25 anos do Auge do Brasil na Fórmula 1.pdf

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25 anos do Auge do Brasil na Fórmula 1 Carlos Frederico Pereira da Silva Gama1 Em 1991, a União Soviética ainda existia. Mesmo após um golpe de estado que tentou derrubar Mikhail Gorbatchev. O Brasil era governado pelo primeiro presidente civil eleito pelo voto direto em três décadas: Fernando Collor de Mello. Nas palavras de Lulu Santos (com popularidade em baixa após ter defendido Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, em plena Rede Globo), o Sertanejo de Leandro & Leonardo, Chitãozinho & Chororó e Zezé di Camargo & Luciano era “a trilha sonora de um governo corrupto”. Na Fórmula 1, o Brasil vivia seu momento de maior brilho. Ayrton Senna desfrutava, na McLaren-Honda, de sua melhor metade de campeonato da carreira. Venceu as primeiras 4 provas, largando na frente do resto do grid. Venceu pela primeira vez, com apenas uma marcha no fim da prova, o Grande Prêmio do Brasil, em Interlagos. Venceu pela 4ª vez o Grande Prêmio de Mônaco. Enquanto o equipamento estava superior aos demais (como em anos anteriores), o único susto de Ayrton foi um acidente durante treinos no circuito Hermanos Rodriguez, no México. Abaixo de Ayrton estavam as Williams-Renault do quase aposentado Nigel Mansell e do veterano Riccardo Patrese, que só começaram a andar para valer no Grande Prêmio do Canadá. Patrese fez a pole, Mansell liderou a corrida inteira (Ayrton quebrou). Num azar histórico (misturado com fanfarronismo), o Leão perdeu uma vitória com quase 1 volta de vantagem...na última volta, enquanto acenava para o público. O vencedor, pela última vez na F1, era simplesmente Nélson Piquet, o maior piloto brasileiro da categoria, três títulos mundiais, dois deles com equipamento inferior. A vitória no circuito Gilles Villeneuve colocou Piquet em 2º lugar na tabela do Mundial. Senna era o 1º. Desde 1987, para delírio de Galvão Bueno, não víamos isso: Brasil e Brasil. Desde então, nunca mais vimos. Com uma revolucionária, mas frágil Benetton-Ford tubarão, Piquet tinha como companheiro o injustiçado Roberto Moreno – o melhor piloto que correu na F1 sem subir ao lugar mais alto do pódio (Chris Amon não é da minha época e só vi Stefan Belloff pelo VHS). Ao contrário de Stefan Johansson – o piloto mais ou menos dos carros de ponta que nunca venceu – Moreno fazia misérias com AGS, Eurobrun, Coloni, Forti Corse e, acima de tudo, com a inguiável Andrea Moda. Moreno fazia uma temporada sólida na Benetton, ainda que longe dos pódios (como em Suzuka, 1990). Na Leyton House, o subestimado Maurício Gugelmin lutava com um bólido bem menos empolgante que o da temporada anterior (na qual Ivan Capelli quase venceu o GP da França). Além das Williams e das Benetton, outras equipes pouco ameaçavam o reinado da McLaren. A lendária Ferrari oferecia frágil oposição, com um carro que o Professor Alain Prost definiu como “um caminhão” e que atrasou a carreira do jovem Jean Alesi. A Tyrrell contava com o motor Honda do ano anterior, nas mãos do talentoso Stefano Modena e do veterano batedor Satoru Nakajima. Um dos mais belos carros da história da F1. Mas a sensação de 1991 era um carro verde de motor Ford de um time estreante: a Jordan, do indestrutível Andrea de Cesaris e do tímido e rápido Bertrand Gachot. Após jogar spray de pimenta (?) num motorista de táxi inglês durante uma briga, Gachot foi preso. Essa prisão mudou a história da F1. O substituto de Gachot estreou no Grande Prêmio da Bélgica, disputado na imortal Spa-Francorchamps – a pista das pistas para boa parte do grid da época – após dar uma volta de bicicleta pelos 7km do circuito. Um jovem piloto alemão vinculado à Mercedes, que bancou o cockpit verde na última hora. Em seu primeiro treino oficial, Michael Schumacher colocou sete décimos de diferença em De Cesaris (piloto 1

Fã de Nélson Piquet e das Williams desde o tri/1987 e fã de F1 desde o Grande Prêmio de México de 1986

com mais de 150 GPs disputados e 1 pole). Por alguns milésimos, superou Moreno (com o mesmo motor, mas com uma Benetton). Sua Jordan ficou à frente das Tyrrell-Honda. Adiante, apenas as McLaren (Senna fez a pole, numa volta sensacional), as Ferrari (Prost 1 segundo atrás), as Williams (Mansell atrás de Prost e 1 segundo atrás de Senna) e Nélson Piquet. Disputado em 25 de Agosto de 1991, o Grande Prêmio da Bélgica viu o Brasil colocar 3 pilotos entre os 4 primeiros colocados na classificação final (na época 6 pilotos pontuavam). Nunca antes na história do país e da categoria isso aconteceu. Nunca depois. Senna liderou as primeiras 14 voltas (Schumacher quebrou logo na largada e Prost abandonou na volta 3). Mansell ultrapassou Senna na volta 15, quando o brasileiro fez sua primeira passagem pelos boxes. Piquet assumiria a liderança pela última vez na F1 na volta 17, superando seu velho rival. Mansell voltaria à liderança nas 5 voltas seguintes, até ser traído pela tecnologia com uma quebra (algo comum nessa temporada de estréia das inovações de Patrick Head e Adrian Newey). Surpresa quase geral, Alesi herdou a liderança de Mansell e a manteve por 9 voltas, segurando bravamente Senna. Piquet lutava pelo 3º lugar com Patrese, vindo do fundo, e De Cesaris. Alesi quebrou a 15 voltas do fim. Por 10 voltas, a Jordan de De Cesaris pareceu próxima de uma vitória épica (o que mostra que o 7º lugar de Schumacher no grid não era 100% braço), até quebrar. Aí Senna venceu mais uma vez, ampliando sua vantagem no campeonato frente às Williams. Um apagado Gerhard Berger se manteve longe do pódio até ser beneficiado pelas múltiplas quebras e por ter uma McLaren, chegando em 2º. Um heroico Piquet conseguiu levar a Benetton ao pódio. Moreno também brilhou. Além de se beneficiar das quebras (estava entre 7º e 9º e chegou em 4º), fez a volta mais rápida – sua única na F1. Patrese teve problemas mecânicos e se arrastou até chegar em 5º. Apenas 7 carros terminaram a prova. Um país endividado que crescia para trás triunfava na mais tecnológica das modalidades esportivas. Diante de um governo corrupto carente de legitimidade, Senna e Piquet eram ídolos nacionais. Vacas magras do futebol, vôlei e economia eram compensadas pelo “tema da vitória”, tocadoa com frequência comparável aos sucessos sertanejos. Parecia impossível acreditar que veríamos um campeão mundial morrer nas pistas, que a F1 fosse desaparecer das manhãs de domingo, os autódromos virariam loteamentos imobiliários. Parecia impossível imaginar o primeiro presidente eleito pelo voto direto em 30 anos sendo o primeiro a sofrer impeachment. O Brasil de 1991 era contraditório. Suas possibilidades pareciam imperfeitamente maiores. Seus limites eram expostos de forma dolorosa, mas sincera. No país do futuro o futuro parecia promissor.

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