2014. As possibilidades semânticas da história: um estudo sobre a refiguração narrativa dos relatos ultramarinos na literatura contemporânea

May 29, 2017 | Autor: D. Vecchio Alves | Categoria: História, Ficção, Metáfora, Refiguração Narrativa, Relatos Ultramarinos
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Descrição do Produto

Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – IFCH
Departamento de História – DH









Possibilidades semânticas da história
Um estudo sobre a refiguração narrativa dos relatos ultramarinos no romance
contemporâneo









Daniel Vecchio Alves










Projeto de Doutorado - 2014/2019
Orientador: Paulo Celso Miceli
Área: História Cultural
Linha de Pesquisa: Gênero, Subjetividades e Cultura Material








CAMPINAS
2016

Resumo

ALVES, Daniel Vecchio. Universidade Estadual de Campinas [2014-2019].
Possibilidades semânticas da história. Um estudo sobre a refiguração
narrativa dos relatos ultramarinas no romance contemporâneo. Orientador:
Paulo Celso Miceli.

A tese pretendida busca no processo de refiguração narrativa definido por
Paul Ricoeur (2010) a sua principal ancoragem teórico-metodológica para
analisar os cruzamentos metafóricos entre história e ficção realizados pelo
romance contemporâneo. Diante de tal estratégia, nos sensibilizaremos para
o fato de que a metáfora da qual se serve esse processo de refiguração
suscita a abertura de um real possível mediante o texto ficcional,
provocando o surgimento de uma narrativa que pode resultar menos evasiva se
a compararmos com os vários aspectos heurísticos que pode conter um romance
fundamentado pela metáfora. A fim de analisarmos e avaliarmos o valor
referencial e crítico desse conceito mediador redirecionaremos seu campo de
reflexão ao tema eminente das navegações ultramarinas, clamando com essa
escolha a necessidade de rever os sentidos da construção narrativa e
identitária que a história oficial dos descobrimentos até então promovera
sob os auspícios de sua expressão épica. Nosso objeto de estudo situa-se,
portanto, no amplo campo da reflexão sobre as relações metafóricas entre
ficção e história através dos estudos de Paul Ricoeur, mas delimita como
âmbito específico de seu interesse aquilo que podemos qualificar como a
refiguração histórica das navegações ibéricas no romance contemporâneo.
Para isso, propomos examinar aqui um trio de narrativas produzidas nesse
tema recentemente, e que se compromissam com um processo de refiguração dos
relatos históricos de três significativas empresas ultramarinas: a primeira
viagem à América liderada por Colombo (El último crimen de Colón, de
Marcelo Levinas), a primeira viagem feita ao Oriente por Vasco da Gama
(Peregrinação de Barnabé das Índias, de Mário Cláudio) e, por último, a
primeira circunavegação da história realizada pela esquadra de Fernão de
Magalhães (Maluco. Romance dos descobridores, de Napoleón Baccino).
Observaremos, com essa literatura, que a história das navegações ibéricas
passa a se constituir não pelo valor dos registros fidedignos do seu
conjunto de relatos de viagem, mas pelas marcas que a denunciam como um
espaço de luta do significado, tornando-se, sobretudo, um locus de reflexão
acerca tanto do fazer do relato quanto das suas relações de força com o
contexto ultramarino e com o nosso próprio contexto pós-colonial. Por isso,
abordaremos os romances em questão de modo a esclarecer que todos eles
parecem articular uma refiguração da história das navegações ibéricas,
sendo essa refiguração um significado positivo, justamente porque parece
fazer revalidar a ideia de história ao reformular as premissas ideológicas
e as estratégias figurativo-discursivas do próprio relato. Essa
reformulação nos proporcionará uma aplicação diferencial da referência
figurada no horizonte textual das fontes, advogando para sua leitura e
representação uma analogia entre a explicação do passado e a compreensão
narrativa que põe em relevo a diversificação, a hierarquização e a
refiguração dos recursos formais e heurísticos dos registros.

Palavras-chaves: História; Ficção; Metáfora; Refiguração Narrativa; Relatos
Ultramarinos.





SUMÁRIO






1)Introdução e
Justificativa...........................................................
..............4


2)Crítica
bibliográfica...........................................................
.......................6
2.1)Consolidação das bases hipotéticas de pesquisa em ciências
humanas...6
2.2)A metáfora como relação de força entre história e
ficção.......................7
2.3)A refiguração dos Diários de Cristóvão Colombo em El último crimen
del Colón de Marcelo
Levinas.................................................................
.....12
2.4)A refiguração da Relação de Álvaro Velho em Peregrinação de Barnabé
das Índias de Mário
Cláudio.................................................................
........15
2.5)A refiguração de A primeira viagem ao redor do mundo de Antonio
Pigafetta em Maluco. Romance dos descobridores de Napoleón Baccino
Ponce de
León....................................................................
...........................17
2.6)Reconsiderações sobre a Política do Sigilo de Jaime
Cortesão.............19


3)Objetivos.............................................................
......................................21


4)Referencial Teórico-Metodológico: os procedimentos da refiguração
narrativa na
história................................................................
......................22

5)Plano de Trabalho e
Cronograma..........................................................24


6)Referências...........................................................
....................................25


7)Anexo I - Proposta de Sumário da
Tese.................................................27


8)Anexo II - Bibliografia de
Pesquisa.......................................................28










1)Introdução e Justificativa

Nesse projeto, adentraremos no universo da primeva literatura dos
descobrimentos ultramarinos, abrangendo especificamente a expansão marítima
ibérica dos séculos XV e XVI. O gosto efetivo pelos relatos de viagem, no
entanto, é anterior a essa época, tem suas raízes fincadas na Idade Média,
quando predominavam os relatos de peregrinação aos lugares santos. Esse
gosto nunca parou de crescer, tendo conhecido um significativo aumento do
público europeu quinhentista e seiscentista em virtude do comércio marítimo
com o Oriente, fonte perene de riqueza e imaginário.
No período renascentista, uma avalanche de relatos de viagem invadiu
toda a Europa, principalmente nas regiões peninsulares envolvidas
diretamente no ultramar. Desde o século XV, a mentalidade aberta e curiosa
intensificada pela expansão marítima favoreceu o florescimento de um
primeiro conjunto de relatos ibéricos. Essa primeira literatura das viagens
ultramarinas "conheceu uma grande popularidade ao longo do século XVI e no
início do XVII, atingindo verdadeiros recordes editoriais por toda a
Europa." (MADEIRA, 2005, p.26).
Contudo, por muito tempo, tal literatura tem sido abordada
limitadamente em função dos interesses apolíticos dos prolongados regimes
que assolaram a Península Ibérica desde então. Um dos resultados
intelectuais desse fator é que, ignorando as marcas de identidade,
religiosidade e outras subjetividades, os estudos sobre a história dos
descobrimentos ultramarinos permaneceram concentrados numa linha técnica e
econômica de estudo.
Diante desse contexto opressivo, muitos investigadores perceberam a
natural disposição da literatura contemporânea em revisitar e se apropriar
da história das navegações, propondo leituras alternativas e menos
restritivas. Veremos que tal propósito investigativo, ademais, corrobora o
trabalho de alguns teóricos que perceberam que a literatura passou também a
se tornar um espaço de discussão das fontes documentais desse tema
histórico, abordando questões fundamentais sobre a história e a identidade
dos países descolonizados. Sendo assim, o tema da viagem, por meio da
literatura, abre possibilidades de diálogo entre culturas e narrativas,
constituindo-se numa ferramenta para repensar os elementos ideológicos e
discursivos que compõem as experiências pós-coloniais das culturas[1]
atlânticas e asiáticas.
Na visão de Fernando Cristóvão, por exemplo, a literatura de viagens
constitui um subgênero literário tardiamente reconhecido, que se distingue
"pelo seu relacionamento interpretativo com o referente" (CRISTÓVÃO, 2002,
p. 15). Assim, existem textos que, de fato, não relatam nenhum percurso
físico do viajante histórico, mas pertencem ao subgênero referido por
relatarem minuciosamente o seu contato revisionista e simbólico com o
referente do espaço e do documento explorado. Nesse sentido, alega Fernando
Cristóvão que a literatura de viagens não tem monopólio das viagens, pois
ela abunda também na ficção de costumes, na história e em outras
narrativas: "Todavia nesta, o mais importante é o estatuto da viagem
enquanto deslocação, participando diretamente das características
semiológicas, históricas, de edição e de recepção que são próprias da
literatura de viagens." (CRISTÓVÃO, 2002, p. 15-16).
Diante desse caráter revisitador da história do descobrimentos
consolidado por parte da literatura contemporânea, nesse projeto, nos
proporemos a explorar uma heterogênea gama de textos e aspectos que oscilam
entre a cosmografia e a crônica, passando pela corografia e pelas relações
etnográficas. Alem disso, frisaremos os aspectos narrativos e imaginários
de muitos relatos e crônicas de viagens, agregando e reatualizando
informações do consagrado esquema classificativo da literatura de viagem
proposto há algumas décadas atrás por Joaquim Barradas de Carvalho, esquema
que ainda se atém aos aspectos técnicos desses documentos.[2]
Sendo assim, há muitas lacunas que merecem atenção nessa área temática
da história dos descobrimentos, lacunas que gradualmente são remexidas e
investigadas por escritores e estudiosos da literatura de viagens, como é o
caso das obras literárias que serão selecionadas como objetos de análise
nessa presente pesquisa:


El ultimo crimen del Colón (2001), de Marcelo Levinas
Peregrinação de Barnabé das Índias (1998), de Mário Cláudio
Maluco. Romance dos descobridores (1989), de Napoleón Baccino


