivística comparada
Não é estranho de todos que o método comparativo de análise de há
muito que é utilizado para o estudo nas Ciências Sociais e Humanas.
Considerando que o estudo das semelhanças e diferenças entre diversos tipos
de grupos, sociedades ou povos contribui para uma melhor compreensão do
comportamento humano, os estudos comparatistas têm sido aplicados à
Literatura, à Política, à História, à Economia, ao Direito, etc. No Brasil,
concretamente, a disciplina de Bibliotecnomia Comparada e Internacional faz
parte dos curricula das ciências da informação porque se achou pertinente
dotar o aluno de um enquadramento teórico da disciplina, apresentando-lhe a
sua evolução histórica no contexto nacional e internacional. Contudo a
biblioteconomia ou a arquivística comparadas, assentes em princípios
metodológicos adequados, podem ir mais longe se se detiverem no estudo das
realidades arquivísticas similares, ou distintas, que variam de país para
país. (malheiro da silva, 104). Também é possível o estudo das diferentes
tendências apresentadas pelas escolas que, desde o século XIX, têm marcado
as ciências documentais: a Escola dos Annales, a École de Chartes e a
Escola de Florença, por exemplo, ou ainda, é possível fazer um estudo da
evolução arquivística através dos contributos dados nas sucessivas
Conferências Internacionais da Table Ronde des Archives, ou perceber em que
medida a arquivística americana influenciou na década de 60 os arquivos da
América latina, incluindo o Brasil. (Malheiro da Silva, 144).
Cada país adaptou a teoria arquivística às suas necessidades de acordo
com a sua identidade, sendo possível, no âmbito da legislação arquivística,
notar algumas nuances relativamente ao que se passa na América Latina, nos
países socialistas, no Canadá ou na Austrália.
São inúmeras, portanto, as potencialidades da área que em muito
contribuem para a formalização do saber da ciência arquivística.


4.2. - Linguística e a Indexação.
De facto, as novas perspectivas e potencialidades da arquivística -
cujas fontes são os recursos informacionais, transformaram a forma como se
investigava no passado e como se investiga hoje. Há duas décadas atrás
debatia-se a questão de como a história se socorria da arquivística e vice-
versa, hoje, como ciência autónoma, novas disciplinas atravessam o universo
arquivístico enriquecendo o seu âmbito de acção. Do carácter
interdisciplinar da ciência arquivística há que destacar duas disciplinas
que também elas há muito que reclamaram o estatuto de ciências: a
Linguística e a Indexação.
A Linguística, tem seguido um percurso idêntico ao da arquivística.
Assumida como ciência desde a década de 60, tem por isso, insistido na
necessidade de rigor e na formalização do objecto que é comum a todas as
disciplinas. Segundo Benveniste, «a linguística tornou-se uma ciência maior
entre aquelas que se ocupam do homem e da sociedade, uma das mais activas
na investigação teórica»[2] e técnica graças ao processo de renovação
iniciado por Ferdinand Saussure. Essencial à materialização da informação,
o código linguístico apresenta-se através de signos que representam
objectos, ideias ou conceitos, dependentes do senso comum do grupo social
que os utiliza. Os recursos linguísticos identificam e organizam os
símbolos contidos nos registos de informação. (Malheiro da Silva, 26).
Partindo do contributo de Saussure, a Indexação assume a língua como
sistema de signos, composto pelo significante (semântica: substantivo,
adjectivo) e pelo significado (sentido ou interpretação da palavra),
garantindo, deste modo, a sua unidade semiológica.
Linguagem controlada aplicada à documentação de arquivo, a Indexação
deve apresentar «termos claros, exactos que correspondam a conceitos
universais em matéria de arquivos»[3]. A análise e interpretação do
documento de arquivo permitem descrever ou identificar um documento
relativamente ao seu conteúdo e selecção dos termos de indexação: norma ISO
5963 e NP 3715 (1988). Como instrumento de apoio, a indexação para arquivos
possui as normas de descrição arquivística da ISADG e as normas para o
controlo de autoridade proporcionado pela ISAAR.


