A aura da arte em um friche industrielle: revitalização das Oficinas do Km 3, Santa Maria - RS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE TECNOLOGIA CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO

Clarissa Squizani Manske

A AURA DA ARTE EM UM FRICHE INDUSTRIELLE: REVITALIZAÇÃO DOS ESPAÇOS LIVRES DAS OFICINAS DO KM 3

Santa Maria, RS 2016

Clarissa Squizani Manske

A AURA DA ARTE EM UM FRICHE INDUSTRIELLE: REVITALIZAÇÃO DOS ESPAÇOS LIVRES DAS OFICINAS DO KM 3

Pesquisa de conclusão apresentada ao Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS) como requisito parcial para a obtenção do grau de Arquiteta e Urbanista.

Orientador: Ph.D.Luis Guilherme Aita Pippi

Santa Maria, RS 2016

Ficha catalográfica elaborada através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Central da UFSM, com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).

Squizani Manske, Clarissa A AURA DA ARTE EM UM FRICHE INDUSTRIELLE: REVITALIZAÇÃO DOS ESPAÇOS LIVRES DAS OFICINAS DO KM 3 / Clarissa Squizani Manske.-2016. 150 p.; 30cm Orientador: Luis Guilherme Aita Pippi Pesquisa (graduação) - Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Tecnologia, Curso de Arquitetura e Urbanismo, RS, 2016 1. paisagem urbana 2. paisagismo 3. revitalização 4. patrimônio ferroviário 5. friche industrielleI. Aita Pippi, Luis Guilherme II. Título.

________________________________________________________________________________ © 2016 Todos os direitos autorais reservados à Clarissa Squizani Manske. A reprodução em partes ou do todo deste trabalho só poderá ser feita mediante a citação da fonte. Endereço: Rua Venâncio Aires, 620/1501 Bairro Centro, Santa Maria, RS. CEP: 97010-00. Fone: (55) 9959-1560; E-mail: [email protected]

Clarissa Squizani Manske

A AURA DA ARTE EM UM FRICHE INDUSTRIELLE: REVITALIZAÇÃO DOS ESPAÇOS LIVRES DAS OFICINAS DO KM 3

Pesquisa de conclusão apresentada ao Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS) como requisito parcial para a obtenção do grau de Arquiteta e Urbanista.

Aprovado em 15 de julho de 2016

__________________________________ Luis Guilherme Aita Pippi, Ph.D. (UFSM) (Orientador)

__________________________________ Décio Bevilacqua, Dr. (UFSM)

Santa Maria, RS 2016

DEDICATÓRIA

Dedico, em primeiro lugar, ao meu pai Romeu e minha mãe Carmen, que já perguntam há algum tempo: e a formatura, quando sai? Dedico à minha namorada Ana, que esteve presente em toda a minha graduação, sempre estando ao meu lado e dizendo para seguir em frente quando o mundo parecia desmoronar, apoiando absolutamente tudo o que decidi fazer. Dedico a todos os mestres que tive durante minha trajetória. Vocês tem boa parte da responsabilidade por quem me tornei e onde cheguei. Meus sinceros agradecimentos. Dedico também aos sonhadores, àqueles que sonham com a paz , com a cidade bonita e que acreditam no amor. Dedico aos amantes da arte, que acreditam nela, que creem que ela torna o mundo um lugar mais agradável de se viver. Dedico àqueles que, assim como eu, sentem através da cor, parafraseando Henri Matisse.

AGRADECIMENTOS

A todos que, de alguma forma, contribuíram com o desenvolvimento deste trabalho. Obrigada, de coração. Aos meus pais, que me educaram e me ensinaram a sonhar e querer ser sempre alguém melhor. Ao meu irmão pelas caronas e as risadas na hora do jantar de todos os dias. À minha namorada Ana, por absolutamente tudo. Acredito que ninguém mais no mundo teria aguentado as crises de estresse como ela aguentou. Eu te amo imensamente. Ao meu amigo Francisco, minha inseparável companhia durante toda a graduação, em muitas noites de projeto, de festas e de conversas sobre a vida. Obrigada por ter te encontrado nessa vida. Ao meu orientador, professor Luis Guilherme Aita Pippi, por ter aceitado me orientar sem nem me conhecer e muito menos saber o que eu faria. Obrigada pela amizade, pela boa energia e pela empolgação e paixão pelas ideias. Aos professores do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFSM, pelos ensinamentos e aportes durante toda a minha formação. Aos colegas-amigos que estiveram comigo durante todos esses anos de faculdade. À oportunidade que tive de conhecer outras culturas e algumas partes do mundo, que despertou em mim os melhores sentimentos de inspiração e utopia, que me despertou o sentimento de me expressar através das cores de uma aquarela. Que me fez querer conhecer mais e mais. Á cidade de Roma, que foi minha casa por um ano, o mais inspirador da minha vida. Á arte, que me inspira todos os dias, em tudo que faço.

“Dizem que a paisagem é um ‘estado de alma’, mas isso ainda não é o suficiente. É preciso falar no plural para exprimir essa comunicação simpática e essa espécie de associação entre nós e a alma das coisas: a paisagem é um estado das almas.” GUYAU

RESUMO

A AURA DA ARTE EM UM FRICHE INDUSTRIELLE: REVITALIZAÇÃO DOS ESPAÇOS LIVRES DAS OFICINAS DO KM 3 AUTORA: Clarissa Squizani Manske ORIENTADOR: Luis Guilherme Aita Pippi Os vestígios históricos edificados de uma cidade são marcos de sua identidade e compõem o imaginário urbano, sendo merecedores de atenção para que sejam valorizados e conservados. O espaço das antigas Oficinas Ferroviárias do Km 3 é um importante componente da história ferroviária do município de Santa Maria, Rio Grande do Sul, e hoje encontra-se, em sua grande parte, em estado de degradação, onde aos poucos uma parcela valiosa da memória urbana é perdida. A alternativa proposta, a qual é o objetivo do presente trabalho, é de transformar área em um espaço livre público, que valorize o patrimônio edificado e gere um espaço de cultura e lazer, a fim de servir como um importante equipamento para a comunidade. Os espaços livres públicos são o palco das expressões culturais de uma cidade e neles ocorrem a convivência e a troca de experiências, conhecimentos e sensações, sendo esses fundamentais para a qualidade de vida urbana. Diante disso, a presente pesquisa reúne referenciais teóricos e projetuais como aportes à proposta, além de análises e diagnósticos da área de intervenção e seu entorno. Palavras-chave: Paisagem urbana. Paisagismo. Revitalização. Patrimônio ferroviário. Friche Industrielle.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Diagrama de localização do estado do Rio Grande do Sul no país, localização do município de Santa Maria no Estado, e, por fim, a localização do Distrito Sede no território do município, respectivamente. ....................................................................................................... 7  Figura 2 – Mapa das estradas de ferro existentes em 1930 no Brasil. ........................................ 9  Figura 3 – Mapa aproximado de todas as ferrovias brasileiras – antigas e recentes – inclusive as erradicadas............................................................................................................................ 10  Figura 4 - Mapa da situação das linhas ferroviárias no Estado do Rio Grande do Sul em 1965 e da situação atual, respectivamente............................................................................................ 10  Figura 5 - Presença da linha férrea e espaços adjacentes no município de Santa Maria. ......... 12  Figura 6 - Fragmento da lista de Patrimônio Cultural Ferroviário, de 15 de dezembro de 2015. Bens declarados com valor histórico, artístico e cultural da Lei nº 11.483/07 e da Portaria IPHAN nº 407/2010.................................................................................................................. 21  Figura 7 - Capa do livro Landscape Architecture of the Great Painters of Italy, de Meason, o qual popularizou o termo “arquitetura de paisagem”, e uma figura presente no livro, respectivamente. ....................................................................................................................... 30  Figura 8 - Diferentes ângulos do complexo SESC Pompéia, São Paulo. ................................. 32  Figura 9

- Vista aérea da Fábrica da Pompéia antes da reforma vista do seu interior,

respectivamente. ....................................................................................................................... 33  Figura 10 - Diferentes ângulos da via interna do SESC Pompéia. ........................................... 34  Figura 11 - Planta baixa do complexo SESC Pompéia. ........................................................... 34  Figura 12 - Estrutura metálica e cobertura com telhas de barro e vidro. .................................. 35  Figura 13 - Fotos dos ambientes e seus usos. ........................................................................... 35  Figura 14 - Elementos edificados do Parc de la Vilette. .......................................................... 36  Figura 15 - Implantação geral e esquema compositivo do Parc de la Vilette, respectivamente. .................................................................................................................................................. 38  Figura 16 - Ilustração dos folies. .............................................................................................. 39  Figura 17 - Folies. ................................................................................................................... 39  Figura 18 - Elementos e instalações do Parc de la Vilette........................................................ 40  Figura 19 - Vista geral do Conjunto KKKK. ........................................................................... 40  Figura 20 - Vista aérea do conjunto; vista geral e vista dos pavilhões, respectivamente. ........ 42  Figura 21 – Implantação do Conjunto KKKK.......................................................................... 42 

Figura 22 - Vistas do galpão transformado no Memorial da Imigração Japonesa. .................. 43  Figura 23 - Elementos edificados do Conjunto KKKK. .......................................................... 43  Figura 24 - Localização do bairro Km 3 em relação ao Distrito Sede do município de Santa Maria. ....................................................................................................................................... 44  Figura 25 - Imagens da etapa de construção das Oficinas do Km 3. ....................................... 45  Figura 26 - Imagens internas dos pavilhões, com destaque para a estrutura e iluminação natural. .................................................................................................................................................. 46  Figura 27 - Planta de zoneamento da área das Oficinas do Km 3. .......................................... 47  Figura 28 - Registros da situação de abandono e depredação dos pavilhões das Oficinas do Km 3................................................................................................................................................ 48  Figura 29 - A empresa Santa Fé Vagões já instalada e em funcionamento no espaço das antigas Oficinas do Km 3. .................................................................................................................... 49  Figura 30 – Implantação da área de intervenção...................................................................... 50  Figura 31 – Vista aérea do atual espaço das Oficinas do Km 3. .............................................. 51  Figura 32 – Passeio público e acesso principal às Oficinas, na Avenida Osvaldo Cruz. ........ 51  Figura 33 – Campo de futebol pertencente à ALL e Campo do Aliado, respectivamente. ..... 52  Figura 34 – Compilado de imagens dos pavilhões das Oficinas do Km 3............................... 53  Figura 35 – Compilado de imagens dos pavilhões das Oficinas do Km 3............................... 53  Figura 36 – Compilado de vistas da área das Oficinas do Km 3 a partir da área de moradias irregulares, nas proximidades da linha férrea. ......................................................................... 54  Figura 37 – Ilustração das fachadas do conjunto de pavilhões das Oficinas do Km 3. ........... 55  Figura 38 - Mapa dos Espaços Livres Intraurbanos Públicos de Santa Maria......................... 56  Figura 39 – Mapa de raios de abrangência dos espaços livres públicos do centro de Santa Maria. .................................................................................................................................................. 56  Figura 40 - Climatologia de Santa Maria, médias do período de 1961 a 1990........................ 58  Figura 41 - Macrozoneamento ambiental do Estado do Rio Grande do Sul............................ 60  Figura 42 - Modelo digital de elevação do perímetro urbano de Santa Maria. As numerações demarcadas na imagem correspondem, respectivamente, a: 1. Morro das Antenas; 2. Morro do Linck; 3. Morro Cechela; 4. Morro Cerrito; 5. Morro Mariano da Rocha............................... 60  Figura 43 - IDH no município de Santa Maria. ...................................................................... 61  Figura 44 - Gráfico de população x nº de domicílios, em 2010; e relação de porcentagem de população de mulheres e homens............................................................................................. 61  Figura 45 - Pirâmide etária da população do bairro Km 3 do município de Santa Maria. ...... 62 

Figura 46 - Localização da área de intervenção em relação à divisão em macrozonas do 1º Distrito; e localização da área de intervenção em relação ao mapa de zoneamento urbanístico. .................................................................................................................................................. 63  Figura 47 - Índices urbanísticos para a zona 6.c, macrozona B (Centro). ............................... 64  Figura 48- Índices urbanísticos para a zona 1-1.c, macrozona A (Corredor de Urbanidade). . 64  Figura 49 - Fragmento do Mapa de Operações Consorciadas de Realização Necessária, PDDUA. ................................................................................................................................... 65  Figura 50 – Mapa de hipsometria do Distrito Sede de Santa Maria com demarcação da área estudada. ................................................................................................................................... 67  Figura 51 – Mapa de declividade do Distrito Sede de Santa Maria com a área estudada demarcada. ................................................................................................................................ 67  Figura 52 - Mapa de aplicação da legislação ambiental, com destaque para o afastamento a ser respeitado (buffer) relativo à cada item. ................................................................................... 69  Figura 53 – Mapa de áreas verdes e recursos hídricos. ............................................................ 70  Figura 54 - Mapa de uso do solo em grandes áreas. ................................................................. 71  Figura 55 - Mapa de usos do solo por edificação. .................................................................... 72  Figura 56 - Mapa de hierarquia viária municipal com demarcação da área estudada. ............. 73  Figura 57 - Mapa das linhas de transporte público e paradas no entorno da área estudada demarcada. ................................................................................................................................ 74  Figura 58 – Compilado de mapas mentais feitos em conjunto com os questionários. ............. 77  Figura 59 – Compilado de mapas mentais feitos nas turmas de 1º e 2º ano............................. 78  Figura 60 - Elementos mencionados nos mapas mentais feitos na escola................................ 79  Figura 61 - Elementos mencionados nos mapas mentais feitos nos questionários. ................. 79  Figura 62 - Elementos mencionados em ambas aplicações. ..................................................... 79  Figura 63 – Questionário elaborado para análise qualitativa e quantitativa. ............................ 80  Figura 64 - Perfil dos entrevistados. ......................................................................................... 81  Figura 65 – Infográfico com resultados para os questionamentos sobre espaços público de lazer e atividades culturais e artísticas. ............................................................................................. 82  Figura 66 – Infográficos de resultados dos questionamentos sobre o contato com expressões artísticas, a existência de oficinas e ateliês, e feiras e comércio local...................................... 83  Figura 67 – Nuvem de palavras mencionadas em relação a atividades culturais e/ou artísticas que os entrevistados gostariam que existisse na região. ........................................................... 83  Figura 68 – Nuvem de palavras resultada do questionamento sobre o que representa a identidade do bairro Km 3.......................................................................................................................... 84 

Figura 69 – Infográfico sobre reconhecimento e uso do espaço das Oficinas do Km 3 e do Campo do Aliado. .................................................................................................................... 84  Figura 70 – Nuvem de palavras gerada a partir das palavras mencionadas pelos entrevistados sobre os significados e lembranças das Oficinas do Km 3. ..................................................... 85  Figura 71 – Nuvem de palavras gerada a partir das palavras citadas pelos entrevistados para definir o espaço das Oficinas do Km 3 em três palavras. ........................................................ 85  Figura 72 - Nuvem de palavras gerada a partir das palavras mencionadas pelos entrevistados sobre os significados e lembranças do Campo do Aliado. ....................................................... 86  Figura 73 - Nuvem de palavras gerada a partir das palavras citadas pelos entrevistados para definir o espaço das Oficinas do Km 3 em três palavras. ........................................................ 86  Figura 74 – Nuvem de palavras gerada a partir dos novos usos imaginados para a área das antigas Oficinas do Km 3 e Campo do Aliado......................................................................... 87  Figura 75 – Mapa síntese de pontos nodais e sensoriais. ......................................................... 89 

LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Cronograma de etapas do Trabalho Final de Graduação....................................... 14  Quadro 2 - Informações gerais sobre a obra do SESC Pompéia. ............................................. 32  Quadro 3 - Informações gerais sobre o Parc de la Vilette. ....................................................... 36  Quadro 4 - Informações gerais sobre o Conjunto KKKK. ....................................................... 40  Quadro 5 – Quadro resumo de problemas, objetivos, público alvo e diretrizes para a macroescala. ............................................................................................................................. 92  Quadro 6 - Quadro resumo de problemas, objetivos, público alvo e diretrizes para a mesoescala. .................................................................................................................................................. 93  Quadro 7 - Quadro resumo de problemas, objetivos, público alvo e diretrizes para a microescala. .................................................................................................................................................. 94 

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 3  1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA ........................................................................................ 3  1.2 OBJETIVOS ..................................................................................................................... 4  1.2.1 Objetivo geral ........................................................................................................... 4  1.2.2 Objetivos específicos ................................................................................................ 4  1.3 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................. 5  1.4 CONTEXTUALIZAÇÃO DA CIDADE DE SANTA MARIA ....................................... 7  1.5 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO - FERROVIÁRIA ............................................ 8  1.5.1 A ferrovia no Brasil e no Rio Grande do Sul ......................................................... 8  1.5.2 A Mancha Ferroviária em Santa Maria............................................................... 11  1.5 METODOLOGIA ........................................................................................................... 13  1.6 CRONOGRAMA ............................................................................................................ 14  1.7 RECURSOS .................................................................................................................... 14  2 APORTES TEÓRICOS ...................................................................................................... 15  2.1 PATRIMÔNIO ............................................................................................................... 15  2.2 PATRIMÔNIO INDUSTRIAL ...................................................................................... 16  2.3 FRICHE INDUSTRIELLE .............................................................................................. 17  2.4 DEFINIÇÕES E CONCEITOS LEGAIS ACERCA DO PATRIMÔNIO ..................... 19  2.5 A CIDADE ...................................................................................................................... 21  2.5.1 Limite de crescimento ............................................................................................ 23  2.6 O ESPAÇO LIVRE PÚBLICO....................................................................................... 25  2.7 A ARQUITETURA DA PAISAGEM ............................................................................ 28  3 ESTUDO DE REFERÊNCIAS ........................................................................................... 31  3.1 ESTUDO DE CASO: SESC POMPÉIA ........................................................................ 31  3.2 ESTUDO DE CASO: PARC DE LA VILETTE ............................................................ 36  3.3 OBRA DE REFÊNCIA: CONJUNTO KKKK ............................................................... 40 

4 LEITURA DO LUGAR ...................................................................................................... 44  4.2 O ESPAÇO DAS ANTIGAS OFICINAS DO KM 3 E A ÁREA DE INTERVENÇÃO .............................................................................................................................................. 50  4.3 EQUIPAMENTOS CULTURAIS E ESPAÇOS PÚBLICOS NA CIDADE DE SANTA MARIA................................................................................................................................. 55  4.4 ANÁLISE DE CONDICIONANTES ............................................................................ 57  4.4.1 Condicionantes físico – ambientais .......................................................................... 57  4.4.1.1 Clima .................................................................................................................... 58  4.4.1.3 Vegetação e Áreas de Preservação Permanente .................................................. 59  4.4.1.2 Relevo ................................................................................................................... 59  4.4.2 Condicionantes socioculturais .................................................................................. 61  4.5 CONDICIONANTES LEGAIS ..................................................................................... 62  4.5.1 Lei do Uso do Solo (LUOS) ................................................................................... 62  4.5.2 Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (PDDUA) ................. 65  4.6 ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS DA ÁREA DE INTERVENÇÃO E ENTORNO .............................................................................................................................................. 66  4.6.1 Topografia .................................................................................................................. 66  4.6.2 Incidência solar e ventos predominantes................................................................. 68  4.6.3 Vegetação e hidrografia ............................................................................................ 68  4.6.4 Usos ............................................................................................................................. 70  4.6.5 Mobilidade urbana ....................................................................................................... 72  4.7 METODOLOGIAS DE ANÁLISE SOCIOCULTURAL E ESPACIAL ...................... 74  4.7.1 Mapas mentais ....................................................................................................... 75  4.7.2 Questionários ......................................................................................................... 80  4.7.3 Fichamento/inventário .......................................................................................... 87  4.5 SÍNTESE DE RESULTADOS ....................................................................................... 88  5 PROPOSTA ......................................................................................................................... 90  6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 96 

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................... 97  APÊNDICE ........................................................................................................................... 102  ANEXOS ............................................................................................................................... 111 

3

1 INTRODUÇÃO

1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA A arte está fatalmente comprometida por uma sociedade que se estusiasma com ela só na sala de leilões e cuja lógica abstrata despoja o mundo de sua sensibilidade. Ela também está contaminada por uma ordem social para a qual a verdade não tem nenhuma utilidade, e valor significa a facilidade de ser vendido (EAGLETON, 2011, p. 40).

Com essa constatação, Eagleton explicita o afastamento da população das expressões artísticas, que acabam por tornar-se privilégio de apenas pequenos grupos sociais. Nós, que segundo Eagleton, somos seres culturais, temos a necessidade do contato com os anseios e impulsos artísticos que, por muitas vezes, servem para expressar os valores, as aspirações, os sonhos, as angústias e as formas de pensar dos grupos sociais. ( Eagleton, 2011). Disseminar a arte e a cultura para as grandes massas, as quais não possuem poder aquisitivo capaz de garantir acesso frequente a equipamentos culturais, requer um planejamento de estratégias para que sejam criadas novas possibilidades de acesso e contato. No âmbito urbano e paisagístico da cidade, o grande potencial cultural encontra-se nos espaços livres públicos. Estes são palco para qualquer forma de expressão, são a casa da vida coletiva e das trocas culturais e sociais. Segundo Jacobs (2011, p. 119), “a inserção espontânea da vida cultural faz parte da missão histórica das cidades”. Conforme Pippi: Os espaços livres podem apresentar uma identidade resultante da realidade dos diferentes elementos que os compõem (construídos e naturais), cuja natureza pode estar inter-relacionada com diversos fatores, tais como: conhecimento, identidade, jogo de interesse, importância e forma de aprovação (PIPI et al., 2011, p. 193).

Nesse sentido, destaca-se o conceito da materialização de um espaço público na área, que tornar-se-á um reflexo da identidade da região e do objetivo de funcionar como um equipamento cultural, caracterizando os elementos que o compõem. Pippi et al. (2011, p. 193) ainda afirmam que “os mesmos podem valorizar a paisagem natural e construída na cidade,

4 valorizando pontos estratégicos do cenário urbano, bem como promover a preservação e conservação dos recursos, reforçar as unidades de vizinhança e/ou fortalecer a identidade cultural local ou regional.”

Renovar e recuperar, tendo em mente as dimensões passadas e futuras de uma cidade, é outra forma de exercer a cidadania, no sentido em que, para morar em uma cidade, os seus habitantes devem ter o direito de usufruir esses diferentes tempos. O direito à cidade, fundamental naquilo que se considera cidadania é também um direito à história, à memória e à identidade (PESAVENTO, 2005).

