A BANALIZAÇÃO DOS DANOS MORAIS COM O ADVENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

June 15, 2017 | Autor: Mariano Brum | Categoria: Direito Processual Civil, Direito Civil
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CENTRO UNIVERSITÁRIO DA CIDADE Escola de Direito

A BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL COM O ADVENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CIVEIS

MARIANO BRUM ALVES

Orientador : Professora Maria Lúcia de Azevedo

Rio de Janeiro 2010

Mariano Brum Alves

A BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL COM O ADVENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CIVEIS

Projeto ou TCC apresentado à Escola de De Direito do Centro Universitário da Cidade - UniverCidade- como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito

Orientadora : Professora Maria Lúcia de Azevedo

Rio de Janeiro 2010

MDir.10-2 A474

Alves, Mariano Brum A banalização do dano moral com o advento dos juizados especiais Cíveis. / Mariano Brum Alves. Rio de Janeiro, 2010. 54. f.

Monografia (Graduação em Direito) - Escola de Ciências Jurídicas do Centro Universitário da Cidade.

1.Dano Moral. 2.Direito Civil. I.Título. II.Centro Universitário da Cidade – UniverCidade, Instituição.

DORIS: 342.1513

MARIANO BRUM ALVES

BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL COM O ADVENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CIVEIS

Esta monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de Bacharel em Direito Escola de Ciências Jurídicas do Centro universitário da Cidade UNIVERCIDADE

________________________________________________________________ Coordenador

__________________________________________________________________ Professora Maria Lúcia de Azevedo

AGRADECIMENTOS

Em primeiro, pois é o seu único lugar, agradeço ao meu Deus querido, que me ama e me sustém, e que deu todas as oportunidades para que chegasse até aqui. Aos queridos pais, Elias e Fátima, que tanto me ensinam, apóiam e me amam incondicionalmente, à vocês o meu amor.Esta conquista é nossa! A companheira, amiga, confidente e amante Ariana, pela paciência, carinho e apoio em mais esta caminhada. Amo-te Ao irmão do coração Fábio Guiller pelo incentivo, apoio e empenho. Aos amigos de ontem, hoje e sempre, Amanda Pereira, Amanda Lorena, Elaine Nepomuceno e Charles Luna, vossa amizade é um presente de Deus À professora Maria Lucia pela paciência , empenho na arte de ensinar. Ao professor Lucio Rosa , pelos belos ensinamentos jurídicos e pela incansável disposição de lecionar. Aos membros do escritório Oberg Ferraz Advogados Associados, pela oportunidade de aprender do universo jurídico na prática.

“Nada temos a temer quanto ao futuro, a menos que nos esqueçamos como Deus tem nos conduzido no passado."

Ellen G. White

RESUMO

ALVES, Mariano Brum. A BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL COM ADVENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. 2010. Monografia (Graduação em Direito). Centro Universitário da Cidade – Campo Grande, Rio de Janeiro.

Necessário se faz analisar o tema “dano moral” sobre a ótica dos Juizados Especiais Cíveis, eis que o volume de ações pleiteando indenizações por danos morais nos cartórios aumentam a cada dia. Contudo em muitas demandas, os pedidos não possuem fundamentação plausível , pois quando há, estão fundadas em meros contratempos ou aborrecimentos do cotidiano. Portanto é necessário compreender que, com advento dos Juizados Especiais Cíveis , criados pela Lei 9.099/95 , facilitando o acesso à Justiça o instituto do dano moral fora vulgarizado pela sociedade atual. Através da compreensão histórica dos institutos, conceitos emitidos pelos doutrinadores jurídicos e posicionamentos dos Tribunais brasileiros o que se pretende é uma analise crítica a banalização do instituto ante a facilidade de acesso ao Poder Judiciário, promovida pela Lei 9.099/95.

Palavras Chave: Banalização,Dano Moral, Indenização,Juizado Especial Cível,Lei 9.099/95

SUMÁRIO INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 08 CAPÍTULO 1: DA RESPONSABILIDADE CIVIL......................................................... 09 1.1 Conceito............................................................................................................................. 09 1.2 Evolução Histórica............................................................................................................10 1.3 Requisitos..........................................................................................................................12 1.3.1 Ação.................................................................................................................................12 1.3.2 Culpa................................................................................................................................13 1.3.3 Nexo de causalidade........................................................................................................ 15 1.3.4 Dano.................................................................................................................................16 1.3.4.1 Dano material................................................................................................................17 1.3.4.2.Dano moral....................................................................................................................17 1.4 Da Responsabilidade Civil Objetiva e Subjetiva............................................................19 CAPÍTULO 2: DO DANO MORAL.................................................................................... 20 2.1 Conceito............................................................................................................................. 20 2.2 Evolução Histórica do Dano Moral no Brasil................................................................ 21 2.3 Espécies de Danos Morais................................................................................................ 25 2.4 Da Reparação do Dano Moral......................................................................................... 26 2.5 Quantificação das indenizações por danos morais........................................................ 28 2.5.1 Elementos para análise................................................................................................. 29 2.5.1.1 Da intensidade do dano.............................................................................................. 30 2.5.1.2 Da repercussão da ofensa...........................................................................................30 2.5.1.3 Do grau de culpa do ofensor...................................................................................... 31 2.5.1.4 Posição sócio-econômica do ofendido....................................................................... 32 2.5.1.5 Da retratação ou tentativa do ofensor de minimizar o dano.................................. 33 2.5.1.6 Situação econômica do ofensor................................................................................. 33 2.5.1.7 Aplicação de pena ou desestímulo............................................................................. 34 CAPÍTULO 3: DOS JUIZADOS ESPECIAIS.................................................................... 35 3.1 Considerações Iniciais...................................................................................................... 35 3.2 Histórico e desenvolvimento dos juizados Cíveis...........................................................35 3.3 Princípios que orientam o processo no juizado............................................................. 36 3.3.1 Oralidade......................................................................................................................... 36 3.3.2 Simplicidade.................................................................................................................... 39

3.3.3 Informalidade.................................................................................................................. 40 3.3.4 Economia processual....................................................................................................... 41 3.3.5 Celeridade........................................................................................................................ 42 CAPÍTULO 4: DA BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL COM O ADVENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS......................................................................................... 43 4.1 Breve Histórico sobre a Reparação por Dano Moral.................................................... 43 4.2 A Banalização do Instituto...............................................................................................43 CONCLUSÃO........................................................................................................................ 50 REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 52

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta a banalização do direito à indenização por danos morais com o advento dos Juizados Especiais Cíveis no ordenamento jurídico pátrio A responsabilidade civil é uma relação obrigacional que é regida pelo Direito Privado em seu ramo Direito Civil, sendo assegurado ao que sofre o dano, o direito de ser indenizado pelo causador do dano. Para que ocorra a indenização é necessária a presença de quatro pressupostos, quais sejam: ação ou omissão culpa nexo causal e danos. Ao ser introduzido no ordenamento jurídico pátrio o Juizado Especial Cível tinha como o objetivo: de facilitar o Acesso à Justiça, da sociedade carente, e que certamente não recorreria ao poder judiciário em busca de garantia e proteção dos seus interesses violados ou ameaçados de violação, por ausência de recursos para sustentar os custos do Processo. É óbvio que todo o cidadão tem o direito de bater às portas do Poder Judiciário para propor ação, com o fito de resguardar ou defender direito que no seu entender lhe é devido. Porém, tem-se observado o descabimento e a temerariedade de algumas demandas em virtude do abuso deste direito diante da característica facilidade de acesso à justiça assegurada pelos Juizados Especiais. Observa-se que nos últimos anos as demandas visando reparações por danos morais cresceram consideravelmente no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis. Contudo, em sua maioria observa-se que não há fundamentos válidos para justificarem as demandas, eis que se baseiam em meros aborrecimentos, fatos do dia-a-dia e que de maneira nenhuma encontram fundamento para a reparação por dano moral. Diante desta realidade, a importância do presente trabalho caracteriza-se pela necessidade de compreensão da banalização dos pedidos de danos morais nas demandas em razão da facilidade de acesso à Justiça proposta pelos Juizados Especiais Cíveis.

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CAPÍTULO 1: DA RESPONSABILIDADE CIVIL

No intuito de obter-se uma melhor compreensão do presente trabalho faz-se necessário um breve estudo sobre a responsabilidade civil, seu conceito, evolução histórica, e requisitos.

1.1 CONCEITO

A responsabilidade civil caracteriza-se pela obrigação de alguém indenizar aquele que sofreu dano, provocado por sua conduta, de coisas ou pessoas sob seus cuidados. Esta responsabilidade torna-se cristalina com a leitura do art.186 do Código Civil Brasileiro: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato 1 ilícito.

Maria Helena Diniz conceitua a responsabilidade civil da seguinte forma: “A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesmo praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”2

Observa-se que o lesado possui a faculdade de buscar a reparação do dano ou não, sendo privado o interesse diretamente lesado. A responsabilidade civil inicialmente possui um aspecto regulador. O Ilustre Rui Stoco cita Silvio Rodrigues, quando este afirma que a responsabilidade encontra seu fundamento no princípio milenar de que "deve reparar o dano aquele que causá-lo"3. Serpa Lopes leciona de forma equiparada: "responsabilidade civil significa o dever de reparar o prejuízo"4. Savatier, mencionado por Rodrigues, preenche este pensamento jurídico, quando contempla a

1

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm - acessado no dia 19/10/2010 ² DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 19. ed. rev. e atual. São Paulo:Saraiva, 2005, v. 7. p. 40. 3 Rui Stoco, Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, Ed. Revista dos Tribunais, SP, 1997, 3a ed, pg. 50. 4 Loc. cit 2

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responsabilidade civil como a "obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam"5

1.2 DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Em tempos remotos, imperava a vingança privada, consistindo que a compensação dos danos causados era exercida de forma unilateral por aquele que fora lesado contra o causador , não havendo nenhuma relação de proporcionalidade entre dano e reparação e a necessidade de comprovar a culpa do agente. Mais adiante, com a evolução e organização da sociedade , o Estado no intuito de pacificar a sociedade, avocou para si a responsabilidade de administração da Justiça, utilizando-se da Lei de Talião, que permitia ao sofredor do dano a provocação do mesmo mal ao seu causador. (Código de Hammurabi – 2500 a.C, Código de Manu - séc.XII a.C). Não havia preceito genérico prevendo a responsabilidade de quem causasse dano a outrem, prevalecendo a tipicidade das condutas, sem menção ao elemento culpa, o qual era irrelevante para a caracterização da responsabilidade.6 Em 326 a.C a Lex Poetelia Papiria - proibiu que penas corporais fossem aplicadas ; limitando assim, a responsabilidade pelo débito ao patrimônio do causador do dano. Contribuindo grandemente para o avanço da Responsabilidade Civil. No século III a.C foi aprovado um plebiscito Lex Aquilia que foi um marco para o desenvolvimento da responsabilidade civil atual, esta lei estabelecia para aquele que sofre um dano lhe era permitido uma actio legis Aequiliae visando o recebimento do valor do dano causado , em razão da damnun injuri datum, a responsabilidade prevista para aquele que causa dano à coisa alheia. A importância desta lei está na inovação de defender a substituição das multas fixas por uma pena proporcional ao dano causado. Neste tempo os romanos buscavam diferenciar a pena e a reparação através da distinção de delitos públicos e privados. Da ocorrência de um delito público era imposta uma pena pecuniária ao ofensor, o valor era destinado ao Estado, no tocante ao delito privado o 5

Direito Civil, Volume 4, Responsabilidade Civil, Ed. Saraiva; São Paulo; 1999, 17a. ed., pg. 06. GIORDANI José Acir Lessai, A responsabilidade civil objetiva genérica no Código Civil de 2002, RJ, Lúmen Juris, 2004, p. 5. 6

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destino da pena caberia a vítima. Verifica-se que a reparação do dano foi tomando notoriedade com princípio pelo qual se pune a culpa por danos injustamente provocados, independentemente de relação obrigacional preexistente. Verifica-se que a culpa surge neste momento como um elemento fundamental para caracterização para a imposição do dever de indenizar. A responsabilidade civil atual está alicerçada no Direito Romano e suas leis acima citadas, sem desmerecer a natural evolução deste instituto. O direito francês aperfeiçoou as idéias romanas, tendo sempre como pressuposto para a reparação do dano a prática de um ato ilícito e generalizou o princípio aquiliano In lege Aquilia et levissima culpa venit, ou seja, culpa ainda que levíssima, obriga a indenizar. Portanto, torna-se pressuposto necessário a culpa caracterizada, não importando qual a sua gravidade. DOMAT criou algumas diferenças como, entre a responsabilidade civil, caracterizada pelas ofensas mais leves sendo a reparação perante a vítima e a responsabilidade penal,que abrangia mas ofensas mais graves, de caráter perturbador da ordem, ocorrendo a reparação perante o Estado e, entre a culpa contratual, originada das pessoas que descumprem as obrigações e a culpa extracontratual, originada da negligência ou imprudência fora das relações obrigacionais. Daí em diante , a responsabilidade civil e a penal começam a ser distintas uma vez que a actio legis aquiliae era considerada reipersecutória. Seguindo o curso da evolução jurídica, o Direito Francês buscou o melhoramento das idéias do Direito Romano, e em 1804 o Código Civil Francês adotou a culpa como fundamento do direito de indenizar. À luz do Direito Francês com o fito de melhor entender a responsabilidade civil Carlos Roberto Gonçalves ensina:

O direito francês, aperfeiçoando pouco a pouco as idéias romanicas, estabeleceu nitidamente um princípio geral da responsabilidade civil, abandonando o critério de enumerar os casos de composição obrigatória. Aos poucos, foram sendo estabelecidos certos princípios, que exerceram sensível influência nos outros povos:direito à reparação sempre que houvesse culpa, ainda que leve, separando-se a responsabilidade civil (perante a vítima) da responsabilidade penal (perante o Estado); a existência de uma culpa contratual (a das pessoas que descumprem as obrigações) e que não se liga nem a crime nem a delito, mas se origina da negligência ou imprudência.7

7

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 5-6.

