A atividade arqueológica e a salvaguarda do património arqueológico em avaliação de impacte ambiental

July 6, 2017 | Autor: Gertrudes Branco | Categoria: Archaeology, Environmental Impact Assessment, Preventive Archaeology
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Arqueología y Prehistoria del Interior Peninsular

02

2015

ARPI 02

Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

Publicación Anual: 2015 ISSN: 2341-2496 Dirección: Primitiva Bueno Ramírez (UAH) Subdirección: Rosa Barroso (UAH) Consejo editorial: Manuel Alcaraz (Universidad de Alcalá); José Mª Barco (Universidad de Alcalá); Cristina de Juana (Universidad de Alcalá); Mª Ángeles Lancharro (Universidad de Alcalá); Estibaliz Polo (Universidad de Alcalá); Antonio Vázquez (Universidad de Alcalá); Piedad Villanueva (Universidad de Alcalá). Comité Asesor: Rodrigo de Balbín (Prehistoria-UAH); Margarita Vallejo (Historia Antigua- UAH); Lauro Olmo (Arqueología- UAH); Leonor Rocha (Arqueología – Universidade de Évora); Enrique Baquedano (MAR); Luc Laporte (Laboratoire d'Anthropologie, Université de Rennes); Laure Salanova (CNRS). Edición: Área de Prehistoria (UAH)

SUMARIO Editorial 04-13 Arqueologia Profissional versus Arqueologia de Investigação: a situação portuguesa. Rocha, Leonor 14-31 A atividade arqueológica e a salvaguarda do patrimonio arqueológico em avaliação de impacte ambiental. Branco, Gertrudes 32-50 Los espacios divulgativos del patrimonio arqueológico de la comunidad de Madrid: el Plan de yacimientos visitables. Hernández Garcés, Carlos 51-67 Las Navas de Tolosa: Musealizando su campo de batalla. Ramírez Galán, Mario 68-89 Regreso a la cueva de Los Casares (Guadalajara). Un nuevo proyecto de investigación para el yacimiento del Seno A. Alcaraz-Castaño, Manuel; Weniger, Gerd-Christian; Alcolea, Javier; de Andrés- Herrero, María; Baena, Javier; de Balbín, Rodrigo; Bolin, Viviane; Cuartero, Felipe; Kehl, Martin; López, Adara; López-Sáez, Jose Antonio; Martínez-Mendizábal, Ignacio; Pablos, Adrián; Rodríguez-Antón, David; Torres, Concepción; Vizcaíno, Juan e Yravedra, José. 90-107 Manifestaciones gráficas en la Cueva-Sima del Castillejo del Bonete (Terrinches, Ciudad Real). Polo Martín, Estíbaliz; Bueno Ramírez, Primitiva; Balbín Behrmann, Rodrigo; Benítez de Lugo Enrich, Luís y Palomares Zumajo, Norberto 108-132 Viviendas del Bronce Final e inicios de la Edad del Hierro en la Cuenca Superior del Tajo . Coroba Peñalver, Juan Ramón 133-145 Paisaje visigodo en la cuenca alta del Manzanares (Sierra de Guadarrama): Análisis arqueopalinológico del yacimiento de Navalvillar (Colmenar Viejo, Madrid). López Sáez, Jose Antonio; Pérez Díaz, Sebastián; Núñez de la Fuente, Sara; Alba Sánchez, Francisca; Serra González, Candela; Colmenarejo García, Fernando; Gómez Osuna, Rosario y Sabariego Ruiz, Silvia. 146-164 El Proyecto de investigación “ Los paisajes culturales de la ciudad de Toledo: Los Cigarrales”. Criterios de actuación y metodología de trabajo Carrobles Santos, Jesús; Morín de Pablos, Jorge; Rodríguez Montero, Sagrario y Sánchez Ramos, Isabel M.

A ATIVIDADE ARQUEOLÓGICA E A SALVAGUARDA DO PATRIMONIO ARQUEOLÓGICO EM AVALIAÇÃO DE IMPACTE AMBIENTAL Gertrudes Branco (1)

Resumo A prática arqueológica em Portugal conheceu, nos últimos anos do séc. XX, um importante desenvolvimento, que inverteu a polaridade das intervenções do campo da investigação científica, efetuada preferencialmente em meio académico, para o domínio das ações preventivas e de salvaguarda exercidas de forma liberal. Muitas destas ações são potenciadas pelo cumprimento das exigências decorrentes da aplicação da legislação de avaliação de impacte ambiental, sejam prospeções arqueológicas efetuadas no âmbito da caracterização do património arquitetónico e arqueológico afeto a áreas de projeto, seja o acompanhamento arqueológico da sua execução, ou a realização de registos, sondagens ou escavações arqueológicas de minimização. O conhecimento adquirido encontra-se comprometido pela ausência de metodologias e conceitos uniformes, que comprometem a utilidade e eficácia dos dados registados.

Palavras chave: Avaliação de Impacte Ambiental, Arqueologia, Arqueologia Preventiva e de Salvaguarda.

Abstract The archaeological practice in Portugal met, in the last years of the century. XX, an important development, which reversed the polarity of interventions in the field of scientific research, preferably carried out in academia, in the field of preventive and safeguard actions exercised liberally. Many of these actions are underpinned by compliance with the requirements arising from the enforcement of environmental impact assessment, archaeological surveys are carried out as part of the characterization of the architectural and archaeological heritage affect the project areas, is the archaeological monitoring of its execution or performance records, surveys or excavations minimization. The knowledge gained is compromised by the lack of uniform methodologies and concepts that undermine the usefulness and effectiveness of the recorded data.

Key words: Environmental Impact Assessment, archaeological, Preventive Archaeology and Safety .