4.3. – A Terminologia arquivística
A Linguística, como disciplina de apoio à Terminologia arquivística
(vocabulário técnico) tem sido indispensável na consolidação de uma
metodologia arquivística. A fixação de uma terminologia estruturada tem
sido um desafio para o Conselho Internacional de Arquivos (CIA) ciente de
que é urgente «compatibilizar o controlo da explosão documental com a
preservação de documentos fundamentais produzidos em suportes cada vez mais
diferenciados e através de códigos de registo cada vez mais
sofisticados»[4]. As diferentes realidades nacionais, tipologias
arquivísticas e documentais, termos correntes, conceitos arquivísticos que
variam de país para país, determinando variantes no que respeita ao léxico
administrativo, legal e jurídico, limitam o ambicioso projecto de um
instrumento plurilingue. Inúmeras têm sido, por isso, as dificuldades na
elaboração de um Dicionário de Terminologia Arquivística (1ª ed, 1984- 2ª
ed, 1988[5] e trad. portuguesa de 1993) capaz de dar uma abrangente e
satisfatória exaustividade aplicada à realidade de todos os países e de
todas as escolas ou movimentos arquivísticos. O «património» Lexical de
cada país deve ser respeitado e articulado com o esforço de normalização
que o deve reger. Daí toda a pertinência em incluir no Dicionário português
de Terminologia (1993) o vocabulário equivalente nas principais línguas:
português do Brasil, espanhol, francês, italiano, inglês e alemão.
Passados onze anos, o referido dicionário continua a ser um
instrumento útil, mau grado, as limitações decorrentes de uma década de
mutações tecnológicas que exigem alguns aperfeiçoamentos, como aliás, as
autoras previam. Hoje, continuam a acentuar-se tendências distintas, a
terminologia clássica, de linhagem francesa e a terminologia moderna da
escola anglo-saxónica, ambas distantes da realidade portuguesa. Outro
instrumento que tem vigorado entre nós é a NP 4041/90 – intitulada:
Documentação: terminologia arquivística: conceitos básicos, que, segundo os
críticos, se cinge ao «mínimo essencial da Arquivística clássica, de pendor
técnico e carecida de substrato teórico» (Malheiro da Silva, 1999: 235).
Para além das competências linguísticas, o arquivista deve alargar o
seu campo de acção à Teoria Literária, para a edição de texto, por exemplo,
na medida em que deve ser capaz de realizar análise de conteúdo na sua
dupla vertente de crítica interpretativa e judicativa. Ou seja, é
interpretativa ao entendermos o texto como reflexo e expressão de certas
necessidades socioculturais, localizado no espaço e no tempo (Paul Ricoeur
– Teoria da Interpretação, 1976) e é judicativa, porque o arquivista faz
uso da sua capacidade de julgar o significado da frase entendido por
Husserl (autor das Investigações Lógicas) como um objecto ideal que pode
ser identificado e reidentificado por diferentes indivíduos em épocas
diferentes.

Se a arquivística é hoje uma ciência da informação, enriquecida pelas
relações interdisciplinares e sujeita às mutações tecnológicas, ela requer
uma terminologia estruturada e sistematizada, adequada e suficientemente
abrangente que responda às necessidades de uniformização, de normalização e
de coordenação para uma troca eficaz de informação. Quanto ao caso
português, terá forçosamente de haver um consenso face à natureza
polissémica da nossa língua e optar pela economia de termos aplicados aos
diferentes conceitos arquivísticos que garantam a solidez da terminologia
nacional.

