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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS . FAFIC
Gontexto
Publicação da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
Publicação semestral rssN 1983-0238 Mossoró, v. 3, n. 3, 2008
Conselho Editorial Aluísio Lins de Oliveira Edinaldo Tiburcio Gonçalo Emanuel Pereira Braz Francisco Fabiano de Freitas Mendes José Roberto Cardoso da Cunha Robson Fernandes Filgueira Tobias Arruda Queiroz
SUMARIO
Apresentação
Projeto Gráfico/capa Tobias Arruda Queiroz
Revisão Conselho Editorial Endereço secretaria da Faculdade de Filosofia e ciências sociais Conselho Editorial da Revista Contexto Campus Central da UERN Rua Prof. Antônio Campos, Br 110, Km 48, Costa e Silva - CEp - s9.600970, Mossoro/RN.
[email protected]
Contexto. Revista Acadêmica da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais, v.3, n.3, (jan .ljul,2008). - Mossoró, RN: Faculdade de Filosofia e Ciêncías Sociais, 2008. Semestral
Descrição baseada em'. V.2, n.2 (jan./jul., 1gg7) ISSN: 1983-0238 1 ciências sociais - periodico. 2. Filosofia - periodico. 3.comunicação social - periodico. 4.Geografia - periodico. 5. Historia - periodico. l. universidade do Estado do Rio Grande do Norte. ll. Faculdade de Filosofia e ciências sociais. lll. Títuro. UERN/BC CDD 3OO
CDU
3
...09
Ciência= So"iri; Uma discussão sobre as ciências sociais e um trabalho sociologico Francisco Vanderlei de Lima. .........15 Etica e trabalho Ailton Siqueira .........27 Descentralizaçáo e participação: as ambigüidades democráticas José Osimar Gomes de Lima ........45 Comunicação Social O jornalismo como gênero literário Márcia de Oliveira Pinto .........59 O sítio virtual como suporte de leitura e navegação Taciana de Lima Burgos ........73 As marcas ideologicas na linguagem publicitária do outdoor Jefferson Garrido de Araújo NeÍo .........90 Filosofia Nova hermenêutica historico-crítica: revolução anamnésica e solidariedade historica em Walter Benjamin Francisco Ramos Neyes ...... 1 03 Os valores como fundamento ético do agir humano Edinaldo Tiburcio Gonçalo .. 111 A Bioética e a seca: um novo olhar Maria Veralúcia Pessoa Porto e Telmir de Sousa Soares .......125 Geografia O Espaço da Modernidade: a (re) construção urbana de Natal na década de 1920 Jamilson Azevedo Soares ....143 História Euclides da Cunha e a contradição no pensamento brasileiro Francisco Fabiano de Freitas Mendes .......160 A megafauna extinta e os artefatos culturais de um tanque natural na região Central do Rio Grande do Norte Valdeci dos San tos, Kleberson Porpino, Abrahão Sanders on .. .... 176 Colaboradores 194 Normas para Publicação
Somente assim se estruturará uma verdadeira sociedade, em que todos assumarl compromissos com os seus companheiros, sabendo que a dignidade de cada um depende da dignidade do outro. (STRIEDER, 1992)
A Bioética e a Seca: um novo olhar Maria Veralúcia Pessoa Porto Departamento de Filosofia / UERN
Telmir de Sousa Soares Departamento de Filosofia I UERN
NOTAS rArtigo adaptado a partir do texto Ética, produzido inicialmente como uma
das unidades
do Caderno de Estudos do Projeto Juventude Cidadã.
REFERÊNCIAS BOCHENSKI, J. M. Diretrizes do pensamento filosófico. 7.ed. São Paulo: E,PU, 1987.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: temas transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998. MONTEIRO, A. P. Valores éticos e cidadania. 2.ed. São Paulo: [s.n], 200s.
STRIEDER, Inácio. O lugar da ética na sociedade atual. Perspectiva filosófica, Recife, v. 1 , n. l, p. 1 1,, julldez. 1992.
VAZQUEZ, Adolfo Sanches. Étic a.7 .ed. Rio de Janeiro: Civrhzação Brasileira, 1984, (Coleção Perspectivas do Homem, v.46).