12

O Código de 1804 Francês, exerceu grande influência nas codificações posteriores eis que a teoria da responsabilidade civil subjetiva ou baseada na culpa foi consagrada nos códigos supervenientes, como o Código Civil Alemão e o Código Civil Brasileiro de 1916. A responsabilidade civil subjetiva em nosso ordenamento jurídico sobre a influência de um novo momento jurídico, devido a racionalização do sistema de reparação de danos , foi consagrada pelo artigo 159 do antigo Código Civil de 1916: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar 8

direito, ou causar dano a outrem, fica obrigado a reparar o dano” .

Com o advento do Novo Código Civil, de 2002 esta regra foi transcrita para o artigo 186, preconizando: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato 9 ilícito.”

Em suma, observa-se a reparação civil e a sua evolução e especialização,frente à responsabilidade criminal estando em conexão com a impossibilidade da autotutela.10Pela evolução natural do direito , percebe-se a transformação do instituto da responsabilidade civil, iniciando-se da vingança privada, de caráter sancionatório, até a noção subjetiva atual e originada a partir da “Lex Aquilia”.

1.3 REQUISITOS

Para a configuração da responsabilidade civil é essencial a presença de quatro pressupostos: ação (seja ela comissiva ou omissiva), culpa do agente, nexo de causalidade, o dano.

1.3.1 AÇÃO Diniz esclarece que "todo ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou 8 9

GIORDANI, José Acir Lessa, ob.cit., p. 5. COSTA, Mário de Almeida, Direito das Obrigações, Almedina,1994,Coimbra, pág. 443.

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coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado" 11 O ato praticado em desacordo com o ordenamento jurídico, e que provoca um prejuízo a outrem, é ilícito ; funda-se na responsabilidade subjetiva, esta , norteada na culpa. Não incidindo a culpa a responsabilidade se baseia no risco. Em relação ao que pratica o ato (agente), sua conduta poderá ser comissiva ou omissiva. A conduta comissiva se caracteriza pela prática de um ato contrário ao que deveria ser feito. Desta forma, a conduta será omissiva no momento em que o agente deixar de fazer, praticar ou observar um dever jurídico que o obriga a praticar certo ato que deveria realizar. Com relação ao ato omissivo, leciona Gonçalves:

Para que se configure a responsabilidade por omissão é necessário que exista o dever jurídico de praticar determinado fato (de não se omitir) e que se demonstre que, com a sua prática, o dano poderia ser evitado. O dever jurídico de agir (de não se omitir) pode ser imposto por lei (dever de prestar socorro às vítimas de acidente imposto a todo condutor de veículo pelo art. 176, I, do Código de Transito Brasileiro) ou resultar de convenção (dever de guarda, de vigilância, de custódia) e até da criação de alguma situação especial de perigo.12

É de suma importância salientar que a conduta do agente, seja ela omissiva ou comissiva deverá ser voluntária, ou seja, deverá ser praticada pela vontade do agente , livre de coação , excluindo-se os provocados por fenômenos naturais ou quando praticados no estado inconsciência. O dever de indenizar nasce de uma conduta comissiva ou omissiva do agente que desobedece a um preceito social, contratual ou legal.

1.3.2 CULPA

11 'DlNIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro -Responsabilidade Civil, v, 7, p, 34. 12 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 39.

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A caracterização da responsabilidade se dá com a conduta voluntária comissiva ou omissiva, porém é necessário que o agente tenha praticado o ato com culpa, por negligência, imprudência ou imperícia. A não observância pelo agente de atitudes preventivas e cuidados mínimos ao nascimento de danos ao patrimônio de terceiros é o que faz surgir a ilicitude do ato , conseqüentemente o dever de indenizar. A culpa, como requisito para o nascimento do dever de indenizar, origina-se da proposição genérica de que o dever ressarcitório está relacionado ao descumprimento de uma obrigação. O inadimplemento de um dever jurídico gera, para o infrator, um dever de indenizar, de modo que a ordem jurídica restabeleça o equilíbrio rompido.13 Em seu sentido mais amplo (lato sensu) a culpa abrange tanto o dolo quanto a culpa propriamente dita. Na culpa stricto sensu, não há a pretensão de lesar, prejudicar, o agente causa dano ao outrem, não prevendo que sua conduta poderia gera o dano. Para José Acir Lessa Giordani, existem três elementos na culpa stricto sensu :erro de conduta, a previsibilidade do resultado e a falta de cuidado ou omissão da diligência exigível.14 O erro de conduta é ponto essencial para a diferenciação entre a culpa e o dolo. Na culpa não há previsibilidade do dano pelo agente em sua conduta, que gera resultado dessemelhante do pretendido pelo agente. Para que a culpa seja caracterizada é necessário que o agente não tenha previsto o resultado lesivo, desta forma a previsibilidade do resultado – a imprevisibilidade – inexiste o ilícito capaz de acarretar o dever de reparação. Quanto à falta de cuidado ou omissão de diligência exigível, desdobra-se nas modalidades clássicas de imperícia, imprudência ou negligência. No dolo, guarda-se a definição de Caio Mario: “... a finalidade do agente em cometer a conduta e obter o resultado ilícito, caracteriza a contraveniência a uma norma jurídica, a vontade de promover o resultado maléfico...”15

13

PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade civi de acordo com a Constituição de 1988, RJ, Forence, 1997, p. 66. 14 GIORDANI, José Acir Lessa, A responsabilidade civil objetiva genérica no Código Civil de 2002, RJ, Lúmen Juris, 2004,pg 21. 15 PEREIRA, Caio Mário da Siva, ob.cit., p. 65.

15

Tal conceito foi atualizado e passou a incluir,também, a conduta de quem, embora não tenha previsto diretamente causar o resultado lesivo, procedeu consciente de que sua conduta poderia ser auferir dano. O fato é que o dolo, como elemento subjetivo da conduta, indo além da mera culpa stricto sensu, também acarreta para o agente o dever de indenizar o prejuízo causado a terceiro.

1.3.3 NEXO DE CAUSALIDADE

O dano deriva da ação do agente. O nexo de causalidade é a ligação entre o ato lesivo e a conduta que o reproduziu. Deve-se atentar para o fato de que o dano não surgiria se a conduta do agente não tivesse ocorrido. O simples fato da conduta do lesante ser uma exigência para o surgimento do dano, gera ao agente o dever de responder pelo que causar. Se não houver esta relação causalística, é inadmissível a obrigação de indenizar.Salienta Maria Helena: O vínculo entre o prejuízo e a ação designa-se “nexo causal”, de modo que o fato lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente ou como sua conseqüência previsível. Tal nexo representa, portanto, uma relação necessária entre o evento danoso e a ação que o produziu, de tal sorte que esta é considerada como sua causa.16

O nexo de causalidade é um elemento indispensável , pois é através deste que pode-se identificar através da união da conduta do agente e o dano , quem verdadeiramente produziu o dano, pois é impossível ressarcir aquele que foi lesado , se não houve a identificação do nexo causal que leva o ato lesivo ao agente. Contudo, há algumas excludentes para o nexo de causalidade, a saber : o caso fortuito e a força maior, culpa exclusiva da vítima e o fato de terceiro. No tocante ao caso fortuito e a força maior, importante ressaltar que

são

caracterizados pela impossibilidade de evitar o evento (objetivo) e a exiguidade de culpa na ocorrência do evento. O caso fortuito nasce de um fato humano, porém, não é possível determinar precisamente o agente causador, exemplos: greve , guerra, etc. A força maior independe 16

de

conduta

DINIZ, op. cit., p. 113.

humana,

surge

de

um

fenômeno

natural

(maremoto,

16

terremoto,inundações etc.).Nestas situações a relação de causa e efeito entre a conduta do agente e o resultado danoso é inexistente. A vítima por muitas vezes provoca o dano, sendo o agente mero instrumento para a concretização do acidente, inexistindo a causalidade entre o dano e a ação do agente.Assim , a vítima deve assumir todos os seus prejuízos pois a culpa foi exclusivamente sua. A responsabilidade é excluída ,quando resta provado que não há participação culposa do devedor, e que a ação foi praticada por ato exclusivo de terceiro, valendo-se desta excludente. O código de processo civil estabelece que o nexo causal é um pressupostos da responsabilidade civil, e deverá ser provado, sendo que esta prova caberá ao autor da demanda.

1.3.4 DANO

Não há que se falar em dever de indenizar , se não há o dano. Desta forma, constata-se a indispensabilidade do dano para que seja caracterizada a responsabilidade civil. Conceituando dano, merece destaque o que leciona Nehemias Melo

Dano é a agressão ou a violação de qualquer direito, material ou imaterial que, provocado por dolo ou culpa pelo agente (responsabilidade subjetiva) ou em razão da atividade desenvolvida (responsabilidade objetiva), cause a uma pessoa, independentemente de sua vontade, uma diminuição de valor de um bem juridicamente protegido, seja de valor pecuniário, seja de valor moral ou até mesmo de valor afetivo.17

Por esse ensinamento fica acertado que a Conduta antijurídica, atribuído a uma pessoa, tem como resultado a obrigação de obrigar o ofensor a reparar o dano causado. Existe uma obrigação de reparar o Dano, imposta por quem quer que, por ação ou omissão voluntária, causar prejuízo a outrem. O ressarcimento pelo prejuízo só ocorrerá se o dano decorrer de um acontecimento preciso, que ainda deva ser reparado , e que exsurge do ato delituoso. 17

MELO, Nehemias Domingos de. Da culpa e do risco como fundamentos da responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005.P 50

17

Os danos são divididos em materiais e morais, danos materiais ocorrem quando houve perda de bens ou deixou de ganhá-los em razão do ato; os danos morais são os que atingem a órbita moral, intelectual e psíquica da vítima.

1.3.4.1 DANO MATERIAL

Ao falarmos de dano material ou patrimonial é importante esclarecer que patrimônio corresponde ao conjunto das relações jurídicas de uma pessoa, que apreciáveis em dinheiro.18 Zarpando deste conceito, entende-se que o dano material reflete no patrimônio da pessoa lesada, ou seja, há uma lesão , que destruiu ou desvalorizou o patrimônio da vitima, devendo ser avaliada para a indenização a diminuição sofrida no patrimônio. O dano material pode ser divido em dois elementos: o dano emergente e os lucros cessantes. O dano emergente é o dano efetivamente sofrido pela vítima, é a deterioração de seu patrimônio, caracteriza-se pela mudança do patrimônio antes da conduta ilícita do agente e após o ato lesivo, ou seja, demonstra a efetiva perda ou diminuição do bem. No tocante aos lucros cessantes vale dizer que é tudo aquilo que em razão do ato lesivo a vítima deixou de lucrar, para o cálculo deste elemento deverá ser considerado o acontecimento futuro, que ainda irá acontecer.

