A caminho de um Ensino Superior Inclusivo? A experiência e percepções dos estudantes com deficiência

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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA FACULDADE DE MOTRICIDADE HUMANA

VI MESTRADO EM EDUCAÇÃO ESPECIAL

A caminho de um Ensino Superior Inclusivo? A experiência e percepções dos estudantes com deficiência – Estudo de Caso –

Dissertação elaborada com vista à obtenção do grau de Mestre em Educação Especial Orientador: Professor Doutor David António Rodrigues

Júri Presidente Professor Doutor David António Rodrigues Vogais Professor Doutor Leandro Silva Almeida Professora Doutora Maria Margarida Nunes Gaspar de Matos

Lília Maria Feteira da Silva Aguardenteiro Pires 2007

O Acesso das pessoas com deficiência ao ensino superior não é um luxo, é antes uma condição prévia para uma sociedade que se esforça por obter igualdade de oportunidades para todos os seus membros.

Van Acker, 1995

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AGRADECIMENTOS Sendo impossível mencionar todos aqueles que de alguma forma me apoiaram neste percurso, a quem deixo desde já os meus agradecimentos, irei referir apenas aqueles que mais directamente comigo trabalharam e que de alguma forma contribuíram para a concretização deste projecto há muito ambicionado. Ao meu orientador Professor Doutor David António Rodrigues por todo o apoio, incentivo e orientação que me proporcionou no decorrer deste trabalho. Aos meus colegas de mestrado Jorge Humberto, Cristina Fonseca e Antónia Cardoso que me apoiaram e incentivaram a atingir a meta final. Às minhas amigas, Jacqueline Lemos da Costa, Elisa Vaz e Alice Ribeiro sempre presentes com espírito positivo e motivador nos momentos bons e nos menos bons deste percurso. A Paula Luegi e à Doutora Cristina Pimentel pelo tempo disponibilizado para a leitura e correcção literária deste trabalho. Aos estudantes que tão prontamente aceitaram participar neste estudo e que sem a sua colaboração dificilmente este trabalho seria possível. À minha família, em especial ao Nuno e à minha filha Abigail pelo carinho, paciência e apoio incondicional disponibilizado durante todo este trajecto.

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RESUMO O presente trabalho de investigação teve como objectivos conhecer e compreender a experiência e as percepções dos estudantes com deficiência sobre as condições de estudo no ensino superior. Procurámos ainda compreender a importância das estruturas formais de apoio para a melhoria da qualidade ensino oferecido a este grupo estudantil. Foi usada uma metodologia qualitativa de estudo de caso através de entrevista semiestruturada a dezasseis estudantes com deficiência que frequentavam cursos de seis Faculdades da Universidade de Lisboa. Os resultados revelaram que os estudantes identificaram como barreiras ao seu percurso académico, as dificuldades de acesso a documentação e bibliografia em formato adaptado às suas necessidades; as atitudes de discriminação de docentes, funcionários e colegas; e, no caso de estudantes em Faculdades sem apoio formalizado, a ausência de um serviço especializado ou pessoa de contacto; como facilitadores, o apoio de colegas, funcionários e docentes em algumas actividades, e a existência de serviços de apoio e de regulamentos específicos. As estruturas formais de apoio, em particular os serviços de apoio, parecem contribuir para a melhoria das condições de estudo dos estudantes nas Faculdades onde estão institucionalizados, através da resposta às necessidades individuais dos estudantes, desenvolvendo pontualmente actividades que visam produzir modificações no meio e na cultura da comunidade académica local.

Palavras-chave: Ensino Superior; Universidade; Estudantes com Deficiência; Educação Inclusiva; Percepções; Experiências

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ABSTRACT The purpose of this study was to determine and identify the experiences and perceptions of disabled students about the learning conditions in the university. We tried to understand the importance of formal structures of student support services for the improvement of the quality of education offered to those students.

A qualitative methodology of a case study, through semi-structured interview, was used for the sixteen disabled students who were attending different courses in six faculties of the University of Lisbon. The results indicated that the students identified as barriers to their academic progress, the difficulties of access to documentation and bibliography in suitable format according to their needs; the attitudes of discrimination by some of the teachers, employees and colleagues; and, in the case of students in faculties without a student support service, the absence of a specialized service or person; as facility factors, the support of colleagues, employees and teachers in some activities, and the support of student disability services as well as specific regulations.

The formal structures of student disability support services, seem to contribute for the improvement of the conditions of study of the students in the units where they are institutionalized, through the reply to the individual needs of the students, developing promptly activities that they aim at to produce modifications in the way and the culture of the local academic community.

Keywords: Higher Education; University; Students with Disabilities; Inclusive Education; Perceptions; Experiences

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INDICE AGRADECIMENTOS .................................................................................................. II RESUMO ................................................................................................................III INDICE ..................................................................................................................V LISTA DE FIGURAS................................................................................................. VII LISTA DE GRÁFICOS ............................................................................................. VII LISTA DE QUADROS............................................................................................... VII ABREVIATURAS ........................................................................................................ IX LISTA DE ANEXOS......................................................................................................X INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 1 PARTE I – REVISÃO DA LITERATURA ................................................................. 4 Capítulo 1 - O ENSINO SUPERIOR: O DESAFIO DA DIVERSIDADE ............. 5 1.1. De um sistema elitista a um sistema de massas ............................................................... 5 1.2. O actual sistema de ensino superior – novas funções e mudanças estruturais e novos públicos......................................................................................................................... 9

Capítulo 2 - EDUCAÇÃO: DA EXCLUSÃO À INCLUSÃO................................ 16 2.1. Sociedade e diversidade ................................................................................................. 16 2.2. A Escola e a diversidade – da exclusão à inclusão......................................................... 20 2.3. Da Escola integrativa à Escola inclusiva em Portugal ................................................... 29

Capítulo 3 - POLÍTICAS DE INCLUSÃO NO ENSINO SUPERIOR ................ 33 3.1. Iniciativas para a construção do direito à educação superior inclusiva.......................... 33 3.1.1. Princípios orientadores para uma política de inclusão no ensino superior............................33 3.1.2. Políticas e práticas locais para a inclusão de estudantes com deficiência no ES ..................38 3.1.3. Outra Iniciativas para a defesa de uma política inclusiva no ES...........................................69

3.2. As distintas realidades académicas: O acolhimento e atendimento aos estudantes universitários com deficiência em alguns países e em Portugal ................................. 74 3.3. A experiência e percepções dos estudantes com deficiência no ES............................... 98

PARTE II – ESTUDO EMPÍRICO .......................................................................... 107 Capítulo 4 - OBJECTO DE ESTUDO ................................................................... 108 4.1. Enunciado do problema................................................................................................ 108 4.2. Questões de investigação ............................................................................................. 111 4.3. Objectivos da Investigação .......................................................................................... 111

Capítulo 5 - MÉTODOS E PROCEDIMENTOS ................................................. 113 5.1. 5.2. 5.3. 5.4. 5.5. 5.6.

Tipo de Estudo ............................................................................................................. 113 O Caso e a Escolha do Caso......................................................................................... 114 A Selecção da Amostra ................................................................................................ 115 Esquema Geral da Pesquisa ......................................................................................... 117 Os Instrumentos e as Técnicas de Recolha de Dados .................................................. 118 O Modelo de Análise ................................................................................................... 123

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Capítulo 6 - APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS........................................ 125 6.1. A Universidade de Lisboa............................................................................................ 125 6.1.1. Identificação e Localização.................................................................................................125 6.1.2. Funcionamento e Financiamento ........................................................................................126 6.1.3. Políticas e recursos das unidades orgânicas da UL dirigidas aos estudantes com deficiência ..................................................................................................................................129

6.2. Os Estudantes com Deficiência.................................................................................... 154 6.2.1. Caracterização da amostra ..................................................................................................154 6.2.2. A experiência e percepções dos estudantes com deficiência da UL....................................157

Capítulo 7 - DISCUSSÃO DOS RESULTADOS.................................................. 188 7.1. Políticas e recursos das unidades orgânicas da UL dirigidos aos estudantes com deficiência188 7.2. A Experiência e percepções dos estudantes com deficiência .................................................194

Capítulo 8 - CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ........................................ 205 BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 211

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LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 – Interacções entre os componentes da CIF.............................................................................20 FIGURA 2 - Localização da UL...............................................................................................................125

LISTA DE GRÁFICOS GRÁFICO 1 – Ensino Superior Público: evolução dos candidatos e dos colocados no período de 1996 a 2006 ..................................................................................................................................................10 GRÁFICO 2 – Proporção de população em Portugal com o ensino superior (em %),...............................22 GRÁFICO 3 – Pedidos de admissão ao contingente especial para deficientes no ano lectivo de 2005/2006 ..........................................................................................................................................................59 GRÁFICO 4 – Número de estudantes colocados através do contingente especial para deficientes no ano lectivo de 2005/2006.........................................................................................................................60 GRÁFICO 5 – Distribuição do número de estudantes com deficiência por unidade orgânica e tipo de deficiência.......................................................................................................................................115

LISTA DE QUADROS QUADRO 1 – Diferenças entre três opções de escola ...............................................................................24 QUADRO 2 – Diferenças entre a integração e a inclusão..........................................................................24 QUADRO 3 – Deveres dos estudantes e profissionais no modelo tradicional ...........................................75 QUADRO 4 – Deveres dos estudantes e profissionais na fase de transição para o modelo de desenvolvimento do estudante ..........................................................................................................77 QUADRO 5 – Fase do processo de investigação .....................................................................................117 QUADRO 6– Grelha de análise ...............................................................................................................124 QUADRO 7 – Área útil ocupada pelas Unidades Orgânicas da UL em 2005..........................................128 QUADRO 8 – Infra-estruturas de utilização pedagógica e científica da UL até Dez. 2005.....................129 QUADRO 9 – Número de estudantes bolseiros em 2005/2006 ...............................................................131 QUADRO 10 – Número de estudantes bolseiros com deficiência em 2005/2006 ...................................131 QUADRO 11– Número de estudantes inscritos na FLUL no ano lectivo de 2005/2006 .........................134 QUADRO 12 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência.................................................134 QUADRO 13 – número de alunos da FLUL por curso e tipologia da deficiência ...................................134 QUADRO 14– Número de estudantes inscritos na FDUL no ano lectivo de 2005/2006.........................140 QUADRO 15 - Distribuição do Número de estudantes com deficiência na FDUL em 2005/2006..........140 QUADRO 16 – Número de estudantes inscritos na FCUL no ano lectivo de 2005/2006 ........................143 QUADRO 17 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência na FCUL em 2005/2006 .........144 QUADRO 18 – Número de alunos da FCUL por curso e tipologia da deficiência ..................................144 QUADRO 19– Número de estudantes inscritos na FFUL no ano lectivo de 2005/2006..........................148 QUADRO 20 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência na FFUL em 2005/2006..........148 QUADRO 21 – Número de estudantes inscritos na FPCEUL no ano lectivo de 2005/2006 ...................150 QUADRO 22 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência na FPCEUL em 2005/2006 ....150 QUADRO 23 – Número de estudantes inscritos na FPCEUL no ano lectivo de 2005/2006 ...................152 QUADRO 24 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência.................................................152 QUADRO 25 – Distribuição da amostra por unidade orgânica ...............................................................155 QUADRO 26 – Distribuição da amostra por unidade orgânica ...............................................................155 QUADRO 27 – Distribuição da amostra por área de estudo ....................................................................156 QUADRO 28 – Distribuição da amostra por ano curricular.....................................................................156 QUADRO 29– Comparação entre os dois grupos da amostra nas variáveis de notação social, zona de residência e transporte e acompanhamento nas deslocações...........................................................157 QUADRO 30 – Distribuição da amostra por unidade orgânica e deficiência ..........................................158 QUADRO 31 – Síntese do Tema Experiência no ensino antes de frequentar o ES .................................159 QUADRO 32 – Síntese do Tema Processo de Candidatura ao ES...........................................................161 QUADRO 33– Síntese do Tema Experiência no ES universitário...........................................................164

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QUADRO 34 – Síntese do Categoria Relacionamento interpessoal e institucional .................................166 QUADRO 35– Síntese da Categoria actividades académicas ..................................................................174 QUADRO 36 – Síntese do Categoria Apoio social..................................................................................181 QUADRO 37– Síntese do Tema Percepção do apoio prestado pelo estabelecimento de ensino .............182 QUADRO 38– Síntese do tema Sugestões para a melhoria das condições de estudo dos alunos com deficiência no ES ............................................................................................................................184

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ABREVIATURAS AV-CC - The Australian Vice-Chancellors' Committee CNE – Conselho Nacional de Educação DDA - Disability Discrimination Act DGES – Direcção-Geral de Ensino Superior DSA - Disability Services Act DSAc. – Divisão dos Serviços Académicos DSE - Disability Standards for Education ECTS – European Credit Transfer System (Sistema Europeu Transferência Créditos) ES – Ensino Superior EUA – Estados Unidos da América FBAUL – Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa FCUL – Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa FDUL – Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa FFUL – Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa FLUL – Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa FMDUL – Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa FMUL – Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa FPCEUL – Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa HEFCE - English Higher Education Funding Councils ICSUL – Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa LLM – Línguas e Literaturas Modernas ONU – Organização das Nações Unidas RUL – Reitoria da Universidade de Lisboa SASUL – Serviços de Acção Social da Universidade de Lisboa SFEFC – Scottish Higher Education Funding Councils SKILL - The National Bureau for Students with Disabilities

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LISTA DE ANEXOS ANEXO 1 – GUIÃO DE DADOS DE CARACTERIZAÇÃO DAS UNIDADES ORGÂNICAS DA UL ANEXO 2 – GUIÃO DE DADOS DE CARACTERIZAÇÃO DOS ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA ANEXO 3 – INQUÉRITO SOBRE OS APOIOS DADOS AOS ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA PELAS FACULDADES DA UL ANEXO 4 – GUIÃO DE ENTREVISTAS AOS ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA

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INTRODUÇÃO

A educação é um direito universal reconhecido para todos os indivíduos e consignado em diversos documentos produzidos por organismos internacionais os quais fomentaram o desenvolvimento de políticas de inclusão de alunos com deficiência no ensino obrigatório. Em diversos países, a partir dos anos 90, o movimento da escola inclusiva veio igualmente influenciar as políticas de educação no ensino superior, todavia, em Portugal esse movimento apenas teve reflexo nas políticas estabelecidas para os ensinos básico e secundário. São, no entanto, essas mesmas políticas e os avanços nas tecnologias da informação e da comunicação que impulsionam o incremento do número de estudantes que se candidatam e, consequentemente, dos que são admitidos nesse sistema de ensino. As transformações políticas, económicas, sociais e culturais que marcaram a evolução da sociedade portuguesa, bem como a democratização do acesso ao ensino superior, vieram contribuir para a emergência de novos públicos, onde se incluem os estudantes com deficiência. No actual contexto político internacional e nacional, o princípio da igualdade de oportunidade de acesso e sucesso, no contexto do ensino superior, tem tido destaque nas discussões sobre a qualidade de ensino e o desenvolvimento económico e social das sociedades. A universidade, outrora lugar privilegiado para a procura desinteressada do conhecimento e sua transmissão a uma elite favorecida, é actualmente confrontada com a exigência da sociedade em preparar todos os cidadãos para a competitividade da economia, possibilitando-lhes melhores oportunidades e capacidades para se integrarem plenamente na sociedade do conhecimento. Assim sendo, o acesso ao ensino e a sua frequência superior irão permitir ao cidadão com condição de deficiência a aquisição de conhecimentos e competências, qualificando-o para uma maior participação na sociedade. Coloca-se-nos então a questão: de que modo as instituições de ensino superior em Portugal estão preparadas para lidar com as exigências que lhe são impostas por este novo paradigma educacional?

Lília Aguardenteiro Pires

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Introdução A legislação portuguesa prevê que durante a frequência dos ensinos básico e secundário sejam atribuídos a estudantes com deficiência apoios pedagógicos adequados às suas necessidades individuais; e que o estudante possa concorrer ao ensino superior, através de um contingente especial, previsto no regulamento do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior definido anualmente por Portaria do Ministério da Educação. Não está, no entanto, prevista na Lei a continuidade dos apoios recebidos anteriormente, nem explícita a obrigatoriedade de as instituições de ensino superior garantirem as condições necessárias para o sucesso educativo desses estudantes. Sendo assim, que recursos humanos e técnicos especializados e financeiros dispõem as instituições de ensino superior para responder com qualidade às necessidades especiais dos estudantes com deficiência? Sentem as instituições a responsabilidade de garantir essas mesmas condições ou haverá a necessidade de se instituir legalmente um regime de apoio adequado aos estudantes com deficiência que frequentam o ensino superior? Em virtude do aumento do número dos estudantes com deficiência, da manifestação das suas necessidades específicas e da pressão para continuarem a usufruir de recursos e apoios especiais que lhes foram proporcionados durante os níveis de ensino anteriores, alguns dos estabelecimentos de ensino superior, no âmbito da autonomia que lhes é conferida pela Lei, estabeleceram orientações e medidas de protecção dos direitos desses estudantes; outros, porém, permanecem indiferentes a essas revindicações. Neste contexto, questionamos: como vivenciam os estudantes com deficiência a sua experiência no ensino superior? Que condições de estudo têm os estudantes com deficiência nas instituições de ensino superior? Com que barreiras se confrontam e que factores contribuem para a sua inclusão? De que modo estão as instituições de ensino superior preparadas para acolher os estudantes com deficiência? Se existem, nas instituições, estruturas, recursos e medidas, de que modo contribuem para uma melhor inserção desses estudantes? Caminham as instituições de ensino superior para um ensino inclusivo? Levantadas algumas questões que nos pareceram pertinentes, iniciámos uma pesquisa bibliográfica direccionada para as questões de investigação no domínio da inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior, tendo-nos confrontado com a inexistência, em Portugal, de estudos com este objecto, realidade que contrasta com a de outros países. Os estudos que tivemos oportunidade de analisar, na sua maioria

Lília Aguardenteiro Pires

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Introdução centravam-se numa mesma instituição e em deficiências específicas. Da sua análise podemos constatar que os estudantes com deficiência no ensino superior enfrentam inúmeras barreiras de natureza legal, financeira, físico-ambiental, social, cultural e pedagógica que condicionam a sua participação no contexto académico. Será que os estudantes universitários portugueses enfrentam barreiras semelhantes? É, pois, desta reflexão e da experiência profissional na área, como responsável técnica de um dos serviços de apoio da universidade escolhida, o que se poderá reflectir no enviesamento da investigação, que surge o nosso interesse pela temática e, consequentemente, pela realização do presente estudo. No âmbito do presente trabalho académico levámos a cabo um estudo de caso, numa Universidade onde coexistem duas realidades diferentes: unidades orgânicas com e sem estruturas de apoio formalizado para estudantes com deficiência. Num modelo de investigação qualitativa, sustentado pela análise documental e pelo recurso a questionários e entrevistas semi-estruturadas, procurámos analisar e compreender as experiências dos estudantes com deficiência que as frequentam, as suas percepções sobre as condições de estudo, em particular, as barreiras e os factores facilitadores à sua inclusão; e de que modo as estruturas formais de apoio e os normativos específicos contribuem para a inclusão dos estudantes com deficiência na universidade. O presente estudo incide essencialmente no depoimento dos estudantes, porque reconhecemos, conforme Hurst (1996), Tinklin e Hall (1999) e Mazzoni et al. (2001) que são os próprios que nos podem ajudar a perceber a realidade, dado que são eles que convivem com as restrições que o meio lhes impõem. A importância do tema pode ser justificada se for tida em consideração que a educação é um direito e que as instituições de ensino superior devem contribuir para uma formação de qualidade para Todos, nomeadamente para os estudantes com deficiência. As barreiras atitudinais, a falta de preparação ou formação dos docentes, a inadequação de meios são alguns dos factores que determinam o sucesso desse grupo estudantil neste contexto educativo. As barreiras identificadas, na recepção e acolhimento, no relacionamento interpessoal, na acessibilidade física e arquitectónica, nas actividades académicas e no apoio social, não impossibilitam os estudantes de ter resultados positivos, porém, convém avaliar a que custo. O conhecimento sobre as barreiras e os factores facilitadores à participação dos estudantes com deficiência neste contexto

Lília Aguardenteiro Pires

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Introdução educativo, poderá permitir a adopção de acções mais eficazes, seja por aprimorar o que se já vai fazendo, seja por suprimir as lacunas que persistem. Deste modo, procurámos entrevistar estudantes com deficiência física e sensorial que estivessem inscritos em Faculdades com e sem apoio formalizado. Procurámos igualmente recolher depoimentos de estudantes de vários anos curriculares, de modo a incluir estudantes com pouca experiência neste contexto educativo, à partida com maior consciência do processo de transição, e estudantes na fase intermédia ou a concluir os seus cursos, com uma experiência mais madura. No que concerne à sua estrutura interna, este trabalho repartir-se-á por duas partes. Na primeira parte, a revisão da literatura, abordamos duas temáticas centrais à investigação: ensino superior e diversidade e educação inclusiva. No primeiro capítulo procurámos abordar os desafios que a inclusão da diversidade coloca a um sistema tradicionalmente elitista, como o ensino superior. No segundo capítulo fazemos uma abordagem à Educação Inclusiva e à forma como a Sociedade e a Escola têm vindo a encarar a Diversidade. No terceiro capítulo procurámos identificar as abordagens de inclusão no ensino superior em diferentes países e em Portugal, fazendo uma revisão dos estudos realizados neste âmbito. Na segunda parte, expomos a planificação e organização do estudo. No quarto capítulo enunciamos o problema, descrevemos os objectivos gerais e colocamos as questões centrais de investigação que deles decorrem. No quinto, definimos o tipo de estudo e o caso, descrevemos os procedimentos relacionados com a selecção da amostra, a metodologia, os instrumentos e o processo de análise da informação recolhida. Nos capítulos finais, procedemos ainda à apresentação e discussão dos resultados e das conclusões gerais a que chegámos. Terminamos fazendo referência a toda a bibliografia utilizada e apresentando os anexos.

Lília Aguardenteiro Pires

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PARTE I – REVISÃO DA LITERATURA

Lília Aguardenteiro Pires

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Capítulo 1 - O ENSINO SUPERIOR: O DESAFIO DA DIVERSIDADE A expansão do ensino superior em Portugal foi um processo rápido e significativo para o qual contribuíram o prolongamento da escolaridade obrigatória, o aumento da escolarização no ensino secundário e as transformações políticas, económicas e sociais ocorridas no país nas últimas três décadas. Em poucos anos, evoluiu-se de um sistema elitista, determinado a servir principalmente como meio de acesso a cargos de administração pública e de grandes empresas, para um sistema de massas, estando subjacente ao seu alargamento a qualificação de recursos humanos essenciais ao desenvolvimento, modernização e competitividade do país. A emergência de novos públicos e a pressão da sociedade da informação (Costa, 2001) constituem um novo desafio para o sistema de ensino superior, que tem procurado responder com soluções organizativas e operacionais inovadoras consubstanciadas na política educativa europeia definida para o Espaço Europeu do Ensino Superior.

1.1. De um sistema elitista a um sistema de massas A criação da universidade em Portugal remonta aos finais do século XIII. De modo a responder às necessidades sentidas pelo clero e pela burguesia para a formação de uma pequena elite intelectual, até então diplomada noutros centros europeus, são criados em Lisboa, em 1290, por D. Dinis, os Estudos Gerais. O acesso à universidade como um privilégio de elites mantém-se uma realidade até finais dos anos 60. As transformações políticas, económicas, sociais e culturais que marcaram a evolução da sociedade portuguesa, na transição dos anos sessenta para os setenta, contribuíram significativamente para as alterações registadas no ensino superior, bem como para a democratização no seu acesso.

Lília Aguardenteiro Pires

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade

O aumento generalizado da escolarização a partir dos anos 50, consequência da acção governamental ao nível da expansão da rede escolar, o reconhecimento pela classe política do papel da educação como factor preponderante de desenvolvimento económico1, a melhoria dos níveis de vida e as aspirações da população no sentido de adquirirem um novo estatuto social legitimado pela obtenção de um diploma universitário que lhes facultasse uma melhor oportunidade no mercado de trabalho e consequente mobilidade social ascendente contribuíram significativamente para o alargamento do ensino superior a partir do início dos anos 70 (Arroteia, 1996; Costa, 2001; Seixas, 2003). Com a chamada Reforma de Veiga Simão, que apontava para a democratização do ensino, o ensino superior passaria a ser assegurado por Universidades, Institutos Politécnicos, Escolas Normais Superiores e outros estabelecimentos equiparados2. Deste modo, de quatro universidades existentes em 1970 (Coimbra, Lisboa, Técnica de Lisboa e Porto) a rede universitária evolui, no final da década de 90, para 13 universidades3 e uma escola universitária não integrada, o Instituto Superior de Ciências do Trabalho e Empresa. Através dos Institutos Politécnicos e das Escolas Normais Superiores4 a rede de ensino superior estender-se-ia a todos os distritos do país: o ensino mais vocacionado para a formação técnico-profissional visava satisfazer as necessidades de mão-de-obra qualificada impostas pelo mercado de trabalho. A introdução no sistema de um ensino de curta duração traduzia-se, segundo Seixas (2003:84), numa mudança qualitativa do sistema e em uma resposta para a transição de um ensino superior de elite para um ensino superior de massas. No final dos anos oitenta, a pressão da procura era bastante acentuada, consequência do aumento significativo do número de alunos que concluíam o ensino secundário e da difícil situação do mercado de trabalho, o que induziria os indivíduos à continuação no sistema de ensino. 1

Conforme podemos verificar no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 402-73 de 11 de Agosto O plano de expansão e diversificação do ensino superior foi definido pelo Governo para corresponder à necessidade de assegurar o desenvolvimento social económico do país, que exige um número cada vez mais elevado de cientistas, técnicos e administradores de formação superior, dotados de capacidade critica e inovadora. 2 Conforme Lei n.º 5/73, de 25 de Julho. 3 Além das anteriores, Aveiro, Évora, Nova de Lisboa, Minho (instituídas em 1973), Algarve (1979), Açores (1980), Trás-os-Montes e Alto Douro (1986), Aberta e Madeira (1988). 4 A partir de 1979 designado ensino superior politécnico. Decreto-Lei n.º 427-B/77 de 14 de Outubro e Decreto-Lei n.º 513-T/79 de 26 de Dezembro correspondendo ao ensino superior de curta duração.

Lília Aguardenteiro Pires

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade

Apesar do alargamento verificado até à altura, o sistema de ensino superior público mostrou-se incapaz de responder a esta conjuntura, estando assim criadas as condições propícias ao alargamento da rede ao ensino universitário particular e cooperativo5 (DGES, 1999). Com o aparecimento de novos estabelecimentos, o ensino superior diversificou-se, quer em termos de oferta de cursos, considerados mais bem adaptados às mudanças económicas e tecnológicas em curso, quer devido à dispersão geográfica, afigurando-se assim como um contributo para a promoção do desenvolvimento das regiões (Seixas, 2003). A estrutura do ensino superior encontra-se estabelecida pela Lei de Bases do Sistema Educativo6, segundo a qual cabe ao ensino superior universitário, numa perspectiva de promoção de investigação e de criação do saber Assegurar uma sólida preparação científica e cultural e proporcionar uma formação técnica que habilite para o exercício de actividades profissionais e culturais e fomente o desenvolvimento das capacidades de concepção, de inovação e de análise crítica (Lei n.º 46/86, n.º 3)

Ao ensino superior politécnico, orientado por uma constante perspectiva de investigação aplicada e de desenvolvimento, dirigido à compreensão e solução de problemas concretos, compete: Proporcionar uma sólida formação cultural e técnica de nível superior, desenvolver a capacidade de inovação e de análise crítica e ministrar conhecimentos científicos de índole teórica e prática e as suas aplicações com vista ao exercício de actividades profissionais. (Lei n.º 46/86, n.º 4)

Com a revisão da Lei, em 1997, procedeu-se à uniformização dos graus conferidos pelos dois subsistemas, podendo as instituições de ensino superior dos dois subsistemas atribuir os graus de bacharel e licenciado. Com a revisão de 2005, é abolido o grau de bacharel e uniformizado o grau de mestre, sendo o grau de doutor apenas conferido por

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A Universidade Livre seria a primeira universidade privada a entrar em funcionamento em 1979, porém, seria encerrada em 1985. Após o seu encerramento outras surgiram como a Universidade Portucalense, a Universidade Lusíada, Universidade Autónoma Luís de Camões, Universidade Internacional, Universidade Moderna, Universidade Fernando Pessoa, Universidade Independente e Universidade Lusófona.(Arroteia, 1996). Existe ainda a Universidade Católica, instituída pela Igreja Católica em 1967, ao abrigo da Concordata de 1940 entre o Governo português e a Santa Sé. 6 Lei n.º 46/86 de 14/10, alterada pela Lei 115/97 de 19/09 e pela Lei n.º 49/05 de 30/08.

Lília Aguardenteiro Pires

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade

estabelecimentos de ensino superior universitário, e alterado a organização da formação em unidades de créditos7. Seixas (2003) distingue três grandes períodos de evolução do número de estudantes do ensino superior: 

um primeiro período, que vai dos anos 60 até ao ano lectivo de 1976/77, caracterizado pela expansão do ensino superior, em consequência do aumento da procura de educação e do aumento da capacidade de oferta;



um segundo período, de 1977/78 até 1987/88, marcado pela limitação ao acesso8 ao ensino superior e consequente estagnação de efectivos, justificada pela necessidade de preservar a qualidade de ensino e ajuste às necessidades do País;



e, por último, um terceiro período englobando os anos finais da década de 80 e os anos 90, caracterizado pela explosão dos seus efectivos, consequência da procura e alargamento da rede de ensino superior politécnico. Devido ao sistema dos numerus clausus vigente no sistema de ensino universitário superior público, esta modalidade de ensino afigura-se como uma alternativa possível de acesso a um nível de ensino mais elevado, especialmente para os estudantes com menos recursos e com menor possibilidade de aceder ao ensino privado, também em expansão.

Porém, a partir de 19959, regista-se um abrandamento do número de candidatos ao ensino superior: para tal facto são apontados como justificação a tendência negativa da evolução demográfica, bem como a alteração do sistema de acesso, nomeadamente a introdução de pré-requisitos exigidos para a frequência de determinados cursos e o estabelecimento obrigatório de uma nota mínima, quer nas provas de ingresso, quer na nota de candidatura (Arroteia, 1999; Seixas, 2003). O número de candidatos ao ensino superior público viria a registar um decréscimo a partir de 1996, conforme se pode verificar no Gráfico 1.

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Anteriormente organizado em anos – 3 para o grau de bacharel e 4 para o grau de licenciatura. Com a introdução do numerus clausus em 1977, facto que contribuiria em certa medida para o aumento do número de efectivos no ensino superior privado. 9 Segundo Seixas (2003) enquanto o ensino superior público apresenta uma variação anual, entre 1995 e 1997, estabilizada nos 6%, o ensino superior privado regista uma quebra de 10% entre 1995/96 e 1996/97 e 1997/98. O decréscimo no ensino superior privado parece afectar sobretudo as universidades, cujos inscritos em cursos de licenciatura diminuem 27% entre 1995/1996 e 1997/98. 8

Lília Aguardenteiro Pires

8

O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade

GRÁFICO 1 – Ensino Superior Público: evolução dos candidatos e dos colocados no período de 1996 a 2006 (Fonte: DGES) 70000

60000

50000

40000 Candidatos Colocados 30000

20000

10000

0

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

Candidatos

62307

52122

52652

48051

50755

45210

46292

41662

42595

38976

40521

Colocados

32873

35452

37901

36782

40100

36381

38379

36077

37568

33520

34860

Relativamente à constituição da população estudantil universitária, ainda hoje esta é maioritariamente constituída por jovens oriundos de famílias mais favorecidas económica e escolarmente (Balsa et al., 2001). Balsa et al. (2001) e Seixas (2003) partilham a opinião que a democratização do sistema só se verificou em termos quantitativos e não qualitativos dado que, a selecção social ainda persiste no acesso a algumas instituições e cursos. Uma certa atenuação das desigualdades sociais de oportunidades educativas de acesso ao ensino superior, traduzida no aumento de estudantes oriundos de estratos sociais tradicionalmente pouco representados ou mesmo excluídos deste nível de ensino, encontra-se associada a uma manutenção de fortes desigualdades sociais de acesso a diferentes cursos, instituições e subsistemas de ensino superior (Seixas, 2003:71)

1.2. O actual sistema de ensino superior – novas funções e mudanças estruturais e novos públicos A expansão do ensino superior contribuiu para o desenvolvimento de novas categorias de estudantes, passando, segundo Costa (2001), de uma universidade homogénea, constituída por jovens diplomados do ensino secundário via ensino, para uma universidade heteróclita, formada por um público com motivações e necessidades de

Lília Aguardenteiro Pires

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade

resposta diferentes (mulheres, estudantes oriundos de vias profissionalizantes, adultos, alunos com necessidades educativas especiais, etc.). Segundo Heitor (2003) a população portuguesa caracteriza-se pela dualidade: por um lado, congrega uma população jovem, com qualificações semelhantes às dos jovens que pertencem a outros países europeus; por outro, congrega uma população de uma faixa etária mais velha, com uma forte participação na força de trabalho, mas com qualificações formais baixas. Acresce ainda o facto de em Portugal se registar em elevadas taxas de abandono escolar no ensino secundário e superior (45%) comparativamente com as da União Europeia (19%). Nos dias de hoje, a questão central não é tanto o número de jovens saídos do ensino secundário, mas, fundamentalmente, os níveis de qualificação da população activa portuguesa. Apesar de ter havido uma duplicação da proporção da população com mais de 21 anos (ver Gráfico 2) que completou o ensino superior, entre 1991 e 2001, apenas 8,6% da população a partir dessa faixa etária tinha completado o ensino superior em 200110. GRÁFICO 2 – Proporção de população em Portugal com o ensino superior (em %), de 1991 e 2001 (Fonte: INE, 2002)

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Apenas 20% da população portuguesa dos 25 aos 64 anos completou o 12º ano, contra 65% na média da OCDE. Apenas 9% da população portuguesa na mesma faixa etária completou o nível de ensino Superior, contra 24% na OCDE. (in PCM, 2005)

Lília Aguardenteiro Pires

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade

Face a esta situação, o Governo Português propõe-se, por um lado, reduzir para metade o insucesso escolar nos ensinos básico e secundário e, por outro, investir na qualificação dos portugueses, sobretudo, promover o aumento da procura de ensino superior pelos jovens portugueses e, principalmente, captar estudantes não tradicionais, de modo a atingir a média da União Europeia em termos de formação superior. Esta mudança da estrutura de procura e o novo papel do conhecimento imposto pela sociedade impõem novas exigências ao ensino superior, designadamente novas formas de ensino e organização para que se possa manter a qualidade. Segundo Costa (2001:52) Na perspectiva do ensino e da formação, requer-se que a universidade capacite as pessoas para o desenvolvimento máximo das suas capacidades e para adaptação permanente, ao longo da vida, às exigências do trabalho (…) Na ciência, requer-se cada vez maior progresso do conhecimento, mas também que este conhecimento beneficie a sociedade e a economia, como factor de competitividade na globalização. No apoio ao desenvolvimento, requer-se que a universidade acompanhe os novos modos de produção, servindo as necessidades de um desenvolvimento regional e nacional sustentado, adaptável e com sentido ecológico. Na formação geral das ideias, requer-se que a universidade contribua para o desenho de uma nova sociedade de democracia real e participada, civilizada e inclusiva.