Observaremos que esses romances abordam uma série de lacunas simbólicas
dos antigos relatos de viagem, envolvendo elementos de crendices, medos e
variados conflitos que poderiam constituir naturalmente o imaginário
ultramarino da época. Suas narrativas parecem se compromissar com a
releitura dos relatos de três importantes viagens da primeira fase
ultramarina: a primeira viagem à América liderada por Colombo em 1492, a
primeira viagem feita ao Oriente por Vasco da Gama em 1497 e 1498 e, por
último, a primeira circunavegação realizada pela esquadra de Fernão de
Magalhães, em 1521.
O tema das navegações marítimas sempre despertou muita atenção e
ultrapassa fronteiras, atingindo escritores de países diversos, como por
ora se apresenta com os autores aqui selecionados. Seus romances tratam
essas três viagens como eventos enigmáticos, que, pelo desafio pioneiro,
suscitavam conturbados imaginários, além dos aspectos comerciais que
estavam efetivamente envolvidos. Mas a questão principal consistirá em
saber de que recursos históricos e narrativos cada uma das obras romanescas
mencionadas dispõem para abordar a polissemia desses relatos, que hoje são
mundialmente divulgados.
Explorando os horizontes de possibilidade semântica dessa documentação,
portanto, os romances parecem promover uma curiosa investigação histórica,
levando em conta, sobretudo, que a capacidade de referenciar não é uma
característica exclusiva da história ou de qualquer outro discurso
considerado empírico, como a biografia. Veremos que a desconstrução da
verdade histórica e a abertura de um referencial possível mediante o texto
ficcional provocou o surgimento de uma narrativa fundamentada na metáfora,
no intuito de explorar possíveis sentidos subjetivos não evidenciados
claramente pelos registros. Como veremos no devido momento, essa metáfora
semântica capaz de delinear subjetividades históricas e culturais encontra
a sua melhor expressão nos trabalhos de I. A. Richards (1965), Max Black
(1962), Gérard Genette (1972) e Paul Ricoeur (2000).
Por meio do trabalho desses intelectuais, emerge uma inovação narrativa
que assemelha a metáfora à resolução de uma dissonância semântica, de uma
nova extensão do sentido figurado que amplia o significado das linguagens.
Veremos como essa metáfora constitui o que Paul Ricoeur (2010) denomina de
refiguração narrativa, processo semântico que será nossa principal
ancoragem teórico-metodológica para analisar os cruzamentos metafóricos
entre história e ficção realizados pelo romance contemporâneo.
Para Ricoeur, a metáfora que opera esse processo semântico explora
outros sentidos do campo simbólico dos registros, sentidos que devem ser
analisados com o mesmo grau de importância das marcas narrativas que
predominam na superfície textual. Longe de resumir-se à mera designação de
um objeto mediante uma palavra que designa outro objeto, a metáfora "é, com
efeito, um erro calculado, que associa coisas que não se ajustam e,
mediante este aparente mal-entendido, faz emergir uma nova relação de
sentido, até então despercebida, entre os termos que prévios sistemas de
classificação ignoravam ou não admitiam." (RICOEUR, 2013, p. 75). Assim,
muito mais do que uma ferramenta linguística, Ricoeur percebeu que ela é
para a história um meio indiciário de mergulhar nos desejos, vontades e
demais sensibilidades humanas que se encontram alocadas nos subterfúgios
semânticos das fontes.
A relação entre o sentido literal e o sentido figurativo de uma
expressão metafórica nos proporcionará aqui uma linha diretriz adequada que
nos permitirá identificar os outros traços semânticos das fontes
históricas. A metáfora nos conduzirá, desse modo, a uma conclusão
interpretativa diferente daqueles situados na estrutura lexical dos
registros, mostrando-nos como novas possibilidades de articulação e
conceitualização do passado podem surgir mediante a assimilação dos campos
semânticos até agora pouco explorados ou desconhecidos dos registros.
Todavia, aqui só notaremos consistentemente a eficácia dessa estratégia
semântica para a história no momento em que redirecionarmos esse campo
teórico de reflexão ao tema eminente das navegações ultramarinas, clamando
com essa escolha a necessidade de rever os limites dos sentidos da
construção narrativa que a história oficial dos descobrimentos até então
promovera sob os auspícios de sua expressão épica. Portanto, sem retirar a
presente pesquisa do campo das relações metafóricas entre ficção e
história, delimitamos como âmbito específico de seu interesse aquilo que é
coerente chamarmos de refiguração narrativa da história dos descobrimentos
ultramarinos.
É possível afirmar de antemão que as obras desse possível conjunto
temático possuem como traço comum a finalidade de redirecionar os andaimes
da memória das navegações, apontando para a necessidade de rever os
sentidos históricos que a historiografia oficial dos descobrimentos até
então promovera sob o jugo dos regimes. Por isso, pretendemos efetuar uma
análise que evidencie as simetrias metafóricas dos relatos de viagem que
serão investigados aqui, compreendendo suas releituras realizadas no espaço
textual dos romances assinalados.
Ao estabelecermos um paralelo analítico entre as obras literárias e os
relatos que os romancistas tomam por referência, melhor poderemos avaliar,
com o iminente auxílio teórico de Paul Ricoeur, a densidade interpretativa
de seus registros, ponderando as contribuições semânticas que o processo de
refiguração narrativa pode proporcionar à história cultural dos
descobrimentos ultramarinos.

2)Crítica bibliográfica

2.1)A consolidação da base hipotética de pesquisa em ciências humanas


Para a epistemologia, o falso ou o simulado é simplesmente um erro que
deve ser eliminado. Porém, se na cultura científica a verdade torna-se uma
questão de acerto e erro, nas humanidades, a verdade é a inacessibilidade
da certeza e do real. No cenário reflexivo atual das ciências humanas, o
registro "suspende a dicotomia certo/errado, verdade/mentira e
real/imaginário. Mais do que isso, a partir do romantismo, tais ciências já
se tornam um espaço de autorreflexão e de construção das novas
subjetividades e dos novos paradigmas do ser" (SELIGMANN-SILVA, 2013, p.
36).
Todavia, mesmo ressurgindo através dessa problemática, principalmente
por meio dos estudos hermenêuticos e fenomenológicos que se estenderam por
todo o século XX, as ciências humanas ainda parecem nadar contra a corrente
ao serem enquadradas muitas vezes em valores ou conceitos provenientes da
lógica ou das ciências naturais. Tudo nos leva a crer que, contra o
reposicionamento desses valores, está a promessa de autenticidade, que tem
a seu favor a nossa forte herança dialética, que incita o ser humano a
sempre enxergar

um mundo onde o bem e o mal sejam nitidamente
discerníveis, pois existe nele a vontade inata e indomável
de julgar antes de compreender. Sobre essa vontade estão
fundadas as religiões e as ideologias. [...]. Nisso está
contida a incapacidade de suportar a relatividade
essencial das coisas humanas, a incapacidade de encarar a
ausência do Juiz supremo. Devido a essa incapacidade, a
sabedoria do da incerteza é difícil de aceitar e de
compreender. (KUNDERA, 2009, p. 14-15)

Milan Kundera traduz a "sabedoria da incerteza" como uma sabedoria
capaz de confrontar a persistente necessidade humana de entender o mundo
sob o prisma binário do real e da fantasia, como se essas categorias fossem
entidades nitidamente discerníveis. Nessa linha de pensamento é que
gostaríamos de reposicionar as ciências humanas, já que elas se apropriam
também das incertezas, do silêncio, do oculto, da dúvida e do erro para
compreender o mundo humano em suas mais complexas experiências e tendências
de representação.
Veremos que esse reposicionamento revela-se como base para a
constituição de um pensamento recente sobre a inter e a
transdisciplinaridade. Esse pensamento é partilhado por um número grande de
pesquisadores, dentre eles Georges Gusdorf (1967), Basarab Nicolescu
(1999), Hilton Japiassu (1995), Américo Sommerman (2002), Ivan Fazenda
(2008), entre outros. Averiguaremos que todos esses pesquisadores, cada um
a seu modo, procuram destacar em seus trabalhos a importância da inter e da
transdisciplinaridade nas suas trajetórias profissionais e intelectuais.
Eles nos dão um bom exemplo de como esses pensamentos recentes têm sido
incorporados e desenvolvidos no campo das ciências humanas, auxiliando-nos
com uma prática reflexiva mais cautelosa e significativa. Uma questão
primeira que pode ser encontrada nesses teóricos é "a necessidade da
superação da dicotomia ciência/existência no trato da inter e da
transdisciplinaridade. Isso nos leva a pensar que qualquer atividade nesse
âmbito requer uma imersão teórica nas discussões epistemológicas mais
fundamentais e atuais de cada um dos campos do saber [...]. (FAZENDA, 2008,
p.14).
Na história, por exemplo, esse viés extrapola sua noção epistêmica
tradicional reduzida à verdade científica, aderindo-a a uma linha mais
retórica e filosófica de apropriação do passado. De acordo com tal
assertiva, apresentamos nossa reorientação teórica e metodológica nas
ciências humanas, almejando com isso um conhecimento histórico que parta de
interpretações hipoteticamente construídas com base na documentação
disponível. Essa estratégia vai além da zona de conforto que separa
categoricamente a certeza científica de qualquer elemento de incerteza,
evidenciando a atuação das expectativas e dos imaginários históricos na
constituição dos registros.
Operando de forma distinta da lógica, portanto, as humanidades serão
evocadas aqui na sua perspectiva subjetivadora do conhecimento, em que a
formulação de hipóteses se apresenta como ato de significar, o ponto máximo
da operação referencial que pode ser realizada tanto pela história quanto
pela ficção.