Com isso em mente, o presente trabalho busca possibilitar o planejamento de um novo palco cultural, um espaço público de trocas de experiências, vivências e expressões para a cidade de Santa Maria, carinhosamente referida como cidade cultura. Planejamento esse que busca reavivar a alma da arte em um patrimônio urbano edificado, que neste caso é o espaço definido pela área das Oficinas do Km 3, uma infraestrutura que integra de forma significativa a história do município de Santa Maria, cujas origens remetem às instalações ferroviárias, e estas compõem o atual imaginário urbano.

1.2 OBJETIVOS

1.2.1 Objetivo geral

O presente trabalho propõe uma revitalização dos espaços livres das Oficinas do Km 3 através de um plano e anteprojeto paisagístico com intervenções culturais para esses espaços livres e seu entorno imediato, localizados no bairro Km 3, no município de Santa Maria, sem propor intervenções arquitetônicas e de restauro nos pavilhões existentes, a fim de mantê-los como um reflexo da pátina do tempo sobre as edificações.

1.2.2 Objetivos específicos



Valorizar e incitar a preservação uma parcela histórica-cultural do patrimônio

ferroviário presente no município de Santa Maria;

5 

buscar a imagem e o significado da área das Oficinas do Km 3 para o imaginário coletivo

do bairro e/ou da comunidade santa-mariense e estabelecer a identificação relacional e identidade local da população local com a área, através de contato com os moradores da região e da cidade; 

inventariar as edificações das Oficinas do Km 3 de acordo com os fichamentos do

Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a fim de garantir um suporte adequado para a consolidação de um espaço público no seu entorno, e como consequência incitar sua preservação; e 

elaborar um anteprojeto paisagístico (estruturas físicas, mobiliários urbanos,

revestimentos de piso, iluminação, vegetação e recursos hídricos) para os espaços livres das Oficinas do Km 3 e externos circundantes à área, a fim de configurar um sistema integrado de espaços públicos qualificados para a região, conforme as necessidades identificadas na área.

1.3 JUSTIFICATIVA

Guyau (2009), afirma que: A emoção moral mais elevada é, ela também, uma emoção social, mas distingue-se da emoção estética pela finalidade que persegue e impõe na vontade: realizar no indivíduo e na sociedade as condições da vida mais social e universal (GUYAU, 2009, p.95). A emoção artística é, portanto, essencialmente social. Ela tem como resultado ampliar a vida individual, fazendo com que ela se confunda com uma vida mais ampla e universal. A finalidade mais elevada da arte é produzir uma emoção estética de um caráter social (GUYAU, 2009, p.104).

Como compreende-se a partir das afirmações de Guyau (2009), a estética e a arte estão essencialmente conectadas com a vida social dos indivíduos. O contato existente entre arte, artista e público gera uma nova sociedade, um novo elo que até então não existia. O filósofo francês Guyau (2009) destaca três elementos que indicam a representatividade que a arte possui da vida coletiva: “o prazer intelectual de reconhecer os objetos por intermédio da memória [...] o prazer de simpatizar com o autor da obra de arte, com seu trabalho, com suas intenções seguidas de êxito, com sua habilidade. [...] e o prazer de simpatizar com os seres representados pelo artista” (GUYAU, 2009, p. 97). Diante disso, constata-se que o viés artístico é um caminho com possibilidades promissoras para a requalificação de uma área que está em desuso e que poderia tornar-se uma geradora de problemas sociais. Neste caso, o espaço trata-se de um friche industrielle, ou seja,

6 uma área industrial ferroviária, com significativa relevância no histórico de Santa Maria. As Oficinas do Km 3 são um vestígio industrial da época áurea da presença da ferrovia no município. A ferrovia teve um papel de indiscutível importância no crescimento de Santa Maria, sendo o berço do desenvolvimento do município, e consequentemente como condicionante na organização espacial. Incutidos no imaginário dos habitantes, muitos equipamentos que são vestígios dessa era estão esquecidos pelo poder público, caindo em total desuso, tais como o Campo dos Aliados e o Monumento dos Ferroviários. Dada a importância desses elementos, onde encaixam-se as Oficinas do Km 3, uma requalificação dos espaços livres é essencial para a mudança de paradigmas quanto a valorização do patrimônio ferroviário. Segundo Mendonça (2001, p. 1 ), “ruínas e vazios industriais estão ligados a um dos mais importantes traços da identidade cultural local, formada pela classe trabalhadora dos municípios [...]”. Por outro lado, ao tratar-se de uma área urbana sem uso momentâneo, deve-se também ressaltar que o espaço configura-se como um vazio social, que, de acordo com Mendonça, é um termo definido por geógrafos alemães por volta de 1952. Um vazio social pode incitar o sentimento de insegurança e também o aparecimento de violência nas proximidades, formando uma nova visão dos habitantes sobre aquela área. Estes espaços acabam por tornar-se um refúgio para atividades ilícitas, vandalismo, tráfico, assaltos, entre outros. Contrapondo-se a esse cenário, pode ser citado, segundo Stédile e Fernandes (2011, p. 8), o resumo de Aristóteles sobre os princípios de construção das cidades: “Uma cidade deve ser construída de modo a proporcionar a seus habitantes segurança e felicidade.” Com base nessa perspectiva, ressalta-se o potencial de uma proposta de revitalização dos espaços livres das Oficinas do Km 3. Como consequência de tal proposta, ter-se-á a requalificação e conservação de um espaço patrimonial do município, identificando-o com os grupos sociais encontrados no entorno. Segundo Mendonça, Muitas vezes, esses novos usos não conseguem disfarçar a imagem de degradação da paisagem urbana encontrada principalmente nos subúrbios industriais (...) mas sobretudo conseguem interferir na identidade social desses antigos espaços que foram zonas portuárias, vilas operárias, etc (MENDONÇA, 2001, p. 7).

De acordo com Bógea (2013, p. 6), “não se guarda um edifício para não tocar, se resguarda, na medida em que se quer transformar. Nos termos de Michael Sorkin: ‘Uma autêntica arquitetura do passado merece uma autêntica arquitetura contemporânea.” A autora define o contexto de autêntica não apenas como algo novo e inaugural, mas autêntica quando

7 reinventa uma possibilidade já existente. “Não forja o novo para transformar, configura o novo ao re-inventar o que está lá” (BOGÉA, 2013, p. 6).

1.4 CONTEXTUALIZAÇÃO DA CIDADE DE SANTA MARIA

O município de Santa Maria sempre foi carinhosamente referenciada por poetas, historiadores e cronistas, em suas obras literárias, como a Cidade Coração do Rio Grande do Sul (RECHIA, 1999). O título deriva de sua posição geográfica, a qual localiza-se na Depressão Central do Estado do Rio Grande do Sul, como pode-se perceber na Figura 1. O privilégio de encontrar-se em uma região central tornou Santa Maria o principal ponto das linhas férreas no Estado e conferiu a ela um aspecto estratégico, tornando-se sede da Segunda Guarnição Militar do Exército Brasileiro, com a instalação de dois Quarteis Generais. O território do município atualmente limita-se ao norte com os municípios de São Martinho da Serra, Itaara, Júlio de Castilhos e Silveira Martins; ao sul com Formigueiro, São Sepé e parte do município de São Gabriel; ao leste limita-se com Restinga Seca; a oeste, com uma porção do município de São Gabriel, Dilermando de Aguiar e São Pedro do Sul.

Figura 1 - diagrama de localização do estado do Rio Grande do Sul no país, localização do município de Santa Maria no Estado, e, por fim, a localização do Distrito Sede no território do município, respectivamente.

Fonte: Autora.

8 De acordo com os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 2010, a área do município de Santa Maria é de 1.788,129 km², sendo o 34º maior município do Estado (CENSO, 2010). Seu território é dividido em 10 distritos, que são: Arroio Grande, Arroio do Só, Boca do Monte, Pains, Palma, Passo do Verde, Santa Flora, Santo Antão, São Valentim e Sede, sendo que neste último localiza-se a zona urbana. Quanto aos seus aspectos fisiográficos, pode-se caracterizar a zona urbana como terrenos arenosos e assentada sobre coxilhas. Ao norte do município, encontra-se o Planalto Meridional do Brasil, conhecido como serra, cujo relevo e vales constituem a Serra Geral. Quanto à hidrografia, Santa Maria pertence à Bacia Hidrográfica do Guaíba e à sub-bacia VacacaíVacacaí Mirim. De acordo com os dados da Agência de Desenvolvimento de Santa Maria (ADESM, 2016a), há uma grande quantidade de cursos d’água área do município, a qual forma uma área sedimentar com considerável número de planícies aluviais, com destaque para as várzeas do rio Vacacaí-Mirim, do arroio Cadena e do rio Vacacaí.

1.5 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO - FERROVIÁRIA

O presente trabalho, ao propor uma requalificação de um espaço derivado da implantação da linha ferroviária, acaba por ressaltar a história e a lembrança da ferrovia e suas infraestruturas adjacentes. Nesse contexto, é de grande valia definir o trajeto histórico de uma infraestrutura que tem grande significado no desenvolvimento em âmbito nacional, estadual e municipal.

1.5.1

A ferrovia no Brasil e no Rio Grande do Sul

O desenvolvimento ferroviário teve seu maior impulso na terceira década do século XIX, na Europa e nos Estados Unidos. O processo desencadeou significativas transformações nos sistemas de transporte e na vida das cidades, configurando as distribuições territoriais e as relações com o meio natural. Além disso, as estradas de ferro originaram um novo tipo de arquitetura, as estações de trem, além de acarretarem ainda a construção de armazéns, depósitos, oficinas de locomotivas, entre outros. No Brasil, a implantação do transporte ferroviário data também de meados do século XIX. As primeiras leis a tratarem da construção da ferrovia surgiram em 1835, e em 1854 o primeiro trecho de estrada de ferro foi construído, pelo então intitulado Barão de Mauá, que ligava o Porto de Mauá até a Estação de Fragoso.

9 Nesse período destaca-se o significativo crescimento e desenvolvimento de muitas cidades. O contato direto entre os territórios, tanto no interior como no exterior do país, ampliou o comércio, e as cidades passaram a ter um relevante papel como centro comercial, político, financeiro e cultural. Essa expansão acarretou a construção e melhoria de infraestruturas, além de a necessidade de instalação de equipamentos urbanos. A Figura 2 apresenta o mapa das estradas de ferro em 1930.

Figura 2 – Mapa das estradas de ferro existentes em 1930 no Brasil.

Fonte: VFCO, 2016a.

Diante disso, o uso do metal na construção civil surgiu de forma muito significativa, a fim de acelerar o processo de construção. Segundo Kühl (1998), as novas condições que foram criadas pelo surgimento da ferrovia e das linhas de navegação fluvial, permitiram o surgimento de um novo fenômeno na arquitetura: os edifícios importados, produzidos pela indústria. Estes eram fabricados no continente europeu e eram trazidos desmontados, compreendendo todas as estruturas da edificação. A grande maioria das estruturas era de metal, mais precisamente de ferro, que originou a chamada Arquitetura do Ferro no Brasil. Na época, foram necessárias numerosas edificações em um curto espaço de tempo, o que exigiu agilidade na construção em áreas que não possuíam suficiente mão-de-obra qualificada. Kühl (1998) afirma que estes edifícios com estrutura metálica localizaram-se e alguns ainda se localizam principalmente nos atuais estados do Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará e Amazonas. Atualmente, de acordo com Rio Grande do Sul (2016), o Sistema Ferroviário Brasileiro tem aproximadamente 30.000 km de extensão, concentrados basicamente nas regiões

10 Sul, Sudeste e Nordeste e sua operação é através de concessão com fiscalização feita pela Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT. A figura que segue apresenta as ferrovias brasileiras.

Figura 3 – Mapa aproximado de todas as ferrovias brasileiras – antigas e recentes – inclusive as erradicadas.

Fonte: VFCO, 2016b.

Figura 4 - Mapa da situação das linhas ferroviárias no Estado do Rio Grande do Sul em 1965 e da situação atual, respectivamente.

Fonte: VIAÇÃO FÉRREA, 2016; RIO GRANDE DO SUL, 2016.

11 A malha ferroviária do Rio Grande do Sul (Figura 4) foi administrada por um longo período pela Rede Federal – RFFSA, e em 1997 foi concedida para a iniciativa privada, passando a ser controlada pela América Latina Logística do Brasil S.A. – ALL Logística. Segundo Do Sul... (2016), o Estado possui atualmente uma malha ferroviária com 3.259 km de linhas e ramais ferroviários, sendo utilizada apenas para transporte de cargas. Atualmente, alguns trechos não possuem operação regular, sendo que os terminais ferroviários que concentram maior volume de cargas estão localizados na Região Metropolitana de Porto Alegre e em Passo Fundo, Cruz Alta e Uruguaiana (RIO GRANDE DO SUL, 2016).

1.5.2 A Mancha Ferroviária em Santa Maria

A cidade de Santa Maria tem significativa importância histórica e estratégica no contexto do Estado do Rio Grande do Sul e no âmbito da viação férrea regional e nacional. Seu nascimento data de 1797, quando um grupo encarregado de delimitar territórios dominados pelo Império Espanhol e Império Português montou um acampamento onde seria o marco inicial da cidade, que mais tarde seria chamada de Rua do Acampamento. Por conta de sua posição geográfica privilegiada, na região mais central do Estado, outros grupos migrantes fixaram-se no local, e atividades comerciais começaram a ser desenvolvidas na região. Desde seu nascimento, a cidade foi um ponto de encontro de diferentes grupos e culturas, tornando-se atrativa para camponeses, ex-escravos e imigrantes. No ano de 1885, iniciam-se as atividades ferroviárias na cidade. O movimento através do tráfego dos trens trouxe para o ambiente urbano “uma série de transformações e de novas dinâmicas sociais” (BELTRÃO 1979 apud SANTOS E ZANINI, 2012, p. 284). Logo, a cidade tornou-se um importante centro ferroviário no âmbito nacional, e o principal do Estado: estava em uma localização geográfica privilegiada, era o ponto de cruzamento de todas a linhas férreas estaduais e sediou a Diretoria da Compangnie Auxiliaire des Chemins de Fer au Brésil, a empresa arrendatária das ferrovias gaúchas (BELTRÃO, 1979; FLÔRES, 2007). A ferrovia foi, sem dúvida, um marco civilizador (ELIAS, 1993 apud FACCIN E ZANINI, 2013). A cidade apresentou significativo desenvolvimento social, econômico, urbano e cultural através dos investimentos ferroviários. Além disso, a ferrovia foi influente no processo de urbanização da cidade, tanto em números quanto em formas. Com uma rede de serviços extensa, o parque ferroviário extendeu-se por aproximadamente cinco quilômetros no interior da malha urbana (FACCIN E ZANINI, 2013). O conjunto da ferrovia e suas estruturas auxiliares, pertencentes à Cooperativa de Consumo dos Empregados da Viação Férrea do Rio

12 Grande do Sul (COOPFER), conforma o que chamou-se posteriormente de Mancha Ferroviária de Santa Maria. A Figura 5 ilustra a presença da ferrovia em Santa Maria.

Figura 5 - Presença da linha férrea e espaços adjacentes no município de Santa Maria.

Fonte: Adaptado de OpenStreetMap, 2016.

A partir da segunda metade do século XX, a Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA), começou a passar por um lento processo de decadência e sucateamento, e foi desestatizada e privatizada na metade da década de 1990. Com isso, o desenvolvimento decorrente da atividade ferroviária em Santa Maria sofreu transformações. Como reflexo da desestruturação da RFFSA, a Mancha Ferroviária passou a ser ligada à imagem de decadência e estagnação, que refletiu-se também na paisagem urbana e no contexto social, adquirindo o aspecto de abandono. Além disso, as áreas e edifícios sucateados tiveram seus usos alterados e a instalação de ocupações irregulares nas linhas férreas. Em 1996, na tentativa de evitar a perda dos vestígios patrimoniais da ferrovia, ocorreu o tombamento da Mancha Ferroviária de Santa Maria, como patrimônio histórico e cultural do município, e no ano 2000, o Sítio Ferroviário foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico

13 e Artístico do Estado (IPHAE), sendo que o sítio inclui a Estação Férrea da GARE, o Colégio Manuel Ribas, a Vila Belga – 40 casas geminadas (80 moradias) e o prédio da Cooperativa dos Funcionários da Ferrovia (COOPFER) (RIO GRANDE DO SUL, 2016). Na tentativa de valorizar o patrimônio ferroviário urbano já reconhecido e fortalecer a imagem do município, a Mancha Ferroviária foi incluída, através de projetos específicos, no Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Santa Maria (PDDUA/SM), aprovado no ano de 2005. O plano tem como metas gerais para essa área sua revitalização juntamente com o resgate da identidade urbana, a fim de preservar a cultura ferroviária e respeitar os usuários e moradores da região (SANTA MARIA, 2009).

1.5

METODOLOGIA

Para o desenvolvimento do Trabalho Final de Graduação do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Maria, deve-se cumprir as seguintes etapas: plano de trabalho específico, pesquisa, partido geral, painel intermediário, entrega do anteprojeto e defesa final. Na etapa em que se desenvolve o plano específico de trabalho, define-se a temática, bem como sua delimitação e conceituação, que trata-se da revitalização de uma área livre, bem como a área a ser estudada e trabalhada (as Oficinas do Km 3) e a metodologia a ser utilizada para o desenvolvimento do trabalho. O desenvolvimento da pesquisa proporciona o embasamento, bem como constrói referenciais teóricos, visuais e projetuais para a elaboração do anteprojeto proposto. A pesquisa é composta pelos aportes teóricos, estudo de obras de referência, levantamento de dados e contato com a população local, aplicação de questionários e confecção de mapas mentais, compilação e análise dos dados e assimilação dos resultados para o processo projetual. Os aportes teóricos tem como finalidade apresentar referenciais teóricos e conceituais a cerca da temática tratada, como forma de relacionar conceitos já concretizados com o trabalho desenvolvido. Já o estudo de obras de referência projetual, busca apresentar análises críticas de propostas desenvolvidas anteriormente com parcial semelhança de temática, a fim de avaliar as soluções propostas dentro das condições do referido projeto. O levantamento de dados e informações, através de pesquisa e contato direto com a comunidade, tem o objetivo de aproximar o processo projetual das reais condições e necessidades da área e sua população, para

14 que o resultado final possa atingir níveis satisfatórios em termos de atender as questões levantadas na análise de dados e problemáticas. A definição do partido geral apresentará soluções preliminares do projeto paisagístico e plano de implantação de atividades, com definição e espacialização de diretrizes projetuais e traçados, redefinindo a paisagem das áreas livres das Oficinas do Km 3. No painel intermediário será apresentada uma síntese de soluções gerais para o projeto, já com traçados e equipamentos locados e definidos, demarcando a intervenção na paisagem. A entrega e defesa final apresentará as soluções finais e mais específicas do projeto, incluindo espeficações vegetais, de pavimentação e materiais, mobiliários, detalhamentos de estruturas físicas, e mobiliários urbanos relevantes para o entendimento da proposta.

1.6

CRONOGRAMA

Cronograma representado noelaborado com a distribuição das etapas do trabalho distribuídas em um ano. Quadro 1 – Cronograma de etapas do Trabalho Final de Graduação. Etapas

Março

Abril

Maio

Junho

Julho

Agosto

Setembro

Outubro

Novembro

Dezembro

Pesquisa Partido Apresentação Anteprojeto Defesa Final

Fonte: Autora.

1.7

RECURSOS

No decorrer do desenvolvimento do trabalho, incluindo levantamentos de campo, contatos e dinâmicas com a comunidade e desenvolvimento e graficação da proposta em si, utilizou-se: papel, lápis, canetas, lápis de cor, canetas coloridas e demais materiais para desenho necessários, pranchetas, câmera fotográfica digital, computador com softwares de CAD 2D e

15 3D instalados, impressões e plotagens de material gráfico produzido para a apresentação e material para a confecção de maquete.

2

APORTES TEÓRICOS

2.1 PATRIMÔNIO

Patrimônio. Esta bela e antiga palavra estava, na origem, ligada às estruturas familiares, econômicas e jurídicas de uma sociedade estável, enraizada no espaço e no tempo. Requalificada por diversos adjetivos (genético, natural, histórico, etc;) que fizeram dela um conceito ‘nômade’, ela segue hoje uma trajetória diferente e retumbante (CHOAY, 2011, p. 11).

De acordo com Choay (2011), com a adição de um adjetivo, forma-se a expressão patrimônio histórico. Essa “designa um bem destinado ao usofruto de uma comunidade que se ampliou a dimensões planetárias, constituído pela acumulação contínua de uma diversidade de objetos que se congregam por seu passado comum [...]” (CHOAY, 2011, p. 11). Dentre tamanha diversidade de bens heterogêneos que podem ser classificados como patrimônio histórico, o autor afirma que o exemplar que mais se relaciona com a vida coletiva é o patrimônio histórico representado pelas edificações. Esses, em tempos passados, eram chamados de monumentos históricos, porém a partir da década de 1960 essa terminologia passou a representar apenas uma pequena parcela da quantidade de bens que passou a ser incluída nas definições de patrimônio. Ainda segundo o Choay (2011), no ano de 1837, foi criada na França a primeira Comissão dos Monumentos Históricos, que engloba três grandes categorias de monumentos classificados em remanescentes da Antiguidade, edifícios religiosos da Idade Média e alguns castelos. No período após a Segunda Guerra Mundial, o número de bens multiplicou-se muito, e, posteriormente, “todas as formas da arte de construir, eruditas e populares, urbanas e rurais, todas as categorias de edifícios, públicos e privados, suntuários e utilitários foram anexados”. (CHOAY, 2011, p. 12) Os edifícios foram classificados com novas denominações, como arquitetura menor, arquitetura vernacular, arquitetura industrial1, entre outros.

