A acumulação capitalista, a cidade e as pessoas: O capital, o território, as territorialidades e temporalidade.

Share Embed


Descrição do Produto

Capitulo 1.

A acumulação capitalista, a cidade e as pessoas: O capital, o território, as territorialidades e temporalidade.

Capitulo 1. A acumulação capitalista a cidade e as pessoas: o capital, o território, as territorialidades e temporalidade.

A questão urbana tem sido, pela atual bibliografia geográfica, tomada como uma questão territorial, entendemos o território como todo espaço habitado pelo homem e diferenciado entre eles por fatores (i)materiais, que exercem poder sobre o mesmo. Para entender o território temos de passar pela ideia (intuição) de espaço, o espaço é um conceito de amplo debate dentro da ciência geográfica, adotaremos aqui a noção de Eliseé Reclus que diz “'homme est la nature prenant consicence d'elle même.”-o homem é a natureza adquirindo consciência de si própria” (Reclus,1985:40), ou seja, a natureza (ou o espaço),os ‘entes naturais’, tomam consciência de que existem à partir da consciência humana de existência, está concepção longe de ser recente nasce com Kant, em seu livro ‘Critica da razão pura’ o filósofo alemão nos traz a concepção de que :

“Mas se é verdade que os conhecimentos derivam da experiência, alguns há, no entanto, que não têm essa origem exclusiva, pois poderemos admitir que o nosso conhecimento empírico fosse um composto daquilo que recebemos das impressões e daquilo que a nossa faculdade cognoscitiva lhe adiciona (estimulada somente pelas impressões dos sentidos); aditamento que própria mente não distinguimos senão mediante uma longa prática que nos habilite a separar esses dois elementos.” (Kant, 1983:23).

Ou seja, existe o ser cognoscível (o ser em si) e que é cognoscente (aquilo tenta conhece-lo), e o que rege o que o cognoscente é capaz de conhecer são suas capacidades ‘apriori’-inatas. O próprio espaço entra então como uma representação ‘apriori’ que auxilia o sujeito cognoscente a entender e intuir os ‘objetos’ organizados especialmente, como Kant nos diz a seguir: “O espaço não é um conceito empírico abstraído de experiências externas. Pois a representação de espaço já tem que estar subjacente para certas sensações se referirem a algo fora de mim […] O espaço é uma representação a priori necessária que subjaz a todas as intuições externas. […] O espaço não é um conceito discursivo ou, como se diz, um conceito universal de relações das coisas em geral, mas sim uma intuição pura. […] O espaço é representado como uma magnitude infinita dada. […] A representação originária do espaço é, portanto, intuição a priori e não conceito” (KANT, 1983: 41).

Partindo desta concepção de espaço, ou seja, de ‘espaço-geográfico’, as experiências humanas não podem se desenvolver sobre uma espécie de 'espaço puro’, ou vazio, as

experiências materiais se dão sobre um desdobramento da concepção de espaço que o ser humano é capaz de criar, construir, assim o espaço-geográfico-vivido nunca é apenas espaço, processam-se neles outros processos, ele é sempre um espaço produzido por usos e significâncias. O que defendemos é que este espaço experimentado pelas relações materiais de existência não é apenas espaço, mas deve ser mantido dentro da concepção de território, o território aqui entendido tratasse de uma espécie de ecúmeno proposto por Max. Sorre (1984), o ecúmeno é o espaço habitado pelo homem, o espaço-geográfico que o ser humano transforma, vivência, preenche de funções e significados é -na nossa concepção- o seu território. Porém, no mundo material vivemos sobre territórios diferenciados, grupos diferenciados formulam des dos tempos imemoriais territórios diferenciados a partir de suas experiências (i) materiais de mundo, a conquista de territórios entre povos, esta disputa de interesses entre eles, e de interesses internos da contradição entre os interesses individuais e coletivos dará origem ao Estado primitivo até o Estado moderno. - isso será tema de debate mais adiante1. Entramos aqui na perspectiva de Raffestin (1993) o espaço é a prisão original e o território é a prisão que o homem construiu para si. Logo, o território é o espaço habitado pelo homem, neste ponto de vista temos diversas concepções. O ator preponderante do território é o Estado, considerado pelo francês como a centralidade no espaço, aproximando-se a concepção de território descrita por Milton Santos (2008), segundo o autor, “(...) confunde-se território e espaço (...) e extensão (...). Por território entende-se geralmente como a extensão apropriada e usada (...) o sentido da palavra territorialidade como sinônimo de pertencer a aquilo que nos pertence (...)” (Santos, 2008:19). A noção de território estende-se a concepção de lugar quando “alargada” a um grupo de pessoas, ou seja, pessoas criando lugares, afetividade com lugares, usos, consumos e trocas sobre os lugares, e a interligação entre eles no limite formariam a noção de território.