(1)

[email protected] CHAIA/ Universidade de Évora (Portugal) ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

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“La EIA es un procedimiento jurídi-

Em Portugal, a transposição da diretiva

co-administrativo que tiene por objetivo la identifica-

comunitária para o regime jurídico nacional

ción, predicción e interpretación de los impactos am-

ocorreu em 1990, com a publicação do Decreto-Lei

bientales que un proyecto o actividad produciría en

n.º 186/90, de 6 de junho e do Decreto

caso de ser ejecutado, así como la prevención, co-

Regulamentar n.º 38/90, de 27 de novembro. Estes

rrección y valoración de los mismos, todo ello con el

determinam que estudo de impacte ambiental

fin de ser aceptado, modificado o rechazado por par-

deve ser elaborado tendo em consideração a

te de las distintas Administraciones Públicas compe-

situação de referência do património arqueológico

tentes” (Conesa Fdez.-Vítora, 2010: 75) .

e arquitetónico, determinando as incidências e medidas mitigadoras relativas a “alterações do

O procedimento de avaliação de impacte

património cultural e/ou dos patrimónios construídos

ambiental foi incorporado no Direito Comunitário

e arqueológicos e qualquer ação que afete os usos e

através da publicação (Jornal Oficial nº L 175 de

costumes locais e regionais”.

05/07/1985 p. 0040 – 0048) da Diretiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de junho de 1985, relativa à

Ao longo dos anos as alterações legislativas

avaliação dos efeitos de determinados projetos

restringiram o âmbito das componentes culturais

públicos e privados no ambiente.

consideradas pelo estudo de impacte ambiental. Em contraponto, solicitam a participação inter-

Esta representou a oportunidade de generalizar, entre os diferentes países europeus

ventiva dos organismos governamentais com competências na sua salvaguarda.

(Estados-membros), a prática de uma política ambiental fundamentada na avaliação técnica e

A legislação atual – Decreto-Lei n.º 151-

científica dos projetos de maior relevância

B/2013, de 31 de outubro – determina a caracte-

económica, com a possibilidade de auscultar,

rização dos fatores ambientais suscetíveis de

através de Consulta Pública, a opinião da

serem consideravelmente abrangidos por um

população interessada na implementação das

projeto, onde

propostas apresentadas. Esta interação resulta

património arquitetónico e arqueológico.

se

inclui, exclusivamente, o

potencialmente benéfica para a salvaguarda do ambiente e para o incremento e divulgação do conhecimento científico.

Este normativo estabelece igualmente que a Comissão de Avaliação dos projetos deve ser constituída por uma equipa interdisciplinar,

Desde a sua fase inicial, este normativo

composta, entre outros, por um representante da

advoga a integração da componente ambiental

entidade com competências em matéria de gestão

humana no procedimento de avaliação de impacte

do património arqueológico e arquitetónico,

ambiental, requerendo a identificação, descrição e

sempre que o projeto possa afetar valores

avaliação dos efeitos do projeto sobre o

patrimoniais, ou se localize em zonas definidas

património cultural.

como sensíveis, nos termos da legislação aplicável ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

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às áreas de proteção dos monumentos nacionais e

1.- ATIVIDADE ARQUEOLÓGICA

dos imóveis de interesse público. Um estudo recente (Branco, 2014) com Ao benefício de salvaguarda, potenciado

base em documentação produzida, no âmbito de

pela legislação ambiental, acresce o contributo da

79 projetos localizados no Alentejo Central, sub-

legislação patrimonial específica.

metidos a avaliação de impacte ambiental entre 1995 e 2008, demonstraram a importância deste

O decreto que regulamenta a atividade arqueológica em território nacional insere na

procedimento no desenvolvimento da atividade arqueológica e na salvaguarda patrimonial.

categoria de trabalhos arqueológicos: “todas as ações que visem a deteção, o estudo, a salvaguarda

A legislação produzida em matéria de

e valorização dos bens do património arqueológico

avaliação de impacte ambiental estabelece o

usando métodos e técnicas próprios da arqueologia

conteúdo mínimo das matérias a versar pelo

(…) nomeadamente prospeções, ações de registo,

estudo de impacte ambiental – a fauna, a flora, o

levantamentos (…)” (art. 2.º, Decreto-Lei n.º

solo, a água, a atmosfera, a paisagem, os fatores

270/99, de 15 de julho).

climáticos,

o

património

arquitetónico

e

arqueológico e a paisagem – contudo, é omissa Estes

trabalhos,

imprescindíveis

na

quanto à autoria dos estudos produzidos.

elaboração do conteúdo patrimonial a constar do relatório síntese do estudo de impacte ambiental,

Em 1995 um artigo de fundo produzido

são obrigatoriamente dirigidos por arqueólogos e

sobre a avaliação de impacte ambiental e o

carecem de autorização por parte do organismo

património cultural (Raposo, 1995) referia que,

competente na administração do património

num conjunto de 198 estudos realizados a nível

cultural (Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro).

nacional, apenas

24

(12,1%)

registaram

a

participação de arqueólogos, 10 de historiadores A caracterização, avaliação e minimização

(5%) e 6 antropólogos (3%).

patrimonial, requerida pela legislação ambiental, a possibilidade interventiva da tutela no procedi-

Nos restantes estudos de impacte ambien-

mento de avaliação de impacte ambiental,

tal, a caracterização do património arquitetónico e

conjugada com a legislação patrimonial específica,

arqueológico foi efetuada por profissionais sem

resultam numa conjugação de fatores legais,

formação específica nas matérias abordadas.

fundamentais para a salvaguarda do património arqueológico e para o incremento da atividade arqueológica em território nacional.

A fiscalização sistemática do cumprimento da definição e autoria legal de todos os trabalhos arqueológicos foi assumida de forma veemente pelo Instituto Português de Arqueologia (criado, em 1997), o qual chama sucessivamente a atenção

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das diferentes comissões de avaliação para as

Central, entre 2000 e 2008, cerca de 88%

situações de incumprimento.

apresentava um, ou mais, arqueólogos na constituição da sua equipa técnica. Os restantes

Este posicionamento institucional, reforçado pelos requisitos ambientais, possibilitados

12% mereceram a desconformidade ou foram reformulados a pedido da Comissão de Avaliação.

pela publicação do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de maio, de acordo com a qual: “A equipa deve ser

Na prática, atualmente, a articulação

pluridisciplinar, o que significa que devem ser diver-

institucional entre património e ambiente, supor-

sas as disciplinas (especialidades) envolvidas no EIA,

tada pela legislação existente, não permite que

em função das questões relevantes a abordar (…)

seja declarada a conformidade de um estudo de

devendo esta natureza interdisciplinar refletir-se no

impacte ambiental, sem que a componente patri-

resultado final do EIA.” (Partidário e Pinho, 2000:

monial se encontre subscrita por um arqueólogo.