A universidade deixa assim de ser exclusivamente o lugar privilegiado para a procura desinteressada do conhecimento e a sua transmissão a uma elite favorecida, uma vez que terá de cumprir as suas responsabilidades sociais para com o desenvolvimento da chamada Sociedade do Conhecimento, nomeadamente quanto à aplicação dos conhecimentos produzidos e à preparação de todos os cidadãos para a competitividade da economia e afirmação nacional na era da globalização. Reafirmando a urgência do aumento das qualificações académicas e profissionais, para a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos e para do desenvolvimento económico e sustentado do país, o actual Governo reconhece, no Programa do XVII Governo Constitucional, para 2005-2009, a importância do investimento na qualidade do ensino superior, e compromete-se em promover a igualdade de oportunidades, melhorando as condições de ensino e da acção social escolar; condições que se podem igualmente converter em melhores oportunidades de acesso e sucesso para os estudantes com deficiência. A posse de um diploma de ensino superior, para além de ser um direito de quem mostrar ter capacidade e mérito, é um recurso muito importante, em termos de aprendizagem futura, projecto de vida e empregabilidade. Conseguir melhor

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade relevância social e cultural para as formações e melhorar a sua qualidade possíveis vai, portanto, de par com atrair mais gente para frequentá-las e assegurar a todos as melhores condições possíveis para concluí-las. (Governo, 2005: 53)

Reforçando a ideia da importância do ensino superior para o desenvolvimento de uma economia mais competitiva, em Junho de 1999, é assinado pelos Ministros de 29 países europeus (entre os quais o português) a Declaração de Bolonha, com objectivo de construir, até 2010, um Espaço Europeu de Ensino Superior11, de forma a melhorar a mobilidade dos cidadãos e aumentar a competitividade internacional do ensino superior europeu, consolidando um amplo movimento de reformas legislativas em diversos países. O Espaço Europeu de Ensino Superior comporta assim os seguintes conceitos-chave: 

A capacidade de atracção mundial da formação superior oferecida pela UE;



Comparabilidade entre formações homólogas adquiridas em países distintos;



Um sistema de unidades de crédito acumuláveis e transferíveis entre estabelecimentos de ensino e países (ECTS12);



A mobilidade de estudantes e professores;



A cooperação na elaboração e a integração de programas de ensino;



A organização do percurso escolar em dois ciclos (graduação e pós-graduação);



A garantia de qualidade mediante orientações comuns relativas à avaliação do ensino, acreditação de habilitações profissionais e certificação de habilitações académicas.

No que respeita à duração e organização dos estudos, o Ensino Superior passará a estar, em todos os países do Espaço Europeu de Ensino Superior, organizado em três ciclos: 

1.º Ciclo, com duração de 6 semestres (180 a 240 créditos), ou três anos, correspondente ao grau de Licenciatura;



2.º Ciclo, com duração de 4 semestres (90 a 120 créditos), ou dois anos, correspondente ao grau de Mestre;



3.º Ciclo, com duração de 6 semestres, ou três anos, correspondente ao grau de Doutor.

11 12

Também referida como Área Europeia de Ensino Superior European Credit Transfer System

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade

A introdução generalizada do sistema de créditos em todos os tipos de formação vai permitir a acumulação destes créditos, facilitando a transferência dos estudantes de um curso para outro, dentro da mesma ou para outras instituições. Os créditos ECTS13 exprimem o volume de trabalho necessário à conclusão de cada curso, que inclui as horas de contacto14, as horas de projecto, as horas de trabalho de campo, o estudo individual e as actividades relacionadas com avaliação, abrindo-se também a actividades complementares com comprovado valor formativo artístico, sócio-cultural ou desportivo. Segundo o CNE (2002:4), o Processo de Bolonha envolve uma reorientação pedagógica e não só uma reorganização pedagógica, dado que, Tanto a preocupação com a relevância das formações como a adopção do sistema ECTS pressupõem uma clara definição prévia dos saberes (conhecimentos, competências e atitudes) que se espera que os formandos adquiram e privilegia metodologias de aprendizagem activa, cooperativa e participativa, rompendo com o ensino magistral e a mera transmissão de conhecimentos.

Sendo assim, procura-se transformar um ensino centrado no docente num ensinoaprendizagem centralizado nas actividades desenvolvidas pelo estudante, aumentando o peso relativo do seu trabalho no desenvolvimento das disciplinas/unidades curriculares. Ou seja, de um sistema de ensino baseado na ideia de transmissão de conhecimentos passa-se para um sistema baseado no desenvolvimento de competências, no qual o estudante deixa de ser sujeito passivo, passando a estruturar os conhecimentos que vai adquirindo, relacionando o que lhe é transmitido com o que ele próprio procura. O docente deixa assim de ser mero transmissor de conhecimento e passa a assumir o papel de facilitador da aprendizagem. O CNE (2002:4) chama a atenção para as virtudes do novo sistema, porém não deixa de assinalar algumas das dificuldades que na sua implementação a curto prazo: Em síntese, o sistema ECTS pressupõe um outro entendimento do conceito de currículo, que já não é uma colecção ordenada de matérias a ensinar, mas que implica um outro 13

O sistema ECTS é baseado no princípio de que 60 créditos medem o volume de trabalho em tempo integral ao longo de um ano académico para um estudante típico; 14 «Horas de contacto» o tempo utilizado em sessões de ensino de natureza colectiva, designadamente em salas de aula, laboratórios ou trabalhos de campo, e em sessões de orientação pessoal de tipo tutorial. (Decreto-Lei n.º 42/2005 de 22/02, art. 3.º, alínea e))

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade olhar sobre a aprendizagem e, consequentemente, do papel das metodologias de ensino e de aprendizagem. É altamente duvidoso que o sistema de ensino superior em Portugal e os docentes do ensino superior estejam desde já preparados para este tipo de mudanças, envolvendo uma outra maneira de pensar o ensino e a aprendizagem.

Costa (s/d) considera que estamos perante um novo paradigma, o Paradigma de Bolonha que comporta quatro componentes fundamentais: 

Formação de banda larga – O ensino superior, ao invés de preparar os alunos para um perfil profissional estreito porque especializado, procura prepará-los, num 1.º ciclo, para uma área profissional mais ampla, sendo diversos os perfis que os alunos podem ocupar e desenvolver.



Primado das competências – Um dos principais objectivos do ensino superior é facultar aos alunos uma competência essencial, a de aprender a aprender. Além desta, procura igualmente que o estudante desenvolva as competências específicas a cada área disciplinar e as transversais: a mentalidade racional e crítica, o gosto pela inovação e iniciativa, a apetência pela cultura, a mentalidade multicultural,

o

domínio

de

línguas

estrangeiras,

as

capacidades

comunicacionais e de trabalho de grupo, o domínio das tecnologias da informação, a responsabilidade social e tanto mais. 

Primado da aprendizagem – Pressupõe que as competências não se ensinam, treinam-se na prática, através da aprendizagem baseada em projectos, aprendizagem baseada em problemas, e-learning, tutoria [na dupla concepção de facilitator e de mentor], etc.



Novos públicos – Numa perspectiva de formação ao Longo da Vida, nomeadamente a de pessoas que concluíram um primeiro grau, que passaram para o mundo do trabalho e que pretendem voltar ao ensino superior para formações complementares, ajustadas aos seus interesses profissionais actuais ou futuros.

O ensino superior tem sido visto pela sociedade como um factor determinante de democratização e inclusão social e como elemento estruturante do desenvolvimento económico a nível local e regional. Hoje em dia a sociedade encara o papel do ensino superior não só da visão tradicional de criação, gestão e transmissão do saber, mas também como elemento de inclusão da sociedade, dando aos cidadãos melhores oportunidade e capacidades para se integrarem plenamente na sociedade do conhecimento e, ainda, como um factor

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O Ensino Superior: O Desafio da Diversidade estrutural de desenvolvimento social e económico e para reforço da competitividade entre as nações. (Simão et al., 2005:32)

Da Reforma de Veiga Simão à actual Reforma de Bolonha, o ensino superior procura alcançar uma melhor qualidade de ensino, de modo a atingir um ensino para Todos, com uma oferta educativa ampla, flexível, diversificada, individualizada, adequada às necessidades do estudante tradicional, do estudante profissionalizado e do estudante com necessidades educativas especiais. Porém, entre as perspectivas teóricas e as práticas há um percurso a percorrer, em alguns casos longo, o que nos deixa na expectativa de saber em que medida toda esta nova Reforma ou Paradigma e a actual prometida estratégia governamental irá contribuir para um ensino de qualidade real, em termos de serviços e recursos para aqueles que ainda, e apesar da mudança, parecerem continuar a estar excluídos das políticas educativas para o ensino superior. Face a esta mudança, interessa-nos saber o que se entende por inclusão, estar incluído e por educação inclusiva.

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Capítulo 2 - EDUCAÇÃO: DA EXCLUSÃO À INCLUSÃO

O modo como a sociedade humana tem encarado a diferença influenciou significativamente o desenvolvimento das políticas educativas essencialmente dirigidas à inclusão da deficiência. Assim, de uma escola tradicional, onde a deficiência é remetida para instituições específicas, evoluiu-se para uma escola integrativa, na qual a diferença se adapta. Hoje, procura-se alcançar uma escola inclusiva, que produza a igualdade e que considere a heterogeneidade do seu público, ou seja, que responda à diferença de forma apropriada, com equidade e com qualidade.

2.1. Sociedade e diversidade A par da evolução biológica do ser humano, outras modificações têm ocorrido na forma como as sociedades se organizam, em que comunidades diversas estabelecem regras de convivência, nas quais cada indivíduo tem obrigações e direitos, e em que, regra geral, o normal é estabelecido em função do que é semelhante, conhecido e previsível, onde a diferença, o desconhecido e o imprevisível, são remetidos para ghettos (Rodrigues, 2001). Segundo Maturana (2002, cit. in Torres, 2002) é no contexto das relações humanas e não no do biológico que a diferença surge: Una araña es un ser distinto de un insecto; un coleóptero es un ser distinto de una mariposa; un ratón es un ser distinto de un gato; un ser humano es distinto de un elefante; y todos estos seres son distintos porque viven de distintas maneras [...] Una persona que ha perdido una pierna es un ser distinto de una persona de dos piernas [...] Desde el punto de vista del ser biológico no hay errores, no hay minusvalías, no hay disfunciones [...] Sólo desde el espacio humano yo prefiero ser una araña y no una mariposa [...] Es en el espacio de las relaciones humanas que el niño limitado pasa a ser limitado. En Biología no existe minusvalía...

Deste modo, não existem critérios generalizados que permitam definir a diferença, que para Rodrigues (2006:78) é antes de mais uma construção social historicamente e culturalmente situada.

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Educação: da Exclusão à Inclusão

Os diversos juízos de valor que são emitidos em cada sociedade têm também consequências nos sujeitos, que, no âmbito da educação, podem ir da desigualdade até à exclusão (Rodrigues, 2001). Ao longo da história da Humanidade, as pessoas com deficiência foram encaradas de maneiras diferentes; Santos e Morato (2002) consideram quatro tipos de abordagens: 

A separação (pensamento mágico-religioso: aniquilação e veneração);



A protecção (instituição do monoteísmo: caridade);



A emancipação (Humanismo e Renascimento: estudo do homem e educabilidade das populações especiais nos mosteiros, locais de cultura);



A integração (aparecimento de conceitos como a normalização e educação).

A modos de ver a diferença têm também correspondido conceitos de deficiência distintos: O modelo médico assenta na ideia de que a deficiência é uma tragédia pessoal, em que todos os problemas das pessoas com deficiência advêm, exclusivamente, da sua deficiência e que a sua participação na vida social depende, unicamente, do seu esforço de adaptação (Reindal, 1995, Skidmore, 1996, Johnstone, 1998). Nesta perspectiva, a recuperação ou reabilitação deverá incidir na pessoa. A Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1980 distingue três níveis na caracterização do grau de deficiência: Deficiência: é toda a perda ou anormalidade na estrutura ou funcionamento de um órgão ao nível psicológico, fisiológico ou anatómico (relacionada com o organismo da pessoa); Incapacidade: é uma restrição ou ausência, causada por uma deficiência, da capacidade de realizar uma actividade, de forma normal (relacionada com o desempenho individual); Desvantagem: Prejuízos e limitações (de ter um papel/ adaptação normal), devido a Deficiência ou Incapacidade, quando em interacção com o meio, considerando

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Educação: da Exclusão à Inclusão

idade, sexo, cultura e factores sociais (relacionada com a adaptação do indivíduo ao meio) (OMS, 1989) Esta conceptualização revolucionou a categorização tradicional, uma vez que, não deixando de realçar os aspectos clínicos, introduz uma nova variável: a sua participação na sociedade, procurando-se potenciar a integração social do indivíduo, de modo a minimizar as suas desvantagens. No contexto dos movimentos sociais ocorridos nos anos 80, nos EUA, evolui-se para um modelo social em que se consideram os problemas das pessoas com deficiência como produto da sociedade (Johnstone, 1998), ou seja, a incapacidade é o resultado das barreiras impostas pela sociedade à participação activa das pessoas com deficiência. Deste modo, é reconhecido o direito de participação da pessoa com deficiência nas tomadas de decisão relativizando o papel do médico ou do especialista (Johnstone, 1998). Esta é uma visão funcionalista da deficiência, dado que sustenta a sua caracterização na interacção do indivíduo com a sociedade, sendo esta a modificar-se e não o indivíduo. Considerando este novo conceito, em 2001, a OMS apresenta um novo Sistema de Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidades e Saúde – CIF. A CIF está dividida em duas partes, cada uma com duas componentes: Parte 1. Funcionalidade e Incapacidade a) Funções (fisiológicas dos sistemas orgânicos e psicológicas) e Estruturas do Corpo (partes anatómicas do corpo); b) Actividades (execução de uma tarefa ou acção por um indivíduo) e Participação (envolvimento numa situação de vida). Parte 2. Factores Contextuais a) Factores Ambientais (ambiente físico, social e atitudinal); b) Factores Pessoais (histórico particular da vida e do estilo de vida de um indivíduo). A funcionalidade de um indivíduo num domínio específico é uma interacção ou relação complexa entre a condição de saúde e os factores contextuais. Tal como se pode verificar na figura 1, há uma interacção dinâmica entre estas entidades, podendo a

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Educação: da Exclusão à Inclusão

intervenção num elemento modificar um ou vários outros. Assim, a avaliação do indivíduo tem subjacente, além dos níveis de funcionalidade e incapacidade, os factores ambientais que podem funcionar como barreiras ou facilitadores dessa funcionalidade, em função da subjectividade do indivíduo, ou seja, o que se constitui como uma barreira para uma determinada pessoa poderá constituir-se como facilitador para outra15. A CIF considera a existência e a influência dos factores pessoais mas não os codifica, porém, regista a importância dos mesmos para que um indivíduo possa desempenhar as suas actividades e participar das actividades num determinado ambiente.

FIGURA 1– Interacções entre os componentes da CIF (CIF, 2001)

Os diferentes modelos de categorização da deficiência, influenciaram igualmente o modo como são referidas as pessoas nessa condição: deficientes, portadoras de deficiência, com deficiência, com condição de deficiência e com limitações oriundas de deficiência (Mazzoni, 2003). Do confronto entre o modelo Médico e Social, emergem novos modelos dos quais destacamos o Modelo Afirmativo apresentado por Swain e French (2000:580) em que é desvalorizada a deficiência, enfatizando-se os aspectos positivos e afirmativos dos indivíduos, onde é esperado que a sociedade não se apresente apenas livre de barreiras estruturais but also a society which celebrates difference and values people irrespective

15

Mazzoni (2003) dá o exemplo da presença de desníveis entre o passeio e a rua, como um factor facilitador para as pessoas cegas e como barreiras para pessoas em cadeiras de rodas.

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Educação: da Exclusão à Inclusão

of race, sexual preference, gender, age or impairment. Neste contexto, o indivíduo assume uma atitude positiva perante a sua condição de deficiência repudiando the dominant value of normality (Swain e French, 2000:580), essencial à sua própria emancipação social. Jonhstone (1998) apresenta ainda o Modelo Baseado nos Direitos, que orienta o seu enfoque, não tanto para a garantia da prestação de serviços directa ou indirectamente às pessoas com deficiência, mas na consciencialização da sociedade para os direitos das pessoas com deficiências, o que a induzirá a providenciar os meios para a inclusão dessas pessoas. Nessa linha, Wolfensberger (1985, cit. in Rodrigues, 2001) propõe o conceito de valorização da função social, na perspectiva de tornar as pessoas com necessidades especiais parte da estrutura da comunidade, desempenhando funções sociais que sejam válidas e valorizadas. Segundo Rodrigues (2001:24) evoluímos assim da perspectiva de um indivíduo devedor, passivo, sem passado e desviante, para a de um indivíduo contribuinte, activo e crítico. Ou seja, evolui-se da aceitação social da deficiência imposta pelo direito de participação para o reconhecimento efectivo do seu contributo na sociedade, em que a diferença é, se adequadamente considerada, uma visão do mundo e uma postura alternativa. (Rodrigues, 2001:24). As reflexões acerca da diversidade e do direito estendem-se às mais diversas áreas, nomeadamente à da educação, que, numa perspectiva evolutiva, da segregação à integração, se posiciona, actualmente, na inclusão, em que o objectivo primordial incide sobre a participação das crianças e jovens como uma parte do todo da comunidade académica, em que estes sentem que pertencem à escola e a escola dever-se-á sentir responsável por eles (Rodrigues, 2003).

2.2. A Escola e a diversidade – da exclusão à inclusão A escola universal, laica e obrigatória surge, no século XIX, como uma instituição formal destinada à socialização dos jovens, à manutenção da ordem social e à promoção do desenvolvimento, procurando desta forma colmatar as desigualdades sociais e culturais das populações (Rodrigues, 2001).

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Educação: da Exclusão à Inclusão

A escola tradicional (Rodrigues, 2001), neste contexto, irá adaptar o modo de ensino individual ao colectivo (de grandes grupos), de modo a ensinar a muitos como se fossem um só, indiferente às diferenças (Rodrigues, 2003; Canário, 2006). A organização escolar caracterizava-se pela homogeneidade da classe, em termos etários e de conhecimentos, e do espaço, do tempo, e dos saberes (Barroso, 2003; Canário, 2006). A organização pedagógica assente assim no princípio da homogeneidade, das normas, dos valores e das atitudes contribuiria para a exclusão daqueles que não se adaptavam ao seu funcionamento, nomeadamente, Os alunos com qualquer necessidade especial de educação não podiam ser integrados nela, dado que rompiam essa regra fundamental de homogeneidade

(Rodrigues, 2001:16). Deste modo, os alunos passam a ser integrados em escolas especiais, organizadas maioritariamente por categorias de deficiência, que respondiam da mesma forma e segundo os mesmos princípios que a escola tradicional. Segundo Rodrigues (2001), a escola que se pretendia democrática, imbuída de princípios de homogeneidade, acabaria por se tornar ela própria no principal factor de exclusão. Surge assim a necessidade de uma escola que responda com eficácia a todos os seus alunos, independentemente do seu estatuto sócio-económico e condição física. Uma escola onde se celebre a diversidade, encarando-a como uma mais valia e não como algo a excluir. Nos finais dos anos 60, movimentos sociais, políticos e legislativos colocam em causa o sistema

tradicional

de

educação

especial,

considerando-o

discriminatório

e

antidemocrático. Nos Estados Unidos, nos anos 70, com o relatório de Lilly (1970) e a Lei Pública 94142 (1975) emerge o conceito da escola integrativa, focalizando a atenção na educação de crianças com deficiência no meio menos restritivo possível, promovendo a sua integração na escola regular através da criação de envolvimentos diferenciados na sala de aula, pressupondo a desvalorização das categorias (Smith e Neisworth, 1975, cit. in Rodrigues, 2001).

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Educação: da Exclusão à Inclusão

O Relatório Warnock (1978) introduz o conceito de necessidades educativas especiais, dando ênfase ao currículo como resposta às necessidades educativas dos alunos no seu percurso escolar. Esta alteração conceptual da classificação médico-pedagógica para a educacional irá permitir concepções diferentes em termos de sistemas de apoio, sendo o enfoque colocado nos apoios educativos. Os apoios centravam-se no próprio aluno e a sua presença na classe regular não pressuponha modificações quer na organização quer no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. Por conseguinte, conforme afirma Correia (1999:20), estar integrado significa o reconhecimento do direito do aluno a frequentar a escola regular, porém, Quando a prática de integração se concretiza apenas na sua colocação na escola, isto é, se a integração física não estiver articulada com a necessária integração social e académica, tal prática resulta falaciosa e irresponsável.

Segundo Rodrigues (2001), a escola integrativa originará um entendimento daltónico da diferença, em que os alunos com necessidades educativas normais (sem uma deficiência identificada, mas com problemas específicos de aprendizagem, de comportamento, insucesso escolar, etc.) não têm o mesmo tipo de atendimento personalizado e de condições essenciais ao sucesso escolar que os alunos com necessidades educativas especiais (com deficiência identificada) usufruem. Deste modo, Rodrigues conclui que a escola integrativa: Fica francamente aquém do objectivo de integrar todos os alunos, conseguindo, quando muito, resultados na integração de alunos com alguns tipos de deficiência. Talvez uma das causas mais significativas desta insuficiência seja o facto de a escola integrativa se ter preocupado exaustivamente com o apoio ao aluno (com a intervenção com o aluno) e não ter cuidado com a intervenção sobre o sistema escolar. Na verdade, não é o aluno que precisa de ser mudado é o conceito homogeneizador da escola tradicional (2001:18).

Em 1994, na conferência Mundial sobre as Necessidades Educativas Especiais de Salamanca (UNESCO, 1994), surgiu um novo paradigma: o da Educação Inclusiva, em que mais do que integrar no ensino regular crianças que dele estariam excluídas, se defende que a Escola deve incluir desde o início todas as crianças em idade escolar, quaisquer que sejam as suas características físicas, sociais, linguísticas ou outras,

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Educação: da Exclusão à Inclusão

procurando criar oportunidades de aprendizagem bem sucedidas para todas, graças à diferenciação de estratégias. Estas escolas devem reconhecer e satisfazer as necessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de utilização de recursos e de uma cooperação entre as respectivas comunidades (UNESCO,

1994). Neste novo paradigma é igualmente atribuído um novo papel à escola na sociedade, em que: As escolas regulares, seguindo esta orientação inclusiva, constituem os meios mais capazes para combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades abertas e solidárias, construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para todos. (UNESCO, 1994, ponto 2)

Deste modo, a escola dirige a sua atenção não só aos alunos com deficiência mas a todos aqueles que possuem uma necessidade especial. Segundo Correia (2001:128) a escola inclusiva é aquela que: Pretende dar resposta às necessidades de todos os alunos, sejam quais forem as suas características, nas escolas regulares das suas comunidades e, sempre que possível, nas classes regulares dessas mesmas escolas.

Uma escola inclusiva responde com eficácia a todas as crianças da comunidade onde se insere, aceita e valoriza a diferença, encarando-a como uma fonte de enriquecimento e de procura de novas metodologias de ensino e aprendizagem, apresentando-se como uma alternativa à escola tradicional da qual a escola integrativa é uma continuação dado que lhe permite manter o seu carácter selectivo, monocultural e de exclusão. (Rodrigues, 2001:20) As mudanças fundamentais nestas três concepções de escola são resumidas no Quadro 1:

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Educação: da Exclusão à Inclusão QUADRO 1 – Diferenças entre três opções de escola Escola Tradicional

Escola Integrativa

Educação inclusiva

Indivíduo abstracto

Categorias

Indivíduos e grupos

Produto

Produtos diferentes

Processos

Uniformização

Dicotomia metodológica

Diferenciação

Currículo construído

Dicotomia curricular

Currículo em construção In Rodrigues 2001:20

Porter (1997), por sua vez, resume do seguinte modo (Quadro 2) as principais diferenças entre integração e inclusão: QUADRO 2 – Diferenças entre a integração e a inclusão INTEGRAÇÃO

INCLUSÃO

Centrada no aluno

Centrado na sala de aula

Resultados diagnóstico-prescritivos

Resolução de problemas em colaboração

Programa para o aluno

Estratégias para os professores

Colocação adequada às necessidades dos alunos

Sala de aula favorecendo a adaptação e o apoio Porter, 1997 in Hegarty, 2001

Segundo Ainscow (2000), para que a escolas inclusivas sejam uma realidade, estas devem investir em seis tipos de mudança: 

Assumir, como ponto de partida, as práticas e conhecimentos existentes;



Ver as diferenças como oportunidades para a aprendizagem;



Inventariar as barreiras à participação;



Usar os recursos disponíveis para apoiar a aprendizagem;



Desenvolver uma linguagem ligada à prática;



Criar condições que incentivem aceitar riscos.

Ainda, Correia (2003) destaca seis pressupostos que uma escola inclusiva deverá considerar:

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Educação: da Exclusão à Inclusão



Um sentido de comunidade e de responsabilidade – promovendo-se uma boa comunicação entre profissionais de educação e pais, mostrando respeito pela diversidade, encarando o aluno como um todo, nos aspectos académicos, socioemocionais e de cidadania;



Uma liderança crente e eficaz – responsável pela planificação e consecução dos objectivos que levam ao sucesso escolar de todos e de cada um dos alunos;



Colaboração e cooperação – através da promoção de ambientes de interajuda entre docentes e discentes onde exista a confiança e o respeito essenciais ao desenvolvimento de estratégias;



Serviços e flexibilidade curricular – possibilidade de recorrer a uma variedade de serviços, sendo ainda possível determinar o currículo a considerar em função das características e necessidades do aluno;



Formação –

promover e valorizar as ofertas de oportunidades de

desenvolvimento profissional, de modo a que os visados possam adquirir e/ou aperfeiçoar as suas competências; 

Apoios educativos – mobilizar os recursos humanos e materiais que possibilitem uma resposta adequada às necessidades dos alunos.

Assim sendo, segundo Rodrigues (2003:100), a escola deverá reflectir e discutir sobre a qualidade das suas respostas educativas em consonância com o conceito de diversidade dos alunos, dando mais qualidade à diversidade e encarando a qualidade como um conceito de exigência situada e contextualizada. Heward (2003, cit. in Rodrigues, 2006) afirma que para responder à diversidade não significa que se tenham de utilizar metodologias diferentes para cada aluno, mas sim proporcionar oportunidades de aprendizagens diversificadas. Segundo Sebba e Ainscow (1996 cit. in Vislie, 2003:22), para se definir em políticas de inclusão deve fazer-se uma clara distinção entre os conceitos de inclusão e integração: A Inclusão não é:  

focusing on an individual or small group of pupils for whom the curriculum is adapted, different work is devised or support assistants are provided; about how to assimilate individual pupils with identified special educational needs into existing forms of schooling

A Inclusão é:

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Educação: da Exclusão à Inclusão • a process (rather than a state), by which a school attempts to respond to all pupils as

individuals;

• regards inclusion and exclusion as connected processes; schools developing more

inclusive practices may need to consider both;

• emphasizes the reconstructing of curricular provision in order to reach out to all

pupils as individuals;

• emphasizes overall school effectiveness; • is of relevance to all phases and types of schools, possibly including special schools,

since within any educational provision teachers face groups of students with diverse needs and are required to respond to this diversity.

Por seu lado, Wilson (2000, cit. in Rodrigues, 2003) considera que a inclusão pressupõe os seguintes componentes: •

É situada na comunidade vista como aberta, positiva e diversa;



É livre de barreiras físicas, curriculares, de sistemas de apoio e métodos de comunicação;



Promove a colaboração em lugar da competição;



Propõe a igualdade e ideais democráticos.

Segundo a UNESCO (2003) existem três razões que legitimam o investimento na inclusão: •

Educacional – porque ao responder às necessidades individuais de cada alunos beneficiam-se todos os outros;



Social – porque escolas inclusivas promovem mudanças de atitudes face à diferença, contribuindo para uma sociedade mais justa;



Económica – porque é menos dispendioso estabelecer e manter uma escola para todos os alunos do que um sistema completo com diferentes tipos de escolas especializadas para grupos específicos de alunos.

Alcançar este modelo de educação inclusiva supõe mudanças ao nível de toda a estrutura, organização e cultura da escola. A Escola que desde a sua génese cria grupos homogéneos e que procura promover o aluno médio representativo da cultura da classe dominante, neste contexto terá de equacionar e reestruturar a forma como se organiza de modo a responder com qualidade a todos os alunos. Porém, esta pode parecer um mudança difícil, sabendo que,

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Educação: da Exclusão à Inclusão Quantas vezes as comunidades escolares não são abertas, não são livres de barreiras, usam a competição a todos os níveis e não são estruturas democráticas

(Rodrigues 2003:96) Por outro lado, vivendo nós numa época em que a desigualdade entre os homens se parece agravar e em que não há solução plausível nem previsível para as injustiças e conflitos que proliferam (Rodrigues, 2006), coloca-se-nos a questão: Ora, se a sociedade está longe de ser inclusiva, poderá ser a escola uma ilha de inclusão num mar de exclusão?

(Rodrigues, 2003:91) Segundo o autor, a escola será sempre desejavelmente um reflexo da sociedade, propondo que em vez de escola inclusiva, falemos de educação inclusiva, no sentido de não se criarem paraísos balcanizados em relação ao meio envolvente (Rodrigues, 2003). Uma escola inclusiva numa sociedade que não o é não parece realmente desejável dado que, se os valores da escola não tiverem uma expressão no seu exterior, carecerão de sustentabilidade e de sentido […] A expressão educação inclusiva chama, assim, a atenção para a importância que o processo de inclusão deve ter na comunidade e na família, sob pena de se tornar um processo realmente ineficaz

(Rodrigues, 2003:91) Passada mais de uma década desde a primeira abordagem oficial às vantagens do desenvolvimento da educação inclusiva, a escola, de diferentes níveis, continua a mostrar algumas dificuldades em atingir a desejada qualidade para Todos. Segundo Barroso (2003:31), A escola massificou-se sem se democratizar, isto é, sem criar estruturas adequadas ao alargamento e renovação da sua população e sem dispor de recursos e modos de acção necessários e suficientes para gerir os anseios de uma escola para todos, com todos e de todos.

No mesmo sentido, Barroso (2003) considera que, nos dias de hoje, são múltiplas as formas de exclusão produzidas pela escola, sendo as quatro principais: 

A escola exclui porque não deixa entrar os que estão de fora;



A escola exclui porque põe de fora os que estão dentro;



A escola exclui incluindo;



A escola exclui porque a inclusão deixou de fazer sentido.

A primeira modalidade está relacionada com as desigualdades de oportunidades em termos sociais, culturais e económicos, a segunda, com factores de insucesso e

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abandono escolar, a terceira com o desfasamento entre a procura e a oferta escolares e a última, relacionada com o modo como os alunos encaram a escola, tanto ao nível da oferta, como no seu papel nas suas vidas. O mesmo autor atribui os problemas da escola actual ao facto de esta não ter abandonado os princípios que estiveram na sua génese, nomeadamente no modo de organização e gestão do ensino, de agrupamento e seriação dos alunos e de regulação pedagógica, apesar de terem surgido algumas alterações, a que o autor chamou enxertos, como o trabalho de grupo, a interdisciplinaridade, o ensino em equipa, os métodos activos, ou os centros de recursos (Barroso, 2003). Para Canário (2006) o fracasso da escola deve-se, em parte, ao facto de se ter subestimado a experiência e o papel fundamental do indivíduo na sua própria aprendizagem. Rodrigues (2003) apresenta algumas das razões referidas pelos professores como barreiras à inclusão e que estão relacionadas com três factores: •

Falta de formação de professores;



Carência de recursos;



Ausência de mudanças estruturais na escola que sustentem as inovações.