1

A concepção marxista de Estado passa pela leitura dialética de duas contradições, o Estado surge da contradição entre interesses individuais e coletivos ao ponto que surge como instrumento de reprodução da luta de classes dando força às classes dominantes.

O autor prossegue criando a ligação entre o Estado e o território que nos referimos acima: “território é o nome politico para o espaço de um país (…) a existência de um país pressupõe um território (...) pode-se falar de territorialidade sem Estado, mas é praticamente impossível nos referirmos a um Estado sem território” (Santos, 2008:19).

Porém, ele complementa esta noção, extrapolando o Estado-Nação colocando em pauta que o “território pode ser um instrumento, um fundo de acumulação e recursos, porém de forma mais rígida ele é anterior ao Estado, o que pressupões a criação de múltiplas territorialidades em um território único.” (Santos, 2008:20). Logo, entenderemos que o território é uma concepção de apropriação do espaço pelo Estado-Nação, em contraposição a este território generalizado sobre o controle do Estado existe o território real, o “território-usado” (Santos, 2008:20) que é o espaço usado pelo homem, ou melhor, as territorialidades, “que irão denotar identidades no espaço” (SAQUET, 2011:80).

Para entendermos o território enquanto espaço-usado pelo Estado, utilizaremos a noção marxista de Estado, levantada por David Harvey. A ‘Concepção marxista de Estado’ confunde-se com sua fraseologia militante que pode ser resumida com “O Governo do Estado moderno é apenas um comitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia" (MARX & ENGELS, 2004): porém

na literatura marxista existem considerações mais complexas que

devem ser levadas em conta, diferentemente de Rousseau (ROUSSEAU,1999: 70) que dita que a origem do Estado vem da “vontade geral da população” , do ‘contrato social’ ,ou seja, o Estado vem de uma síntese social, uma troca constante entre o Estado e a população procurando sanar interesses comum à sociedade, Marx irá pensar em uma origem inversa a esta idealista, uma origem materialista onde o Estado surge das contradições de classe, ele surge como um poder regulador que irá manter a luta de classes dentro da ‘ordem’ estabelecida, ou seja o Estado surge, e possui um poder sobre a sociedade,

acima dela , que se aliena gradativamente. O poder do Estado vem da sociedade e se aliena dela, o Estado então irá surgir pela dinâmica dialética entre interesses individuais e coletivos, onde atuará de forma reguladora. (Harvey,2005) Como Harvey destacou dos escritos de Marx e Engels: Assim o Estado não é, de forma alguma, um poder vindo de fora da sociedade; assim como não é ‘realidade da ideia moral’ a ‘imagem e a realidade da razão’ como sustenta Hegel. Em vez disso, o Estado é um produto da sociedade em um determinado estagio especifico de seu desenvolvimento; é o reconhecimento que a sociedade se envolveu em uma autocontradição insolúvel, e esta rachada em antagonismos irreconciliáveis, incapazes de ser exorcizados. No entanto para que estes antagonismos não destruam as classes, com interesses econômicos conflitantes, um poder, aparentemente situado acima da sociedade, tornou-se necessário para modelar o conflito e mantê-lo nos limites da ‘ordem’; e este poder nascido da sociedade, mas se colocando acima dela, progressivamente, alienando-se dela, é o Estado (MARX & ENGELS Apud HARVEY, 2005: 79).