13-14), garantiram as condições necessárias para o incremento significativo da participação dos

Esta especificidade coloca o arqueólogo

arqueólogos na redação do estudo de impacte

entre os profissionais com maior representação

ambiental.

nos estudos de impacte ambiental (Fig. 1), só precedido pelos engenheiros do ambiente, no

Dos 58 estudos de impacte ambiental relativos a projetos apresentados para o Alentejo

conjunto das equipas formadas, em média, por 9 profissionais de distintos setores de atividade.

Eng. Ambiente 100

99

Arqueólogo Biólogo

90

Geólogo 80

Arqto. P aisagista

77

Geógrafo

70

Eng. Biofísico

60 50 40

Eng. Minas

54

P sicólogo

43

Lic. Ciências Ambiente

43

30 20 10

19

17

15

12

12

0

Fig. 1 - Contabilização das 10 profissões com maior representação nas equipas técnicas dos EIA analisados (Alentejo Central 2000-2008). ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

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A Fig. 1 representa, simultaneamente, o

gestão territorial. Esta recolha de informação,

posicionamento dos arqueólogos no conjunto dos

nalguns casos, surge acompanhada pela referência

profissionais contribuintes para o estudo de

a “visita ao local e inquérito oral” ou substituída pela

impacte ambiental e atesta o cumprimento da

consulta aos inventários patrimoniais.

interdis-ciplinaridade requerida pela legislação ambiental.

Esta prática confirma o escrito por Jorge Raposo (1995), segundo o qual apenas 12,6% dos

Na totalidade dos 79 estudos analisados

estudos de impacte ambiental, elaborados até

(Branco, 2014) registamos a representação de 32

1995, utilizam simultaneamente três tipos de

setores de atividade, resultantes do facto de,

fonte: consulta institucional, trabalho de campo e

contrariamente à componente patrimonial, existir

pesquisa documental.

maior flexibilidade na relação entre a temática ambiental e a formação académica do subscritor. A

A ausência de um técnico especializado

título de exemplo, a fauna e a flora aparecem

registou consequências ao nível da qualidade dos

caracterizados

estudos efetuados, com repercussões ao nível da

por

engenheiros

biofísicos,

engenheiros silvicultores ou biólogos.

salvaguarda patrimonial: “como curiosa coincidência (!?), verifica-se que todos os estudos elaborados

Esta versatilidade transparece, igualmente, na

coordenação

impacte

composição técnica mas onde esta não registou a

ambiental, assumida por profissionais de distintas

presença de arqueólogos, historiadores ou antropó-

áreas

minas,

logos, também não se identificaram quaisquer

engenheiros do ambiente, arquitetos paisagistas e

vestígios patrimoniais na área de influência da

sociólogos, por exemplo – com responsabilidade,

obra” (ibidem: 69).

científicas

dos



estudos

de

por equipas em que se conhece algo da sua

engenheiros

de

ou não, na caracterização de algum descritor ambiental específico.

Esta afirmação é replicável para o nosso período e área de estudo. Apenas para citar dois exemplos: na área de afetação do projeto do

2. CARACTERIZAÇÃO PATRIMONIAL

Mercado Abastecedor da Região de Évora, a equipa técnica não contou com a presença de um arqueó-

Como já tivemos oportunidade de referir,

logo, como resultado a caracterização da situação

numa fase inicial, a caracterização do património

de referência patrimonial não identificou, pela

arqueológico era efetuada maioritariamente, por

consulta ao Plano Diretor Municipal de Évora ou ao

profissionais indiferenciados. Nesta fase, a caracte-

IPPAR, qualquer elemento patrimonial. Em fase de

rização do descritor património era fundamentada

consulta pública, o IPPAR emite parecer quanto à

através da consulta às entidades oficiais –

necessidade de se efetuarem prospeções arqueoló-

autarquias

complementada,

gicas em fase de estudo, das quais resultou a

pontualmente, pela análise dos instrumentos de

identificação de quatro ocorrências patrimoniais,

e/ou

tutela



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duas das quais na área de afetação do projeto.

b. Procedimentos estabelece

Igualmente, a caracterização da situação de referência

do

projeto

do

metodológicos

os

parâmetros

comuns:

metodológicos

mínimos a adotar para cada fase de projeto,

Aproveitamento

com recomendações ao nível da identificação,

Hidroagrícola da Defesa da Pedra Alçada, não

avaliação de impactes e propostas de medida

contou com a colaboração de um técnico especiali-

de minimização;

zado, sendo referida a consulta à “Carta Arqueoló-

c. Procedimentos

metodológicos

específicos:

gica do Alandroal”, através da qual se antecipa a

estabelece os critérios relativos à prospeção

riqueza patrimonial da área envolvente ao projeto.

arqueológica, a cumprir de acordo com cada

A Comissão de Avaliação condiciona o licencia-

tipologia e fase de projeto;

mento do projeto à apresentação de um docu-

d. Relatório: estabelece o conteúdo mínimo do

mento comprovativo da realização de trabalhos de

relatório, a submeter à apreciação da tutela,

prospeção na área a inundar, na área a irrigar e na

como complemento ao exigido pelo Regula-

área abrangida pelos riscos de rutura da barragem,

mento de Trabalhos Arqueológicos.

os quais permitiram a identificação de seis sítios arqueológicos (três dos quais inéditos).

A

metodologia

veiculada

não

trás

novidades ao nível das técnicas propostas, quando Consciente desta realidade, a tutela tomou

comparada com as práticas vigentes à data da sua

a opção de regulamentar sobre a metodologia a

publicação, apenas estabelece parâmetros de

utilizar na elaboração do descritor património

conjugação mínima obrigatória para a sua

arqueológico, emitindo a circular “Termos de

aprovação pela tutela.

Referência para o Descritor Património Arqueológico em Estudos de Impacte Ambiental” (IPA, 2004), que se mantém em vigor.