“Arquitetura menor: termo proveniente da Itália para designar as construções privadas não monumentais, em geral edificadas sem a cooperação de arquitetos; arquitetura vernacular, termo inglês para distinguir os edifícios marcadamente locais; arquitetura industrial das usinas, das estações, dos altofornos [...]” (CHOAY, 2011, p. 12) 1

16 2.2 PATRIMÔNIO INDUSTRIAL

As antigas Oficinas Ferroviárias do Km 3 são, como se pode definir, um patrimônio industrial, resquício de uma época de acelerado desenvolvimento econômico e processo de industrialização. De acordo com Kühl (2010), apesar do aumento de estudos e experiências de intervenção nesses bens, os patrimônios industriais, não ocorre de forma equivalente uma reflexão mais aprofundada sobre conceitos, metodologias e princípios de preservação que englobem também os processos de industrialização. O legado deixado pelo processo de industrialização passou a receber preocupação já no século XIX, porém tornou-se mais significativa a partir da década de 1960. O termo arqueologia industrial surge em discussões na Inglaterra na década de 1950, e nos anos seguintes aparece em discursos cada vez mais numerosos. Em 1962, na Grã-Bretanha, um membro da Inspetoria de Monumentos Antigos, caracterizou os monumentos industriais como “as estruturas, em especial do período da Revolução Industrial, que ilustram processos industriais, incluindo os meios de comunicação (RAISTRICK apud KÜHL, 2010, p. 25). Kühl (2010) ainda traz outra definição, do autor Angus Buchanan:

[...] arqueologia industrial é um campo de estudo relacionado com a pesquisa, levantamento, registro e, em alguns casos, com a preservação de monumentos industriais. Almeja, além do mais, alcançar a significância desses monumentos no contexto da história social e da técnica. Para os fins dessa definição, um ‘monumento industrial’ é qualquer relíquia de uma fase obsoleta de uma indústria ou sistema de transporte [...] (BUCHANAN apud KÜHL, 2010, p. 26).

Além dos textos e definições dos autores que trataram do tema, foi criada a Carta de Nizhny Tagil, documento do The International Committee for the Conservation of the Industrial Heritage (TICCIH), no ano de 2003. A Carta trata de um amadurecimento das definições anteriormente feitas, fazendo uma síntese mais abrangente da questão. De acordo com a Carta:

O patrimônio industrial compreende os vestígios da cultura industrial que possuem valor histórico, tecnológico, social, arquitetônico ou científico. Estes vestígios englobam edifícios e maquinaria, oficinas, fábricas, minas e locais de tratamento e de refinação, entrepostos e armazéns, centros de produção, transmissão e utilização de energia, meios de transporte e todas as suas estruturas e infra-estruturas, assim como

17 os locais onde se desenvolveram atividades sociais relacionadas com a indústria, tais como habitações, locais de culto ou de educação. A arqueologia industrial é um método interdisciplinar que estuda todos os vestígios, materiais e imateriais, os documentos, os artefatos, a estatigrafia e as estruturas, as implantações humanas e as paisagens naturais e urbanas, criadas para ou pelos processos industriais, a arqueologia industrial utiliza os métodos d einvestigação mais adequados para aumentar a compreensão do passado e do presente industrial. O período histórico de maior relevo para este estudo estende-se desde os inícios da Revolução Industrial, a partir da segunda metade do século XVIII até os nossos dias, sem negligenciar suas raízes pré e proto-industriais (TICCIH, 2003).

No que se trata em relação ao termo arqueologia industrial, ele não é empregado no sentido da arqueologia tradicional (escavações). A arqueologia industrial, segundo Kühl, deve ser entendida de maneira mais ampla, relacionada com a dimensão semântica da palavra arqueologia, que é associada com fases passadas de manifestações humanas. A Carta de Nizhny Tagil consolidou o uso da terminologia, e definiu de forma mais precisa o seu significado, de forma que cararacterizou a arqueologia industrial como um método interdisciplinar. Nesse sentido, a arqueologia industrial deve ser embasada em diversos campos de saber, sem possuir referenciais específicos, e não apenas fundamentada em conhecimentos que sejam a respeito apenas do legado industrial. É um vasto campo, que abrange variadas temáticas e questões a serem consideradas e estudadas, o que exige a mobilização de várias disciplinas. Dessa forma, busca-se uma maior compreensão do processo que levou a identificar tal bem como um patrimônio industrial, e todos os elementos que a ele estão relacionados. Além disso, são necessários, de acordo com Kühl (2010, p.26), “estudos interdisciplinares que aprofundem a questão da inserção desses bens no espaço, ao longo do tempo, e suas relações com a estruturação da cidade ou do território, sua articulação com aspectos sociais, econômicos, culturais e políticos”.

2.3 FRICHE INDUSTRIELLE

O aparecimento de ruínas e vazios industriais são consequências de alterações econômicas em determinado espaço e período de tempo, e, como citado anteriormente, é um campo a ser estudado por diversos caminhos teóricos. A teoria francesa que os define como friche industrielle é um caminho ainda pouco difundido, mas está ligado ao planejamento urbano e paisagístico.

18 Originada na França, onde encontram-se muitos desses espaços, consequência da rápida expansão industrial e sua posterior decadência, a definição do termo é relativamente nova, tanto em outros países como no Brasil. Em português, não temos uma expressão que possa definir esse fenômeno que se alastra por muitas cidades em todo o mundo. Na língua inglesa, os friches industrielles são chamados de brownfields, sendo estes dois os principais termos empregados atualmente quando se trata do assunto: “indústrias e vazios urbanos que podem ser transformados, revitalizados, e ter novos usos sociais” (MENDONÇA, 2001, p.1). De acordo com Mendonça (2001), anteriormente à definição de friche industrielle, o geógrafo francês Jean Labasse, no ano de 1966, introduziu na França o conceito de friches sociales, o que pode definir-se como vazios sociais, e está associado aos conceitos de ciclos industriais e descentralização social. Para o autor, esses conceitos impulsionaram os próximos estudos vinculados ao conceito, com foco nas dimensões sociais, econômicas e espaciais, diante do cenário de desindustrialização ocorrido na França no pós-guerra (BRITTO E MARTINS apud FERNANDES, 2014). Ainda para Mendonça (2001, p. 2), o Service Technique de l’Urbanisme (STU), a definição do conceito de friches industrielles é empregada para definir “um espaço, construído ou não, desocupado ou muito sem utilização; antes ocupado por atividades industriais ou outras atividades ligadas à indústria”. Para a reinsererção deste espaço no contexto urbano e imobiliário, independentemente do seu uso, necessitará de um estudo e novo planejamento. Além disso, afirma também que o termo friche industrielle pode sugerir uma homogeneidade que não é coerente com a realidade destes espaços, sugerindo apenas uma das causas da presença destes no tecido urbano: a interrupção do uso primordial das antigas indústrias. Os friches industriais2 existentes em áreas antes industrializada constituem uma enorme variedade tipológica, tanto em suas caracteríticas espaciais e morfológicas quanto nas possibilidades e potencialidades de revitalização e requalificação (urbana, arquitettônica e/ou paisagística). A ligação direta dos friches industriais com a imagem de abandono e deterioração como uma presença na malha urbana ressalta possíveis impactos causados pelos mesmos, que Fernandes (2014), classifica da seguinte maneira:

(i)

2

Impacto visual: a presença da ruína, que representa o fracasso de uma era.

Termo adaptado à língua portuguesa, mencionado por alguns autores para referir-se a friche industrielle.

19 (ii)

Impacto econômico: desvalorização do solo e de edifícios das áreas próximas.

(iii)

Impacto social: sentimento de insegurança e intranquilidade nos moradores das

proximidades. De forma conjunta, esses aspectos configuram uma presença negativa dos friches na malha urbana. O abandono gera a insegurança e, em muitos casos, o surgimento de violência nessas áreas. Segundo Mendonça (2001), influencia as práticas sociais, altera hábitos de vida dos habitantes, costumes e visões de mundo relacionados aos espaços. Afirma ainda que “alguns locais degradados são associados ao ‘vandalismo, tráfico de drogas, assaltos e até assassinatos” (MENDONÇA, 2001, p. 7). Nesse contexto, outros impactos econômicos e sociais costumam ser relacionados aos friches, como aumento dos indíces de desemprego e redução de atividades culturais. Diante deste cenário, pode-se ressaltar ainda que a degradação destes espaços potencializa o desaparecimento de edifícios e espaços importantes na memória coletiva e na construção da identidade de um bairro ou cidade. Assim, os friches industriais, além de necessitarem de atividades que promovam sua preservação como edificação e memória, podem apresentar-se como uma importante oportunidade e alterativa para a implantação de um novo equipamento para a cidade. Com isso, além de receber tratamento e cuidado, recebem a oportunidade de serem reabsorvidos pelo tecido urbano e representam uma nova fase no desenvolvimento espacial, onde pode-se idealizar novos conceitos, preservando a memória do passado.

2.4 DEFINIÇÕES E CONCEITOS LEGAIS ACERCA DO PATRIMÔNIO

A definição de um friche industrial inclui um vasto leque de tipologias de friches que são geradas de acordo com a origem e o uso da antiga indústria que ali costumava operar. No caso do presente trabalho, que cuja área de estudo em questão é definida pelo espaço onde operaram as antigas Oficinas do Km 3, podemos caracterizar tal friche industrial como um fragmento de patrimônio ferroviário, definição essa dada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN, 2016). Conforme a Lei 11.483, de 31 de maio de 2007 (ANEXO A), foi atribuída ao Iphan a responsabilidade de receber e administrar os bens móveis e imóveis de valor artístico, histórico

20 e cultural, oriundos da extinta Rede Ferroviária SA (RFFSA) (BRASIL, 2007). A partir disto, o Instituto passou a avaliar os bens que se enquadram nessas condições. De acordo com o Iphan, o patrimônio ferroviário oriundo da RFFSA constitui-se de bens imóveis e móveis, os quais incluem “estações, armazéns, rotundas, terrenos e trechos de linha, material rodante, como locomotivas, vagões, caros de passageiros, maquinário, além de bens móveis como mobiliários, relógios, sinos, telégrafos e acervos documentais” (IPHAN, 2016). Para a classificação destes bens como valor histórico foi criado o Programa de Preservação do Patrimônio Histórico Ferroviário (Preserfe), desenvolvido pelo Ministério dos Transportes, que até então era a instituição responsável pela gestão da RFFSA. O Iphan recebeu então a nova atribuição de gestão desse acervo e, para isso, instituiu a Lista do Patrimônio Cultural Ferroviário, de acordo com a Portaria Iphan nº 407/2010, que conta com 639 bens inscritos até 15 de dezembro de 2015 (IPHAN, 2016). Para serem inscritos na lista, de acordo com o Iphan, os bens são avaliados por uma equipe técnica da Superintendência do Estado e passam por apreciação da Comissão de Avaliação do Patrimônio Cultural Ferroviário (CAPCF), sendo que a decisão é homologada pela Presidência do Iphan. Ainda de acordo com o Iphan, os bens que já não são operacionais são transferidos ao Instituto, e os bens operacionais permanecem sob responsabilidade do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), o qual atua em conjunto com o Iphan em busca de promover a preservação desses bens. O procedimento descrito é aplicado apenas aos bens originários da extinta RFFSA. Os que não pertenciam à Rede não se enquadram nessa legislação, porém poder ser objeto de Tombamento (Decreto Lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, aplicado a bens móveis e imóveis), ou ao Registro (Decreto nº 3.551, de 4 de agosto de 2000, aplicado ao Patrimônio Cultural Imaterial) (IPHAN, 2016). No Estado do Rio Grande do Sul, o patrimônio ferroviário tem sido estudado pelo Iphan, sendo que, nos últimos anos, 180 recintos ferroviários foram inventariados, incluindo estações, armazéns, residências, caixas-d’água, pontes e viadutos, distribuídos em mais de três mil quilômetros de malha ferroviária. O patrimônio inclui a Estrada de Ferro Porto Alegre – Uruguaina. De acordo com o Iphan (2016), a Estrada foi aberta em 1883 como uma empresa federal, ligando Santo Amaro a Cachoeira do Sul. Anteriormente à implantação da ferrovia, viagens para Porto Alegre deveriam ser feitas por embarcações que navegavam pelo rio Jacuí. No ano de 1898, a empresa belga Cie. Auxilaire assumiu a Estrada de Ferro, e em 1905 tornou-se a

21 linha – tronco da Viação Férrea do Rio Grande do Sul (VFRGS), porém ainda era administrada pela empresa belga. A Figura 6 apresenta uma parcela da lista de Patrimônio Cultural Ferroviário.

Figura 5 - Fragmento da lista de Patrimônio Cultural Ferroviário, de 15 de dezembro de 2015. Bens declarados com valor histórico, artístico e cultural da Lei nº 11.483/07 e da Portaria IPHAN nº 407/2010.

Fonte: Adaptado de IPHAN, 2016.

2.5 A CIDADE

[...] a cidade transforma tudo, inclusive a matéria inerte, em elementos de cultura (RIMBAUD apud SANTOS, 2014, p. 84).

O tecido urbano cresce e expande-se constantemente, e a evolução dos diferentes modos de vida urbana gera um expressivo consumo de espaços. Segundo Panerai (2014, p. 13), “a cidade, outrora compacta, inclui hoje grandes zonas não construídas: áreas naturais, plataformas logísticas, setores de estocagem, terrenos baldios.” Ainda de acordo com o autor, a inserção da cidade no espaço geográfico, assim como sua forma, o traçado de suas vias, as relações entre

22 bairros e organização do seu tecido são diretamente relacionadas com os grupos sociais que nela produzem, vivem e transformam (PANERAI, 2014,). A autora Kohlsdorf (1996) ao tratar a cidade como um fenômeno, resgata as ideias do historiador e escritor Lewis Munford. Munford afirma que a vida cívica é um atributo essencial da cidade, pois essa manifesta-se antes mesmo de qualquer princípio de assentamento perrmanente e carrega consigo ideiais de como tratam-se as relações humanas e conotações de cortesia e civilidade. Kohlsdorf ainda afirma que a cidade “[...] é o lugar propício à troca de informações de contatos diretos e imprevistos que consituem, talvez, a única estratégia possível de transformações sociais. Por isso, nas palavras de Engels, a cidade é o lugar da história” (KOHLSDORF, 1996, p. 16). Em conjunto com os conceitos de Kohlsdorf (1996), vale ressaltar as ideias de Pesavento (2005). A autora traz a ideia de “cidade cronótopo”, que quer dizer uma unidade de lugar e tempo, sendo a cidade como “um lugar no tempo, um momento no espaço” (PESAVENTO, 2005, p. 23). Além de ser um lugar no tempo, a autora afirma também que o espaço urbano carrega o seu próprio tempo, com uma história e uma memória carentes de leitura, como se fosse, de acordo com o filósofo Walter Benjamin, um livro de pedra. Nesse contexto, pode-se afirmar que as formas, traços e matérias que demarcam a apropriação do espaço compõem uma grande trama de características a serem estudada. (PESAVENTO, 2005). Pesavento (2005) define que esse tempo das cidades é múltiplo e está sempre em reconstrução, sendo a cidade uma permanente reinvenção do mundo no espaço. Conforme as decisões políticas, com as quais se definem as intervenções no espaço urbano, a cidade reconstitui-se de forma contínua, “tendo como horizonte o passado e o futuro” (PESAVENTO, 2005, p. 24). Após a conceituação da cidade como um cronótopo, ou seja, uma unidade de lugar e tempo, afirmando que a mesma está diretamente relacionada com suas carracterísticas temporais, Pesavento (2005) destaca a importância de renovar e recuperar a cidade, considerando todas as suas dimensões temporais. O ato de renovar e recuperar é uma maneira de exercer a cidadania, no senso de que, na condição de morador de determinada cidade, o habitante deve ter o direito de usufruir dos diferentes tempos do espaço urbano. Segundo a

23 autora, “o direito à cidade, fundamental naquilo que se considera cidadania é também um direito à história, à memória e à identidade” (PESAVENTO, 2005, p. 24). Nesse sentido, Pesavento (2005) traz o conceito de patrimonialização do passado da cidade, que deve estar em sintonia com a educação do olhar para a compreensão da concepção do espaço urbano e seus monumentos. A patrimonialização desse passado presume que a cidade é assumida como uma propriedade compartilhada, a qual deve-se reconhecer a história comum que está inscrita no seu espaço. Indo além, deve-se considerar a sua memória social, bem como saber reconhecer em seus elementos os locais que são repletos de sentido, a fim de despertar o sentimento

de

pertencimento,

reconhecendo

territórios

e

temporalidades

urbanas

(PESAVENTO, 2005). Considerando-se as definições de cidade dadas pelas autoras, pode-se compreender a cidade como uma consequência das transformações ocorridas em seu espaço ao longo do tempo, as quais deram origem à sua morfologia. Morfologia essa que está diretamente relacionanda com quem habita e faz uso do espaço, mantendo-o em constante transformação. Além disso, a cidade é o palco da vida cívica e das trocas de experiências, com foco nos seus espaços públicos que geram a oportunidade para essas vivências. E, ainda, tem-se a cidade como um grande livro de memórias edificadas, o qual viveu por diversos períodos de tempo, acumulando camadas de memórias, que devem ser concretizadas através dos processos de patrimonialização, para possibilitar o direito dos cidadãos de viver as diferentes temporalidades da cidade que habitam.

2.5.1 Limite de crescimento

A malha urbana costuma ter elementos que podem ser considerados como um "limite de crescimento" (PANERAI, 2014, p. 66). De acordo com o autor, "o limite é um obstáculo a um crescimento linear, um ponto de parada ou um acidente que impede a extensão" (PANERAI, 2014, p. 66). Em circunstâncias gerais, o obstáculo desempenha seu papel como um limite por um espaço de tempo, existindo a possibilidade de ser superado e transformado em um pólo. Esses elementos podem ser tanto naturais quanto construídos pelo homem. Segundo Panerai (2014, p. 66), elementos como "a ponte, o cruzamento, a alameda, a feira, a rótula rodoviária, a porta da cidade, uma fazenda, um monumento, um cemitério, a penitenciária, a estação de trem" podem vir a tornar-se um elemento limitador para o

24 desenvolvimento territorial de uma cidade. Porém, ainda de acordo com o autor, algumas vezes o elemento limite pode tornar-se ponto de partida para um crescimento oposto. Panerai (2014) dá como exemplo deste caso uma estação ferroviária que localiza-se externamente à aglomeração urbana, e que acaba por atrair o crescimento para a sua direção, ao mesmo em que impede o mesmo, levando o crescimento para o sentido contrário. Com isso, temos como exemplo o bairro da estação (PANERAI, 2014, p. 67). Para que se defina um limite de crescimento, de acordo com Panerai (2014), deve haver uma barreira de crescimento. A palavra barreira é utilizada no sentido de um obstáculo, um ponto que impede a expansão do tecido urbano, que pode ser tanto geográfico quando construído. Essa barreira pode ser caracterizada por uma diferença de caráter administrativo entre territórios, como por exemplo, a demarcação de propriedade privada, uma zona protegida, entre outros. A barreira, dependendo do local onde está na malha urbana e de seu estágio de desenvolvimento, pode bloquear ou induzir o crescimento (PANERAI, 2014). Uma situação é estável apenas por um determinado período, e dessa forma um elemento pode transformar-se ao longo do processo de desenvolvimento, assumindo sucessivas funções. Dada a existência destes pontos caracterizados como barreiras, o fato de sua transposição é uma etapa muito relevante para o desenvolvimento urbano. Para que a cidade faça a transposição deste limite, pode apoiar-se em elementos já pertencentes à realidade urbana ou em prolongamentos de traçados existentes (PANERAI, 2014). É uma situação comum onde os tipos existentes em ambos os lados do elemento tido como obstáculo sejam muito diferentes entre si, não só por questões temporais, mas por situações e condições particulares de cada lado da barreira. Diante desse cenário, a questão mais relevante é a transformação do objeto tratado como barreira, sendo que ele é um elemento de relação entre as duas partes do tecido, que na grande maioria das vezes são diferentes. A transposição da barreira pode de ocorrer através de diferentes possibilidades. Nas situações de transposição definidas por Panerai (2014), a barreira pode ser transformada e torna-se um novo elemento na estrutura do tecido urbano, de forma a consagrar ou fundir as diferenças entre os dois lados. Ainda pode acompanhar uma nova organização que acentua suas características urbanas e a torna um novo elemento, possibilitando a criação de novos espaço públicos qualificados, como praças, monumentos e equipamentos. Em alguns casos, ainda, essas transformações geram retorno ao núcleo mais

25 antigo e central da malha urbana, como a implantação de novas ruas e a disponibilidade de novos espaços, que levam a contemporaneidade ao ambiente urbano.

2.6 O ESPAÇO LIVRE PÚBLICO

A cidade, sendo definida como um palco para a vida pública, acaba por expressar a demanda gerada pela população de espaços de convivência que possam corresponder aos diferentes interesses dos cidadãos, e que sejam convenientes para abrigar as manifestações afimativas da cidadania. Dessa forma, os espaços públicos, como parques e praças, são locais propícios para a prática da cidadania. De acordo com Feghali e Lassance (2007, p. 10), “há muito tempo, os espaços livres públicos, principalmente nas grandes cidades, tem um importante papel a desempenhar, como opção para o lazer, interação social, contemplação, descanso, entre outros.” Macedo (1995, p. 16) define os espaços livres “como todos aqueles não contidos entre as paredes e tetos dos edifícios construídos pela sociedade para sua moradia e trabalho”. Tratando-se do contexto urbano, o autor tem como espaços livres “as ruas, praças, largos, pátios, quintais, parques, jardins, terrenos baldios, corredores externos, vilas, vielas e outros mais por onde as pessoas fluem no seu dia-a-dia [...]” (MACEDO, 1995, p. 16). Para Magnoli (2006), “o espaço livre é todo espaço não ocupado por um volume edificado (espaço-solo, espaço-água, espaço-luz ao redor das edificações a que as pessoas tem acesso)” (MAGNOLI, 2006, p. 179). E, ainda segundo a autora, o indivíduo percebe o espaço através de três formas: “usando-o, vendo-o e sentindo-o” (MAGNOLI, 2006, p. 179). De acordo com Carrión (2004), as principais definições a respeito do espaço público são derivadas das correntes de urbanismo moderno, e fazem referência exclusiva a um lugar físico (espaço) que tem sua gestão ou conceito de própriedade pública. Essa concepção, segundo o autor, mostra-se restritiva ao analisar-se a bibliografia especializda, onde destacam-se três concepções dominantes sobre o espaço público. Uma primeira concepção provém das teorias do urbanismo operacional e da especulação imobiliária, que trata o espaço público como aquele que é residual, como uma área marginalizada depois da construção de uma edificação, como uma residência ou comércio, quando, visto por um ângulo contrário, pode-se afirmar que a partir do espaço público organiza-

26 se a cidade. Em outros termos, o tecido urbano é composto com diferentes usos do solo, onde o espaço público assume a função de criar vínculos entre um e outro, de criar locais de lazer e espaços para a população, além de proporcionar locais de trocas e comércios de produtos, acesso à informação ou abrigar monumentos (CARRIÓN, 2004). Como uma segunda concepção, com caráter predominantemente jurídico, o autor define como aquela que provém do conceito de propriedade e apropriação do espaço. Nela é distinguido o espaço vazio do espaço construído, o espaço individual e espaço coletivo, o que conduz à formação do espaço privado em contraponto ao espaço público. Trata-se de um conceito jurídico no qual o espaço público é aquele que não é privado, pertence a todos e é assumido pelo Estado, como proprietário e administrador, e representante do interesse geral (CARRIÓN, 2004). A terceira concepção, em um cunho mais filosófico, traz a definição de que os espaços públicos formam um conjunto de nós isolados ou conectados, onde a individualidade desaparece gradualmente, e, assim, limita a liberdade. Esse conceito expressa a transição do privado ao público, onde o indivíduo perde sua liberdade nesse caminho, porque edifica uma instância coletiva onde nega a si mesmo e aliena-se (CARRIÓN, 2004). Diante deste conceito filosófico, Carrión (2004) traz alguns questionamentos sobre as relações que o espaço público tem com todos os outros elementos, como: por que pensamos geralmente que se sai do privado para entrar no público, e não o contrário? Ou então, as fachadas dos edifícios são o limite do privado ou o limiar do espaço público? A fachada é pertencente ao edifício privado ou ao espaço público? É dentro ou fora de qual dos espaço? Diante da explanação dessa três concepções, Carrión introduz um conceito alternativo. Para o autor, “o espaço público não é o residual, tampouco uma forma de apropriação e menos um lugar onde se aliena da liberdade” (CARRIÓN, 2004, p. 81, tradução nossa)3. É necessário superar essas concepções e passar a enterder o espaço público por âmbitos interrelacionados, onde de um lado temos sua condição urbana e sua relação com a cidade, e por outro, sua referência histórica, pois transforma-se ao longo do tempo e em cada época possui um lógica diferente, bem como sua articulação funcional com a cidade.