Segundo o autor, a formação de professores que inclui os aspectos relacionados com necessidades educativas especiais tem vindo a aumentar, porém, nem sempre a oferta corresponde às necessidades sentidas pelos professores e apresenta-se pouco concentrada na realidade de escola. Em relação aos recursos, Rodrigues (2003) refere que as preocupações (fundadas) dos professores incidem na insuficiência e desadequação dos mesmos, sobretudo na insuficiência de recursos humanos qualificados. Segundo o autor não basta ter mais recursos e qualidade e quantidade, é necessário questionar se estes recursos são postos ao serviço da inclusão (Rodrigues, 2003:98). Por último, em relação às mudanças nas escolas, as críticas dos professores concentramse no conservadorismo do seu funcionamento, todavia, segundo Rodrigues (2003), apesar de esse facto corresponder à maioria dos casos, a autonomia da escola permite-

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lhe empreender projectos com práticas mais activas, mais ligadas à comunidade e mais inclusivas, podendo estar igualmente sujeitas à mudança dos discursos de cima. Rodrigues (2003:100) conclui: As escolas mais bem sucedidas em dinamizar práticas inclusivas são, talvez, aqueles que, ainda que conhecendo os condicionalismos da criação do movimento da inclusão, apostam nele como uma meta de igualdade e verdadeira equidade para todos os aluno.s

Um dos objectivos possível e desejável da educação é a valorização da diversidade, não apenas como a tolerância das diferenças, justificativa em muitas situações para uma menor exigência e menor qualidade, mas como factor fundamental à construção de uma escola mais igualitária, equitativa, com qualidade e, consequentemente, mais inclusiva. Segundo Canário (2006), para a construção de uma escola mais justa, democrática, para Todos, sem discriminação e que não seja geradora de desigualdades, tanto no contexto académico, como social, tem de se ter em atenção o modo como se trata o aluno. Recorrendo a um novo conceito, Canário (2006:43) afirma: Para construir uma escola baseada na hospitalidade [na plena aceitação do outro] o que precisamos não é de “reformas”, nem de mais “formação”, precisamos, sobretudo, de ter a capacidade de “desaprender” para construir alguma coisa de novo.

2.3. Da Escola integrativa à Escola inclusiva em Portugal As primeiras iniciativas de Educação Integrada em Portugal ocorreram em meados do século XX, com a criação, em 1944, pelo Instituto Aurélio da Costa Ferreira, das classes especiais destinadas a alunos com problemas de aprendizagem e orientadas por professores especializados do referido Instituto (Correia, 1999). Mais tarde, na década de 60, sob orientação da então Direcção-Geral de Assistência surgiram novas iniciativas, que se resumiram em programas de ensino integrado com alunos com deficiência visual. Nos anos 70, mais precisamente com a chamada Reforma Veiga Simão, o Ministério da Educação passa a assumir, progressivamente, o sector da Educação Especial, criando

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em 1972 as Direcções Gerais do Ensino Básico e Secundário e, em 1976, as Equipas de Ensino Especial Integrado, com o objectivo de promover a integração familiar, social e escolar das crianças com deficiência, dirigindo-se essencialmente aos portadores de deficiências sensoriais e motoras, com capacidade de acompanharem os currículos escolares normais. A Constituição da República Portuguesa aprovada em 1976 consagra, no Artigo 71.º os direitos e deveres dos cidadãos com deficiência e as obrigações do Estado para com eles, estabelecendo nos Artigos 73.º e 74.º o direito à educação para Todos em igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar. A 04 de Outubro de 1979, é publicada a Lei n.º 66/79 que, no seu Artigo n.º 1 define Educação especial como: O conjunto de actividades e serviços educativos destinados a crianças e jovens que, pelas características que apresentam, necessitam de um atendimento específico.

As actividades e destinatários são caracterizados no Artigo seguinte: A educação especial integra actividades directamente dirigidas aos educandos e serviços de acção directa à família, aos educadores e às comunidades, contemplando deficientes físicos, motores, orgânicos, sensoriais e intelectuais.

A referida Lei, no Artigo 4.º, estabelece que cabe aos estabelecimentos de ensino regular proceder ao progressivo reajustamento das suas estruturas e aos serviços de educação especial proporcionar as condições de apoio que se considerassem necessárias para integração desses alunos. A Lei refere que uma das condições necessárias a uma educação integrativa é assim a própria modificação das estruturas de ensino. Porém, apenas com a Lei de Bases do Sistema Educativo de 1986 (Lei n.º 46/86 de 14 de Outubro) é consagrada finalmente a educação especial como modalidade integrada no sistema geral da educação, estabelecendo como um dos objectivos a garantia de condições adequadas ao desenvolvimento e pleno aproveitamento das capacidades das crianças com necessidades educativas específicas. Prevê ainda o ensino em instituições específicas quando comprovadamente o exijam o tipo e o grau de deficiência da criança.

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O Decreto-Lei n.º 319/92 de 23 de Agosto vem alargar o campo de acção da Educação Especial, introduzindo algumas alterações, como o conceito de necessidades educativas especiais, baseado em critérios pedagógicos, propondo o abandono da classificação por categorias, apoiado em decisões do foro médico, responsabilizando a escola pela procura das respostas adequadas à integração desses alunos no ambiente o mais normal (ou natural) possível. O regime educativo especial é estabelecido como um conjunto de medidas que consideram a criação de equipamentos especiais de compensação, adaptações materiais e curriculares, condições especiais de matrícula, de frequência e de avaliação, adequação e organização de classes ou turmas, apoio pedagógico acrescido e ensino especial. Deste modo o ensino especial visa o atendimento educativo de alunos que necessitam de: •

Currículo escolar próprio (adaptado);



Aprendizagem de técnicas específicas que lhes permitam o acesso ao currículo regular;



Aprendizagem sistematizada de competências que promovam a sua autonomia e integração pessoal;



Um currículo alternativo.

No contexto dos normativos e declarações emanados de organizações internacionais começa a surgir, no contexto nacional, a necessidade emergente de adequar a nossa legislação aos princípios universais de uma escola para Todos, ou uma escola inclusiva. Deste modo, em Julho de 1997 entra em vigor o Despacho Conjunto n.º 105/97, o qual vem dar corpo a este conceito, promovendo o desenvolvimento de serviços de apoio local como parte do corpo docente da escola, criando a figura dos professores de Apoio Educativo. As directrizes normativas deste Despacho visavam promover o sucesso educativo para todos os alunos, a integração sócio-educativa de crianças e jovens com necessidades educativas especiais, o desenvolvimento da qualidade educativa e a articulação de recursos da comunidade. O atendimento educativo passa a centrar-se na escola. Esta, no

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quadro da sua autonomia deve, assim, implementar um modelo de apoio que fomente a existência de respostas pedagógicas diversificadas e adequadas a todos, contribuindo assim para a igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativos. O Despacho Conjunto n.º 105/97 fomenta a flexibilização da organização curricular, das estratégias de ensino/aprendizagem, da gestão dos recursos e do currículo, de modo a potenciar o desenvolvimento de todos, de acordo com as características e as necessidades individuais O mesmo Despacho prevê que os professores de apoio educativo prestem apoio à escola no seu conjunto, ao professor da turma, ao aluno e à sua família e que colaborem na organização e gestão de recursos e medidas diferenciadas no processo de ensino/aprendizagem. Em síntese, o movimento inclusivo procura fomentar escolas onde haja uma mudança nos valores, nas crenças, nas mentalidades, nas convicções da cultura de escola e nas práticas de sala de aula, em que haja igualmente uma cooperação entre todos os seus membros na resolução de problemas, bem como na definição de estratégias diferenciadas de ensino: uma escola de todos, com todos e para todos, onde reine a diversidade, a equidade e a qualidade.

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Capítulo 3 - POLÍTICAS DE INCLUSÃO NO ENSINO SUPERIOR

No presente capítulo iremos apresentar alguns dos documentos que contribuíram significativamente para a definição de princípios orientadores para a construção de políticas e de diversas práticas de inclusão no ensino superior em alguns países. Tendo em conta a subjacente diversidade de realidades académicas encontrámos modelos de atendimento a estudantes com deficiência diferentes. Abordamos ainda alguns estudos realizados tendo por objecto a inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior, onde são enunciados as barreiras e os factores facilitadores do processo de inclusão.

3.1. Iniciativas para a construção do direito à educação superior inclusiva O direito à educação é um direito universal reconhecido para todos os indivíduos e consignado em diversos documentos produzidos por organismos internacionais. Os documentos que abordam especificamente a deficiência e a diversidade defendem igualmente o direito das pessoas com deficiência à plena cidadania, garantindo a igualdade de oportunidades em diversos domínios, a supressão de barreiras de mobilidade e comunicação, a vida autónoma e a sua participação activa em todas as actividades da comunidade.

3.1.1. Princípios orientadores para uma política de inclusão no ensino superior As primeiras iniciativas na defesa dos direitos das pessoas com deficiência surgiram em meados do século XX. Em 1948, A Declaração Universal dos Direitos do Homem, publicada pela ONU, consagra, no Artigo 26.º, o direito à educação superior para todos e, no Artigo 27.º, a livre participação na vida cultural da comunidade.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior Toda a pessoa tem direito à educação […] o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos, em plena igualdade, em função do seu mérito (Artigo 26.º n.º

1). Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e dos benefícios que deste resultam (Artigo 27.º n.º 1).

O período de 1980 a 1990 destaca-se pelo aparecimento de um novo paradigma teórico sobre a deficiência nos documentos internacionais e europeus. Esse novo paradigma caracteriza-se pelo abandono do corpo como centro de referência em favor do direito das pessoas com deficiência à plena integração social. A partir deste momento os documentos provindos das diversas organizações referem explicitamente o direito à plena integração e igualdade de oportunidades das pessoas com deficiência, reforçando a necessidade de combater as regras sociais que as privam do usufruto dos direitos comuns e de cidadania (Veiga, 2006). Pouco antes do início da chamada Década das Nações Unidas para as Pessoas Deficientes (1983-1992), é organizada pelo Governo Espanhol, em colaboração com UNESCO, A Conferência Mundial sobre Acções e Estratégias para Educação, Prevenção e Integração na qual foi emitida a Declaração de Sundberg16, cujos princípios enunciados se assemelham aos princípios defendidos pelo movimento inclusivo e da qual destacamos três Artigos: Toda a pessoa deficiente deve poder exercer o seu direito fundamental de acesso à educação, à formação, à cultura e à informação (Artigo 1º). As pessoas deficientes devem poder utilizar ao máximo as suas potencialidades criativas, artísticas e intelectuais, para sua própria realização e enriquecimento da comunidade (Artigo 3º). A fim de colocar o máximo das suas capacidades ao serviço da sociedade, todas as pessoas deficientes e, em particular, as que têm dificuldades de comunicação, devem poder dispor de programas educativos, culturais e de informação adaptados às suas necessidades específicas (Artigo 5º).

Nos anos 90 apareceram os documentos internacionais que maior contributo deram para o desenvolvimento de uma educação para todos, inclusiva e promotora do sucesso de todos individualmente, assente em princípio de direito, de igualdade de oportunidade e não de discriminação, seja ela positiva ou negativa. 16

Em homenagem a Nils-Ivar Sundberg, responsável pelo Programa da UNESCO para Educação Especial, no período de 1968 a 1981.

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Em 1990, em Jomtien, Tailândia, realizou-se a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, da qual resultou a Declaração Mundial sobre Educação para Todos, estabelecendo como metas relativas ao desenvolvimento do sucesso escolar, a atingir no ano 2000, a redução do analfabetismo na população adulta, a expansão do ensino de competências capazes de promover o emprego, o bem-estar e a saúde dos jovens e dos adultos, entre outras. E, de forma específica, foi estabelecido que Devem ser tomadas medidas de modo a garantir igualdade de acesso à educação de todas as categorias de pessoas com deficiência como parte integrante do processo educativo (ponto 5).

Em 1993 é aprovado pela Assembleia-geral da ONU o documento intitulado Normas sobre a Igualdade de Oportunidades para Pessoas com Deficiência, que seria estruturado com a auscultação de diversas organizações de e para pessoas com deficiência, e de representantes governamentais, com o objectivo de combater a discriminação a que esse segmento da população mundial continuava a estar sujeito. O referido documento contém 23 Normas que abrangem um vasto leque de necessidades nas áreas da educação, acessibilidade, emprego, segurança social, vida familiar, recursos financeiros e participação na vida cultural, recreativa, desportiva e religiosa. Transcrevemos aqui a norma relativa à educação, que se constitui uma referência para muitos países na produção de documentos normativos e legislativos sobre este assunto: Os Estados devem reconhecer o princípio segundo o qual deve proporcionar-se às crianças, jovens e adultos com deficiência igualdade de oportunidades em matéria de ensino primário, secundário e superior, num contexto integrado. Os Estados devem ainda garantir que a educação das pessoas com deficiência seja parte integrante do sistema de ensino (Norma n.º 6)

Em 1994, foi organizada pela UNESCO, em colaboração com o Governo Espanhol, a Conferência Mundial de Salamanca em que participaram 92 países e 25 organizações internacionais. As resoluções desta conferência foram publicadas sob a designação de: Declaração de Salamanca e Enquadramento da Acção na Área das Necessidades Educativas Especiais. Este documento, aprovado por todos os países representados, entre os quais Portugal, delineou o conceito de educação inclusiva e apresentou as principais práticas capazes de tornar viável a sua concretização17.

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Abordadas no capítulo anterior.

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Em 1998, na sede da UNESCO em Paris, na Conferência Mundial sobre a Educação Superior, mais de 180 países aprovaram a Declaração Mundial sobre o Ensino Superior no Século XXI: Visão e Acções, onde é destacada a importância do ensino superior para o desenvolvimento sócio-económico e cultural das nações. Reforçando o já consagrado na Declaração dos Direitos do Homem em 1948, no Artigo 3.º ( para uma nova visão da educação superior), determina-se que o acesso ao ensino superior deve ser baseado no mérito e no esforço dos candidatos sem discriminação de qualquer natureza, e que devem ser equacionados recursos e estratégias para as pessoas com necessidades especiais que lhes permitam ultrapassar as dificuldades que possam vir a encontrar no acesso e frequência desse nível de ensino. a) (…) admission to higher education should be based on the merit, capacity, efforts, perseverance and devotion, showed by those seeking access to it, and can take place in a lifelong scheme, at any time, with due recognition of previously acquired skills. As a consequence, no discrimination can be accepted in granting access to higher education on grounds of race, gender, language or religion, or economic, cultural or social distinctions, or physical disabilities. d) Access to higher education for members of some special target groups, (…) disadvantaged groups, peoples (…) who suffer from disabilities, must be actively facilitated, since these groups as collectivities and as individuals may have both experience and talent that can be of great value for the development of societies and nations. Special material help and educational solutions can help overcome the obstacles that these groups face, both in accessing and in continuing higher education.

Recentemente, a ONU retomou a discussão sobre os direitos das pessoas com deficiência, tendo sido adoptada em 13 de Dezembro de 2006, pela Assembleia-Geral, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, onde mais uma vez se afirma a necessidade de garantir os direitos humanos de todas as pessoas, proibindo a discriminação com base na deficiência em todas as áreas da vida. Este documento inclui orientações para as áreas da reabilitação e habilitação, educação, saúde, acesso à informação e serviços públicos, entre outros, que permitam às pessoas com deficiência alcançar uma maior autonomia e, em consequência, uma melhor qualidade de vida. O Artigo 24.º da Convenção contém as directrizes específicas à área da educação. No n.º 1 é consignado que: States Parties recognize the right of persons with disabilities to education. With a view to realizing this right without discrimination and on the basis of equal opportunity, States Parties shall ensure an inclusive education system at all levels and life long learning.

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No n.º 2 é sublinhada a importância de educar as pessoas com deficiência tendo em consideração as suas necessidades individuais, providenciando adaptações razoáveis, ou seja, as modificações necessárias e ajustadas de acordo com essas mesmas necessidades e os meios que maximizem o desenvolvimento académico e social do indivíduo, tendo com meta a inclusão plena. Nos números seguintes, são enunciadas as medidas apropriadas e fundamentais que os Estados devem assegurar às pessoas com deficiência de modo a que lhes ser possível aprender e participar em igualdade de oportunidades, nomeadamente o acesso a meios alternativos de comunicação, como a escrita Braille e a língua gestual, a contratação de professores especializados nesses domínios, inclusive com deficiência, que estejam igualmente habilitados para a formação, neste domínio, de outros profissionais em todos os níveis de educação. Por último é referida a responsabilidade dos Estados de garantir também ao nível do ensino superior, aprendizagem ao longo da vida e educação vocacional/profissional, as condições necessárias para a garantia do processo formativo do indivíduo com sucesso. A Convenção entrará em vigor após vinte Estados a terem retificado, ficando estes obrigados a reconhecerem no quadro jurídico local os direitos das pessoas com deficiência reconhecidos no tratado.

Uma vez citados os documentos de nível internacional considerados fundamentais para o desenvolvimento da educação inclusiva apontando alguns deles para uma transformação da escola de todos os níveis de ensino, no sentido desta se constituir como um espaço verdadeiramente inclusivo, capaz de promover a aprendizagem e o desenvolvimento de todos os alunos, interessa-nos conhecer qual o reflexo dessas mesmas orientações nos contextos locais nas políticas de ensino superior, sobretudo no nosso país.

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3.1.2. Políticas e práticas locais para a inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior Na grande maioria dos países onde se aplicam as consideradas políticas educativas relativamente à inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior, estas fundamentam-se sobretudo nos princípios orientadores vindos dos documentos internacionais anteriormente referidos. Apresentaremos de seguida alguns exemplos de países com uma política educativa consolidada dirigida a este grupo estudantil e outros, que têm manifestado progressos significativos nesse domínio, comparativamente com a realidade nacional. Salientamos ainda o facto de que o processo de candidatura ao ensino superior varia de país para país; nuns, a candidatura processa-se na própria instituição e é esta que estabelece os critérios de admissibilidade, noutras, o acesso assemelha-se ao existente em Portugal.

3.1.2.1. Fora da Europa Na Austrália, o Disability Discrimination Act 1992 (DDA) e o Disability Services Act 1992 (DSA) definem os princípios básicos que orientam as instituições de ensino superior (tertiary institutions) na promoção de uma educação inclusiva, baseando-se no pressuposto de que todos os estudantes, incluindo os estudantes com deficiência, têm direito a ser tratados com dignidade e a beneficiar de uma educação nos mesmos moldes da oferecida a outros estudantes. Por conseguinte as instituições universitárias são induzidas a: 

Assegurar que o estudante com deficiência não seja discriminado ao procurar inscrever-se num determinado curso;



Negociar e executar todas as adaptações necessárias que permitam ao estudante com deficiência participar nas actividades académicas do mesmo modo que os outros colegas;



Assegurar que os métodos de ensino/aprendizagem e de avaliação são apropriados à especificidade de cada caso individual de forma a assegurar que ele possa demonstrar os seus conhecimentos e capacidades.

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A fim de auxiliar as instituições de ensino superior a alcançar esses objectivos, foi publicada, pelo The Australian Vice-Chancellors' Committee (AV-CC), uma série de documentos de orientação, o primeiro dos quais em 1996, Guidelines Relating to Students with Disabilities, revisto em Maio de 2006, onde são estabelecidos como princípios gerais os seguintes: 1. That universities will uphold academic standards such that students graduate with the requisite skills and knowledge associated with the degree conferred. 2. That universities provide students with a disability with the opportunity to realise their academic and social potential and to participate fully in university life.

(AV-CC, 2006:3) As linhas gerais propostas no referido documento supõem que, às actividades de ensino e avaliação e à promoção de serviços para estudantes com deficiência estejam subjacentes os seguintes princípios:  Inclusive – Core activities of the University are designed and implemented in order to accommodate the needs of all students including those with a disability.  Comprehensive – Provision for students with a disability should cover all core university activities in recognition of the right to participate fully in the academic and social life of the University.  Equitable – University responses to the needs of students with a disability should recognise the rights and responsibilities of all parties and ensure that solutions are equitable for all concerned.  Explicit – Policies should clearly identify student and staff responsibilities in relation to provision of services and adjustments, the procedures whereby these will be implemented and the mechanisms for resolving disagreements.  Systemic – Consideration of the needs of the diverse student population should be embedded within University-wide planning, administrative support and quality assurance processes.  Respectful – Universities should ensure that all their interactions with students with a disability are characterised by respect for their rights to dignity, privacy, confidentiality and equity.  Consultative – Students and staff should be engaged in planning and evaluation of teaching and support strategies.  Resourced - Universities should provide adequate resources to enable the provision of learning environments and services that address the needs of students with a disability.

(AV-CC, 2006:3) O referido documento subdivide-se em quatro áreas: princípios gerais, políticas e administração, ensino-aprendizagem e campus e serviços. Outras das publicações de referência da AV-CC é a AV-CC Guidelines on Information Access for Students with Print Disabilities, onde são mencionadas estratégias que devem ser seguidas pelas instituições de ensino para a melhoria das condições de

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estudantes com dificuldades de visão, nas áreas do acesso à informação, dos materiais de estudo, do acesso à Internet, dos métodos de ensino, equipamento e tecnologia e das políticas educativas a promover pela instituição, dando exemplos de boas práticas. Em 1998, é publicado o Students with Disabilities: Code of Practice for Australian Tertiary Institutions, considerado um documento de referência actual (O’Connor et al., 1998), que estabelece os princípios e linhas gerais a considerar pelas instituições de ensino superior na organização de serviços mínimos de apoio a estudantes com deficiência. Neste são considerados os direitos e responsabilidades da instituição, do corpo docente e estudantes, bem como os procedimentos a seguir no desenvolvimento e implementação de políticas, orientações para a planificação anual de estratégias para o apoio a estudantes com deficiência, desenvolvimento de estratégias de ensinoaprendizagem adequadas e provisão de serviços, gerais ou específicos, que abranjam este grupo estudantil. O Governo Australiano publicou ainda recentemente o Disability Standards for Education 2005 (DSE), reforçando a obrigatoriedade das instituições universitárias em cumprir o estipulado na Section 2218 da DDA, ou seja, em fomentar uma cultura antidiscriminação desenvolvendo políticas e práticas nesse sentido. A mesma Lei estabelece que as diversas organizações abrangidas, nas quais se incluem os estabelecimentos de ensino, têm de produzir Action Plans que devem ser remetidos para a Human Rights and Equal Opportunities Commission.

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Education (1) It is unlawful for an educational authority to discriminate against a person on the ground of the person’s disability or a disability of any of the other person’s associates: (a) by refusing or failing to accept the person’s application for admission as a student; or (b) in the terms or conditions on which it is prepared to admit the person as a student. (2) It is unlawful for an educational authority to discriminate against a student on the ground of the student’s disability or a disability of any of the student’s associates: (a) by denying the student access, or limiting the student’s access, to any benefit provided by the educational authority; or (b) by expelling the student; or (c) by subjecting the student to any other detriment. (2A) It is unlawful for an education provider to discriminate against a person on the ground of the person’s disability or a disability of any of the person’s associates: (a) by developing curricula or training courses having a content that will either exclude the person from participation, or subject the person to any other detriment; or (b) by accrediting curricula or training courses having such a content. (3) This section does not render it unlawful to discriminate against a person on the ground of the person’s disability in respect of admission to an educational institution established wholly or primarily for students who have a particular disability where the person does not have that particular disability. (4) This section does not make it unlawful for an education provider to discriminate against a person or student as described in subsection (1), (2) or (2A) on the ground of the disability of the person or student or a disability of any associate of the person or student if avoidance of that discrimination would impose na unjustifiable hardship on the education provider concerned.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

O DSE prevê ainda que as instituições não sejam penalizadas caso não propiciem as condições necessárias aos estudantes quando, The application of unjustifiable hardship should take account of the scope and objects of the Act and the Standards, particularly the object of removing discrimination as far as possible, and of the rights and interests of all relevant parties. In determining whether the exception of unjustifiable hardship can be relied on, all relevant circumstances of the particular case are to be taken into account.(Ruddock, 2005:26)

Segundo Cooper (2003), a maioria das universidades australianas instituiu o Disability Action Plan19, no qual se definem acções, estratégias e recursos essenciais à equidade de tratamento dos estudantes com deficiência e cuja aplicação e supervisão é da responsabilidade da Human Rights and Equal Opportunities Commission. Nos EUA, a The Americans with Disabilities Act 1990 (ADA) e a Section 504 do The Rehabilitation Act of 1973 atribuem às instituições públicas a garantia da prestação de serviços para todos, sem discriminação baseada na condição do indivíduo, reconhecendo alguns dos serviços essenciais às pessoas com deficiência, nomeadamente no contexto do ensino superior (Gilbert, 1998; Rund e Scharf, 2000; Konur, 2000). Rund e Scharf (2000:84) afirmam, Today most colleges and universities readily accept this responsibility. As a result, most instituions have an office of disability services staffed by qualified professional prepared to ensure compliance with federal law and to determine and facilitate the provision of appropriate accommodations.

Segundo os mesmos autores, o estudante com deficiência poderá obter subsídios para aquisição de serviços e equipamento recorrendo a diversos fundos (estatais, federais ou institucionais), porém, este constitui um processo bastante demorado e complexo (Rund e Scharf, 2000). No Canadá, The Canadian Charter of Rights and Freedoms inclui um parágrafo que torna inequívoco o princípio da equidade e da igualdade de direitos para todos os cidadãos: Every individual is equal before and under the law and has the right to the equal protection and equal benefit of the law without discrimination and, in particular, without 19

Disability Action Plan da Griffith University (www.gu.edu.au/equity/pdf/dis_action_plan.pdf) e da Australian National University (http://www.anu.edu.au/equity/daplan.html) são considerados pelo autor como os mais detalhados.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior discrimination based on race, national or ethnic origin, colour, religion, sex, age or mental or physical disability (Parágrafo 15 (1)).

Por conseguinte, as pessoas com deficiência devem ter direito a acesso igual a todos os recursos, oportunidades de emprego, educação e serviços. O mesmo Código, segundo a OCDE (2003), aplica-se a todos os cidadãos que se encontrem numa condição de doença ou deficiência permanente ou temporária. De acordo com a OCDE (2003), a Bill 125 (Act to amend the Youth Protection Act and other legislative provisions) é uma legislação específica sobre deficiência que complementa o anterior Código, porém, nenhum faz referência explícita à educação. No entanto, as universidades são responsabilizadas pela provisão dos serviços e apoios necessários ao estudante, qualquer que seja a sua condição, de modo a permitir que este desempenhe e cumpra os mesmos objectivos académicos com dignidade e sem qualquer obstáculo. Às universidades é requerido que preparem anualmente um plano sobre acessibilidade e políticas, programas específicos, actividades e serviços. Esses programas são públicos; porém, o seu incumprimento não é penalizado, nem depende dele qualquer fundo. Entretanto, o Governo local providencia incentivos institucionais para que as instituições possam cumprir as obrigações impostas pelo The Canadian Charter of Rights and Freedoms. Para o efeito, os estabelecimentos de ensino devem revelar-se pró-activos em promover as adaptações necessárias, nomeadamente em termos de serviços e apoios prestados aos estudantes com deficiência, procurando envolver o próprio estudante em todo o processo. Segundo Cooper (2003), todas a universidades canadianas possuem unidades de apoio e aconselhamento para estudantes com deficiência, dando como exemplo do modelo de política seguida pela maioria das instituições de ensino superior o expresso pela Universidade de New Brunswick. The University of New Brunswick is committed to the equitable treatment of students with disabilities. In May, 1996, the UNB Senate demonstrated this commitment by adopting the following statement: While all students are expected to satisfy the requirements for courses and programs, the administration, faculty, staff, and students of UNB are expected to provide reasonable accommodation to meet the needs of students with disabilities.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior Reasonable accommodation is the use of originality and flexibility in adjusting to particular needs; it is not to be interpreted as the lowering of academic standards. Reasonable accommodations may include such things as special seating, wheelchair accessible tables, adjustments to lighting or ventilation, use of a computer, tape recorder or FM system, and extended time for tests or exams. This statement recognizes the responsibility of the student to identify his/her specific needs for which accommodation is requested; it also recognizes the role of the university to preserve, as much as possible, the confidentiality and privacy of students' affairs; and finally it recognizes the joint effort of student and university needed to create and support an environment where students with disabilities will have the opportunity to attain academic and personal success. UNB has limited resources and must work within existing resources (faculty, staff, and budgets) in attempting to meet the needs of students with disabilities.20

Cooper (2003) destaca ainda o exemplo da Universidade de Saskatchewan, que se orienta pela valorização da diversidade e do seu contributo para a comunidade académica. The University of Saskatchewan Mission Statement, adopted in 1993, affirmed the Institution’s responsibility to the people of Saskatchewan. It articulated values that included an appreciation for diversity and a commitment to a climate of dignity and fairness. The University, in adopting the Mission Statement, pledged itself to promote accessibility and to advance equity through its policies and practices. Just as we value the diversity of all our students, we value and appreciate the differences and perspectives that students with disabilities bring to Campus. We appreciate the efforts, the determination and the compensatory strategies that they have developed to enable them to enroll in University. We value what we learn about disabilities; this enriches us individually and it enriches the learning environment.21

Ontario Ministry of Training, Colleges & Universities (MCTU) providencia, desde 1988, incentivos financeiros às universidades para a promoção de uma políticas de inclusão de estudantes com deficiência, em função do cumprimento do estabelecido no Ontario Human Rights Code: Every person has a right to equal treatment with respect to services, goods and facilities, without discrimination because of race, ancestry, place of origin, colour, ethnic origin, citizenship, creed, sex, sexual orientation, age, marital status, family status or disability (Part I (1)).

20

http://www.ds.unb.ca/prog.php Students with Disabilities: Policy, Procedures and Recommendations University of Saskatchewan in http://students.usask.ca/disability/disabil2000.doc 21

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Os estudantes com deficiência podem igualmente usufruir de apoios para aquisição de serviços e equipamentos de que necessitam através do Canada Study Grant, do Assistance Program for Students with a Permanent Disability e do The Bursary for Students with Disabilities. Todos estes programas se destinam a estudantes com deficiência permanente, canadianos ou com residência permanente, como forma de auxílio no combate às barreiras que encontrem no seu percurso académico devido à sua condição. Os subsídios atribuídos destinam-se à aquisição de equipamentos e serviços, como por exemplo: 

Intérprete de língua gestual;



Tutor (para estudantes com dificuldades de aprendizagem);



Note-taker;



Leitores;



Assistente pessoal (para actividades dentro da instituição);



Transporte especializado;



Texto em formato alternativo (ampliado, Braille, gravado);



Computadores e outras ajudas técnicas e software;

Para o efeito o estudante terá de fazer prova da sua condição junto do serviço de apoio específico do estabelecimento de ensino ou directamente nos gabinetes públicos que gerem os referidos fundos. The Bursary for Students with Disabilities é um fundo complementar aos outros, podendo o estudante recorrer a este quando não obtiver dos anteriores financiamento suficiente para a aquisição dos serviços e equipamentos de que necessita. No Brasil, até ao início da década de 80, poucas pessoas com deficiência tinham a oportunidade de alcançar o ensino superior. Porém, com o anunciado Ano Internacional das Pessoas Deficientes e da Década das Nações Unidas para as Pessoas com Deficiência, foram introduzidas medidas legislativas que contribuíram para a melhoria das condições de vida dessas pessoas, originado um aumento da sua procura deste nível de ensino (Sassaki, 2001; Valdés, 2006). Desde finais dos anos 90, tem-se verificado uma evolução significativa nos normativos e iniciativas para a promoção do acesso e permanência em igualdade de oportunidades para estudantes com deficiências em instituições de ensino superior, reflexo de uma

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maior atenção do Estado brasileiro ao valor da inclusão social no desenvolvimento económico e social do país. Em 1999, é publicada a Portaria n.º 1.679 que determina que sejam incluídos nos instrumentos destinados a avaliar as condições de oferta de cursos superiores, para fins de autorização e reconhecimento e de credenciamento de instituições de ensino superior, bem como para renovação, conforme as normas em vigor, requisitos de acessibilidade de pessoas portadoras de necessidades especiais. (Artigo 1.º)

Por conseguinte, perante a Lei, as instituições de ensino superior são obrigadas a criar condições de acessibilidade para estudantes com deficiência, sendo o cumprimento dessa portaria requerido para o processo de autorização de funcionamento, de reconhecimento de cursos e de acreditação dessas instituições. Nesse sentido, as instituições devem prever mudanças em termos de: (i)

eliminação de barreiras arquitectónicas;

(ii)

acessibilidade aos locais de estudo e de uso comum;

(iii)

manutenção de uma sala de apoio, com materiais específicos para os estudantes com deficiência visual;

(iv)

adopção de um plano de aquisição gradual de acervo bibliográfico em suporte Braille e sonoro;

(v)

e, para os estudantes com deficiência auditiva, apoio de língua gestual22 na realização e revisão de provas, flexibilidade na correcção de provas escritas, valorizando o conteúdo semântico; e, para os professores, formação sobre as especificidades linguísticas dos estudantes surdos.

A referida Portaria viria a ser revogada em 2003 pela Portaria 3.284 de 27 de Novembro, na qual é considerada a acessibilidade dos alunos com deficiência no ensino superior e reiteradas, de forma ainda mais específica, as condições para que as instituições de ensino superior sejam acreditadas mediante a promoção da acessibilidade; refere ainda que caberá à Secretaria de Educação Superior, com o apoio técnico da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação, estabelecer os requisitos desta acessibilidade.

22

"Língua de sinais", no Brasil.