Dentro do próprio Estado

às contradições se

reproduzem as

contradições da própria sociedade capitalista, a luta de classes se reproduz dentro do próprio Estado, não atoa Harvey (HARVEY, 2005: 80) propõe que o Estado é um sistema estatal, ou melhor, um sistema de poder, pela multiescalaridades e locais de poder, porém, via de regra, dentro da sociedade que visa à acumulação de capital, aqueles que possuem capital acumulado terão maior possibilidade de alcançarem estes espaços de poder. Desta forma, o Estado se torna um instrumento por onde a classe dominante se torna a classe dirigente, logo o Estado torna-se um instrumento de do instrumento de dominação de classe- lembrando que a classe dominante não é única, existem diversas

ramificações de interesses diversos no objetivo de multiplicar o

capital, neste sentido o Estado surge como regulador e a classe dirigente terá como característica a tomada dos interesses de determinadas frações

da

classe dominante (HARVEY,2005: 80). Estas contradições principais geram dentro de si contradições adicionais, a classe dominante tem de dirigir o Estado de forma que não arregimente a luta de classes, interclasse (pois o interesse das parcelas da classe dominante são conflituosos) e entre classes ao mesmo tempo que “tem de exercer seu poder em seu próprio interesse de classe, enquanto afirma que são para o bem de todos” (MARX Apud HARVEY,2005: 80). Para tal o Estado

toma diversas formas e cria diversas características, Harvey aponta duas preponderantes: a) Autonomia relativa do Estado: O Estado reveste a administração estatal

(funcionários) com uma autoridade fundada em si mesma,

aparentemente neutra, acima da sociedade, e que pode voltar-se contra os interesses imediatos da multiplicação do capital, em momentos onde a luta de classes se nivela, ou eventualmente que o Estado sai das mãos

das classes dominadas o Estado parece agir-se de forma

autônoma.(Harvey,2005:81) devemos acrescentar que isso é possível pois a ‘genética’ do Estado, em seu período, é a da manutenção da estrutura da qual foi criado, logo suas atitudes, mesmo enfurecendo parcelas das classes dominantes tem a tendência de reproduzir parcela da mesma. No Brasil este movimento se apresenta na década de 1930.

b) Ideias dominantes: A classe dominante, precisa, para perpetuar-se como classe dirigente colocar suas ideias como ideias universais e eternas, porém esta dinâmica gera em si contradições diversas. A classe dominante para atingir a acumulação de capital pode distanciar-se dos seus ideais universais e eternos (iluministas) o que pode erguer a luta de classes, criando, por exemplo, lutas reivindicatórias que aquecem a luta de classes, ou o seu oposto, em momentos de crise o Estado pode encarnar-se como esta moral universal viva, exemplos de Estado que tomaram-se como eternos e Morais foram as experiências destrutivas do fascismo e do nazismo que saíram do controle da ordem comum e ordinária do Estado. (HARVEY, 2005:82)

O Estado tem de suprir de bens públicos e infraestrutras para estas relações econômicas continuarem, no caso do Estado-nação capitalista temos de compreender que o capitalismo é caótico, um exemplo é a diferença de interesses entre as camadas e formas que o capital se acumula e se distribui entre as classes dominantes, ou seja, entre o “lucro industrial, no juros para financiar capital e na renda dos proprietários” (Harvey,2005:84), e a diferença entre os possuidores e despossuídos necessitam do Estado que age a partir de

um marco legal , um “modo de regulação”(HARVEY,2006). Neste conflito nasce o Estado-Nação e suas nuances. O território que analisaremos acontece sobre a administração do EstadoNação, materializado sobre a figura das subprefeituras, e ocorre na cidade sobre o modo de produção capitalista, sofrendo então o processo de produção capitalista do espaço. A cidade, segundo Harvey- em sua citação do texto de Park- é: “a tentativa mais consistente do homem e a mais bem sucedida como um todo para refazer o mundo em que vive o mais próximo de seu desejo íntimo. Mas, se a cidade é o mundo que o homem criou, é o mundo no qual ele está doravante condenado a viver. Assim, indiretamente, e sem qualquer clareza da natureza de sua tarefa, fazendo a cidade o homem refez a si mesmo”. (Park apud Harvey,2009:01)

Esta produção e apropriação do espaço ocorre sobre o modo de produção capitalista, enquanto o ser transforma a cidade a própria cidade transforma o ser, esta relação dialética é o amago da urbanidade. Segundo Harvey (2005) o capitalismo é necessariamente uma relação social localizada em um determinado período histórico que sobrevive mediante a multiplicação que causa inexoravelmente em sua estrutura a ‘acumulação progressiva’ sem a qual o próprio sistema inexiste, logo para o autor a ‘acumulação progressiva’ é o motor do próprio capital e cria uma “estrutura capitalista expansível.” (Harvey,