Quando

quantificamos

as

técnicas,

constante dos estudos de impacte ambiental analisados pelo nosso estudo, não obstante as

Esta Circular pode ser dividida em 4 partes

imposições tutelares, constatamos que estas

complementares:

fazem recurso fundamental a quatro tipos de

a. Enquadramento legal: articula a legislação

fontes de informação: cartográfica, bibliográfica,

referente

à

salvaguarda

do

património

institucio-nal e prospeção arqueológica superficial.

arqueológico, com os decretos referentes ao procedimento

de

avaliação

de

impacte

Estas, na sua maioria fontes de informação

ambiental, de modo a justificar o facto do

secundárias, são utilizadas para identificar a

descritor património arqueológico só poder ser

presença e/ou ausência de vestígios arqueológicos,

efetuado por um arqueólogo, acrescentando a

coincidentes com as áreas submetidas a projeto,

pretensão da tutela de que o conteúdo dos

para

relatórios só integre o EIA e/ou RECAPE depois

arqueológica.

posterior

relocalização

em

prospeção

de legalmente aprovados; ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

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O recurso a fontes de informação primária – análise cartográfica, fisiográfica e toponímica –

indícios, enquanto áreas de potencial interesse arqueológico.

que apontam para indícios que carecem de interpretação são residuais no conjunto analisado e, frequentemente,

utilizadas

para

o

Não basta referir na metodologia a

estrito

realização de análise toponímica, ou fisiográfica da

cumprimento da Circular vigente, subestimando-

cartografia, é necessário aliar esta informação ao

se o seu valor enquanto indicadores de áreas de

conhecimento dos padrões de ocupação humana

potencial arqueológico.

do território, obtidos a partir do conhecimento bibliográfico. Estes devem ser representados

Uma

das

na

cartograficamente e fundamentados em relatório,

referência

explicitando-se quais os resultados expectáveis e

patrimonial advém do facto das técnicas serem

quais os resultados obtidos no decurso dos

executadas de forma isolada, não perfazendo uma

trabalhos de campo.

caracterização

principais

da

situação

fragilidades de

metodologia conjunta que transmita o conhecimento patrimonial sobre a área de projeto, que vá

É necessário mudar o paradigma da

além da constatação da presença ou ausência de

caracterização da situação de referência, no qual

ocorrências patrimoniais.

as condições de visibilidade dos solos, aquando da prospeção arqueológica, representam um dos

O sim/não de uma existência desprovida de

maiores condicionalismos ao conhecimento.

uma interpretação que a fundamente é um trabalho técnico, com possíveis consequências

Em avaliação de impacte ambiental, aos

onerosas para o património e para a execução do

arqueólogos é expetável mais de que um trabalho

projeto, que não cumpre os objetivos básicos do

técnico, não por ser o seu dever como cientistas,

procedimento de avaliação.

mas porque a sua competência na análise e interpretação dos dados pode acarretar consequências

A identificação, predição e avaliação de impactes deve considerar a natureza específica do património

arqueológico,

nomeadamente,

danosas para a proteção e salvaguarda do património, e onerosas para a execução do projeto.

a

existência de áreas de potencial, nas quais não se identificam

vestígios

superficiais,

mas

cuja

Este

potencial

interpretativo

permite

desvalorizar a importância arqueológica dos vestí-

existência se antecipa pela conjugação de

gios

diferentes fontes e técnicas metodológicas.

assumindo, por exemplo, o facto destes se

materiais

encontrados

em

prospeção,

encontrarem em posição secundária, em resultado A natureza do património arqueológico e

de eventual lavouras e arrastamentos sedimen-

os objetivos de salvaguarda do procedimento de

tares. O mesmo pode fundamentar a importância

Avaliação

tornam

patrimonial de áreas sem vestígios materiais

necessário que se analise, verifique e fundamente

visíveis, que repetem padrões de povoamento

de

Impacte

Ambiental,

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conhecido na região e cuja existência é firmada

3. O REGISTO ARQUEOLÓGICO

por indícios credíveis. Por registo arqueológico entende-se as É a fundamentação científica, resultante

ações de identificação, caracterização e valoriza-

da aplicação das técnicas metodológicas e a sua

ção das ocorrências patrimoniais, efetuadas no

interpretação, que deve encontrar-se expressa na

âmbito do procedimento de avaliação de impacte

caracterização

ambiental.

da

situação

de

referência

patrimonial e não a constatação da presença/ ausência de materiais arqueológicos, fundamen-

Neste contexto, é expetável que o registo

tados pelas condições de visibilidade de solos,

arqueológico forneça as informações necessárias

como acontece na maioria dos casos analisados.

para possibilitar à Comissão de Avaliação e à tutela tomar decisões relativas à salvaguarda dos

Esta proposta não implica, necessariamente, uma alteração das técnicas metodológicas

elementos patrimoniais existentes na área de incidência direta e indireta de um projeto.

praticadas, ainda que as tecnologias associadas aos sistemas de informação geográficas (SIG)

Para além deste objetivo específico, não é

sejam uma ferramenta de análise cada vez mais

de somenos importância o facto do registo

indispensável: implica uma maior responsabili-

arqueológico, efetuado no âmbito dos trabalhos

dade do arqueólogo na seleção e fundamentação

de

dos critérios subjacentes à identificação de sítios

arquitetónico e arqueológico, se constituir como

arqueológicos e de áreas de sensibilidade

uma das principais fontes de alimentação da base

arqueológica.

de dados – Endovélico -disponibilizada on-line

caracterização

do

descritor

património

através do Portal do Arqueólogo pela DGPC. Esta é uma responsabilidade que deve ser partilhada com a tutela e prende-se com a nece-

Esta, para além de outras funcionalidades,

ssidade de se manterem bases de dados eficazes e

serve de base à elaboração das plantas de

atualizadas, de se publicarem sínteses de

património, consideradas e regulamentadas no

conhecimento que, para além do julgo histórico-

âmbito da elaboração dos diferentes planos de

culturalista centrado na análise e recolha de

ordenamento do território.

vestígios materiais, perspetivem o território enquanto espaço cénico onde, ao longo dos tempos, decorreu a ação humana.