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“El espacio público no es lo residual, tampoco una forma de apropiación y menos un lugar donde se enajena de libertad.”(CARRIÓN, 2004, p. 81)

27 De acordo com a síntese de conceitos feita pelo autor, a cidade é um grande conjunto de espaços públicos, ou a cidade em seu conjunto é um espaço público, onde se organiza a vida coletiva e existe uma representação da socieadade. Nesse âmbito, desponta a necessidade de entendê-lo como um dos direitos fundamentais da cidadania: “o direito ao espaço público, porque permite reconstruir o direito à associação, à identidade e à pólis” (CARRIÓN, 2004, p. 83, tradução nossa)4. Esse direito ao espaço livre está incluído no âmbito do direito à existência do outro no mesmo espaço, pois não apenas necessitamos de um espaço onde encontramos uns aos outros, mas também um espaço onde é construída a tolerância, possibilitando o aprendizado da convivência com os outros de forma tolerante e pacífica. Diante disso, para que o espaço público opere como um espaço de cidadania e tolerância, deve reunir a multiplicidade das vozes, manifestações e expressões da cidade, para que assim seja possível reunir a heterogeneidade da cidade no espaço público, criando relações harmônicas. Carrión (2004) conclui seu pensamento afirmando que uma cidade que proporciona e multiplica as possibilidades de contato entre os cidadãos é aquela que possui bons espaços públicos. No âmbito da conceituação de Carrión, podemos reforçar suas conclusões com a afirmação de Feghali e Lassance (2007), a qual ressalta que “diversos autores concordam que os espaços livres públicos são indispensáveis para o estudo da paisagem urbana e a qualificação do meio urbano” (FEGHALI E LASSANCE, 2007, p. 12). O autor entende que os métodos que são utilizados para os projetos para espaços livre públicos devem considerar, em outros aspectos, sua característica essencialmente mutante, “como espaço que se transforma continuamente, quer ser por sua ambiência ou pela ação de seus usuários” (FEGHALI E LASSANCE, 2007, p. 12). Para Gehl e Svarre (2013), em geral, as atividades realizadas em espaços livres públicos podem ser divididas em necessárias e opcionais. As atividades necessárias podem incluir o ato de comprar, ir em direção ou voltar de uma parada de ônibus, ou exercer uma atividade profissional, como um manobrista de estacionamento, um policial ou carteiro. As atividades profissionais podem compreender atos como passear ou correr, sentar-se em algum local, parar para ler um livro ou jornal, ou apenas contemplar o ambiente. Para os autores, as atividades que

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“[...] el derecho al espacio público, porque permite reconstruir el derecho a la asociación, a la identidad y a la polis” (CARRIÓN, 2004, p. 83).

28 podem ser necessárias para algumas pessoas podem ser de livre escolha para outras (GEHL E SVARRE, 2013). Os autores trazem também uma retomada da evolução da importância do espaço livre público em um contexto histórico - político. De acordo com Gehl e Svarre (2013), as décadas de 1960 e 1970 foram marcadas por frequentes desafios às autoridades em muitos níveis. Disciplinas eram questionadas nas universidades e grupos de cidadãos protestavam pelo redesenvolvimento de planos urbanísticos. As lutas que aconteceiam fora dos espaços públicos uniram-se à revolução jovem, a demonstrações contra a guerra, protestos contra as tecnologias nucleares, campanhas pelos direitos das mulheres, entre muitos outros. Desafios às autoridades geralmente tomam lugar nos espaços públicos, e eles passam a ter uma importante dimensão política, pois os protestos são feitos em espaços públicos, e algumas vezes são sobre eles mesmos. Por fim, podemos mencionar o conceito de William H. Whyte, chamado de triangulation (triangulação, tradução nossa). Whyte (2001), usa o termo para definir o cenário onde duas pessoas que até então não se conheciam iniciam uma conversa sobre um evento externo, que serve de estímulo para o contato. O elemento que faz com o que o contato inicie pode ser um objeto físico, uma performance, um acontecimento ou até uma sinalização. O conceito de triangulação de Whyte (2001) será novamente retomado nas decisões projetuais do espaço livre proposto.

2.7 A ARQUITETURA DA PAISAGEM

A paisagem pode ser definida como uma parcela do espaço, uma categoria dentro da totalidade. De acordo com Macedo (1999): “a paisagem pode ser considerada como um produto e como um sistema. Como um produto porque resulta de um processo social de ocupação e gestão de determinado território. Como um sistema, na medida em que, a partir de qualquer ação sobre ela impressa, com certeza haverá um reação correspondente, que equivale ao surgimento de uma alteração morfológica parcial ou total” (MACEDO, 1999 apud HIJIOKA et al., 2007, p. 118).

Magnoli (2006), em sua classificação das tipologias de paisagem, classifica as “paisagens com parcelas ponderáveis de população humana de forma permanente” como os núcleos urbanos (MAGNOLI, 2006, p. 178). De acordo com a autora, são raras as paisagens

29 que não possuem intervenção humana, ainda que a intervenção seja dada através de elementos naturais. Variam as formas e as representações das intervenções, porém a grande maioria é criada pelo homem (MAGNOLI, 2006). Ainda de acordo com Magnoli (2006), as formas da paisagem são resultado da relação entre a lógica própria dos processos de suporte, que tratam-se dos sistema geológico e climático, e a lógica própria dos processos sociais e culturais, ou seja, antrópicos. De acordo com Turner (2014), o projeto de paisagem pode ser definido como: […] plano e projeto da forma da paisagem, água, vegetação, pavimentação e edifícios para criar um domínio público de qualidade, seja social, estética e ecológica. Geralmente, tratam-se de espaços livres para uso público (TURNER, 2014, p. 38, tradução nossa)5.

O paisagismo, como uma atividade de composição, possui uma longa história. Segundo Turner (2014), como uma arte, o paisagismo surgiu com o nascimento do traçado das cidades em aproximadamente 10000 a.C. A origem do termo deu-se em um livro publicado por Gilbert Laing Meason no ano de 1824, chamado Landscape Architecture of the Great Painters of Italy (Arquitetura de Paisagem dos Grandes Pintores da Itália, tradução nossa), representado na Figura 7. Com seu livro, Meason (1824) tornou popular o termo landscape architecture, ou seja, arquitetura de paisagem, que costumamos chamar de paisagismo. Como um título profissional, o cargo de paisagista surgiu com William Andrews Nersfield, em 1849. Nersfield foi um soldado, pintor de aquarelas e paisagista, sendo talvez o mais conhecido e bem sucedido paisagista britânico na metade do século XIX. E, por fim, o paisagismo tratado como uma profissão, com foco no projeto de bens comuns e públicos, data de 1862, citado por Olmsted and Vaux em uma carta sobre o Central Park na cidade de Nova Iorque, Estados Unidos.

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“Landscape architects plan and design landform, water, vegetation, paving and buildings to create a public realm with good social, aesthetic and ecological qualities.” (TURNER, 2014, p. 38)

30 Figura 6 - Capa do livro Landscape Architecture of the Great Painters of Italy, de Meason, o qual popularizou o termo “arquitetura de paisagem”, e uma figura presente no livro, respectivamente.

Fonte: GARDENVISIT, 2016.

No âmbito acadêmico, Turner (2014) menciona que o paisagismo, como uma disciplina, data do estabelecimento do Department of Landscape Architecture, na Universidade de Harvard em 1900. Atualmente, a atividade de criar paisagens combina uma visão científica com design ambiental construtivo. Turner (2014) ressalta a citação de Ian McHarg feita por Lewis Munford, em relação aos princípios do projeto de paisagem:

Aqui estão as bases para uma civilização que irá substituir o mundo poluído, destruído, dominado pela máquina, desumanizado e ameaçado por explosões que está se desintegrando e desaparecendo diante dos nossos olhos. McHarg revive a esperança de um mundo melhor (MUMFORD apud TURNER, 2014, p.84, tradução nossa)6.

Quando Meason (1824) lançou o termo ‘arquitetura da paisagem’, de acordo com Turner (2014), ele definiu dois pontos de fundamental importância: Nossos parques podem ser bonitos e nossas mansões com um design impecável, mas nada é mais raro do que ver ambos harmoniosamente conectados. O público em geral tem uma reivindicação sobre a arquitetura de um país. É uma propriedade de uso comum, a qual envolve a identidade e o caráter nacional, e nenhum homem tem o direito de definir seu gosto pessoal e suas invenções como um padrão nacional (MEASON, 1824 apud TURNER, 2014, p. 87, tradução nossa)7.

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“Here are the foundations for a civilization that will replace the polluted, bulldozed, machine-dominated, dehumanised, explosion-threatened world that is even now disintegrating and disappearing before our eyes … McHarg revives the hope for a better world” (TURNER, 2014, p. 84). 7 “Our parks may be beautiful, our mansions faultless in design, but nothing is more rare than to see the two properly connected…. The public at large has a claim over the architecture of a country. It is common property, inasmuch as it involves the national taste and character; and no man has a right to pass himself and his own barbarous inventions as a national taste […]” (MEASON, 1824 apud TURNER, 2014, p. 87)

31 Dessa forma, Meason definiu as bases para uma profissão que conecta a paisagem com a arquitetura para o público em geral: profissionais conhecidos como arquitetos paisagistas focados no projeto de espaços livres públicos. Segundo Turner (2014), em 1977, o sociólogo e historiador norte-americano Richard Sennet introduziu o termo public realm (domínio público), e definiu que “a esfera pública pode ser simplesmente definida como um lugar onde estranhos se encontram” (SENNET apud TURNER, 2014, p.87). O domínio público inclui tanto o espaço interior como o exterior. A porção dele que diz respeito aos arquitetos paisagistas é o espaço ao ar livre: o espaço público inclui todos os lugares exteriores, ligações e a forma construída dos elementos que são acessíveis fisicamente ou visualmente acessíveis, independente de sua propriedade. Esses elementos podem incluir, mas não se limitam a, ruas, caminhos para pedestres, ciclovias, pontes, praças, nós, pontos de transporte, acessos, parques, portos, recursos naturais, corredores de visão, pontos de referência e fachadas de edifícios.

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ESTUDO DE REFERÊNCIAS

As obras destacadas para esse estudo foram escolhidas atentando à semelhança de programa projetual, atividades propostas e contextos em que estão inseridas., tratando de temas como a revitalização de áreas industriais em desuso e planejamento de espaços públicos que sejam destinados à cultura e à arte. Tratam-se de dois estudos de caso: Sesc Pompéia, em São Paulo, e Parque La Vilette, em Paris, nos quais foram feitas visitas in loco, possibilitando um aprofundamento da percepção do local e sua estrutura. Além destas obras, fez-se um estudo de uma obra de referência, o Conjunto KKKK, localizado no município de Registro, no estado de São Paulo, a fim de complementar a análise de diferentes soluções propostas no âmbito da temática proposta no presente trabalho.

3.1 ESTUDO DE CASO: SESC POMPÉIA

A relevância deste estudo de caso para o presente trabalho está na diversidade de usos ligados ao cunho cultural que se deu a um antigo espaço industrial, reutilizando-o e devolvendoo para a cidade como um novo equipamento, centro de cultura, arte e diversidade. A visita ao local ocorreu no mês de novembro de 2011, e a partir dessa experiência, esse estudo de caso

32 traz, além de informações históricas e técnicas do projeto, um pouco das percepções obtidas in loco. A Figura 8 ilustra diferentes vistas do local e o Quadro 2 traz os dados gerais da obra.

Figura 7 - Diferentes ângulos do complexo SESC Pompéia, São Paulo.

Fonte: Autora, 2011.

Quadro 2 - informações gerais sobre a obra do SESC Pompéia.

Fonte: Adaptado ARCHDAILY, 2016.

O espaço do Sesc Pompéia é resultado de um requintado e dedicado projeto, que iniciou quando a arquiteta Lina Bo Bardi esteve pela primeira vez na antiga fábrica de tambores dos irmãos Mauser, na Pompéia, um bairro basicamente operário nas proximidades do centro da cidade de São Paulo. O imóvel foi adquirido pelo Sesc, que pretendia construir um centro cultural e desportivo, e convidou Lina para elaborar o projeto que tornar-se-ia um marco na vida cultural da cidade e também do país. A Figura 9 ilustra a fábrica ainda em funcionamento.

33 Figura 8 - Vista aérea da Fábrica da Pompéia antes da reforma vista do seu interior, respectivamente.

Fonte: VITRUVIUS, 2008.

Lina juntamente com os recém formados arquitetos Marcelo Ferraz e André Vainer desenvolveram o projeto do novo centro durante nove anos (1977 a 1986). As diretrizes do projeto propunham que o espaço livre dos galpões fosse mantido, tendo suas funções reprojetadas e as formas fabris fossem incorporadas por um projeto de cunho moderno. O conceito básico era buscar e edificar expressões arquitetônicas com uma forte e definida identidade.

A rua aberta e convidativa, os espaços de exposições, o restaurante público com mesas coletivas, o automóvel banido com rigor, as atividades a céu aberto culminando com a ‘praia do paulistano’, em que se transformou o deck de madeira no verão, tudo fez do SESC Pompéia uma cidadela de liberdade, um sonho possível de vida cidadã (FERRAZ, 2008, p. 3).

Dentre as decisões projetuais, concretizou-se a rua interna da fábrica, que foi trasformada em um palco cultural para as diversas manifestações, sejam espontâneas ou agendadas. Ao seguir pela rua, que possui um sutil declive, o visitante é conduzido ao cerne do complexo, onde encontra-se uma área mais reservada, a qual abriga o balneário e o complexo esportivo. No âmago do lote, Lina traz o prolongamento do ambiente urbano, quando a rua interna do SESC desenrola a cidade para seu interior, e cria um verdaderio encontro de vias, com a rua construída sobre o Córrego das Águas Pretas. A Figura 10 ilustra a presença da rua dentro do complexo, e na Figura 11 encontra-se a representação do programa projetual em planta.

34 Figura 9 - Diferentes ângulos da via interna do SESC Pompéia.

Fonte: fotos da autora, 2011.

Figura 10 - Planta baixa do complexo SESC Pompéia.

Fonte: adaptado de ARCHDAILY, 2013.

Nos pavilhões existentes, o telhados foram reformulados, recebendo nova estrutura metálica e cobertura com telhas de barro e vidro. De acordo com Marcelo Ferraz (2008), o projeto de recuperação envolveu o cuidado “em deixar todos os vestígios da antiga fábrica evidentes aos olhos dos frequentadores – seja nas paredes, nos pisos, telhados e estruturas, seja na linguagem das novas instalações [...]” (FERRAZ, 2008, p. 4). Na Figura 12 pode-se ver a estrutura dos espaços.

35 Figura 11 - Estrutura metálica e cobertura com telhas de barro e vidro.

Fonte: Autora, 2011.

Na visita ao lugar, no mês de novembro de 2011, as impressões sobre a obra de Lina foram muito marcantes. A principal característica percebida foi a diversidade (grifo nosso). Tudo no local inspira diversidade: percebe-se uma enorme gama de usos dados aos espaços, os mais diversos, e diversas pessoas fazendo uso dos mesmos. Pessoas de todas as faixas etárias, desde um enorme grupo de idosos jogando jogos de tabuleiro no mobiliário proposto em um dos pavilhões, até as crianças saindo da aula de natação. E pessoas de todos os jeitos, de todos os locais, condições econômicas e culturais. Tudo parece estar em uma harmonia que transforma-se em felicidade por ver um local tão humano em funcionamento e pulsando vida. A Figura 13 ilustra os ambientes variados do complexo, com diversificados usos.

Figura 12 - Fotos dos ambientes e seus usos.

Fonte: Autora, 2011.

Diante dessa reflexão, pode-se considerar a intervenção de Lina no SESC Pompéia um exemplar de sucesso, onde a arquitetura do passado, com origens industriais, com respeito à sua materialidade e escala, entra em contato de forma harmônica com os ares modernos e contemporâneos, sendo a obra de Lina ainda muito atual. Nos ensina que a vida de um espaço de lazer e cultura só se mantém através da empatia coletiva para com o mesmo, onde o público identifica-se com o espaço, e a arquitetura torna-se acolhedora, repleta de viva e acessível para quem a desejar. Ainda, para o arquiteto Marcelo Ferraz (2008):

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A experiência do SESC Pompéia contém uma chave para aqueles que quiserem refletir sobre o papel da arquitetura na vida dos homens. Uma chave contemporânea, ativada e ao nosso alcance. É uma experiência arquitetônica que alia criatividade a um grande rigor, liberdade com responsabilidade, riqueza com concisão e economia de meios, poética com ética. (FERRAZ, 2008, p. 4)

3.2 ESTUDO DE CASO: PARC DE LA VILETTE

Um concurso internacional, entre os anos de 1982 e 1983, buscava uma alternativa para a revitalização de áreas abandonadas e pouco desenvolvidas do mercado de carnes e matadouro em Paris, na França. Mais de 470 propostas foram feitas, e a escolhida foi a de Bernard Tschumi, cujo projeto vencedor não seguia a tradicional mentalidade para propostas de intervenção na paisagem, onde costumava-se ressaltar a paisagem e a natureza como forças dominantes. O projeto de Tschumi, o Parc de la Vilette, foi pensado para ser um local de cultura, “onde o natural e o artificial se mesclariam em um estado de constante reconfiguração e descoberta” (SOUZA, 2013). A Figura 14 ilustra registros da autora do parque, e o Quadro 3 traz as informações gerais do projeto.

Figura 13 - Elementos edificados do Parc de la Vilette.

Fonte: Autora, 2014.

Quadro 3 - Informações gerais sobre o Parc de la Vilette.

Fonte: Adaptado de ARCHDAILY, 2016.

37 O projeto foi definido com um estudo de caso pela sua forma de intervenção na paisagem, ousada e harmônica, onde revitalizou-se uma área degradada e instalou-se um equipamento cultural e ao mesmo tempo conformou-se uma atmosfera de lazer e cultura. Além disso, assume um papel escultural, ressaltando as relações entre arquitetura, paisagem e arte. A visita in loco permitiu ampliar a percepção do local e vivenciar sua realidade, através do contato com o ambiente da forma como os usuários o percebem, complementando o estudo da obra. A área situa-se na periferia de Paris, um região densa e com uma grande população imigrante. Liga-se ao resto da cidade por duas linhas de metrô e uma grande perimetral. O programa projetual da proposta deveria conter, além do parque, a Cidade das Ciências e da Indústria, a Cidade da Música e a Grande Halle. Além disso, o objetivo do concurso era a elaboração de um parque urbano contemporâneo, sendo que o projeto escolhido não deveria necessariamente depender da história precedente, mas deveria focar em questões contemporâneas e do futuro. Com uma proposta classificada como desconstrutivista pelo júri do concurso, Bernard Tschumi “busca criar um local totalmente novo, sem ligações com o antigo uso da área. [...] o arquiteto cria uma nova dinâmica, sem ligação com o passado histórico, proporcionando uma nova paisagem viva e autêntica” (SIMIONATO, 2014, p.31). O projeto do Parc de la Villete foi elaborado a partir de três principais métodos de organização, que deram origem a três camadas de intervenção: pontos, linhas e superfícies. O espaço do terreno foi enquadrado em uma malha de trinta e cinco edifícios pontuais, chamados de folies (palavra em francês que significa loucura), que o organiza espacialmente e permite uma qualidade dimensional e organizacional, de modo que cada ponto torna-se um ponto de referência. Mesmo que cada ponto possui sua individualidade, sua natureza repetitiva gera um senso de unidade aos visitantes ao longo do parque. A Figura 15 traz a implantação do parque e ilustra o processo compositivo através das camadas.

38 Figura 14 - Implantação geral e esquema compositivo do Parc de la Vilette, respectivamente.

Fonte: MANUAL DO ARQUITETO, 2014.

As linhas representam os fluxos de movimento desenhados no parque. Esses caminhos, diferentemente dos pontos, não possuem uma lógica organizacional, porém suas intersecções conduzem a pontos de interesse dentro da área do parque e da área urbana que o circunda. As superfícies, terceira camada organizacional, são representadas pelo espaço verde, que compõe 35 dos aproximados 55 hectares da área. Os espaços livres costumam ser palco de eventos, e nas épocas de calor, tornam-se um cinema ao ar livre. Bernard Tschumi concebeu o projeto como um espaço a ser definido pelo usuário, livre para diferentes interpretações. Os folies (Figura 16 e Figura 17) são edifícios de programa informal e efêmero, que muda ao longo do tempo. Cada um possui uma forma única e distinta, concebidos sem a existência de um programa designado, apenas como uma possibilidade de abrigar atividades. Recentemente alguns foram transformados em centros de informação, escritórios e restaurantes.

