2013 - José Malhoa - A Procissão da Colheita / A Vindima

June 14, 2017 | Autor: Arthur Valle | Categoria: Portuguese Art, José Malhoa
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JOSÉ MALHOA A procissão da colheita, 1929 óleo s/ tela, altura (drt: 443 cm) (esq: 320 cm) µ largura (cima: 212 cm) (baixo: 230 cm) (baixo-canto: 19 cm)

01 .11 . 201 3 — 1 9. 01 . 2014

JOSÉ MALHOA A vindima, 1929 óleo s/ tela, altura (drt: 443 cm) (esq: 320 cm) µ largura (cima: 212 cm) (baixo: 230 cm) (baixo-canto: 19 cm)

Aspecto exterior e vista da escadaria do hall do palacete mandado construir por Democrito L. Seabra na Praia do Flamengo, Rio de Janeiro/Brasil. Ao alto e à esquerda da segunda imagem, é possível discernir, por trás do gradil de ferro, a porção superior de A Vindima. Fonte: SCHETTINO, 2012, p.280, 282.

JOSÉ MALHOA A PROCISSÃO DA COLHEITA / A VINDIMA Os dois grandes painéis decorativos A procissão da colheita (originalmente intitulado A caminho da Romaria) e A Vindima foram encomendados a José Vital Branco Malhoa pelo empresário brasileiro Democrito Lartigau Seabra, para ornamentar o hall do luxuoso palacete que esse último mandou construir na Praia do Flamengo, Zona Sul do Rio de Janeiro, nos anos 1920. Oriundo de uma família de comerciantes do Rio, Seabra concebeu o edifício como uma prova de amor à sua esposa, Maria José: o projeto do palacete, de autoria de um arquiteto francês, bem como todas as peças de acabamento e decoração – portais, parquets, vitrais, tapetes, quadros, etc. – vieram da Europa. A encomenda dos painéis a Malhoa deixa-nos entrever o quanto Seabra se esmerou na ornamentação do edifício: em um primeiro momento, o mestre português teria recusado a encomenda, afirmando “não pintar a metro” – possivelmente, Malhoa ficou contrariado com as severas limitações impostas pela moldura arquitetônica que abrigaria os painéis e às quais se deve tributar o formato pouco usual dos mesmos, marcadamente verticalizados e chanfrados em suas partes inferiores. Seabra, todavia, não desistiu das desejadas decorações e teria viajado a Portugal para tratar diretamente com Malhoa, que, frente aos esforços empreendidos pelo brasileiro, acabou aceitando a encomenda. Iniciados em 1928 e terminados em 1929, A procissão da colheita e A Vindima foram efetivamente instalados no palacete da Praia do Flamengo, nas paredes do segundo lance de escadas do hall de entrada. Democrito Seabra terá, todavia, pouco deles desfrutado, uma vez que faleceu no começo de 1931; a viúva Maria José morou no prédio até sua morte, em 1989, e, em 1997, o palacete foi tombado pela Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro. Antes disso, porém os painéis de Malhoa foram retirados dos sítios para os quais haviam sido concebidos e leiloados. Acabaram retornando para Portugal e, em 1992, foram adquiridos para a coleção do Millennium bcp.

Ainda em 1929, antes de atravessar o Atlântico pela primeira vez, as enormes obras foram exibidas na 26ª Exposição da Sociedade Nacional de Belas-Artes. Artur Portela, então escrevendo para o Diário de Lisboa, viu nos painéis sinais de descuido e engano por parte de Malhoa: no caso de A procissão da colheita, recriminou a falta de originalidade da composição, “feita sob reminiscências de outras obras do mestre”, bem como a incoerência na escala das figuras; em A Vindima, acusou a falta da cor e da alegria que seriam características da faina em Portugal. Tal recepção negativa, bem como o fato das obras terem ficado décadas no Brasil, foram fatores que certamente contribuíram para que os painéis pouco fossem levados em conta na fortuna crítica de Malhoa. Uma reconsideração dessa situação far-se-ia hoje necessária. Comparáveis em dimensão aos grandes ciclos decorativos que Malhoa pintou nos anos finais do Oitocentos e início do Novecentos, como os do Museu Militar e da Casa Lambertini, a encomenda brasileira mobilizou todas as energias do pintor, então com 73 anos de idade. Se algumas das figuras de A procissão da colheita de fato evocam aquelas de quadros como A Procissão (1903) ou Chegada do Zé-Pereira à Romaria (1905), Malhoa não copiou-as simplesmente, nem deixou de utilizar modelos ou deslocar-se ao Norte para estudar os tipos humanos e os animais, como comprovam a correspondência trocada com amigos e os vários desenhos preparatórios ainda hoje existentes, espalhados por coleções portuguesas. A necessidade de integrar as pinturas em um contexto arquitetônico pré-determinado terá, de certo, influído na escolha de uma paleta de cores mormente esbatidas e na marcante frontalidade de boa parte das figuras; nesse mesmo sentido, as aparentes discrepâncias de escala e perspectiva parecem contribuir para a afirmação da planaridade dos painéis, que não deveriam romper a integridade do interior arquitetônico que os abrigava. Por fim, a própria escala da encomenda acabou por conferir uma monumentalidade inaudita à temática de gênero, tão característica da obra de Malhoa. Em certa medida, A procissão da colheita e A Vindima se constituem como a síntese tardia de uma série de motivos campesinos caros ao pintor, e sua atual exposição possibilita que os apreciemos com o olhar renovado que merecem.

Arthur Valle Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; Bolsista de Pós-Doutorado Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/Brasil.

Este texto foi redigido em Português do Brasil.

Referências bibliográficas COUTO, Matilde Tomaz. Malhoa e Bordalo: confluências duma geração. Instituto Português de Museus – Museu de José Malhoa, 2005. PORTELA, Arthur. “Pintura, escultura e aquarela. A 26a exposição da Sociedade de Belas-Artes”. Diario de Lisboa, Ano 9o, 2471, 30 Abr. 1929, p.3. SALDA NHA, Nuno. José Malhoa (1855–1933) – Catálogo Raisonné. Scribe, 2012. SCHET TINO, Patrícia T. J.. A Mulher e a casa [manuscrito] : estudo sobre a relação entre as transformações da arquitetura residencial e a evolução do papel feminino na sociedade carioca no final do século X I X e início do século X X. Tese (Doutorado) – UFMG, Escola de Arquitetura, 2012.

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