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Em 2 de Dezembro de 2004 é publicado o Decreto n.º 5.296, Lei da Acessibilidade, que no Artigo 24.º estabelece, entre outros aspectos, que os estabelecimentos de ensino superior devem proporcionar condições de acessibilidade para pessoas com deficiência em todos os edifícios e lugares comuns, bem como definir nos regulamentos internos os princípios de não discriminação com base na condição de deficiência de qualquer membro da comunidade académica. Os estabelecimentos de ensino de qualquer nível, etapa ou modalidade, públicos ou privados, proporcionarão condições de acesso e utilização de todos os seus ambientes ou compartimentos para pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, inclusive salas de aula, bibliotecas, auditórios, ginásios e instalações desportivas, laboratórios, áreas de lazer e sanitários. § 1.º Para a concessão de autorização de funcionamento, de abertura ou renovação de curso pelo Poder Público, o estabelecimento de ensino deverá comprovar que: I – está cumprindo as regras de acessibilidade arquitetônica, urbanística e na comunicação e informação previstas nas normas técnicas de acessibilidade da ABNT, na legislação específica ou neste Decreto; II – coloca à disposição de professores, alunos, servidores e empregados portadores de deficiência ou com mobilidade reduzida ajudas técnicas que permitam o acesso às atividades escolares e administrativas em igualdade de condições com as demais pessoas; e III – seu ordenamento interno contém normas sobre o tratamento a ser dispensado a professores, alunos, servidores e empregados portadores de deficiência, com o objetivo de coibir e reprimir qualquer tipo de discriminação, bem como as respectivas sanções pelo descumprimento dessas normas. O acesso e a permanência, com qualidade e dignidade, ao ensino superior é direito de todos os brasileiros, tenham ou não uma deficiência e representa o coroamento do processo de inclusão escolar, iniciado nos primeiros anos de vida.

No seguimento desta nova perspectiva de conceber o acesso ao ensino superior, a partir de 2005 são promovidas várias acções afirmativas pela Secretaria de Educação Superior e pela Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação em prol da educação superior inclusiva. Estas acções envolvem o incremento do acesso e permanência de pessoas com deficiência no ensino superior, a avaliação do desenvolvimento de iniciativas específicas por parte das instituições de ensino superior e subsídios a estudantes com deficiência. Apresentamos algumas iniciativas:

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Programa Universidade para Todos (PROUNI) – instituído em Janeiro de 200523, tem por objectivo a concessão de bolsas de estudo a estudantes com deficiência e/ou em situação de carência sócio-económica que se encontrem a estudar em instituições de ensino superior privadas, estando estas em maioria no Brasil (Valdés, 2006). Esta bolsa poderá ser reforçada com as bolsas atribuídas pelo Fundo de Financiamento ao Estudante no Ensino Superior (FIES), cabendo sempre ao estudante o pagamento de 25% da propina.



Programa de Acesso à Universidade (INCLUIR) – visa o financiamento de propostas das instituições de ensino superior que se pretendam implementar políticas de eliminação da descriminação do aluno com deficiência, nomeadamente de projectos de adequação das estruturas físicas das instituições ensino superior e programas inovadores na área do ensino-insvestigação para a promoção da inclusão. As propostas das instituições devem incluir um dos seguintes eixos24: a) Acessibilidade à comunicação de alunos com deficiência, em todas as actividades académicas. b) Aquisição de equipamentos e materiais didácticos específicos destinados ao uso de alunos com deficiência para a promoção de acessibilidade. c) Aquisição e adaptação de mobiliários para acessibilidade de pessoas com deficiência aos diferentes ambientes ou compartimentos da Instituição. d) Reforma nas edificações para acessibilidade física dos alunos com deficiência em todos os ambientes. e) Formação profissional de professores e técnicos para actuação com alunos com deficiência. f) Contratação de pessoal para os serviços de atendimento educacional especializado.

No ano de 2005 foram aprovados pelo programa INCLUIR 13 projectos de instituições de ensino superior diferentes e 28 projectos em 2006.

23

Lei 11.096 de 13 de Janeiro http://portal.mec.gov.br/sesu/index.php?option=content&task=view&id=557&Itemid=303 [acedido em 10 de Outubro de 2006] 24

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3.1.2.2. Na Europa No contexto europeu, a problemática da inclusão dos estudantes com condição de deficiência é largamente discutida. Alguns países com um processo de transformação social mais consolidado (Alemanha, Áustria, Bélgica, França, Noruega) dispõem, há algumas décadas, de programas de apoio a estudantes universitários com deficiência e de uma política comum de igualdade de oportunidades dirigida a este grupo estudantil (Hurst, 1996; Alcantud, et al., 2000). Seguidamente, iremos debruçar-nos apenas naqueles em que nos foi possível obter informação sobre o contexto local.

No Reino Unido, segundo vários autores, até 1993 o ensino superior não estava acessível a pessoas com deficiência e os apoios que eventualmente fossem disponibilizados dependiam da boa vontade do corpo docente e dos estudantes. (Baron et al.; 1996, Parker, 1998, 1999; Hurst, 1999; Riddell et al., 2005). A situação viria a mudar com a fundação do SKILL (The National Bureau for Students with Disabilities), organização dedicada à promoção do acesso de pessoas com deficiência ao ensino superior e dos Scottish and English Higher Education Funding Councils (SFEFC e HEFCE), organismos estatais que, entre 1993 e 1996 (Parker, 1999), accionaram alguns fundos to encourage institutions to become more accessible to students with special needs (HEFCE, 1995, cit in Parker, 1998:190). Na sequência dessas actividades, em 1994, a SHEFC estabeleceu o cargo de National Coordinator, e o HEFCE, a de eQuip team em 1997. Em 1990, seria estabelecido, a título experimental, a Disabled Students’ Allowance (DSA), que consistia num fundo a atribuir a estudantes de cursos graduados do ensino superior para suprir as suas necessidades individuais. Segundo Hurst (1999), a DAS contribuiu, em certa medida, para incrementar o número de candidatos com deficiência ao ensino superior. A DSA permanece nos dias de hoje, sendo os subsídios aos estudantes atribuídos segundo os seguintes critérios: 

The basic allowance (anual): para aquisição de, por exemplo, cassetes, papel para impressão em Braille, fotocópias ampliadas e outros pequenos itens e equipamentos;

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Allowance for large items of equipment (atribuído uma vez durante a frequência de um curso do 1. º Ciclo): para aquisição de equipamentos mais dispendiosos, como por exemplo, computadores pessoais, impressoras Braille, bloco de notas electrónico, lupa portátil, ou circuito interno de televisão para ampliação de livros;



Allowance for non-medical personal help (anual): para aquisição de serviços, de leitores (para estudantes com dificuldades de visão), interprete de língua gestual, leitura labial, assistente pessoal para tirar notas ou para ajudar estudantes em cadeira de rodas, entre outros.

Segundo Hall e Tinklin (1998), Konur (2000) e Holloway (2001) a Disability Discrimination Act 1995 (DDA), a Lei da anti-discriminação de pessoas com deficiência no Reino Unido, não abrangia directamente as instituições de ensino superior, dificultando os esforços dos estudantes com deficiência na garantia das melhores condições para frequência e sucesso académico. The university and student relationship as well as the university–staff legal relationship have been very problematic in the UK (Birtwistle, 1998). Birtwistle argues that the university–student legal relationships are not of equals, but unequals where the university has a higher bargaining power. The internal resolution of disputes may take years which most students do not have the resources to afford.(Konur, 2000:1049)

Em 2001, o Special Educational Needs and Disability Act 2001 (SENDA) veio corrigir essa situação ao introduzir importantes alterações no Disability Discrimination Act (1995), atribuindo às instituições de ensino superior a responsabilidade de garantir a igualdade de oportunidades para todos os estudantes e em especial para os estudantes com condição de deficiência. Deste modo, The Disability Discrimination Act part 425, estabelece que as instituições do ensino superior têm: A duty not to treat disabled students less favourably, without justification, for a reason which relates to their disability. A duty to make reasonable adjustments to ensure that people who are disabled are not put at a substantial disadvantage compared to people who are not disabled in accessing further, higher and Local Education Authority-secured education.

(Capítulo 2, Parte 2)

25

A part 4 da DDA corresponde à SENDA.

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Neste contexto, e segundo a Disability Rights Commission (DRC), a discriminação ocorre quando: a responsible body treats a disabled person less favourably, for a reason relating to the person’s disability, than it treats (or would treat) a person to whom that reason does not, or would not, apply and that treatment cannot be justified. a responsible body fails to make a reasonable adjustment when a disabled student is placed, or likely to be placed, at a substantial disadvantage in comparison with a person who is not disabled. (DRC, 2001:24)

Em função dessas alterações, as instituições de ensino superior terão de implementar/ajustar a sua política educativa e procedimentos, de modo a assegurar as condições necessárias para que os estudantes com deficiência não se sintam em desvantagem em relação aos colegas. É imposto aos estabelecimentos o dever de antecipação, pois, mesmo que no estabelecimento de ensino não haja estudantes inscritos nessa condição, terão de acatar o preceituado na Lei, visto que, failure to anticipate the need for an adjustment may mean it is too late to comply with the duty to make the adjustment when it is required” (DRC, 2002:69)

Por conseguinte, no futuro, seja qual for o estabelecimento de ensino que o estudante escolher, este deverá ter a garantia de encontrar as condições necessárias para iniciar ou prosseguir os seus estudos em igualdade de oportunidades. Para orientação das instituições de ensino, foi organizado pela Disability Right Commission, uma série de Codes of Practice, que no caso concreto das universidades, aplica-se o Disability Discrimination Act Part 4 - Post 16 Code of Practice (McCarthy, 2001; Cooper, 2003, Ridell et al. 2005), no qual são apresentados exemplos práticos da aplicação da Lei. O Disability Discrimination Act – amended entrou em vigor em Setembro de 2002, tendo sido estabelecido o prazo de Setembro de 2003, para as instituições de ensino superior organizarem os seus planos de intervenção, em termos de aquisição de ajudas técnicas e serviços, como por exemplo, lupas, intérprete de língua gestual, documentação em formato alternativo e formação de técnicos e docentes nas áreas da deficiência e tecnologias de apoio; e o de Setembro de 2005, para os programas de eliminação de barreiras físicas e arquitectónicas. O Disability Discrimination Act Part

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4- Post 16 Code of Practice considera ainda estas fases e orienta as instituições no modo de proceder. Desconhece-se o impacte dessa Lei nas instituições de ensino superior. No entanto, em 2005 foram introduzidas novas alterações no Disability Discrimination Act, atribuindo aos organismos e instituições públicas, nomeadamente aos estabelecimentos de ensino superior, a obrigatoriedade de produzir um Disability Equality Scheme (DES) até 6 de Dezembro de 2006. Por conseguinte, as instituições públicas estão obrigadas a: 

Publicar o Disability Equality Scheme com planos de acção para 3 anos e apresentar anualmente relatórios de progresso;



Ponderar e avaliar o impacte na vida das pessoas com deficiência de planos, políticas e procedimentos propostos ou desenvolvidos pela instituição;



Descrever o modo como as pessoas com deficiência foram incentivadas a participar na realização dos DES e planos de acção.

Segundo a Equality Challenge Unit (2006), o Disability Discrimination Act 2005 introduz uma nova visão, mais positiva, do sector público perante as pessoas com deficiência. No que diz respeito às instituições de ensino superior, perante as novas orientações, estas terão que equacionar o seu modo de actuar, direccionando-se para uma prática mais inclusiva, o que supõe:    

reviewing their own practices and adopting more inclusive teaching and learning approaches in accordance with anticipatory duties; ensuring that they have appropriate training to make their teaching and learning and assessment practices more accessible to disabled; students ensuring that they understand their duties to make reasonable adjustments; ensuring that they are aware of the advice and support services which are available within the institution for disabled students. (ECU, 2006: 5)

Em Espanha, as primeiras iniciativas de apoio aos estudantes com deficiência apareceram também na década de 90 (Alcantud et al. 2000). Porém, desde 1982 que a Ley de Integración Social de los Minusválidos26 prevê a concessão de condições especiais para estudantes com deficiência. Los minusválidos que cursen estudios universitarios, cuya minusvalía les dificulte gravemente la adaptación al régimen de convocatorias establecido con carácter 26

Ley 13/1982, de 7 de Abril.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior general, podrán solicitar y los centros habrán de conceder la ampliación del número de las mismas en la medida que compense su dificultad. Sin mengua del nivel exigido, las pruebas se adaptarán, en su caso, a las características de la minusvalía que presente el interesado. (LISMI, Artigo 32.º n.º 2)

A mesma Lei, Artigo 30.º, refere-se à gratuitidad de la enseñanza, princípio que em algumas universidades tem sido estabelecido apenas para estudantes com deficiência, tendo estes como limitação e contrapartida à sua concessão o aproveitamento académico (Alcantud et al. 2000). Na opinião de Óscar Moral (2005 cit. in Fraga e Fernandez, 2005), este facto teve como consequência sentenças díspares em contenciosos entre estudantes e instituições, originando uma discriminación territorial y personal. Em termos de frequência, o Real Decreto 696/1995 de 28 de Abril27, no Artigo 18.º, estipula que as Universidades públicas devem garantir aos alunos com necessidades educativas permanentes o princípio da igualdade de oportunidades, e para tal, […] realizarán las adaptaciones que fuere menester con el fin de que los alumnos con necesidades educativas especiales permanentes puedan efectuar las pruebas de acceso a la universidad. Asimismo, facilitarán a estos alumnos el acceso a las instalaciones y a las enseñanzas con el fin de que puedan proseguir sus estudios. O mesmo Artigo no n.º 2, e o Real Decreto 704/1999 de 30 de Abril, que regula os procedimentos de selecção para ingresso nos estabelecimentos de ensino universitário, asseguram que as universidades devem reservar 3% de vagas para estudantes com deficiência. […] un 3 por 100 de las plazas disponibles para estudiantes que tengan reconocido un grado de minusvalía igual o superior al 33 por 100, o padezcan menoscabo total del habla o pérdida total de audición, así como para aquellos estudiantes con necesidades educativas especiales permanentes asociadas a las condiciones personales de discapacidad que durante su escolarización anterior hayan precisado recursos extraordinarios. (Real Decreto 704/1999, Artigo 22. º n. º 1) A Lei Orgânica 6/2001 das Universidades, no Artigo 46.º, enumera os direitos e deveres dos estudantes, designando como um direito do estudante: La igualdad de oportunidades y no discriminación, por circunstancias personales o sociales, incluida la discapacidad, en el acceso a la Universidad, ingreso en los centros, permanencia en la Universidad y ejercicio de sus derechos académicos.

27

Real Decreto de Ordenación de la Educación de los alumnos com necesidades educativas.

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Neste país, a percentagem de serviços de apoio especializados em universidades passou de 2% em 1994 para 75% em 2001 (Rubio, 2003). Estes serviços surgiram, alguns, por iniciativa dos próprios estabelecimentos de ensino, outros, por iniciativa de organizações não governamentais (associações de voluntariado, de pessoas com deficiência ou fundações) (Alcantud et al., 2000; Rubio, 2003). O número de alunos com deficiência que frequenta este nível de ensino tem aumentado, embora seja ainda muito reduzido (Fraga e Fernandez, 2005). No que concerne à França, de uma maneira geral, o apoio prestado no ensino superior aos estudantes com deficiência fundamenta-se na Loi n.º 75-534 de 30 de Junho de 197528, a qual estipula como dever nacional a educação e formação de pessoas com deficiência em escolas regulares com apoios essenciais ao seu sucesso académico e desenvolvimento pessoal. Com base nesta Lei, foram estabelecidas as condições de exame para estudante com deficiência, previstas em sucessivas circulares, em particular sobre a acessibilidade aos locais, utilização de ajudas técnicas e humanas e duração da prova29. O Quadro normativo existente não visava directamente os estabelecimentos de ensino superior, em particular, por isso as políticas de acolhimento e integração dependiam, até 2006, directamente dos estabelecimentos de ensino; deste modo, no âmbito de contratos-programa, o Estado estabeleceu financiamento para as iniciativas de cada estabelecimento, bem como a criação de um fundo “inter-ministérios” para o melhoramento da acessibilidade dos edifícios (FIA) que permite co-financiar obras respeitantes à acessibilidade exterior e interior dos edifícios de ensino superior (OCDE, 2003). Os estudantes com deficiência podem recorrer a diversas ajudas financeiras, tendo em conta o tipo de deficiência e o grau da sua incapacidade (compreendido entre 50 a 80%), porém o estudante poderá igualmente obter uma bolsa de estudos do ensino superior em função dos critérios sociais que estão subjacentes aos estudantes universitários. Esta bolsa, atribuída pelos reitores das universidades, tem por objectivo suprir os encargos do estudante e da sua família. Um estudante com deficiência que tenha um grau de 28

Loi d’orientation en faveur des personnes handicapées. Circulaire n° 2003-100 du 25 juin 2003 Organisation des examens et concours de l’enseignement scolaire ou supérieur pour les candidats en situation de handicap. 29

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incapacidade igual ou superior a 80% está isenta do pagamento das propinas. (OCDE, 2003). Podem também beneficiar de transporte adaptado (domicílio-universidade e vice-versa) desde que apresentem um atestado comprovativo da gravidade da sua deficiência. Esta medida fica a cargo do Ministério da Educação se o estudante viver em França e a cargo da autoridade educacional, se viver na região de Île-de-France (OCDE, 2003). A grande maioria das universidades proporciona serviços de apoio com programas de actuação individualizados, com o objectivo de facilitar a integração destes estudantes no meio universitário e profissional; os estudos encomendados pelo Governo francês (Glibert, 2002; Georget e Mosnier, 2006) revelaram a existência em algumas universidade do chargé d’accueil e de um service accueil handicap, que procuram garantir aos estudantes com deficiência o acesso ao ensino. Estas iniciativas mostram uma vontade das próprias instituições em criar condições adequadas aos estudantes com deficiência; no entanto, os estudos revelaram ainda que nesta matéria existem grandes disparidades entre instituições. Deste modo, em 2005, a Loi pour l’égalité des droits et dés chances, la participation et la citoyenneté des personnes handicapés, de Fevereiro de 2005, enuncia pela primeira vez a obrigação de as universidades acolherem os estudantes com deficiência com condições essenciais ao seu desempenho e desenvolvimento. Les établissements d'enseignement supérieur inscrivent les étudiants handicapés ou présentant un trouble de santé invalidant, dans le cadre des dispositions réglementant leur accès au même titre que les autres étudiants, et assurent leur formation en mettant en œuvre les aménagements nécessaires à leur situation dans l'organisation, le déroulement et l'accompagnement de leurs études. (Artigo. L.

123-4-1.)

No sentido de proporcionar toda a informação essencial aos potenciais candidatos ao ensino superior com deficiência, o Ministério da Educação desenvolve o site Handi-U: Le site handi-U, au service des étudiants, cherche à offrir les informations pertinentes pour la vie d'un étudiant: conditions d'accessibilité, d'accueil et d'accompagnement des universités, nom des responsables d'accueil, aides diverses auxquelles il peut prétendre, liens avec le CNOUS et les CROUS pour la restauration et l'hébergement, transport, textes officiels, adresses utiles…. (http://www.sup.adc.education.fr/handi-u/).

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Existem ainda universidades que dispõem de um guia do estudante com deficiência, Guide Accueil Handicap, com informação sobre a acessibilidade dos edifícios da universidade, transportes adaptados de ligação com o campus universitário, bibliotecas, residência e restaurantes universitários. Em Itália, a Lei nº104/9230 prevê no Artigo 2.º que os estudantes com deficiência, no ensino primário, secundário e superior, beneficiem de medidas especiais. Estipula igualmente nos Artigos 12º, 13º e 42º os apoios específicos aos estudantes com deficiência que frequentam instituições de ensino superior, nomeadamente a dotação da universidade de meios técnicos, pedagógicos e materiais didácticos específicos que possibilitem ao aluno exercer o seu pleno direito à educação, bem como a dotação de financiamento aos estabelecimentos de ensino de superior para o cumprimento do estipulado. a) la dotazione alle scuole e alle università di attrezzature tecniche e di sussidi didattici nonché di ogni altra forma di ausilio tecnico, ferma restando la dotazione individuale di ausili e presìdi funzionali all'effettivo esercizio del diritto allo studio, anche mediante convenzioni con centri specializzati, aventi funzione di consulenza pedagogica, di produzione e adattamento di specifico materiale didattico; c) la programmazione da parte dell'università di interventi adeguati sia al bisogno della persona sia alla peculiarità del piano di studio individuale; d) l'attribuzione, con decreto del Ministro dell'università e della ricerca scientifica e tecnologica, da emanare entro tre mesi dalla data di entrata in vigore della presente legge, di incarichi professionali ad interpreti da destinare alle università, per facilitare la frequenza e l'apprendimento di studenti non udenti; (Artigo 13.º)

A Lei nº17/99 viria a introduzir alterações à anterior Lei-Quadro, reforçando as responsabilidades das universidades na organização do apoio individual ao estudante com deficiência, e determinando que as universidades nomeassem delegados dos reitores para a problemática da deficiência, com a função de monitorizar, coordenar e assegurar todas as actividades relacionadas com a integração das pessoas com deficiência no meio universitário. Os estudantes com deficiência que têm uma incapacidade superior ou igual a 66% (devidamente comprovada por uma Comissão Especial Médica) estão totalmente isentos do pagamento das propinas. 30

Legge 5 febbraio 1992, n. 104 Legge-quadro per l'assistenza, l'integrazione sociale e i diritti delle persone handicappate.

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Segundo o estudo realizado pela OCDE (2003), na Suíça não existe legislação que garanta aos estudantes com deficiência determinados direitos ou atribua às instituições incentivos para a remoção de barreiras existentes no sistema de ensino superior; o estudante com deficiência poderá, todavia, recorrer aos apoios financeiros e serviços especiais que são previstos pela Lei Federal para as pessoas com deficiência. Segundo Riddell et al. (2005) também na Polónia não é exigido das instituições qualquer esforço para garantir as condições essenciais aos estudantes com deficiência. Hurst (1993) afirma que na Suécia o ensino superior é gratuito para todos os estudantes, sendo apenas exigido aos estudantes com deficiência acatar os requisitos gerais e específicos exigidos, podendo estes requerer prioridade no acesso. Segundo Wahlstrom (1998) e Riddell et al. (2005), as instituições de ensino superior são legalmente coagidas a reservar 0,15% do seu orçamento para investimentos na área dos apoios aos estudantes com deficiência. Para Wahlstrom (1998), a maioria das universidades suecas oferece boas condições de estudo para este grupo estudantil, nomeadamente em termos de acessibilidade física, transporte e recursos humanos especializados.

3.1.2.3. Em Portugal Da análise à legislação vigente no nosso país, constata-se que a responsabilidade social das instituições na criação de condições adequadas a todos os estudantes, consignada em diversas resoluções internacionais, não tem tido grande impacte no enquadramento jurídico para o ensino superior, bem como no domínio dos normativos internos da grande maioria das instituições nacionais do ensino superior. A Constituição da República Portuguesa consagra, desde 1976, um Artigo dedicado às pessoas com deficiência, onde se afirma não só a igualdade dos cidadãos com deficiência perante os direitos consagrados na Lei Fundamental, como também a obrigação do Estado em realizar uma política de reabilitação e em apoiar as organizações representativas dos cidadãos com deficiência (Artigo 71.º). No Artigo 74.º estabelece-se ainda que todos têm o direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar e que cabe ao Estado na realização da política de ensino

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior [...] garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística.

Nesse sentido, a Lei de Bases do Sistema Educativo estabelece no n.º 6 do Artigo 12.º que compete ao Estado criar as condições que garantam aos cidadãos a possibilidade de frequentar o ensino superior, de forma a impedir os efeitos discriminatórios decorrentes das desigualdades económicas e regionais ou de desvantagens sociais prévias.

De facto, o Estado regulamenta, anualmente, a adaptação das provas de acesso às necessidades específicas apresentadas pelos estudantes e garante o processo de transição, através de um contingente especial para candidatos com deficiência física e sensorial31 previsto no regulamento do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior, também definido anualmente por Portaria do Ministério da Educação. A partir do ano lectivo de 1994/9532, os estudantes com situações clínicas devidamente comprovadas passaram também a ser abrangidos pelo mesmo contingente. Em 200133, a quota de vagas para esse mesmo contingente é alterada de 1% para 2% (ou duas vagas, qual deles o maior valor) das vagas fixadas para o concurso nacional da primeira fase, para cada estabelecimento/curso. Para se candidatar ao contingente especial específico, o estudante com deficiência ou com doença crónica tem de instruir o processo com documentação que comprove o seu tipo e grau de deficiência, juntar informação detalhada dos serviços especializados de apoio educativo do órgão de gestão do estabelecimento de ensino sobre o seu processo educativo e anexar outra documentação que considere útil para a avaliação da sua situação e particularmente das consequências desta no seu desempenho individual no percurso escolar no ensino secundário. A apreciação dos pedidos de admissão incide sobre análise documental e comprovação da deficiência. Em termos do desempenho individual, são tomadas em consideração as repercussões, em termos de capacidade, das suas limitações nas áreas de recepção da informação, mobilidade e locomoção, manipulação, comunicação oral e escrita,

31

Portaria n.º 787/85 de 17 de Outubro. Portaria n.º 216/94 de 12 de Abril, Anexo III, n.º 4. 33 Portaria n.º 715/2001 de 12 de Julho. 32

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

autonomia no desempenho das actividades da vida diária e, ainda, o tipo e o grau de êxito das compensações e adaptações que foram desenvolvidas34. Mesmo que o candidato reúna todas as condições pode não ser colocado, em virtude do número limitado de vagas disponíveis e da classificação de todos os candidatos. Neste caso, a candidatura será considerada no âmbito do contingente geral e/ou de outro contingente especial requerido pelo interessado. Toda a documentação que o estudante reunir para o seu processo de candidatura não transitará para o estabelecimento de ensino no qual foi colocado, sendo este apenas informado da existência de estudantes que se candidataram ao referido contingente, cabendo ao estudante, se assim o entender, divulgar a sua condição e requerer os apoios de que eventualmente irá precisar. Mesmo concorrendo ao ensino superior através do contingente especial para deficientes, o estudante terá que efectuar as provas de ingresso previstas para o curso a que pretende concorrer e provar a sua aptidão física, funcional ou vocacional, ou seja, provar que cumpre os pré-requisitos que eventualmente tenham sido fixados para esse curso pelo estabelecimento de ensino superior. Porém, os critérios subjacentes a esses prérequisitos são estabelecidos em função das deliberações das comissões científicas de cada escola, o que dá origem à existência de pré-requisitos em cursos da mesma área de conhecimento (designação e plano curricular semelhantes) numas instituições e em outras não. Temos o exemplo do curso de História de uma universidade pública que, devido à disciplina de História de Arte, esteve inacessível, por alguns anos, aos estudantes sem capacidade de visão. O estudante com deficiência que pretenda candidatar-se ao contingente especial para deficientes só o poderá fazer na 1.ª fase do concurso nacional de acesso, para o efeito terá que igualmente realizar as provas de acesso na 1.ª fase, facto que constitui mais um factor de discriminação, dado que, se por qualquer motivo justificável, como por exemplo súbito internamento, o estudante ficar impedido de realizar as provas de acesso nas datas previstas, perde a oportunidade de candidatar-se ao referido contingente, restando-lhe apenas a possibilidade de concorrer ao contingente geral nas fases previstas. 34

Portaria n.º 714-B/2006 de 14 de Junho, Artigo 26.º e Anexo III.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

O contingente especial para deficientes tem sido visto como uma medida reparadora, mercê da qual os estudantes com deficiência são compensados pelas falhas na organização de apoios nos níveis de ensino anteriores, sendo-lhes permitido concorrer a determinados cursos com médias mais baixas (e às vezes consideravelmente mais baixas) comparativamente aos colegas que concorrem pelo contingente geral. Porém, a oportunidade que lhes é concedida no acesso, nestas circunstâncias, poderá contribuir para uma situação de desvantagem na frequência, ou seja, níveis mais baixos em termos de conhecimentos e competências académicas associados à falta de recursos e condições de apoio na instituição de ensino superior, colocá-los-á numa situação menos favorável em termos de desempenho e sucesso académico. Por conseguinte, é importante que os estudantes, antes de efectuarem as suas escolhas, ponderem duas questões fundamentais: por um lado, que condições de apoio são essenciais para que possa ter sucesso académico, e se as instituições às quais pretendem concorrer dispõem dos meios e recursos necessários, por outro, se possuem a capacidade, uma vez concluído o curso, de exercer ou ter as condições necessárias para exercer a profissão a que esse curso está eventualmente ligado. Segundo dados do Gabinete de Acesso da DGES, no ano lectivo de 2005/2006 candidataram-se ao contingente especial 151 estudantes dos quais apenas 108 foram admitidos (Gráfico 3), destes, porém, não foram colocados quatro. GRÁFICO 3 – Pedidos de admissão ao contingente especial para deficientes no ano lectivo de 2005/2006 Pedidos de Admissão Não Admitidos Admitidos 60

9

50 40 Nº de 30 pedidos 20 10

30 50 2 11

2 23

24

0 Auditiva

Motora

Visual

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Outras

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O estudante, mesmo que satisfaça os requisitos que lhe são exigidos para se candidatar pelo contingente especial para deficientes, poderá optar por apresentar a sua candidatura pelo contingente geral, procedimento que tem sido adoptado por alguns estudantes com deficiência ao longo dos últimos anos. Como podemos verificar no Gráfico 4, no ano lectivo de 2004/2005, os que não foram admitidos ao contingente especial, 31 conseguiram colocação no ensino superior através de outro contigente. GRÁFICO 4 – Numero de estudantes colocados através do contingente especial para deficientes no ano lectivo de 2005/2006

Pedidos de Admissão - Colocação no Ensino Superior não admitidos admitidos

140

31

120 100 80 N.º de pedidos 60

104

40 20

12 4

0 não colocados

colocados

Relativamente à frequência, o Decreto-Lei n.º 88/85 de 1 de Abril prevê a aplicação do regime constante no Dec.-Lei n.º 174/7735 de 2 de Maio aos estudantes com deficiência do ensino superior, que estabelece no Artigo n.º 1: Os estudantes portadores de deficiência física ou psíquica, que frequentem os ensinos preparatório e secundário passam a estar sujeitos a um regime especial no que respeita a matrículas, dispensa e tipo de frequência e avaliação de conhecimentos.

Em função da Lei da Autonomia das Universidades, cada instituição goza de autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa, financeira e disciplinar: por conseguinte, cada estabelecimento pode definir a sua própria política de inclusão. Neste domínio, o Estado parece assim transferir a responsabilidade de estabelecer e garantir o direito à educação sob os princípios de igualdade de oportunidades e de participação para as instituições de ensino superior. 35

Revogado pelo Decreto-lei n.º 319/91 de 23 de Agosto.

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No âmbito da autonomia universitária, ao longo dos últimos anos alguns estabelecimentos de ensino superior têm progressivamente estabelecido regulamentação que abarca os direitos dos estudantes com deficiência, em alguns casos induzidos pela reivindicação directa dos estudantes ou pela intervenção das associações estudantis. Assim sendo, são conhecidas instituições do ensino superior que consideram regimes especiais de avaliação nos regulamentos pedagógicos internos36, e outras37, que têm regulamentos específicos ou Estatutos especiais para estudantes com condição de deficiência, onde são abordadas algumas das medidas que devem ser observadas no apoio a este grupo estudantil, nomeadamente quanto à acessibilidade e mobilidade nos espaços comuns, condições de estudo, avaliação e acesso à informação. Ainda, em termos de apoio social, a Lei de Bases para o Financiamento do Ensino Superior38 estabelece no n.º 4 do Artigo. 20.º sobre a Acção social escolar que devem ser considerados apoios específicos a conceder a estudantes portadores de deficiência. A atribuição de apoios específicos ao estudante com deficiência está dependente do critério dos serviços de Acção Social de cada instituição, dos recursos disponíveis, e principalmente, da formação e sensibilidade dos técnicos para a condição do estudante. Porém, raramente esses apoios têm sido aplicados na aquisição de equipamentos e aparelhos essenciais aos estudantes no seu percurso académico. Neste caso em concreto, os estudantes são orientados no sentido de recorrerem aos fundos nacionais para financiamento de ajudas técnicas.39 No seguimento das conclusões do Ano Europeu das Pessoas com deficiência, sob o tema Igualdade de oportunidades para as pessoas com deficiência40, e das directivas 36

E, em outros casos atribuição do estatuto de trabalhador estudante aos estudantes com deficiência. Por exemplo, Faculdades de Letras, de Ciências e de Belas Artes da Universidade de Lisboa, Universidade do Minho, do Porto, Trás-os-Montes e Alto Douro, Algarve e Évora, e Instituto Politécnico de Leiria e Porto. 38 Lei 37/2003 de 22 de Agosto. 39 Sobre o assunto consultar Despacho n.º 18 891/2006 de 18 de Setembro de 2006. 40 O Ano Europeu serviria de incentivo para o lançamento de novas medidas políticas e iniciativas da Comissão Europeia para a promoção da igualdade de oportunidades para as pessoas com deficiência e a sua plena integração na sociedade. Deste modo, a Comissão Europeia elaborou um plano de acção plurianual de natureza evolutiva até 2010. A primeira fase deste plano, 2004-2005, concentrou-se na criação de condições necessárias à promoção de emprego das pessoas com deficiência, sendo consideradas como áreas prioritárias o acesso ao emprego e manutenção da vida activa, educação e aprendizagem ao longo da vida, utilização do potencial das novas tecnologias e acessibilidade das áreas públicas edificadas. A segunda fase (2006-2007) privilegia as acções que promovam o direito das pessoas com deficiência a beneficiarem de medidas destinadas a assegurar a sua autonomia, a sua integração 37

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

comunitárias sobre a igualdade de oportunidades das pessoas com deficiência nas áreas do emprego e actividade profissional, no acesso a serviços de apoio e cuidados de qualidade, o Governo português tem vindo a definir diversas estratégias para a defesa dos direitos das pessoas com deficiência e consequente melhoria da sua qualidade de vida, algumas das quais abrangem a melhoria das condições de estudo nos estabelecimentos de ensino superior. Deste modo, em 2003, fixa como prioridade a revisão da Lei de Bases da Reabilitação41, tendo por propósito a formação da consciência colectiva, procurando fomentar um maior envolvimento da sociedade na promoção efectiva de igualdade de oportunidades para as pessoas com deficiência. A nova Lei42, publicada em 2004, designa como princípios fundamentais os da singularidade, da cidadania, da não discriminação, da autonomia, da informação, da participação, da globalidade, da qualidade, do primado da responsabilidade pública, da transversalidade, da cooperação e da solidariedade. A referida Lei enfatiza ainda a responsabilidade do Estado português na execução de um conjunto de medidas que possibilitem à pessoa com deficiência uma cidadania plena, determinando como objectivos da política nacional a: a) Promoção da igualdade de oportunidades, no sentido de que a pessoa com deficiência disponha de condições que permitam a plena participação na sociedade; b) Promoção de oportunidades de educação, formação e trabalho ao longo da vida; c) Promoção do acesso a serviços de apoio; d) Promoção de uma sociedade para todos através da eliminação de barreiras e da adopção de medidas que visem a plena participação da pessoa com deficiência.