1.3.4.2 DANO MORAL

O dano moral é o agravo que atinge a moral,o intelecto e o ânimo psicológico da vítima, que traz dor à intimidade , ofende a honra.Tal agravo não se pode mensurar, ou seja não há como dimensionar o valor do dano. Nesse sentido, é o conceito apresentado por Eduardo Pinto :

Danos morais são aqueles que causam desassossego, mágoas, aflições,desalentos, padecimentos, dores à intimidade, à alma do ofendido, em razão de atos 18

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2008, p.705

18

lesionadores à sua honra, dignidade, decoro, reputação,intimidade, imagem, autoestima, amor próprio ou sensibilidade, e que acabam por lhe causar aguda e penetrante dor pessoal19.

As intempéries da vida, os meros percalços e desavenças do cotidiano não devem ocasionar indenização. É extremamente necessário estabelecer critérios , como o objetivo do homem médio, para a tentativa de dimensionar este dano, pois será o bom senso do julgador que compensará a dor sofrida pela vítima ao analisar o caso concreto e adequá-lo à proteção legal, fixando o quantum indenizatório. O dano moral pode ser classificado em direto e indireto, considerando a causalidade ente fato e dano como pressuposto. O dano moral direto é aquele que alude a uma lesão específica de um direito extrapatrimonial, como, por exemplo, os direitos da personalidade. Nesta direção leciona Diniz:

O dano moral direto consiste na lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade (como a vida, a integridade corporal e psíquica, a liberdade, a honra, o decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem) ou nos tributos da pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de família). Abrange, ainda, a lesão à dignidade da pessoa humana (CF/88, art. 1, III).20

Gagliano define o dano moral indireto da seguinte maneira:

[...] o dano moral indireto ocorre quando há uma lesão específica a um bem ou interesse de natureza patrimonial, mas que, de modo reflexo, produz um prejuízo na esfera extrapatrimonial, como é o caso, por exemplo, do furto de um bem com valor afetivo ou, no âmbito do direito do trabalho, o rebaixamento funcional ilícito do empregado, que, além de prejuízo financeiro, traz efeitos morais lesivos ao trabalhador.21

No dano moral indireto, o ato lesivo incide inicialmente sobre um bem jurídico patrimonial, contudo, posteriormente recai sobre a esfera extrapatrimonial. O tema sobre o dano moral será melhor abordado no capítulo seguinte. 19

PINTO, Eduardo Viana. Responsabilidade Civil. Porto Alegre: Síntese, 2003. p. 79): 'DlNIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro -Responsabilidade Civil, v, 7, p. 93 21 GAGLIANO, Pamplona Filho, op. cit., p. 67. 20

19

1.4 DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E SUBJETIVA

Existem duas espécies de responsabilidade civil, a objetiva e a subjetiva. Entende-se que são apenas interpretações diferentes sobre a obrigação de reparação do dano. De acordo com a regra geral prevista no art. 186 do Código Civil, a vítima só poderá obter a reparação do dano se provar a culpa (em sentido lato, abrangendo o dolo ou a culpa em sentido estrito) do agente. Tal dispositivo trata da responsabilidade subjetiva, onde a culpa é elemento imprescindível para que surja o dever de indenizar.Porém, com o avanço da sociedade, através do desenvolvimento industrial, bem como a dificuldade, em certos casos, de a vítima provar a culpa do agente causador do dano, fez-se necessário o surgimento da responsabilidade objetiva, baseada na teoria do risco. A responsabilidade objetiva, diferentemente da subjetiva, independe de culpa, ou seja, a vítima não precisa comprovar a culpa do agente, basta a demonstração do dano e do nexo causal para que surja o dever de indenizar. Uma das teorias que procuram justificar a responsabilidade objetiva é a teoria do risco. Onde toda pessoa que exerce alguma atividade cria uma risco de dano para terceiros, por isso deve ser obrigada a repará-la, ainda que sua conduta seja isenta de culpa, desde que haja o nexo de causalidade entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima. É mister ressaltar que a responsabilidade objetiva não afastou a subjetiva. Esta subsiste como regra, sem prejuízo da adoção da responsabilidade objetiva, nos casos e limites previstos em leis especiais. A teoria do risco, sem substituir a teoria da culpa, cobre muitas hipóteses em que o apelo às concepções tradicionais se revela insuficiente para a proteção da vítima.

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CAPÍTULO 2: DO DANO MORAL

2.1 CONCEITO

Entende-se por dano moral, o sofrimento em virtude da violação de um bem juridicamente tutelado, extrapatrimonial. Seja a dor física, dor-sensação, nascida de uma lesão material; seja a dor moral, dor-sentimento, nascida de causa material, como o abalo do sentimento de uma pessoa, provocando-lhe dor, tristeza, desgosto, depressão, enfim, perda da alegria de viver.22 O dano moral não gera prejuízo de cunho patrimonial a vítima, a verba indenizatória que corresponde ao pagamento de uma quantia em dinheiro, com vistas a uma satisfação compensatória, é destinada a amenizar a dor da vítima. Se houverem reflexos de natureza material em razão do dano moral, a indenização será do dano patrimonial decorrente da lesão à esfera moral da vítima, e não somente do dano moral propriamente dito. O dano moral está em voga como um assunto atual e com forte tendência ao crescimento. A maioria da sociedade, com um pouco de entendimento jurídico saberá dizer o que ele seja, mas dizer quanto ao seu conceito e à sua amplitude ou dimensão surgirão dificuldades. Em conseqüência, a jurisprudência se mostra vacilante no reconhecimento das situações em que se configura essa espécie de dano. Novamente vale salientar o conceito de Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 55)

lesão de direitos cujo conteúdo não é pecuniário,nem comercialmente redutível a dinheiro. Em outras palavras, podemos afirmar que o dano moral é aquele que lesiona a esfera personalíssima da pessoa (seus direitos da personalidade), violando, por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e imagem, bens jurídicos tutelados constitucionalmente.

A lição de Carnelutti sobre o conceito de dano é importante para a melhor compreensão do tema abordado, leciona que o dano é “lesão de interesse juridicamente tutelado”. Contudo o tema merece ser estudado com desvelo, para que não ocorra nenhum equívoco na interpretação do presente conceito no tocante ao dano moral. 22

PORTO, Ricardo Cunha. A indenização do dano puramente moral e a sua liquidificação. Natal, 2001.disponível em: . Acesso em: 18 nov. 2004.

21

Importante salientar, o que de fato caracteriza o dano moral, é a conseqüência da lesão e não natureza do interesse juridicamente tutelado. Podendo ser o “interesse juridicamente tutelado, a honra, e de uma lesão a esta espécie de direito da personalidade decorrer dano patrimonial, exemplificando a questão temos na falsa imputação de calúnia que abalando a imagem e reputação de um elemento, lhe frustre determinados negócios em vias de lhe proporcionar boa remuneração”.23 Desta forma, conceituamos o dano moral como o sofrimento moral, em razão do ato lesivo ao interesse juridicamente protegido.

2.2 DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DANO MORAL

De acordo com os historiadores, as primeiras notícias sobre a codificação do direito, remetem à Mesopotâmia em uma época anterior ao Direito Romano, onde já havia a previsão, ainda que de maneira muito rústica e primitiva, de que o dano moral poderia ser reparado de forma pecuniária. Esta preocupação para com a sociedade foi consolidada por Kamo Rabi ou Hamurabi no Codigo de Hamurabi, que tinha como princípio a garantia do mais fraco Os babilônios estabeleciam penalidades pecuniárias para os casos de dano moral, e somente quando estes meios eram frustrados é que se aplicava a pena de talião (olho por olho, dente por dente). Há relatos que três séculos antes do Código do Rei Kamo Rabi – Hamurabi, o código sumério chamado Código de Ur-Nammu trazia em seus artigos a previsão de em algumas situações se ter a indenização como forma de reparação, se aproximando do atual dano moral. Entretanto, Wilson Melo Silva narra que o Código de Manu, na Índia e as leis Mesopotâmicas não tiveram “a manifesta intenção de se referirem, nesta parte, de modo positivo e expresso ao dano moral” 24 Moisés, o grande líder, que conduziu o povo hebreu para a libertação da escravidão no Egito doze séculos a.C, não apenas iniciou uma religião, mas também adotou algumas 23

MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rêgo, Elementos de Responsabilidade Civil por Dano Moral, Rio de

janeiro, Renovar, 2000. 24

SILVA, Wilson Melo "O dano e a sua reparação". 3ª edição Rio de Janeiro: Forense, 1983, pág. 12

22

medidas para que o direito fosse exercido, não excluindo os danos morais, conforme se observa neste texto em Deuteronômio 22:13,19 - Bíblia, em que a vítima sofre uma indiscutível humilhação. "Se um homem desposar uma mulher e, depois de coabitar com ela, a aborrecer, e lhe imputar delitos vergonhosos, e contra ela divulgar má fama, dizendo: Tomei esta mulher, e me cheguei a ela, porém não a achei virgem, os pais da moça tomarão as provas da virgindade dela, e as levarão aos anciãos da cidade, à porta. O pai da moça dirá aos anciãos: Dei minha filha por mulher a este homem, porém ele a aborreceu, e lhe imputou delitos vergonhosos dizendo: Não achei tua filha virgem. Então os pais estenderão a roupa dela diante dos anciãos da cidade, os quais tomarão aquele homem e o castigarão. Condená-lo-ão em cem ciclos de prata, e o entregarão ao pai da moça, porque divulgou má fama sobre uma virgem de Israel. Ela continuará a ser sua mulher e ele não poderá ,mandá-la embora enquanto viver."25

“A legislação que o profeta concebeu acha-se reunida no Pentateuco, um dos códigos mais importantes da antigüidade e que se divide nos seguintes livros: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Apesar de consagrar a Lei de Talião, sua índole era humanitária”26 Para os gregos, as normas impostas pelo Estado liquidaram do direito, a possibilidade da “vingança privada” e previam que a reparação do dano poderia ser pela compensação financeira, tornando-se uma tradição eis que tal previsão ocorria desde os tempos homéricos. A Lex Duodecimum Tabularum ou aLei das XII Tábuas foi promulgada no ano 452 a. C. e, nasceu com o fito de assegurar a plebe o que era direito , possibilitando uma imparcialidade maior no julgamento dos Meritíssimos Magistrados. Contudo, previa penas de cunho pecuniário para os crimes de dano, injúria e furto, ainda que existisse indícios da pena de Talião, conforme se extrai da referida Lei das XII Tábuas, através do § 11 da mesma Tábua VII: “Se alguém fere a outrem, que sofra pena de Talião, salvo se existiu acordo” (Si, membrum rupsit, ni cum eo pacit, tálio esto). “Como se nota, os romanos tinham noções sólidas do dano moral, e é inegável seu aperfeiçoamento ao longo dos séculos, tendo repercussões nos aspectos históricos dos danos morais na Itália, Alemanha e na França, conforme nos ensina Clayton Reis” 27

25

BÍBLIA. Tradução de João Ferreira de Almeida. 4ª edição. São Paulo: Vida, 1996.

26

OLIVEIRA, Adriane Stoll de. A codificação do Direito. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: . Acesso em: 27 out. 2010. 27

ANDREOTTI NETO, Nello. Direito civil e romano. São Paulo: Rideel, 1975, livro 1.

23

O direito público alicerça-se nesta magnífica lei à 2000 anos, que sobrevive influenciando muitas legislações de muitas nações, mesmo sofrendo adaptações no decorrer do tempo, é considerada uma rica fonte do direito universal. No ordenamento jurídico pátrio o instituto do dano moral só fora de fato reconhecido com o promulgação da Carta Magna de 1988, até à sua edição o que se debatia era os fatos que poderiam ensejariam o dano moral. Ainda sob as Ordenações do Reino de Portugal, no Brasil Colônia não havia lei que versava sobre o ressarcimento do dano moral, restando sua impossibilidade neste momento. Buscando desvincular-se da estrutura política e jurídica imperial, onde prevaleciam as Leis Extravagantes e Ordenações do Reino Português, em 1902 foi apresentado ao Senado brasileiro o projeto do Código Civil Brasileiro, sendo instituído somente em 1916 pela Lei nº3.071 de 1916. O Código Civil de 1916 ainda que limitado, previa algumas situações onde caberia a reparação do dano moral, como nos mostra Posteriormente, foi editado o Código Civil de 1916, que apenas previa algumas hipóteses de indenização pelo dano moral, conforme exemplifica Gonçalves (2005, p. 576):

O Código Civil de 1916 previa algumas hipóteses de reparação do dano moral, como quando a lesão acarreta aleijão ou deformidade, ou quando atinge mulher solteira ou viúva ainda capaz de casar (art. 1538); quando ocorresse ofensa à honra da mulher por defloramento, sedução, promessa de casamento ou rapto (art. 1548); ofensa à liberdade pessoal (art. 155); calúnia, difamação ou injúria (art. 1547). 28

O Código Civil de 1916, no seu artigo 159 compelia a reparação do dano, não fazendo qualquer diferenciação ou delimitação entre os danos morais e materiais, o qual dispunha: “Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”.