2.2)A metáfora como relação de força entre história e ficção

Levando adiante a perspectiva transdisciplinar apresentada
anteriormente, devemos esclarecer as origens e as readequações de alguns
conceitos e formas de abordagem que aqui nos serão vital para compreender o
funcionamento dos recentes hibridismos narrativos que vem se desenvolvendo
na construção do conhecimento histórico. Para tanto, neste tópico de
apresentação bibliográfica, observaremos que, nas últimas décadas, vem se
consolidando uma narrativa de tema histórico que, por meio da metáfora,
reinterpreta hipoteticamente os registros do passado.
Porém, é preciso ressaltar, antes de tudo, que a consolidação dessa
estratégia muito se deve à filosofia da linguagem pensada desde a Grécia
Clássica. Ela tem um parentesco profundo com "a capacidade das palavras
receberem significações adicionais, deslocadas ou associadas na base de sua
semelhança com sua significação fundamental, [...]." (RICOEUR, 2000, p.
273).
Diante dessa flexibilidade semântica das palavras, no Crátilo, Platão
já mostrara que o problema da verdade deve permanecer sem decisão, porque a
denominação não esgota o poder ou a função de falta: "O logos da linguagem
requer, pelo menos, um nome e um verbo e é o entrelaçamento dessas duas
palavras que constitui a primeira unidade da linguagem e do pensamento."
(RICOEUR, 2013, p. 11).
O Teeteto e o Sofista, de Platão, também designam a polaridade entre
função identificante e função predicativa do logos. Por meio dessa reflexão
acerca de um logos articulado, Platão saía do impasse da questão da verdade
emitida ´pelas palavras: "O fracasso de Crátilo, que é o fracasso de uma
teoria da denominação, o obriga a elaborar uma teoria da predicação,
encontrando eco do seu fracasso numa teoria da metáfora que permanece
igualmente nos limites de uma reflexão sobre a designação pelos nomes."
(RICOEUR, 2000, p. 115).
No entanto, foi Aristóteles quem realmente deu os primeiros passos para
o surgimento de uma concepção de estética, cujo significado não se limitava
mais ao grau da cópia do mundo exterior, passando a ser avaliado pelo grau
hipotético da verossimilhança. Ao enaltecer esse processo mimético como
poética, o estagirita nos fornece uma reflexão fundada na possibilidade
figurativa do real, sem o duro compromisso de traduzir os aspectos mundanos
em seu todo, compromisso que a história muitas vezes assumiu sem sucesso. O
texto, nesse sentido poético, passa a ser tomado como "suporte da mudança
de sentido, cuja essência consiste no tropo que depois a retórica
denominará de metáfora." (RICOEUR, 2000, p. 107).
Contudo, mesmo suscitando essa abertura, para o Aristóteles da Poética,
a mimese ainda estava muito relegada ao sagrado, ao processo narrativo que
caracterizava o proferir de deuses, oráculos e aedos. De acordo com essa
tendência, ele contrapõe duas formas narrativas: a verdade histórica e a
verdade poética, ou seja, a verossimilhança, sendo o poder imaginativo e as
sagradas suposições de âmbito universal as marcas principais dessa poética,
enquanto o apego à experiência particular, a característica central da
história (ARISTÓTELES, 2004).
Na Poética, a teoria aristotélica da metáfora se restringe muito à
oposição entre palavra comum e palavra estranha, caracterizando-se mais
como um desvio de linguagem de caráter ornado. Se, na Poética, Aristóteles
se limita a tratar o verossímil como algo evasivo ou extraterreno, ele o
fará ganhar na Retórica, porém, um valor mais pragmático através daquilo
que o estagirita chama de "metáfora proporcional", processo retórico que
assegura a apropriação verossimilhante de um real coletivo com base na
expectativa da visão convencional das identidades e dos problemas humanos
(ARISTOTELES, 2005).
Desse modo, na Retórica, Aristóteles estabelece mudanças conceituais no
seu pensamento. Enquanto na primeira obra o filósofo alimentava a separação
entre poética e história, na segunda essa diferença se esvai, visto que a
retórica parece ter proporcionado a ele uma sensibilidade maior quanto ao
problema da construção da dimensão referencial das representações
discursivas, fazendo-o tomar a relação entre poética e realidade de forma
menos categórica e mais complementar.
Com esse ampliado campo de ação da metáfora no tratamento discursivo
das circunstâncias mundanas, Aristóteles praticamente lançou as bases para
pensarmos uma teoria cognitiva fundada na verossimilhança. Ele parece ter
percebido o poderoso alcance semântico da metáfora que está na base dessa
técnica de representação, tratando-a na Retórica como uma das chaves para
não somente imitar narrativamente algo possível ou parecido com o real, mas
para compreender a arte de julgar e representar a sociedade de forma menos
anacrônica e mais democrática.
Por meio da metáfora, Aristóteles percorre o horizonte das
possibilidades existenciais, anulando ou mesmo colocando em suspenso
qualquer categorização positiva do real, por mais particular que esse real
seja. Tal estratégia visava, acima de tudo, evitar que os sofismos tomassem
conta dos discursos proferidos na polis, preocupação essa que resgata a
pertinência do pensamento de Sócrates na formação da filosofia e dos
discursos retóricos.
Sendo assim, sobre as bases da incerteza e da probabilidade, a
verossimilhança foi elaborada por Aristóteles como um operador de sentidos
metafóricos, cuja funcionalidade consistia "numa ordem já regrada de
relações semânticas com os dados extraídos da superfície da nossa
realidade: subordinação, coordenação, probabilidade, proporcionalidade,
igualdade ou diferença de relações" (RICOEUR, 2000, p. 42). São todas
relações de força entre o verossímil e o objeto, relações que, como visto,
ainda não se mostravam totalmente perceptíveis na Poética.
O exame da retórica antiga e clássica mostrava, portanto, uma primeva
teoria da metáfora fundada não só na substituição, mas também na correlação
nem sempre harmônica entre a palavra e a ideia. Esse rompimento com um
estatuto dogmático da verdade discursiva efetiva-se quando há a
centralização de uma verossimilhança na construção dos discursos sociais.
Essa mudança, além de marcar a passagem da Poética para a Retórica, marca
também "a passagem do modelo narrativo medieval para o chamado romance
moderno, transformando as convenções de escritura e leitura, e delegando,
ao texto e ao leitor, a função de legitimar não mais a verdade e, sim, a
coerência da narrativa." (TROUCHE, 2006, p. 35).
No entanto, só foi a partir de Ferdinand Saussure, em seu Cours de
linguistique general (1916), que um novo fundamento foi aplicado à
descrição do tropo metafórico, dispondo de um novo conceito de entidade
linguística de base para sua abordagem: o signo. Segundo Saussure, o signo
é a unidade característica dos diversos níveis de organização da linguagem
que se interrelacionam. (SAUSSURE, 2006). Mostrando as diferentes
disposições sígnicas, ele explica a distinção entre a linguagem como langue
(língua) e como parole (fala), distinção que configurou fortemente toda
linguística moderna. Nessa diferenciação, Saussure visava descobrir as
estruturas abstratas por trás das línguas, buscando seus desdobramentos
através da fala.
No âmbito da fala, "sitúa la ejecución psicofisiológica, la actuación
individual y las libres combinaciones del discurso, mientras que, en el
terreno de la lengua, empaza las reglas constitutivas del código, la
institución aceptada por la comunidad lingüística y el conjunto de
entidades entre las que se elige en las libres combinaciones del discurso."
(RICOEUR, 1999, p. 42). Essa perspectiva da fala nos mostrou, sobretudo,
que não existem termos absolutos senão relações de dependência mútua.
Enquanto para muitos a metáfora não passava de uma comparação estanque
e abreviada, resultante da substituição mecânica de palavras, a semântica
moderna, a partir de Saussure, foi capaz de dar a essa figura de linguagem
um novo fundamento: a metáfora passa a ser considerada por seu caráter
amplamente discursivo, constituída por uma fusão de domínios semânticos
diferentes, intersecção analógica entre domínios estranhos que através dela
mantêm códigos e ideias interconectadas.
Essa noção de metáfora surge, assim, como uma relação de força, "um
fenômeno linguageiro ordinário (...) de emprego fluido das palavras,
visando assegurar, ao menor custo, o rendimento máximo da representação e
da comunicação em certos contextos." (CHARAUDEAU & MAINGUENEAU, 2008, p.
328). Segundo Charaudeau e Maingueneau, atribui-se assim à metáfora outras
funções principais, além da sua função figurativa: trata-se da "metáfora
cognitiva" (2008, p. 330).
Desse modo, parece difícil afirmar que a linguística moderna ignorou o
caráter subjetivo da comunicação e da linguagem. O tratamento pós-
saussuriano da metáfora proporcionado pela semântica explica muito bem a
natureza da crise metodológica que o Curso de lingüística geral abriu em
seu seio, fazendo do signo e da figura o reflexo da tensão metafórica entre
os sentidos que emanam das palavras. Como veremos devidamente no decorrer
da pesquisa, essa tensão provocada pela metáfora encontra a sua melhor
expressão nos trabalhos de I. A. Richards (1965), Max Black (1962), Gérard
Genette (1972) e Paul Ricoeur (2000).
O que se mostra sintomático nesses intelectuais é que, mesmo depois de
Saussure, a metáfora mantém-se atuando nas fraturas como proferido em seu
Curso. Porém, muito além do universo dicotômico da língua e da fala, as
palavras recebem novos valores e, assim, a ambigüidade do discurso abre
caminho à polissemia da palavra. Desse modo, o limite binário da linguagem,
nos preceitos de Saussure, nos serve de parâmetro para pensarmos nas
mudanças promovidas pela semântica moderna.
Essa mudança abre caminho ao projeto de uma nova retórica que pretende
alargar mais ainda o espaço semântico da linguagem. O problema não é
restaurar o espaço retórico binário entre evento e significado, mas
"compreender de uma nova maneira o funcionamento do discurso através dos
tropos." (RICOEUR, 2000, p. 78-79). Toda a teoria dos tropos e das figuras
estabelece-se sobre esse novo primado polissêmico da palavra, apelando
constantemente a uma poética cujos procedimentos explicativos são comuns a
outros tipos de expressão.
Hayden White, por exemplo, toma de Northrop Frye a noção de "explicação
histórica mediante a elaboração da trama" (emplotment) e sua distinção
entre "os quatros tipos fundamentais de intriga: a novelística, a tragédia,
a comédia e a sátira" (FRYE, 1965). Em Metahistória (1995), focando os usos
figurativos da história, White adiciona posteriormente a essa
conceitualização uma outra que ele denomina de "explicação mediante
argumentos formais" (WHITE, 1995), que consiste nos quatro paradigmas da
forma que a história pode adotar, uma explicação considerada como um
argumento discursivo: são eles o argumento formalista, organicista,
mecanicista e contextualista (WHITE, 1995).
O historiador, desse ponto de vista tropológico, não se limita a contar
uma história, mas transforma-a num conjunto de acontecimentos considerados
como um todo. Nesse sentido, a tropologia torna-se possivelmente o
imaginário da representância do fato. Eis uma das exigências da
figuratividade inerente a qualquer tipo de registro. É por isso que, entre
uma narrativa e um curso de acontecimentos, não há uma relação de
reprodução ou de reduplicação. Ao invés de um jogo de equivalências, há uma
relação metafórica: o leitor é dirigido para o tipo de figura que assimila
os acontecimentos relatados a uma forma narrativa que uma dada cultura
tornou familiar.
O recurso à tropologia, ao colocar a ênfase no procedimento retórico,
faz aflorar as possíveis intencionalidades que atravessam a representação
dos acontecimentos passados. E Hayden White não ignora esse recurso. É por
isso que ele nos convida a entender "o que é fictício em toda representação
do mundo tida por realista e o que é realista em todas aquelas que são
manifestamente fictícias. [...]. Ao dizer isso, White não está muito longe
de compreender uma poética constituída pela referência cruzada da ficção
com a história." (RICOEUR, 2010, p. 262).
Portanto, na perspectiva tropológica sedimentada por Gérard Genette,
Hayden White e outros intelectuais, a relação entre ficção e história é
mais complexa do que se pode imaginar, permitindo todo um campo de
possibilidades semânticas a ser explorado ainda através das velhas
documentações. Fernand Braudel até chega efetuar algumas considerações
sobre algo similar a essa variação de sentidos na história através do que
chamou de tempo de curta, média e longa duração. Braudel reconhece a
existência de ritmos diversos na evolução histórica e que são as relações e
os defasagens entre esses ritmos diversos de evolução que fazem a história
ganhar corpo.
Todavia, com a leitura de seu ensaio A Longa Duração (BRAUDEL, 1976),
temos a convicção de que para Braudel a curta duração é o legitimo ritmo
discursivo da história. Já para Paul Ricoeur, o discurso histórico efetiva-
se por meio de uma relação mais dinâmica e híbrida entre as durações e os
ritmos das ações humanas representadas, afastando da narrativa qualquer
tipo de monotonia ou imobilismo semântico.
Para Ricoeur as articulações cognitivas da metáfora moldam não só
nossos registros, mas também nossa compreensão prática do mundo. Esse
debate travado nos finais da década de 1960 entre filosofia, história,
semântica e narratologia encontra nos três tomos de Tempo e narrativa um de
seus pontos de referência mais relevantes. Paul Ricoeur propõe reconhecer,
por uma nova forma conceitual, os sentidos históricos metaforicamente
desdobrados, tentando facilitar, com isso, a evidência das outras possíveis
intenções que estão por trás dos textos e das fontes.
Nesse processo de evidenciação, Ricoeur reconhece as técnicas
figurativas e redescritivas que estão em jogo no campo discursivo desde
nossa tradição retórica, técnicas que se cruzam com o problema do
significado na história. No esboço dos problemas postos sob a égide de
mimeses III, em Tempo e narrativa, Paul Ricoeur identifica o processo da
"refiguração narrativa" como sendo o processo da "referência cruzada entre
história e ficção" (RICOEUR, 2010, p. 169), apontando com isso a
pertinência desse movimento transdisciplinar figurativo relacionado à
capacidade polissêmica dos discursos, o que vem sendo debatido e
aperfeiçoado desde a antiga retórica.
Contudo, longe de restringir seus estudos às estratégias tropológicas
de Genette e White, veremos que a linha reflexiva de Ricoeur reabre o
diálogo da narrativa com as proposições filosóficas sobre a história, nos
reorientando para uma história não reduzida a sua manifestação narrativa,
mas integrada hermeneuticamente a ela. Ou seja, Ricoeur considera, nesse
processo refigurativo, o envolvimento dos sentidos que estão por trás do
surgimento das palavras, não evidenciando somente os significados evidentes
do registro.
Talvez ainda faltem concepções que abordem consistentemente essa
relação integrada. De qualquer forma, sabemos que a complexidade da
natureza do conhecimento histórico, no viés das suas propriedades
narrativas e semânticas, impede soluções fáceis e restritas apenas ao plano
epistemológico, ontológico ou textual, porém indica que não podemos
rejeitar esses diferentes aspectos para sua abordagem.
É preciso estabelecer um cauteloso e profícuo diálogo entre as
considerações éticas, ontológicas e narratológicas sobre a condição
histórica e cultural do ser humano, sendo esse diálogo o meio de
reconhecermos a narrativa como algo muito mais envolvido com aquilo que
Wittgenstein (1991) chamou de gramática: a narrativa não existe somente
como uma ferramenta registradora objetiva, mas como uma forma de reorientar
e reorganizar os fatores que a motivam e ressurgem circunstancialmente.
Tendo em vista tais reflexões de Ricoeur acerca do processo de
refiguração narrativa da história, o presente estudo se propõe a continuar
a refletir acerca da historicidade calcada na verossimilhança das ideias e
das práticas do passado, cruzamento endossado também pela historiadora
Sandra Jatahy Pesavento: "[...], enquanto representação, a história não se
mede por critérios de veracidade, e sim de verossimilhança e credibilidade.
Ora, o verossímil não é um ponto determinado entre o verdadeiro e o falso,
mas uma modalidade metafórica do fato, uma temporalidade efetuada por
hipóteses, uma modalidade de um passado possível." (PESAVENTO, 1998, p.
12).
Com base nesses preceitos, portanto, a metáfora será tomada aqui como
uma modalidade hipotética do fato, uma técnica narrativa constituída por
imaginários históricos possíveis que ganham corpo através da linguagem. A
partir dessa reposição metafórica dos sentidos, a experiência histórica
também envolve-se, de forma legítima, com as imaterialidades da vida que só
ganham forma em sua representação figurada, ou seja, nas analogias que dão
contorno às emoções, aos sentimentos, às ideias, aos temores ou aos desejos
humanos, tornando possível a exposição crítica de elementos subjetivos que
passam a ser historicizados e sociabilizados narrativamente.
Logo, os romances ou as ficções que são constituídas por essa
estratégia semântica não serão designados aqui como sinônimo de falsidade
ou fantasia, mas como um espaço de tensão do significado, um meio de
alargar o conhecimento humano ao dar corpo narrativo a variados elementos
imateriais da nossa cultura, figurando fatos cotidianos à luz das
imaginações e das sensibilidades possíveis do mundo humano. Essa reflexão,
sem dúvida, abre novas vias para a abordagem da relação entre história e
ficção, especificamente no debate sobre a verdade e os imaginários que a
cercam. O historiador passa a ser, nessa perspectiva, um mediador em busca
de possíveis versões de um dado passado, "um reconfigurador do tempo
histórico dando outros sentidos ao mundo" (SILVA, 2009, p. 3).
Compactuando com essa estratégia, constataremos que certas narrativas
contemporâneas tornam o imaginário calcado na verossimilhança documental
uma estratégia chave para a compreensão e a representação de muitas
subjetividades do passado, inferindo analiticamente sobre o não-dito, o
suposto, o desconhecido, o desejado e o temido que abrigam o universo
semântico da documentação. Veremos, assim, que a chave do problema da
refiguração histórica pela narrativa, seguindo os preceitos de Ricoeur,
parece residir no desenvolvimento de produtivas analogias do registro
documentado.
Isso nos leva a refletir insistentemente, ao longo desse projeto,
sobre a pertinência de uma poética que, sem se distanciar dos contextos,
apreende outros campos semânticos que estão hipoteticamente por trás dos
registros textuais. Alguns críticos chamam essa estratégia de "poética dos
rastros" (SELIGMANN-SILVA, 2013), outros a chamam de "poética cultural" ou
de "novo historicismo" (GREENBLATT, 1991), vertentes do pensamento
literário que interpretam os textos ficcionais como a expressão
das "superestruturas históricas da sociedade" (ADORNO, HORKHEIMER, 1986). 
Independente do termo, visaremos o reconhecimento de uma poética que
intervém nas fontes históricas, tendo como norte a estratégia da
"refiguração narrativa" proposta por Ricoeur. Assim, nos sensibilizaremos
para essa poética que implica uma relação entre história e ficção que se
deslinda sob uma narrativa mapeada, por assim dizer, pelas marcas
metafóricas alojadas nos recônditos simbólicos dos registros, fazendo
também do romance um espaço em potencial para a construção e a análise da
história.