Estabelecendo no Artigo 34.º que Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência à educação e ao ensino inclusivo, mediante, nomeadamente, a afectação de recursos e instrumentos adequados à aprendizagem e à comunicação.

social e profissional e a sua participação na vida da comunidade. Nesta fase, são propostas como prioridades o fomentar da actividade, a promoção do acesso a serviços de apoio e cuidados de qualidade, a promoção da acessibilidade a bens e serviços e o aumento da capacidade analítica da EU. (http://europa.eu/scadplus/leg/pt/cha/c11414.htm. Acedido em 10.10.06) 41 Lei 9/89 de 2 de Maio. 42 Lei 38/2004 de 18 de Agosto.

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Em 2006, é revogado o Decreto-Lei n.º 123/1997 de 22 de Maio, que estabelece a obrigatoriedade de os organismos públicos, onde se incluem os estabelecimentos de ensino superior, definirem, num prazo de sete anos, um conjunto de normas técnicas de eliminação de barreiras arquitectónicas visando a melhoria das condições de acessibilidades das pessoas com mobilidade condicionada. Porém, a escassa fiscalização e as coimas de baixo valor previstas contribuíram para o manifesto pouco empenho no seu cumprimento por parte dos estabelecimentos abrangidos. Com a publicação do Decreto-Lei n.º 163/2006 de 8 de Agosto, que revoga o anterior, o Governo procurou corrigir essa situação agravando as sanções pelo seu incumprimento, alargando a aplicação das referidas normas a todos os edifícios de acesso público e habitacional, estando o seu licenciamento dependente do cumprimento do estipulado pela Lei. No mesmo ano é publicada a Lei n.º 46/2006 de 28 de Agosto, que introduz no ordenamento jurídico português a prevenção e proibição da discriminação, directa ou indirecta, em razão da deficiência, sancionando a prática de actos que se traduzam na violação dos direitos fundamentais ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais, culturais ou outros, por pessoas com deficiência ou com risco agravado de saúde43. Esta Lei veio assim colmatar uma lacuna na nossa legislação, visto que a própria Constituição da República, no Artigo 13.º, não contempla a discriminação ou prejuízo com fundamento na condição de deficiência. No âmbito da referida Lei é considerada discriminação directa a que ocorre sempre que uma pessoa com deficiência seja objecto de um tratamento menos favorável que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável (Artigo 2.º, alínea a))

e discriminação indirecta a que ocorre sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutra seja susceptível de colocar pessoas com deficiência numa posição de desvantagem comparativamente com outras pessoas, a não ser que essa disposição, critério ou 43

Conforme a Lei, pessoa com risco agravado de saúde refere-se aquela que sofre de toda e qualquer patologia que determine uma alteração orgânica ou funcional irreversível, de longa duração, evolutiva, potencialmente incapacitante, sem perspectiva de remissão completa e que altere a qualidade de vida do portador a nível físico, mental, emocional, social e eonómico e seja causa potencial de invalidez precoce ou de significativa redução de esperança de vida; (Artigo 3.º, alínea c))

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior prática seja objectivamente justificado por um fim legítimo e que os meios utilizados para o alcançar sejam adequados e necessários (Artigo 2.º, alínea b))

São ainda tidas como práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência, entre outras: 

A recusa de fornecimento ou o impedimento de fruição de bens ou serviços;



A recusa ou o impedimento da utilização e divulgação da língua gestual;



A recusa ou a limitação de acesso a estabelecimentos de ensino, públicos ou privados, assim como a qualquer meio de compensação/apoio adequado às necessidades específicas dos alunos com deficiência;



A constituição de turmas ou a adopção de outras medidas de organização interna nos estabelecimentos de ensino público ou privado, segundo critérios de discriminação em razão da deficiência, salvo se a sua aplicação beneficiar o indivíduo, garantindo a sua actividade em condições de igualdade ou de direitos.



A adopção de prática ou medida por parte de qualquer empresa, entidade, órgão, serviço, funcionário ou agente da administração directa ou indirecta do Estado, das Regiões Autónomas ou das autarquias locais, que condicione ou limite a prática do exercício de qualquer direito;



A adopção de medidas que limitem o acesso às novas tecnologias.

Cabe ao Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência (SNRIPD) acompanhar a aplicação da Lei, elaborar pareceres não vinculativos e apresentar ao Governo um relatório anual sobre os actos discriminatórios e sanções aplicadas, competindo ao Governo, no prazo de 120 dias após a publicação da Lei, tomar as medidas necessárias para o acompanhamento da sua aplicação e determinar as entidades administrativas com competência para a aplicação das coimas previstas pela prática dos actos discriminatórios. Em Julho de 2005, foram aprovadas em Conselho de Ministros, as Grandes Opções do Plano para 2005-2009, onde estão previstas acções e medidas que, sendo postas em prática, constituem um importante contributo para a melhoria das condições de acesso e frequência do acesso ao ensino superior para estudantes com deficiência. Por conseguinte, o Governo português define como uma das estratégias da 2.ª Opção do Plano – Reforçar a Coesão Social, reduzindo a pobreza e Criando mais igualdade de

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

oportunidades: Mais e Melhor Educação – a valorização do ensino superior através, entre outras, da promoção da igualdade de oportunidades no acesso ao ensino superior, melhorando os níveis de frequência e de conclusão dos cursos superiores, atraindo novos públicos, numa lógica de aprendizagem ao longo de toda a vida e melhorando a acção social escolar (p. 29)

Para a prossecução desse objectivo, o Governo propõe, entre outras medidas, promover o aumento do número de gabinetes de apoio ao aluno com necessidades especiais na Rede de Ensino Superior e financiar investimentos na melhoria das infra-estruturas e dos equipamentos, da eficácia do sistema de acção social escolar, do combate ao insucesso escolar e promoção da participação de estudantes em actividades de investigação e formação. Fundamentando-se no Plano de Acção Europeu para a Deficiência (2004-2010) e em outras iniciativa europeias, o Governo publica, em Setembro de 2006, o I Plano de Acção para a Integração das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade para os anos de 2006-2009 (I PAIPDI 2006-2009), onde é definida como estratégia para o ensino superior: Estratégia n.o 2.1, «Educação para todos— Assegurar condições de acesso e de frequência por parte dos alunos com necessidades especiais nos estabelecimentos de educação desde o pré-escolar ao ensino superior»:

Estabelecendo como medidas de prevenção: Compatibilização e unificação da atribuição de ajudas técnicas para alunos no âmbito das estruturas educativas com o sistema supletivo de atribuição e financiamento de ajudas técnicas. Ministérios responsáveis: ME/MTSS/Ministério da Saúde (MS). Prazo de execução: 2007-2008. Elaboração e divulgação de um manual de acolhimento sobre os apoios existentes nas instituições de ensino superior para estudantes com deficiências ou incapacidade, incluindo um código de boas práticas. Ministérios responsáveis: MTSS/MCTES. Prazo de execução: 2006-2007.

E como medida de reparação: Consagração legal de um regime de apoio adequado aos alunos com necessidades especiais que frequentam o ensino superior público e privado. Ministérios responsáveis:

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior MTSS/MCTES. Prazo de execução: 2006-2007.

Em síntese, está estabelecido, pela primeira vez em Portugal, o enquadramento legislativo propício à edificação de um ensino superior mais inclusivo; todavia, não nos parece que no actual contexto político e económico, de grandes transformações internas e cortes orçamentais, seja prioridade dos estabelecimentos de ensino superior o seu cumprimento. Em outros países, como se pode verificar nos exemplos apresentados, medidas semelhantes foram acompanhadas por programas de financiamento aos estabelecimentos de ensino superior como incentivo ao cumprimento do estipulado e publicados guias oficiais, Codes of Practice, de orientação para a implementação dessas medidas. Nos exemplos internacionais referidos constata-se ainda que a implementação de medidas legislativas mais explícitas neste domínio contribuíram para a melhoria das condições de estudo dos estudantes com deficiência, nomeadamente em termos de recursos humanos e tecnológicos, contribuindo ainda para a menção de dados relativos a este grupo estudantil nas estatísticas de educação nacionais. Em Portugal, contrariamente à maioria dos países europeus, e apesar dos avanços legislativos enunciados, continuam a não existir dados estatísticos que permitam conhecer o peso relativo e respectiva participação destes estudantes no contexto do ensino superior. Patrício (2003) afirma que, tal como em outros países da União Europeia, tem-se verificado em Portugal um acréscimo do número de estudantes com deficiência (apresentando igualmente uma maior diversidade e complexidade de situações) a frequentar o ensino superior, devido à implementação de medidas de apoio específicas nos níveis de ensino anterior. De acordo com Cooper (2003), a existência de normativos que especifiquem claramente as condições que as instituições de ensino superior devem proporcionar, para garantir a igualdade de oportunidades no acesso e frequência aos estudantes com deficiência, tem a vantagem de permitir ao estudante recorrer aos tribunais quando se considere discriminado. Porém, da análise a vários processos judiciais movidos por estudantes com deficiência a instituições de ensino superior nos E.U.A., Quinn, (1999, cit. in Cooper, 2003) conclui que a maioria dos casos não foi bem sucedida. O autor aponta dois motivos:

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior First, many students were unable to convince the courts that they were in fact ‘otherwise qualified’ to pursue the course of studies in the relevant programme. Second, the courts were frequently unwilling to accept that particular form of accommodation requested by the students was ‘reasonable’, as its introduction would fundamentally alter the nature of the programme in question. (Cooper, 2003:31)

Assim, por um lado os estudantes terão que provar que possuem as competências mínimas requeridas para o curso que pretendem frequentar e, por outro, as condições requeridas pelo estudante não devem pressupor a redução ao mínimo dos objectivos estipulados pela instituição para o curso em questão. Milani (1996) e Cooper (2003) referem o exemplo de uma estudante com deficiência visual a quem não foi permitido frequentar um curso de psiquiatria44. Em sua defesa, a estudante apoia-se no facto de essa escola ter graduado, em 1976, outro estudante na mesma condição. Porém, o tribunal considerou que as condições que foram requeridas e satisfeitas anteriormente não permitiam à estudante adquirir os requisitos mínimos e experiência médica suficiente exigidos pelo estabelecimento de ensino para obter graduação nessa área. Milani (1996) e Konur (2000) apresentam outro caso45 em que uma instituição de ensino norte-americana negou a admissão ao curso de enfermagem a uma aluna surda, argumentando que a sua limitação auditiva poderia interferir nos cuidados com os doentes. O tribunal fundamenta a sua decisão no facto de a Lei Norte-Americana não colocar qualquer limite à liberdade das instituições em estabelecer pré-requisitos sobre a condição física do candidato para admissão a cursos de saúde. Konur (2000) afirma que este exemplo demonstra que os tribunais basearam as suas decisões no modelo médico, atribuindo maior ênfase à condição física da estudante, tendo concluído daí que as pessoas surdas são incapazes de exercer a carreira de enfermagem, ignorando as suas capacidades e possíveis adaptações do meio que lhes permitissem desempenhar com eficiência a referida função. Milani (1996) refere ainda vários exemplos em que os tribunais norte-americanos consideram que as instituições de ensino superior não violaram a Lei ao não 44

Ohio Civil Rights Commission (Cheryl Fischer vs Case Western Reserve University 1994 (Cooper, 2003). 45 Southeastern Community College V. Davis, 442 U.S. 397 (1979). (http://caselaw.lp.findlaw.com/scripts/getcase.pl?court=US&vol=442&invol=397 [acedido em Dezembro de 2005].

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

providenciar as condições mais adequadas aos estudantes em virtude de estes não terem notificado atempadamente as instituições de ensino da sua condição e respectivos apoios indispensáveis. Da análise destes casos, Konur (2000) conclui que as alterações legislativas não foram suficientes para a mudança das mentalidades subjacentes às decisões anteriores. Fichten (1995 cit. in ACCSEHP, 1999:8) defende a publicação por parte das instituições de ensino superior de políticas de protecção dos direitos dos estudantes com deficiência, classificando a sua ausência como uma forma de discriminação passiva. A autora afirma: Instead of developing new structures or policies on student rights, some administrators urge proceeding on a case-by-case basis. Of course, certain student's needs will always have to be dealt with on an individual basis. In the long run, however, services, facilities and equipment will have to be integrated into the regular service delivery system of the organization.

A autora inclui ainda nessa classificação a atitude de algumas instituições ao justificarem a não criação de condições necessárias à efectiva inserção e participação dos estudantes com deficiência, com base na ausência de recursos financeiros: Here is an example of passive discrimination: a university administrator may say something like this: "Don't encourage 'them' to come here because it is costly to make architectural modifications, provide special services and equipment, and pay the salaries of special service providers and staff. Even just a few students with disabilities will cause new problems, and will disrupt existing routines. The admission criteria of some of our programs will have to be changed. Some curricula will have to be modified. We'd have to move some of the classes from lecture halls that are not accessible to ones that are (Fitchen, 1998:192).

Em síntese, as leis gerais de anti-discriminação dos diversos países são fundamentais para os estudantes com deficiência no ensino superior na obtenção da garantia da igualdade de oportunidades a diferentes níveis. Porém, também ficou patente que os estudantes com deficiência têm de estar conscientes dos seus direitos e deveres para poderem exigir das instituições as condições que lhes são mais favoráveis. Por outro lado, como ficou demonstrado, a ausência de Leis específicas não é impedimento para que as instituições de ensino superior não definam uma política interna explícita sobre os direitos dos estudantes com deficiência nesse estabelecimento de ensino.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

3.1.3. Outra Iniciativas para a defesa de uma política inclusiva no ensino superior Organizações não governamentais têm tido algum peso na elaboração de políticas de inclusão dos estudantes com deficiência nas Universidades, na publicação de informação e na realização de actividades de intercâmbio entre serviços. Vejamos alguns exemplos: 

Skill: National Bureau for Students With Disabilities46, sediado no Reino Unido, desde 1974 procura promover a formação de jovens adultos com deficiência nos diferentes níveis de ensino e a sua inclusão no mercado de trabalho. Esta organização tem também, ao longo dos últimos anos, publicado guias que auxiliam não só os estudantes universitários com deficiência, como todos aqueles que trabalham e se interessam pela problemática.



Canadian Association of Disability Service Providers in Post-Secondary Education (CADSPPE)

47

, fundada em 1998, no Canadá, por profissionais

ligados aos serviços de apoio a estudantes universitários com deficiência, tendo por objectivos: To promote professional development for members. To ensure that the nature of service to students with disabilities across the country develops within the framework of common objectives. − To promote ease of movement across the country, from one institution to another, for students with disabilities. − To benefit from the experience of colleagues and provide mutual support for problem solving. − To develop affiliations with groups who pursue a common purpose. − To encourage the development of research in the field. − −



The Association on Higher Education and Disability (AHEAD)48 (EUA), conceituada

organização

internacional

e

multicultural

constituída

por

profissionais que estão envolvidos no incremento da participação de pessoas com deficiência no ensino superior, tem, desde 1977, promovido inúmeras conferencias, workshops e publicações49, contribuindo assim para a formação e actualização dos profissionais da área e para a melhoria da qualidade de serviços e apoios disponíveis aos estudantes no ensino superior. 46

http://www.skill.org.uk http://www.cadsppe.cacuss.ca/ 48 http://www.ahead.org/ 49 Incluindo The Journal of Postsecondary Education and Disability. 47

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

Por último, ACHIEVE50 (Nova Zelândia), organização com objectivos



semelhantes à anterior mas de menores dimensões, cujos membros podem ser não só profissionais, mas estudantes com deficiência, familiares, universidades e outras instituições de ensino superior. A ACHIEVE desenvolve projectos na área da cooperação entre instituições universitárias da Nova Zelândia, do National Code of Practice e desenvolvimento de Websites. A ACHIEVE constitui ainda um grupo de referência do Ministério da Educação. Iniciativas da Comunidade Europeia como o Forum Européen de l'Orientation Académique

(FEDORA),

HELIOS

II

e

HORIZON

constituíram

marcos

importantíssimos para a promoção da igualdade de oportunidades em diversas áreas, incluindo a do ensino superior. Salienta-se que funciona actualmente no âmbito do FEDORA um grupo de trabalho, Disability & Special Needs, constituído por vários expert no apoio ao estudante e cujas actividades para 2004-2007 estão enunciadas como: 

    

Adopting a definition of principles of compensation for disability and accessibility according to the United Nations Standard Rules on the Equalization of Opportunities for Persons with Disabilities and according to EU regulations and guidelines for best practice; Identifying and disseminating models of best practic; Exchanging information on financial support and regulations in each country Organising conferences on these topics in the different EU member countries and HE institution; Promoting the exchange of staff and students in this field; Presenting their areas of research and special support at FEDORA events especially FEDORA summer universities.

O XI congresso do FEDORA, Professional Challenges: Guidance and Counselling within the European Higher Education Area, decorreu em Outubro de 2006, na Universidade de Vilnius, na Lituânia, contando com a participação de membros de vários países51 e representantes da União Europeia, UNESCO e EUA, tendo, como um dos pontos do programa o tema da integração dos estudantes com deficiência no ensino superior e a sua transição para o mercado de trabalho. Ainda no âmbito da divulgação e discussão de políticas e boas práticas no contexto da inclusão no ensino superior, destacamos a International Conference on Higher 50 51

http://www.achieve.org.nz/welcome.html Não incluiu Portugal.

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Education and disability, organizada pelas Universidades de New Orleans e de Innsbruck, desde 1992, que congrega investigadores na área da educação superior inclusiva, a nível mundial, bem como profissionais que desenvolvem a sua actividade na área dos serviços de apoio a estudantes com deficiência nesse nível de ensino. Em Julho de 2007, terá lugar a 6.ª Conferência subordinada ao tema: Milestone 2007: Sharing International Resources on the Road to Inclusion. Em Espanha, desde 1995, o Real Patronato de Prevención y de Atención a Personas con Minusvalía reúne anualmente os diferentes serviços de apoio a estudantes universitários com necessidades especiais, com o objectivo de debater, trocar experiências e reflectir sobre a situação da diversidade na universidade, em particular, da deficiência, contando inclusivamente com a participação de membros do corpo docente sensíveis a esta questão e representantes de estudantes com deficiência. Em 2005, os referidos encontros anuais passaram de meras reuniões de serviços de apoio universitários, para Congressos Nacionais sobre Universidad y Discapacidad, envolvendo não só os membros já referidos, como também membros ligados à estrutura governamental. Dos trabalhos realizados nesse primeiro congresso sob o tema Universidad y Discapacidad: Cuestiones Actuales, ficou estabelecida a produção, a curto prazo, de um livro Branco da Universidad y Discapacidad, cujo objectivo é dar a conhecer a situação actual dos estudantes com deficiência no contexto universitário e identificar as deficiências e debilidades do sistema na garantia da igualdade de oportunidade no acesso e sucesso de estudantes com deficiência no ensino superior. No II Congresso, sob o título, Adaptar la igualdad, normalizar la diversidad, realizado na Universidade Complutense, em Outubro de 2006, o tema dominante foi o processo de Bolonha, nomeadamente a criação do Espaço Europeu do Ensino Superior e sua influência na legislação específica, na organização dos serviços, nas adaptações curriculares e nos movimentos de pessoas com deficiência na Universidade. O livro branco da Universidad y Discapacidad foi novamente tema de debate. Este tipo de encontros também se realizaram em França mas, neste caso, as instituições contaram com o apoio do Ministério da Educação (Gibert, 2002).

Lília Aguardenteiro Pires

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

Em 2005, o Instituto Internacional para a Educação Superior na América Latina (UNESCO) reuniu em Caracas, Venezuela, no Seminario Regional sobre la Integración de las Personas con Discapacidad en la Educación Superior em América Latina y el Caribe, representantes de diversos países da América Latina e das Caraíbas, para diagnóstico e discussão do acesso de pessoas com deficiência ao ensino superior nesses países52. No final, os participantes comprometeram-se a (i) criar a Red Latinoamericana y del Caribe de Educación Superior para la Inclusión y la Diversidad como espaço estratégico para o intercâmbio de experiências e conhecimentos, a realização de investigações conjuntas, a assessoria e o desenvolvimento de propostas da comunidade universitária Regional; (ii) promover a criação de redes similares em cada um dos países ou contribuir para o fortalecimentos das já existentes; (iii) produzir um plano de acção conjunto que proponha ou reforce o enquadramento legal para a inclusão de pessoas com deficiência no ensino superior; um guia de avaliação das condições de inclusão e acessibilidade e a realização de um programa regional de formação de docentes nas áreas da diversidade, deficiência e direitos humanos; e a compilação e sistematização dos dados estatísticos sobre os estudantes com deficiência em instituições de ensino superior de cada país participante. Assinala-se ainda a existência de grupos de discussão online sobre o tema da inclusão e Universidade, do qual destacamos o grupo promovido pela Universidade de Buffalo, DSSHE-L, que se encontra em funcionamento desde 1993 e conta com a participação de inúmeros profissionais, de vários países, a maioria de língua inglesa, ligados aos serviços de apoio a estudantes universitários com deficiência, constituindo um meio privilegiado para esclarecimento de dúvidas pontuais sobre políticas e organização de recursos, troca de experiências e divulgação de oportunidades de emprego na área. Como podemos constatar, todas estas iniciativas surgiram no início dos anos 90, coincidindo com os movimentos para a promoção de uma educação inclusiva, e demonstram a importância crescente do desenvolvimento de uma políticas mais inclusiva neste nível de ensino.

52

No endereço http://www.iesalc.unesco.org.ve/ [acedido em Novembro de 2006] encontram-se disponíveis os estudos e comunicações apresentados pelos representantes da Bolívia, Brasil, Chile, Costa Rica, Cuba, Equador, Guatemala, Honduras, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

A realidade descrita anteriormente, no entanto, contrasta com a do nosso país. As iniciativas neste domínio, até à actualidade, foram pontuais, algumas das quais promovidas por membros de serviços que desempenham funções em serviços universitários dirigidos ao apoio a este grupo estudantil. Esses mesmos elementos, que se reuniam, desde 1998, para trocar experiências e promover actividades conjuntas, em 2003 tomaram a iniciativa de convidar outros elementos para fazerem parte desse grupo. Por consequência, em Julho de 2004, dez instituições53 de ensino superior assinaram um protocolo de cooperação, no qual se comprometeram a proporcionar nas suas próprias instituições um serviço de melhor qualidade a estudantes com deficiências e promover a aproximação inter-serviços que apoiam estudantes com deficiências, por forma a facilitar a troca de experiências, o desenvolvimento de iniciativas conjuntas e a racionalização de recursos. Estas dez instituições constituíram-se em grupo, entretanto designado de Grupo de Trabalho de Apoio a Estudantes com Deficiência no Ensino Superior (GTAEDES) estabeleceriam, na mesma data, protocolos de cooperação com a Direcção Geral do Ensino Superior e com a Unidade de Missão, Inovação e Conhecimento, dos quais resultaram algumas iniciativas e projectos, como: 

Atribuição de ajudas técnicas aos estudantes com deficiência das instituições cooperantes (em fase de conclusão);



Biblioteca Aberta para o Ensino Superior, cujos principais objectivos são a promoção da produção e acesso a materiais de estudo online e apetrechamento de bibliotecas e centros de produção com tecnologia específica para a acessibilidade (em desenvolvimento);



Diagnóstico: Mapa Nacional dos Serviços de Apoio dos Estudantes com Deficiência do Ensino Superior que pretende (i) o levantamento exaustivo do panorama nacional dos serviços de apoio; (ii) o levantamento da realidade de alguns países de relevo na matéria, (iii) proposta de estratégias políticas futuras concertadas (iniciado);

53

Universidade de Coimbra, Reitoria da Universidade de Lisboa, Universidade do Porto, Universidade Técnica de Lisboa, Universidade de Évora, Universidade do Minho, Universidade de Aveiro, Universidade de Trás-os-Montes, Faculdade de Letras e Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

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Apresentação de medidas de apoio e de um enquadramento legal específico para estudantes com deficiências, na frequência dos estabelecimentos do ensino superior (concluído em 2005 e entregue à DGES);



Organização de um guia sobre os apoios existentes nas instituições de ensino superior nacionais para distribuição aos candidatos ao ensino superior (programado).



Elaboração um código de boas práticas para o apoio ao estudante com deficiências para divulgação junto das instituições de ensino superior (programado).

Apesar do carácter inovador das iniciativas, não podemos deixar de assinalar o pouco interesse manifestado pela Direcção-Geral de Ensino Superior na observância dos compromissos assumidos, nomeadamente no desbloqueamento da verba estabelecida para a atribuição directa de ajudas técnicas aos estudantes com deficiência abrangidos, ficando os mesmos a aguardar mais de um ano para proceder às respectivas compras.

3.2.

As distintas realidades académicas: O acolhimento e atendimento aos estudantes universitários com deficiência em alguns países e em Portugal

3.2.1.

Modelos de atendimento

Como já foi referido no Capítulo 2, aos diferentes modos de abordar a deficiência têm correspondido modelos de intervenção educativos distintos. Recapitulando, o Modelo Médico ou Clínico, centrado exclusivamente no indivíduo e nos seus aspectos biológicos, funcionais e médicos e na intervenção terapêutica, tem subjacente a ideia de que o indivíduo com deficiência apresenta algumas dificuldades em superar as suas limitações e que a sua participação depende, unicamente, do seu esforço de adaptação. No Modelo Social, assume-se o princípio de que a deficiência é o resultado da interacção do indivíduo com a sociedade, sendo o ambiente o responsável pelas limitações individuais. Deste modo, cabe à sociedade empreender as mudanças de atitude do meio envolvente necessárias à plena participação em todas as áreas da vida.

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Swain e French (2000) apresentam o Modelo Afirmativo como uma evolução do Modelo Social, no qual se consideram as pessoas com deficiência como cidadãos participativos que determinam a sua vida, cultura e identidade, afirmam o valor e a validade de viver como pessoa com deficiência. Debruçando-nos sobre o contexto educativo, estas mudanças traduziram-se em perspectivas de actuação distintas. Deste modo, de uma intervenção centrada na condição de deficiência dos alunos, subjacente ao modelo clínico, passa-se para uma intervenção, compreendendo as necessidades especiais do aluno nas suas múltiplas relações e contextos, consubstanciada no modelo social. No contexto do Ensino Superior, Brown et al. (1991) definem dois modelos de atendimento aos estudantes com deficiência: o Traditional Service Delivery Model, consubstanciado no modelo Clínico, e o Student Development model, na linha do Modelo Afirmativo. No modelo “Tradicional”, o técnico que acolhe e acompanha o estudante com deficiência no estabelecimento de ensino, tal como o médico, avalia quais as necessidades do estudante a serem supridas e quais os apoios a receber, centrando assim a sua actuação no indivíduo e no seu “problema”. Neste modelo, o técnico apresenta-se assim como o expert que detém o direito exclusivo do conhecimento, do controlo e da tomada de decisão e, em consequência, é ele quem efectua as diligências necessárias no acesso a bens e serviços conforme se vê Quadro 3: QUADRO 3 – Deveres dos estudantes e profissionais no modelo tradicional

Student x

1. Identify self to Disability Office 2. Determine student's needs. 3. Determine accommodations 4. Assist student to develop independence skills not 5. Inform professor of student's disability 6. Negotiate accommodation methods. 7. Make specific arrangements for accommodations. 8. Participate in the service delivery process as requested. x 9. Take responsibility for the process to be implemented and run smoothly.

DSS Staff x x applicable x x x x x

(In Brown E Clopton 1991)

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Segundo os autores, o estudante sente-se aliviado e agradece, contudo remains the passive recipient of services with the goal being to keep the students dependent on the system but happy (Brown et al. 1991), atitude que o tornará um cidadão mais dependente, revelando maiores dificuldades em tomadas de decisão individuais. No segundo modelo proposto, Student Development model, o técnico que acolhe o estudante partilha o conhecimento, o controlo e a decisão com o estudante. A sua função é promover a confiança e autonomia deste, habilitando-o a tomar decisões, de forma mais autónomo e confiante, de modo a torná-lo num membro activo e participativo na comunidade académica e na sociedade (Brown et al. 1991). The professional is seen as a resource for sharing specialized information and the howto methods of getting things done in a system. The student approaches the professional from an equal position which says in effect, Share your knowledge and expertise with me so that I will be able to develop the skills I need to function more independently

(Brown et al. 1991). Deste modo, o técnico do serviço de apoio na universidade, assumindo o papel de consultor, orienta o estudante nos seus contactos com docentes e serviços com o objectivo de o tornar mais autónomo e responsável pela garantia dos recursos necessários à sua participação em igualdade de oportunidades. Segundo os autores, a opção por uma intervenção mais centrada no modelo tradicional ou no modelo de desenvolvimento do estudante, deve ser tomada tendo em consideração as características individuais de cada estudante (Brown et al. 1991). Deste modo, Brown et al. (1991) afirmam que deve ser prevista uma fase de transição, na qual, algumas decisões são tomadas pelo próprio estudante e outras em parceria com o técnico (conforme Quadro 4), visando a sua maior autonomia (Brown et al. 1991).

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior QUADRO 4 – Deveres dos estudantes e profissionais na fase de transição para o modelo de desenvolvimento do estudante

Student 1. Identify self to Disability Office x 2. Determine student's needs. x 3. Determine accommodations x 4. Assist student to develop independence skills x 5. Inform professor of student's disability x 6. Negotiate accommodation methods. x 7. Make specific arrangements for accommodations. x 8. Participate in the service delivery process as requested. x 9. Take responsibility for the process to be implemented and run smoothly. x x person with primary responsibility o person with support responsibility, as needed

DSS Staff x x x o o o o x

(In Brown et al. 1991)

Van Meter (1993), tendo por base os modelos anteriores, propõe um novo modelo, The Integrated Access Model, em que não existe um serviço especializado para apoiar este grupo estudantil, mas qualquer unidade ou pessoa no estabelecimento de ensino estará habilitada a desempenhar essa função. O autor estabelece as seguintes etapas no processo de mudança de um modelo mais tradicional para o modelo The Integrated Access:    

Work to ensure that educational access to students with disabilities is viewed as the responsibility of the entire college or university, and not just that of one office. Build a community of experts in order to accomplish this more undifferentiated knowledge and sensitivity base. Become politically involved with institutional policymaking and long-range planning decisions, and the effects those decisions might have on members of the campus community who have disabilities. Assist students to become excellent self advocates.