4.4. - Trabalhos de Investigação realizados no âmbito do CECD


4.4.1. - A cadeira de Investigação arquivística


No âmbito da disciplina de Investigação Arquivística que a partir do
biénio de 2002-04 passou a fazer parte das cadeiras curriculares do curso
de especialização em Ciências Documentais, foi proposto aos alunos a
realização de um trabalho de pesquisa nas áreas da Educação e da Saúde com
vista à realização de uma colecção bibliográfica de referência, de
ficheiros especializados e de dossiers temáticos que visam constituir uma
base de dados para o Instituto de História Contemporânea da F.C.S.H. da
Universidade Nova de Lisboa. Trata-se de um projecto que congrega o
referido Instituto e os alunos da variante de arquivo do curso de
especialização em Ciências Documentais da Universidade Autónoma de Lisboa
num exercício de investigação inovador, quer para os alunos de Ciências
Documentais que têm pela primeira vez a possibilidade de abrir os
horizontes da área arquivística à produção científica, quer para o
Instituto de História Contemporânea que se socorre de técnicos da
informação para o cruzamento de dados em diferentes suportes: papel, CD-ROM
e Internet.
Todavia, outras disciplinas proporcionaram o mesmo exercício ao longo
do curso tais como Tipologia Arquivística e Observação e Prática
arquivística em que cada aluno teve a oportunidade de visitar um ou vários
arquivos e de realizar o respectivo relatório atendendo, na esteira de
Bruyne e Malheiro da Silva, aos quatro pólos de investigação: o pólo
epistemológico, o pólo teórico, o pólo técnico e o pólo morfológico.
Foi o que fizemos (eu e a Margarida Pereira), como investigadoras da
ciência arquivística, sobre a Biblioteca Memorial António Sardinha, de
carácter híbrido, dada a sua tripla vertente de biblioteca, arquivo e
museu, à guarda de uma biblioteca universitária. Deslocamo-nos ao local,
entrevistamos o arquivista e o director responsáveis pela organização do
arquivo, inteiramo-nos dos procedimentos, dos cursos de formação efectuados
para esse fim, da bibliografia de referência de que se socorreram, quer
para a organização do arquivo, quer para a contextualização histórica da
referida personagem. Processo que nos obrigou, ainda no segundo semestre do
curso, a fazer as mesmas leituras: inteirarmo-nos da bibliografia mais
representativa sobre os arquivos privados ou de família, bem como o desafio
de nos documentarmos sobre o autor, a sua época e o seu pensamento através
dos livros existentes na sua biblioteca para compreender a organização dos
documentos de arquivo (nomeadamente manuscritos) segundo a ordem original.
Quantos centros de documentação pertencentes a entidades públicas e
privadas similares, continuam a ser negligenciados e à espera de uma
política concertada que os dignifique e dinamize, transformando-os, por
exemplo, em Fundações, como tem feito a vizinha Espanha na última década.
Ora, a dinâmica das Fundações e dos institutos de investigação,
detentores de acervos valiosíssimos e de produção do conhecimento
científico, suscitam hoje questões que se prendem com o problema da
Digitalização, entendida como o novo suporte da Memória.
O novo espaço de comunicação que é a Internet permite novas
potencialidades mas também se depara com problemas sérios que se prendem
com os direitos de autor, com a delimitação da informação, com os suportes
e com a durabilidade da informação disponibilizada.


4.4.2 - O novo património digital
Com a democratização do conhecimento, aliado às novas tecnologias, a
última década tem sido testemunha de um potencial arquivístico em franco
desenvolvimento. Trata-se de perpetuar a Memória utilizando os mais
modernos recursos proporcionados pela Internet. As vantagens inerentes a
esta vertente informacional operando em REDE são múltiplas. Contudo, este
novo suporte apresenta algumas condicionantes que se prendem com o facto da
Internet ser «um espaço de mutabilidade constante» (LOPES; CARDOSO,
MOREIRA, 2001: 3). É necessário, portanto, rever critérios e procedimentos
relacionados com a recolha e preservação do conteúdo que permitam a
constante readaptação à evolução tecnológica. Esta nova realidade exige a
criação de parcerias no âmbito interdisciplinar (comunhão de diferentes
áreas científicas) que criem «sinergias no campo da investigação» (2001:
5).
Se, por um lado, os documentos digitais contribuem para o
enriquecimento das referidas bases de dados, diversificando a oferta
informacional apresentada em diferentes suportes, por outro lado, trata-se
de proceder à defesa e preservação dos fundos relativos à História
nacional. Neste sentido a Biblioteca Nacional, a Torre do Tombo e o Arquivo
Histórico Militar têm dado alguns passos decisivos, sendo que este último
arquivo tem já disponível no seu site a digitalização dos manuscritos
pertencentes ao Cônsul Aristides Sousa Mendes. No plano internacional,
destaca-se o Projecto PANDORA da Biblioteca Nacional Australiana, que
possui normas reguladoras e uma equipa permanente que procede à manutenção
das publicações on-line[6].
Relativamente aos estudos efectuados pelos alunos de ciências
documentais, a inserir na base de dados do Instituto de História
Contemporânea, devem ser levadas em conta questões como a selecção dos
documentos de acordo com a sua pertinência e relação com a informação
existente, o controlo sistemático da qualidade dos documentos digitalizados
bem como a adequada catalogação dos mesmos, isto é, que a cada página
digitalizada se disponibilize na mesma folha ou em hipertexto dados
relevantes como a origem, as dimensões, as datas, o editor, etc. Esta
informação pode, ainda, ser disponibilizada num portal temático com ligação
em rede a diversas universidades ou centros de investigação homólogos ao
Instituto da História Contemporânea.