2.3)A refiguração dos Diários de Cristóvão Colombo em El último crimen
del Colón, de Marcelo Levinas

Uma fecunda veia de recriação narrativa tem suscitado revisitações a
temas históricos diversos. Talvez a viagem seja um dos temas que mais tenha
marcado os nossos registros passados, ultrapassando tempo e espaço, e
constituindo-se, ainda na contemporaneidade, em um dos tópicos mais
intrigantes para escritores e pesquisadores ao redor do mundo.
As recriações dessa temática vão de poemas e contos até romances e
narrativas históricas de diversos estilos. No entanto, o leitor que ainda
está mais acostumado com as imagens heróicas dos antigos navegantes sente-
se incomodado atualmente diante de uma outra tendência de representação dos
mesmos personagens históricos, tendência que a arte e a sabedoria
literárias vem revelando recentemente de forma menos épica e religiosa.
Aqui começamos por apresentar a primeira obra que nos proporcionará um
exemplo de "refiguração narrativa" dentro de uma planejada coerência
histórica e historiográfica. Em El último crimen de Colón (2001), romance
escrito pelo argentino Marcelo Levinas, a temática do descobrimento
ressurge, antes de tudo, como reflexo do problema da busca das origens e
das identidades hispano-americanas.
Diante dessa preocupação geral, veremos que o livro aqui em questão
lança-se ao desafio de "refigurar" as páginas perdidas do diário de
Cristóvão Colombo, escritas durante sua viagem à América. Percorrendo os
interstícios semânticos dos registros, o escritor argentino revela-nos
detalhes históricos pouco evidentes do relato de viagem ao Novo Mundo,
detalhes que poderiam constar de forma mais prolongada ou explicativa na
declarada parte ausente dos Diários.
Desse modo, reconheceremos que tal projeto literário torna-se coerente
com o contexto tanto da escrita quanto do arquivamento dessa importante
documentação, que pela primeira vez registra por escrito a existência de
nossas terras e gentes ameríndias ao mundo europeu renascentista. Sabe-se
que tais diários acabaram desaparecendo dos arquivos da corte espanhola.
Dos manuscritos restaram apenas notícias de algumas cópias, uma das quais
foi recopilada e incluída nas notícias dadas por frei Bartolomé de Las
Casas em sua Brevísima relación de la destrucción de las Indias de 1552
(1986). Somente por meio dela é que os diários de Colombo tornaram-se
conhecidos entre nós.
Nessa recopilação, veremos que o que chama a atenção de Levinas é a
informação de que Colombo teria deixado propositalmente para trás certos
registros sobre os percalços ocorridos durante a viagem. Atento nesse
detalhe isolado, o romance de Levinas encara metaforicamente o discurso
exaltador de maravilhas fantásticas do Novo Mundo que preponderam nos
diários, tomando-o como dissimulação de uma outra realidade que é mantida
em sigilo.
A simbologia insólita, bastante presente na documentação recopilada,
levou muitos estudiosos a afirmarem que os diários de Colombo são, de fato,
o primeiro texto a revelar a essência do que viria a ser o "real
maravilhoso" da literatura latino-americana. Na esteira crítica desse
realismo-maravilhoso, o fantástico revela-se não como matéria legítima do
medo, da coragem ou mesmo dos segredos compartilhados nas viagens
marítimas, mas como matéria constituinte da censura investida por nossa
tradição historiográfica ao registrá-las.
Observaremos, com esse viés crítico, que por trás do caçador de
sereias, o romance nos revela um Colombo desesperado ao imaginar que seu
verdadeiro segredo fosse descoberto pelos marinheiros: ele falsificou a
medição do tempo-espaço para que a frota não percebesse que a distância
combinada com eles anteriormente havia sido há muito tempo ultrapassada.
Em nossa hipótese de leitura, o fantástico, no romance em questão, é um
elemento ludibriador que ajuda Colombo a manter encoberto os verdadeiros
segredos da viagem. Numa das cenas do regresso, por exemplo, o personagem
Colombo, em meio a uma forte tempestade, diz que "nada podía ser tan feroz
com los secretos" (LEVINAS, 2001, p. 333), que ele "dejó al mar unos
pergaminos..." (LEVINAS, 2001, p. 337). Nesse momento do romance, nos é
dado a conhecer sua confissão: há revelações que ficaram por contar ao
longo das páginas do seu diário.
Ficamos sabendo, assim, que Colombo havia escrito um último diario e
"en esos papeles, el almirante admitió haber llegado a un nuevo continente
y confesó sus crímenes especificando cuáles fueron. También reveló, de
manera rotunda, su intención de continuar al gran gaño hasta su muerte"
(LEVINAS, 2001, p. 376). O narrador revela, com isso, um outro relato que
toma as informações registradas como informações dissimuladas. Levinas
porta-se, assim, como um investigador ao explorar os sentidos que podem
estar por trás do conteúdo apresentado nos diários recopilados, elaborando
por meio da metáfora uma versão plausível do manuscrito perdido.
No romance, esse relato confessional de Colombo é fundado nas
referências cartográficas duvidosas e cálculos grossamente equivocados que
surgem ao longo dos conhecidos diários. Tais informações confusas são
estampadas logo nas páginas iniciais do texto literário, quando o narrador
em terceira pessoa, extradiegético e onipresente, similar ao narrador das
fontes que referencia, nos apresenta não um Colombo sedento por imaginários
como coloca em geral a cronística dos descobrimentos, mas um Colombo ciente
desse ludibriamento imaginário, angustiado e desesperado com o percurso
físico da viagem. Desse modo, o navegador tenta a todo custo manter a
distração da sua frota com a imaginação de terras lendárias e seres
fantásticos para conseguir completar sua meta de viagem: desembarcar nas
Índias.
Em busca de manter a imaginária tensão para cumprir a chegada em terra
firme e confirmar o sucesso de sua viagem, seu verdadeiro medo não é dos
monstros descritos por Marco Polo, mas de não poder contar ao mundo as suas
façanhas marítimas. Isso justificaria o seu estranho desembarque em Lisboa,
antes de noticiar os Reis Católicos sobre a distinta terra onde aportara.
Diante da sua caracterização história envolta em toda a sorte de fantasias
e profecias, surge um novo Colombo, indivíduo atormentado não pelos
monstros ou pela morte, mas pelo próprio tempo, transparecendo "la arena
caída de un reloj" (LEVINAS, 2001, p. 28).
Nessa linha de representação seguida pelo romance, veremos que o espaço
lexical dos Diários se amplia através de uma interpretação diferente dos
elementos imaginários incitados pelo navegador protagonista em seus
escritos. Com essa estratégia, o romance evidencia as possíveis fraudes e
dissimulações da documentação oficial em foco, partindo do possível fato de
que nela só se podia registrar aquilo que enaltecesse a empresa marítima
diante de seus investidores.
Essa tensão consegue abarcar todo um contexto histórico e contrastar o
registro da viagem com as prováveis ações e modos de pensar do capitão e
autor do relato: "Pensaba su Diario como una crónica fiel de todo aquello
que le viniese en gana contar, que le conviniera referir. […] y también una
crónica infiel, que incluía muchas mentiras, un novedoso género del
relato." (LEVINAS, 2001, p. 110). É dessa forma que temos na obra de
Levinas uma narração envolvente e criativa, que, além de deleitar, também
nos leva a questionar os meios e modos como foi narrada a história das
navegações e, principalmente, com quais possíveis intenções seus registros
oficiais foram efetuados.
Avaliaremos, por fim, a complexidade histórica envolvida nessa
representação romanesca de Colombo, apresentando-o como um indivíduo
intensamente obcecado pela sua aventura marítima, incapaz de abandonar sua
meta a um só instante. Pela leitura do romance, nada, nem mesmo o
assassinato de um companheiro de viagem, parece resultar mais relevante que
sua preocupação com o tempo: elemento contra o qual ele luta para cumprir o
objetivo de chegar aonde achava que ia chegar.
Num processo de sobreposição de imaginários e imagens documentais,
veremos que El último crimen de Colón nos apresenta um legítimo processo de
refiguração narrativa dos fatos passados, percorrendo os caminhos entre a
significação possível e o que foi registrado da viagem de descobrimento.
Estabelece-se, assim, um questionamento claro das "verdades" históricas
mediante ao próprio campo semântico da fonte referenciada, integrando ao
texto romanesco um viés narrativo e documental de representação.