A aplicação deste modelo pressupõe, que os próprios docentes, tal como procedem para com os outros estudantes, providenciem os materiais e exames em formato adequado às necessidades do estudante com deficiência, que o gabinete designado para a atribuição de subsídios aos estudantes conheça os fundos disponíveis para este grupo estudantil e que os laboratórios de informática disponham de equipamento adaptado. Para que a comunidade académica esteja habilitada a responder às necessidades dos estudantes, terá igualmente de receber formação na área, que pode ser veiculada através de workshops ou seminários. Por outro lado, é necessário que a própria instituição reveja as suas políticas e procedimentos, devendo os estudantes com deficiência ser chamados para dar o seu contributo. Por conseguinte, os estudantes devem estar conscientes das

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

implicações da sua condição na vida académica, dos seus direitos e deveres. Esse conhecimento pode ser adquirido, por exemplo, através da partilha de experiências com outros colegas na mesma condição. O’Connor e Watson (1994 cit. in ACCSEHP, 1999) propõem uma categorização semelhante. Para os autores, os modelos de atendimento aos estudantes com deficiência podem ser conceptualizados como um continuum entre specialist e generic, reflectindo assim a dicotomia dos modelos médico/social. O primeiro modelo reconhece a existência de um centro especializado que suporta os estudantes com deficiência, os quais terão de se adaptar ao meio, cabendo ao técnico especialista a responsabilidade de promover as condições mais favoráveis no meio à inserção do estudante. No modelo genérico é esperado que todo o envolvimento seja acessível: todas as estruturas, consoante a sua especialidade são responsáveis por reunir as condições necessárias para atender qualquer estudante, independentemente da sua condição, e o técnico especialista desempenha apenas a função de consultor. ACCSEHP (1999) consideram que o modelo genérico proposto por O’Connor e Watson (1994) é o mais favorável ao estudante, visto que a existência de um serviço específico pode ter uma conotação negativa pouco propícia à inclusão desses alunos, sendo muito mais natural que a resposta a conceder a estes estudantes conste na míriade de tarefas que os serviços gerais para os estudantes executam diariamente. Porém, autores como Wolforth (1998) e Saucier e Gagliano (1998) argumentam que o sucesso do modelo de descentralização de serviços de apoio supõe a existência de profissionais especializados, que forneçam a formação devida aos outros técnicos e docentes, mudança de atitude da comunidade académica relativamente à presença dos estudantes com deficiência e um efectivo conhecimento dos próprios estudantes sobre as suas necessidades de apoio. As mesmas autoras inferem que essas condições são difíceis de alcançar, o que justifica a existência de serviços mais especializados que acautelem o cumprimento da política instituída, tanto pelos docentes, como pelos órgãos e serviços do estabelecimento de ensino.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

Alcantud et al. (2000), na análise às diversas realidades de algumas instituições universitárias da Europa, adoptam a mesma classificação, porém, com um significado diferente. Segundo os autores, os serviços generales correspondem àqueles que abrangem as necessidades de todos os estudantes com deficiência, e que, com acções dirigidas a esse grupo, proporcionam também melhores condições a todos os estudantes. Os serviços específicos correspondem àqueles que se especializaram no apoio a um tipo concreto de deficiência. Alcantud et al. (2000) dão como exemplo a Universidade de Bristol, que se tem especializado no domínio da investigação na área da deficiência auditiva, e as Universidades de Lion e de Viena, na produção de tecnologia específica à deficiência visual54. Alcantud et al. (2000), visando no estudo que realizaram identificaram outras iniciativas de pôr em prática o princípio da igualdade de oportunidades neste contexto, umas apoiadas pelo Governo Central, outras de iniciativa da própria instituição, algumas das quais com a colaboração de associações representativas de grupos de pessoas com deficiência. São elas: 

Edição de guias sobre os Serviço de Apoio disponíveis nas universidades dos países, apenas em França, Reino Unido, Alemanha e Holanda. A European Agency for Development in Special Needs Education55, mantém em actualização uma base de dados – HEAG database56 - onde estão registados os Serviços de Apoio aos Estudantes com Deficiência de pelo menos 17 países europeus e cujo objectivo é ajudar os estudantes e professores a considerarem a possibilidade de intercâmbio com outros países. A referida base é mantida pela Universidade Católica de Lovaina (Bélgica).



A existência de um coordenador para estudantes com deficiência em cada universidade. Segundo Alcantud et al. (2000), a Alemanha foi pioneira em adoptar esta iniciativa (1986), seguindo-se a França57 (1990), a Suécia (1993) e a Áustria (1997).

54

Neste domínio não podemos deixar de destacar o trabalho desenvolvido pela Unidad de Investigación Acceso da Universidade de Valência, dirigido pelo próprio Francisco Alcantud Marìn. (http://acceso.uv.es/Cas/Presentacion.htm) 55 http://www.european-agency.org 56 http://www.european-agency.org/heag/index.html 57 Handi-u – Liste Responsables de l'accueil des étudiants handicapés http://195.83.249.62/handiU/annuR/fann.htm

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financiamento específico às universidades que acolhem estudantes com deficiência, a fim de custear o apoio especifico, adoptado pelo Governo local da Suécia e Bélgica58.



A existência de legislação específica sobre a integração de pessoas com deficiência, já referidas no capítulo anterior e, segundo Alcantud et al. (2000), adoptadas pelos países com tradição em legislação no âmbito da integração das pessoas com deficiência, nomeadamente, Alemanha, França, Áustria e Reino Unido.

Portugal, apesar de não ter sido um dos países objecto da análise de Alcantud et al. (2000), dispõe, em algumas instituições de ensino superior, de estruturas e princípios orientadores neste domínio. No contexto nacional, o acolhimento e o acompanhamento de estudantes com deficiência no ensino superior são estabelecidos por Serviços de Apoio específicos59, por serviços, gabinetes ou núcleos de apoio ao estudante60, ou, ainda, por comissões de acompanhamento organizadas pelos Conselhos Directivos ou Pedagógicos61. Os apoios e as medidas estabelecidos, na maioria dos casos são definidos em função das necessidades individuais dos estudantes admitidos. Os Serviços de Acção Social em diversas instituições de ensino superior público desempenham igualmente um papel importantíssimo na concessão de subsídios e apoios específicos aos estudantes com deficiência, embora limitada em função dos orçamentos disponíveis. Outros estabelecimentos de ensino dispõem de centros de investigação na área das tecnologias e serviços para pessoas com deficiência que apoiam tanto os estudantes da instituição como a comunidade local62. No âmbito do programa HELIOS II, o grupo temático 13, constituído por dezanove parceiros de doze Estados-membros, elaborou o documento: Ensino Superior e Estudantes Deficientes: Para uma Políticas Europeia de Integração (Helios II, 1996), onde se afirma a responsabilidade dos estabelecimentos de ensino superior na definição 58

No nosso estudo identificamos iniciativa semelhante no Reino Unido e Canadá. Ex. Universidades do Minho, Porto e Coimbra. 60 Ex. Faculdade de Letras e de Ciências da Universidade de Lisboa, Universidade de Évora. 61 Ex. Faculdade de Ciências e Belas-Artes da Universidade de Lisboa, Instituto Politécnico do Porto. 62 Ex: Universidade de Trás-os-Montes - CERTIC e Escola Superior de Educação do Porto - Núcleo de Apoio à Inclusão Digital. 59

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de politicas institucionais que consagrem medidas relativas à inclusão de estudantes com deficiência e que assegurem melhores: 

Condições de vida académica: acolhimento e informação, mobilidade e acessibilidade aos locais de estudo, alojamento, serviços de restauração e transporte adequados, acompanhamento personalizado quando imprescindível, acesso à prática desportiva, à cultura e tempos livres e ao apoio social;



Condições de estudo: acompanhamento e apoio na transição de nível de ensino e organização de estudos, materiais didácticos em formato adequado a cada indivíduo, ajudas técnicas apropriadas, tutória, diversidade de modelos de avaliação, centros de documentação apetrechados tecnicamente, formação ao nível das tecnologias;



Condições de transição para a vida social e/ou profissional: acesso a informação, documentação e actividades de ajuda à inserção profissional.

Para o efeito, é expresso no documento que os estabelecimentos de ensino superior devem igualmente de dotar-se de uma estrutura de acolhimento, informação e acompanhamento destinadas aos estudantes com deficiência que intervenham nos três domínios do percurso académico dos estudantes: transição para o ensino superior, frequência do ensino superior e transição para a vida activa. Da análise efectuada a vários sites de serviços/estruturas de apoio de alguns estabelecimentos de ensino superior de diferentes países verifica-se que a maioria restringe a sua actuação à frequência no ensino superior. Os que prestam alguma atenção à fase de transição para o ensino superior disponibilizam informação sobre as condições específicas de apoio existentes no site da instituição ou em guias para todos os estudantes ou específicos para estudantes com deficiência. Outros, em colaboração com os serviços gerais, promovem o designado dia aberto, durante o qual é proporcionada aos estudantes em geral uma visita à Universidade. Durante este dia os estudantes com deficiência poderão contactar com a realidade e procurar antecipadamente identificar algumas dificuldades com que possam vir a confrontar-se.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

Alguns serviços de apoio a estudantes com deficiência têm a preocupação de organizar e distribuir informação específica junto dos estudantes com deficiência que pretendam preparar-se para se candidatar ao ensino superior. Essa prática é corrente em universidades dos EUA e do Reino Unido. Ao nível da frequência do ensino superior, verificámos que os Serviços de Apoio fazem incidir a sua actividade sobre: (i)

a orientação dos estudantes na negociação de apoios junto do corpo docente e administrativo, assumindo muitas vezes o papel de intermediário;

(ii)

o

encaminhamento

dos

estudantes

para

outras

instituições

que

disponibilizam alguns serviços nas áreas, como por exemplo, transporte adaptado, atribuição de subsídios63, produção de textos em suporte especial (gravado, em Braille, ampliado, relevo), apoio de assistentes para actividades específicas como intérprete de língua gestual, apoio à mobilidade, apoio de laboratório, etc.; (iii)

o domínio da acessibilidade, accionando os meios possíveis para a eliminação de barreiras que possam prevalecer no estabelecimento de ensino, tanto em termos físicos e arquitectónicos como de acesso à informação veiculada

pela

instituição,

ou

disponibilizada

pelos

centros

de

documentação, contribuindo ainda, em algumas instituições, para o acesso a equipamento específico, como por exemplo sistemas de som, equipamento e programas informáticos específicos, sistemas de iluminação, etc.; (iv)

a informação, sensibilização e formação de docentes e funcionários nos domínios das estratégias de ensino-aprendizagem e das especificidades de cada deficiência ou doença e respectivas repercussões na vida académica do estudante.

Os estudantes com deficiência podem ainda recorrer aos serviços para formação específica em orientação e mobilidade (essenciais nos primeiros meses de permanência na instituição) e formação ao nível das novas tecnologias. Também neste caso, a maioria dos Serviços recorre a prestação de serviços de outras entidades. 63

Que poderão ser fundamentais para o pagamento de serviços de transporte adaptado e de assistência em actividades académicas e pessoais, bem como, para a aquisição de equipamento essencial à sua actividade académica.

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior

Ao nível da transição para a vida activa, alguns serviços de apoio orientam os estudantes com deficiência para técnicos ou serviços especializados na área das próprias instituições ou para instituições que promovem programas específicos de promoção de emprego para pessoas com deficiência; outros, reúnem e distribuem informação que possibilite uma procura de emprego autónoma. Os técnicos que estão adstritos ao atendimento dos estudantes com deficiência, nos serviços especializados ou gerais, possuem na maioria formação muito diversa que se traduz em práticas distintas (ACCSEHP, 1999; Parker, 1999; Rubio, 2003), o que tem motivado, em alguns países como os EUA, o Reino Unido, a França e a Espanha, o desenvolvimento de algumas iniciativas de formação promovidas por organismos públicos ou por associações não governamentais, e a publicação de códigos de ética em países como o Reino Unido, a Austrália e os EUA (Parker, 1999).

3.2.2. Apoios educativos no contexto do ensino superior Muitos dos estudantes com deficiência que estão inscritos no ensino superior usufruíram nos níveis de ensino anteriores, ao abrigo da legislação em vigor, de apoios educativos que se traduziram, em alguns casos, em adaptações curriculares, adaptações materiais, equipamentos especiais de compensação, condições especiais de matrícula, condições especiais de frequência, condições especiais de avaliação, adequação na organização de classes ou turmas e apoio pedagógico acrescido. Ao chegaram a este novo patamar educativo, os estudantes ficam na expectativa de que lhes sejam reconhecidas as suas necessidades individuais e o seu potencial e, consequentemente, garantidas as condições que propiciem as mesmas oportunidades educativas. A realidade com que se irão confrontar é todavia bem diferente. Para Rodrigues (1999:16), a universidade identifica-se frequentemente com uma imagem de reserva intelectual, opinião partilhada por Sánchez (2000), que afirma que las características que rodean a la enseñanza universitaria suele ser bastante selectiva y academicista. Neste contexto, as adaptações ao currículo universitário nem sempre são bem aceites, suscitando algumas dúvidas e controvérsias. Na opinião de Rodrigues

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Políticas de Inclusão no Ensino Superior a organização clara do âmbito, dos objectivos, dos conteúdos, da avaliação e da bibliografia da disciplina […] pode constituir um obstáculo para a diversificação de oportunidades de aprendizagem e de avaliação que os estudantes com NE podem solicitar (1999:14).

Segundo o Decreto-Lei n.º 319/91 de 23 de Agosto, no art. 5.º n.º2, consideram-se adaptações curriculares todas aquelas que não prejudicam o cumprimento dos objectivos gerais dos ciclos e níveis de ensino frequentados e só são aplicáveis quando se verifique que o recurso a equipamentos especiais de compensação não é suficiente.

Sánchez (2000) considera que o conceito de adaptação curricular deve ser entendido como uma estratégia de planificação e actuação docente que procura responder às necessidades de formação que determinados estudantes apresentam. No contexto do ensino superior, muitos professores questionam-se sobre que tipo de adaptações curriculares devem ser consideradas, quais são os estudantes que delas devem usufruir e, em muitos casos, se estas não supõem baixar os níveis de exigência. Por outro lado, o Decreto-Lei n.º 219/ 91 de 23 de Agosto aparentemente não se aplica ao ensino superior e, na ausência de disposições legais específicas para este contexto educativo, alguns docentes consideram que os estudantes com deficiência terão de responder ao plano curricular comum. Sánchez (2000) e Ouellett (2004) argumentam que o que se pretende, ao proceder a determinadas adaptações curriculares, não é baixar os níveis de exigência, mas adequar o processo de ensino-aprendizagem às condições individuais dos estudantes com deficiência tendo em vista os objectivos gerais do curso ou unidade curricular. Segundo Sánchez (2000), as alterações, modificações ou transformações podem ocorrer tanto ao nível do acesso ao currículo (não significativas) como ao nível dos elementos básicos do currículo (significativas). As adaptações de acesso ao currículo são as mais frequentes no âmbito do ensino superior, dado que não põe em causa os conteúdos e objectivos dos cursos, ou seja, não implicam nenhum tipo de alteração significativa ao nível dos elementos do currículo considerados básicos ou essenciais (Alcantud et al, 2000; Sánchez, 2000).

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Sánchez (2000) considera que as adaptações ao nível do acesso ao currículo podem ter lugar ao: 

nível pessoal – o qual engloba recursos humanos (intérpretes de língua gestual, técnico de mobilidade, pessoas que prestem cuidados de saúde, higiene e outras actividades de vida diária, técnico tiflotécnico, voluntários, etc.) e a modificação da atitude dos diferentes elementos da comunidade perante as dificuldades e potencialidades dos estudantes com necessidades especiais.



nível do espaço – abrangendo a melhoria e adequação de condições de acesso aos edifícios e salas de aula, a sonorização e iluminação dos diversos locais onde os estudantes se movimentam e a previsão de lugares reservados nos parques de estacionamento e nas salas de aula que permitam uma melhor audição e visão;



nível dos materiais – a adaptação do mobiliário e a concessão de ajudas técnicas para a mobilidade, visão e audição, de maneira a favorecer o processo de ensino-aprendizagem,

a

mobilidade

e

autonomia

desses

estudantes.

Proporcionar previamente a documentação em suporte adequado (textos com uma compreensão adequada aos estudantes surdos, textos em Braille ou digitalizados, etc.); 

nível da comunicação – permitir e fomentar a utilização de sistemas aumentativos e alternativos de comunicação.

Em termos de adaptações aos elementos básicos do currículo, a autora considera que se deve equacionar o quê, quando e como se ensina e avalia. Por conseguinte, refere que se devem prever adaptações quanto: 

à adequação de conteúdos, procedimentos e instrumentos de avaliação (e dá o exemplo da adequação dos instrumentos de avaliação para surdos, em que, num exame, as perguntas de desenvolvimento podem ser substituídas por perguntas do tipo teste de resposta múltipla);



ao tempo para a adequação de determinados objectivos (fundamental para aqueles que não tiveram acesso atempado à informação essencial para os atingir);



eliminação de conteúdos e deprocedimentos de avaliação. (antes de tomar qualquer decisão a esse nível, a autora sugere que o docente considere, por um

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lado, o interesse e a motivação do aluno para área em questão, dado que as motivações do aluno superam, em muitos casos, as dificuldade que este tem em aceder aos conteúdos específicos, por outro, a sua importância para o acesso a outras aprendizagens e implicações em termos socio-laborais). Em relação ao como avaliar, a autora sugere uma série de estratégias como a promoção da inter-ajuda ou do trabalho em grupo com colegas (onde destaca o papel importantíssimo do voluntariado); a introdução de métodos e técnicas de ensino ajustadas às necessidades dos estudantes; a introdução de actividades individuais, alternativas ou complementares para alcançar os objectivos comuns, e a eliminação de actividades que por, natureza das mesmas, o estudante esteja impossibilitado de executar ou em que não possa ter uma participação activa e real. Tradicionalmente, em qualquer nível de ensino, o currículo geral é elaborado com os mesmos objectivos para todos os alunos, independentemente das diferenças económicas, sociais e culturais e das suas condições físicas, intelectuais e emocionais. No entanto, para que o aluno possa acompanhar o currículo, a escola tem de oferecer condições adequadas e estimulantes, por conseguinte, É necessário analisar com mais profundidade as componentes do currículo e estabelecer quais os elementos que devem ser comuns a todos os alunos e que elementos têm necessidade de ser modificados para responder às necessidades de alunos com mais problemas de aprendizagem (Marchesi, 1997:197).

Este tipo de adaptações é prática corrente nos ensinos básico e secundário, porém, a sua aplicação no contexto do ensino superior tem suscitado alguma controvérsia (Wray 2003). Para muitos docentes universitários, o cerne da questão encontra-se exactamente no facto de, eliminando conteúdos ou dispensando os estudantes de algumas das actividades, se poder condicionar o cumprimento dos objectivos gerais. O ensino superior não é um ensino obrigatório, é o meio pelo qual os estudantes têm acesso aos níveis mais elevados de conhecimento e competência profissional, cabendo às instituições universitárias a responsabilidade social de formar profissionais competentes nos diferentes domínios (Alcantud et al., 2000; Sánchez, 2000; Sharp e Earle, 2000). Deste modo, para garantir a qualidade da formação profissional, as

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adaptações curriculares significativas no ensino superior não devem comprometer a eliminação ou substituição de conteúdos que não sejam fundamentais para a qualificação ou desempenho profissional (Lourtie, 1999). Assim, no contexto do ensino superior, Ouellett (2004) e Pliner e Johnson (2004), defendem que devem ser ponderados as componentes essenciais dos cursos ou áreas curriculares perante as quais todos os estudantes, com ou sem necessidades educativas especiais, têm de demonstrar um determinado nível de proficiência, ou seja, deve ser questionado, no geral, o que se pretende que o estudante aprenda (principais conteúdos, princípios, conceitos), o que deve estar apto a produzir (competência académica), que atitudes e valores deve desenvolver e que níveis de competência deve evidenciar no final do curso. A instituição e os docentes devem providenciar todos os meios e recursos que permitam aos estudantes responder em função desses parâmetros. No desenvolvimento do currículo devem ainda ser considerados os princípios da amplitude e flexibilidade (Koliadisi, 1994; Rodrigues, 1995), ou seja, deve haver uma aproximação entre os objectivos desejados e as capacidades de adaptação e motivação do indivíduo: Os alunos não têm de se adaptar ao currículo – o currículo é que deve ser adaptado às aptidões e às capacidades dos alunos (Hausotter, 1994). Deste modo, a diferenciação curricular pode acontecer em ambientes de aprendizagem diversificados, como o grande grupo, o grupo de nível, o grupo de projecto e o estudo individual (Rodrigues, 2001). Neste âmbito, a orientação incluída no Processo de Bolonha relativa à flexibilização da estrutura curricular é um bom contributo, visto que, por um lado, possibilitará ao estudante com deficiência construir o seu próprio perfil de formação, seleccionando as unidades curriculares do seu interesse e para as quais considere reunir condições mais favoráveis para um bom desempenho e respectivo sucesso académico, por outro lado, impõe novas formas de trabalho, como projecto, trabalho de campo, estudo individual e processos de avaliação diferenciada. Sharp e Earle (2000) e Earle e Sharp (2000) analisaram o tipo de avaliação concedida aos estudantes com deficiência relacionando-a com a qualificação profissional, concluíram que os modelos de avaliação para estudantes com deficiência vulgarizados nas instituições de ensino superior, são inapropriados e pouco sensatos, constituindo

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apenas um meio de compensação natural, convergindo na violação do princípio da igualdade de oportunidades para todos os estudantes, por não permitir avaliar os mesmos níveis de conhecimento e competências exigidos aos outros estudantes. the use of alternative assessments is compensatory in nature and, as a result, ultimately threatens to subvert the equality of opportunity it aims to provide … thus it violates the principles of assessment and undermines the validity of assessment in higher education (Sharp e Earle, 2000:191).

Konur (2002) contraria as autoras alegando, por um lado, e com base em vários outros estudos sobre os modelos de avaliação concedidos aos estudantes com deficiência, que é possível providenciar meios alternativos que permitam avaliar esses estudantes segundo os mesmos critérios definidos para os outros colegas, por outro, que existe um conflito entre os argumentos das autoras, entre os quais o de que não se devem equacionar meios alternativos de avaliação para este grupo estudantil relativamente aos normativos legais actualmente em vigor no Reino Unido (SENDA, 2001). Considerando a posição dos docentes nesta matéria, é frequente nas nossas instituições de ensino superior encontrar docentes que optam por dispensar os estudantes com deficiência de muita da bibliografia obrigatória, possibilitando-lhes uma avaliação de compensação, sem confirmarem se estes procederam às diligências necessárias para obter a documentação exigida em adequado à sua condição, ou então, agem de modo semelhante ao relatado por Rodrigues (1999:9): Um professor universitário, meu colega, dizia-me uma vez que tinha alunos com deficiências motoras nas suas aulas e que a sua reacção era de enorme embaraço sobre as formas de se relacionar, ensinar e avaliar estes alunos. Optava assim por passar estes alunos, baixando – escandalosamente na opinião dos restantes alunos –, as exigências da avaliação. Assim, tinha a certeza que não os voltaria a ver nas suas aulas.

Esta atitude tem muitas vezes subjacente o estigma de que os estudantes com condição de deficiência têm níveis de rendimento inferiores aos demais estudantes. Todavia, em alguns casos, são os próprios estudantes que alimentam esse comportamento, deixandose iludir pelas facilidades concedidas pelos docentes, acomodando-se perante uma avaliação menos rigorosa. Segundo Alcantud et al. (2000), a responsabilidade de definir as adaptações curriculares não deve recair exclusivamente no docente que, na maioria dos casos, não tem formação

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específica sobre as características individuais do estudante e das suas potencialidades, nem conhecimento de outras experiências a nível nacional e internacional, devendo essa responsabilidade ser partilhada com os técnicos da instituição especializados na matéria, caso existam, ou com outros docentes com especialização na área e organizações especializadas na matéria. Em suma, é essencial que os docentes reflictam sobre a sua experiência, percepções e valores relativamente aos estudantes com deficiência e estratégias pedagógicas. Segundo Rodrigues, a inclusão de estudantes com deficiência constitui um desafio tanto para as instituições como para os docentes, de modo que, a presença destes estudantes estimula a reflexão sobre os conteúdos, as metodologias, o sucesso do ensino e da aprendizagem feitas na universidade. Desta reflexão podem beneficiar muitas outras pessoas: os docentes que podem diferenciar as suas práticas docentes, os alunos com dificuldades, mesmo sem deficiências identificadas, e os restantes alunos, que poderão, com metodologias adequadas de individualização, progredir ao ritmo e à dimensão das suas capacidades. (Rodrigues, 1999:16)

A ideia de pedagogia universal defendida pelos autores tem subjacente o conceito de Desenho Universal, inicialmente proposto no domínio da acessibilidade física e arquitectónica e adaptado à educação no âmbito do paradigma da educação inclusiva (Wray, 2003; Campbel, 2004; Pliner e Johnson, 2004; Ouellett, 2004). Este conceito subentende, em termos gerais, um conjunto de metodologias e práticas que visam a inclusão e a não discriminação através da concepção de espaços, produtos e serviços, flexivos, consistentes, acessíveis e sustentáveis, que possam ser utilizados por um maior número de pessoas possível, independentemente das suas capacidades; ou seja, supõe que ao criar condições mais favoráveis para as pessoas com necessidades especiais se estão a criar melhores condições para todos. No âmbito do ensino superior, Campbell (2004), Ouellett (2004) e Pliner e Johnson (2004) associam o conceito de Desenho Universal ao conceito de Universal Instructional Design ou Universal Design for Learning, designando-o como: a method of designing course materials, content, and instruction to benefit all learning styles. The principles of Universal Instructional Design promote equal access to learning for students from a variety of backgrounds, abilities, and learning styles. UID encourages a range of instructional methods, evaluation methods, and technology to remove barriers to education while maintaining high academic standards.

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Em suma, o objectivo primordial do Universal Instructional Design é que os curricula dos cursos incluam alternativas que assegurem a todos os estudantes as condições que melhor se adequam ao seu perfil, o que não quer dizer que para cada estudante se tenha de estabelecer uma metodologia diferente, mas antes, se equacionem metodologias de ensino-aprendizagem e de avaliação diferenciadas que permitam a qualquer estudante demonstrar os seus conhecimentos, capacidades e competências e, por consequência, cumprir os objectivos estabelecidos. Wray (2003), Campbell (2004) e Ouellett (2004) fazem alusão a instrumentos desenvolvidos para apoiar os docentes e instituições a superar o desafio de proporcionarem curricula mais inclusivos. Wray (2003) menciona a existência de algumas iniciativas nessa área abrangendo apenas as adaptações curriculares para estudantes com deficiência, nomeadamente o South West Academic Network for Disability Support (SWANDS)64, no Reino Unido, coordenado pela Universidade de Plymouth, e o Teachability Project65, na Escócia, coordenado pela Universidade de Strathclyde. Ambos os projectos são financiados pelos governos locais e abordam os temas da organização curricular, avaliação e recursos elarning. Ouellett (2004) faz igualmente referência a iniciativas semelhantes, porém, umas mais generalistas, como por exemplo o Center for Applied Special Technology (CAST)66, outras promovidas por instituições de ensino superior norte-americanas que abordam apenas as questões relacionadas com os estudantes com deficiência, como por exemplo o projecto Curriculum Transformation and Disability, desenvolvido pela Universidade de Minnesota67.

64

Para mais informação consultar Waterfield, J., & West, B. (Eds.). (2002). SENDA Compliance in Higher Education: South West Academic Network for Disability Support (SWANDS): University of Plymouth. também disponível em: http://www.plymouth.ac.uk/pages/view.asp?page=3243 [acedido em Março de 2004] 65 Idem, Simpson, A. E. (2000). Teachability Project: Creating an Accessible Curriculum for Students with Disabilities. Glasgow: University of Strathclyde. Também disponível em: http://www.teachability.strath.ac.uk/original/downloads/teachability.doc [acedido em Março de 2004] 66 http://www.cast.org/ 67 Concluído em Julho de 2003 e do qual resultou a publicação Curriculum Transformation and Disability Workshop Facilitator's Guide (http://www.gen.umn.edu/research/CTAD/guide/ facilitators_guide.pdf) . Para mais informação sobre o Universal Instructional Design da mesma instituição consultar http://ds.umn.edu/faculty/applyingUID.html

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Segundo Campbell (2004), neste contexto, as ajudas técnicas que favorecem a inclusão de pessoas com necessidades especiais relacionadas com as tecnologias da comunicação e informação, como por exemplo programas e equipamento informático, assumem um papel fundamental. Apresentemos alguns exemplos identificados por vários autores, relacionando-os com os benefícios que o seu uso pode proporcionar a determinados grupos de estudantes com deficiência. No caso dos estudantes com deficiência auditiva, sem a autorização e colaboração dos docentes para o uso de aparelhos FM, a sua permanência na sala de aula torna-se muito desgastante e desmotivadora. Ainda no caso dos estudantes surdos, que recorrem à leitura labial, acompanhar e entender o discurso do professor torna-se complicado quando este se desloca com frequência de lugar ou fala enquanto escreve no quadro. Perante esta vicissitude, há docentes na Universidade de Valencia (Espanha) que permitem a projecção da sua imagem numa tela, utilizando outra para a projecção dos seus dispositivos. Apesar disso, os estudantes ainda permanecem em desvantagem, dado que são obrigados a repartir a sua atenção ora para a imagem do professor, ora para o caderno, para tirar notas (Alcantud et al., 2000a). Nesta situação, normalmente os estudantes acabam por recorrer aos apontamentos dos colegas ou à gravação da aula68. Nesta situação é habitual, em algumas instituições de ensino superior, recorrerem ao serviço de voluntários formando-os para tirar notas69 em aula. Segundo Zenteno (2000), este trabalho poderá ser feito de um modo artesanal, ou então, recorrendo a computadores portáteis. Em 1998, a Universidade Saint Mary’s (Canadá), em colaboração com a IBM, lançou o projecto Liberated Learning70 com o objectivo de proporcionar melhores condições aos estudantes surdos. Liberated Learning é uma aplicação que por meio do sistema de reconhecimento de voz, transforma o discurso do docente em texto visível em tempo real. Posteriormente o texto é corrigido71 e é disponibilizado aos estudantes (com ou sem condição de deficiência) que o solicitarem. Actualmente este projecto encontra-se 68

Normalmente são familiares ou amigos que efectuam a sua passagem para papel. Também designados por “secretários”. 70 http://www.liberatedlearning.com 71 Actualmente os sistemas de reconhecimento de voz não introduzem automaticamente a pontuação e formatações de texto. 69

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numa terceira fase e conta com a colaboração de outras instituições do Canadá, GrãBretanha, E.U.A. e Austrália. Com o Liberated Learning os estudantes com deficiência visual também podem dispor dos conteúdos das aulas em formato digital ou em Braille, poupando-lhes assim o trabalho moroso e árduo de “desgravarem” horas de aulas em cassete. Apesar dos avanços deste sistema, os estudantes com deficiência auditiva podem sentir dificuldades em participar nas aulas. Para colmatar essa dificuldade, na Universidade Concordia (Canadá) é utilizado um sistema chamado C-note que permite a divisão do ecrã em dois sectores de tal forma que o estudante e secretário poderão estabelecer comunicação entre si, possibilitando ao estudante a oportunidade de participar nas discussões e debates que eventualmente ocorram na aula (Zenteno, 2000). Para os estudantes com deficiência auditiva, os problemas de acesso à informação não se colocam tanto em termos de acesso à informação escrita, mas na compreensão dessa informação (Alcantud, 2000a). Alguns dispositivos e sistemas alternativos como programas de fala, voz, vocabulário, labioleitura e compreensão-expressão, podem ajudar os estudantes surdos a melhorar as suas competências linguísticas. LEECOM e Simicole-200272 são programas desenvolvidos pela unidade de investigação ACCESO da Universidade de Valencia, exemplos da aplicação da língua gestual para o desenvolvimento de conhecimentos linguísticos. LEECOM é um programa estruturado em duas fases: a primeira prevê actividades em grupo, de modo a ensinar, praticar e consolidar estratégias para compreender, seleccionar e estruturar as ideias principais dos textos; a segunda consiste na aplicação do programa Simicole-2002. Este programa contém 30 textos relativos a 10 temas (Ócio e tempos livres, meios de comunicação, o mar, a ciência, a ecologia, política e economia, a mulher, Valencia, a saúde e Universidade) que se distribuem por três níveis de dificuldade à razão de 10 textos por nível. O estudante vai progredindo em função dos resultados alcançados nos aspectos léxico-semânticos, morfo-sintácticos e aspectos relativos à compreensão do texto (Manchón, 2002). Os estudantes com deficiências físicas ou motoras constituem mais um dos grupos de estudantes que podem usufruir de dispositivos ou sistemas que lhes permitam uma

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http://acceso.uv.es/simicole

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maior autonomia e oportunidade de participarem na vida académica. Sempre que não lhes seja possível aceder de modo tradicional ao computador, é possível utilizar dispositivos alternativos diversificados, como por exemplo: •

o teclado normal – que pode sofrer alterações que permitem, por exemplo, através de coberturas ou grelhas, alcançar e a digitar a tecla pretendida evitando o carregar em duas ou mais teclas em simultâneo.



Teclado especial – de dois tipos: fixo (com teclas maiores e/ou com espaçamentos maiores entre teclas) útil a pessoas com movimentos imprecisos; programável ou configurável (com teclas reduzidas, ou com um número de teclas inferior ao normal, podendo ser associado a cada tecla uma função específica), necessário a pessoas que não têm a capacidade ou força para controlar toda a área do teclado vulgar.



Dispositivos apontadores – baseados no controlo de um cursor que se movimenta no ecrã. Podem ser análogos ao rato ou joystick e trackball73.



Sistemas especiais – que consistem em transmissores que emitem um sinal que é retransmitido (ultra-som) ou reflectido (infravermelhos) por um dispositivo situado na cabeça do utilizador (capacete, bola adesiva de material reflector posicionada na testa ou módulo colocado na armação dos óculos).



Interface de voz – sistemas de reconhecimento de voz que permitem a execução de comandos de voz.

Há ainda o caso de estudantes que, por problemas motores severos74 ou doença crónica grave, estão forçados a internamentos prolongados ou mesmo a ficarem retidos em casa. O projecto Teleaula75 desenvolvido pelo CANTIC, alargado ao contexto do ensino superior, permitiria reduzir o distanciamento entre o estudante e o estabelecimento de ensino superior, com eventuais resultados positivos tanto ao nível académico, como a nível pessoal.