Resumo - O texto trata de uma reflexão bioética que apresenta diferentes formulações sobre a seca, que sempre foi tratada como responsável maior por todas as mazelas do Nordeste, responsabilidade, questionada neste artigo. Queremos mostrar que a origem da miséria no sertão nordestino não está na escassez de água nem na irregularidade dos invernos, mas na forma como a sociedade da região está organizada nos aspectos sociais, econômicos e políticos, mais do que uma contingência da natureza, o problema da seca exibe uma dimensão política no problema da seca. Palavras-chave: Bioética. Seca. Política.
Abstract - Thc prcscnt tcxt brings a bioethic reflection about diÊ ferent views over drought, which has always been seeing as the main cause of Brazilian Northeast problems. Through the questioning of this responsibility, the text intends to show that the northeast poverty in not caused by water scarcity or season irregularity, but it's caused by the way people are organrzed in that area concerning the social, political and economic aspects. Instead of a natural explanation, the problem of drought has its roots on a political field. Keywords: Bioethics. Drought. Politics.
Na cidade em que vive uma grande leva de pedintes, mendigos e miseraveis, encontranlos, geralmente, por tras deles, governantes corruptos e salteadores até mesmo dos Templos. Platão A Rcp[rhlica
124
Edinaldo Tibúrcio Gonçalo - Os V:tlores Como Fundamento Éltc«r rto Ar;ir Humantr
CONTEXTO
1
.15-.1
39
125
Introdução A Seca tem sido um objeto de pesquisa muitas vezes mal definido. Este fenômeno é uma terrível realidade, mas não é a principal causa
tt;r
brasileiros que obseruam via meios dc comutricrtç;rt) () l)rrlrlt'rrr;r rl;1 :i(.('r. ;r considerar tanto o problema como sua solução scgurrtlo unrir ( ()n( r'l)(,,r(l mágica e naturalista, promovendo um tipo de escapisnro (pr('ollr;r t'(':,1)('r.l pelo "céu" como o portador de melhores condições de tcrnpo c tlt' vrrLr l;rl
pobreza da Região Nordeste e tem servido unicamente para justificar uma serie rle
postura só estimula uma concepção rnítico-naturalista do mundo, o (luc nn
problemas sociais por qlle passa a região, assim como tem sido
pede o homem de romper com seu subordinamento e seu subdescnvolvi
a base
sobre a qual
se ergueu um complicado sistema político de malversação de verbas, assistenciu
mento.
lismo e paternalismo.
Assim como a medicina, enquanto ciência, cura enfermidades, ali-
E fato que a irregularidade climática causa a seca e, como unr:r reação em cadeia, a seca causa apobreza; a pobreza causa o desgaste lur
via dores e perrnite um tipo de diagnostico com o qual os pacientes estão geralmente preocupados em vista da saude do corpo, a Bioética, além das
economta; a economia desaba no desemprego e o desemprego conduz ir uma elevação do quadro de miseria, sendo um fator agravante em relação
preocupações com o colpo do indivíduo, também possui a preocupação
ao problema da violência urbana. No período de seca, o trágico torna-sc cotidiano. A convivência com o crirne, a impunidade e o desrespeito aos di-
cessidade de discussões sobre temáticas variadas: pobreza, gueÍra, racismo,
reitos elementares do cidadão, em Í-unção da apropriação da seca pela elitt: em busca de auferir beneficios a partir das dificuldades do povo do sertão,
mica e socialmente excluídas do processo de desenvolvimento. A partir
passava 'despercebidos' em decorrência da preponderância dada aos aspectos naturais da seca como causa unica de todo o flagelo.
olhar.
Na política, a preocupação em rcsolver o problema da seca levou a uma espécie de obsessão pela acumulação de água. A postura de acumular recursos hídricos como fonna de "combater" a seca, posto que esta é encarada unicamente como um problema de
"falta d'âgua", vai
se sedimentar
com as dores que assolam o corpo político e social, e daí se justifica a nesaude publica, ern defesa dos interesses e direitos das populações econô-
dcssa compreensão é que sugerimos nosso título
-
Bioética e Seca: um novo
O Fenômeno da Seca A seca é um fenôrneno fisico, natural, que ocoÍre com freqüência e regularidade na região do semi-árido nordestino. E vem se repetindo de
oito a dez vezes por século, podendo prolongar-sc por três, quatro ou cinco
no que chamamos de "Indústria da Seca". Esta tem sido muitas vezes foco de vários debates, muito embora, pelo que parece, nem sempre estes dc-
anos e atingir parte ou tocla a região.
bates levem à compreensão dos seus elementos mais característicos e ne-
a resporlsabilidade de todas as causas e conseqüências da pobreza no àtn-
cessariamente mais perversos, principalmente aqueles que dizem respeito
bito da sociedade nordestina aos desequilíbrios naturais. Todos os problemas sociais da região não podem mais ser justificados como oriundos do
à sua forma peculiar de apropriar-se do trabalho de sertanejos e retirantes.