2005:73). Para que está acumulação exista de forma progressiva existem tensões e contradições se mutuando de forma progressiva ao próprio processo, para que a acumulação progressiva ocorra ela necessita de ao menos três fatores: a) A existência de um exército industrial de reserva: Para que a acumulação continue de forma indeterminada e progressivamente é necessário que exista um exército de trabalhadores dentro ou fora do mercado de trabalho que mantenham relações de trabalho temporárias, de subemprego e uma massa considerável de desempregados, esta camada da população Marx denominou como looping-proletariado(citação).Esta camada da população tem a função de manter os salários achatados à partir do excesso de procura dos trabalhadores por empregos seus salários tendem necessariamente à queda em valor (não necessariamente em moeda).Tal exército só é construído à partir

da exigência de uma produtividade também progressiva de cada trabalhador (que dispensa a necessidade do seu ‘vizinho’), a mesma se materializa na linha de trabalho na superexploração do trabalhador e nas inovações tecnoprodutivas.(HARVEY,2005:68)

b) Meios de produção disponíveis: Para que a ‘acumulação progressiva’ ocorra o reinvestimento de capital deve se destinar para a obtenção de novos meios de produção (meios por onde e com o qual se produz a mercadoria) para aumento de produtividade e necessariamente de mercadorias para venda, logo, para que a ‘acumulação progressiva’ ocorra é necessário que o mercado tenha disponível meios de produção (de preferência mais eficientes e que necessitem de um menor número de trabalhadores para fazer o manejo),sem esta simples prerrogativa o processo de acumulação se abarranca causando crise e possível desvalorização de capital que fique ‘parado’, além da existência dos meios de produção no mercado em quantidade e qualidade eles devem tentar manter-se de uma faixa de preço acessível ao capital, o que por vezes gera algum nicho de oportunidade aos trabalhadores que conseguem adquirir pequenos meios de produção e se tornam eles mesmo partes agora orgânicas do mecanismo de ‘ acumulação progressiva’ .(HARVEY,2005:69).

c) Existência de mercado consumidor: até então vimos que a acumulação passa pelo aumento de produção ao menor custo de forma progressiva, porém este valor acumulado em forma de mercadoria só se realiza diante da venda, deriva dai a necessidade progressiva de conquista de novos mercados além de uma competição pela preservação de seus próprios nichos de mercado. .(HARVEY, 2005:69). Os três aspectos necessários para a progressividade da acumulação de capitais expostos acima são por si só contraditórios, excludentes, entre si, -além de necessitarem de situações bastante específicas para que acontecerem, causando crises de menores e maiores intensidade- porém a principal contradição apontada por Marx seria o motivo das crises estruturais do próprio capitalismo, nos termos de Harvey (2005:44) aludindo à Marx “o capitalismo tende, ativamente, a produzir algumas barreiras para seu próprio desenvolvimento”, a produtividade crescente passa, como vimos, pela crescente mecanização da produção e crescimento do exército industrial de reserva, porém o valor só se realiza na venda da mercadoria, ou seja, na crescente necessidade do mercado de criar novos mercados, com uma alta produtividade e barateamento do produto (pela diminuição dos custos com trabalho, alta disponibilidade no mercado, etc.) ele não é consumido totalmente pelas classes

que possuem capital, subentende-se que serão os trabalhadores quem irão ser esta margem de consumo, porém como trabalhadores desempregados, subempregados ou empregados com baixíssimos salários podem ser consumidores? E como um mercado com altíssima produção irá dar vazão à sua produção?

Desta

forma

temos

no

sentido

da

acumulação

duas

necessidades

contraditórias, o consumo e o (dês)sub emprego, nas situações em que não se pode protelar a reversividade desta contradição cria-se o que Marx denominou ‘crise de super produção’. Ou seja, temos na crise de superprodução a contraditória posição descrita em “O capital” e vivida por diversas vezes nós últimos quatrocentos ou quinhentos anos na qual não é a totalidade de pessoas da sociedade que possuem os bens de consumo, porém a capacidade de consumo da mesma dentro do capitalismo se esgota enquanto a produtividade continua em alta, causando grandes choques e perdas de capital investido, além do amontoamento

de capital fora do ciclo de

2

acumulação , e na diminuição na velocidade do mesmo, diminuindo assim os lucro, Harvey pensa este processo como circulação-anual que se reduzida se transforma em uma

longa

crise

estrutural

no

capitalismo,

não

atoa

o

“tempo

de

circulação”(HARVEY,2005:46) do capital tem de diminuir, criando a tendência de tentar “vencer o espaço pelo tempo” (HARVEY,2005:45). A solução da crise – que necessariamente é contraditória e prepara o terreno para a próxima- tem um valor positivo ao sistema capitalista no sentido que o da “certa racionalidade” (Harvey, 2005:45) ao capitalismo que traz de modo geral quatro grandes efeitos: a) A produtividade aumenta: a crise exige que a produção continue, mesmo com menor capital disponível o que força o aumento de produtividade, pela