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Consiste numa base fixa, onde se insere uma bola que faz o cursor mexer. (Queirós, 2001). Motivados, por exemplo por acidentes de viação. 75 O projecto teleaula tem por objectivo “possibilitar que crianças e/ou jovens com doenças crónicas graves impedidas de se deslocarem à escola, possam continuar a sua escolaridade acompanhando aulas à distância, em casa ou no hospital, através da utilização de sistemas de videoconferência".(Cordeiro, 2000). 74

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Ainda em relação aos estudantes com problemas de controlo de movimentos dos membros superiores, os sistemas de reconhecimento de voz podem ser contributo valioso para a produção de texto escrito individual (Alcantud e Borrás, 1999). Infelizmente, além

destes sistemas ainda não se apresentarem muito adequados à

expressão da língua portuguesa, exigem ao utilizador uma boa dicção, dificultando assim, aos estudantes com problemas de fala, a construção de expressões. Os estudantes com tetraplegia ou paralisia cerebral, ou outros, com dificuldades no controlo dos membros superiores, que apresentam dificuldades em folhear livros, podem ter a ajuda de equipamentos electrónicos desenhados para este propósito, como por exemplo um Folheador Electrónico (passa-páginas), que, no limite, pode se activado por um simples interruptor sensível ao toque, a um movimento, ao som ou a um simples sopro. Apesar das vantagens, este equipamento apresenta algumas limitações dado que nem todos os livros poderão ser manipulados por ele, devido às variações do tamanho, volume e ao próprio material do papel (Godinho et al., 2004). Em relação aos estudantes com deficiência visual, o uso do computador portátil e de bloco de notas Braille permite-lhes tirar apontamentos nas aulas e assim prescindir, em alguns casos, da gravação, como ainda possibilitar-lhes apresentar um trabalho em aula, recorrendo aos mesmos meios de exposição da matéria, como por exemplo o datashow. Por outro lado, os docentes podem disponibilizar aos estudantes os exercícios a serem efectuados nesse dia na aula e a informação dos dispositivos com a matéria usados em aula (slides, transparências, textos de apoio a trabalhar em aula), possibilitando-lhes a oportunidade de participar em igualdade de circunstâncias com os colegas. Existem no mercado diversos modelos de equipamento que facilitam o acesso à informação escrita. O estudante poderá recorrer a um scanner e respectivo sistema de reconhecimento de caracteres (OCR), que podem ser portáteis e possuírem sistemas integrados de saída de voz ou de caracteres Braille. O facto de se poder guardar a informação escrita em registo digital, possibilita aos estudantes com deficiência visual o acesso atempado a textos e dicionários imprescindíveis ao estudo. Além disso, resolvelhes ainda o problema de armazenamento da informação.

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Em termos de avaliação, os estudantes com deficiência visual, através do computador ou bloco de notas, passam praticamente a ter as mesmas condições dos colegas, ou seja, podem dispor do enunciado por escrito (quer digital quer em Braille) e deixam de necessitar de efectuar o seu teste em local diferente76, condição que lhes facilita o esclarecimento de dúvidas junto do docente sem se deslocarem de sala. O acesso à informação escrita é um dos problemas mais complexos com que os estudantes com deficiência visual se confrontam neste nível de ensino. A maioria das bibliografias e textos dados nas aulas encontra-se em suporte papel. Por outro lado, normalmente as obras de referência que já se encontram produzidas em Braille ocupam muito espaço, e em alguns casos são de morosa consulta. Neste contexto, o acesso à Internet veio trazer contributos importantíssimos: por um lado, o facto de alguns docentes aproveitarem este recurso para publicar materiais essenciais às unidades curriculares que leccionam, e disponibilizarem o seu endereço de correio electrónico, e por outro, em alguns casos a constituição de grupos de discussão específicos dessa área, oferecem aos estudantes com deficiência visual os mesmos mecanismos de acesso à informação, que muitas vezes era veiculada em papel e afixada em placards, bem como uma maior aproximação ao docente, o que lhe, permite esclarecer dúvidas quando assim o desejarem. As bibliotecas virtuais77 são igualmente um óptimo recurso que possibilita ao estudante ter acesso directo a obras literárias de referência. Algumas destas bibliotecas têm ligação ao Project Gutenberg78 criado em 1971 e que contava em 2002 com 6.267 obras digitalizadas. Muito do espólio que o constitui foi produzido por voluntários. Existem ainda universidades, como a de Valencia e a de São Paulo79, que criaram bibliotecas virtuais para o apoio aos seus estudantes. No caso da Universidade de Valencia os docentes são incentivados a disponibilizarem para a base de dados da 76

Quando os estudantes necessitam de usar a máquina de escrever Braille, normalmente são deslocados para outra sala, dado que o barulho produzido pela máquina incomoda e desconcentra os outros colegas. 77 Alguns exemplos: Virtual Bookstore (www.vbookstore.com.br); Virtual Books online (www.terra.com.br/virtualbooks/virtualbooks_index.htm); The Online Books Page (http://digital. library.upenn.edu/books); Tiflolibros (http://www.tiflolibros.com.ar); B-on ( http://www.b-on.pt/) 78 http://gutenberg.net 79 www.bibvirt.futuro.usp.br/index.html

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biblioteca virtual apontamentos de aula e outros documentos relevantes para as diversas disciplinas em formato electrónico (Zúnica et al., 1997). Não obstante, a prossecução deste tipo de projectos é confrontada com alguns entraves como a protecção dos direitos de autor e a manutenção da base de dados. O facto de existirem as bibliotecas virtuais não significa que as necessidades dos estudantes com deficiência, em termos bibliográficos, fiquem supridas. Naturalmente os estudantes terão que recorrer às bibliotecas gerais, onde se vêem igualmente confrontados com algumas dificuldades. A grande maioria das instituições de ensino superior já permite a consulta online do seu espólio bibliográfico, mas em algumas ainda não estão garantidos os princípios da acessibilidade fundamentais para que este possa ser consultado pelos estudantes com deficiência, através de tecnologia assistida. Por outro lado, dado que nem todos os estudantes possuem tecnologias de apoio ou acesso à Internet em sua casa, seria bastante importante que as bibliotecas das universidades pudessem dispor de um posto de trabalho que incluísse pelo menos um computador com acesso por voz ou Braille, scanner e sistema de ampliação de caracteres que possibilite o controle de cor, contraste e tamanho. Através destes meios, o estudante com deficiência visual poderá consultar as bases bibliográficas da biblioteca, seleccionar e requisitar os livros de que necessite e inclusivamente fazer no local a digitalização da obra ou apenas dos excertos que lhe interessam. Posteriormente, a correcção pode ser feita por um colega ou serviço e, caso considere necessário, pode requerer a uma instituição80 a impressão em Braille. Sobre este aspecto, há a assinalar que, nos dias de hoje, os Centros de Recursos que estão sob a alçada do Ministério da Educação apenas se dirigem fundamentalmente a alunos que frequentam os níveis de ensino básico e secundário. O apoio prestado neste domínio aos estudantes do ensino superior é esporádico e em função da disponibilidade dos serviços. Em conformidade com a autonomia universitária, algumas instituições tem procurado dar resposta às necessidades dos estudantes com deficiência, através de serviços especializados de produção de materiais adaptados. Estes serviços procuram igualmente auxiliar os estudantes em termos de ajudas técnicas e materiais e apoiar os 80

No caso de não existir impressora braille na escola, a Mediateca da Caixa Geral de Depósitos, a ACAPO, a APEDV e o Ministério da Educação (em casos excepcionais) disponibilizam este tipo de serviço.

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docentes no desenvolvimento de estratégias educativas. O investimento nesses serviços advém do próprio orçamento da instituição, dado que a verba vinda do Orçamento de Estado não incluiu financiamento suplementar para os recursos materiais e humanos específicos para o apoio a estes estudantes. Em síntese, actualmente um estudante com condição de deficiência no ensino superior precisa de ter acesso a uma variedade de ajudas técnicas para poder ter as mesmas oportunidades que os outros colegas e, consequentemente, as mesmas condições de estudo essenciais ao seu sucesso escolar. No essencial, o acesso às chamadas ajudas técnicas no contexto do ensino superior pode ter um contributo importantíssimo em termos pessoais, sociais e académicos. Os exemplos apresentados podem traduzir-se no aumento da auto-estima – dado que em muitos casos esses recursos reforçam a independência do estudante com deficiência – e na integração do estudante na comunidade escolar permitindo-lhe uma maior participação em diversas actividades. O recurso a essas ajudas é muitas vezes condicionado pelos preços proibitivos a que elas são comercializadas e pela morosidade inerente ao processo de candidatura aos programas nacionais específicos. Apesar das vantagens apresentadas, ainda existem alguns estudantes que oferecem alguma resistência à sua utilização, ou desconhecem os diferentes recursos existentes e as suas potencialidades (Mazzoni, 2003). Finalmente, os estudantes interessados vêem-se ainda muitas vezes confrontados com problemas de utilização, adequação e rentabilização dos recursos existentes no mercado. Cada caso é um caso e cada contexto requer respostas diferentes para cada indivíduo. Ao contrário de outros países, os investigadores das universidades portuguesas só agora começam a demonstrar algum interesse – muito dele motivado pelos apoios financeiros que começam a ser concedidos para esta área – em desenvolver projectos na área e no âmbito das condições da actividade académica dos estudantes no contexto do ensino superior.

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3.3. A experiência e percepções dos estudantes com deficiência no ensino superior Hurst (1996) constatou que a experiência dos estudantes com deficiência não era um assunto que despertasse grande interesse nos investigadores, incitando-os a que se debruçassem mais sobre o assunto. Passada uma década sobre o seu repto, foi possível encontrar alguns estudos neste domínio, a grande maioria produzida por investigadores de língua inglesa (Reindal, 1995b; Chard e Couch, 1998; Hall e Tinklin 1998; Borland e James, 1999; Beilke E Yssel, 1999; Holoway 2001; Fuller et al. 2004; Shevlin et al. 2004; Wolanin e Steele 2004; Riddell et al. 2005); e alguns em língua portuguesa, a grande maioria brasileiros (Michels, 2000; Torres, 2002; Reis, 2003; Mazzoni, 2003; Massini 2004, Massini et al. 2006). Sabe-se, no entanto, que no ano 2006 decorriam dois estudos financiados pela Fundação da Ciência e Tecnologia, um da responsabilidade da Universidade do Minho, Processo de Integração e Sucesso Académico dos Estudantes com Deficiência no Ensino Superior

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, o qual pretendia

avaliar o grau de satisfação desse grupo estudantil, e o outro, da responsabilidade da Faculdade de Motricidade Humana em colaboração com a Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, Acessibilidade e Inclusão no Ensino Superior, cujo um dos principais objectivos é a avaliação das condições de acessibilidade da Universidade Técnica de Lisboa. Segundo Wolanin e Steele (2004), a existência de medidas legislativas e institucionais não garantem por si só que os estudantes com deficiência encontrem nas instituições de ensino superior as condições mais adequadas às suas necessidades e que lhes possibilitem demonstrar verdadeiramente as suas capacidades e conhecimentos e, consequentemente, atingir os níveis de desempenho requeridos. Para a maioria dos estudantes, a transição para o ensino superior constitui um período de dificuldades de natureza diversa e mudanças significativas em relação a estatutos e papéis, interacções sociais, sexuais e profissionais. Envolve, em muitos casos, deslocação de localidade, ruptura com o meio familiar e com as redes de apoios constituídos, e supõe a adaptação a novos contextos, novas metodologias de ensino e aprendizagem (Borland e James, 1999; Jesus, 2002).

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No âmbito do protocolo estabelecido entre a Fundação da Ciência e Tecnologia e o Secretariado Nacional da Reabilitação e Integração da Pessoa com Deficiência

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No caso dos estudantes com condição de deficiência, acresce ainda o facto de, ao transitarem para este nível de ensino, se confrontarem com uma nova realidade, principalmente em termos de apoios educativos, muito diferente da que vivenciaram anteriormente, dando origem a alguma desmotivação, desânimo e mesmo abandono (Johnstone, 1995; Wolanin e Steele, 2004). Conforme afirmam Wolanin e Steele, (2004:27) secondary education and higher education are different planets for students with disabilities. Vejamos algumas diferenças. Nos níveis de ensino anteriores, os estudantes com deficiência e seus familiares conviveram com um sistema que pressupõe o comprometimento das escolas em cumprir os normativos legais, providenciando as condições essenciais ao sucesso académico dos estudantes com deficiência, proporcionando-lhes o direito de usufruírem de recursos e serviços adequados e um currículo adaptado. Em contraste, no ensino superior, as instituições não adoptam a mesma atitude e, neste contexto, assume-se que os estudantes são adultos, responsáveis pela sua própria vida e decisões e, por conseguinte, terão eles próprios que encontrar e negociar os apoios e recursos de que necessitam durante o seu percurso académico na instituição. Na prática verifica-se que a maioria dos estudantes não parece estar informada nem preparada para essa tarefa, dado que, em alguns casos, essa função era anteriormente assumida, quase exclusivamente, por pais, professores e estabelecimento de ensino, os quais estabeleceram entre si o plano educativo individual do aluno, onde se previam, serviços, recursos e adaptações curriculares específicos para ele (Wolanin E Steele 2004). Em comparação, no ensino superior, supõe-se que o estudante esteja habilitado a responder ao currículo regular, não sendo muito bem aceites quaisquer alterações significativas ao mesmo. Wolanin E Steele (2004:23) consideram que, comparativamente aos seus colegas, os estudantes com deficiência revelam um nível de preparação mais baixo, em virtude de, por um lado, alguns terem respondido a um currículo muito diferente do regular, por outro, à baixa expectativa de alguns professores relativamente ao progresso académico desses alunos, e ainda, ao facto de esses estudantes não terem tido a oportunidade de usufruírem de serviços, recursos e apoios pedagógicos adequados que lhes permitissem atingir os níveis de competências necessários à sua progressão académica.

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Assim sendo, Trainor (2002) e Hampton e Gosden (2004) consideram que os estudantes com deficiência devem participar em programas de preparação onde possam adquirir níveis básicos de competência e autonomia. Trainor (2002) propõe ainda que os pais participem igualmente nesse mesmo programa. Segundo Mazzoni (2003), a primeira dificuldade encontrada pelos estudantes com deficiência, no acesso ao ensino superior, está associada à escolha de carreira. Ryan e Struhs (2004) consideram que os estudantes enfrentam algumas barreiras quando procuram enveredar por carreiras ligadas à enfermagem, serviço social, medicina, fisioterapia e educação. Decisions about placement of students with disabilities in these situations can be perceived to involve judgements about balancing the rights of one group of people with particular needs (students with disabilities) against the right of another group. Where professional or registration bodies stipulate that certain competencies need to be met before practicing rights are granted, universities are required to ensure that all students have such competencies. This can place universities in a difficult situation. They may be torn between the requirements of registration bodies and industry and the needs of their students with disabilities, who may require adjustments or accommodations to facilitate the demonstration of such competencies (Ryan e Struhs, 2004)

Torres (2002) e Ryan e Struhs (2004) afirmam ainda que são os próprios estudantes a considerar que não têm competências para seguir essas carreiras profissionais, optando, segundo Torres (2002), por carreiras aparentemente menos exigentes. Torres (2002) conclui que factores de ordem socioeconómica são determinantes para a escolha do curso a frequentar. Em termos de preparação para o ensino superior, no estudo realizado por Shevlin et al. (2004) em duas universidades irlandesas, no ano lectivo de 2000/2001, alguns dos 16 estudantes entrevistados afirmaram que tiveram a preocupação de verificar quais as condições de acessibilidade da instituição, nomeadamente quais os transportes que a serviam. Além disso, os estudantes revelaram que, na escolha do curso, foram influenciados pelas escolhas de amigos, experiência de familiares e pela sua preferência ou fascínio pela área de estudo em questão. Como referimos anteriormente, durante a frequência do ensino secundário a instituição de ensino identifica o estudante com deficiência e procura, com base na legislação existente, responder às suas necessidades. No ensino superior, essa legislação não se

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aplica e o estudante terá de se dirigir aos responsáveis pela instituição e solicitar medidas diferenciadas de acordo com a sua condição. Mesmo em instituições onde há uma boa políticas de atendimento aos estudantes com deficiência, na prática o estudante tem de requerer continuamente os apoios de que necessita, tanto a docentes como a outros técnicos e pessoal administrativo da instituição (Borland e James, 1999; Holloway, 2001; Riddell, 2003). Borland e James (1999) observam que, neste caso, a política institucional fundamenta-se no modelo social da deficiência, todavia as práticas e as experiências dos estudantes baseiam-se no modelo médico, ou seja, o apoio é prestado na acepção de que a deficiência é um problema individual. Em alguns casos o apoio a estes estudantes é visto não como um direito mas como um favor (Shevlin et al. 2004). Em muitas instituições de ensino superior, os estudantes com deficiência são incentivados a denunciar a sua condição, o mais cedo possível, junto dos serviços, de modo a que sejam organizados atempadamente os apoios apropriados à sua condição. Shevlin et al. (2004) consideram que esse facto constitui um pertinente exemplo de como o privado se torna público. Por conseguinte, alguns estudantes optam por não o fazer, com receio de serem discriminados (Hall e Tinklin 1998; Fitchen 1998). Heiman e Kariv (2004) e Shevlin et al. (2004) nos estudos que realizaram verificaram que os estudantes com deficiência estão sujeitos a maiores níveis de stresse e gasto de energia, visto que a maioria terá de empregar parte do seu tempo na procura, organização e negociação de todos os recursos e meios necessários ao seu acesso e sucesso académico. Patrício (2003:53) considera que os estudantes se confrontam, nos estabelecimentos de ensino superior, com quatro tipos de barreiras: 

físicas ou arquitectónicas que condicionam ou impedem a acessibilidade aos edifícios, locais de estudo, aos transportes públicos, a parques de estacionamento de veículos, à utilização de casas de banho, aos balcões de atendimento público, entre outras;



psicológicas e culturais que, suportando-se em estereótipos relativamente à deficiência, comprometem o desenvolvimento do sentimento de pertença à

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comunidade escolar em que se inserem, induzem o estudante a adaptar-se ao meio concebido para as maiorias; 

de índole pedagógica e didáctica que denotam características do ensino de massas, traduzindo-se me dificuldades de acesso à informação, à documentação e à investigação, a opções curriculares, métodos de avaliação e a equipamentos adaptados às condições específicas do estudante, e na aquisição desses mesmos equipamentos;



resultantes da falta de informação/formação dirigida à comunidade académica e ao próprio estudante com deficiência.

Nos estudos referidos anteriormente, o testemunho dos estudantes com deficiência confirma a existência dessas barreiras nas instituições de ensino que frequentam. As barreiras à acessibilidade física são um dos aspectos mais referidos em estudos produzidos por vários autores (Borland e James, 1999; Tinklin e Hall, 1999; Holloway, 2001, Mazzoni, 2004; Shevlin et al., 2004; Wolanin e Steele, 2004; Riddell et al. 2005). Estas traduzem-se, na maioria dos casos, em dificuldades em obter transporte adaptado para se deslocar dentro e fora do campus da instituição, no acesso às salas de aula e laboratórios, às áreas de estudo, às casas de banho adaptadas, a alojamento apropriado e aos refeitórios. Segundo Kowalsky e Fresko (2002), esta é também uma das áreas em que as instituições têm procurado investir mais. Num estudo realizado recentemente por Fuller et al. (2004) sobre a experiência de estudantes com deficiência numa instituição de ensino superior do Reino Unido, os 173 estudantes entrevistados referiram ter problemas no acesso à informação de suporte às aulas, em tomar notas, em participar nas aulas e no acesso a meios de avaliação alternativos. Face a esta situação, vários autores reforçam a ideia de que o acesso e domínio dos recursos informáticos, como por exemplo o acesso à internet, e de equipamentos especializados, facilitam significativamente o trabalho do estudante e do docente (Alcantud et al. 2000; Holloway, 2001; Pliner e Johnson 2004; Shevlin et al. 2004). Schevlin et al. (1004) e Riddell et al. (2005) comprovam que, quando os estudantes não conseguem obter os equipamentos de que necessitam atempadamente, ou estão temporariamente privados do seu uso em virtude de avaria, o seu desempenho e sucesso académico pode ficar comprometido. Mazzoni (2003) conclui que, em algumas circunstâncias, a falta de recursos informáticos nas salas de aula inibe o uso dessas

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tecnologias com consequências no aproveitamento dos estudantes. O autor conclui que o recurso aos meios informáticos beneficia não só os estudantes com deficiência mas todos os alunos. Michels et al. (1998 citado por Mazzoni, 2003) consideram que um factor a ser considerado na resolução de algumas das barreiras que enfrentam os estudantes com deficiência é a conjugação de esforços entre docentes e instituições de ensino, e que esta deve ser uma questão prioritária no seio da comunidade académica. Segundo Tinklin e Hall (1998) e Rao (2004), as experiências positivas dos estudantes dependem substancialmente da atitude, experiência e personalidade de alguns membros da comunidade académica, bem como da política institucional, que varia muito entre departamentos dentro de instituições, e de instituição para instituição. Rao (2004), fundamentando-se nos estudos de Junco (2002) e Beilke e Yssel (1998) afirma que atitudes mais negativas por parte dos docentes podem influenciar a auto-estima dos estudantes, enquanto boas relações entre docentes e estudantes são um excelente contributo para a garantia de melhores condições de estudo no contexto da sala de aula. De acordo com a revisão da literatura feita por Rao (2004), alguns factores como a experiência do docente com estudantes com deficiência, área do saber e Faculdade a que pertence podem influenciar as atitudes do corpo docente e comunidade académica no geral perante os estudantes com deficiência. Segundo o autor, há estudos que comprovam que Faculdades e docentes com experiência com estudantes com deficiência têm atitudes mais positivas perante esses estudantes, tendendo as Faculdades de Ciências Sociais e Humanas a mostrar atitudes mais positivas do que as de Ciências, nomeadamente nas áreas de Química, Matemática, Física e áreas da Engenharia. Leyser et al. (2000), Kowalsky e Fresko (2002), Ouellett (2004) e Fuller et al. (2004) afirmam que muitos docentes universitários e funcionários não estão preparados para apoiar os estudantes com deficiência, desconhecendo os recursos a usar e as adaptações que poderão realizar, bem como a lei existente neste domínio. Fitchen (1998) e Kowalsky e Fresko (2002) afirmam que os docentes sentem algum desconforto no contacto com os estudantes com deficiência, facto corroborado pelas entrevistas realizadas por Massini et al. (2006) a quatro docentes sobre a sua experiência com estudantes com deficiência visual.

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Fuller et al. (2004) são de opinião de que os docentes muitas vezes falham em conceder as melhores condições de apoio aos estudantes com deficiência por ignorância existem, porém, casos em que mesmo conhecendo que implicações tem a condição do estudante no seu desempenho académico, os docentes se mantêm pouco receptivos, chegando mesmo, como afirmam Fitchen (1998) e Mazzoni (2003), a questionar a presença e competência dos estudantes, produzindo nestes sentimentos de desânimo e angústia, que os levam, em alguns casos, ao abandono. Consciente das dificuldades que os docentes enfrentam para responder aos desafios que a presença de estudantes com deficiência lhes coloca, Lourtie (1999:120) defende que

[…] não é viável que façamos formação dos professores do ensino superior para esta área, pelo menos de uma forma extensiva. O que teremos que fazer é uma sensibilização dos professores do ensino superior e conseguir ter apoios em termos de aconselhamento das necessidades.

Beilke e Yssel (1999) e Mazzoni (2003) defendem que os estudantes que possuem deficiências não visíveis são confrontados com atitudes de desconfiança tanto de docentes como de colegas, chegando mesmo a sentir que estes julgam que se estão a servir da sua condição física para obter condições mais favoráveis. Por conseguinte, Fuller et al. (2004) defendem que atitudes positivas por parte dos docentes contribuem significativamente para o sucesso do processo formativo dos estudantes com deficiência. Na realidade, para que haja uma mudança de atitudes dentro da instituição é necessário que todos que nela trabalham recebam formação sobre o assunto (Nunan e McCausland , 2000; Shevlin et al. 2004). Holloway (2001) faz também referência a estes aspectos, acrescentando que atitudes mais positivas manifestadas por docentes e pessoal técnico são fruto do interesse pessoal sobre a deficiência ou formação específica adquirida. Contudo, Beilke e Yssel (1999) consideram que as barreiras físicas são mais fáceis de resolver do que mudar as atitudes dos técnicos e docentes. Segundo Mazzoni (2003), a relação entre docentes e estudantes assume diferentes formas, como sentimentos de pena, respeito, admiração, super-protecção, indiferença, conflito e rejeição, e que os estudantes reagem de forma diversa perante as atitudes de

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preconceito e de ignorância: uns com agressividade, outros com indiferença. Alguns dos estudantes participantes no estudo desenvolvido pelo autor consideraram que o diálogo e a convivência são excelentes meios para combater essas atitudes. Fitchen (1998) afirma que, em certas ocasiões, o próprio estudante com deficiência e a forma como percepciona as suas limitações e incapacidades constituem por si só um obstáculo. A autora fundamenta a sua opinião dando o exemplo de alguns estudantes que querem passar por estudantes ditos normais, não reclamando qualquer apoio especial e ocultando de todos a sua condição. Devido a essa atitude, os estudantes acabam por enfrentar inúmeras dificuldades que irão originar sentimentos de frustração e revolta, levando-os em alguns casos a obter fracos resultados ou a desistirem. Outra das barreiras com que os estudantes se confrontam no ensino superior diz respeito às ajudas financeiras que Holloway (2001) considera fundamentais para a aquisição de bens e serviços específicos indispensáveis para o sucesso do estudante neste contexto educativo. Tinklin E Hall (1999), Gibert (2002) e Rindell et al. (2005) afirmam que, apesar de existirem fundos de apoio a estudantes, no geral, estes nem sempre são suficientes para fazer face às necessidades específicas dos estudantes, ou, nas situações em que são consideradas essas necessidades, o financiamento chega tardiamente. O apoio de terceiros em diversas actividades académicas e pessoais é referido por alguns autores como de extrema importância para o sucesso dos estudantes com deficiência (Parker, 1999; Alcantud et al. 2000; Riddell et al. 2005). Dependendo do país, a função de assistente pessoal poderá ser exercida por familiares, amigos, colegas dos estudantes ou por pessoas que se inscreveram em programas de voluntariado. Umas desempenham essa actividade gratuitamente, outras são contratadas pelos próprios estudantes, directamente ou sob indicação dos serviços de apoio das instituições de ensino, recorrendo para o efeito a subsídios concedidos pelo Governo. As tarefas atribuídas aos assistentes pessoais variam consoante as necessidades individuais dos estudantes abrangidos, Nos estudos realizados por Parker (1999) e Riddell et al. (2005), os estudantes sublinham as vantagens e desvantagens deste tipo de serviço. Identificam como uma das vantagens o incremento da sua autonomia, contudo consideram que os assistentes pessoais que são indicados pelos programas de voluntariado nem sempre têm o perfil

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indicado para as tarefas a desempenhar, o que supõe que alguns deles tenham que recrutar novos assistentes pessoais, muitas vezes no decorrer do ano lectivo. No estudo realizado por Kowalsky e Fresko (2002) sobre a função de tutoria desempenhada por colegas junto de estudantes com deficiência visual e dificuldades de aprendizagem, os autores concluem que esta actividade constitui um excelente recurso para estudantes com deficiência. Tanto os estudantes como os seus tutores se mostraram muito satisfeitos com a experiência. Para os estudantes com deficiência visual, os tutores representaram um modo de contactarem com o mundo visual e com a vida no campus. Os tutores consideraram a sua experiência como uma oportunidade para conhecer melhor as dificuldades destes estudantes, melhorar os seus próprios resultados académicos, e adquirir alguma experiência na área das necessidades educativas especiais, útil para a sua futura vida profissional. Por fim, na maioria dos estudos em que os estudantes expressam a sua opinião sobre os serviços e técnicos que neles exercem funções, apesar de assinalarem alguns aspectos negativos como a dificuldade de resposta atempada, a maioria revela-se muito satisfeita com o apoio prestado por estes (Reis, 2003; Fuller et al., 2004; Riddell et al., 2005). A sua actividade varia substancial de instituição para instituição e de país para país. Em alguns são considerados estudantes com deficiência todos aqueles que apresentam alguma deficiência e doença que condicione o seu desempenho académico. Neste grupo são igualmente incluídos os estudantes com dificuldades de aprendizagem. Noutros, as actividades dirigem-se apenas a estudantes com deficiências físicas e sensoriais, e em alguns casos, a apenas um tipo de deficiência. Da revisão da literatura e da consulta aos diversos sites de serviços universitários, constatámos que este tipo de serviços tendem a dar lugar a serviços mais generalistas, intervindo na defesa dos direitos de todos os estudantes que apresentem dificuldades de aprendizagem de origem diversa, assumindo o papel de consultor e promotor de iniciativas com vista à inclusão desses estudantes.

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PARTE II – ESTUDO EMPÍRICO

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Capítulo 4 - OBJECTO DE ESTUDO 4.1. Enunciado do problema A democratização da sociedade portuguesa, acompanhada pela democratização da educação, nomeadamente do ensino superior, contribuiu para o aumento significativo do número de estudantes que o frequenta. Como consequência deste crescimento, encontramos hoje uma população estudantil bastante diversificada, na qual se incluem os estudantes com deficiência. Subjacente à noção de democratização do ensino está o reconhecimento de um modelo de organização social e educativa capaz de promover a igualdade de oportunidades de todos os indivíduos no acesso ao referido sistema (Balsa, et al., 2001). Os avanços alcançados, nos últimos anos, nos domínios das políticas de inclusão de estudantes com deficiência nos níveis de ensino básico e secundário e o desenvolvimento das tecnologias da informação e da comunicação têm contribuído para o incremento do número de estudantes que se candidatam e, consequentemente, dos que são admitidos ao ensino superior (Lourtie, 1999; Patrício, 2003). Durante a frequência dos ensinos básico e secundário, os estudantes com deficiência recebem, ao abrigo de diplomas específicos, respostas pedagógicas adequadas às suas necessidades individuais, podendo candidatar-se ao ensino superior através de um contingente especial, previsto no regulamento do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior definido anualmente por Portaria do Ministério da Educação. Embora as dificuldades no que diz respeito ao acesso estejam atenuadas, o mesmo não se poderá dizer em relação à oferta de condições específicas propícias a um bom desempenho e que garantam iguais oportunidades de sucesso escolar por parte desses estudantes. Em Portugal, contrariamente à maioria dos outros países, não existe uma política claramente definida e coerente neste domínio (Patrício, 2003/2004), nem mesmo estudos e dados estatísticos que permitam conhecer o número e respectiva participação destes estudantes no contexto do ensino superior. Porém, o ingresso deste subgrupo no ensino superior, a manifestação das suas necessidades específicas e a pressão para continuar a usufruir de recursos e apoios

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Objecto de Estudo

especiais que lhes foram proporcionados durante os níveis de ensino anteriores apresentam-se como desafios às instituições de ensino superior. É urgente explorar a sua capacidade de inovação, no sentido de oferecer aos estudantes com deficiência uma formação superior de qualidade. Esta é, além do mais, uma exigência consubstanciada em diplomas e acordos internacionais (ONU, 1993; UNESCO, 1990, 1994, 1998) e nacionais (Constituição da República Portuguesa; Lei de Bases do Sistema Educativo, Lei da não discriminação em razão da deficiência) no âmbito da promoção do princípio da igualdade de oportunidades, da qualidade do ensino e do direito ao sucesso escolar, inseridas na função social do ensino e no contributo do ensino superior. O conceito de “inclusão”, adoptado a partir dos anos 90, vem dar significado à ideia de um modelo de pertença total à instituição, em que a responsabilidade da inclusão de um aluno com deficiência é de toda a comunidade escolar, e representa uma oportunidade, um objectivo para que a universidade não caminhe para um grupo de pessoas sozinhas (Rodrigues, 1999). Em Portugal, os únicos dispositivos legais publicados que referem a adopção de estratégias ao nível pedagógico e de avaliação que garantam igualdade de oportunidades ao acesso e sucesso escolar dos estudantes com deficiência ao nível do ensino superior (Decreto-Lei 88/85 de 1 Abril; Portaria 787/85 de 17 Outubro) foram revogados pelo Decreto-Lei 319/91 de 23 Agosto e, em consequência, anulados os Artigos referentes aos apoios neste sistema de ensino, dando origem a um vazio legal neste domínio até à actualidade. No entanto, em função da Lei da Autonomia das Universidades, cada instituição goza de autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa, financeira e disciplinar (Artigo 3.º) competindo-lhe de igual modo a definição de políticas de inclusão. Para que a universidade possa mobilizar os recursos necessários para responder directamente às características e necessidades específicas de cada estudante com deficiência, tem, segundo Mazzoni et al. (2001), de aprender com eles. A investigação já realizada neste domínio em outros países identifica no seio das instituições de ensino superior barreiras de natureza legal, financeira, físico-ambiental, social, cultural e pedagógica que condicionam a participação dos estudantes com condição de deficiência.

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Objecto de Estudo

Segundo a Lei de Bases do Sistema Educativo português, as universidades têm por objectivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em sectores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade portuguesa. O acesso e frequência ao ensino superior permite assim ao cidadão com condição de deficiência uma maior participação na sociedade, dado que, durante esse período, os estudantes terão oportunidade de increase their knowledge, to develop their social skills, to obtain good qualifications to expose themselves to debate and discussion. This is an important experience for empowerment (Hurst, 1996:141). Porém, face às dificuldades que foram anteriormente identificadas pelos diversos autores, esse empowerment poderá não ser conseguido. No actual contexto político europeu e nacional, o princípio da igualdade de oportunidade de acesso e sucesso educativo tem tido algum destaque nas discussões sobre a qualidade de ensino e o desenvolvimento económico e social das sociedades. O actual Governo Português incluiu nas Grande Opções do Plano para 2005-2009 acções e medidas que visam a promoção da igualdade de oportunidades no acesso e de sucesso ao ensino superior. Algumas das medidas anunciadas pelo Governo são: o aumento do número de gabinetes de apoio aos estudantes com necessidades educativas especiais; elaboração de um manual de acolhimento sobre os apoios existentes nas instituições de ensino superior, incluindo um código de boas práticas; e a consagração legal de um regime de apoio adequado. Estas iniciativas parecem-nos ser um primeiro passo no caminho para um ensino superior inclusivo; as alterações legislativas são importantes para a melhoria das condições, mas nem sempre, produzem mudanças de mentalidades essenciais à construção de uma educação inclusiva. Em nenhum dos documentos provindos do Governo se refere que serão tidas em consideração as opiniões daqueles que actualmente desempenham a sua actividade profissional na área, bem como a participação dos estudantes na elaboração dessas mesmas medidas e estratégias que, como podemos apreender da experiência em outros países, são tidas como fundamentais.