Mesmo rcconhecendo tal fato, não se pode atribuir indevidamente
A visão simplista do problema da seca como um problema hídrico facilita a aceitação de uma compreensão da seca corno urn problema natu-
fcnômeno da seca, como o resultado puro e simples de um evento de natu-
ral. Tal concepção, por sua vez, leva naturalmente o sertanejo c os dernais
bido a parlir de uma concepção idcologica de naturcza religiosa quc utrclu
'126
Maria Veralúcia Pessoa Porto, Telrrltr «lr'1"ottr;;t Soilrt:l; A Biot)tir;a tl lt llr'{ 'r rrrtt ttttvrl ,lllrtt
reza fisica e clirnática. Tal fenômeno não pode ser, por outro lado, pcrcc-
CoNTEXTO
- v.l, n .1, ;;rrr lrl/))O0t}, p
l2a;-13Í)
127
() lromcm nordcstino a urrl
conformismo místico, conforme menciona o Pe.
pelo governo.
Jose cle Magalhães: "no sermão, durante o humanitário almoÇo, o vigário
alentara os desprotegidos, pedindo-lhes que se conformassem coln a po-
A Seca: problema exclusivamente nordestino?
Afinal, o proprio Jesus Cristo nascera e moÍrera pobre, entre dores e agonia." (SOUZA; NEVES,2002, p. 115).
A historia da sociedade brasileira está intimamente ligada à tcrná-
breza.
A seca precisa deixar de ser considerada sirnplesmente urn evento
tica da seca e da ocupação do territorio urbano pelas levas de retirantcs quc se deslocam periodicamente do sertão para a cidade.
Mais do quc urn
Í'c-
natural situado exclusivamente como urn lenômeno rural e que assola uni-
nômeno climático, a seca e uffr problema social e político.
camente o Norrleste brasileiro. Ela tern uma dimensão social e política:
Analisada a partir desta dimensão a seca pode ser vista como Llm problema eminentemente social, fruto de uma historia de relações sociais
[...] agclra transfomada deflnitivamente ern um fenômeno social e político muito mais do que meramente climático, passa a constituir-se ern chave importante lla compreensão da realidade historica e social t ljá que funde os r,-ários elementos cla cultura ligados à conccpção sobre a vida no campo, sobre a natureza e suas relações com a vida social, sobre a pobreza e sobre a possibiliclade de ação autônonra e consciente por parte dos retirantes farnintos que clamam por comida, trabalho, rcrnóclios c roupas. (SOUZA; NEVES,2002, p. l0l).
baseadas no paternalismo e na manutenção da rniséria dos sertanejos.
Ao
Irlesmo tempo,, deixa de ser um problema unicamente agrário, já que as relações entre cidade e campo passam a se intensificar a partir de meados do
scculo XIX, passando a afetar, principalmente desde 1871 , as cidades. As comissões de socorro do interior foram
f
...1 orientadas
para aderirem ao programa de construção e restauração de igrejas, cadeias, cernitórios, açudes, câmaras municipais, estradas, etc, utilizando-se da mão-de-obra dos flagelados. [...] cavar poços, aprofundar lagos, açudes e aguadas públicas. (SOUZA; NEVES, 2002, p. 66)
Os efeitos da scca como um fenôrneno social e político podern ser ot-rservados nas palavras de um tlos nraiores artistas da musica nordestina,
- o rei do baião: "Quando
oiei a tcrra ardendo / Quá fbgueira dc São João I Eu prcguntei / A Deus do céu, ai i Pru clue tamanha judiação
A migração do camponês para as grandes cidades por conseqüôn-
[...] Prtr farta dágua i percli mcu gado / nrorreu de sede meu alazào 1...)