39 Figura 15 - Ilustração dos folies.

Fonte: ARCHDAILY, 2013.

Figura 16 - Folies.

Fontes: Autora, 2014.

A visita in loco deu-se em março do ano de 2014. A época, já final do inverno no local, proporcionou observar o parque em seu estado mais ativo e repleto de usuários. A noção espacial do parque dá-se pelo local em que o usuário se localiza e o ponto de referência do qual ele está próximo. Algumas áreas parecem ter uma escala menor de acordo com a quantidade de equipamentos agrupados, enquanto outras, os grandes epaços livres, parecem possuir escala maior, na qual toma-se como referência de localização os folies, representados na Figura 16 e Figura 17. A atmosfera do parque remete à arte e à cultura, dado seu caráter escultural através das edificações, como ilustra a Figura 18, além de obras e esculturas contempôneas que intervem no local. Além disso, nota-se uma enorme diversidade de usuários, que utilizam o espaço para fins diferentes, percebendo-se que o parque não é apenas um espaço que atende o bairro, mas a cidade de Paris em sua totalidade.

40 Figura 17 - Elementos e instalações do Parc de la Vilette.

Fontes: Autora, 2014.

3.3 OBRA DE REFÊNCIA: CONJUNTO KKKK A reabilitação do Conjunto KKKK (Figura 19), que localiza-se na cidade de Registro, no estado de São Paulo, é uma experiência de significativa relevância do escritório Brasil Arquitetura no âmbito da conservação do patrimônio histórico cultura, adotando a estratégia de dar um novo uso ao antigo edifício, onde permite a a atuação da sociedade, juntamente com a integração ao ambiente urbano e a consolidação da memória local. O projeto de intervenção de cunho contemporâneo no Conjunto KKKK é uma parcela de um projeto maior de urbanização do espaço nas proximidades do leito do rio Ribeira de Iguape, no município de Registro, o Projeto Parque Beira Rio. O Quadro 4 traz as informações gerais do projeto.

Figura 18 - Vista geral do Conjunto KKKK.

Fonte: BRASIL ARQUITETURA, 2016.

Quadro 4 - Informações gerais sobre o Conjunto KKKK.

Fonte: Adaptado de BRASIL ARQUITETURA, 2016.

41 Em um contexto histórico, por volta do ano de 1912, o governo brasileiro firmou um tratado oficial com o govenro japonês a fim de possibilitar a vinda de 2000 famílias que se instalariam no vale do rio Ribeira de Iguape, com grande potencial para o cultivo de arroz. No ano de 1922, a Companhia Ultramarina de Desenvolvimento KKKK (Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha, que em tradução para o português siginificam, respectivamente, Outra Nação, Sociedade Anônima e Companhia), vinda de Tóquio, construiu quatro armazéns e um engenho de beneficiamento de arroz, pioneiro no Brasil, tornando-se um referencial na história da imigração japonesa. A empresa manteve-se em funcionamento até o ano de 1939, quando suas ativividades foram temporariamente suspensas em decorrência da Segunda Guerra Mundial. Ao término da guerra, o engenho retomou suas atividades plenamente, então sob nova direção, sofrendo diversas adaptações que tinham fins sociais e culturais. No ano de 1987, o conjunto passou por processo de tombamento pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (SEGAWA et al., 2002). De acordo com NAHAS (2008), o processo da recuperação e readequação do conjunto iniciou-se por volta de 1990, quando Lina Bo Bardi convidou o arquiteto Marcelo Ferraz para representar Pietro Maria Bardi em um evento que seria realizado um um dos galpões do Conjunto KKKK. Após quatro anos, o escritório onde Marcelo atua, o Brasil Arquitetura, foi informalmente convidado pela Secretaria de Cultura para elaborar um proposta de projeto para o Conjunto KKKK. Então, com apoio do poder público estadual e municipal, o projeto de intervenção no conjunto teve como prioridade a restauração das edificações, com manutenção de suas características construtivas – paredes portantes de alvenaria de tijolo aparente com arcos de função estrutural, juntamente com o projeto do Memorial da Imigração Japonesa do Vale do Ribeira, o qual recebeu obras cedidas por artistas de origem nipônica, além de peças, fotografias e ferramentas doadas pela população do local, na construção de uma imagem de sua história. Além disso, o Conjunto KKKK localiza-se junto ao Parque Beira-Rio, que foi construído na tentativa de promover a recuperação ambiental das margens do rio Ribeira de Iguapé e o controle das enchentes. O parque relaciona-se com a cidade através da nova praça construída para o mercado municipal. A Figura 20 ilustra diferentes ângulos do complexo.

42 Figura 19 - Vista aérea do conjunto; vista geral e vista dos pavilhões, respectivamente.

Fonte: VALE DO RIBEIRA, 2016; BRASIL ARQUITETURA, 2016; SKYSCRAPER, 2016.

A proposta projetual trata-se de uma gama de atividades ligada à educação e cultura. Os quatro galpões térreos, que conformam dois grandes espaços com um corredor-jardim entre eles, foram transformados em centro de convivência com espaço para as mais diversas exposições. Conta também com espaço para o desenvolvimento das atividades educacionais do Centro de Formação Continuada de Gestores, da Secretaria de Educação. Para dar suporte ao programa pedagógico e administrativo foram necessárias novas instalações, as quais foram configuradas em blocos de concreto de dois pavimentos, instalados de forma livre dentro dos galpões. O programa projetual distribuído na planta baixa está ilustrado pela Figura 21.

Figura 20 – Implantação do Conjunto KKKK.

Fonte: adaptado de BRASIL ARQUITETURA, 2016.

43 O galpão de três pavimentos, que abrigava o maquinário de beneficiamento de arroz, foi destinado a abrigar o Memorial da Imigração Japonesa. Foi restaurado e na sua fachada implantou-se um volume na cor vermelha que abriga o elevador. A Figura 22 ilustra o galpão visto de diferentes ângulos.

Figura 21 - Vistas do galpão transformado no Memorial da Imigração Japonesa.

Fonte: BRASIL ARQUITETURA, 2016.

Para configurar uma conexão no conjunto, uma laje de concreto e uma marquise foram construídas, as quais apenas tangenciam as edificações, e resgatam a antiga cobertura da circulação lateral que havia no local. No local, instalaram-se ainda dois marcos contemporâneos: um escultura de Tomie Otake, o Guaracaí, que remete à uma antiga árvore que existiu na cidade e tornou-se um símbolo da sua identidade; e uma edificação de forma cúbica, branca e de alvenaria caiada que abriga um teatro. Com uma plasticidade que claramente diferencia-se da arquitetura existente, o edifício coexiste com a mesma sem gerar conflitos formais, concretizando-se como uma clara presença contemporânea sem desrespeitar a imponência dos antigos galpões. Todos os elementos estão representados na Figura 23.

Figura 22 - Elementos edificados do Conjunto KKKK.

Fonte: BRASIL ARQUITETURA, 2016.

44 4

LEITURA DO LUGAR

4.1 A CONSTRUÇÃO DE NOVAS OFICINAS E O NASCIMENTO DE UM BAIRRO: O KM 3 A história das origens do bairro denominado Km 3 mistura-se com a história da ferrovia no município e, principalmente, com a das Oficinas do Km 3. A começar pela denominação do bairro, que foi batizado de Km 3 como referência ao quilômetro de número três da ferrovia, que tem seu quilômetro zero na Estação da GARE. A instalação das oficinas trouxe uma população de trabalhadores ferroviários para a área, que acabaram instalando-se nas proximidades, dando origem ao bairro. Através de entrevistas com os atuais moradores do bairro, constatou-se que a grande maioria teve na família pelo menos um membro que foi trabalhador ferroviário, e em decorrência desse fato, instalaram-se ali. De acordo com a ADESM (2016a), no ano de 1986 o bairro já havia sido nomeado como Km 3 e era um bairro oficialmente. Já no ano de 2006, o bairro passou por significativas mudanças no seu território, sendo que sua área mais povoada foi englobada pelo bairro vizinho Nossa Senhora da Dores, além de pequenas perdas de área para os bairros Cerrito e São José. As novas áreas que foram incorporadas ao bairro tratam-se de uma porção de área de morro, onde encontra-se a Vila Bilibiu, e a área das oficinas da antiga RFFSA, as Oficinas do Km 3. A Figura 24 localiza o bairro no Distrito Sede de Santa Maria. Figura 24 - Localização do bairro Km 3 em relação ao Distrito Sede do município de Santa Maria.

Fonte: Adaptado de ADESM, 2016a.

45 Devido à sua condição geográfica, como mencionado anteriormente, Santa Maria tornouse a principal localidade ferroviário do Estado. A instalação da Compagnie Auxiliare de Chemins de Fér au Brésil trouxe uma gama de atividades do setor a serem realizadas na cidade, e as oficinas ferroviárias, que localizavam-se nas proximidades da estação de passageiros do Km 0, atendiam a maior parte da frota de trens. Nos anos seguintes, em um curto espaço de tempo, a atividade ferroviária obteve grandes proporções em todo o Estado, e a demanda de serviço das oficinas aumentou consideravelmente. A infraestrutura das mesmas passou a não comportar as atividades desenvolvidas, e as edificações onde estavam instaladas eram precárias e sem qualidade construtiva, onde ocorriam pequenos incêndios com certa frequência. No ano de 1923, um incêndio de grandes proporções destruiu grande parte das oficinas. Após o ocorrido, a Viação Férrea do Rio Grande do Sul iniciou o projeto de construção de novas oficinas, com técnicas construtivas mais atuais e seguras (FLÔRES apud FACCIN, 2009). No ano de 1925, iniciaram-se a terraplanagem e a construção dos novos pavilhões das oficinas. O terreno definido para as obras encontrava-se no km 3 da linha que ligava Santa Maria à Porto Alegre. Logo após seu início, as obras pararam e só foram retomadas dois anos mais tarde (Figura 25Figura 23), em 1927, com a construção de dois grupos de pavilhões, cada um com 60,00 x 100,00 m (TRINDADE apud FACCIN, 2009). Com as obras concluídas, as oficinas centrais, já existentes, abrigariam apenas os serviços de reparo das locomotivas, e as novas oficinas do Km 3 abrigariam, além de atividades de reparo, também a fabricação de vagões e carros. Figura 23 - Imagens da etapa de construção das Oficinas do Km 3.

Fonte: FACCIN, 2009.

A estrutura dos novos pavilhões era composta por pilares e vigas confeccionados com trilhos de ferro em desuso, e a vedação com alvenaria de tijolos aparentes, caiados em determinados períodos. A área edificada, em sua totalidade, superava os 20.000m². Nas fachadas das edificações distribuem-se, de forma harmônica, portas de madeira acabadas com

46 arco pleno e janelas confeccionadas em ferro, organizadas em fita na parte superior das paredes. A iluminação natural dos pavilhões era bastante eficiente, devido às grandes dimensões das aberturas e à presença de lanternins, que também auxiliavam na ventilação. Os vãos livres atingiam de dez a quinze metros, necessitando que a cobertura fosse sustentada por treliças de madeira e coberta com folhas de zinco. Os restos de dormentes que eram retirados e substituídos das ferrovias transformaram-se no piso dos pavilhões (FACCIN, 2009). A Figura 26 traz registros da época, no interior dos pavilhões.

Figura 26 - Imagens internas dos pavilhões, com destaque para a estrutura e iluminação natural.

Fonte: FACCIN, 2009.

O complexo foi subdividido em setores, definindo então a Oficina de Vagões, a Oficina de Pontes e a Oficina de Carros de Passageiros (Figura 27). As atividades de fabricação, reparo e montagem de peças eram distribuídas entre as oficinas. Toda a matéria-prima e os materiais diversos que eram empregados nas atividades, além de estruturas e peças que necessitavam de reparo, chegavam ao local pela ferrovia. Nas proximidades das Oficinas havia um desvio na linha férrea, o qual levava o trem para um pátio de manobra e, posteriormente, ao complexo dos pavilhões. Através de subdivisões da linha, cada componente ou material chegava à respectiva oficina à qual foi destinado (FACCIN, 2009).

47 Figura 27 - Planta de zoneamento da área das Oficinas do Km 3.

Fonte: Autora, 2016.

Ao fim da década de 1930, mais de mil operários trabalhavam nas Oficinas do Km 3. As atividades já englobavam a fabricação de uma ampla gama de artigos, e as Oficinas eram vistas com grande importância pelo Estado. Em 1962, já sendo administrada pela Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA), tinha cerca de três mil trabalhadores (ABREU, 1962 apud MARCHIORI; NOAL FILHO, 1997 apud FACCIN, 2009). No ano de 1968, todas as atividades que até o momento localizavam-se na oficinas centrais foram relocadas para as Oficinas do Km 3. Uma edificação foi estruturada especificamente para as atividades de fundição, e a Oficina de Pontes foi reformada e ampliada, após um vendaval. Com isso, houve a total desativação das oficinas centrais. Já na década de 1980, uma alteração no sistema de frenagem dos trens, que agora não empregava mais componentes metálicos, diminuiu a mão-de-obra empregada na fundição. A Oficina de Fundição já não necessitava da área e de todos os funcionários que possuia, e foi relocada em uma estrutura de menor porte, próxima à Oficina de Vagões. No local da Fundição instalou-se a Oficina de Mecanização (FACCIN, 2009).

48 Contudo, o sistema ferroviário nacional já havia entrado em um processo de crise e posterior decadência nesse período. Com a ausência de recursos financeiros, o sistema começou a decair. A falta de recursos já causava reflexo nas Oficinas do Km 3 na década de 1970, que apresentavam os sinais da falta de manutenção, o que apenas se agravou com o passar do tempo. As atividades das Oficinas prosseguiram até o ano de 1996, quando a RFFSA foi privatizada devido ao agravamento da situação do sistema ferroviário. A situação anterior à privatização era de total sucateamento, reflexo fiel da situação da infra-estrutura ferroviária brasileira. Após serem privatizadas, as Oficinas tiveram suas atividades gradativamente encerradas, sendo totalmente cessadas no ano de 2001. Um cenário de abandono e decadência após o encerramento das atividades das Oficinas do Km 3, que são definidas então como um friche industrielle. Habitações irregulares configuram-se nas áreas adjacentes às Oficinas, que pertencem à RFFSA. Nesse sentido, também pode-se ressaltar os problemas de caráter ambiental que surgem à partir do abandono e da ocupação ilegal, como sistema de esgoto clandestino, depósito de resíduos poluentes em recursos hídricos, degração da vegetação nativa e mata ciliar, depósito de lixo e resíduos nos arredores, entre outros. Além desses fatores, o patrimônio arquitetônico passou a ser depredado e saqueado, situação na qual tijolos, telhas e resíduos de madeira componentes dos antigos pavilhões tornaram matéria de construção para as casas das ocupações da vizinhança (FACCIN, 2009). A Figura 28 traz registros de 2009, demonstrando os pavilhões já muito degradados. Figura 28 - Registros da situação de abandono e depredação dos pavilhões das Oficinas do Km 3.

Fonte: FACCIN, 2009.

No ano de 2005, a fábrica de vagões Santa Fé deu início às negociações para implantar suas atividades na área onde estavam implantadas as antigas Oficinas do Km 3 (Figura 29). Gerada a partir de uma parceria entre a América Latina Logística (ALL) e a Millenium, uma empresa do Estado de São Paulo, a Santa Fé Vagões visa diminuir os custos e aumentar

49 faturamento da ALL, que começaria a produzir seus próprios vagões. Dentre as opções de escolha do local a ser implantada a nova fábrica, estavam Santa Maria e Ponta Grossa, localizada no Estado do Paraná. Então, no mês de agosto de 2005, anunciou-se que a empresa instalar-se-ia na área das antigas Oficinas. O pacote de incentivos oferecido pela prefeitura municipal e pelo governo estadual, e a posição geográfica de Santa Maria, que está próxima à Argentina, onde a ALL também atua, foram os fatores que definiram a escolha do munícipio para sediar a empresa. Por meio da Lei Municipal de Incentivo à Industrialização,o pacote de incentivos incluiu a total isenção do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), corte de 50% do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) e investimento de R$ 85.000,00 na construção do muro e das cercas que limitam o perímetro das antigas Oficinas, a fim de assegurar a segurança das novas instalações. No âmbito de incentivos estaduais, o governo ofereceu o Fundo de Operação Empresa (FUNDOPEM), com redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), e abatimento os demais impostos por até oito anos (RIGO apud FACCIN, 2009).

Figura 24 - A empresa Santa Fé Vagões já instalada e em funcionamento no espaço das antigas Oficinas do Km 3.

Fonte: FACCIN, 2009.

Dessa forma, a instalação da empresa Santa Fé Vagões ocupou parcialmente as instalações das antigas Oficinas do Km 3. Para acomodar sua infraestrutura, a empresa restaurou a antiga Oficina de Vagões, o galpão que se encontrava em melhores condições, e instalou nele sua linha de produção. O pequeno edifício que abrigava a antiga Oficina de Truques foi recuperado para transformar-se em refeitório e administração. Nesse contexto,

50 mesmo com os investimentos da empresa, os demais pavilhões permaneceram em estado de degradação, sem sofrerem qualquer cuidado ou intervenção.

4.2 O ESPAÇO DAS ANTIGAS OFICINAS DO KM 3 E A ÁREA DE INTERVENÇÃO

A área de intervenção definida para o projeto de revitalização proposto compreende a área delimitada pelos muros existentes, que conformam o terreno que então é propriedade dos arrendatários dos patrimônios das antigas Oficinas do Km 3, o Campo do Aliado e a área adjacente a ele, a qual é delimitada por uma área cercada pertencente ao poder público. A área total do espaço compreendido pelos muros delimitadores é de 136.818,13 m², e a área total de intervenção, englobando o Campo do Aliado e suas adjacências totaliza 266898,93 m² (área delimitada pela linha pontilhada branca na Figura 30). A Figura 31 traz uma vista aérea do atual espaço das Oficinas. Figura 25 – Implantação da área de intervenção.

Fonte: Autora, 2016.

51 Figura 26 – Vista aérea do atual espaço das Oficinas do Km 3.

Fonte: PIPPI, 2015.

De acordo com a implantação da área de intervenção representada pela Figura 30 podese pontuar algumas características da área. O acesso principal, atualmente, dá-se pela Avenida Osvaldo Cruz, sendo cercada por residências. Na área de acesso, e ao longo da Avenida Osvaldo Cruz, não há passeio público adequado, que encontra-se sem pavimentação, representado na Figura 32. Figura 27 – Passeio público e acesso principal às Oficinas, na Avenida Osvaldo Cruz.

Fonte: Autora, 2016; GOOGLE, 2016.

52 Nas dependências das Oficinas, ou Pátio de Vagões, como também é conhecido, há uma significativa quantidade de vegetação nativa, a qual forma massas em algumas regiões do terreno. Há também o campo de futebol pertencente à América Latina Logística (ALL), que o administra e permite que o público o utilize. O campo encontra-se em boas condições de manutenção. Já o Campo do Aliado, que também está incluído na área de intervenção, não encontra-se em adequado estado de manutenção, sendo que os moradores, através dos questionários realizados, mencionaram a falta de investimento e cuidado no local. A Figura 33 ilustra a condição dos campos atualmente.

Figura 33 – Campo de futebol pertencente à ALL e Campo do Aliado, respectivamente.

Fonte: Autora, 2016.

Algumas estruturas que compunham o complexo de Oficinas encontram-se em estado de ruínas, sendo que am algumas restam apenas algumas paredes e a estrutura da cobertura, ou até mesmo somente a pavimentação. Os pavilhões que encontram-se em estado de ruínas tratam-se do antigo Pavilhão de Fundição, antigo Pavilhão de Carros de Passageiros e o antigo Pavilhão de Pontes. Do antigo setor de Almoxarifado resta apenas vestígios do piso. A Figura 34 e Figura 35 ilustram a condição atual dos pavilhões. O setor do pavilhão da antiga Oficina de Carros onde hoje opera uma empresa, caracterizando o uso industrial do local, não pôde ser fotografado devido às restrições da empresa. Porém, o pavilhão encontra-se em bom estado de conservação, tendo suas fachadas e interior íntegros.

53 Figura 28 – Compilado de imagens dos pavilhões das Oficinas do Km 3.

Fonte: Autora, 2016.

Figura 29 – Compilado de imagens dos pavilhões das Oficinas do Km 3.

Fonte: Autora, 2016.

54 Em relação ao entorno da área de intervenção, pode-se observar que na porção mais ao norte do mapa (Figura 30) encontra-se uma área de moradias irregulares. Na Figura 36 pode-se visualizar os pavilhões das Oficinas vistos do ângulo da área dessa moradias, localizadas muito próximas à linha férrea. Na porção mais ao sul há uma zona prevalentemente residencial. Na região noroeste, encontra-se uma Área de Preservação Permanente, porém ela não está incluída na área de intervenção.

Figura 30 – Compilado de vistas da área das Oficinas do Km 3 a partir da área de moradias irregulares, nas proximidades da linha férrea.

Fonte: Autora, 2016.

A Figura 37 traz as fachadas do conjunto dos antigos pavilhões do complexo de Oficinas. Pode-se perceber o estado de degradação dos mesmos, sendo que alguns apresentamse já sem a cobertura e com patologias em suas paredes. As fachadas de cada um, com demarcação das patologias que os afetam encontram-se no ANEXO F.

55 Figura 31 – Ilustração das fachadas do conjunto de pavilhões das Oficinas do Km 3.

Fonte: Adaptado de FACCIN, 2009.

4.3 EQUIPAMENTOS CULTURAIS E ESPAÇOS PÚBLICOS NA CIDADE DE SANTA MARIA

De acordo com os dados disponibilizados pela ADESM (2016b), o Escritório da Cidade levantou e contabilizou a existência de 51 praças no município de Santa Maria no ano de 2012. A Figura 38 demonstra um mapa dos espaços livres de lazer e recreação em Santa Maria, resultado de uma análise feita no ano de 2008, sendo que foram indicadas mais praças e pequenas porções de terra remanescentes do parcelamento do solo. A cidade possui muitos espaços com potencial de investimento, o que resultaria em uma melhoria da qualidade do ambiente urbano, bem como proporcionaria maior qualidade de vida para os habitantes.

56 Figura 32 - Mapa dos Espaços Livres Intraurbanos Públicos de Santa Maria

Fonte: PIPPI; WEISS, 2009.

Figura 33 – Mapa de raios de abrangência dos espaços livres públicos do centro de Santa Maria.

Fonte: Autora.