2.4)A refiguração da Relação de Álvaro Velho em Peregrinação de Barnabé
das Índias, de Mário Cláudio


Desde Alexandre Herculano, veremos que não é somente de esplendor e
heroísmo que foi construído o perfil de Vasco da Gama e suas viagens
marítimas. O romance Peregrinação de Barnabé das Índias (1998), de Mário
Cláudio, é um exemplo atual importante de que a viagem do Gama, longe de
ser um definido episódio comercial, técnico e épico do passado português, é
uma fonte plural de interpretação histórica.
Para termos uma mínima ideia do limite imposto à história desse
navegador, é necessário analisar alguns sinais salientes na Relação de
Álvaro Velho, único documento conhecido que registra a primeira viagem de
Vasco da Gama ao Oriente. Nesse registro, é mantido o foco na descrição do
espaço da viagem em detrimento do perfil de Vasco. Seu perfil fica reduzido
ao seu retrato moral de capitão-mor, dotado de atos de grande prudência e
virtude, demonstrando rígido cumprimento e obediência ao regimento para uma
segura navegação.
Entretanto, o que o romance em questão parece incitar é que somente
descrever os espaços observados foi uma estratégia que não evitou que o
registro de Álvaro Velho falhasse na sua pretensão à veracidade. Podemos
perceber na leitura dessa relação de viagem que, apesar de possuir uma
tendência acrítica ao destituir a narrativa de momentos mais conflitantes e
pessoais, há sucintas passagens em que se sobressaem os sentidos e as
emoções do narrador, o suficiente para embaralhar a consistência verídica
de parte das suas descrições, fazendo-o confundir, por vezes, os espaços,
as pessoas e os objetos observados.
Atenta-se o leitor da Relação que há, por exemplo, momentos pontuais em
que o narrador afirma ver "xhristãos". Essa afirmação aparece algumas vezes
ao longo do relato, surgindo pela primeira vez no momento em que desembarca
Vasco da Gama com sua embaixada na atual cidade indiana de Kozhikode. Nesse
local, o narrador começa a adquirir provas sucessivas de que aquela terra
pertencia aos cristãos, pensando estar a ver igrejas, imagens de santos e
outras entidades do cristianismo:


E em meo do corpo da Igreja esta huu corucheo todo de
quanto, e tinha hua porta quanto huu home cabia, e hua
escada de pedra prque sobiam há esta porta, e dentro
estava huua ymagem pequena a quall elles diziam que era
nosa Senhora, [...]. E outros mujtos santos estavam
pintados pellas parredes da Igreja os quaes tinham
diademmoas, e a sua pimtura hera em diversa maneira porque
os dentes eram tam grandes que sayam da boca hua polegada,
e cada santo tinha quatro e çinquo braços, e abaixo desta
Igreja estava hu gram tanque lavrado de quantaria asy como
outros mujtos que pello camjnho tínhamos visto. (VELHO,
1838, p. 176)


O choque cultural não acontece casualmente, ele é produzido. Exemplo
disso é Álvaro Velho que, como visto nessa citação, julgando estarem os
portugueses rodeados de cristãos convertidos por São Tomé, tem a ilusão de,
ao entrar num templo hindu, se encontrar numa igreja. Sabemos que os
portugueses daquela época ainda não conheciam os hindus, acabando por
confundi-los com cristãos.[3]
Com a constituição cruzada desse espaço descritivo, há expectativas de
rastrear outras estranhezas que foram apropriadas pelas marcas subscritas
da instituição político-religiosa dos portugueses da época. Isso pode ser
observado pela crença exposta de Álvaro Velho nas lendas cristãs
ultraterrestres. Tais lendas divulgavam a existência de antigos reinos
cristãos em terras desconhecidas e distantes, como o reino do Preste João.
É através desses breves rastros narrativos que vamos percebendo, ao longo
de sua leitura, a amplitude cultural que está por trás dos fatos técnicos e
espaciais que predominam no texto da relação.
Refigurando a face técnica e descritiva da primeira viagem ao Oriente,
a narrativa de Mário Cláudio se apropria metaforicamente dessa e outras
potenciais marcas deixadas na superfície do registro. Portanto, veremos que
tais rastros simbólicos são matéria-prima para a constituição metafórica
do imaginário e da vida política do navegador. O registro histórico é
produtivamente aproveitado por Mário Cláudio para alcançar, em sua obra,
porém, um efeito diferente daquele fornecido pela tradição, ou seja,
contrário à dimensão de magnitude dos navegantes registrados nos relatos e
nas crônicas reais.
Exemplo histórico digno de sustentar a possibilidade existencial de uma
conflitante matéria imaginária na vida de Vasco é o caso da famosa casa
pintada de Évora. Expulso de Sines, em obediência ao rei, vai Vasco da Gama
viver nessa antiga cidade, numa casa cuja frente mandou decorar com painéis
que traziam representações mitológicas, florais e faunísticas inspirados na
Índia. Por isso, a respectiva rua ficou conhecida nessa cidade por "Rua das
Casas Pintadas, designação posteriormente substituída por rua Vasco da
Gama." (FERREIRA, 1998, p. 38).
As possibilidades de o navegador ter vivido com esse conflito
imaginário são aproveitadas por Mário Cláudio, que investe na refiguração
dos motivos e das marcas documentais da pintura da casa de Évora para
representar metaforicamente seu perturbado imaginário:

[...] se exterioriza a ira da besta, pintada na parede do
claustrim, obedecendo àquilo que ordenou ele que se
executasse, [...]. E não sossega o monstro, e longamente o
contempla o velho [Vasco] com seu jeito taciturno, [...].
Repentinamente se suspende aquela extrema turbação, e nem
as neves que persistem em fustigar o Alentejo bastam a
reprimir o grito que se expande na alma do que se encolhe
de frio, [...]. (CLÁUDIO, 1998, p. 21-22)

A hidra irada pintada na parede do quarto de Vasco é a metáfora de um
micromundo imaginariamente ordenado e temido, o que evidencia sua
incapacidade de pensar a diversidade do planeta. O almirante parece ter uma
visão enraizada da qual não consegue se desfazer, sendo o monstro, para
Vasco da Gama, o efeito simbólico da totalização de seu mundo.
Esse imaginário opressor constituído de lendas e mitos parece ser uma
forma instigante e produtiva que o autor do romance encontrou na própria
documentação para explorar as lacunas históricas acerca dessa famosa
viagem. Contudo, além de executar uma leitura atenta da documentação
permitindo seu alargamento semântico através da refiguração metafórica do
seu campo mental, observaremos que essa narrativa parte de muitas das
hipóteses e especulações sobre acontecimentos sociopolíticos que podem ter
transformado a vida dos Gama. Essas hipotéticas marcas políticas já foram
abordadas anteriormente por alguns investigadores, como Alexandre
Herculano, que serão trazidos à análise no devido momento dessa pesquisa
(HERCULANO, 1984; ARAGÃO, 1886; BAENA, 1897; MONTEIRO, 1898).
Em resumo, a narração de Mário Cláudio, além de representar de forma
intensa os imaginários históricos que pretendemos abordar, nos parece ser
uma narrativa marcada também por cenários que mostram os acontecimentos
exteriores da vida de Vasco da Gama, destacando os episódios que demonstram
o enfraquecimento político e moral de sua família no reino português,
enfraquecimento esse que potencializa, por sua vez, os possíveis
imaginários envolvidos com a viagem e o navegador em questão.
Com isso, veremos que Mário Cláudio não apenas investirá nas condutas
imaginárias que se desviam da descrição espacial efetuada por Álvaro Velho,
reconhecendo os outros componentes materiais e imateriais do seu contexto
histórico. Veremos que o tom dominante de sua intervenção narrativa parece
ser coerente com o que diz Roger Chartier acerca das representações
históricas, cujo foco está inicialmente nas práticas sociais para,
consequentemente, obter as representações integradas a essas práticas em
que a ideia de imaginário não deixa de surgir (CHARTIER, 2002).
Constataremos, por fim, que a noção de imaginário na narrativa em
questão é derivada do espaço descoberto pelo econômico, o social e o
político: "É um explicandum, não um princípio preguiçoso de explicação."
(RICOEUR, 2007, p. 209). O pretenso não-dito e implícito que o conceito de
imaginário pressupõe parece se desdobrar de uma complexa rede de aquisições
graduais e circunstanciadas das questões sociopolíticas vividas pela
família de Vasco da Gama.
Diante dessa cuidadosa transposição de significados, procuraremos
compreender a Peregrinação de Barnabé das Índias como uma narrativa
híbrida, que extrai da documentação as verossimilhanças que estão por trás
dos sentidos convencionais relevados pela fonte em questão e sua
historiografia.