Em razão da sua preterição nesta situação, lançavam intensos os debates sobre a possibilidade ou não da reparação do dano moral. E a sua reparabilidade “só era reconhecida nos casos de acidentes ferroviários. O Supremo Tribunal Federal, quando decidia questões relativas a esses fatos, não fundamentava suas decisões no artigo 1.538 do Código Civil e sim no artigo 21 caput da Lei n.º 28

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva,2005 pg 576.

24

2.681/12, negando aos familiares das vítimas a indenização por danos morais. Em alguns acórdãos o STF considerava não ser indenizável o valor afetivo exclusivo. Em outras decisões, o artigo 76 da Lei Civil era considerado como norma de natureza meramente processual. E, ainda houve julgamentos em que o dano moral só se tornaria indenizável caso a lesão produzisse reflexos patrimoniais para o ofendido.”

29

É possível contemplar esta visão no antigo acórdão do Excelso Pretório, ao interpretar o art. 1537 do Código Civil de 1916, que conclui não ser indenizável o valor não patrimonial: “Nem sempre dano moral é ressarcível, não somente por se não poder dar-lhe valor econômico, por se não poder apreciá-lo em dinheiro, como ainda porque essa insuficiência dos nossos recursos abre a porta a especulações desonestas pelo manto nobilíssimo de sentimentos afetivos; no entanto, no caso de ferimentos que provoquem aleijões, no caso de valor afetivo coexistir com o moral, no caso de ofensa à honra, à dignidade e à liberdade, se indeniza o valor moral pela forma estabelecida pelo Código Civil. No caso de morte de filho menor não se indeniza o dano moral se ele não contribuía em nada para o sustento da casa.”30

Conclui-se, que o valor da reparação por dano moral deveria estar incluído no montante referente a indenização por dano material. Sendo assim, devido a repercussão social e doutrinária constantes, o entendimento a respeito da reparabilidade do dano moral começou a ser ampliado, mas ainda com muita resistência e limitação. A Constituição Federal de 1988 rompeu com a resistência presente, erigindo no seu artigo 1º, inciso III “a dignidade da pessoa humana” e sacramentando em seu artigo 5º, incisos V e X o direito a reparação por dano moral, de forma ampla e irrestrita, inserido tais direitos no rol das cláusulas imutáveis (pétreas) do art. 60 § 4 da referida Carta, exterminando qualquer desentendimento: Art. 5.º. [...]: [...] V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; [...] X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;31

29

DANO MORAL , Conceito - http://pt.wikipedia.org/wiki/Dano_moral - acesso em 29/10/2010. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. 2a Turma. Ementa: Dano moral. Valor afetivo exclusivo.Indenização. Inadmissibilidade. Inteligência do art. 1.537 do Código Civil. RE 12.039. Relator:Lafayette de Andrada. Data do julgamento: 6.8.1948. RT 244/629. 31 BRASIL,Constituição Federal http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm acesso em 29/10/2010 30

25

Desta forma, restou-se consolidada em nosso ordenamento jurídico a reparação do dano moral, sem posteriormente garantida em favor do consumidor com a edição da Lei n.º 8.078 de 1990 o Estatuto Consumerista. A Lei n.º 10.406 de 2002 contemplou em seu artigo 186, o dano moral e a sua reparação no artigo 927, ambos de forma categórica, clara e objetiva.

2.3 ESPÉCIES DE DANOS MORAIS

Conforme sobejamente abordado, o dano moral no tocante a “causalidade entre o dano e o fato” poderá ser classificado em direto ou indireto.32 O dano moral direto ocorre na lesão à “dignidade da pessoa humana”, a considerada pelo Estado Democrático de Direito no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988 princípio e, quando há violação dos direitos a personalidade da pessoa, tal como leciona Maria Helena Diniz:

O dano moral direto consiste na lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade (como a vida, a integridade corporal e psíquica, a liberdade, a honra, o decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem) ou nos tributos da pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de família)33

O dano indireto provoca um prejuízo a um interesse que não seja patrimonial, em razão de uma lesão a um bem patrimonial daquele que foi lesado.34 Gagliano também leciona o seguinte:

O dano moral indireto ocorre quando há uma lesão específica a um bem ou interesse de natureza patrimonial, mas que, de modo reflexo, produz um prejuízo na esfera extrapatrimonial, como é o caso, por exemplo, do furto de um bem com valor afetivo ou, no âmbito do direito do trabalho, o rebaixamento funcional ilícito do empregado, que, além de prejuízo financeiro, traz efeitos morais lesivos ao trabalhador.35

32

GAGLIANO; Pamplona Filho, 2006, p. 67.

33

DINIZ, 2005, p. 93.

34

35

Loc. cit GAGLIANO; Pamplona Filho, op. cit., p. 67.

26

2.4 DA REPARAÇÃO DO DANO MORAL

Faz se necessária a compreensão da natureza jurídica da reparabilidade do dano moral. Para Sergio Cavalieri Filho 17, o verdadeiro sentido do pagamento em dinheiro pelo dano pessoal: a condenação em dinheiro não é um lenitivo para a dor (reparação), mas uma satisfação. É a esteira seguida pelo Projeto de Lei nº 6.960/2002, que pretende acrescentar ao art. 944 do Código Civil que "a reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao lesante.” 36 A indenização do dano moral compõe não um ressarcimento pela humilhação, dor, sofrimento, mas uma compensação a todos esses sentimentos. Desta forma, a reparação dos danos morais, torna-se uma compensação, de forma pecuniária, em razão da vítima ter suportado intenso sofrimento em virtude de um ato lesivo. Constata-se ser o dano extrapatrimonial imensurável, e insusceptível de avaliação pecuniária. Sendo assim alcança-se o entendimento de Sílvio Rodrigues e Cavalieri Filho, quando diz este ser a condenação em dinheiro por conta de dano moral "mero lenitivo para a dor, sendo mais uma satisfação do que uma reparação."37 Ao bater as portas do judiciário, aquele que foi lesado por um dano moral busca de alguma forma atenuar os efeitos do dano sofrido, e promover um ato punitivo ao causador do dano, como forma de compensar o dano e a injustiça suportados. Neste sentido, ensina Maria Helena Diniz: A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e de satisfação compensatória. Não se pode negar sua função: a) penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor, visando a diminuição de seu patrimônio, pela indenização paga ao ofendido, visto que o bem jurídico da pessoa – integridade física, moral e intelectual, não poderá ser violado impunemente, subtraindo-se o seu ofensor às conseqüências de seu ato por não serem reparáveis; b) satisfatória ou compensatória, pois como dano moral constitui um menoscabo a interesses jurídicos extrapatrimoniais, provocando sentimentos que não tem preço, a reparação pecuniária visa proporcionar ao prejudicado uma satisfação que atenue a ofensa causada.38

36

René Demogue, Traité des obligations, vol. 4, § 403, citado por J. M. Carvalho Santos, op. cit., pp. 23-4, ensina que raramente é reparável adequadamente o dano moral, mas ele pode ser compensado porque "(...) le developpement de la civilisation fait la repugnance a retribuer les oeuvres de l’inteligence." Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil brasileiro, vol. 7, p. 93, explica que a indenização deve corresponder à lesão, e não ser equivalente a ela, "(...) por ser impossível tal equivalência." 37

38

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil, 2ª Edição São Paulo : Malheiros, 2000 DINIZ, 2005, op. Cit. p. 106-107

27

Por tais razões é que a reparação do dano moral apresenta três aspectos inerentes a ela: compensatório, sancionatório e pedagógico. O caráter compensatório é um meio de compensar aquele que foi lesado pelos sofrimentos provocados pelo agente do ato ilícito. O que se espera da reparação do dano moral não é o ato reparatório, em sentido literal, pois, para a dor não há valor pecuniário que a mensure; mas, essencialmente, apreciar o valor compensatório competente a amenizar. Deste modo, é essencial a lição do Professor Wilson Mello Da Silva: “Reparar, em verdade, o dano moral, seria assim buscar, de um certo modo, a melhor maneira de se contrabalançar, por um meio qualquer, que não pela via direta do dinheiro, a sensação dolorosa infligida à vítima, ensejando-lhe uma sensação outra de contentamento e euforia, neutralizadora da dor, da angústia e do trauma moral. .... “... Com a prestação pecuniária o que se visa não é diretamente extinguir a dor com a aplicação de um preço ou antídoto; não é extraí-la pondo-lhe no lugar a moeda, como ficou esclarecido. O que se faz é outra coisa, é procurar para o lesado um conjunto de sensações agradáveis, motivo de satisfação e de emoções, segundo a sua inclinação e o seu temperamento, de sorte a criar condições que, se não chegam a suprimir o sentimento de pesar, de certo podem atenuá-lo, tornando-o mais suportável e menos prolongado”.39

Com fito de atenuar os prejuízos e sofrimentos causados pelo dano , o Direito visa proporcionar ao lesado o meio ideal para a sua recuperação em razão da dor experimentada. O segundo aspecto (sancionatório) terá uma função pedagógica para o agente, pois o educará a agir com prudência em suas ações, e irá persuadi-lo em seu animus laedere, demonstrando assim, que o Estado reprova o ato lesivo. O aspecto pedagógico é um reflexo direto do aspecto sancionatório, pois à medida em que esta exerce papel inibidor na prática de novas ofensas, este fato tem repercussão social, produzindo reflexos igualmente pedagógicos no contexto social. A mera condenação na indenização do dano moral produzirá efeito pedagógico ao agente do ato lesivo, pois trará um desestímulo à reincidência, servindo ainda, como exemplo para a sociedade, sobre o destino do causador de um ato ilícito. . A reparação do dano moral, é multifacetada, apesar de num primeiro momento prevalecer o seu aspecto individualista. A este respeito Carlos Alberto Bittar acentua, reportando-se a René Savatier, Giovani Bonilini e Alfredo Minozzi:

39

REIS, Clayton. Avaliação do dano moral. São Paulo: Forense, 1999. p. 134

28

“[...] embora sob perspectivas diversas possa ser analisada, resultam como centrais, na teoria da responsabilidade civil, as orientações de que: sob o prisma do interesse coletivo, prende-se ao sentido natural de defesa da ordem constituída e, sob o do interesse individual, à conseqüente necessidade de reconstituição da esfera jurídica do lesado, na recomposição ou na compensação dos danos sofridos. De outra parte, sob o ângulo do lesante, reveste-se de nítido cunho sancionatório, ao impor-lhe a submissão, pessoal ou patrimonial, para a satisfação dos interesses lesados. Serve, também, sob o aspecto da sanção, como advertência à sociedade, para obviar-se a prática do mal.”40

Insta adicionar os comentários de Clayton Reis e Rui Stoco, sobre a questão em voga: “O sentido didático existente no dever de indenizar repousa, igualmente, na idéia da construção do homem moral, que seja capaz de entender através do recurso da obrigatoriedade da reparação, a função apaziguadora na ordem social. Afinal, seria impossível imaginar que uma pessoa fosse continuamente obrigada a indenizar prejuízos causados a terceiros, em virtude da prática incessante de atos ilícitos, e não adotasse posturas preventivas e responsáveis no sentido de evitar a perda contínua de seus valores patrimoniais, bem como os abalos psicológicos decorrentes desses fatos”41 “a causa que permite o estabelecimento de determinado quantum é a necessidade e a proporcionalidade entre o mal e aquilo que pode aplacá-lo, e o efeito será a prevenção, a repressão e o desestímulo”14 (grifo nosso).42

Diante o exposto, conclui-se que a reparação do dano moral, possui como foco central a defesa dos interesses individuais e num momento mais amplo serve como instrumento protetor dos interesses da coletividade.

2.5 QUANTIFICAÇÃO DAS INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS

Ainda que diante da autorização concedida pela Carta Magna em seu artigo 5º, inciso V, a indenização por danos morais mesmo que composta por méritos distintos que satisfazem à teoria da compensação e á teoria do desestímulo torna-se árdua a tarefa de analisar o quantum indenizatório, e que métodos e formas serão utilizados para o seu doseamento. 40

BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p.26. 41 REIS, Clayton. Os novos rumos da indenização do dano moral. Rio de Janeiro : Forense, 2002. 42

STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: responsabilidade civil e a sua interpretação doutrinária e jurisprudencial. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2001. p. 1397.