2

O ciclo de acumulação consiste no percurso que o capital transcorre antes de realizarse e multiplicar-se, consiste em cinco etapas: 1)Capital (capital inicial ou de reinvestiremos). 2) investimento (empregasse o capital na compra dos meios de produção).3)trabalho (os trabalhadores criam a mercadoria agregando valor à ela).4) venda/distribuição (a etapa onde a circulação da mercadoria tornasse importante e agrega trabalho/valor à mercadoria) 5) lucro ( o valor se realiza em moeda para o proprietário dos meios de produção e para a nova parcela de capital criado)

superexploração do trabalhador, novas tecnologias desenvolvidas e o barateamento (desvalorização) das antigas tecnologias (Harvey, 2005:46) b) O custo da mão de obra decresce: o desemprego causado pela desaceleração da economia engrossa as fileiras do exército industrial de reserva (looping proletariado) o que descreve os salários dos empregados (Harvey, 2005:47). c) Inovações de investimento: os capitais que se amontoam no rítmico lento no ciclo de acumulação encontram novas linhas de investimento com retorno mais veloz, renovando toda a economia (Harvey, 2005:47). d) Demanda efetiva aumenta: para que o sistema volte a se sustentar as vendas devem voltar a ocorrer em longa escala. ( (Harvey, 2005:47).(discorreremos sobre o aumento da demanda abaixo) O aumento da demanda, na verdade, é o sustentáculo de toda recuperação do sistema capitalista, que ressurge de sua própria dificuldade acumulando um montante maior de capital que no período anterior à crise, o aumento da demandada efetiva parte segundo nosso geógrafo inglês de quatro grandes movimentos do capitalismo: a) Penetração de novas atividades: como já apontado por Rosa Luxemburgo (2009) ,ou seja, o capitalismo se sustenta a medida que penetra suas atividades em locais com atividade pré-capitalista, convertendo suas atividades econômicas gradativamente (ou abruptamente) em atividades capitalistas( ou seja, sua produção passa pelo ciclo de acumulação), criando então toda uma nova sociedade inserida no campo da demanda capitalista, que não necessariamente se soma ao looping proletariado, pois como nos lembra Harvey (2005 : 46) uma sociedade pré-capitalista que venda seus excedentes no mercado não necessita, em primeiro momento, adentrar em relações de trabalho tipicamente capitalistas, pois o que se insere primeiramente é sua mercadoria e sua capacidade de consumo, auxiliando à solucionar a contradição que da origem à este momento, porém o processo de capitalização se completa em algum tempo fazendo as relações capitalista de trabalho prevalecerem e realimentando a contradição que se dispôs a solucionar.

b) Criação de novos desejos: novas tecnologias de produção alinhada a novas ramificações de investimento como descrito criam novos produtos que criam em si novos desejos e produtos de massa (HARVEY, 2005:47).

c) Aumento populacional: pensando à longo prazo o aumento vegetativo da população traz ao mercado um acréscimo permanente de consumidores ao mercado. (HARVEY, 2005:47) d) Expansão geográfica: o capital se mostra expansível vertical e radicalmente, adentrando em todo o espaço geográfico e em todas as relações sociais, a noção de ‘mercado global’ se constrói e se consolida enquanto o capital se expande pelo globo, de norte a sul, entre leste e Oeste, até mesmo do zênite ao nadir o capitalismo tenta se impor e se integrar (HARVEY, 2005:47).