2.5)A refiguração de A primeira viagem ao redor do mundo de Antonio
Pigafetta em Maluco. Romance dos descobridores, de Napoleón Baccino
Ponce de León

A obra Maluco. Romance dos descobridores (1989), escrita pelo mexicano
Napoleón Baccino Ponce de León, enriquece nossa análise através da sua
proposta de refiguração do relato da primeira viagem de circunavegação
intitulado A primeira viagem ao redor do mundo. Esse relato foi escrito
pelo celebrado Antonio Pigafetta, marinheiro toscano da cidade de Vicenza,
que sobreviveu a essa terrível viagem de 1521.
Em Maluco, a aventura, antes apresentada por Pigafetta, será narrada
por Juanillo Ponce de León, o bufão da frota e, como seu nome sugere, o
duplo do autor da obra. Dessa maneira, as características que o bufão
assume vêm em auxílio do autor nas críticas às convenções e certezas da
nossa historiografia conservadora. Além de ter a função de provocar o riso
da tripulação por meio de histórias e brincadeiras que traziam alguma
distração à viagem, no romance ele questiona e desdobra semanticamente o
relato de Pigafetta, relativizando as ações e os aspectos civilizatórios
exprimidos pelo próprio autor do relato na representação dessa longa
jornada: "A glória de Magalhães sobreviverá a sua morte. Dotado de todas as
virtudes, mostrou inquebrantável persistência em meio às maiores
adversidades." (PIGAFETTA, 2007, p. 118).
A princípio, a relativização desses aspectos é evidenciada na obra pelo
fato de Juanillo nunca acertar o nome de Pigafetta, transformando tal lapso
de memória num elemento risível, digno de um bufão. Procedendo desse modo,
o que o bufão faz é ampliar sua voz e estendê-la a toda a tripulação, que
como ele, também contribuíram para a história das navegações, mas que
seguem esquecidos pelos crônicas reais. E assim se constitui um crítico
diálogo de Juanillo com a nossa conservadora tradição histórica, sua
ilustre interlocutora.
Vivendo com dificuldades e sentindo-se esquecido pela corte para a qual
serviu, Juanillo se dirige ao rei Carlos V através de uma longa carta,
explicitando a sua ruim condição e da necessidade de reconquistar a pensão
que lhe foi retirada por Felipe II. Para enfatizar o mérito dos serviços
prestados e, com isto, resgatar seu lugar na gesta de seu país, ele implora
ao rei para tomar parte das façanhas da viagem ultramarina. Diante desse
pedido, Juanillo ressalta a importância de seu relato e de seus serviços
como bufão, sobretudo um bufão que tem habilidades de registrar e recriar
realidades através do canto, da dança e da narrativa.
Com esse personagem ressalta-se o poder polissêmico da metáfora sobre o
registro documentado, inferindo sobre as intenções que estão por trás de
sua realização e fundando argumentos na qualidade de ator e contra
testemunha dos fatos centrais da primeira grande circunavegação da
história. Essa narrativa, com base nos registros de Pigafetta, parece
promover a abertura de novos significados e novas versões desse episódio
histórico, indo além da subversão paródica efetuada pelo Bufão em muitas
passagens.
O que parece ocorrer em Maluco é que tal episódio curioso da história
das navegações já não é apenas visto a partir dos interesses da corte, mas
de diferentes lugares e aspectos da cultura. Assim, se verifica a
refiguração do romance: enquanto no texto original o cronista legitima o
projeto através de um olhar mediado que só vê o que importa para os
senhores da expedição, na obra de Napoleón Baccino, o bobo da frota é quem
parece desvelar o episódio, refigurando, através de uma elaborada metáfora,
as versões oficiais que a história registrou.
Nesse processo refigurativo dos significados que podem constar no
diário de viagem, a narrativa se constitui das suas possíveis nuances
políticas e imaginárias:

Nessa luz vacilante do amanhecer vemos, pela primeira vez
em quatro meses, o negro contorno de algumas ilhas.
Ásperas silhuetas contra um céu branco. Topos altos e
agudos. Com fiapos de névoa enredados, como babas da
noite. Uma paisagem sombria. Desolada. Que não está de
acordo com nossos sonhos. Assim, aproveitando as
prerrogativas que se concedem aos enfermos, fechamos os
olhos outra vez. Voltamos aos nossos sonhos. Até que o sol
esteja alto. (LEÓN, 1992, p. 209)


A abertura desse conflito semântico se manifesta quando, depois de dias
de calmaria absoluta, em que as naus não podiam avançar, os homens
começavam a contar histórias insólitas entre si como se trocassem objetos
preciosos. A passagem acima parece configurar na obra a própria trama
verossímil da humanidade, a de que só a ação imaginária descrita pela
palavra é real na vida.
Em nossa hipotética leitura, o romance de Napoleón Baccino mostra que o
sentido da história não pode ser descrito em termos de referencialidade ou
autoridade de verdade, senão pelas suas obscuras e insuficientes versões.
Tentaremos mostrar que Maluco se distingui de muitas outras reescrituras do
passado das navegações ultramarinas porque não só incorpora e desdobra
informações históricas, mas opera consistentemente na perspectiva do
contexto social e cultural dos feitos narrados, como se mostra a seguir:


Tínhamos nos acostumado àquele covil e achávamos que
conhecíamos seus mínimos detalhes, e, de repente, a
penumbra desaparecia e tudo mudava. Víamos toda a dimensão
de nossa miséria e não podíamos acreditar no que estávamos
vendo. Havia restos de comida, improvisados ninhos de
palha, [...], excrementos, o barco de brinquedo de
Filhinho, e até o cadáver de um companheiro que tinha
morrido em silêncio sem que ninguém notasse. [...]. Aquela
luz fria que invadia o porão nos revelava aspectos
desconhecidos de nós mesmos. Havia ainda alguns cantos
escuros e chegamos a sentir verdadeiro pavor deles. [..].
Então, sem que ninguém dissesse nada, como quem teme
romper um sonho, fomos lentamente voltando à vida. (LEÓN,
1992, p. 140)


O submundo do porão das embarcações vem à tona durante o relato,
tornando a descoberta algo muito mais putrefato do que se imaginava.
Veremos que tais desvios descritivos e imaginativos que emanam do relato
histórico em questão partem de diferentes marcas discursivas que se mostram
nessa e em outras passagens do romance. Em muitas cenas, se apresentam, por
exemplo, diálogos do bufão com o almirante da frota Fernão de Magalhães e
com Pigafetta, trazendo ao texto os desdobramentos semânticos dos diários,
cartas e crônicas.
Diante desse tratamento documental do romance, uma polissemia histórica
parece ser cuidadosamente extraída a partir das marcas simbólicas presentes
no relato de Pigafetta e outros documentos secundários relativos a essa
viagem, não restringindo a narrativa à fabulação para promover uma
revisitação histórica aos leitores. Sendo assim, o imaginário metafórico
tende, em nossa leitura, a mostrar um outro relato por contar, constituído
pelos sentidos que ficaram à deriva na historiografia ou dissimulados na
documentação.