Neste contexto, é importante ponderar o que registamos e como registamos, porque a informação não se esgota no cumprimento de um

Quanto

maior

e

melhor

for

o

conhecimento sobre uma determinada região,

objetivo específico, perdura enquanto fonte de conhecimento disponível.

maior e melhor será a salvaguarda das ocorrências patrimoniais afetas à execução de um projeto.

Sobre esta matéria, o conceito e âmbito ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

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legal da definição de património arqueológico, que

definindo sítio arqueológico como “una agrupación

transcreve na íntegra a definição assumida pela

espacialmente definida y funcionalmente significa-

Convenção

do

tiva de vestígios materiales de atividades humanas

Património Arqueológico (1997), considera todos

deserrolladas en el Pasado” (Garcia Sanjuán, 2005:

os vestígios, bens e outros indícios, cujo conteúdo

24).

Europeia

para

a

Proteção

permita traçar a história da humanidade, através da aplicação de metodologia arqueológica.

Existem locais com vestígios materiais que não

poderão

ser

designados

como

sítios

Deste modo, a lei admite que a caracterís-

arqueológicos, porque nunca o foram e os

tica potenciadora do património arqueológico não

materiais identificados resultam de deposições

reside na natureza do objeto mas no seu conteúdo

secundárias, ou porque um dia o foram mas

histórico e nos métodos de pesquisa utilizados.

devido a ações antrópicas e/ou pós-deposicionais (erosão, transporte de sedimentos, etc…), não

Na ausência de critérios legais que definam

preservam contextos ou estruturas significantes.

a atribuição de um interesse cultural arqueológico relevante, é enorme a responsabilidade do

Não é fácil acomodar sob uma única

arqueólogo e da tutela. O primeiro tem a

designação – sítio arqueológico – a diversidade

competência para determinar, de entre um vasto

abarcada pela realidade arqueológica, tanto mais

conjunto de vestígios, aqueles que permitem tra-

quando esta resulta de ações de prospeção super-

çar a história da humanidade através da aplicação

ficial, para a qual é imperativo decidir sobre a

de metodologia arqueológica, designando-os

aplicação de medidas de salvaguarda, perante a

“património arqueológico”. À tutela compete

sua eminente destruição pela obra de execução de

assegurar a salvaguarda e preservação desses

um projeto. Sobre esta matéria refletem um

vestígios, de uma forma preventiva ou mitigadora.

conjunto alargado de base de dados divulgadas por alguns dos principais países europeus (Kuna,

São necessários os vestígios materiais da ação humana, o contexto espacial onde se produ-

2002; Cottenceau e Hannois, 2001; Fernández Cacho, 2008).

ziu a ação e a sua interpretação, para se escrever a História. Assim, a definição de património

Estas categorizam a realidade arqueoló-

arqueológico é indissociável do conceito de sítio

gica, distinguindo “sítio arqueológico”, de “vestígios

arqueológico, porque é escasso o conhecimento

arqueológicos”, das “evidências arqueológicas” ou

que advém do objeto isolado.

dos “achados isolados” que, em diferentes linguagens, são sinónimos para áreas de potencial

Sobre o conceito de sítio arqueológico

arqueológico. Estas categorias registam locais

recomenda-se a leitura de Garcia Sanjuán (2005),

onde se identificaram vestígios de natureza

na qual o autor após comentar algumas definições

arqueológica, para os quais é necessária a realiza-

constantes da bibliografia especializada, conclui

ção de trabalhos arqueológicos de diagnóstico

ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

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para compreender a sua significância contributiva

a possível existência de uma ocupação humana

para a história da humanidade.

pretérita, através da identificação superficial de vestígios materiais (artefactos).

Em Portugal, a existência de uma base de dados tutelada que permite que se unifique, sob a categoria de “Sitio Arqueológico”, um conjunto

a. Achado isolado – artefacto desassociado de outros indícios arqueológicos;

diversificado de dados arqueológicos, minimiza a

b. Vestígios dispersos – área de dispersão

importância dos indícios bibliográficos, valoriza as

superficial de vestígios materiais (artefactos),

observações empíricas, desvaloriza a importância

identificados

dos sítios arqueológicos enquanto recetáculos de

arqueológica, cuja conjugação de indícios não

informação histórica, e acarretam consequências

permite

ao nível da avaliação de impacte ambiental.

cronológica credível;

através

uma

c. Documental Em avaliação de impacte ambiental esta

de

atribuição



prospeção

funcional

inventariação

arqueológicos

resultante

de

da

ou

sítios

consulta

hierarquização é importante: não se deve

bibliográfica, fontes documentais, análise

identificar, valorizar e minimizar, de igual forma, o

cartográfica, toponímica, entre outras, as

que é património e o que tem potencial para o ser.

quais não foram confirmadas no decurso do trabalho de campo.

A legislação exige a caracterização, avalia-

d. Sítio arqueológico – Conjugação espacialmente

ção e minimização dos impactes de um projeto

definida e funcionalmente significativa de

sobre o património arqueológico, enquanto

vestígios materiais de atividades humanas

conjunto significante de vestígios de ações huma-

pretéritas,

nas pretéritas. Contudo, a natureza do património

fundamentalmente do uso de metodologia

arqueológico (p.e. depósitos estratificados), nem

arqueológica

sempre torna percetível a sua importância através

Fernández Cacho, 2008). Neste incluímos

da prospeção arqueológica superficial, principal

tipos como sejam: anta, necrópole, habitat,

método de investigação utilizado na caracteriza-

entre outros.

cuja

interpretação

(Garcia

Sanjuán,

depende

2005;

ção do descritor património arquitetónico e arqueológico.

No conjunto dos 79 estudos de impacte am -biental

No âmbito da nossa investigação (Branco, 2014), propusemos a categorização das ocorrên-

analisados,

inventariamos

1224

ocorrências patrimoniais, identificadas originalmente como “sítio arqueológico”.

cias arqueológicas em duas categorias e três subcategorias, de acordo com a natureza dos vestígios identificados:

A reorganização da informação compilada, tendo por base o conteúdo das descrições originais, concluiu pela existência de 834 indícios

Indícios arqueológicos – locais que indiciam

arqueológicos, 307 sítios arqueológicos e 13 não

ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

02– 2015

23

sítios, divididos por 22 tipos, maioritariamente inseridos

na

classe

de

“religioso, ritual e

Categoria Tipo Indícios arqueológicos Achado isolado

funerário” (59,6%) ou “doméstico” (32,5%).