57 A Secretaria de Juventude, esporte, Lazer, Idoso e Criança fez o levantamento de dados referentes à disponibilidade de academias públicas para a terceira idade que existiam no município no ano de 2012. Foram localizadas 10 academias que estão implantadas nos seguintes locais: Complexo Esportivo Oreco, Praça Nonoai, Parque Dom Antônio Reis, Praça dos Bombeiros, Centro Desportivo Municipal, Posto de Saúde de Santa Maria, Distrito de Boca do Monte, Distrito de Arroio do Só, Distrito de Santa Flora, Distrito do Passo do Verde. Além do levantamento das academias existentes, a ADESM (2016b) disponibiliza um lista de academias públicas a serem implantadas nos próximos anos: Praça Reinaldo Coser, Praça Ary Cechella, Praça General Osório, Praça Santa Rita, Praça Gomes Carneiro, Praça Miguel Meirelles, Praça Ernesto Botton, Praça Felipe de Oliveira, Praça Residencial Lopes, Ginásio Guarany Atlântico, Palma, Arroio Grande, Parque Itaimbé (ADESM, 2016b). No que se trata dos parques, foram listados apenas dois, sendo o Parque Itaimbé e o Parque Nonoai. Os parques Parque do Morro, Parque São Vicente Palotti e Parque Jockey Club são definidos como novas áreas a serem implantadas como parques, de acordo com a ADESM (2016b). No que se trata de museus, contabilizou-se 15 museus no município de Santa Maria, que fazem parte do Sistema Municipal de Museus (SMM). Além disso, estão presentes 32 instituições direcionadas à cultura em diversos campos, como a educação, as artes plásticas e cênicas, dança, folclore, história, música, entre outros ADESM (2016b). No universo de teatros, podemos citar como principal teatro de Santa Maria o Theatro Treza de Maio. Além dele, podemos ressaltar a existência do Teatro Universitário Independente (TUI), criado originalmente com o nome de Teatro Universitário de Santa Maria (TUSM). E, por fim, o Teatro Caixa Preta – Espaço Rozane Cardoso, que trata-se de um espaço multiuso de caráter único na região e está localizado na Universidade Federal de Santa Maria ADESM (2016b).

4.4 ANÁLISE DE CONDICIONANTES 4.4.1 Condicionantes físico – ambientais

Segundo os dados da ADESM (2016a), em um visão geral das características do município, podemos mencionar o clima temperado, chuvoso e quente tipo Cfa, no qual: C – a temperatura média do mês mais frio, entre -3°C e 18°C, e a do mês mais quente superior a 10°C.

58 f – nenhuma estação seca, úmido todo ano. a – verão quente, com temperatura média do mês mais quente superior a 22°C. A área do município está situada em uma região de transição entre o Planalto Meridional Brasileiro e a Depressão Central do Rio Grande do Sul. A área polarizada por Santa Maria é extensa e abrange fragmentos do planalto, mais precisamente as áreas de campo, pequenas áreas coloniais e uma porção da Depressão Central e da Campanha. Além disso, a cidade é parte de duas grandes bacias hidrográficas: a Bacia do Uruguai e a Bacia do Guaíba.

4.4.1.1 Clima

Segundo os dados da ADESM (2016a), o clima da Santa Maria, de acordo com a classificação de Köppen (1989), é definido como temperado, chuvoso e quente. No quadro representado pela Figura 40 encontra-se uma compilação das médias registradas no município durante 29 anos, entre 1961 e 1990. Figura 34 - Climatologia de Santa Maria, médias do período de 1961 a 1990.

Fonte: Adaptado de ADESM, 2016a.

Quanto à sazonalidade das precipitações, de acordo com SARTORI apud ADESM (2016), durante o inverno a concentração de chuvas dá-se de maneira homogênea, predominando chuvas dos sistemas frontais, que são generalizadas e contínuas. Tratando-se de

59 verão, a chuva é concentrada em períodos, classificadas como pré-frontais, sendo mais variáveis e descontínuas. A presença dos ventos no município é significativa, e, segundo Sartori (1979) apud ADESM (2016a), o vento é destaque dentre os elementos atmosféricos de Santa Maria. Apesar de apresentar certa regularidade durante o ano, em algumas ocasiões torna-se mais intenso, principalmente nos dias pré-frontais, quando, além de assumir maior intensidade, varia suas direções. Como situa-se no contato do Planalto com a Depressão Central, o município apresenta dualidade em suas características de ventilação, demonstrando velocidades variáveis (de leves a moderadas), com tendência a períodos de velocidades baixas. Porém, apenas em Santa Maria o vento conhecido por “vento norte” adquire maior intensidade, devido a sua posição na basa do Planalto (SARTORI, 1979 apud ADESM, 2016a). A topografia mais elevada onde está situada a área urbana do município, que é parte do Planalto e seus morros testemunhos, é responsável pela canalização dos ventos em direção à cidade.

4.4.1.3 Vegetação e Áreas de Preservação Permanente

Segundo os dados da ADESM (2016a), a área de Santa Maria é ocupada pelos campos sulinos e pela floresta subcaducifólia subtropical, sendo que esta última caracteriza a Serra Geral (SARTORI, 1979 apud ADESM, 2016a). O centro da cidade, o qual ocupa um ponto mais elevado, separa as mini-bacias do Rio Vacacaí-Mirim e do Arroio Cadena. O Arroio Cadena tem sua nascente no rebordo do Planalto, sendo que sua direção inicial é norte-sul. Na região oeste do município, surge o Rio Vacacaí-Mirim, que também tem sua nascente no Planalto. Além disso, Santa Maria é considerada uma cidade que detém o portal sul da Mata Atlântica. Atualmente, a porção de Mata Atlântica que existe no município é reconhecida pela Unesco como Reserva da Biosfera, a qual constitui uma enorme biodiversidade.

4.4.1.2 Relevo

De acordo com a ADESM (2016a), Santa Maria está situada em uma zona de transição entre o Planalto Meriodional Brasileiro e a Depressão Central do Rio Grande do Sul (Figura 41). O Planalto compõe a elevação de maior destaque na Serra Geral, sendo uma zona agrícola de intenso uso; e a Depressão Central compõe campos limpos e pastagens.

60 Figura 35 - Macrozoneamento ambiental do Estado do Rio Grande do Sul.

Fonte: ADESM, 2016a.

O Rebordo do Planalto configura uma área muito acidentada, onde o processo de erosão deu origem às formas montanhosas. Nos locais onde o relevo residual resistiu à erosão permaneceram os morros testemunhos isolados, como é o caso dos morros testemunhos existentes em Santa Maria: o Mariano da Rocha, o Cerrito, o Cechela e o Santo Antão. A Figura 42 representa um modelo digital do relevo da área do município de Santa Maria com a demarcação do Distrito Sede. É possível observar que a área do bairro Km 3, já anteriormente localizada na Sede, está em uma região muito próxima dos morros. Figura 36 - Modelo digital de elevação do perímetro urbano de Santa Maria. As numerações demarcadas na imagem correspondem, respectivamente, a: 1. Morro das Antenas; 2. Morro do Linck; 3. Morro Cechela; 4. Morro Cerrito; 5. Morro Mariano da Rocha.

Fonte:adaptado de PIRES E DAL’ASTA, 2011.

61 4.4.2 Condicionantes socioculturais

Em se tratando do Índice de Desenvolvimento Humano (Figura 43), de acordo com os dados do ano de 2000, Santa Maria tem um índice de 0,845, ocupando a posição de número 46 entre os municípios brasileiros. O município tem seu IDH mais elevado em relação à Educação, atingindo 0,932 (ADESM, 2016a).

Figura 37 - IDH no município de Santa Maria.

Fonte: adaptado de ADESM, 2016a.

No que se trata sobre Educação, em 2010, Santa Maria atingiu uma taxa de alfabetização de 95,53%, ocupando a 4º posição em um comparativo entra os municípios com mais de 100.000 habitantes no estado do Rio Grande do Sul. Em Santa Maria, no ano de 2000, a expectativa de vida da população era de 74,01 anos, de acordo com os dados do IBGE. Limitando as análises para o contexto do bairro onde a área de intervenção localiza-se, o bairro Km 3, pode-se observar na Figura 44 alguns fatores constatados.

Figura 38 - Gráfico de população x nº de domicílios, em 2010; e relação de porcentagem de população de mulheres e homens.

Fonte: Adaptado de CENSO, 2010.

62 Ao observar e analisar os infográficos presentes na Figura 44, é possível constatar que no ano de 2010 havia uma densidade demográfica de 2,93 habitantes por domicílio. Pode-se constatar que a maioria da população é composta por mulheres (51,6%), totalizando 1.292 mulheres, e o restante (48,4%), é composto por homens, sendo estes contabilizados em 1.212 (CENSO, 2010).

Figura 39 - Pirâmide etária da população do bairro Km 3 do município de Santa Maria.

Fonte: Adaptada de CENSO, 2010.

A pirâmide etária representada pela Figura 45, relativa à população do bairro Km 3, indica uma população relativamente jovem, com destaque para as faixas etárias entre 15 e 29 anos. Nota-se também um aumento na população com idade entre 40 e 54 anos. (CENSO, 2010)

4.5 CONDICIONANTES LEGAIS

4.5.1 Lei do Uso do Solo (LUOS)

A área foco da proposta do presente trabalho localiza-se no Distrito Sede (1º Distrito) do município de Santa Maria. De acordo com a divisão do Distrito Sede do município em

63 Macrozonas, a área de intervenção, as antigas Oficinas do Km 3, está localizada na área denominada A – Corredor de Urbanidade. Porém, no mapa de Zoneamento Urbanístico, a área está incluída na macrozona Centro (B), zona 6.c. Ainda de acordo com o zoneamento, faz divida com uma Área Natural de Preservação (macrozona H, hachurada em verde no mapa na Figura 46), que trata-se da bacia do rio Vacacaí – Mirim. As Figuras 47 e 48 trazem os índices urbanísticos definidos para a área.

Figura 40 - Localização da área de intervenção em relação à divisão em macrozonas do 1º Distrito; e localização da área de intervenção em relação ao mapa de zoneamento urbanístico.

Fonte: Adaptada de SANTA MARIA, 2009.

64 Figura 41 - Índices urbanísticos para a zona 6.c, macrozona B (Centro).

Fonte: SANTA MARIA, 2009.

Figura 42- Índices urbanísticos para a zona 1-1.c, macrozona A (Corredor de Urbanidade).

Fonte: SANTA MARIA, 2009.

65 De acordo com a Lei Federal nº 6.766 de 19 de dezembro de 1979, nomeada de Lei Lehmann, que regula o parcelamento do solo urbano, determinou-se um distanciamento mínimo de quinze metros entre qualquer tipo de edificação e a Estrada de Ferro, salvo outras exigências de legislação específica.

4.5.2 Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (PDDUA)

De acordo com as definições do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Santa Maria (PDDUA), a área das antigas Oficinas do Km 3 é considerada uma das áreas para intervenções e medidas urbanísticas, como mostra o mapa representado pela Figura 49, que localiza as Operações Consorciadas de Realização Necessária (SANTA MARIA, 2005). Figura 43 - Fragmento do Mapa de Operações Consorciadas de Realização Necessária, PDDUA.

Fonte: SANTA MARIA, 2005.

Ainda de acordo com o PDDUA, há a proposta de um Trem Turístico para a região, que visa envolver os municípios de Santa Maria, São Pedro do Sul e Itaara, de forma a aproveitar a malha ferroviária que existe na região, como forma de oportunizar o turismo relacionado ao patrimônio natural, cultural e paisagístico (SANTA MARIA, 2005). Além disso, visa preservar o patrimônio histórico da região, a partir do uso do transporte ferroviário.

66 O PDDUA também propõe o Programa de Densificação Multipolar e Inlusão Social, o qual trata dos conflitos da periferização, de áreas urbanas degradadas ou subutilizadas. Tem como principal objetivo promover a qualificação dos espaços públicos, recuperando áreas degradadas, promovendo a regularização fundiária e garantindo o direito à cidade para todos (SANTA MARIA, 2005). Dentre os projetos previstos pelo programa, existe o projeto Porto Seco, que tem como objetivo recuperar a área ferroviária degradada do Km 3 e destiná-la ao uso público, de forma a ressaltar e viabilizar as potencialidades urbanísticas do local. Isso darse-ia através de uma renovação urbana da área com a criação de um emprendimento polifuncional e um Porto Seco vinculado ao fluxo de cargas (SANTA MARIA, 2005). O Programa de Valorização da Identidade Urbana visa valorizar a identidade urbana de Santa Maria:

[...] o que significa promover a recuperação, a restauração e a manutenção de seus bens patrimoniais sejam naturais ou construídos. Também tem o intuito de valorizar, planejar, recuperar e manter os espaços públicos, as praças e parques, as áreas recreativas e de convívio assegurando a qualidade da paisagem urbana e as relações de uso democrático, fazendo com que a população reconheça seu território e assuma a sua parte (cidadão consciente) e preserve sua história e seu legado cultural. (SANTA MARIA, 2005)

O programa inclui os seguintes projetos: Laboratórios de desenvolvimento de áreas patrimoniais (Escritório do Patrimônio); Qualificação da paisagem urbana; Rede de micro espaços abertos; e Mancha Ferroviária, presentes no ANEXO E.

4.6 ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS DA ÁREA DE INTERVENÇÃO E ENTORNO

4.6.1 Topografia

Através da análise dos dados topográficos da área em estudos pode-se visualizar na Figura 50 que, em geral, é um local pouco acidentado, sendo que a porção mais central é relativamente plana e baixa, onde estão implantadas os pavilhões das Oficinas do Km 3 e também o Campo do Aliado. Na região mais ao norte, no entorno da área estudada, encontrase o Rebordo do Planalto, com elevações mais significativas as quais ultrapassam os 220 metros de altura acima do nível do mar. Já ao sul, localizam-se os morros testemunhos, que podem atingir alturas próximas a 170 metros acima do nível do mar.

67 Figura 44 – Mapa de hipsometria do Distrito Sede de Santa Maria com demarcação da área estudada.

Fonte: Adaptado de PIPPI, 2016a.

Na Figura 51, que representa a declividade do solo, pode-se perceber que a área em estudo tem uma declividade muito baixa, ficando entre 0 e 5%, sendo praticamente nula. A ausência de declividade caracteriza uma região próxima à recursos hídricos, como ocorre nesse caso, o que possibilita a ocorrência de enchentes em épocas chuvosas, que, nesse caso, atingem a área onde localizam-se as moradias irregulares. Álem disso, pode-se perceber que a área está muito próxima do limite com o relevo da Serra Geral, onde a declividade cresce significativamente. Figura 45 – Mapa de declividade do Distrito Sede de Santa Maria com a área estudada demarcada.

Fonte: Adaptado de PIPPI, 2016b.

68 4.6.2 Incidência solar e ventos predominantes

O índice de insolação no município de Santa Maria é um dos menores do Estado do Rio Grande do Sul, por conta da grande frequência de nebulosidade e nevoeiros, principalmente durante o outono e inverno. No intervalo entre os meses de junho a agosto, o valor padrão de insolação é de até 5,1 horas por dia. Já no intervalo entre dezembro e janeiro, o valor pode superar o número de 8 horas por dia. Tratando-se do fator sombreamento, observou-se que não existem edifícios em altura nas proximidades da área estudada, e, em consequência disso, não há interferência na insolação através de sombreamento. No município de Santa Maria, os ventos sopram predominantemente nas direções Leste e Sudeste, sendo que em alguns períodos do ano sopram na direção Norte (MACHADO, 1950 apud STRECK et al., 1998, p. 137). Na área a qual refere-se esse estudo a intensidade dos ventos deve ser considerada, trantando-se de uma grande área plana sem barreiras próxima que possam barrar a incidência dos ventos.

4.6.3 Vegetação e hidrografia

A área das Oficinas do Km 3 tem seu entorno muito próximo ao rio Vacacaí-mirim, sendo que no intervalo espacial entre ambos está a região de moradias irregulares. O rio Vacacaí-mirim pode ser considerado o curso d’água de maior relevância para a região, sendo que sua vazão e largura de leito são consideráveis. Assim como muitos cursos d’água do município, o Vacacaí-mirim é destino de dejetos sanitários, devido à falta de infraestrutura sanitária na região das moradias irregulares. Além do próprio Vacacaí-mirim, existem outros cursos d’água na área, onde pode-se destacar a Sanga da Tela, que encontra-se mais ao norte no espaço das Oficinas. A Figura 52 traz a representação da legislação ambiental aplicada ao local, com detaque para a área adjacente do rio Vacacaí-mirim e à Sanga da Tela, que devem ter um afastamento de 50 metros de raio a ser respeitado.

69 Figura 46 - Mapa de aplicação da legislação ambiental, com destaque para o afastamento a ser respeitado (buffer) relativo à cada item.

Fonte: Adaptado de PIPPI, 2016c.

Na Figura 53, que trata-se do mapa de áreas verdes e recursos hídricos, pode-se perceber que os afastamentos previstos para a região hidrográfica do rio Vacacaí-mirim e Sanga da Tela não estão sendo respeitados, podendo-se observar a presença de edificações muito próximas às margens. Neste mesmo mapa, observa-se a presença significativa de áreas de vegetação, tanto na área das Oficinas do Km 3 como no seu entorno. Há a presença da mata ciliar da Sanga da Tela no espaço relativo às Oficinas, além de vegetação ao longo da Avenida Osvaldo Cruz e no entorno do Campo do Aliado.

70 Figura 47 – Mapa de áreas verdes e recursos hídricos.

Fonte: Autora, 2016.

4.6.4 Usos

Ao observar a Figura 54, que trata-se de um mapa de usos do solo por grandes áreas, percebe-se a predominância do uso urbano do solo no entorno da área. Porém, pode-se destacar a presença de uma significativa área de mata e solo exposto na área estuda, além da vasta área de mata presente nas elevações da Serra Geral, na porção mais ao norte do mapa.

71 Figura 48 - Mapa de uso do solo em grandes áreas.

Fonte: Adaptado de PIPPI, 2016d.

No que se trata de usos do solo em uma escala menor, como o uso de cada edificação, pode-se observar na Figura 55 o caráter da área edificada. Ao analisar o mapa, pode-se concluir que o uso predominante no entorno é o residencial, havendo algums atividades comerciais pontuais, além da presença de trés edificações de uso religioso e duas edificações de uso institucional, que tratam-se de escolas. Como equipamentos classificados como uso para lazer, identificou-se apenas os dois campos de futebol localizados dentro da área de intervenção. Os dois edifícios classificados como uso cultural referem-se a um museu e um ateliê de artesanto.

72 Figura 49 - Mapa de usos do solo por edificação.

Fonte: Autora, 2016.

4.6.5 Mobilidade urbana Em relação à questão de mobilidade urbana, analisou-se a relação da área em estudo com a hierarquia viária do município, representada na Figura 56. A área das antigas Oficinas do Km 3 tem uma de suas laterais delimitadas pela Avenida Osvaldo Cruz, que, de acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo (SANTA MARIA, 2009), é caracterizada como uma Via Arterial (VA), sendo um conexão com a zona Leste do município. Através da Avenida Osvaldo Cruz dá-se o principal acesso ao espaço das Oficinas atualmente.A área está próxima também de uma Via Estrutural (VE), a BR-158/BR - 392, que conecta o município com a região noroeste

73 do Estado. As demais vias que cercam a área são classificadas como ruas locais, atendendo um baixo fluxo local de veículos. A característica mais marcante da área, possivelmente, é a presença da linha férrea nas suas dependências, onde ainda há fluxo de trens apenas de carga. A presença do trilho é um elemento condicionante no processo projetual de extrema relevância, devendo ter seu devido raio de distanciamento respeitado. De acordo com o mapa da Lei de Uso e Ocupação do Solo (SANTA MARIA, 2009), existe a previsão da implantação de uma estação férrea na área.

Figura 50 - Mapa de hierarquia viária municipal com demarcação da área estudada.

Fonte: Adaptado de SANTA MARIA, 2009.

Analisou-se, também, a disponibilidade de transporte público para a área estudada. Fezse um levantamento das linhas que passam nas ruas próximas e elaborou-se um mapa esquemático com o trajeto e os pontos de parada das mesmas (Figura 57). Pode-se perceber que a região possui uma considerável oferta de transporte público. Diversas linhas incluem as proximidades da área em seu trajeto. Porém, as linhas que incluem a área diretamente são a Carolina – São José, também chama de Km 3 – São José, que percorre a Avenida Osvaldo Cruz e possui ponto de parada muito próximo ao atual acesso às Oficinas do Km 3; e também a linha

74 Vila Schirmer, que percorre a região mais ao norte da área. Pode-se observar uma total ausência de transporte público na área congruente aos trilhos, que trata-se de uma região de moradias irregulares. Figura 51 - Mapa das linhas de transporte público e paradas no entorno da área estudada demarcada.

Fonte: Adaptado de OpenStreetMap, 2016.

4.7 METODOLOGIAS DE ANÁLISE SOCIOCULTURAL E ESPACIAL

Além da compilação e análise de dados sobre a área, para ter-se uma leitura do lugar de maneira universal, são necessárias formas diretas de contato com a estrutura e os habitantes locais, de forma a compor um panorama de percepções acerca da área em estudo. Esse panorama é essencial para o processo projetual na medida em que define condicionantes, potencialiades e fragilidades. Para isso, utilizou-se as seguintes metodologias descritas.

75 4.7.1 Mapas mentais “Cada homem leva na mente uma cidade feita apenas de diferenças, sem figuras nem formas, e as cidades particulares a recheiam.” Ítalo Calvino

O foco desta etapa metodológica é analisar o espaço das Oficinas do Km 3 e seu entorno e relação com o bairro através da percepção dos moradores da região. Sob o enfoque Humanista – Cultural, o local é analisado em uma perspectiva qualitativa. E, além disso, segundo Kozel (2007), com um aporte fenomenológico no estudo que abraça investigações com experiências vividas. A linha de pensamento nascida na Geografia, denominada Humanista – Cultural, tem como interesse as manifestações culturais de diferentes grupos humanos em relação à organização do espaço. Em conjunto com o aporte fenomenológico, busca-se obter resultados menos exatos e mais humanos sob a percepção de um espaço. De acordo com Peixoto apud Lima e Kozel (2009):

O rigor é próprio das ciências descritivas [...], a fenomenologia [...] se ocupa da descrição das vivências, [...] por natureza inexata; sua preocupação é com o rigor, com a fidelidade ao real’. Desse modo, propõe superar os pré-conceitos, as aparências e o imediatismo. ‘Essa inexatidão é proveniente da própria natureza do [...] mundo humano -, que é complexo plural e inconcluso (PEIXOTO apud LIMA E KOZEL (2009, p.209).