29

Em virtude da omissão da lei, ficou ao arbítrio do Magistrado a valoração do quantum indenizatório no tocante a reparação dos danos morais. Entretanto, quando há omissão na lei, a Lei de Introdução ao Código Civil prevê em seu artigo 4º: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.43 Em momento algum poderá o Meritíssimo Magistrado, abnegar-se de obsequear ao pleito , até mesmo no caso de omissão legal. Sobre imprevisibilidade legal da reparação dos danos morais e a ausência de critérios para mensurar a indenização leciona o mestre Silvio de Salvo Venosa: "A falta de legislação específica nessa problemática tem gerado, todavia, decisões díspares e incongruentes. De qualquer modo, em princípio, a tarifação ou qualquer estudo matemático não é critério adequado para os danos morais em geral, porque amordaça a distribuição da justiça: como é ainda nova essa disseminação dessa modalidade de indenização em nossos tribunais, chegar-se-á, certamente, em breve tempo, a balizamento razoável imposto pela própria jurisprudência".44

Para a melhor compreensão do tema é necessário compreender que existem dois sistemas de aferição do valor indenizatório do dano moral para aplicação no caso concreto , são eles: tarifário e aberto. No sistema tarifário, o valor da indenização já está predeterminado, incumbindo ao Juiz a constatação do dano moral e, após, obedecer aos patamares determinados para cada situação. No sistema aberto, que é o utilizado por nosso ordenamento, o Juiz procederá com a avaliação subjetiva, com fito de satisfazer a lesão sofrida pelo lesado, ao estabelecer o quantum indenizatório. À luz do Código Civil Brasileiro, em seus artigos 186 e 944, a possibilidade de indenização em razão do dano moral ocasionado por ato ilícito está vinculada à proporcionalidade à extensão do dano e à culpa do agente.

2.5.1 – ELEMENTOS PARA ANÁLISE

43

DECRETO-LEI Nº 4.657, DE 4 DE SETEMBRO DE 1942 - Lei de Introdução ao Código Civil.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del4657.htm - acesso em 01/11/2010 44

VENOSA, Silvio de Salvo 2005, p.284-285

30

A seguir, serão elencados alguns elementos que devem influenciar o Magistrado no julgamento, de acordo com o entendimento doutrinário pátrio.

2.5.1.1 DA INTENSIDADE DO DANO

A intensidade do dano deve ser essencial para dosimetria, pois o bem moral tutelado , os efeitos do ato lesivo, e a viabilidade de recuperação psíquica ou física , bem como a extensão do dano ; devem ser observador por este elemento. Como nos mostra o julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, abaixo: AÇÃO INDENIZATÓRIA. COMPRAS EM SUPERMERCADO. RECUSA DO CARTÃO DE DÉBITO, APESAR DO EFETIVO DÉBITO NA CONTA DO USUÁRIO. APLICAÇÃO DAS NORMAS PROTETIVAS DO CONSUMIDOR. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL CONFIGURADO. A INDENIZAÇÃO DEVE REPRESENTAR COMPENSAÇÃO RAZOÁVEL PELO CONSTRANGIMENTO EXPERIMENTADO, CUJA INTENSIDADE, ALIADA AS OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS PECULIARES DE CADA CONFLITO DE INTERESSES, DEVE SER CONSIDERADA PARA FIXAÇÃO DO VALOR. SENTENÇA QUE NÃO OBSERVOU OS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS NA FORMA DO ART. 557, § 1°- A DO CPC, PARA REDUZIR O QUANTUM INDENIZATÓRIO A TÍTULO DE DANOS MORAIS PARA O VALOR DE R$ 2.000,00, MANTIDA NO MAIS A D. SENTENÇA. 45

2.5.1.2 DA REPERCUSSÃO DA OFENSA

Demonstra os efeitos sociais do ato lesionador, no meio (familiar e social) onde aquele que foi vítima de um ato lesivo convive. Verifica-se a ocorrência deste critério no julgamento colacionado abaixo, onde o dano moral não foi considerado, ante a ausência da repercussão social da ofensa. AGRAVO INTERNO. NEGATIVA DE SEGUIMENTO À APELAÇÃO CÍVEL. Decisão em consonância com a jurisprudência predominante nesta Corte, estando assim ementada: "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER

45

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - Décima Quarta Câmara Cível - APELACAO: 001600021.2007.8.19.0036 - Relator :DES. CLEBER GHELFENSTEIN Julgamento: 26/10/2010 –disponível em : http://www.tjrj.jus.br – acesso em 01/11/2010 – grifo nosso.

31

CUMULADA COM INDENIZAÇÃO. COBRANÇA INDEVIDA. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. O dano moral não precisa ser provado através de prova testemunhal, documental, oral ou pericial, pois se trata de um dano interno, traduzido na dor, sofrimento, e constrangimento sofrido.Entretanto, os fatos geradores de tais danos é que podem ser provados, sendo que no caso dos autos, a situação narrada pela autora, ora recorrente, não configura, ao sentir desta relatoria, dor, sofrimento, ou humilhação, sendo incabível a imputação da obrigação de indenizar por danos morais. Todavia, não é qualquer dano moral que se torna indenizável, certo que pequenos aborrecimentos ou percalços, não podem gerar ou configurar dever indenizatório a movimentar o aparelho judiciário para a obtenção de um ressarcimento.Entretanto, o mero inadimplemento contratual ou simples falha na prestação de serviço não são suficientes para ensejar tais danos, não tendo o autor de desincumbido do ônus de comprovar que, dos fatos advieram conseqüências outras aptas a ensejar o abalo psíquico que caracteriza indenização por esse fundamento.Não configurando, a situação narrada dor, sofrimento, ou humilhação, descabida a imputação da obrigação de indenizar pelos danos morais. Não restou comprovada a ocorrência de fato gerador de sofrimento ao ofendido, tampouco da repercussão social da ofensa alegada, devendo ser mantida a sentença monocrática.PRECEDENTES DESTE TJRJ.Apelação desprovida, na forma do art. 557, "caput" do CPC."DESPROVIMENTO DO RECURSO. 46

2.5.1.3 DO GRAU DE CULPA DO OFENSOR

Na análise do elemento “grau de culpa, deve o Juiz deter-se na verificação dos elementos objetivos dos fatos ocorridos, procurando a priori estabelecer uma classificação, o mais possível despida de qualquer critério subjetivo, para que seja estabelecida a classificação que lhe servirá de parâmetro orientador quando prolatar o decisum, sendo de suma importância que estabelecendo o grau em que ocorreu a culpa, também seja analisada a intensidade do dano que em decorrência foi provocado. Se a culpa foi classificada como leve (simples) ou grave. A classificação leve por certo terá que ser levada em consideração para que o quantum indenizatório com maior razão não venha ultrapassar ou até mesmo desprezar os critérios e princípios objetivos e subjetivos da eqüidade quando de sua fixação. Se, porém,

46

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro , Décima Oitava Câmara Cível APELACAO :004769964.2009.8.19.0002 – Relator : DES. JORGE LUIZ HABIB Julgamento: 19/10/2010 disponível em : http://www.tjrj.jus.br – acesso em 01/11/2010 – grifo nosso.

32

o grau de culpa for grave; por certo o seu potencial ofensivo terá repercutido com maior intensidade no ofendido, ocasionando-lhe danos de maiores montas...” 47 Corrobora este critério de fixação do quantum indenizatório o acórdão do STJ abaixo transcrito: REsp 687709 / MG RECURSO ESPECIAL 2004/0139539-7 - Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA (1123) - DIREITO CIVIL. IMPUTAÇÃO DE FURTO A FUNCIONÁRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ARBITRAMENTO MODERADO. INALTERABILIDADE. 1. Considerando que o quantum indenizatório arbitrado a título de danos morais guarda proporcionalidade com a gravidade da ofensa, o grau de culpa e o porte sócio-econômico dos causadores dos danos, não deve o valor ser alterado ao argumento de que é excessivo. 2. Recurso especial desprovido.48

2.5.1.4 POSIÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA DO OFENDIDO

Este elemento é extremamente essencial para a fixação do quantum indenizatório, não devendo ser ignorado pelo interprete. O critério em voga deriva do conceito de Aristóteles que estabeleceu o vinculo da idéia de igualdade à idéia de justiça,consagrando-se na igualdade aristotélica que seria satisfeita se o legislador tratasse de maneira igual os iguais e de maneira desigual os desiguais.49 Isso se justifica em virtude de alguns exercerem maior influência sobre a sociedade do que outros. Desta forma, o ato lesivo praticado contra um indivíduo de grande influência na sociedade deve ser estimado mais grave do que o cometido contra um indivíduo desconhecido. A prestação pecuniária como forma de indenização de dano moral, é utilizada para atenuar o sofrimento do ofendido, que está sensibilizado após o ato lesivo.

47

SILVA, Antônio Cassemiro da. A fixação do quantum indenizatório nas ações por danos morais. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 44, 1 ago. 2000. Disponível em: . Acesso em: 30 out. 2010. 48

Superior Tribunal de Justiça – Quarta Turma REsp 687709 / MG RECURSO ESPECIAL 2004/0139539-7 – Relator : Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – Data do Julgamento : 25/03/2008 disponível em : http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=DJE.font.+ou+DJE.suce.&pro cesso=+687709+&b=ACOR – acesso em 01/11/2010. 49

AFONSO da Silva, José. Curso de direito constitucional positivo. 11 ed., São Paulo : Malheiros, 1996, p. 208.

33

2.5.1.5 DA RETRATAÇÃO OU TENTATIVA DO OFENSOR DE MINIMIZAR O DANO

Estas práticas demonstram arrependimento do ofensor, podendo tornar o caráter punitivo da indenização inócua ou desnecessária.

2.5.1.6 SITUAÇÃO ECONÔMICA DO OFENSOR

Deve ser analisado que se a indenização por dano moral foi fixado em um valor modesto a ser suportado por quem é detentor de grande fortuna, não cumprirá a indenização sua finalidade secundária de inibir a prática de novos lícitos. Desta forma é importante que este critério entre em consonância com o caráter punitivo da indenização do dano moral, pois ainda que sejam pequenos os demais elementos, a reparação do dano moral pela indenização deve ser eficazmente sentida pelo ofensor, para que se façam valer as funções preventivas e punitivas da infração. Sendo assim, a pequena empresa que foi condenada à pagar uma indenização de R$5.000,00 (cinco mil reais) demorará alguns meses para se reestruturar financeiramente. No decorrer desta recuperação financeira, haverá a efetivação da função punitiva e preventiva da indenização. O que não ocorreria se a mesma monta fosse aplicada como condenação para uma grande empresa de telecomunicações. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro utiliza-se deste critério, conforme se analisa do julgado a seguir: Ação indenizatória na qual se pleiteia indenização por danos morais e materiais em razão de cancelamento de vôo internacional e dificuldades no embarque. Sentença que julgou procedente a pretensão autoral. Inconformismo da parte autora quanto ao valor arbitrado a título de danos morais. Relação de consumo. Falha na conduta do fornecedor de serviços, que acabou por ocasionar ao autor mais do que meros aborrecimentos. O quantum indenizatório deve ser arbitrado com observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, ao critério punitivo pedagógico do instituto e à capacidade econômica do ofensor. Valor arbitrado com razoabilidade, condizente com a situação fática e o dano ocasionado ao autor. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO, na forma do art. 557, caput do CPC.50

50

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro , Vigésima Câmara Cível APELACAO : 0138730-71.2009.8.19.0001 Relator : DES CONCEICAO MOUSNIER Julgamento: 15/10/2010 disponível em : http://www.tjrj.jus.br – acesso em 01/11/2010 – grifo nosso

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2.5.1.7 APLICAÇÃO DE PENA OU DESISTÍMULO

Tal critério é mais presente, ou seus reflexos são mais claros nas indenizações de danos nas relações consumeristas com força aumentada consideravelmente, em caso de reiteração da conduta lesiva. Observa-se ser o posicionamento do Tribunal do Estado do Rio de Janeiro: direito do consumidor. fornecimento de energia elétrica. corte indevido. autora que ficou sem energia no imóvel utilizado fins comerciais. sentença julgando parcialmente procedente o pedido, condenando a ré a pagar a autora indenização pelos danos morais suportados no valor de r$ 7.000,00, além dos ônus da sucumbência. inconformismo da ré. valor indenizatório fixado com observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, pois tal importância compensa a autora, e, ao mesmo tempo, desestimula o prestador de serviço a proceder de modo abusivo. busca da efetividade à teoria do desistímulo sem que sob a sua invocação se materialize enriquecimento sem causa. recurso conhecido e seguimento negado na forma do artigo 557, caput do cpc.51

51

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro , Décima Oitava Câmara Cível APELACAO : 009649466.2007.8.19.0004 (2009.001.36745) Relator : DES MARCO AURELIO BEZERRA DE MELO Julgamento: 10/08/2009 disponível em : http://www.tjrj.jus.br – acesso em 01/11/2010 – grifo nosso

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CAPÍTUULO 3: DOS JUIZADOS ESPECIAIS CIVEIS

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Inspirados na Pretoria do Direito Italiano, eclodiram os Juizados de Pequenas Causas para causas relativas a matéria cível em 1984 pela a edição da Lei Federal nº 7.244, visando alcançar a brevidade em solucionar as demandas de menor alçada, melhorando assim a esperança das partes na solução da lide.Porém, os interessados não o utilizaram eis que não era obrigatório, tornando quase que inútil a intenção da lei. A Constituição Federal em seu artigo 98, inciso I determinou a criação, pelos Estados e pela União, de juizados especiais, “providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante procedimentos orais e sumaríssimos, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de Juízes de primeiro grau”. 52

Em cumprimento ao estabelecido pelo Constituinte, em 1995 nasce os Juizados Especiais Cíveis com o advento da Lei n. 9.099, de 26/09/1995.