Neste contexto importa ressalvar, que os

Sítio arqueológico

Quant. 66

Vestígios dispersos

476

Documental

292

Anta

106

dados compilados não resultam de observações

Aqueduto

3

próprias, dependem de trabalhos de campo e de

Arte rupestre

24

recolhas bibliográficas, feitas por distintos autores

Atalaia

5

que, dentro de um objetivo comum, descrevem de

Canalização

3

forma heterogénea um conjunto de ocorrências

Cromeleque

2

Fortificação

3

Fossa

3

patrimoniais, dificultando uma distinção credível entre

“indícios

arqueológicos”

e

“sítios

arqueológicos.

Ao

invertermos

a

polaridade

da

investigação partindo dos registos para os conceitos, ao invés dos conceitos para os registos, estamos necessariamente a incorrer em erros grosseiros de interpretação. Contudo, este é um aspeto que nos importa salientar.

No âmbito dos nossos objetivos não é relevante a assunção de um autor ao identificar uma “villa” romana, ou um “povoado” neolítico, a partir

Indeterminado

Habitat

100

Lixeira

1

Menir

14

Necrópole

10

Oficina

3

Povoado

10

Povoado fortificado

9

Sepultura

5

Silo

2

Villa

4

Não sítio

13

Tab. 1.- Contabilização das categorias e tipos arqueológicos inventariados

de um conjunto de vestígios materiais dispersos à superfície do terreno. Em causa não está a im-

legal da salvaguarda do conhecimento através do

portância desta identificação para a construção do

registo científico. Informatiza-se no presente a

conhecimento histórico-cultural de uma região.

informação, salvaguardada para conhecimento

Importa-nos o contributo dos estudos de impacte

futuro de uma realidade sacrificada no passado,

ambiental para a construção da memória futura e,

em prol da execução de um projeto.

desde logo, o que prevalece de conteúdo relevante nos registos produzidos, para além da interpretação efetuada pelos seus autores.

Ao reorganizarmos as informações disponibilizadas pelos registos patrimoniais, estas revelaram fragilidades dos conteúdos perpetuados,

A nossa base documental é composta pe-

carentes de critérios explícitos, de conceitos pré-

los registos da memória futura produzidos num

vios, de fundamentação, baseados em descrições

passado recente, fundamentados pelo princípio

sumárias e demasiado truncadas para permitir

ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

02– 2015

24

hoje, e amanhã, a sua utilidade como bases docu-

das para a realização de trabalhos arqueológicos

mentais para a construção do conhecimento.

nas últimas duas décadas (1990 a 2010), de acordo com os dados disponíveis no Arquivo da Arqueolo-

Não podemos dissociar o trabalho efetua-

gia Portuguesa.

do no âmbito dos estudos de impacte ambiental da produção científica, na qual a identificação

Importa ressalvar que os resultados apre-

(vestígios materiais) e a interpretação (tipo, cate-

sentados poderão registar alguma variabilidade

goria) devem ser exaustivamente fundamentadas

numérica que depende da organização e atuali-

num conhecimento que se pretende perpetuo à

zação da base de dados. Os mesmos são conside-

observação do seu autor.

rados suficientemente fiáveis para serem estatisticamente representativos a partir do ano de 2003,

A opção pela diferenciação dos registos em

data a partir da qual se processa o registo sistemá-

“indícios arqueológicos” e “sítios arqueoló-gicos”

tico das autorizações concedidas para a realização

prende-se também com a necessidade de afirmar,

de trabalhos arqueológicos.

perante a natureza específica do objeto e do método arqueológico, a importância dos indícios na salvaguarda do património arqueológico.

O ano de 1997 marca o início de um crescendo na arqueologia nacional, que se acentua fortemente em 2003 e se mantém em ascensão

Maria Cacheda Pérez (2004) salienta o valor destes registos, como forma de se proteger, de

constante até ao ano de 2007, como podemos constatar na Fig. 2.

modo amplo e assertivo, o património arqueológico, atribuindo importância não só aos sítios arqueológicos, como aos vestígios que têm potencial para o serem. Este potencial deve ser acautelado, quando aplicável, na definição de medidas de proteção específicas, servindo, simultaneamente, como uma referência importante ao acompanhamento arqueológico da empreitada.

Em números, registamos a realização de 199 trabalhos arqueológicos no ano de 1990, maioritariamente para a realização de escavações (110) e prospeções (21) concedidas ao abrigo de projetos de investigação (Categoria A). Em sete anos (até 1997) constata-se um aumento de cerca de 56% nos trabalhos arqueológicos autorizados. Neste ano começa a verificar-se uma inversão na Categoria dos trabalhos autorizados, tendência

4. AÇÕES PREVENTIVAS E DE EMERGÊNCIA

que irá marcar as décadas seguintes. A análise dos trabalhos arqueológicos motivados pelo procedimento de avaliação de impacte ambiental não se pode dissociar da análise sumária do contexto nacional, o qual é obtido tendo por base o volume de autorizações concedi-

A análise da Fig. 2 permite-nos entender que, com ligeiras alterações, as autorizações concedidas ao abrigo de projetos de investigação (Categoria A) conheceram um decréscimo cons-

ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

02– 2015

25

tante desde 2000, representando uma diminuição

C (50), definindo uma tendência que se irá acen-

de quase 70% até 2010.

tuar em crescendo na última década. Em 2010 o contributo dos projetos de investigação para a to-

Em contraciclo com esta diminuição dos projetos de investigação, regista-se o aumento

talidade da prospeção efetuada em território nacional é de apenas 2,7%.

exponencial das autorizações concedidas para a realização de trabalhos arqueológicos inseridos na

Esta tendência – decréscimo do contributo

Categoria C (prospeções e acompanhamento) e na

dos projetos de investigação para o panorama ar-

Categoria D (sondagens e escavações), associadas

queológico nacional – revela-se igualmente ao ní-

ao desenvolvimento de ações preventivas e de

vel das escavações arqueológicas, com o ano de

salvaguarda.