cia das estiagens confirma que a seca não e um problema unicamente nor-
Adcus l{osinha / Guarda contigo nreu coração [...]'". Acleus Ro,çinha,, como frisa bem a musica cantacla por Luiz Gon-
destino. São Paulo (Capital) encontra-se abarrotada de nordestinos. Isso nos coloca na posição dc acatar qlle a seca ó um problem a da sociedade
zaga, rcpresenta a farnília carnponesa que e obrigarÍa a migrar,, posto que o
brasileira. Sem contar quc o que hoje pode ser considerado como um pro-
L,urz Gonzaga
sertão
já não lhe pennite a subsistência. Ao chegar à cidade,
passa a
viver
blema para São Paulo, a superpopulação, provocada, sobretudo, com a fuga
Llm grande desenraizamento, pois, deixando para trás a vir,ência dos valo-
clos nordestinos,, cra antes
res clo campo, não consegLle criar espaços significativos em que possa con-
b usc
tinuá-los, apesar de todas as "possibilidades" dispostas pela rnobilidadc
a citação abaixo que se
sírcio-cultural propiciadas e disponibilizadas nos nleios urbanos. Privada
lrortaleza, capital do Estado do Ceará:
de
sc'r-rs
vínculos traclicionais, a f,arnília retirante, vítima da seca. r,ítirna
avatn mão-dc-obra bar ata,j ustamcn te por ser desqualifi cada. Vej amos
refcrc à atuação da política contra a seca ( 1900) ern
dc-r
[...] se [...] as obras rrão Íirsscrn suÍ-icir-ntcs, e- ntL.sln() coru clas a clrpital sc cnchcssc clc'barlxu'os', a s«rlrrção ó lr lnrrrsli'ri'rr
assistcncialismo, torna-se dcpenclente das politicas clc socomo estatrclcciclas
1)A
alvo de cobiça por parte dos empresários que
M:tri:t Vcral[tci;l Pes:;rlit Porto, Trllttttt r lr I 1 irlt t'" r I ir );ll os A IJtot]tir::t t:;t lirií ,1 llllt tt'rvrt olltill
CONTFXTO v.], tt ll,
;;rrr lul/1'OOÍi, 1r 1,)Ír 1.){)
129
:iüu QLrâtto como o centro arquitctônico do ettrcdci r-ill rtiir'r;rlrvlr.
estendelrdo-[rcs rniro protectora e anri,uir, I.lo sei() cjcls seus cstados. (SO{-JZA: NEVES,2002. p" 89)'
cstar. E há portas para todos os áUroscnt{rs, que ele lcrnbra clc tcr lriurc:rtlo.
A "soiidarieclacJe" dc o,.rtrcls Estar.los lcvanta a curirlsidatle c ll sttspcita sobre a veracillaclt: clcsta benc',,olôncia. Trata-sc ilc tttna solida prcocupação copr o po\/o r)ordcstino oLr scrá rnais utrl tipo di: cxpr"rlpriaçãoi) Nos períoclos
ctrc
scca, pcqLrcnos proprietários Êln difrculdades
l'cndcill litltls
1ct'-
ras a baixos preços, c os ltrtiÍúndios cresccln. Rcstrltado dc unl processo contÍnuo cle concentraçiio cla tera nas n1ãos cle pclttcos proprictários c da in-
oporluriitlade cle acesso a clil para pcqLtcttos agrictrltorcs. O la-
sigliíicantc tiÍúndio iinpr"oclutivo, ou dcclicado i) pccriária cxtettsiVa, ocllpa pouca nrão-c1e-obra, irnpcclc o cultivtl c cbriga o ciilnllonôs a nligrat" Pgr gutlo lado, as nrcrliilas lotnadas pelo goverllo sclllprc estiveram rnais próximas clc um tipo clc csmola. Íbr"ncc:ida sclxprc em lotrgos pcríoclos de estiagem. Tais açõcs paliativas inviabilizar,'altt qualcluer tipo dc scllução. LutzGonzaqa, na rnúsi ca Lctzes da Secu, cattta: "Mas, Dclutor, ulra
esrnola, pra gnr hornem clue é siro, ou llic tnata dc vcr-{onhlr clu vicia o cidadão". Dar csrnolas faz com que o pcclinte continue selnpre a mendigar pelas rneslnls portas, rnesmo cluan