As diferentes percepções do espaço por cada indivíduo são representadas pela imagem desde a pré-história, quando a linguagem simbólica surgiu para registrar cenas cotidianas. De acordo com Lima e Kozel (2009), as possibilidades de representação do espaço, ainda que normatizadas pela técnica em algumas sociedades e culturas, ainda são construções simbólicas, que são chamados mapas mentais ou cognitivos. “Os mapas mentais são desenhos concebidos a partir das observações sensíveis, da experiência humana no lugar e não se baseiam em informações precisas e rigorosamente estabelecidas” (LIMA E KOZEL, 2009, p. 211). Ainda de acordo com as autoras, a nossa existência é intermediada por símbolos. De acordo com Tuan apud Lima e Kozel (2009, p.211), “o homem possui uma capacidade altamente desenvolvida para o comportamente simbólico”, e esse fator pode ser apropriado pelos campos de estudo para dar lugar às expressões dos sujeitos.

76 Diante dessas definições, através dos mapas mentais, busca-se obter percepções da experiência geográfica de cada indivíduo, de acordo com sua vida, suas práticas e relações com os lugares e as pessoas. Sob essa perspectiva, Kevin Lynch, na década de 1960, foi pioneiro tratar da necessidade da representação mental do ambiente, através de seus estudos sobre a imagem das cidades. (DE PAULA, 2010) Através de seu trabalho, ele uniu conceitos que se referem à espacialização das cidades, como a forma e a escala, a elementos que estruturam a percepção e experiência individual de quem as vive (LYNCH, 2011). Seu objetivo era unir seus resultados metodológicos às práticas projetuais de planejamento urbano. Dessa forma, Lynch tornaria visível que a imagem das cidades feita por cada indivíduo pode contribuir para que os espaços sejam mais agradáveis e harmoniosos. De acordo com o autor, “parecer haver uma imagem pública de qualquer cidade que é a sobreposição de imagens de muitos indivíduos” (LYNCH, 2011, p. 19). Segundo Kohlsdorf (1996), essa imagem pública a qual Lynch se refere, pode ser obtida tanto pela sobreposição de mapas mentais quanto por meio de procedimentos estatísticos, que demonstram a incidência, ausência e predominância de diversos elementos. Ainda é possível munir-se de comparações de mapas mentais com imagens aerofotogramétricas para buscar os aspectos coincidentes com as imagens formadas por pessoas. No presente trabalho, a aplicação do método dos mapas mentais fez-se em diferentes faixas etárias, e com diferentes formas de abordagem. Em um primeiro momento, aplicou-se a metodologia em duas turmas da Escola Estadual Celina de Morais, e, em um segundo momento, os mapas foram requisitados ao final dos questionários respondidos pelos moradores da área. Em todas as formas de abordagem para a aplicação da metodologia, antes de iniciar-se a abordagem, alguns questionamentos foram colocados, como: Como você sente e imagina o bairro/espaço das Oficinas? Você gosta? Por quê? Como é? O que você faz lá? O que você sente quando vai ou passa nesse espaço? Os questionamentos são para despertar sensações e memórias enquanto acontece a formação de um percurso imaginário pelo espaço. Na Escola Estadual Celina de Moraes, localizada nas proximidades do espaço das antigas Oficinas do Km 3, a metodologia foi aplicada nas turmas de 1º e 2º ano, onde estudam crianças na faixa etária entre 7 e 8 anos de idade. Nesse caso de aplicação da metodologia, prosseguiu-se da seguinte forma: após a explanação inicial da atividade e questionamentos iniciais, requisitou-se que cada um desenhasse livremente suas lembranças. O material para desenho foi distribuído. O ideal é que se posso utilizar cores para as representações, em uma folha branca, sem linhas, e utilizada no sentido horizontal. Então as crianças produziram

77 imagens, de acordo com a técnica que definiram, e ao fim inseriram seu nome e idade, requisito para as classificações de análise. Alguns dos mapas feitos, compilados nas Figuras 58 e 59, estão representando os principais pontos lembrados pelos entrevistados e pelas crianças. As Figuras 60, 61 e 62 ilustram as nuvens de palavras com os locais e sentimentos mais lembrados através dos mapas mentais. Figura 52 – Compilado de mapas mentais feitos em conjunto com os questionários.

Fonte: Autora, 2016.

78 Figura 53 – Compilado de mapas mentais feitos nas turmas de 1º e 2º ano.

Fonte: Autora, 2016.

79 Figura 54 - Elementos mencionados nos mapas mentais feitos na escola.

Fonte: Autora, 2016.

Figura 55 - Elementos mencionados nos mapas mentais feitos nos questionários.

Fonte: Autora, 2016.

Figura 56 - Elementos mencionados em ambas aplicações.

Fonte: Autora, 2016.

80 4.7.2 Questionários

Para esta etapa de análise, elaborou-se um questionário (Figura 63) para ser aplicado junto a população que vive nas adjacências da área em estudo. Os questionários foram aplicados entre os meses de maio e junho no entorno a área das Oficinas do Km 3, principalmente na Avenida Osvaldo Cruz e na área onde localizam-se as moradias irregulares.O método utilizado foi através de uma análise qualitativa, por meio de perguntas abertas, e análise quantitativa, com perguntas fechadas. As perguntas foram feitas diretamente aos moradores, sendo o questionário necessariamente aplicado de forma direta a cada um, pois ao fim das perguntas, o morador era instigado a fazer um mapa mental da área. Figura 57 – Questionário elaborado para análise qualitativa e quantitativa.

Fonte: Autora, 2016.

81 Para essa análise, obteve-se 46 respostas ao total. A Figura 58 traz o perfil dos entrevistados, que, como pode-se perceber através do infográfico, foram em sua maioria mulheres com mais de 50 anos de idade. Além disso, pode-se constatar que a maior parcela dos moradores vive na região há um tempo significativo. Para a aplicação do questionário, as faixas de tempo foram divididas de forma a classificar as respostas, porém alguns moradores estão na área há mais de 60 anos. Quando questionados sobre há quanto tempo vivem ali, 50% dos entrevistados mencionou estar ali por conta de ter ou ter tido um familiar ferroviário que trabalhou nas Oficinas do Km 3. A partir dessa informação, pode-se perceber que a origem do bairro deu-se com a instalação das Oficinas, que trouxe os trabalhadores e suas famílias para o local. A Figura 64 traz um infográfico com o resumo das características dos entrevistados.

Figura 58 - Perfil dos entrevistados.

Fonte: Autora, 2016.

Quando questionados sobre a existência de espaços públicos de lazer na região, a grande maioria disse não existir. As respostas positivas relataram que os equipamentos existentes muitas vezes estão atendendo uma demanda a qual não foram destinados ou não tem qualidade alguma para isso. O infográfico representado pela Figura 65 demonstra esses resultados, juntamente com os resultados dos questionamentos sobre a existência de atividades culturais e artíticas na região. A maior parcela respondeu que não existem atividades do gênero, e as respostas positivas indicaram que não há locais adequados e preparados para isso, além de não

82 haver diversidade e interatividade nas atividades propostas. Juntamente com as respostas, os moradores comentaram que a maioria das atividades aconteceu ou acontece por determinado período de tempo e é cessada, por não haver disponibilidade de local, de material ou de quem gerencie e ministre a atividade.

Figura 59 – Infográfico com resultados para os questionamentos sobre espaços público de lazer e atividades culturais e artísticas.

Fonte: Autora, 2016.

Quando questionados se possuem contato com alguma expressão artística, apenas 30% dos moradores respondeu positivamente, sendo que as atividade mencionadas foram dança, capoeira e artesanato, as quais não acontecem mais ou acontecem com pouca frequência. Quanto à existência de oficinas e/ou ateliê de artesanato e/ou arte na região, a maioria dos entrevistados respondeu que não há nada do gênero. As respostas positivas mencionaram que algumas atividades são desenvolvidas no lonão da comunidade (localizado na área de moradias irregulares), na igreja local e na creche. E, ainda, em resposta ao questionamento sobre a existência de alguma feira e/ou comércio local, a grande maioria respondeu que não existe. As respostas positivas mencionaram que algumas vezes moradores comercializaram na entrada das Oficinas do Km 3 o artesanato produzido na comunidade, e que os vizinhos vendem alguns

83 produtos exporadicamente. Uma moradora comentou que precisa ir vender seus produtos no Brique que acontece na Vila Belga, ou em outros locais quando há a possibilidade, pois não há possibilidades na região. Os dados relativos a esses questionamentos estão representados no infográfico da Figura 66. Figura 60 – Infográficos de resultados dos questionamentos sobre o contato com expressões artísticas, a existência de oficinas e ateliês, e feiras e comércio local.

Fonte: Autora, 2016.

Os entrevistados foram instigados a mencionar as atividades culturais e/ou artísticas que gostariam que existissem na área ou que pudessem praticar. As atividades relatadas foram compiladas e geraram a nuvem de palavras da Figura 67.

Figura 61 – Nuvem de palavras mencionadas em relação a atividades culturais e/ou artísticas que os entrevistados gostariam que existisse na região.

Fonte: Autora, 2016.

84

Os entrevistados foram também questionados sobre o que representaria de melhor forma a identidade no bairro Km 3. Essa questão teve como objetivo captar a percepção dos moradores acerca do ambiente onde vivem e ressaltar pontos fundamentais no imaginário coletivo. O resultado gerou a nuvem de palavras da Figura 68. Percebe-se que a maioria dos entrevistados não soube dizer, e os pontos mais citados foram o espaço das Oficinas do Km 3, o museu Diácono João Luiz Pozzobon, a capela e a creche Estação dos Ventos. Figura 62 – Nuvem de palavras resultada do questionamento sobre o que representa a identidade do bairro Km 3.

Fonte: Autora, 2016.

No método de análise quantitativo, foi questionado se o entrevistado conhece e utiliza o espaço das Oficinas do Km 3 e o Campo do Aliado, respectivamente. Caso a resposta fosse positiva, questionou-se qual o uso é dado para o local. Os resultados estão representados pelo infográfico da Figura 69. Figura 63 – Infográfico sobre reconhecimento e uso do espaço das Oficinas do Km 3 e do Campo do Aliado.

Fonte: Autora, 2016.

85 Dentro das análises qualitativas, buscou-se um aprofundamento no imaginário coletivo quanto ao espaço das Oficinas do Km 3 e do Campo do Aliado. Para isso, os entrevistados foram questionados se cada espaço representava um significado e/ou despertava lembranças. Além disso, foram instigados a descrever cada local em 3 palavras que a eles remetessem. Os resultados geraram as nuvens de palavras representadas nas Figuras 70, 71, 72 e 73.

Figura 64 – Nuvem de palavras gerada a partir das palavras mencionadas pelos entrevistados sobre os significados e lembranças das Oficinas do Km 3.

Fonte: Autora, 2016.

Figura 65 – Nuvem de palavras gerada a partir das palavras citadas pelos entrevistados para definir o espaço das Oficinas do Km 3 em três palavras.

Fonte: Autora, 2016.

86 Figura 66 - Nuvem de palavras gerada a partir das palavras mencionadas pelos entrevistados sobre os significados e lembranças do Campo do Aliado.

Fonte: Autora, 2016.

Figura 67 - Nuvem de palavras gerada a partir das palavras citadas pelos entrevistados para definir o espaço das Oficinas do Km 3 em três palavras.

Fonte: Autora, 2016.

Por fim, os entrevistados foram questionados se imaginam um novo uso para a área que engloba as antigas Oficinas do Km 3 e o Campo do Aliado. Muitos disseram que o local está muito abandonado e compõem um cenário de tristeza, porém foi ressaltado que poderiam imaginar com total liberdade, sem considerar as possibilidades e impedimentos de concretização. Assim, os novos usos imaginados geraram a nuvem de palavras representada pela Figura 74.

87 Figura 68 – Nuvem de palavras gerada a partir dos novos usos imaginados para a área das antigas Oficinas do Km 3 e Campo do Aliado.

Fonte: Autora, 2016.

A aplicação da metodologia de análise através dos questionários foi fundamental para a construção e delimitação da identidade e do imaginário do bairro Km 3 e da área das antigas Oficinas e Campo do Aliado. Os locais, lembranças e fatores lembrados serão de fundamental relevância para a elaboração de diretrizes projetuais para a revitalização do espaço livre das antigas Oficinas do Km 3.

4.7.3 Fichamento/inventário

Os edifícios históricos, através do desgaste natural, sofrem processo e degradação, além de passarem por outras ações, como vandalismo, poluição, falta de manutenção e fatores climáticos, como ventos e chuvas. Preservar essas representações concretas da história não é uma atividade fácil. Como uma maneira de possibilitar e facilitar o acesso à preervação desses bens, pode-se utilizar o sistema de inventariação, que nada mais é do que um levantamento e registro das características do bem, caracterizando-se como “uma operação permanente, dinâmica e sistemática, visando o cadastro de manifestações humanas, em suas diferentes criações espontâneas e formas, e de potencialidades naturais” (IPAC, 201 apud. MARTINS, 2013). De acordo com o Iphan (2016), inventário é o primeiro passo para o reconhecimento da importância de um bem.

88 Pode-se ressaltar ainda o relato da Declaração de Amsterdã sobre a importância dos inventários como fundamento para a conservação:

Seria desejável que esses inventários fossem largamente difundidos, notadamente entre as autoridades regionais e locais, assim como entre os responsáveis pelo planejamento físico-territorial e pelo plano urbano como um todo, a fim de chamar sua atenção para as construções e zonas dignas de serem protegidas. Tal inventário fornecerá uma base realista para a conservação, no que diz respeito ao elemento qualitativo fundamental para a gestão dos espaços (IPHAN, 1995, apud MARTINS, 2013).

Diante disso, fez-se a inventariação dos pavilhões das antigas Oficinas do Km 3, a fim de reconhecer suas atuais características enquanto edificação, como aporte para a proposta projetual, e para ressaltar sua importância como patrimônio histórico do município de Santa Maria, na tentativa de buscar visibilidade para o conjunto de edificações. As fichas foram retiradas do Sistema Integrado de Conhecimento e Gestão (SICG), que se trata de uma ferramente de apoio desenvolvida pelo Iphan, com a responsabilidade de gerir e proteger o patrimônio cultural, reunindo informações sobre as cidades históricas brasileiras. As fichas referentes ao inventário das oficinas encontra-se no Apêndice A.

4.5 SÍNTESE DE RESULTADOS

Através da aplicação das metodologias de diagnóstico, do levantamento de dados da região através de pesquisa e da percepção dos autores, elaborou-se um mapa síntese dos pontos nodais e sensoriais da área (Figura 75). No mapa estão marcados pontos que foram mencionados ou percebidos, bem como sua característica sensorial.

89 Figura 69 – Mapa síntese de pontos nodais e sensoriais.

Fonte: Autora, 2016.

Na análise do mapa gerado, pode-se perceber que os locais mais presentes no imaginário urbano local é o espaço das Oficinas do Km 3 em si e o Campo do Aliado. Esses foram os locais mais lembrados e comentados durante as entrevistas, fosse através de alguma lembrança, elogio ou reclamação. O Campo do Aliado foi mencionado como sede de campeonatos de futebol e jogos ocasionais, e muito mencionado na lembrança da infância dos moradores. Também foi lembrado como o local em que a grande maioria leva os filhos para brincar. Porém, há um sentimento de insatisfação com o local por não haver devida manutenção e cuidado, sendo que alguns moradores o definiram como “jogado”, no sentido de esquecido. O espaço das Oficinas do Km 3 em si também foi mencionado por meio das lembranças de infância dos moradores, sendo que metade da população entrevista teve ou tem algum familiar que foi trabalhador ferroviário. Por conta disso, o espaço é uma figura muito importante

90 no imaginário local, considerando-se que a região foi habitada em função da instalação das Oficinas. Cada entrevistado que mencionou o espaço contou alguma história ou lembrança de sua infância com relação ao local. As Oficinas também despontaram como um local com potencial patrimonial, sendo que há um desejo explícito por parte da população que este receba cuidados. A insatisfação da área, mencionada por moradores instalados em uma área muito próxima do pavilhão onde atualmente há uso industrial, é em relação ao barulho e à movimentação fabril causada pela empresa em funcionamento no local. Percebe-se que a área no entorno das Oficinas do Km 3 é prevalentemente residencial, tornando-se inadequada a presença de um uso industrial na região. Além disso, há uma insatisfação com a área que permeia a ferrovia e que dá acesso a moradias irregulares, sendo que não há pavimentação das vias e apresenta grandes porções de depósito de lixo na área. Outros locais que foram mencionados com frequência pelos moradores foram a Escola Estadual de Ensino Fundamental Professora Celina de Morais, a Casa Museu João Luiz Pozzobon e a capela localizada junto ao ambulatório João Luiz Pozzobon. Além disso, destacase também a paisagem natural da área, com a referência à vista para os morros e o nascer do sol, e as áreas de vegetação correspondentes à mata ciliar do rio Vacacaí-mirim. Por fim, destaca-se novamente a lembrança da ferrovia e o sentimento de nostalgia por parte dos moradores que vivem na área há mais tempo. Ao serem questionados sobre o espaço das Oficinas, a grande maioria abriu um sorriso e mencionou o quão bom foi o tempo em que estavam em funcionamento. Através da análise de pontos nodais e sensoriais da área, pode-se ter uma maior sensibilidade para com as decisões projetuais, sendo de extrema valia o contato com a comunidade local e com o ambiente urbano da área, aprofundando o conhecimento do imaginário local.

5

PROPOSTA

5.1 APRESENTAÇÃO DA PROPOSTA

Diante das análises e diagnósticos feitos da área a ser trabalhada, propõe-se uma revitalização paisagística para os espaços livres da área das antigas Oficinas do Km 3 e suas

91 adjacências, a fim de torná-lo um espaço para cultura, arte, lazer e recreação, itens os quais mostraram-se em evidente estado de deficiência através dos diagnósticos realizados. A proposta irá incluir todo o paisagismo da área, que compreende um plano de proposta de novos usos, traçados, locais de estar, mobiliário urbano, iluminação, remanejo e implantação de massas de vegetação, bem como definição e inclusão de novas espécies, a fim de compor uma nova paisagem harmônica para um local de relevância histórica e patrimonial para o município. Além disso, proporcionar a conexão de forma universal com o ambiente urbano, para que, além de atender às necessidades dos moradores da região, o espaço possa assumir o caráter de um parque de bairro, com um raio de abrangência de 1000 metros (PIPPI et al., 2011), o qual terá a capacidade de tornar-se um espaço livre público que compreenda atividades ativas e passivas. Com isso, busca-se também a valorização e a consolidação das Oficinas do Km 3 enquanto bem de valor histórico e patrimonial para o município de Santa Maria, ressaltando a memória de caráter ferroviário e proporcionando visibilidade à sua importância e beleza enquanto uma marca da história edificada na linha do tempo.

5.2 PÚBLICO – ALVO

Considera-se como público alvo da proposta os moradores da região que convivem diariamente com o espaço das antigas Oficinas e demonstram o desejo de um novo uso para o local, bem como possuem carência em equipamentos de lazer e recreação na área, e também todos os cidadãos da área contemplada pelo raio de antendimento do parque de bairro, que inclui o incremento de parques para com toda a região central do distrito Sede de Santa Maria. Além disso, considerando o âmbito turístico, a região compõe uma importante parcela da história do município, e está no caminho da linha férrea, a qual é visada para futuros investimentos turísticos, patrimoniais e culturais, podendo tornar-se um ponto atrator nesse contexto. Em termos de faixas etárias e tipos de público, todas as idades serão contempladas pelos equipamentos propostos, que serão diversificados e adequados para cada necessidade diagnosticada através do contato com a população.

92 5.3 DIRETRIZES PROJETUAIS

A partir das análises e diagnósticos feitos na área de intervenção, pode-se identificar questões problemáticas no ambiente, e a partir destes problemas pode-se elaborar diretrizes projetuais, bem como definir os objetivos almejados por este projeto. Em um âmbito de diretrizes gerais e fundamentais, definiu-se a concepção de um espaço público livre de acesso universal, que proporcione aos cidadãos o direito de acesso à cultura, arte e lazer, e a valorização e consolidação do caráter patrimonial de identidade ferroviária da área de intervenção como um importante item do imaginário urbano local. Os seguintes quadros sistematizam os problemas encontrados, objetivos a serem atingidos, público alvo da intervenção e diretrizes para a macro, meso e micro escalas. Quadro 5 – Quadro resumo de problemas, objetivos, público alvo e diretrizes para a macroescala.

Fonte: Autora, 2016.

93 Quadro 6 - Quadro resumo de problemas, objetivos, público alvo e diretrizes para a mesoescala.

Fonte: Autora, 2016.

94 Quadro 7 - Quadro resumo de problemas, objetivos, público alvo e diretrizes para a microescala.

95 (continuação)

Fonte: Autora, 2016.

96 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os diagnósticos e análises do local, juntamente com o levantamento de dados históricos, e a relação com os aportes teóricos, ressaltou a importância que o espaço das Oficinas do Km 3 tem no imaginário urbano. Pode-se observar também a relevância deste na história do município de Santa Maria, que tem sua linha do tempo conectada com a ferrovia. A área em questão pôde ser percebida como um grande potencial para um espaço livre público, capaz de possibilitar aos moradores da região o acesso a equipamentos de lazer, recreação e cultura, os quais apresentaram-se deficientes ou inexistentes na área. Todo cidadão, dentro do seu exercício de cidadania, tem direito ao lazer e à cultura, além de espaços onde possa relacionar-se com outros cidadãos, exercendo também seu direito à vida pública. A leitura das dinâmicas e pontos sensoriais da área indicou um espaço residencial muito carente no que se trata de espaços para lazer e recreação, além da falta de local para o desenvolvimento de atividades culturais por parte dos moradores, que muitas vezes tomam partido de uma iniciativa que logo é impedida, seja por falta de oportunidades ou espaço físico. Demonstrou-se também uma aréa rica em memórias relacionada ao espaço das Oficinas do Km 3, e com um desejo explícito de que a área possa voltar a ter vida, tendo a comunidade como parcela integrante, como foi nos tempos áureos de seu funcionamento. Por fim, a proposta de revitalização paisagística na microescala almeja atender às necessidades da comunidade que tem um apreço, e até mesmo um carinho, pela área de intervenção definida. Busca-se, através do aporte da presente pesquisa, viabilizar a valorização de um importante patrimônio do município através de um novo uso para mesmo, ressaltando sua aura artísitica e cultural, em um espaço pensado para todos.