1997 a constituir-se como um marco na alteração de paradigmas. Neste ano, os trabalhos de esca-

Estes números assumem especial relevân-

vação arqueológica, efetuados no âmbito de proje-

cia a partir de 1999 quando o contributo percentual

tos de investigação, constituíam 35% da totalidade

dos projetos de investigação, para a totalidade dos

dos trabalhos autorizados, em contraponto com os

trabalhos de prospeção arqueológica realizados a

48,2% relativos a ações de emergência. Estes re-

nível nacional (27), é definitivamente ultrapassado

presentam apenas 3,3% no ano de 2010.

pelos trabalhos efetuados no âmbito de Categoria

Fig. 2 - Quantificação anual das autorizações concedidas para a realização de trabalhos arqueológicos por Categoria. Fonte: Endovélico. ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

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26

quando foi suplantado pela realização de escavações (Fig. 5).

Fig. 3 - Percentual anual das autorizações concedidas para a realização de trabalhos de prospeção arqueológica, inseridos na Categoria A (investigação) e Categoria C (ações preventivas). Fonte: Endovélico.

Fig. 5- Quantificação anual das autorizações concedidas para a realização de trabalhos de prospeção, acompanhamento e escavação arqueológica, inseridos na Categoria C (ações preventivas) e na Categoria D (ações de emergência). Fonte: Endovélico.

Em números, o acompanhamento arqueológico surge na nossa pesquisa a partir do ano de 1991, com 5 autorizações concedidas. Contudo, só a partir de 1998 adquire um caráter sistemático. Em 2002 as autorizações concedidas para a realização de acompanhamento arqueológico representam 29,2% da totalidade dos trabalhos autoriFig. 4 - Percentual anual das autorizações concedidas para a realização de trabalhos de escavação arqueológica, inseridos na Categoria A (PNTA) e Categoria D (ações de emergência). Fonte: Endovélico.

zados. Em 2010, este valor atinge 42,5%.

Apesar da Categoria B, de acordo com o disposto legal, se referir exclusivamente a ações de estudo e valorização de sítios ou monumentos

Paralelamente ao aumento dos trabalhos

classificados ou em vias de classificação, os dados

de prospeção e escavação, efetuados no âmbito

disponibilizados pelo Endovélico não nos permi-

das Categorias C e D, regista-se o aumento das

tem fazer a distinção entre sítios classificados e

autorizações concedidas para a realização de tra-

não classificados. Desta forma inserimos na Cate-

balhos de acompanhamento arqueológico.

goria B todas as autorizações registadas para valorização de sítios arqueológicos.

O acompanhamento arqueológico domina o número de autorizações concedidas a partir

Em contrapartida a um aumento exponen-

do ano de 2002, com exceção no ano de 2009,

cial dos trabalhos arqueológicos autorizados para

ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

02– 2015

27

as Categorias C e D (escavação, prospeção e acom-

dominar o panorama arqueológico nacional, resul-

panhamento) verificamos uma constante no nú-

tando na inversão da polaridade das categorias

mero de autorizações concedidas para a realização

associadas à realização de trabalhos arqueológicos

de ações de valorização. Esta constante traduz-se,

(Categoria A < Categoria C e D). Este paradigma foi

na globalidade das autorizações concedidas, numa

sendo paulatinamente reforçado pela adoção de

diminuição de 8% para 1,5% ao longo das últimas

legislação de matriz comunitária, que consolida a

duas décadas, revelando um desinvestimento nes-

importância do conhecimento arqueológico, seja

te setor por oposição ao crescimento das ações

em procedimentos de avaliação de impacte am-

preventivas e de emergência.

biental ou na elaboração de instrumentos de gestão e ordenamento territorial.

Estes números são significativos se considerarmos que as ações de valorização têm como

Reportando-nos exclusivamente à nossa

objetivo final a disponibilização dos sítios para

base documental, relativa ao Alentejo Central,

fruição pública. Cruzando este percentual de 1,5%

registamos 58 autorizações para a realização de

de autorizações concedidas no ano de 2010, com o

trabalhos arqueológicos, com vista à caracteri-

percentual de 31,3% correspondente às ações de

zação do descritor património arquitetónico e ar-

escavação arqueológica (Categoria A e D) autoriza-

queológico. Em fase de execução do projeto, fo-

das para o mesmo ano, verificamos um enorme

ram concedidas 17 autorizações para a realização

desfasamento entre o investimento efetuado em

de trabalhos de acompanhamento arqueológico, e

intervenções arqueológicas, valorização e disponi-

realizadas 203 ações de escavação/sondagem ar-

bilização de recursos.

queológica.

Da análise dos dados disponíveis, verificamos um aumento muito significativo das autori-

Contabilizadas as ocorrências patrimoniais identificadas por categoria:

zações concedidas pela tutela para a realização anual de trabalhos arqueológicos.

a. Categoria C

Em números, as autorizações registadas passam de 199 (ano de 1990) para 1561 (ano de

Prospeção arqueológica.i)

1537 ocorrências patrimoniais identificadas

2010), representando um aumento de 8 vezes nas

no decurso das prospeções arqueológicas,

últimas duas décadas, com uma média de 6 autori-

efetuadas no âmbito de 79 estudos de impac-

zações concedidas por dia útil no ano de 2010, das

te ambiental (1044 arqueológicas; 477 arqui-

quais apenas 5,5% se enquadram no âmbito de

tetónicas; e 16 indeterminados);

projetos de investigação/valorização.

ii)

711 (46,2%) ocorrências não foram alvo de medidas de minimização específicas por en-

Ao longo dos anos, a dinâmica criada pelo binómio [desenvolvimento + salvaguarda] passou a

cerramento, desconformidade, cancelamento e parecer desfavorável ao projeto;

ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

02– 2015

28

iii)

373 (24,3%) ocorrências não foram alvo de

e. Categoria D

propostas de minimização específicas, por Sondagens/escavação arqueológica.-

não serem afetadas pelo projeto; iv)

v)

vi)