V- EXPERIÊNCIA E BALANÇO DE DOIS ANOS DO CURSO DE CIÊNCIAS DOCUMENTAIS.
Após o conhecimento das bases da teoria arquivística, o mais
interessante e mais produtivo foi a investigação sobre as tipologias
arquivísticas e sobre os sistemas de informação.
Estes dois anos de especialização terão de ser entendidos como o
percurso em diferentes etapas do conhecimento arquivístico, teórico e
prático. O enriquecimento intelectual operado pelo contacto próximo entre
alunos e professores que nos transmitiram o enquadramento teórico das
diversas áreas da arquivística e o seu testemunho pessoal acrescido da
convivência diária com os colegas partilhando experiências e angústias e
cimentando amizades aprofundadas pela troca de experiências e espírito de
mútua ajuda.


A importância do Estágio é determinante na tomada de contacto com a
realidade do universo arquivístico e com o mundo do emprego, em geral. É o
ponto- -chave do curso, no que representa, em muito casos, a transição
do mundo académico para o primeiro emprego na área, sem ambições ou
pretensões de começar de cima.
Devemos estar cientes de um longo caminho a percorrer no sentido da
modernização, da adaptação às novas exigências, sem esquecer que sem a
teoria não pode existir uma prática concertada virada para as necessidades
reais, sem correr o risco de que ainda se incorre hoje, de trabalhar sem
objectivos, sem um plano delineado; resistindo à mudança, sem estar atento
às modernas propostas apresentadas, produto da empenhada investigação de
autores nacionais e estrangeiros. Há que mudar as mentalidades, mudança que
passa necessariamente por consciencializar os futuros profissionais, não
tanto aos 30 anos, (é o meu caso, mais vale tarde que nunca) mas aos 15.
Aqueles que decidindo fazer carreira no âmbito das ciências documentais,
comecem o mais cedo possível, nos cursos técnico-profissionais a partir do
10º ano, com seguimento na Licenciatura na área e possibilidade de, caso o
desejem, de avançar na investigação através do mestrado e do doutoramento.
O mercado de trabalho exige cada vez mais competências ao arquivista
que vão desde as ciências sociais e humanas às ciências exactas. Não nos
basta já hoje definir aquilo que se tornou um lugar-comum: de que os
arquivos são espaços de socialização e de democratização do conhecimento. É
necessário avançar para um sistema político de democracia inteligente que
reconheça a necessidade dos arquivos, que forme os seus profissionais e que
valorize a sua actividade, determinante para a organização administrativa
do país. (democracia da solidariedade, democracia do défice e da retoma)

Conclusões:
Face à incógnita que é o futuro, é vital manter o espírito aberto e
otimista, que prima pela qualidade e pela inovação. Não devemos esperar que
seja o Estado a inovar. É importante acompanhar o conhecimento científico
produzido no estrangeiro, mas sobretudo, produzi-lo internamente dando-lhe
um cunho nacional, tal como sucede com a arquivística espanhola, sul-
americana, australiana, etc. Falta-nos criar uma identidade arquivística.
Que a globalização do conhecimento não permita uma total abstracção da
especificidade cultural portuguesa, cingindo-se à cópia dos modelos
estrangeiros.























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[1] Francisco Fuster Ruiz - «Archivística, archivo, documento de
archivo... necesidad de clarificar los conceptos». ANALES DE DOCUMENTACIÓN,
2, 1999, p. 103-120.


[2] Émile Benveniste – Problèmes de linguistique générale I. Paris:
Éditions Gallimard, 1966: 45.
[3] Antónia Heredia Herrera – Archivística general: teoria y práctica,
1989: 165.
[4] Ivone Alves, Maria Madalena Garcia, et.al., - Dicionário de
Terminologia Arquivística. 1993: IV.
[5] Aceite pelo Comité de Terminologia da C.I.A que procede à sua
actualização.
Grupo particularmente activo nesta área é o Grupo Iberoamericano de
Terminologia Archivística.
[6] Note-se que este projecto só contempla os documentos nado-digitais e
não os documentos digitalizados. No nosso caso, interessa-nos sobretudo
disponibilizar documentos históricos e não documentos que já foram criados
no contexto digital. Cada instituição deve, portanto, adequar o acervo
digital às suas necessidades.
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