3.2. HISTÓRICO E DESENVOLVIMENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

Na Inglaterra, os County Courts, funcionam desde 1842 e superam o número de 400, muitos deles atendidos por juízes itinerantes. 53 De resto, conhece a Inglaterra os juizados informais, não-oficiais, a cuja autoridade as partes se submetem por consenso, com procedimento extremamente rápido e simplificado.54 Em 1873 a legislação austríaca elencou os Juizados. Na América do Norte, os Estados Unidos estabeleceram a Poor Man’s Court em alguns de seus estados; na década de 30, em Nova Iorque nasceram as Small Claims Courts 52 53

Art.98,I da CRFB http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm - acesso 01/11/2010.

Cf. J. R. GOMES DA CRUZ, “Reflexões sobre os Juizados de Pequenas Causas”, Revista Forense nº 285, p. 93 e segs. 54 Sobre isso, CAETANO LAGGRASTA NETO, “Juizado especial de pequenas causas e direito processual civil comparado”, no volume Juizado especial de pequenas causas, coordenado por KAZUO WATANABE, p. 71 (iniciado à p. 37).

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também nominado de Common Man´s Court, havendo notícias que a partir de 1912 haviam institutos similares no Kansas, Ohio, Oregon e Illinois, as causas não poderiam superar a monta de U$50,00.55 Com o objetivo de proporcionar melhor defesa dos direitos dos camponeses que não possuíam meios financeiros para contratar causídicos, no século XX, a Noruega implantou este sistema. Verifica-se a presença dos juizados especiais também na Alemanha, México, Japão, Argentina, Itália e Portugal, principalmente no âmbito criminal. No Brasil Lei 9099 de 1995 veio aperfeiçoar o sistema, aumentando a competência do Juizado em relação à matéria e ao valor. A função pedagógica do Juizado Especial Cível hoje pode ser avaliada pelo fato de que uma grande parcela da sociedade busca seus direitos, junto às portas do Poder Judiciário. As microempresas também foram contempladas com as benesses dos Juizados Especiais Cíveis, com a instituição da Lei 9.841, de 1999.

3.3 PRINCÍPIOS QUE ORIENTAM O PROCESSO NO JUIZADO

Os juizados especiais cíveis são incumbidos pelo constituinte de conciliar, julgar e executar as causas de menor complexidade, de acordo com o disposto no artigo 98, I, da CRFB e, seguindo os princípios elencados no artigo 2º da Lei 9.099 de 1995, que são os princípios da oralidade, informalidade, economia processual, celeridade e simplicidade, cumprem a missão de abrir as portas do Poder Judiciário às pessoas mais carentes, atendendo a uma demanda reprimida, mediante a oferta de um processo rápido, econômico e simples.

3.3.1 ORALIDADE

55

SILVANA, CAMPOS MORAES, Juizados especiais cíveis, p. 61, Rio de Janeiro, 1998

37

Na atividade jurisdicional, o processo não consiste somente em atos orais , ou somente em atos escritos, e sim na conjugação de ambos. De modo histórico, o processo progrediu do modo escrito para o modo oral. A oralidade está prevista no artigo. 13, §3º da Lei nº9099/95, seguindo a exigência constitucional do cumprimento da forma oral no tratamento do processo; e pode ser ensinada como a possibilidade de se autorizar a documentação mínima nos atos processuais, registrando-se apenas os atos essenciais, conforme: Art. 13. Os atos processuais serão válidos sempre que preencherem as finalidades para as quais forem realizados, atendidos os critérios indicados no art. 2º desta Lei. § 3º Apenas os atos considerados essenciais serão registrados resumidamente, em notas manuscritas, datilografadas, taquigrafadas ou estenotipadas. Os demais atos poderão ser gravados em fita magnética ou equivalente, que será inutilizada após o trânsito em julgado da decisão.

56

Objetivando agilizar efetivamente os resultados, a oralidade deverá satisfazer diversas funções no decorrer do processo. Exclusivamente oral era, entre os romanos, o procedimento no período das ações da lei. A oralidade perdurou no período clássico, mas já então a fórmula se revestia de forma escrita [...] Inteiramente oral era o procedimento entre os germanos invasores, o que veio a influir no do povo conquistado [...] Mas o direito canônico reagiu contra o sistema e no direito comum generalizou-se o procedimento escrito [...] Na França, porém, o código de processo napoleônico acentuou o traço oral do procedimento, que não fora jamais abandonado (Cintra; Grinover; Dinamarco, 1993, p. 274).57

O relato acima descrito denota que o princípio da oralidade não é novidade de nosso ordenamento jurídico, sendo originário do direito romano germânico. Contudo, a sua participação no procedimento da Lei 9.099/95, tem excelente notoriedade como leciona Lopes :

eis que o princípio da oralidade aparece como norteador geral do processo civil com maior ou menor intensidade, dependendo do tipo da lide, tal qual como posta pelo sistema à apreciação do Estado Juiz. Todavia, no processo comum, pelas suas próprias características, a oralidade não consegue ser erigida ao seu ponto máximo, enquanto no processo especializado a possibilidade aumenta de sobremaneira, como podemos verificar, por exemplo, nos seguintes dispositivos da Lei n.º 9.099/95: 56

BRASIL , Lei 9.099 de 26 de setembro de 1995 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9099.htm acesso 01/11/2010. 57

disponível

em

:

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, DINAMARCO, Cândido Rangel e, GRINOVER, Ada Pellegrini.Teoria geral do processo. 9º ed. São Paulo: Melhoramentos, 1993.

38

artigo 13, §§ 2º e 3º, artigo 14, artigo 17, artigo 19, artigo 21, artigo 24, § 1º, artigo 28, artigo 29 e artigo 30 58

Insta ressaltar duas grandes vantagens deste princípio, a primeira consiste em agilizar o procedimento, permitindo - como já narrado acima – nas audiências o registro apenas de atos essenciais. A segunda trata-se de um sentimento positivo gerado sobre as partes, eis que ao se manifestarem perante o Juiz, lhes é possibilitado influenciá-lo, estreitando a relação do judiciário e aqueles que batem à sua porta. Esta livre manifestação das partes viabiliza a conciliação, promovendo a aceitação das circunstâncias a serem auferidas por consenso mútuo. Importante mencionar que este princípio possibilita um efetivo acesso à Justiça, em razão de ser permitido que as demandas sejam propostas de forma oral. A própria letra do artigo 30 da Lei nº9. 099/1995 permite que as contestações sejam feitas de forma oral e tomadas a termo e sejam anexadas aos autos, tornando os atos processuais mais ágeis, assim também como nos depoimentos das partes e os testemunhos, bem como manifestações das partes em audiência, anexando aos autos, o que torna célere o ato processual. O Princípio da oralidade é essencial e intransponível, segundo as palavras do M. M André Luiz Cidra, no acórdão abaixo: ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO 1ª TURMA RECURSAL RECURSO N 0019435-32.2006.8.19.0070 RECORRENTE: VALDEIA BRITO DA SILVA RECORRIDO: AMPLA - ENERGIA E SERVIÇOS S/A EMENTA - Sentença de extinção do processo, sem exame do mérito, com supedâneo no reconhecimento de ilegitimidade passiva ad causam. "Apagão". Irrefragável pertinência subjetiva para a recorrida figurar no pólo passivo da relação jurídica processual pela sua qualidade de fornecedora do serviço e quem efetivamente contratou com o consumidor, configurando eventual culpa exclusiva de terceiros, segundo o CDC, em situação que em tese pode vir a definir eximente de responsabilidade e não de ilegitimidade como reconhecida na sentença impugnada. Impossibilidade, por outro lado, do julgamento do mérito, já que o processo sequer foi formado validamente. Supressão da audiência de instrução e julgamento. Ainda que possível fosse a aplicação mutatis mutandis do entendimento uniformizado dos Juizes de Juizados Especiais e Turmas Recursais no sentido da viabilidade da adoção da regra estabelecida no art. 285 A do CPC nas questões que envolvam matéria de direito, a causa singularmente apreciada envolve lide que exige análise de fatos cuja prova poderá ser produzida pelas partes, sendo a AIJ a oportunidade própria, ex vi do art. 33 da Lei de Regências dos Juizados. Posicionamento do STJ no sentido de que o julgamento antecipado não é cabível nem mesmo quando a matéria for majoritariamente de direito, exigindo-se que seja 58

Figueira Junior; Lopes, 1995, p. 48.

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exclusivamente de direto (STJ-3ª Turma, AI 891.936, rel. Min. Sidnei Beneti). Causa de pedir que indique questão fática e impede, destarte, o provimento judicial antecipado, notadamente quando a recorrida assevera querer produzir prova, derivando a aplicação do art. 515 § 3º do CPC em irrefragável violação dos princípios jurídico-constitucionais de garantia. Princípio da oralidade que no microssistema dos Juizados Especiais emerge como dogma intransponível e segundo o entendimento consolidado em enunciado abre exceção apenas para as lides que envolvem questão de direito, exclusivamente. Formulação da regra jurídica concreta mediante o julgamento prematuro da lide que está em antinomia com o sistema procedimental da Lei de Regência dos Juizados Especiais. Inadmissibilidade de elastério em procedimento para limitar fases. Exegese ampliativa que não é permitida no microssistema dos Juizados Especiais, em que há concentração dos atos processuais na AIJ, dispondo os arts. 27 e 28 da Lei 9.099/95 sobre a imprescindibilidade da realização da audiência de instrução e julgamento e audição das partes. Indisponibilidade do rito especial da Lei 9.099/95 fora da exceção legal. A legalidade da forma procedimental é obrigatória pelo substrato da lei regente e subordina a atividade judicial para a entrega da tutela jurisdicional. Reconhecimento da nulidade do processo, a fim de que seja designada audiência de instrução e julgamento, uma vez que não há subsunção do conflito de interesses à regra estabelecida no artigo 285 A do CPC, diante da necessidade imperiosa da análise de matéria fática. Nulidade que é reconhecida de ofício. Provimento do recurso. Ante o exposto, na forma prevista no art. 46 da Lei 9.099/95, voto pelo provimento do recurso para declarar a nulidade do processo a partir da sentença, a fim de que seja formado o processo regularmente, designando-se audiência de instrução e julgamento. Sem ônus sucumbenciais. Rio de Janeiro, 16 de agosto de 2010. ANDRÉ LUIZ CIDRA Juiz Relator59

Contudo a prática forense tem nos revelado que as audiências ainda são registradas de forma tradicional, não proporcionando a celeridade desejada com a edição da lei.