97 7

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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100 SANTA MARIA. Lei complementar nº 039, de 29 de dezembro de 2005. Plano diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Santa Maria. Santa Maria, 2005. ______________. Lei complementar n° 072 de 04 de novembro de 2009. Lei de uso e ocupação do solo. Santa Maria, 2009. RECHIA, Aristilda A. Santa Maria: Panorama Histórico-Cultural. Santa Maria: Associação Santa-Mariense de Letras, 1999. RIO GRANDE DO SUL. Atlas Socioeconômico Rio Grande do Sul. Agência Gaúcha de Fomento, 2002. . Disponível em Acesso em 4 jun. 2016. ____________________, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE). Sítio Ferroviário de Santa Maria. Dísponível em: Acesso em 5 mai. 2016. SANTOS, Milton. Técnica, espaço, tempo: globalização e meio técnico-científico informacional. São Paulo: Edusp, 2008. _______________. Espaço do Cidadão: O Vol. 8. São Paulo: Edusp, 2007 SANTOS, Miriam; ZANINI, Maria Catarina Chitolina. Ferrovias, etnicidade e processos migratórios: ascensão social e alteridades no mundo do trabalho. Revista de Ciências Sociais – Política e Trabalho, v. 2, n. 37, 2012. SEGAWA, Hugo M.; FANUCCI, Francisco P.; FERRAZ, Marcelo Carvalho. O conjunto KKKK. Grupo Takano, 2002. SERPA, Angelo. O espaço público na cidade contemporânea. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2014. SIMIONATO, Thaís Barrera. Bernard Tschumi e o Parc de La Villete. Trabalho final de graduação. Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2014. SOUZA, Eduardo. Clássicos da Arquitetura: Parc de la Villette / Bernard Tschumi, 2013. ArchDaily Brasil. Disponível em Acesso em 23 mai. 2016. STÉDILE, Cristiane Campos. FERNANDES, Morgane Alves de J. Urbanismo Culturalista: Camillo Sitte, Ebenezer Howard e Raymond Unwin. Universidade do Estado do Mato Grosso, Barra do Bugres, 2011. STRECK, N. A. et al. Danos físicos em estufas plásticas causados pelo vento em Santa Maria, RS. Ciência Rural, v. 28, n. 1, mar. 1998. Disponível em: . Acesso em 05 jun. 2016.

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102 APÊNDICE

103 APÊNDICE A – FICHAMENTOS DE INVENTARIAÇÃO DOS EDIFÍCIOS DO CONJUNTO DAS OFICINAS DO KM 3 DE ACORDO COM O SICG

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111 ANEXOS

112 ANEXO A – COMPILAÇÃO DE ARTIGOS PERTINENTES DA LEI Nº 11.483, DE 31 DE MAIO DE 2007

Dispõe sobre a revitalização do setor ferroviário, altera dispositivos da Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001, e dá outras providências.

Art. 2º A partir de 22 de janeiro de 2007: I - a União sucederá a extinta RFFSA nos direitos, obrigações e ações judiciais em que esta seja autora, ré, assistente, opoente ou terceira interessada, ressalvadas as ações de que trata o inciso II do caput do art. 17 desta Lei; e II – os bens imóveis da extinta RFFSA ficam transferidos para a União, ressalvado o disposto nos incisos I e IV do caput do art. 8º desta Lei. (Inciso com redação dada pela Lei nº 11.772, de 17/9/2008) Art. 3º Parágrafo único. Fica a União autorizada a utilizar bens nãooperacionais oriundos da extinta RFFSA para promover a quitação da participação dos acionistas minoritários, mediante dação em pagamento. Art. 4º Os bens, direitos e obrigações da extinta RFFSA serão inventariados em processo que se realizará sob a coordenação e supervisão do Ministério dos Transportes. Parágrafo único. Ato do Poder Executivo disporá sobre a estrutura e o prazo de duração do processo de Inventariança, bem como sobre as atribuições do inventariante. Art. 8º Ficam transferidos ao Departamento Nacional de Infra- Estrutura de Transportes - DNIT: I - a propriedade dos bens móveis e imóveis operacionais da extinta RFFSA; II - os bens móveis não-operacionais utilizados pela Administração Geral e Escritórios Regionais da extinta RFFSA, ressalvados aqueles necessários às atividades da Inventariança; e III - os demais bens móveis não-operacionais, incluindo trilhos, material rodante, peças, partes e componentes, almoxarifados e sucatas, que não tenham sido destinados a outros fins, com base nos demais dispositivos desta Lei.

113 IV - os bens imóveis não operacionais, com finalidade de constituir reserva técnica necessária à expansão e ao aumento da capacidade de prestação do serviço público de transporte ferroviário, ressalvados os destinados ao FC, devendo a vocação logística desses imóveis ser avaliada em conjunto pelo Ministério dos Transportes e pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, conforme dispuser ato do Presidente da República. (Inciso acrescido pela Lei nº 11.772, de 17/9/2008) Art. 9º Caberá ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN receber e administrar os bens móveis e imóveis de valor artístico, histórico e cultural, oriundos da extinta RFFSA, bem como zelar pela sua guarda e manutenção. § 1º Caso o bem seja classificado como operacional, o IPHAN deverá garantir seu compartilhamento para uso ferroviário. § 2º A preservação e a difusão da Memória Ferroviária constituída pelo patrimônio artístico, cultural e histórico do setor ferroviário serão promovidas mediante: I - construção, formação, organização, manutenção, ampliação e equipamento de museus, bibliotecas, arquivos e outras organizações culturais, bem como de suas coleções e acervos; II - conservação e restauração de prédios, monumentos, logradouros, sítios e demais espaços oriundos da extinta RFFSA. Art. 12. Aos ocupantes de baixa renda dos imóveis não-operacionais residenciais oriundos da extinta RFFSA cuja ocupação seja comprovadamente anterior a 6 de abril de 2005 é assegurado o direito à aquisição por venda direta do imóvel, nas condições estabelecidas nos arts. 26 e 27 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998. § 1º Para avaliação dos imóveis referidos no caput, deduzirse- á o valor correspondente às benfeitorias e às acessões comprovadamente realizadas pelo ocupante, observadas, em qualquer hipótese, as regras da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. (Parágrafo com redação dada pela Lei nº 12.348, de 15/12/2010) § 2º Os ocupantes referidos no caput deste artigo deverão manifestar seu interesse pela compra direta no prazo de até 30 (trinta) dias a contar da notificação a ser realizada pelo órgão competente.

114 § 3º Para os fins do disposto neste artigo, considera-se ocupante de baixa renda aquele com renda familiar igual ou inferior ao valor estabelecido pelo § 2º do art. 1º do DecretoLei nº 1.876, de 15 de julho de 1981.

Art. 13. Aos ocupantes dos imóveis não-operacionais oriundos da extinta RFFSA, não alcançados pelo disposto nos arts. 10 ou 12 desta Lei e cuja ocupação seja comprovadamente anterior a 6 de abril de 2005, é assegurado o direito de preferência na compra do imóvel, observando-se, no que couber, o disposto no art. 24 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, e ainda: I - a venda será realizada na modalidade de leilão; II - o pagamento poderá ser parcelado, conforme estabelecido no edital, em até 180 (cento e oitenta) prestações mensais e consecutivas em se tratando de imóveis residenciais ou em até 60 (sessenta) prestações mensais e consecutivas para os demais imóveis; III - os ocupantes poderão adquirir o imóvel pelo valor da proposta vencedora, deduzido o valor correspondente às benfeitorias comprovadamente por eles realizadas, desde que manifestem seu interesse no ato do leilão ou no prazo de até 15 (quinze) dias, contado da publicação do resultado do certame. Art. 14. Os imóveis não-operacionais oriundos da extinta RFFSA poderão ser alienados diretamente: I - desde que destinados a programas de regularização fundiária e provisão habitacional de interesse social, a programas de reabilitação de áreas urbanas, a sistemas de circulação e transporte ou à implantação ou funcionamento de órgãos públicos: a) aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; b) a entidades públicas que tenham por objeto regularização fundiária e provisão habitacional, nos termos da Lei nº 11.124, de 16 de junho de 2005; c) a Fundos de Investimentos Imobiliários, previstos na Lei nº 8.668, de 25 de junho de 1993; II - aos beneficiários de programas de regularização fundiária e provisão habitacional de interesse social.

115 § 1º O disposto no caput deste artigo não se aplica aos imóveis não-operacionais destinados a compor os recursos do Fundo Contingente referidos no inciso II do caput do art. 6º desta Lei. § 2º Para a avaliação dos imóveis referidos no caput deste artigo, aplicar-se-á o método involutivo.

116 ANEXO B – COMPILAÇÃO DE ARTIGOS PERTINENTES DO PROGRAMA CAMINHE LEGAL CAPÍTULO II DOS PRINCÍPIOS Art. 2º A execução e manutenção dos passeios, bem como a instalação, nos passeios, de mobiliário urbano, equipamentos de infraestrutura, vegetação, sinalização, entre outros permitidos por lei, devem estar de acordo com os seguintes princípios: I. Acessibilidade: garantia de mobilidade plena para todos os usuários, assegurando o acesso de idosos e pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida em rotas acessíveis, concebidas de forma contínua e integradas por conexões convenientes entre destinos, incluindo as habitações, os equipamentos de serviços públicos, os espaços públicos, o comércio e o lazer, entre outros; II. Segurança: não ofertar riscos de acidentes, minimizando interferências decorrentes da instalação do mobiliário urbano, equipamentos de infraestrutura, vegetação, sinalização, publicidade, tráfego de veículos e edificações; III. Identidade: os passeios devem reforçar a hierarquia viária e o tipo de fluxo peatonal da área, observando os aspectos estéticos e harmônicos de seu entorno para promoção da identidade, qualidade do ambiente urbano e valorização turística da cidade; IV. Manutenção: a escolha dos materiais deverá garantir o trânsito de pedestres e passagens eventuais de veículos sem danos ao passeio público, como, também, facilitar a recomposição após eventuais obras e serviços locais; V. Permeabilidade: estimulada através da faixa de mobiliário e da faixa permeável, contribuindo para a drenagem urbana; VI. Conforto: promover mobilidade peatonal confortável, estimulante, mediante revestimentos com materiais adequados, presença de vegetação, disciplinamento e oferta de mobiliário e generosidade de dimensões; CAPÍTULO III DOS PADRÕES DE PASSEIOS Art. 3º A padronização dos passeios de que trata a presente lei é de acordo com a hierarquia viária e fluxo peatonal e está definida conforme segue: I. Padrão 1 - direcionado aos eixos prioritários de mobilidade urbana, na área central e nos bairros e em suas interligações importantes; caracteriza-se por homogeneidade dimensional e de coloração, promovendo leitura facilitada e estímulo à continuidade de fluxo; II. Padrão 2 – direcionado aos canais viários de hierarquia local, em áreas de dominância da ocupação residencial; caracteriza-se por permeabilidade e variedade de materiais, cores e elementos vegetais, oportunizando um caminhar mais lento e observativo;

117 III. Padrão 3 – direcionado aos setores residenciais populares, onde implantados loteamentos e/ou condomínios de habitações de interesse social; caracteriza-se por permeabilidade, homogeneidade, dimensionamento mínimo e materiais com resistência e abrasividade comprovados, porém, menor custo de mercado em aquisição e execução, facilitando a implantação e manutenção dos passeios públicos em tais setores; VI. Padrão Setorial – padrão concedido ou determinado pelo Executivo, através de projeto específico do Escritório da Cidade, para caracterizar loteamentos, condomínios ou áreas especiais na zona urbana e rural do município.

CAPÍTULO IV DAS FAIXAS E ELEMENTOS COMPONENTES Art. 5º O passeio, em qualquer dos padrões, fica estruturado em até 3 (três) faixas e pelos seguintes elementos: I. Meio-fio; II. Faixa de mobiliário; III. Faixa livre; IV. Faixa permeável; V. Esquina. Seção I Do meio-fio Art. 6º O meio-fio é o elemento pertencente ao passeio que o delimita do leito carroçável. Art. 7º O meio-fio deverá ser executado em concreto pré-moldado, nas dimensões de 100 x 30 x 15 x 13 (comprimento x altura x largura da base x largura do topo). Art. 8º A borda do meio-fio deverá ser arredondada no lado voltado para a sarjeta. Art. 9º Para facilitar a acessibilidade, a altura do meio-fio deve ser de 15 cm a 17 cm. Seção II Da faixa de mobiliário Art. 10. A faixa de mobiliário é o espaço do passeio localizado em posição adjacente ao meiofio e à faixa livre. Art. 11. A faixa de mobiliário será destinada à implantação de equipamentos e mobiliário urbano, à vegetação e a outras interferências existentes nos passeios, tais como rampa de acesso de veículos, tampas de inspeção, grelhas de exaustão e de drenagem das concessionárias de infra-estrutura, lixeiras, sinalização vertical, iluminação pública e eletricidade.

118 Art. 12. Os canteiros com vegetação, nesta faixa, serão classificados em: I. Canteiro isolado, com dimensões internas de 80 x 120 cm; II. Canteiro contínuo, seguindo a configuração da faixa de mobiliário com largura interna de 80 cm. Parágrafo único. O canteiro isolado ou trecho do canteiro contínuo, mediante análise do Escritório da Cidade, poderão receber grelhas para facilitar o fluxo de pedestres. Art. 13. O canteiro contínuo será interrompido em locais de travessia de pedestres, acessos de garagens ou para implantação de mobiliário ou equipamento. Art. 14. No padrão 1 será adotado o canteiro isolado, com exceção dos passeios com larguras superiores a 3 m, que deverão adotar o canteiro contínuo. Art. 15. Nos padrões 2 e 3 será adotado o canteiro contínuo. Art. 16. Caso o munícipe deseje trocar a modalidade de canteiro estabelecido pelo padrão, deverá encaminhar solicitação ao Escritório da Cidade, o qual, respaldado pelo Fórum Técnico, emitirá parecer. Art. 17. Os equipamentos, mobiliários urbanos e vegetação implantados nessa faixa deverão seguir as disposições constantes no capítulo X deste decreto. Seção III Da faixa livre Art. 18. A faixa livre é o espaço do passeio localizada entre a faixa de mobiliário e a faixa permeável. Art. 19. A faixa livre será destinada exclusivamente à livre circulação de pedestres, desprovida de obstáculos, equipamentos urbanos ou de infra-estrutura, mobiliário, vegetação, floreiras, rebaixamento de meio-fios para acesso de veículos ou qualquer outro tipo de interferência permanente ou temporária, devendo atender às seguintes características: I. Possuir superfície regular, firme, contínua e antiderrapante sob qualquer condição; II. Ter inclinação longitudinal acompanhando o caimento da rua; III. Ter inclinação transversal constante, não superior a 2% (dois por cento); IV. Ser livre de qualquer interferência ou barreira arquitetônica; V. Ser livre de emendas ou reparos de pavimento, devendo ser recomposta em toda sua largura, dentro da modulação original, em caso de interferências. Art. 20. A faixa livre terá largura mínima de acordo com a largura do passeio, conforme menciona o Capítulo VI - Das disposições de acordo com a largura dos passeios, mas nunca inferior a 1.20 m. Seção IV Da faixa permeável

119 Art. 21. A faixa permeável é o espaço do passeio localizado entre a faixa livre e o alinhamento predial, com largura variável. Art. 22. A faixa permeável é destinada a proporcionar maior permeabilidade do solo, obrigatória em passeios com larguras superiores a 2,5 m (dois metros e meio), conforme estabelecido pelo padrão. Parágrafo único. Esta faixa poderá receber plantas de forração ou arbustivas que não se projetem sobre a faixa livre, nem contenham espinhos. Art. 23. A faixa permeável deverá ser pavimentada nas esquinas e acessos de veículos e pedestres aos lotes. Art. 24. Quando permitida a pavimentação, deverá ser nivelada com a faixa livre. Art. 25. Não poderá possuir elementos divisores sobressalentes. Art. 26. A qualquer momento, quando detectado aumento de fluxo de pedestres, o município poderá solicitar pavimentação desta faixa para ampliação da faixa livre, devendo esta ser pavimentada seguindo o estabelecido pelo padrão. Art. 27. A faixa permeável deverá começar a 6 m da esquina, sendo esta distância considerada a partir do alinhamento predial da via transversal. Seção V Da esquina Art. 28. As esquinas deverão ser constituídas de modo a: I. facilitar a passagem de pessoas com mobilidade reduzida; II. permitir a melhor acomodação de pedestres; III. permitir boa visibilidade e livre passagem das faixas de travessia de pedestres nos cruzamentos. Art. 29. Para garantir a segurança do pedestre nas travessias e do condutor do automóvel nas conversões, as esquinas deverão estar livres de interferências visuais ou físicas, conforme distâncias estabelecidas no capítulo X, do mobiliário urbano e arborização. Parágrafo único. Exceção são as placas de sinalização de trânsito, que deverão seguir sua legislação específica. Art. 30. Todas as esquinas deverão ser constituídas de rebaixo de meio-fio para pessoas com necessidades especiais, devendo este ser executado após a parte curva do meio-fio. Art. 31. As esquinas totalmente rebaixadas só serão liberadas mediante aprovação do Escritório da Cidade.

120 CAPÍTULO V DA COMPOSIÇÃO E DAS ESPECIFICIDADES DOS PADRÕES Seção I Do Padrão 1 Art. 32. O Padrão 1 é composto pelos seguintes elementos, conforme ilustrado pela Fig. 1 : I. meio-fio; II. faixa de mobiliário; III. faixa livre. Parágrafo único. Nos passeios largos, em trechos com baixo fluxo de pedestres, poderá haver Faixa Permeável mediante análise ou projeto específico do Escritório da Cidade. Art. 33. Para assegurar mobilidade e continuidade visual nestes trajetos, o padrão requer uma linguagem específica e uniforme, através da implantação dos seguintes materiais para pavimentação: I. Lajota de concreto em tom cinza, 40 x 40 cm; II. Ladrilho em tom cinza, 40 x 40 cm; III. Basalto regular, 40 x 40 cm. Parágrafo único. O material a ser utilizado para pavimentação do passeio, entre os citados neste artigo, deve seguir o material dominante na face da quadra em que o lote está compreendido. Art. 34. Poderá ser definida, pelo Escritório da Cidade, a inserção de desenhos de piso para assegurar a unidade dos passeios, sendo que tais elementos não serão considerados como outro tipo de material na composição do padrão 1. Seção II Do Padrão 2 Art. 35. O Padrão 2 é composto pelos seguintes elementos, conforme ilustrado pela Fig. 2: I. meio-fio; II. faixa de mobiliário; III. faixa livre com largura mínima de 1,5 m; IV. faixa permeável, nos passeios com largura superior a 2,5 m. § 1º A faixa permeável é opcional nos passeios existentes, sendo que mediante projeto específico, poderá o Escritório da Cidade exigir a implantação da mesma. § 2º A faixa permeável será obrigatória nos novos loteamentos e condomínios. Art. 36. Neste padrão, será possível a utilização de diferentes materiais para pavimentação dos passeios, entre os seguintes:

121 I. Bloco intertravado de concreto natural, admitindo peças com coloração; II. Concreto reguado ou alisado, estampado ou não; III. Basalto irregular; IV. Outros materiais, mediante aprovação do Escritório da Cidade. Parágrafo único. O material a ser utilizado para pavimentação do passeio, entre os citados neste artigo, deve seguir o material dominante na face da quadra em que o lote está compreendido. Seção III Do Padrão 3 Art. 37. O Padrão 3 é composto pelos seguintes elementos, conforme ilustrado pela Fig. 3: I. meio-fio; II. faixa de mobiliário; III. faixa livre com largura mínima de 1,2 m; IV. faixa permeável, nos passeios com largura superior a 2,5 m. § 1º A faixa permeável é opcional nos passeios existentes, sendo que mediante projeto específico, poderá o Escritório da Cidade exigir a implantação da mesma. § 2º A faixa permeável será obrigatória nos novos loteamentos e condomínios de interesse social. Art. 38. Para esse padrão, são admitidos os seguintes materiais: I. Concreto reguado ou alisado, estampado ou não; II. Bloco intertravado de concreto; III. Outros materiais, mediante aprovação do Escritório da Cidade. § 1º O material a ser utilizado para pavimentação do passeio, entre os citados neste artigo, deve ser único para loteamentos e condomínios a serem construídos novos, no município § 2º Para os condomínios existentes, deve-se ter como premissa de escolha entre os materiais admitidos aquele dominante na face da quadra em que o lote está compreendido. Seção VI Do Padrão Setorial Art. 45. Poderá ser apresentado, para aprovação do Escritório da Cidade, projeto específico para os passeios públicos de bairros ou setores com peculiaridades urbanísticas, utilizando materiais e desenhos diferenciados. Art. 46. O setor para este plano deverá compreender, no mínimo, os passeios das duas faces de quadra voltados para a mesma via. Art. 47. A solicitação deverá ser encaminhada com anuência de, no mínimo, 80% dos proprietários dos imóveis localizados no trecho de via pública onde será readequado,

122 construído, reconstruído e conservado, observando os parâmetros atinentes estabelecidos nesse decreto. Seção VII Dos passeios pertencentes a imóveis tombados, de interesse patrimonial e entorno Art. 48. Nos passeios pertencentes a imóveis tombados, de interesse patrimonial e entorno destes, prevalecerão as diretrizes determinadas pelo órgão patrimonial responsável quanto aos materiais e critérios de instalação, se houverem. Seção VIII Da transição de padrão Art. 49. Nas esquinas em que houver encontro de dois padrões, o padrão 1 ou 2 deverá seguir até o passeio adjacente, considerando os seguintes limites e o disposto na Fig. 5: I. Início do rebaixamento do passeio para as larguras menores ou iguais a 2,5 m; II. Distância de 1,5 m após o final da rampa do passeio adjacente; III. Final da inclinação do alargamento de passeio na esquina. Art. 50. Deverá ser adotado um único tipo de material para pavimentação do passeio público por testada de lote, mesmo tendo diferentes alternativas de materiais dentro do padrão. CAPÍTULO VI DAS DISPOSIÇÕES DE ACORDO COM A LARGURA DOS PASSEIOS Art. 51. Os passeios, para fins de padronização, serão divididos de acordo com as seguintes larguras (L): I. largura menor que dois metros (L < 2 m); II. largura maior ou igual a dois metros e menor ou igual a dois metros e meio (2 ≤ L ≤ 2,5 m); III. largura maior que dois metros e meio e menor que três metros e meio (2,5
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