143

(9,3%)

propostas

de

sondagens/

no âmbito da caracterização patrimonial

90 (5,8%) propostas de minimização específi-

dos projetos, e no decurso do acompanha-

ca (sondagens) sem registo de execução;

mento

67 (4,4%) medidas de minimização propostas

“preservação pelo registo científico”; ii)

arqueológico,

foram

alvo

de

78 (37,3%) dos sítios intervencionados não

sem registo de execução;

revelaram contextos ou estruturas conser-

66 (4,3%) ocorrências alvo de memória des-

vadas; iii)

critiva, e estudo monográfico;

tadas no decurso do acompanhamento ar-

18 (8,6%) dos sítios intervencionados revelaram-se “não sítios”;

viii) 55 (3,6%) propostas de minimização execuiv)

10 (4,8%) dos sítios intervencionados não têm resultados acessíveis;

queológico; ix)

209 ocorrências patrimoniais identificadas

escavações arqueológicas executadas;

a realizar no decurso do acompanhamento,

vii)

i)

14 (0,9%) ocorrências registadas em prospeção não localizadas em acompanhamento

v)

103 (49,3%) dos sítios intervencionados possibilitaram interpretação crono-funcional.

arqueológico, ou localizadas fora da área de Numa breve análise de eficácia verificamos

projeto; x)

xi)

12 (0,8%) medidas especificas não se efetua-

que das 55 ocorrências patrimoniais, registadas em

ram, por incumprimento na execução do

estudo de impacte ambiental sem referência a

acompanhamento arqueológico;

qualquer tipo de fonte bibliográfica e documental,

6 (0,4%) ocorrências preservadas in situ.

alvo de medidas de minimização específicas (escavação/sondagem), executadas no decurso da

Acompanhamento arqueológico.-

empreitada, apenas 11 (20%) revelaram contextos

i)

230 ocorrências patrimoniais identificadas no

ou estruturas arqueológicas preservadas, ainda

decurso de 17 trabalhos de acompanhamento

que na maioria das situações o diagnóstico efetua-

arqueológico (180 arqueológicas; 45 arquite-

do, com base nos vestígios de superfície, não co-

tónicas; e 5 indeterminadas);

rresponda ao registo de escavação.

ii)

140 (60,9%) sítios identificados em acompanhamento arqueológico, sem proposta

Esta eficácia sobe para cerca de 60% para

de medidas de minimização específicas;

os sítios referenciados previamente pela bibliogra-

9 (3,9%) sítios identificados e preservados in

fia e outras fontes de informação. Neste sentido, o

situ;

investimento

iv)

15 (6,5%) ações de registo específico;

efetuada ao abrigo de projetos de investigação, ou

v)

66 (28,7%) ações de sondagem/escavação

respondendo a requisitos específicos de autar-

arqueológica.

quias, releva-se uma mais-valia no âmbito da pre-

iii)

na

inventariação

arqueológica

ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

02– 2015

29

venção e salvaguarda arqueológica, revelando ní-

arqueológica e para a salvaguarda do património

veis de eficácia custo — benefício superiores aos

arqueológico.

adquiridos no âmbito do estudo de impacte ambiental.

A arqueologia preventiva e de emergência fundamentam-se pelo princípio legal da “conserva-

A eficácia mantém-se elevada (72,3%) nos

ção pelo registo científico”. É o registo científico que

sítios escavados, na sequência da sua identificação

sustenta a salvaguarda, a sua ausência representa

em acompanhamento arqueológico, constatando-

a conivência, do arqueólogo e da tutela, com uma

se uma grande assertividade entre diagnóstico

destruição

inicial e os resultados obtidos no decurso das esca-

remunerada.

arqueologicamente

assistida

e

vações. Contudo, os resultados obtidos registamse entre os menos reportadas à tutela, com relatórios que permanecem por entregar.

Se como refere António Valera (2007) os trabalhos arqueológicos desenvolvidos no âmbito da

Neste

capítulo,

das

209

caracterização

do

descritor

património

escavações

arquitetónico e arqueológico “são eminentemente

arqueológicas efetuadas, o Endovélico regista 153

técnicos e se traduzem essencialmente na aplicação

(73,2%) relatórios aprovados, 17 por entregar, 12

de normativos legislativos e protocolos metodo-

pendentes, e 27 sem registo de autorização. Estes

lógicos, adaptados à natureza e condicionantes de

valores percentuais aproximam-se dos indicados

cada projeto concreto” (Valera, 2007: 76), a

por Jacinta Bugalhão (2010) que aponta o facto das

minimização só faz sentido “se for enquadrada por

quase 8000 autorizações concedidas entre 2003 e

um questionário científico” (ibidem: 77).

2006, cerca de 35% não reportaram os resultados obtidos. Concorda-se com a autora quando esta re-

Neste pressuposto é extremamente difícil

fere: “não entregar relatórios de um trabalho

determinar o contributo das intervenções de

arqueológico realizado é guardar para nós o que não

minimização para a produção de conhecimento,

nos pertence e não cumprir o mínimo dos mínimos

considerando que os relatórios, quando entregues

das

para arquivo da tutela, são elaborados (na sua

nossas

obrigações

deontológicas

e

so-

ciais” (ibidem: 24).

grande maioria) com o objetivo de dar cumprimento aos requisitos técnicos constantes da legislação

A entrega e aprovação dos relatórios é uma das condições fundamentais para a concessão de

em vigor (art. 13, do Regulamento de Trabalhos Arqueológicos), que determinam a sua aprovação.

novas autorizações, de acordo com a legislação nacional (n.º 10, art. 5º do Regulamento de Traba-

Em minimização a prática arqueológica não

lhos Arqueológicos). O incumprimento desta

se pode consubstanciar numa técnica destinada à

premissa e a incapacidade da tutela em fazer

acumulação de dados “isentos” em nome de uma

prevalecer este artigo fundamental, acarreta

memória futura, da qual não antecipamos o nível

graves

de exigência e a adequação dos dados produzidos.

consequências

para

a

atividade

ARPI. Arqueología y Prehistoria del Interior peninsular

02– 2015

30

Parafraseando o slogan conhecido “o futuro é

Xunta de Galicia: 7-14.

hoje”, é hoje que temos de ser exigentes na

Fernández Cacho, S. 2008: Património arqueológico y

produção do conhecimento que justifica a discipli-

planificación territorial: estrategias de gestión para Andalucía. Junta de Andalucía y Universidad de Sevi-

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