3.3.2 SIMPLICIDADE:

No caput do artigo 3 º da Lei 9099/95, lemos que o Juizado Especial Cível tem competência para conciliação , processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade. Desta última parte, se extrai a essência deste princípio, eis não são permitidas as demandas complexas, pois se aceitas, desvirtuariam a celeridade e a manifestação jurisdicional, objetivos do Juizado Especial Cível. O princípio da simplicidade também pode ser percebido na permissibilidade da direção dos atos processuais, que podem ser orientados por juízes leigos e conciliadores. Permite-se assim, aos mais humildes que possuem algum receio de assentar-se à frente de um 59

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – Conselho Recursal - 2010.700.044862-6 – Relator : Des. André Luiz Cidra- Julgamento: 16/08/2010 –disponível em : http://www.tjrj.jus.br – acesso em 01/11/2010 – grifo nosso

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Magistrado, a oportunidade de expor sua opinião à uma pessoa que não lhe traga desconforto, sendo este o conciliador ou o juiz leigo. Verifica-se ainda, a possibilidade das partes obsecrarem por seus direitos sem a presença de um advogado, ante a ausência de recursos para custear a assistência advocatícia. Em virtude desta possibilidade, não deve ser exigido daquele laico, o entendimento de um causídico.

3.3.3 INFORMALIDADE:

Os atos processuais serão válidos sempre que preencherem as finalidades para as quais forem realizados60, assim se inicia o artigo 13 da Lei nº9099/95. Implica dizer que a informalidade está nos atos processuais, na oralidade da contestação, da dispensa da assistência advocatícia nas causas cujo valor não ultrapasse os (vinte) salários mínimos. As palavras de Alexandre Freitas Câmara sobre o referido tema merecem ser consideradas: “O processo nos Juizados Especiais Cíveis é pois, um processo deformalizado, em que não se pode exigir qualquer formalidade desmedida, exacerbada, considerandose válido o ato processual sempre que atingir sua finalidade originariamente prevista. Além disso, para aproximar o jurisdicionado do órgão jurisdicional, é essencial que todas as formalidades exageradas sejam evitadas...” 61

Ao suscitar a existência de alguma nulidade processual, no sentido de que aqueles atos que tiverem alcançaram a sua finalidade e não prejudicaram a defesa, devam ser aproveitados. Os Juizados Especiais sugerem um modelo que atendam às demandas de menor complexidade, para as quais seja suficiente uma versão simplificada do processo comum, a fim de se solucionar o litígio, tendo por finalidade oferecer solução de forma rápida, descomplicada e a baixos custos, principalmente para os casos que envolvam pequeno valor econômico. (Cunha, 1999, p. 25)62

60

Art. 13., Os atos processuais serão válidos sempre que preencherem as finalidades para as quais forem realizadosatendidos os critérios indicados no artigo 2º desta Lei.§ 1º. Não se pronunciará qualquer nulidade sem que tenha havido prejuízo. 61 CÂMARA, Alexandre Freitas– Juizados Especiais Civeis Estaduais e Federais Uma Abordagem Crítica – editora Lumen Juris – Rio de Janeiro 2004 – página 21. 62 CUNHA, Belinda Pereira da. Antecipação da tutela no código de defesa do consumidor – tutela individual e coletiva. São Paulo: Saraiva, 1999.

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3.3.4 DA ECONOMIA PROCESSUAL:

A economia processual pode ser entendida como a luta pelo melhor resultado com o exercício de um direito, utilizando-se do mínimo de atos processuais. Entretanto, “deve haver uma necessária proporção entre fins e meios, para equilíbrio do binômio custo/benefício” (Cintra; Dinamarco; Grinover, 1993, p. 67). Lado outro, ressalta-se que, em apreço ao princípio da economia processual, a Lei 9.099/95 dispõe que o único recurso cabível é o recurso inominado, além é claro, dos embargos declaratórios. Perante o rito sumaríssimo, altamente célere é essencial a observância do princípio em comento, sendo que os atos que não são compatíveis com os princípios elencados na norma devem necessariamente ser remetidos à Justiça comum. RECORRENTE: UNIBANCO- UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S/A RECORRIDO: CIRO AZEVEDO RIBEIRO EMENTA Responsabilidade civil objetiva do banco. Alegação autoral de que meliante teria conseguido celebrar contrato bancário com o recorrente, emitindo cheque que após reapresentação foi devolvido por insuficiência de fundos, gerando aponte negativo no CCF do BACEN, repercutido por registro do Serasa. Recorrido que ingressou com outras ações congêneres, relativas a cheques diferentes, tendo em uma delas confessado reconhecer a sua assinatura em documento caracterizado por "cópia de cheque". Circunstância que afasta a verossimilhança da alegação autoral de que não realizou contrato bancário com o recorrente, conquanto pela ausência de outros elementos de prova não seja possível definir a lide com segurança, sendo imprescindível a perícia técnica. Debilidade na produção de prova, acrescida de circunstância relevante que foi a confissão do demandante em outro feito onde admitiu ser sua a assinatura em documento vinculativo à conta corrente indicada como fraudada, que não permite o reconhecimento seguro da omissão da recorrente com o dever de cuidado que era exigido da Instituição bancária. Prova emprestada que é admitida no microssistema dos Juizados Especiais Cíveis e guarda inteira sintonia com os critérios norteadores do procedimento dos Juizados Especiais (art. 2° da Lei 9.099/95), notadamente os da economia processual, celeridade, simplicidade e informalidade. Provimento parcial do recurso para julgar extinto o processo, sem exame do mérito, reconhecendo a complexidade da causa pela necessidade de realização de perícia técnica. Ante o exposto, na forma do art. 46 da Lei 9.099/95, voto pelo provimento parcial do recurso para reconhecer a necessidade de perícia técnica para a solução da lide, julgando extinto o processo, sem exame do mérito, com fulcro no art. 51, II da Lei de Regência dos Juizados Especiais Cíveis. Sem ônus de sucumbência. Rio de janeiro, 08 de junho de 2009. ANDRÉ LUIZ CIDRA Juiz Relator 63

63

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – Conselho Recursal - 2009.700.032484-0– Relator : Des. André Luiz Cidra- Julgamento: 08/06/09 –disponível em : http://www.tjrj.jus.br – acesso em 01/11/2010 – grifo nosso

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3.3.5 CELERIDADE:

O princípio da celeridade tem por objetivo a rapidez na conclusão do processo e seus efeitos. Por este princípio a justiça deve ser cumprida de forma mais breve possível. Portanova descreve o princípio da celeridade da seguinte maneira: “a celeridade é uma das quatro vertentes que constituem o princípio da economia processual. As outras são economia de custo, economia de atos e eficiência da administração judiciária.” 64

Importante destacar que tal peculiaridade não deve ser exclusividade dos Juizados Especiais Cíveis, conforme leciona Alexandre Câmara, “o processo que se instaura perante um juízo comum, em que se aplica o sistema processual do Código de Processo Civil deve ser tão célere quanto possível” 65 É necessário agir com cautela na defesa da celeridade processual, pois a finalidade da atividade jurisdicional é desapoquentar os ânimos das partes. E havendo erros nas decisões sob a justificativa da celeridade processual, tal justificativa não seria aceita. O que é de suma importância para a sociedade é a justiça.

64

PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 2ª tiragem. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997. p. 171 65

CÂMARA , Alexandre de Freitas – 2004- pag 23.

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CAPÍTULO 4: DA BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL COM O ADVENTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

4.1 BREVE HISTÓRICO SOBRE A REPARAÇÃO POR DANO MORAL

Anteriormente a Constituição Federal havia uma grande batalha entre a doutrina e a jurisprudência no tocante a indenização por dano moral. De um lado o entendimento doutrinário defendia a reparabilidade e do outro a Jurisprudência era totalmente contrária ao instituto da indenização por dano moral. Com a chegada da Constituição Federal de 1988 a divergência em relação a reparação por dano moral foi atenuada, pois nos incisos V e X, do art. 5°, a nossa Lex Mater, alçou a status constitucional a proteção aos bens imateriais do individuo. Ainda antes da instituição da Constituição de 1988, haviam algumas leis que previam e regulavam as indenizações por danos morais , tais como : o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/62), a lei de imprensa (Lei 5.250/67), assim como na lei de falências (decreto-lei 7.661/45) e no Código Eleitoral (Lei 4.737/65) e o precursor Decreto 2.681 de 1912 que regulava as atividades das estradas de ferro, para mencionar algumas.

4.2 A BANALIZAÇÃO DO INSTITUTO

A definição de banalização nos remete a “algo que teve sua imagem desgastada, ou algo de importância que se tornou menos importante pela exaustão da repetição sobre um determinado assunto.” No caso em voga "A banalização do dano moral", por exemplo, pode expressar que, de tão comum, algo tão sério acabou virando algo rotineiro.

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Pois foi o que de fato ocorreu, a reparação por dano moral, hodiernamente é encarada como rotina, diante a sua repetição, a principio, em razão da conscientização da sociedade, no que diz respeito aos seus direitos, diante da garantias constitucionais. Em um segundo momento, percebe-se que a facilidade do acesso à justiça, proporcionada pelos Juizados Especiais Cíveis, promoveu um vasto acréscimo nas demandas propostas buscando a reparação por danos morais. Em muitas situações, as ações são infundadas, e os litigantes

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BANALIZAÇÃO, Conceito , disponível em : http://pt.wikipedia.org/wiki/Banaliza%C3%A7%C3%A3o – acesso em 03/11/2010

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apenas desejam um enriquecimento, este perceptível pela monta desproporcional pleiteada, e não uma compensação pelo alegado dano sofrido. Insta dizer que a regra constitucional da reparabilidade tem o objetivo proteger a ofensa à dignidade humana, conclui-se que o instituto não deveria ser banalizado O Juiz Amauri Lemos prolatou a seguinte sentença sobre o assunto: "(...) qualquer briga, qualquer descumprimento de um contrato, está gerando processos de indenização por dano moral. Claro que, como já expliquei, cada qual sabe sua dor, mas há situações em que é explicita a intenção de conseguir qualquer valor que seja, pelo simples fato, por exemplo, da não entrega de uma revista o tempo aprazado.(...) o instituto do dano moral vem sofrendo um grande desvirtuamento, ou seja, alguns profissionais do direito estão exagerando a sua configuração, ingressando com ações, em números cada vez maiores, com pedidos de ressarcimento por danos morais em cifras absurdas". 67

Vale mencionar o acórdão da Turma Recursal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro: Pedido de compensação por danos morais formulado pelo autor em face do Banco do Brasil S/A. Alega o autor que no dia 24/09/07 foi impedido de entrar numa das agências da parte ré, sob o argumento de que o sistema estava "fora do ar", e que teria sido preterido, de forma discriminatória, pelos prepostos da parte ré. Acrescenta o autor que acionou a polícia militar e acabou conseguindo entrar na agência, bem como que o fato foi registrado na 52ª delegacia de polícia. A sentença extinguiu o processo, sem julgamento do mérito, com fundamento na incompetência territorial. Recurso inominado interposto pelo autor. A sentença merece reparo. Incompetência territorial reconhecida de maneira equivocada. Se o fato aconteceu na cidade de Nova Iguaçu o Juizado Especial Cível situado nesta comarca é competente para julgar a causa, sendo irrelevante o fato de o domicílio do autor estar localizado em outro município. Incidência do disposto no artigo 4º, III, da lei 9099/95. Aplicação da teoria da causa madura (art. 515, §3°, do CPC) para que o mérito da causa seja apreciado. O pedido formulado na inicial deve ser julgado improcedente. Não há nos autos absolutamente nenhum indício de que o autor, ora recorrente, tenha sido maltratado por parte dos prepostos do Banco do Brasil. O que houve foi intolerância por parte do recorrente. Os prepostos do recorrido agiram bem ao orientarem os consumidores a aguardar do lado de fora da agência a normalização do atendimento, porque o ingresso de mais pessoas na agência sem que o atendimento das pessoas que estavam no seu interior fosse concluído acarretaria o acúmulo desnecessário de pessoas no interior do estabelecimento. A narrativa da inicial é inverossímil e não encontra amparo em elementos mínimos de prova. Acolher o pleito do autor significaria estimular o ajuizamento de demandas fadadas ao insucesso, contribuindo para a banalização do conceito de dano moral e para o surgimento de indesejável sociedade de litigantes. Isto posto,

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Sentença proferida no Processo nº 005.2003.004901,1ª Vara Cível da Comarca de Ji-Paraná – RO, onde foram partes Maria Aparecida Ludgero Passarini e Grupo de Comunicação Três S/A.