2.6)Reconsiderações sobre a Política do Sigilo de Jaime Cortesão


Perante as análises propostas, ficará evidente a existência de certo
silêncio semântico inerente a qualquer tipo de registro. Com os relatos
ultramarinos não seria diferente. No entanto, além de toda a
"superestrutura" abrigada por trás desse silêncio basilar da documentação,
envolvendo crendices, medos e desejos, havia também um silêncio
instrumental que estava à disposição do poder ultramarino de Portugal e
Castela e que servia para manter determinadas informações geográficas e
econômicas em pleno sigilo.
A censura e o assunto confidencial já eram, nessa época, um lugar-
comum, uma prática corrente da qual participavam todos os estados
concorrentes da balança comercial marítima. Para Jaime Cortesão, o primeiro
surgimento dessa prática ocorre desde a primeira fase da expansão
ultramarina, especificamente em Portugal, no período anterior ao ano de
1470. Segundo Cortesão, seriam raros os documentos produzidos no entorno da
fase inicial da expansão ultramarina, pois muitos dados teriam sido
escondidos ou alterados, gerando, por isso, uma diminuta e censurada
publicação dos primeiros relatos de viagem.
Claro está que não podemos furtar-nos à impressão de superficialidade
ou de extrema pobreza das fontes sobre as primeiras empresas ultramarinas.
Cortesão ficou longe dar esse debate por acabado, pois, aborda a questão
apenas numa perspectiva específica da história. Sua política de sigilo se
baseia apenas na análise dos dados "geográficos e econômicos, ou seja, na
suposta descoberta de novos países de produtos ricos ou das estradas
marítimas que aí levavam [...]." (CORTESÃO, 1960, p. 6).
A formulação de Cortesão tinha como base um raciocínio apressado e
infundado: quando não havia informações geoeconômicas encontrava-se a prova
do sigilo. Mas, não encontrar fatos cartográficos e econômicos valiosos
para a época "não nos dá o direito de supor que foram obrigados a omiti-
los." (PIMPÃO, 1938, p. 28). Logo, "todas as realizações imputáveis ao
abrigo dessa teoria careciam de verificação porque, por natureza, não
havia." (DOMINGUES, 1990, p. 110). É como se Cortesão partisse do princípio
de que a falta de documentação provava por si só a realização de viagens
secretas de descobrimento e o rapto de grande parte da documentação
informativa dessas viagens.
A par desse questionamento que torna insegura a teoria do sigilo,
deparamo-nos com uma série de argumentos contra sua proposta.
Primeiramente, embora possa ter havido sigilo de informações cartográficas
e econômicas, não é menos provável que a manifestação desse silêncio deve-
se também a outros motivos como o interesse diferenciado dos navegadores e
cronistas, bem como a perda acidental de parte dessa documentação: "se, por
um lado muitas dessas obras devem ter desaparecido para sempre, por outro,
algumas poderão ainda estar sepultadas no pó dos caóticos arquivos
portugueses e estrangeiros." (CARVALHO, 1980, p. 19).
Com tais causas possíveis em jogo, começamos a observar que Jaime
Cortesão procurou resolver tal lacuna imediatamente, julgando que nada mais
restava a dizer sobre o sigilo nos descobrimentos. Contudo, não pretendemos
aqui obedecer o ponto final de seu argumento. Estenderemo-nos nessa questão
na parte conclusiva do presente trabalho, pois interessa-nos, por outro
lado, a base narrativa e historiográfica do sigilo e não a sua base
cartográfica e econômica, tal como foi enunciada nos trabalhos do estudioso
português. Nessa perspectiva, o sigilo é repensado segundo parâmetros mais
abrangentes, compromissado em investigar o silêncio em suas nuances
cognitivas e culturais.
O silêncio, enquanto objeto de reflexão da esfera comunicativa,
transita entre o dito e o não-dito nos fazendo a todo o momento correr o
risco de não caminhar coerentemente entre as marcas contextuais e
narrativas. Para nos distanciarmos desse risco, é preciso observar tais
marcas atentamente por meio de métodos discursivos e historiográficos,
ponderando seus efeitos retóricos e sociais. Quando se trata de identificar
censuras, nós não as identificamos através de signos ou narrativas
intactas, mas, sobretudo, através de pistas, rastros, traços, fissuras,
rupturas e falhas, sinais esses que, nos romances anteriormente
apresentados, revelam-se férteis de significado.
Nessa difícil transposição, veremos que sentir, imaginar e inferir são
verbos que acabam fazendo parte de muitas metodologias da história que
visam explorar o silêncio no plano semântico da documentação. Observaremos
que assim ocorre em historiografias que têm atentado mais enfaticamente
para o estudo dos padrões mentais, dos modos de sentir e dos imaginários
coletivos dos vários períodos históricos, interesses levados à cabo por
correntes como a Psico-História, a História das Mentalidades e a História
dos Imaginários das décadas de 1950, 60 e 70, respectivamente.[4]
Ressaltemos que o silêncio e os imaginários, que são explorados por
tais correntes historiográficas, apresentam múltiplas maneiras de
significar o passado e "são objetos de reflexão de teorias distintas: de
filósofos, de psicanalistas, de semiólogos, de etnólogos e até mesmo de
linguistas, que se interessam pelo silêncio sob a etiqueta da elipse e do
implícito." (ORLANDI, 2007, p. 42). No entanto, resulta nesses campos do
saber uma dificuldade geral: deixar de tomar o silêncio apenas como
ausência, retiro ou mero vazio.
Não será suficiente aqui pensar no ato de silenciar como fazia Harpias,
deusa da mitologia grega, que levando o dedo indicador à boca fazia calar a
todos. Não é o emprego desse olhar que pretendemos aqui, e sim uma reflexão
que parta da necessidade de considerar o silêncio, antes de tudo, como um
objeto cognitivo que torna possível o próprio ato de significar e de dizer,
ou seja, um silêncio reconhecido não pela ausência, mas pela sua presença
semântica efetiva nos modos de expressão.
Dessa forma, os mecanismos de silêncio não serão sempre intencionais e
nem se restringirão a um tipo específico de arte ou de linguagem. Estão
onde está não só a linguagem, mas também onde está a significação, onde
estão os sujeitos e os sentidos. Nessa dimensão semântica do silêncio, os
documentos comportam muito mais significados do que a matéria sigilosa da
qual Cortesão se referia em seus trabalhos.
Desse reposicionamento conceitual, toda uma nova literatura surge
representada por novos autores que, diferentemente dos seus predecessores,
sugerem alternativas legítimas para narrar e descrever os episódios
ultramarinos permeado pelos elementos subjetivos agregados à documentação,
como os desejos, as angústias e os imaginários históricos. Por isso,
devemos pensar nessa e nas outras possibilidades de constituição do
silêncio, pois só assim poderemos vislumbrar outros laços de significação
histórica que a ficção pode realizar em seu espaço narrativo.
Nosso propósito com esse tópico bibliográfico, portanto, é defender a
existência de todo um campo fértil da história dos descobrimentos para ser
observado a partir da literatura, sugerindo uma nova perspectiva cultural
do sigilo. Isso poderá ser constatado a partir da análise que propomos
sobre a refiguração que os romances de Levinas, Cláudio e León fazem acerca
dos relatos de viagem que estão aqui em evidência.
Desse modo, o sigilo ganha força por nos revelar a tensão entre o
caráter referencial e o caráter literário da narrativa de viagem, linha que
é evidente não só nos debates acadêmicos, mas também nos numerosos textos
literários que fundem os fatos com a ficção num processo de releitura dos
registros. Essa tendência de abordagem conceitual da viagem apresentada até
aqui, possibilita aberturas para a atuação do sigilo enquanto um conceito
operador de sentidos, não reduzindo a presente pesquisa à narrativa de
viagem como um relato que surgiu apenas como fruto das viagens físicas.
Isso seria muito empobrecedor, pois reduziria o potencial da interpretação
das grandes narrativas de viagem como As viagens de Gulliver de Jonathan
Swift, Volta ao mundo em 80 dias de Júlio Verne, Moby Dick de Herman
Melville e Coração das Trevas de Joseph Conrad.
Com a perspectiva da literatura de viagens, apresentada por Fernando
Cristóvão e outros intelectuais como Maria Alzira Seixo (1998), ficou claro
que a dicotomia verdade-mentira governa a construção interna da narrativa
de viagem, seja o texto visto como um documento histórico ou como uma obra
literária, por isso nesse tema mais do que em outros o romance encontra um
formidável campo de atuação e diálogo. Como argumenta Percy Adams em
Travelers and Travel Liars: 1660-1800 (ADAMS, 1962) e Travel Literature and
the Evolution of the Novel (ADAMS, 1983), a tensão entre fatos e imaginação
construída em volta das acusações de forjamento e defesas de veracidade
passou a ser um elemento intrínseco na investigação desse tipo de
literatura. Os viajantes queriam que o público considerasse os seus relatos
como plenamente verdadeiros, mas na verdade se enganavam, exageravam ou até
inventavam certos acontecimentos para causar admiração e espanto nos
leitores.
Por isso, veremos, com fim da pesquisa aqui pretendida, que a
ficcionalização da narrativa de viagem não parece ser muito distinta do
processo de assegurar a veracidade do relato de uma viagem física. Pois, a
viagem, a escritura e a leitura de um relato são ações que nos fazem
adentrar no espaço das apropriações dos sigilos, dos sentidos e, no geral,
das representações.



3)Objetivos

Repensar os preceitos epistemológicos das ciências humanas visando a
construção de um princípio hipotético de conhecimento e pesquisa;

A partir do conceito de "refiguração narrativa" de Paul Ricoeur,
estudar como a metáfora pode relacionar a ficção com a história,
relação que se tornará visível no tratamento semântico que será dado
às fontes de pesquisa selecionadas;

Analisar o processo refigurativo dos Diários de Cristóvão Colombo
realizado pelo romance El último crimen de Colón, de Marcelo Levinas,
mostrando como o autor trabalha as referências desses Diários para
propor uma reconstrução possível das suas páginas perdidas;

Analisar o processo refigurativo da Relação de Álvaro Velho realizado
pelo romance Peregrinação de Barnabé das Índias, de Mário Cláudio,
avaliando como o autor articula alguns elementos imaginários que
ficaram obscuros nessa Relação;

Analisar o processo refigurativo do relato de Antonio Pigafetta
realizado pelo romance Maluco. Romance dos descobridores, de Napoleón
Baccino, no intuito de avaliar as derivações semânticas do relato que
permitem o romance explorar os pontos políticos e imaginários que o
registro oficial não representou efetivamente;

Realizar um balanço final sobre esse processo refigurativo dos relatos
ultramarinos de modo a readequar a noção geoeconômica de sigilo,
defendida por Jaime Cortesão, para uma noção mais cognitiva e cultural
do termo.

4)Referencial Teórico-Metodológico: os procedimentos da refiguração
narrativa na história

No contexto da presente pesquisa, parece cada vez mais inviável
qualquer investigação séria que insista em permanecer tranquilamente
disciplinar, sobretudo um campo do conhecimento controvertido, múltiplo e
variado quanto o da história e o da ficção. Pois, é das interfaces dotadas
de pertinência entre esses campos que outras espacialidades semânticas se
formarão, ampliando e ao mesmo tempo afunilando os deslocamentos da
geografia do saber.
Assim, o trânsito entre história e ficção será tomado aqui como um
espaço de "redes de significados" (PESAVENTO, 2003), um campo de reflexão e
interação entre os discursos estigmatizados por verdades imaginárias que
nos cercaram diariamente, constituindo as relações de força dos aspectos
materiais da realidade com as variáveis da nossa imaginação. Para a
evidência dessas relações no próprio plano semântico das fontes,
coletaremos dados ou indícios do momento histórico em foco e leremos os
testemunhos das viagens metaforicamente, ou seja, extraindo possíveis
sentidos históricos levando em conta as "relações de força" (GINZBURG,
2002) do texto com o contexto ultramarino.
Essa relação se mostra para Ricoeur como uma ligação mais dinâmica e
produtiva, pois revela, acima de tudo, as diversas durações e ritmos da
narrativa, afastando-a de qualquer tipo de imobilismo semântico. A crítica,
por outro lado, pouco sensível a toda essa problemática semântica, durante
muito tempo procurou opor o tempo cronológico do realismo ao tempo
subjetivo, anulando o tratamento histórico das subjetividades e o
tratamento heurístico dos romances. Mas, com Paul Ricoeur, mostraremos que,
em vez de um significado absoluto, a traçar uma única e bem demarcada
perspectiva, a narrativa se mostra fluida e de curso variado (RICOEUR,
2010).
É justamente nesse ponto da articulação entre narrativa e forças
humanas que identificamos o movimento reflexivo central da presente
pesquisa, que é o da "refiguração", ou seja, o da referência cruzada entre
história e ficção, cujo procedimento relacional é mediado pela metáfora e
"faz aparecer, para um pensamento ou um documento da história, o seu
caráter poético relativamente aos embaraços da especulação referencial."
(RICOEUR, 2010, p. 169-170).
Muito nos beneficiaremos desse procedimento da refiguração narrativa
das fontes para esclarecermos as relações entre a linguagem e os sentidos
históricos, pois ele nos sugere uma aplicação cognitiva diferencial na
reelaboração da referência figurada do agir humano. O dinamismo dessa
operação reconfigurativa se revela como um meio crítico e criativo para
fazer transitar a dimensão referencial da narrativa nos seus mais variados
graus imaginativos, resultando sua reconfiguração num conflito
interpretativo embasado na comunhão de múltiplos sentidos e enredos de um
mesmo episódio e/ou documento histórico.
No entanto, teremos em conta aqui que esse conflito não é um erro ou
uma falha, pois não devemos perder de vista o fato da "réplica da narrativa
às aporias da verdade consistir menos em resolver as aporias do que em fazê-
las render, em torná-las produtivas. É desse modo que a refiguração
contribui para o pensamento da história." (RICOEUR, 2010, p. 441). A
refiguração nos proporcionará, por fim, uma variedade de figuras que
preservarão a riqueza dos sentidos documentalmente verossímeis, tanto pela
equivocidade própria de cada aspecto quanto pela multiplicidade das figuras
disponíveis nos interstícios semânticos dos registros. Ou seja, a
refiguração narrativa ampliará a capacidade polissêmica da narrativa
histórica, instituindo um trânsito de sentidos proporcionais aos contextos,
aos conceitos e às simbologias operacionalizadas pelas fontes.
Para percorrer tais trajetos semânticos dos relatos de viagem dos
séculos XV e XVI, muitos detalhes ganharão contornos mais verossímeis e se
destacarão entre as descrições de terra, cálculos de navegação, roteiros e
regimentos náuticos. Assim, observaremos que esses relatos ligados à
expansão ultramarina, apesar do foco físico e matemático muitas vezes dado,
abrigam de tudo um pouco, visto que os relatores e escribas eram ao mesmo
tempo roteiristas, geógrafos, cosmógrafos e às vezes também historiadores e
cronistas que traziam na sua imagem do mundo as mais variadas perspectivas
mitológicas e proféticas da tradição.
Portanto, a chave metodológica da refiguração narrativa da história
reside no desenvolvimento de controladas analogias produzidas a partir dos
registros. Com essa estratégia, nos convenceremos que há ainda muitas
lacunas que merecem estudos na história dos descobrimentos, lacunas que
estão sendo gradualmente remexidas e reconfiguradas por muitos escritores e
estudiosos do tema, dentre eles aqueles assinalados na Crítica
Bibliográfica deste projeto.