Tal processo o autor denomina de intensificação e expansão geográfica do capital, nela percebemos o capitalismo se concentra e intensifica em determinados pontos ao mesmo tempo em que se expande e diversifica, tomando de arremate as sociedades que dele não fazem parte, porém Harvey nos sinaliza –apesar de não afirmar categoricamente- que este processo que ele mesmo denominou de ajuste espacial não ocorre apenas entre sociedades ‘pré-capitalistas’ e ‘ capitalistas’ mas também entre capitalistas e capitalistas, o desenvolvimento capitalista se desenvolve em ‘modos de acumulação’ que se sobrepõem uns sobre os outros em “ondas longas”(Harvey,2005:47) é a “destruição criativa”(Harvey, 2005 :47) é esta destruição ‘criativa’ que dita a sobreposição de capitalismos e a destruição do capital por ele mesmo, criando o que Trotsky denominaria de “desenvolvimento desigual e combinado” (TROTSKY,2000:20), a ideia de que o desenvolvimento no capitalismo não é só desigual – ao passo que se podia evoluir as etapas dentro do mesmo- a desigualdade é combinada, ou seja, existe uma ligação na desigualdade entre os espaço, espaço desenvolvidos necessitam de espaço não desenvolvidos ou com outra forma de desenvolvimento para sobreviver e se reproduzir, ao passo que a forma de acumular capitais se transforma ambos os espaços se transformam (se destroem e constroem) também de forma desigual e combinada. Acreditamos que isso ocorra entre diferentes modos de acumulação, sucessivos entre si que causem a destruição criativa da cidade, para propiciar que a acumulação de capital ocorra ao passo que modifica a cidade de forma desigual e combinada conforme a onda do modo acumulação invade e se estabelece no espaço-geográfico.

É neste sistema que a paisagem urbana se torna ao mesmo tempo a representação e a negação deste processo, Assim, o capital passa a ser representado na forma de uma paisagem física, criada à sua própria imagem, criada como valor de uso,

acentuando a acumulação progressiva do capital numa escala expansível. A paisagem geográfica, abrangido pelo capital fixo e imobilizado, é tanto uma glória coroada desenvolvimento do capital passado, como uma prisão inibidora do progresso adicional da acumulação, pois a própria construção dessa paisagem é antitética em relação à ‘derrubada das barreiras espaciais’ e, no fim, até à ‘anulação do espaço pelo tempo’ “(HARVEY, 2005: 53)

É este desenvolvimento e movimento de criação e destruição que pretendemos enxergar sobre a cidade, ao pensá-la como uma construção dialética entre o sistema capitalista, o homem capitalista e o meio urbano.

É esta cidade que se metamorfoseia nas mãos dos diversos aspectos que a produção material capitalista exige do poder de planejamento do território do Estado, e as interferências deste Estado nestes processos materiais. Mas como Santos já nos disse anteriormente, para além do território do Estado temos de avançar também sobre o espaço-vivido, ou melhor, para as territorialidades encontrando as identidades o micro-espaço.

Para desenvolver a ideia de identidade nos apoiaremos na noção de ‘temporalidade e territorialidade’ de Marcos Aurélio Saquet, desenvolvido em obra com mesmo nome, em seu livro ele defende uma “concepção de geografia voltada para a cooperação e desenvolvimento territorial” (Saquet, 2011:91) esta concepção de geografia visa o desenvolvimento territorial do que chamaremos de micro-espaço. A partir da noção de Saquet, o autor aponta que as territorialidades é a geografia que visa o território enquanto práxis, ou seja o território do mundo vivido, como nos mostra o autor:

O território nesta perspectiva de práxis, significa considerar a paisagem, o lugar, o espaço, o tempo,[...]compreensão da sociedade e da natureza ,pela gestão participativa, pela reunião dos sujeitosobjetos e pela construção de novas territorialidades e novos territórios que possibilitem a sustentabilidade e a governabilidade coletiva em

busca da autonomia, redimensionando as relações de poder para valorizar os sujeitos de cada lugar, seu patrimônio e planificação democrática em detrimento das tecnologias inapropriadas e da acumulação de intensiva de capital’(Saquet,2011:55).

Saquet visa discutir os “territórios e as territorialidades”, o autor inicia o capitulo fazendo um debate acerca da noção de temporalidade, partindo do principio que o território é entendido á partir de processos históricos, para entender estes processos temos de entender os movimentos temporais, definindo dois movimentos unitários no tempo: A) O primeiro ele aponta como o ‘tempo histórico’, em fluxos contínuos e históricos, visando o tempo mais próximo de como o referenciamos no cotidiano- o tempo do ‘relógio’- progressivo. (Saquet, 2011:56). B) O segundo seria ‘o tempo das coexistências’, ele pressupõe a existência de diversas temporalidades agindo e coexistindo simultaneamente somente apreensível se correlacionado. (Saquet, 2011:58). Neste ponto o autor traz a conceituação de Milton Santos de “tempo rápido” e “tempo lento”, ou seja, no espaço-geográfico existem passagens diferentes nos ritmos das temporalidades, o passado, o presente e o futuro coexistem, neste sentido, apoiado em Norbert Elias, Saquet nos diz:

Presente, passado e futuro expressam a relação estabelecida no movimento entre mudanças de experiência de vida vinculada as noções de duração processo e instante. Certo instante na processualidade histórica só tem significado presente, consoante afirma Norbert Elias, em relação ao ser humano que o esteja vivendo. Outros aspectos, para o mesmo individuo, podem assumir o significado de passado e futuro. É questão de vida, percepção, sentimento, todavia, presente, passado e futuro diferenciam-se e coexistem, um está no outro. (SAQUET,2011:58).

O autor complementa dizendo que a noção de passado/presente se colocam em parcelas do espaço (com as técnicas inclusive) onde a reprodução do passado para a reprodução do presente, toda esta concepção temporal o autor denomina de “transtemporalidade-processual e coexistente.” (Saquet, 2011:58).

Organizaremos o trabalho em três temporalidades que se transpões de forma processual e coexistem, assim como modificam o espaço, são elas: 

Praeterium- algo que ‘ainda-já’ aconteceu, ou seja, o processo praeterium já aconteceu ao passo que esta acontecendo, é um eterno fantasma, o peso dos mortos sobre nós, dos processos passados que ainda ocorrem. Neste sentido ele ainda esta acontecendo e já aconteceu.



Tempore- algo que ‘esta-já’ aconteceu, ou seja, o processo tempore ao passo que esta acontecendo parece já ter ocorrido, tem relação com a efemeridade do tempo vivido, de como os objetos se mostram na objetividade. Neste sentido ele esta acontecendo e já aconteceu



Future algo que ‘vai-esta’ acontecendo, ou seja, o processo future vai acontecer, é um plano uma presunção, porém como é uma projeção ele já esta acontecendo, se concretizando. Neste sentido ele vai acontecer e esta acontecendo.

A partir desta movimentação entendemos que o tempo é uno, fluxo e fracionado, relação e significado, (i) materialidade no/do território e na/da territorialidade, o território passa por tempo, territorialidades, portanto também é (i) materialidade, formando o território enquanto práxis como a relação da sociedade e a natureza, objetivação e subjetivação, tem pontos fixos e em redes condicionados historicamente. .”(Saquet, 2011:59).

A territorialidade passa pelo que o autor chama de territórios (des-re) teritorializados que são territórios histórico-críticos, o autor toma a noção de Demetteis de “Milieu local”, do Raffestin do trabalho enquanto energia que se plasma no espaço, vendo o território/territorialidade como real material e processo que envolve razão e imaginação, além das diversas formas descritas por Brenet, para chegar a sua concepção de Territorialidade como apropriação de sujeitos em redes que ocorre em variadas escalas sempre envolvidas em relação de diferentes apropriações da coletividade apoiada nas redes de poder e trabalho a partir das mediações existentes tendo (des) continuidades de temporalidades e territorialidades. (Saquet, 2011:90).

As temporalidades – nas territorialidades- formam a noção de identidade, a identidade é fundamental para o território, eles nos traz a noção de território de Gottmann, Raffestin, Foucault e Demateis para entendermos o Estado, entendendo a identidade no território como: a) Iconografias: ligadas a resistência, segurança, diversão, etc. (Saquet, 2011:91). b) Circulação: A possibilidade de circulação de mercadorias e pessoas para a reprodução do capital, criando relações produtivas e comunicativas, formando redes e fluxos e conta com uma dimensão psicológica de estadia e mudança. (Saquet, 2011:91). c) Dimensões de poder: As centralidades e os campos de poder criam relações variáveis e multiformes, tomando a interpretação de Foucault e Raffestin, de uma relação social conflituosa, múltiplas e intencionais, criando ‘campos de poder’ formando malhas, nós e redes que trazem em si significações locais. (Saquet, 2011:91). Após um longo debate o autor retoma os fatores identitários na mesma perspectiva de territorialidade, elencando que: Há relações indentitárias estáveis juntamente com rupturas abruptas e velozes que podem ser apreendidas numa perspectiva que considere: a) as e conexões em diversas escalas e natureza (redes) b) as conexões entre as fases e momentos dos processos de modificação do território (tempos); c) as relações entro sujeitos e grupos sociais distintos (lugares) (Saquet, 2011:98).