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dou provimento parcial ao recurso inominado para anular a sentença apenas para que o mérito da causa seja conhecido e, nesta parte, julgado improcedente o pedido formulado na inicial. Sem custas e honorários sucumbenciais (art. 55, da Lei 9.09/95).68

Arnaldo Marmitt leciona: "O dano moral que induz obrigação de indenizar deve ser de certa monta, de certa gravidade, com capacidade de efetivamente significar um prejuízo moral. O requisito da gravidade da lesão precisa estar presente, para que haja direito de ação. Ao ofendido cabe demonstrar razões convincentes no sentido de que, no seu íntimo, sofreu prejuízo moral em decorrência de determinado ilícito. Alterações de pouca importância não têm força para provocar dano extrapatrimonial reparável mediante processo judicial. A utilização da Justiça deve ser deixada para casos mais graves, de maior relevância jurídica." 69

Portanto, entende-se que não é qualquer caso que se enquadra como sendo de dano moral. Torna-se imoral, a busca pelo enriquecimento através de ações indenizatória por danos morais, levando em conta, que as inúmeras demandas totalmente infundadas, atravancam os cartórios gerando a lentidão, que tanto é evitada ou combatida pelos Juizados Especiais Cíveis. O que é alarmante é que ao tentar convencer o Magistrado de um erro, objetivando o enriquecimento indevido, nasce a banalização, o desprestígio de uma garantia absolutamente essencial a todos. Entende João Roberto Parizatto: “O Direito Positivo Brasileiro admite a reparabilidade do dano moral, eis que todo e qualquer dano causado a alguém deve ser indenizado, de tal obrigação não se excluindo o mais importante deles que é o dano moral, que deve autonomamente ser levado em conta. O dinheiro possui valor permutativo, podendo-se, de alguma forma, lenir a dor.70

68

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – Conselho Recursal - 2009.700.013937-3– Relator : TIAGO HOLANDA MASCARENHAS - Julgamento: 31/03/2009 –disponível em : http://www.tjrj.jus.br – acesso em 01/11/2010 – grifo nosso 69

70

MARMITT, Arnaldo, Dano Moral, AIDE, 1ª edição, 1999, p. 20 Dano Moral. Editora Parizatto, 2ª edição/2000 - MG., pág. 01.

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Entretanto, conforme já amplamente abordoa não é qualquer contratempo que enseja a indenização. O contratempo deve causar efeitos sensíveis ao lesado. A prestação pecuniária atuará para compensar a dor experimentada por aquele que sofreu o ato lesivo. Contudo esta pecúnia indenizatória tem sido instituída de forma diversa do previsto em lei, pois tem sido meio de enriquecimento sem causa. Nos Juizados Especiais Cíveis, os litigantes utilizam-se da facilidade de “acesso à justiça” concedida pela irresponsabilidade processual da Lei nº. 9099/95, e empregam o pedantismo indenizatório nominado dano moral Porém, o instituto do dano moral deve refletir no campo subjetivo e social, não sendo um simples contratempo como assevera Sérgio Cavalieri Filho: "O dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Nessa linha de princípio, só deve ser reputado dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos." 71

A reparabilidade do dano é cabível nos casos que não correspondam ao dia-a-dia do lesado, ou seja, os problemas devem fugir à rotina diária, não deve ser comum, deve causar uma alteração do cotidiano. Enio Duarte Fernandez Junior em Dano moral e Juizado Especial Cível esclarece a questão de forma brilhante: O que ocorre é que, dia após dia, as pessoas não se suportam mais. Não suportam ou toleram a convivência e, à cada problema, logo tentam auferir uma vantagem pecuniária e, para tanto, por não ter certeza da procedência de sua aventura, escudam-se na irresponsabilidade processual do rito do JEC para, em sucumbindo, nada ter a perder.Mais, na incerteza da existência de um direito material concreto, originador de um dever indenizatório na regra clássica da responsabilidade civil – agente»conduta»dano – também a aventura processual irá socorrer-se da inexistência da responsabilidade, ou responsabilização, processual que é natural do JEC. 72

71

72

CAVALIERI FILHO, Sérgio:Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros Editores, 2.ª edição, p. 79.

Disponível em http://www.ambito-juridico.com.br/site/index. php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2274. Acesso em 03/11/2010. Enio Duarte Fernandez Junior

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A utilização dos Juizados Especiais em busca de indenizações ainda que de forma temerária tem se alastrado, ante a ausência da sucumbência, da oralidade e da desnecessidade de assistência advocatícia. Sentencia o Juiz Tiago Holanda Mascarenhas: Embora a parte ré não tenha se esmerado em prestar a inequívoca informação de que cada edição da revista conteria apenas uma aula do curso de maquiagem e que para ter acesso ao curso completo o consumidor deveria colecionar 10 edições da revista, não chegou a haver dano moral. É difícil acreditar que algum dos direitos inerentes à personalidade da recorrida tenha sofrido lesão substancial. Acolher o pedido de condenação da recorrente ao pagamento de indenização por danos morais, data vênia, contribui para a banalização do conceito de dano moral e para o surgimento de verdadeira sociedade de litigantes. Isto posto, dou provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido de compensação por danos morais...73

É latente a vulgarização do dano moral, ao ponto de qualquer situação corriqueira tornar-se fundamento para uma ação indenizatória por danos morais. A acessibilidade ao Judiciário proporcionada pela Lei 9.099/95 em algumas situações pode beirar a irresponsabilidade processual, Assevera Taíse Galvani (2009) infelizmente o Poder Judiciário têm utilizado de forma instigada a aplicação do dano moral para todo e qualquer fato, o que inexoravelmente vem causando verdadeira banalização desse instituto.74 A indenização do dano moral utilizada de maneira equivocada acabou por fomentar novos pleitos com os mesmo pedidos. Importante destacar a as palavras da Juíza Rosangela Carvalho: “Deve ser desencorajada a proliferação da indústria de dano moral que atualmente ocorre, havendo exacerbado número de demandas da espécie em nossos tribunais e, na maioria das vezes, desacompanhadas de justa causa”. 75 Fosse aplicada maior austeridade nos pleitos, o litigante irá avaliar a efetiva constatação do dano, antes de propor a demanda. Contudo, como já narrado neste capítulo, a sociedade está lançada a imoralidade, visando sempre a alteração da situação financeira, empenhando-se no acontecimento de situações ensejadoras de danos morais. A primeira causa é a falta de integridade moral de grande parte destes litigantes. (...) Poder-se-ia atribuir (...) o acionamento do judiciário em busca de indenizações por 73

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – Terceira Turma Recursal – Sentença do processo: 2009.700.011284-7, Juiz Tiago Holanda Mascarenhas disponível em : http://www.tjrj.jus.br – acesso em 01/11/2010 – grifo nosso 74 GALVANI, Taise Garcia. Excesso de pedido de dano oral banaliza o direito. Revista Consultor Juridico, 15 fev. 2009. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-fev- 15/ industria-indenizacao-banaliza-direito-danomoral>. Acesso em 03/11/2010. 75 JUÍZA NEGA INDENIZAÇÃO A CONSUMIDORA E CRITICA INDÚSTRIA DO DANO MORAL. Central Jurídica, 30 ago. 2005. Disponível em http://www.centraljuridica.com/materia/1611 /dano_moral/juiza_nega_indenizacao_consumidora_critica_industria_do_dano.html>. Acesso em 03/11/2010.

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supostos danos morais à pobreza generalizada em nosso país, (...) não fosse a grande gama de litigantes ricos que pleiteiam verdadeiras fábulas dignas dos prêmios das melhores loterias.76

No tocante ao aspecto da facilidade do acesso á justiça, destacam-se dois pontos: para as classes menos abonadas, temos a ausência de custas na propositura da ação; para os mais favorecidos: a impunidade relativa às demandas sem fundamento, que poderiam ser caracterizadas na litigância de má-fé. O que merece repúdio é o ligante que busca a tutela jurisdicional mesmo tendo conhecimento da inexistência do ato lesivo ou do dano, ingressando com a demanda para enriquecer-se à custa de algum abonado, ou em razão de pequenos percalços do cotidiano. Representa-se em um meio de resguardar de maneira ampla a moral do indivíduo, entretanto, em alguns momentos essa se dá em detrimento da real configuração da responsabilidade civil. Entende-se que neste contexto exista uma divisão do dano moral, o dividindo em: dano moral efetivo e situações ensejadoras de reparação moral, nesta última, o sentimento da lesão não se dá de forma efetiva, porém merece ser reparado. A consolidação na jurisprudência das situações ensejadoras, confronta com a imensidão das alegações de dano moral em situações insólitas. Assim leciona o Desembargador aposentado Ramon G. von Berg:

Conforme se verifica, embora possa ser notada a tendência dos magistrados em buscar conter a onda vislumbrada como indústria do dano moral, com reflexos até no STJ, o fato é que a dimensão, o elastério, o alcance hoje do dano moral vem-se abrindo para hipóteses nunca dantes alvitradas. 77

Diante da imprevisibilidade da ocorrência do dano, em conjunto com as facilidades de acesso ao judiciário impostas pela Constituição Federal e a Lei 9.099/95, a banalização do dano moral é fortalecida. Em alguns momentos os litigantes criam circunstancias que possam gerar um dano moral, ou demandam por simples desforra, caracterizando legítimo abuso do direito.

76

HERMES, Gustavo Cauduro. Combatendo a indústria do dano moral. Augure, RS: 14 mai. 2003. Disponível em: http://www.augure.com.br/content/artigos_detalhe.php?artigo_id=4>. Acesso em: 03/11/2010 77

BERG, Ramon G. Von. Dano moral. Disponível em: http://www.blindagemfiscal.com.br/danos/ dano_moral02.htm>. Acesso em: 03/11/2010

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Vislumbra-se que, a aplicação com maior rigor da condenação em litigância de má-fé em conjunto com a redução dos valores das indenizações poderão coibir a vulgarização deste instituto. Necessário se faz também, harmonizar a condenação em litigância de má-fé em casos absurdos com a mudança da caracterização do dano moral em algo mais definido, concreto e certo, com critérios mais científicos e melhor conceituado.

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CONCLUSÃO

O presente trabalho tratou da banalização do dano moral com o advento dos Juizados Especiais Cíveis, com a finalidade de demonstrar que as facilidades propostas pela Lei 9099/05, visando tornar céleres os atos processuais, acabaram por “entulhar” as prateleiras dos cartórios. Ao abordar a Responsabilidade Civil constatou-se que os requisitos da responsabilidade civil são: ação ou omissão, culpa, nexo causal e dano, contidos no 186 do Código Civil. A culpa torna-se elemento essencial para a caracterização da responsabilidade objetiva. O dano moral caracteriza-se pelo dano extrapatrimonial. A Constituição Federal de 1988 possibilita em seu artigo 5º, incisos V e X,a reparação dos danos morais, com o objetivo de atenuar o sofrimento psíquico ou moral do lesado , através da pecúnia indenizatória Com o surgimento dos Juizados Especiais Cíveis podemos perceber que os últimos anos houve um grande aumento e ações nestes órgãos buscando indenizações de grande monta. a criação dos Juizados Especiais Cíveis estes contribuíram pra a banalização do dano moral em razão dos meios de acesso à justiça. Fazendo com que o jurisdicionado muitas das vezes vislumbre o sucesso da ação como forma de obter um enriquecimento fácil, sem custo algum. Muitos alegam que em razão do acordar dos brasileiros para a cidadania, a sociedade se conscientizou de seus direitos, e disso deriva o elevado numero de demandas pleiteando indenizações por danos morais. Hodiernamente pode-se concluir que a banalização do instituto do dano mora ocorre, pois qualquer desentendimento, contratempo discussão, fatos que não fogem a normalidade cotidiana, ocasionam demandas infundadas. Contudo, ainda que infundadas algumas das ações são levadas a procedência de seus pedidos, sem ao menos a verificação dos requisitos essenciais da responsabilidade civil. Assim, novamente narramos que não é qualquer dissabor ou constrangimento que deve ser considerado como dano moral, o correto conceito sobre o dano moral é a: dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, foge à normalidade e é capaz de interferir de forma intensa na esfera psicológica da pessoa, causando-lhe sofrimento, angústia e desequilibro em seu bemestar e a sua integridade psíquica, existindo efetivamente um dano a ser reparado.

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Conclui-se que é necessário medidas para inibir o abuso de direito na utilização dos Juizados Especiais Cíveis como meios de enriquecimento sem causa, ou como lugar para desforras, devendo a condenação por litigância de má-fé ser aplicada com mais rigor, bem como os Magistrados julgarem as indenizações de modo justo e de acordo com a comprovação do dano alegado.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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SILVA, Wilson Melo "O dano e a sua reparação". 3ª edição Rio de Janeiro: Forense, 1983, pág. 12

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REFERÊNCIAS ELETRÔNICAS:

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