5)Plano de Trabalho e Cronograma

Neste plano de trabalho, o número de créditos será dobrado e,
consequentemente, o período de cursos, que passará de 1 para 2 anos. Essa
adição visa um aprimoramento maior na orientação e nos estudos de base para
a efetuação da pesquisa.

"Semestres "Procedimentos "Detalhamentos "
" "Primeiros passos "Cursos obrigatórios em História Cultural na "
" "A)Cumprimento dos "UNICAMP "
" "créditos internos e "Teorias da História "
" "externos à "(Prof.º Edgar De Decca – 120h) "
"1º, 2º, 3º "instituição; "História, Memória e Cultura Material "
"e 4ª "B)Início da leitura "(Prof.º P. P. Funari e Prof.ª M. Rago – "
" "das fontes e do "120h) "
" "arcabouço teórico; "O Sorriso de Clio: Michel Foucault, história"
" "C)Publicação de "e gênero (Prof.º Durval Muniz de Albuquerque"
" "artigos e "Jr. e Prof.ª M. Rago - 120h) "
" "apresentação de " "
" "trabalhos em eventos "Cursos complementares em Literatura "
" "acadêmicos. "Portuguesa na USP "
" "Obs.: Os estudos "Aspectos de Retórica Portuguesa "
" "desenvolvidos nos "(Prof.ª Adma Muhana – 120 h) "
" "cursos constituirão a"Do Épico em Os Lusíadas e Mensagem "
" "investigação inicial "(Prof.ª Maria Helena Nery Garcez – 120h) "
" "da tese. Além desse "Introdução ao Romance Histórico Português "
" "retorno intelectual, "(Prof.º Hélder Garmes – 120h) "
" "o respaldo de " "
" "pareceristas de " "
" "periódicos " "
" "contribuirão com " "
" "avaliações e " "
" "sugestões. " "
" " " "
" "Expansão da Pesquisa:"Bibliotecas: "
" " "Biblioteca do Instituto de Filosofia e "
" "1) Realizar sumários "Ciências Humanas (IFCH – UNICAMP) "
" "e bancos digitais "Biblioteca do Instituto de Letras (IEL – "
"5º, 6º, 7º "contendo fontes e "UNICAMP) "
"e 8º "críticas de apoio à "Biblioteca Florestan Fernandes (FFLCH – USP)"
" "pesquisa; "Biblioteca da Universidade de Lisboa "
" "2)Após a leitura e a "Biblioteca Nacional de Lisboa "
" "reflexão de grande "Bancos digitais: "
" "parte do material "http://scribd.com "
" "coletado, escolher os"http://onlinelibrary.wiley.com/ "
" "periódicos acadêmicos"http://jstor.com "
" "e as obras mais " "
" "relevantes para essa "Sugestão para a Banca de Qualificação: "
" "investigação; "Prof .º Dr.º Edgar Salvadori De Decca "
" "3) Desenvolvimento da"(IFCH/Unicamp) "
" "abordagem teórica e "Prof.º Dr.º Márcio Seligmann-Silva "
" "análise prévia das "(IEL/Unicamp) "
" "fontes. "Prof.ª Dr.ª Márcia Valéria Zamboni Gobbi "
" "4)Redação do texto "(FCL/Unesp – Araraquara) "
" "para o Exame de " "
" "Qualificação no 8º " "
" "semestre. " "
" " "1ª Opção: Profº. Drº. Onésimo T. Almeida, "
" " "especialista em literatura, história e "
"9º/10º " "cultura. Departamento de Estudos Portugueses"
" "Estágio de Pesquisa "e Brasileiros da Brown University. "
" "Doutoral (Período "2ª Opção: Prof.º Dr.º Fernando Cristóvão, "
" "Sanduíche) "especialista em literatura e descobrimentos."
" " "CLEPUL/Universidade de Lisboa "
" " "3ª Opção: Profª. Drª. Ana Paula Laborinho, "
" " "especialista em literatura e descobrimentos."
" " "Centro de Estudos Comparatistas (CEC) da "
" " "Universidade de Lisboa. "
" " " "
"11º " "Sugestões para compor a Banca de Defesa: "
" " "Prof .º.Dr.ºEdgar Salvadori de Decca "
" "Exame de Defesa da "(IFCH/Unicamp) "
" "Tese "Profº. Dr.º Márcio Seligmann-Silva "
" " "(IEL/Unicamp) "
" " "Profª. Dr.ª Márcia Valéria Z. Gobbi "
" " "(FCL/Unesp – Araraquara) "
" " "Profª. Dr.ª Marilene Weinhardt (DELIN/UFPR) "
" " "Profª. Drª.Ana Paula Laborinho "
" " "(CEC/Universidade de Lisboa) "

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7)Anexo I – Proposta de Sumário da Tese

Introdução..................................................................
.....................................................X

Capítulo 1 As polissemias da
história....................................................................
........X
1. O logos articulado em Platão e
Aristóteles...............................................................
..X
2. Vico e o romance histórico
oitocentista..............................................................
........X
3. Diálogos entre filosofia analítica e semântica: a compreensibilidade das
analogias..X
4. Psico-história, história das mentalidades e história dos
imaginários..........................X
5. Micro-história e a lógica das possibilidades
narrativas..............................................X
6. Paul Ricoeur e o processo de refiguração
narrativa....................................................X
7. Poéticas híbridas: diálogos entre Márcio Seligmann-Silva e Stephen
Greenblatt......X


Capítulo 2 A experiência narrativa e sensorial da
viagem..........................................X
2.1 Das epopeias às peregrinações: a tradição mítica e mística dos relatos
de viagem....X
2.2 Permanências do imaginário antigo e medieval nos relatos ultramarinos
dos séculos xv e
xvi.........................................................................
....................................................X
2.3 Entre a crônica e o crônico: questões acerca da noção de
descobrimento..................X
2.4 A historiografia náutica dos regimes
políticos............................................................X
2.5 A historiografia cultural das navegações
ultramarinas...............................................X
2.6 A refiguração dos relatos ultramarinos no romance
contemporâneo..........................X

Capítulo 3 Cristóvão Colombo e a colonização do
imaginário...................................X
3.1 As configurações heroico-míticas dos Diários de Cristóvão
Colombo......................X
3.2 Colombo: ideário de
representações..............................................................
.............X
3.3 O imaginário como objeto de manipulação da tripulação em El último
crimen del Colón de Marcelo
Levinas.....................................................................
...........................X

Capítulo 4 Vasco da Gama e o imaginário
descolonizador.........................................X
4.1 A configuração dos espaços na Relação de Álvaro
Velho..........................................X
4.2 A viagem continua: as memórias reescritas de Vasco da
Gama.................................X
4.3 O "antolhar" do Oriente na Peregrinação de Barnabé das Índias de Mário
Cláudio.....................................................................
.........................................................X

Capítulo 5 Das voltas que o mundo dá: revisitações à primeira
circunavegação.....X
5.1 As experiências sensoriais e outras subjetividades em Primeira viagem
ao redor do mundo de Antonio
Pigafetta...................................................................
...........................X
5.2 As múltiplas faces de Fernão de
Magalhães...............................................................X
5.3 A representação imaginária e oficiosa do relato de Pigafetta em Maluco.
Romance dos descobridores de Napoleón Baccino Ponce de
León.................................................X

Considerações
finais......................................................................
.................................X

8)Anexo II - Bibliografia de Pesquisa


Sumário do levantamento bibliográfico

8.1)Inter e
Transdisciplinaridade.....................................................
.............................X
8.2)História e
Ficção....................................................................
................................X
8.2.1)Estudos
Comparados.............................................................
......................X
8.2.2)História e
Verdade.....................................................................
...................X
8.2.3)História e
Metáfora...............................................................
.......................X
8.2.4)História e
Narrativa...................................................................
..................X
8.2.5)Romance
Histórico...................................................................
...................X
8.2.6)Metanarrativa....................................................
...........................................X
8.2.7)Poéticas
Híbridas....................................................................
.....................X
8.3)Paul
Ricoeur.....................................................................
......................................X
8.4)Hermenêutica e
Fenomenologia...............................................................
.............X
8.5)Semântica.............................................................
..................................................X
8.6)Historiografia
Cultural..................................................................
.........................X
8.6.1)Micro-
História................................................................
.............................X
8.6.2)História dos
Imaginários.............................................................
.................X
8.6.3)História Cultural entre Memórias, Práticas e
Representações.....................X
8.7)A viagem entre Ficção e
História..................................................................
.........X
8.7.1)Relatos de
Viagem......................................................................
.................X
8.7.2)Crônicas dos
Descobrimentos..............................................................
.......X
8.7.3)Historiografia dos
Descobrimentos.............................................................X

8.7.4)História, Ficção e Viagens
Reescritas..........................................................X
8.7.5)O Imaginário das
Navegações..................................................................
...X
8.7.6)A viagem como Existência e como
Poética.................................................X
8.8)Fontes e críticas sobre as viagens de Cristóvão
Colombo.....................................X
8.9)Fontes e críticas sobre as viagens de Vasco da
Gama............................................X
8.10)Fontes e críticas sobre as viagens de Fernão de
Magalhães................................X
8.11)Bibliografia sobre Marcelo Levinas e o El ultimo crimen del
Colón….….........X
8.12)Bibliografia sobre Mário Cláudio e a Peregrinação de Barnabé das
Índias......X
8.13)Bibliografia sobre Napoleón Baccino e Maluco. Romance dos
descobridores...X

-----------------------
[1] O termo pós-colonial descreve, neste artigo, "a busca de bases para a
construção da identidade nacional e cultural numa realidade multicultural
que surgiu, em grande parte, em conseqüência das viagens, encontros e
migrações desde a época colonial" (RODRIGUES, 2014, p. 22).
[2] Para Barradas de Carvalho, tomando em bloco toda a literatura de viagem
dessa época, é possível distinguir os gêneros com a sua evolução
específica: "Chegamos assim a distinguir, com o simplismo inerente a toda
esquematização, quatro ou mesmo cinco gêneros suficientemente definidos, a
saber: crônicas, descrições de terras, diários de bordo, roteiros e guias
náuticos." (CARVALHO, 1980, p.18-19).
[3] É frequente a referência das fontes às cristandades orientais na figura
do apóstolo São Tomé que estaria na origem da conversão dessas comunidades:
"Segundo a tradição lendária, baseada no apógrafo do século III Actos de
Tomé, a Índia ter-lhe-ia sido atribuída." (FONSECA, 1998, p. 253).
[4] Essas correntes historiográficas abrigam os estudos realizados por
Robert Mandrou (1959), Michel Vovelle (1987), Jacques Le Goff (1994),
Georges Duby (1982), Jean Delumeau (2009), Claude Kappler (1993), entre
outros que se encontram nas referências desse projeto.
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