A territorialidade, desta forma, pode ser encontrada nas ‘’rugosidades do espaço’’ rugosidade, pois o espaço “[...] testemunha um momento de um modo de produção pela memória do espaço construído, das coisas fixadas na paisagem criada.” (SANTOS, 1986:138), porém, “as rugosidades não podem ser apenas encaradas como heranças físico-territoriais, mas também como heranças sócioterritoriais ou sócio-geográficas.” (SANTOS, 2012: 43), ou seja, nos espaços que persistem e são ressignificados no micro-espaço, na medida que se relacionam com estas novas redes, demonstrando a sobrevivência e a construção de identidades do micro-espaço, pois nele há os símbolos coletivos e pontos fixos da rede local, no qual se constroem os aspectos psicológicos e físicos de identidades múltiplas, porém unificadas por se tratarem do mesmo território, o território-vivido.

Entendemos então o território como espaço tomado pelo homem. O território tomado pelo homem é administrado por esta instituição criada pelo próprio homem para sanar suas contradições sociais, o Estado. Logo, o território é demarcado, formalmente, pelo Estado, que é um instrumento de um determinado modo de produção- e sua classe dominante-. O modo de produção cria processos de produção e reprodução do espaço, este processo é o processo de transformação no nosso caso a “produção capitalista do espaço” e remodelamento da cidade. Este processo macro de transformações perpassa contraditoriamente a processos micros, ligados às identidades e a processos de sobrevivência dos modos de vida e significâncias daquele espaço- vivido a partir das territorialidades. Logo, trataremos como base nesta concepção duas escalas que se sobrepõe de forma dialética sobre uma cidade que sofre metamorfose continuamente para ajustar-se aos modos de acumulação do capitalismo. a) Um território gerido pelo Estado –subprefeitura- e alterado por ele – por exemplo, o plano diretor- um ‘espaço usado’ gerido e planejado sobre modo de acumulação vigente. b) A territorialidade, o espaço vivido pelo bairro, que cria identidades, que se mostrara nas rugosidades do espaço local.

A partir desta perspectiva tentaremos avaliar as tendências para o desenvolvimento urbanístico local que o plano diretor almeja para a região sobre a perspectiva da tensão dialética entre ‘a acumulação mais larga de capitais – a transformação da cidade – a vivência tradicional na cidade’.

(imagem 1) Portanto, este trabalho buscará esta tensão dialética em conflito, observe a imagem acima para percebermos a gama de opções de interpretações e

possibilidades desta interação. Existe a interpretação padrão as identidades locais se excluem à medida que a acumulação de capitais ocorre e que a transformação da cidade se configura, porém nosso pequeno diagrama da dialética mostra que existem mais possibilidades que esta, devemos nos ater a fala de Zizek (2015:101) o verdadeiro conservador é um anticapitalista, pois estas identidades locais porosas quando não sofrem transformação pela cidade podem (mesmo assim) abrir margem para a acumulação de capitais, transformando as duas – ou seja, não se conserva-(cor roxa no diagrama), ao passo que a cidade ao transformar-se cria a possibilidade de novas identidades (cor vermelha no diagrama). A acumulação e a transformação se entrecruzam de forma clara, (cor verde no diagrama) mas notem o centro de cor escura e de menor nitidez, ali existe (na falta de nitidez) a arca do conflito, e qual conflito? O conflito das impossibilidades, o conflito entre a acumulação a manutenção de identidades e a construção de novas identidades pelas novas localidades e a perfeita acumulação na reconstrução da cidade são possibilidades excludentes entre si. Se mudarmos o foco e nos voltarmos para a população, existe uma impossibilidade de manter a transformação da cidade com a tranquila manutenção da minha identidade, enquanto reconstruo-a nesta nova feição, perceba que no âmbito do conflito nos voltamos novamente ao inicio, ou seja, todas estas possibilidades não superam o conflito, pelo contrario, são parte constituinte desta realidade. Se a acumulação depende da transformação (como demonstramos) e a identidade se relaciona a tradição, a transformação se torna excludente à identidade. É deste prisma que iremos analisar a realidade da subprefeitura Vila Prudente e seu processo de transformação atual, assim como os anseios para o plano diretor à mesma.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.