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Objecto de Estudo

Segundo Tinklin et al. (1999:12) until institutions consult their disabled students directly they will remain ignorant of the difficulties and barriers faced by disabled students. Foi com base neste contexto e tendo também presente os escassos estudos realizados em Portugal nesta área, que propomos o corrente estudo.

4.2. Questões de investigação A reflexão anterior suscita algumas questões que se constituem como ponto de partida da investigação. Pretendemos saber: 

Qual a experiência e percepções dos estudantes com deficiência sobre as condições de estudo na universidade?



De que modo as estruturas formais de apoio e os normativos específicos contribuem para a inclusão dos estudantes com deficiência na universidade?

Desta pergunta, surgem outras que nos podem ajudar a entender a problemática: 

Quais os principais factores que interferem, de forma positiva ou negativa, nas actividades e na participação dos estudantes no meio universitário?



Quais as percepções dos estudantes com deficiência sobre os apoios e medidas estabelecidas pela instituição de ensino que frequentam?



Qual o contributo das estruturas formais de apoio (regulamentos, comissões e serviços de apoio) para a inclusão dos estudantes com deficiência na Universidade?

4.3. Objectivos da Investigação O presente estudo tem por objectivo analisar a situação de inclusão dos estudantes com deficiência no ensino universitário, através das suas experiências e percepções. Pretendemos ainda compreender a importância de serviços estruturados para uma melhor qualidade das condições de estudo desses estudantes. Em termos mais específicos pretendemos:

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Objecto de Estudo

1. Caracterizar a instituição de ensino e as unidades orgânicas em termos de gestão, organização e funcionamento; 2. Identificar as orientações, os apoios e as medidas que a instituição e, em particular, cada unidade orgânica instituíram para os estudantes com deficiência; 3. Caracterizar os estudantes com deficiência, na dimensão pessoal, clínica e escolar; 4. Conhecer os apoios que os estudantes com deficiência obtiveram nos ensinos básico e secundário; 5. Identificar as barreiras e os factores facilitadores da participação no contexto académico presentes nos relatos dos estudantes; 6. Recolher e analisar as percepções dos estudantes com deficiência sobre os apoios e as medidas implementadas pela instituição de ensino que frequentam; 7. Recolher e analisar as percepções dos estudantes com deficiência sobre as suas necessidades de apoio no ensino superior; 8. Compreender de que modo as medidas e recursos estabelecidos pelas instituições para o apoio aos estudantes com deficiência contribuem para a participação dos mesmos no meio académico.

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Capítulo 5 - MÉTODOS E PROCEDIMENTOS

5.1. Tipo de Estudo O presente estudo tem o propósito de aprofundar o conhecimento sobre a experiência dos estudantes universitários com deficiência, através da análise dos significados e interpretações dos actores. Considerando os nossos objectivos, pretendemos adoptar uma perspectiva qualitativa. Segundo Bell (1997:20), os investigadores que adoptam uma perspectiva qualitativa […] procuram compreensão, em vez de análise estatística. Psathas (1973, cit. in Bodgan e Bilken 1994:51) afirma ainda que os investigadores qualitativos questionam os sujeitos tendo por objectivo perceber […] Aquilo que eles experimentam, o modo como eles interpretam as suas experiências e o modo como eles próprios estruturam o mundo social em que vivem. Abordando a pesquisa qualitativa de tipo fenomenológico, Bogdan e Biklen (1994) assinalam cinco características fundamentais a essa classe de actividade inquisitiva: (i) a fonte de dados é o ambiente natural e o investigador um instrumento fundamental; (ii) os dados são obtidos de forma descritiva e incluem transcrições de entrevistas, notas de campo, documentos pessoais, memorandos e outros registos oficiais; (iii) o investigador interessa-se mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados ou produto, evidenciando o modo como as expectativas se traduzem nas actividades, procedimentos e interacções diários; (iv) os dados são analisados de forma indutiva, a teoria só se começa a estabelecer após a recolha dos dados e o passar do tempo com os sujeitos; (v) o interesse da investigação centra-se no significado e sentido que os sujeitos atribuem às situações. Propomos uma investigação de metodologia descritiva, onde os dados recolhidos são em forma de palavras ou imagens e não números. Os resultados escritos da investigação contêm citações feitas com base nos dados para ilustrar e substanciar a apresentação (Bogdan e Biklen, 1994:48); baseada numa abordagem do tipo de estudo de caso, que consiste na observação detalhada de um contexto ou indivíduo. (Bogdan e Biklen, 1994:89).

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Métodos e Procedimentos

5.2. O Caso e a Escolha do Caso Segundo Stake (1998), a opção por um estudo de caso significa para o investigador um interesse fundamental na compreensão aprofundada daquele caso em particular, independentemente de outras preocupações, nomeadamente a generalização dos resultados da pesquisa. O presente estudo foi desenvolvido na Universidade de Lisboa (UL). A opção por esta Universidade deve-se: (i)

Ao facto do investigador exercer a sua actividade profissional numa das unidades orgânicas dessa Universidade;

(ii)

À possibilidade de conseguir ter mais fácil acesso aos sujeitos;

(iii)

À disponibilidade de recursos e meios para aplicação dos instrumentos de recolha de dados;

(iv)

À diversidade de funcionamento e de oferta de recursos e serviços a estudantes com deficiência nas unidades orgânicas que constituem esse estabelecimento de ensino;

(v)

E ao facto de, por enquanto, este ser um tema pouco explorado neste contexto.

Segundo Bodgan e Bilken (1994:86), esta opção tem as suas vantagens, mas poderá acarretar alguns riscos, uns intrínsecos ao investigador, As pessoas intimamente envolvidas num ambiente têm dificuldade em distanciar-se quer das preocupações pessoais, quer do conhecimento prévio que possuem das situações; outros inerentes ao seu estatuto, se os intervenientes no estudo se relacionarem com o investigador […] dificilmente o poderão considerar um observador imparcial […] podem não se sentir à vontade para falar despreocupadamente, como o fariam com outro investigado”.

Moreira (1994:21) assinala os mesmos riscos, todavia, acrescenta, […] As vantagens de tal envolvimento ultrapassam, porém, os inconvenientes: aumento evidente de motivação, familiarização acrescida com o universo de estudo, maior facilidade de contactos.

Salienta-se que, no caso em concreto, o conhecimento do investigador se limita a uma das unidades da UL, desconhecendo a realidade dos estudantes com deficiência inscritos nas restantes. Lília Aguardenteiro Pires

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Métodos e Procedimentos

A Universidade de Lisboa inclui oito Faculdades ou unidades orgânicas. No capítulo da apresentação dos resultados e no da discussão dos resultados, estas serão referidas, em alguns pontos, como unidades orgânicas com apoio formalizado, aquelas que possuem serviços, comissões de acompanhamento, regulamentos ou estatutos específicos para os estudantes com deficiência; e como unidades orgânicas sem apoio formalizado, aquelas que não contemplam quaisquer apoios formais dirigidos aos estudantes com deficiência.

5.3. A Selecção da Amostra Para a constituição da amostra, recorreu-se à colaboração dos Serviços de Acção Social da UL (SASUL), dado que se dispunha da informação de que os SASUL, no âmbito de outro projecto (realizado no ano lectivo 2005/2006), contactaram as unidades orgânicas da UL requerendo os dados relativos a este grupo estudantil. Os SASUL identificaram 58 alunos com deficiência, distribuídos consoante o Gráfico 5: GRÁFICO 5 – Distribuição do número de estudantes com deficiência por unidade orgânica e tipo de deficiência

N.º de Estudantes

.

10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0

VISUAL AUDITIVA MOTORA

Ciências

Farmácia

Medicina

Medicina Dentária

Letras

Direito

Psicologia e C. Educ.

Belas – Artes

Unidades Orgânicas

Pretendia-se inicialmente constituir a amostra seleccionando, de cada unidade orgânica, um estudante por tipo de deficiência de carácter permanente e, no caso dos grupos mais representativos, um estudante do primeiro e do último ano da licenciatura, de modo a verificar se, na unidade orgânica onde estavam inscritos, houve alguma evolução em termos de prestação de serviços dirigidos a esse grupo estudantil.

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Métodos e Procedimentos

Conforme Triviños (1987), esta representa uma amostra não probabilística, de escolha intencional de acordo com características julgadas importantes, tendo em conta os objectivos do trabalho, cujos resultados e conclusões não poderão ser extrapolados além deste grupo específico. Para o efeito, contactou-se por telefone e correio electrónico os estudantes que constavam da lista cedida pelos SASUL, averiguando as características da sua condição e disponibilidade dos estudantes para participar no estudo. Segundo a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (OMS, 2003), as deficiências são problemas nas funções ou na estrutura do corpo, tais como, um desvio importante ou uma perda. […] as funções e as estruturas do corpo podem ser interpretadas através das alterações dos sistemas fisiológicos ou das estruturas anatómicas.

Por uma questão de natureza metodológica e para facilitar a identificação das situações, são apenas consideradas, no presente estudo, as categorias de deficiência em que há alteração da função sensorial e mudanças nas estruturas do corpo permanentes que comprometam ou limitem a participação dos estudantes em actividades académicas. Dos 58 estudantes, apenas 16 constam da amostra, em virtude de, com os restantes, não se ter conseguido estabelecer a comunicação, porque os contactos não estavam correctos ou por dificuldades em estabelecê-los essa mesma, ou por recusa ou impossibilidade dos estudantes em participar no estudo. Algumas das recusas foram justificadas pelo facto de o contacto ter sido estabelecido em época de exames. Houve outros casos em que os estudantes aceitaram participar no estudo, porém não foi possível coordenar a disponibilidade do estudante com a do investigador, ou não compareceram na hora, data e local marcados. Por fim, em pelo menos dois casos pareceu que os estudantes participaram no estudo por formalidade, tendo-se sentido algumas dificuldades em conseguir obter da sua parte informação útil para a investigação. Relativamente a esta questão Ruqouy (1997:105) afirma:

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Métodos e Procedimentos Não é raro encontrar nas pessoas contactadas uma reticência na aceitação da entrevista. Comunicar opiniões ou informações sobre um assunto pode parecer uma operação delicada. (…) Do mesmo modo algumas aceitações serão à partida puramente formais. Neste caso, o entrevistador deverá dar provas de engenho para estabelecer uma comunicação franca, sob pena de obter informações de fraca qualidade.

5.4. Esquema Geral da Pesquisa Apresentamos no Quadro 5 a síntese das fases do processo de investigação relacionandoas com actividades que dinamizámos e que orientaram a pesquisa: QUADRO 5 – Fase do processo de investigação

Fase do estudo Fase 1 Exploratória

Actividades desenvolvidas  Levantamento e análise da literatura que enquadre a problemática  Observação e entrevistas exploratórias não estruturadas 

Guiões de recolha de dados da UL e unidades orgânicas



Inquérito às unidades orgânicas sobre os recursos disponíveis para estudantes com deficiência

Fase 2 Construção dos instrumentos



Guiões de recolha de dados de caracterização dos estudantes



Guião de entrevista aos estudantes



Reformulação dos guiões e do inquérito e elaboração das versões a aplicar

 Recolha de dados de caracterização da UL e respectivas unidades orgânicas Fase 3 Recolha de dados

 Aplicação do inquérito às unidades orgânicas da UL  Recolha de dados de caracterização dos estudantes  Selecção e entrevistas aos estudantes com deficiência

Fase 4 Tratamento de dados Fase 5 Relatório

 Sistematização dos dados de caracterização das unidades orgânicas e da amostra  Análise de conteúdo  Elaboração e redacção do relatório de investigação

Lília Aguardenteiro Pires

117

Métodos e Procedimentos

5.5. Os Instrumentos e as Técnicas de Recolha de Dados Dado que se pretende realizar um estudo centrado nas experiências e percepções dos estudantes com deficiência, optámos por utilizar como instrumentos de recolha de dados os guiões e as entrevistas. Para o efeito foram construídos os seguintes instrumentos:  Guião de Dados de Caracterização das unidades orgânicas da UL (anexo 1);  Guião de Dados de Caracterização dos estudantes com deficiência (anexo 2);  Inquérito sobre os apoios dados aos estudantes com deficiência pelas Faculdades da UL (anexo 3);  Guião de entrevistas aos estudantes com deficiência (anexo 4). As Notas de Campo foram igualmente utilizadas como forma de recolha de dados, sendo essencialmente subjectivas e pessoais permitiram o registo de situações úteis para o complemento do guião de recolha de informação (Bogdan e Biklen, 1994). O Guião de Recolha de Dados de Caracterização das unidades orgânicas destinara-se à recolha de informação relativa a cada unidade orgânica da UL, sobre a sua natureza e funcionamento, políticas e recursos destinados aos estudantes com deficiência. Para a recolha de dados em função do referido guião, recorreu-se à análise de documentos oficiais (Relatórios, Estatutos e Regulamentos), entrevistas exploratórias e observações realizadas aquando das deslocações aos locais. Com o guião de dados dos estudantes procurou-se recolher informação para a sua caracterização em termos sócio-familiares, situação clínica e caracterização escolar. Os referidos dados foram obtidos junto dos estudantes antes da entrevista e completados pela consulta dos processos disponibilizados pelo Gabinete de Acesso da DGES ou pelo próprio estudante. Para a recolha dos dados sobre as políticas e recursos das instituições nas áreas do acolhimento e acompanhamento, actividade académica e acessibilidade e mobilidade, foi elaborado um inquérito a preencher pelas instituições.

Lília Aguardenteiro Pires

118

Métodos e Procedimentos

Para o seu preenchimento foi solicitada a colaboração dos Secretários das Faculdades, dado este ser um cargo que centraliza toda a informação que é veiculada pelos diversos órgãos de gestão. Os inquéritos foram entregues pessoalmente pelo investigador nos gabinetes dos referidos Secretários em meados do mês de Abril. No final do mês de Maio, apenas três Faculdades tinham devolvido o inquérito, e no final do mês de Setembro apenas a Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação ainda não tinha respondido nem se tinha disponibilizado para receber o investigador, apesar das várias tentativas, por e-mail, ofício e telefone, junto do Secretário e do Conselho Directivo. Os inquéritos foram recolhidos localmente pelo investigador; este procedimento permitiu que, no momento da recolha, se esclarecessem algumas dúvidas relativamente aos dados preenchidos pela instituição. Para a recolha dos dados relativos às experiências e percepções dos estudantes recorremos à técnica da entrevista. Segundo Bodgan E Bilken (1994:134), este é um meio privilegiado […]Para recolher dados descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma ideia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspectos do mundo. Ghiglione e Matalon (2001) definem três tipos de entrevista: 

A não directiva ou livre, na qual o entrevistado responde de forma exaustiva, com as suas próprias palavras, a perguntas sobre um tema muito geral através do seu próprio quadro de referência;



A directiva ou estandardizada, em que o entrevistado responde a um conjunto de questões abertas, estandardizadas e colocadas numa ordem invariável à totalidade dos inquiridos;



A semi-directiva, onde o entrevistado responde de forma exaustiva a perguntas sobre um tema, e em que o entrevistador se orienta por um quadro de referência, sendo que, quando não abordados pelo indivíduo, espontaneamente, um ou vários temas do esquema, estes são propostos pelo entrevistador ou investigador.

Ghiglione e Matalon (2001) consideram ainda que, em função do tipo de investigação, se escolherá o método de entrevista: 

Controlo – entrevista directiva; Lília Aguardenteiro Pires

119

Métodos e Procedimentos



Verificação – entrevista semi-directiva e directiva;



Aprofundamento – entrevista não directiva e semi-directiva;



Exploração – entrevista não directiva.

Segundo Moreira (1994), a entrevista assume várias formas, sendo o grau de estruturação o meio mais usual de diferenciar tipos de entrevista. Nas entrevistas estruturadas ou padronizadas o formato é rígido, as questões apresentam-se, por regra, invariáveis. No caso das entrevistas semi-estruturadas, o entrevistador apenas dispõe de uma lista de tópicos que pretende ver abordados pelos entrevistados e pode alterar a sua sequência ou introduzir novas questões em busca de mais informação. No presente estudo, optámos por aplicar o método de entrevista semi-estruturada ou semi-directiva, uma vez que se pretende aprofundar o conhecimento da realidade em questão. Está implícita nesta técnica a construção de um guião (ou esquema), constituído por uma série de questões formuladas a partir de tópicos precisos, relativos ao assunto estudado (Quivy e Campenhout, 1991; Ghiglione e Matalon, 2001). A entrevista realizada aos estudantes centrou-se na temática das experiências e percepções dos estudantes acerca das condições de inclusão no ensino superior, em particular no estabelecimento de ensino onde estavam inscritos. Para responder aos objectivos a que nos propusemos, organizámos o Guião da Entrevista aos estudantes, em blocos temáticos (anexo 4), cada um com um objectivo específico: BLOCO A: Experiência do Estudante antes de ingressar no ensino superior Objectivo: conhecer o percurso do estudante no ensino, nomeadamente identificar o modelo de ensino que frequentou, que apoios educativos teve e qual a sua percepção relativamente aos mesmos e, ainda, identificar os aspectos positivos e negativos do percurso anterior aos quais o estudante deu mais ênfase. BLOCO B:

Candidatura ao ensino superior

Objectivo: Conhecer os factores que influenciaram o estudante na escolha do curso e instituição onde foi colocado, a qual dos contingentes apresentou a sua

Lília Aguardenteiro Pires

120

Métodos e Procedimentos

candidatura e as razões dessa escolha e relação entre a opção de candidatura e a frequência actual. BLOCO C:

Experiência do estudante na Universidade

Objectivo: conhecer e compreender as experiências dos estudantes na instituição de ensino. Identificar as barreiras e os factores facilitadores da participação no contexto académico presentes nos relatos dos estudantes BLOCO D:

Percepção e avaliação do apoio recebido

Objectivo: conhecer as percepções dos estudantes acerca das condições de inclusão da instituição de ensino que frequentam, a forma como avaliam os apoios recebidos, e recolher os seus contributos para a melhoria das condições existentes tanto na instituição que os acolhe como em outros estabelecimentos de ensino superior. BLOCO E:

Validação da Entrevista

Objectivo: Recolher mais informações que eventualmente não tenham sido consideradas no Guião e que os estudantes considerem importantes referir. Os blocos temáticos da entrevista encontram-se ordenados logicamente no guião. As temáticas enunciadas dentro de cada bloco e respectivas questões servem apenas de referência para o entrevistador/investigador cujo objectivo é levar o estudante a explicar e clarificar o mais possível os seus pontos de vista e percepções. Contudo, durante a entrevista procurou-se seguir a lógica de abordagem dos assuntos pelos entrevistados. As entrevistas realizaram-se no fim do ano lectivo de 2005/2006, mais concretamente de finais do mês de Maio a princípios de Julho. Esta opção permitiu aos participantes, principalmente àqueles que se encontravam pela primeira vez no ensino superior, expressarem-se sobre a sua experiência plena de um ano lectivo. Depois da devida apresentação do investigador, da investigação e da própria entrevista (objectivos e enquadramento), e após o pedido de colaboração e o respectivo assentimento, uma vez garantida a confidencialidade da fonte e o anonimato do depoimento, a entrevista propriamente dita iniciou-se com uma mesma questão Lília Aguardenteiro Pires

121

Métodos e Procedimentos

introdutória e generalista, do tipo fale-me de…, que parece ser suficientemente geral para levar o estudante a abordar os aspectos mais significativos da sua experiência. Seguiu-se o mesmo procedimento na questão central para a investigação, introduzindose novos temas ou pedindo-se para esclarecer alguns aspectos, no momento em que o entrevistado parecia ter dado a sua resposta por concluída. As entrevistas foram todas áudio-gravadas, tendo a respectiva duração variado entre quarenta minutos a hora e meia, e efectuaram-se, apesar de o investigador se ter oferecido para as realizar em outro local que fosse mais conveniente para o estudante, na Faculdade de Letras da UL, no gabinete do investigador. Todas as entrevistas foram transcritas, tendo aquelas que correspondiam aos estudantes com problemas de dicção e/ou de audição, sido facultadas aos próprias para eventuais correcções. Constituído o corpus que integra todo o material recolhido, procedeu-se à respectiva análise mais profunda e sistemática. Para o efeito recorrermos à análise de conteúdo, enquanto técnica de tratamento de informação (Vala, 1986:104). Segundo Bardin (1977), a análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise de comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objectivos de descrição de conteúdos das mensagens, visando obter indicadores que permitem inferências de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção dessas mensagens. Bardin (1977) assinala três fases no trabalho de análise de conteúdo: a pré-análise, em que se organiza o material ou informação recolhida de forma a constituir o corpus que irá ser submetido a um estudo aprofundado na segunda fase; a descrição analítica, onde se procede, igualmente, à codificação, classificação e categorização; e a fase de interpretação referencial, em que, com fundamento nos referenciais empíricos, se estabelecem relações com o contexto geral, chegando, se possível, a propostas básicas de transformação. Seguindo as orientações de Maroy (1997), decidiu-se por uma descrição analítica, em que o modelo geral da análise foi elaborado a posteriori e derivado dos materiais, visto que, segundo a autora:

Lília Aguardenteiro Pires

122

Métodos e Procedimentos O trabalho é, pois, muito mais inovador, na medida em que o analista tem de descobrir as categorias pertinentes a partir das quais é possível descrever e compreender a realidade observada. (Maroy, 1997:120)

O tratamento de dados ou da informação foi realizado por tema através de um primeiro momento de leitura flutuante das entrevistas, sendo estas fraccionadas em unidades de registo, fragmentos do discurso manifesto como palavras ou frases, posteriormente categorizados em indicadores, e estes agrupados em subcategorias e categorias emergentes do texto. Após a construção das categorias de análise, estas foram sujeitas a um teste de validade interna: Ou seja, o investigador deve procurar assegurar-se da sua exaustividade exclusividade. Pretende-se assim garantir, no primeiro caso, que todas as unidades de registo possam ser colocadas numa das categorias; e no segundo caso, que uma mesma unidade de registo só possa caber numa categoria (Vala, 1986:113).

5.6. O Modelo de Análise Após concluído todo o processo, o modelo de análise foi traduzido na grelha representada no Quadro 6. Procedemos igualmente à comparação entre as experiências e percepções dos estudantes com deficiência inscritos em instituições com e sem apoio formalizado segundo a mesma categorização. No âmbito da apresentação e análise dos dados será necessário ter em conta que a abordagem qualitativa não visa generalizações, mas a compreensão de determinado contexto. As conclusões do presente estudo serão válidas para este contexto e população em concreto.

Lília Aguardenteiro Pires

123

Métodos e Procedimentos QUADRO 6– Grelha de análise

CATEGORIAS

TEMA

Modelo de ensino

Experiência no ensino antes de frequentar o ES

SUB-CATEGORIAS Ensino Regular

Apoios recebidos

Ensino Especial Apoio pedagógico acrescido Material didáctico em formato especial

Percepção sobre as condições de estudo

Condições especiais de avaliação Percepção positiva Percepção negativa

Preparação para o ensino superior Contingente de acesso Relação entre a opção de candidatura e frequência actual Candidatura ao ES Factores que influenciaram a escolha do curso e da Instituição

Geral Especial para deficientes 1.ª Opção corresponde à frequência actual Outras situações Influência de amigos e familiares Saídas profissionais Proximidade da instituição da área de residência e meios de transporte Motivos económicos Condições de frequência nos estabelecimentos de ensino

Recepção e acolhimento

Relacionamento interpessoal e institucional

Acessibilidade física e arquitectónica Experiência no ES universitário Actividades académicas

Apoio Social

Percepção do apoio prestado pelo estabelecimento

Experiências positivas Experiências negativas Colegas Docentes Funcionários Órgãos de gestão e Serviços Experiências positivas Experiências negativas Documentação e bibliografia em formato adaptado Condições de avaliação Equipamentos especiais de compensação Frequência de aulas Participação em programas específicos Bolsa de Estudo Alimentação Alojamento

Positiva Negativa Sensibilização e formação de docentes

Sugestões para a melhoria das condições de estudo dos alunos com deficiência no ensino superior

Apoio formalizado Recursos materiais Divulgação de boas práticas Sem opinião

Lília Aguardenteiro Pires

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Capítulo 6 - APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS FIGURA 2 - Localização da UL

6.1. A Universidade de Lisboa 6.1.1. Identificação e Localização A Universidade de Lisboa foi constituída em 1911 reunindo as quatro escolas de estudos superiores, na altura, sediadas em Lisboa: a Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa (actual Faculdade de Medicina), Escola de Farmácia (actual Faculdade de Farmácia), Escola Politécnica (actual Faculdade de Ciências) e o Curso Superior de Letras (actual Faculdade de Letras). Além dessas unidades, a Universidade de Lisboa é hoje constituída pela Reitoria, Faculdade de Direito, Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, Faculdade de Belas-Artes,

Faculdade

de

Medicina

FIGURA 2 - Localização da UL

Dentária, Instituto de Ciências Sociais e Serviços de Acção Social Escolar. Dependendo directamente da Reitoria, integra ainda o Instituto Bacteriológico de Câmara Pestana, o Instituto Geofísico do Infante D. Luiz, o Instituto de Orientação Profissional, o Museu Nacional de História Natural (que engloba o Departamento de Zoologia e Antropologia, o Departamento de Botânica Jardim Botânico e o Departamento de Mineralogia e Geologia), o Museu de Ciência, o Centro de Linguística, o Centro de Estudos Geográficos, o Centro de Geofísica, o Centro Interdisciplinar de Ciência, Tecnologia e Sociedade e o Complexo Interdisciplinar.82 A Universidade de Lisboa tem a sua sede na Alameda da Universidade, Campo Grande, zona servida por uma boa rede de transportes, e próxima do Estádio Universitário de

82

Apenas as Faculdades de Farmácia, Ciências, Psicologia e Ciências da Educação, Belas-Artes e Letras serão abordadas mais aprofundadamente, dado que, das unidades orgânicas que oferecem cursos de graduação, são as únicas que têm inscritos alunos com deficiência permanente.

Lília Aguardenteiro Pires

125

Apresentação dos Resultados

Lisboa, que constitui um excelente incentivo à comunidade académica para a prática desportiva. Das unidades orgânicas da Universidade de Lisboa, apenas a Faculdade de Belas-Artes não está sediada na Cidade Universitária (cf. Imagem 1). 6.1.2. Funcionamento e Financiamento A Universidade de Lisboa é uma pessoa colectiva de direito público e goza de autonomia estatutária, científica, pedagógica, patrimonial, administrativa, financeira e disciplinar. Na prossecução dos objectivos permanentes de formação humana, cívica, científica e cultural, bem como no desempenho da sua função social, são, designadamente, fins da Universidade de Lisboa o ensino superior universitário, a investigação científica e a difusão do saber. Estrutura Organizacional Cada Faculdade da Universidade de Lisboa goza, nos termos estatutários, de autonomia científica, pedagógica e patrimonial, podendo optar, em termos de regime de autonomia funcional, pela modalidade de autonomia administrativa ou autonomia administrativa e financeira. No presente, todas as unidades orgânicas optaram pela última modalidade. A Universidade de Lisboa tem receitas que lhe são atribuídas pelo Estado, que, no ano de 2005, corresponderam ao valor de 92 984 959€83, e ainda receitas próprias correspondentes aos rendimentos dos seus bens e à contrapartida dos seus serviços e quaisquer outras permitidas por lei, que, em igual data, totalizaram 40 259 664€84. O modelo de gestão da Universidade de Lisboa fundamenta-se nos princípios de gestão democrática, sendo promovida a participação de todos os corpos universitários na vida académica comum e nos órgãos de gestão. São órgãos de gestão da Universidade de Lisboa os seguintes: a) A Assembleia da Universidade, à qual compete aprovar as alterações aos Estatutos, regular a eleição e conferir posse ao Reitor. É composta por membros por inerência, o reitor, os vice-reitores, os pró-reitores, os presidentes dos órgãos de gestão das 83 84

Orçamento de Estado de funcionamento (fonte: RUL, 2005). Dotação corrigida sem integração de saldos do ano anterior (fonte: RUL, 2005).

Lília Aguardenteiro Pires

126

Apresentação dos Resultados

Faculdades e um membro da direcção da Associação Académica de Lisboa, desde que seja estudante da Universidade de Lisboa; e membros eleitos dentro dos corpos docentes, discentes e funcionários das unidades orgânicas, segundo critérios estipulados estatutariamente. b) O Reitor, autoridade académica máxima, representando a Universidade, dando corpo à sua unidade e dirigindo os seus serviços. Compete-lhe, entre outras atribuições, velar pelo cumprimento dos Estatutos da Universidade e das Leis, representar a Universidade, dirigir a Reitoria e os serviços. c) O Senado Universitário, órgão representativo da Universidade de Lisboa incumbido de definir as grandes linhas da política universitária e de acompanhar e apreciar a sua execução. Este organiza-se em Plenário, onde estão representados a maioria dos órgãos e corpos das unidades orgânicas, segundo critérios estabelecidos pelos Estatutos, sendo da sua competência a aprovação das linhas gerais de orientação da Universidade, nomeadamente a criação, suspensão e extinção dos cursos; Comissão Coordenadora, à qual compete, entre outras, a preparação e execução das deliberações do Senado; Comissão Científica, que coordena as matérias de âmbito estritamente científico; e em Comissão Disciplinar que coadjuva o reitor no exercício do poder disciplinar. d) O Conselho Administrativo, que assegura a gestão administrativa, patrimonial e financeira da Universidade, o qual pode delegar nos órgãos próprios das Faculdades, dos institutos ou dos museus a competência necessária para uma gestão mais eficiente. Em cada Faculdade da Universidade de Lisboa e no Instituto de Ciências Sociais a gestão é assegurada por quatro órgãos: a Assembleia de Representantes, órgão representativo da comunidade, o Conselho Directivo, órgão de gestão administrativa e financeira, Conselho Científico, órgão de gestão científica e cultural, e Conselho Pedagógico, órgão de gestão pedagógica. A composição dos Órgãos, no geral, obedece aos seguintes princípios: a) Representação de docentes e estudantes na Assembleia de Representantes, no Conselho Directivo e no Conselho Pedagógico;

Lília Aguardenteiro Pires

127

Apresentação dos Resultados

b) Paridade entre docentes e estudantes na composição da Assembleia de Representantes, do Conselho Directivo e do Conselho Pedagógico; c) Composição exclusivamente do Conselho Científico por doutores; d) Participação de funcionários não docentes na Assembleia de Representantes e no Conselho Directivo. A Universidade de Lisboa confere os graus de Bacharel, Licenciado, Mestre e Doutor e o título de Agregado. Atribui também diplomas de estudos pós-graduados, nomeadamente de cursos de especialização e pós-graduação, e certificados de outros estudos de pós-licenciatura ou de formação pré-graduada. Infra-estruturas Em 2005, a área útil dos edifícios da Universidade de Lisboa85 correspondia a 145 997,93 m2, dos quais 14 046,77 m2 correspondem à área privada da Reitoria, Faculdades da UL e ICSUL, repartida conforme Quadro 7. QUADRO 7 – Área útil ocupada pelas Unidades Orgânicas da UL em 2005 Universidade de Lisboa - Área útil ocupadas pelas Unidades Orgânicas em 2005 (m2) 37775

40000 35000 30000 23924

25000

19559

20000

14621

15000 10000

10321

10044

8755

5176

6826

5000

3047

0 Reitoria

FLUL

FDUL

FMUL

FCUL

FFUL

FPCEUL FBAEUL FMDUL

ISCUL

Do total da área útil da Universidade de Lisboa em 2005, 58 % correspondem a áreas ocupadas por infra-estruturas de utilização pedagógica e científica, expressas na seguinte distribuição (Quadro 8):

85

Na área útil total foram englobadas todas as áreas ocupadas, com excepção das circulações e instalações sanitárias (fonte: RUL, 2005).

Lília Aguardenteiro Pires

128

Apresentação dos Resultados

QUADRO 8 – Infra-estruturas de utilização pedagógica e científica da UL até Dez. 2005 m2

FLUL

FDUL

FMUL

FCUL

FFUL

FPCEUL

FBAEUL

FMFUL

ISCUL

70

35

18

53

16

21

45

15

5

17 535,43

4

8

18

22

3

1

1

1

1

13 484,35

50

80

108

347

50

79

26

25

0

13 038,06

22

0

108

62

26

6

0

11

0

8 262,52

Lab. Ensino

1

1

37

162

22

2

0

0

0

10 325,40

Bibliotecas

0

0

17

12

1

2

7

1

1

14 701,41

1

1

4

33

3

2

5

2

2

2 688,65

Salas de aula Anfiteatros Gab. de docentes Lab./ C. Investigação

Salas de Informática Reprografias TOTAL

6

3

2

4

4

1

0

1

1

802,96

154

128

312

695

125

114

84

56

10

80 838,78

População estudantil Dos 18.964 estudantes inscritos na Universidade de Lisboa no ano lectivo de 2005/2006, 17.070 frequentavam cursos de formação inicial, dos quais 584 eram estudantes do 1.º ano/1.ª vez; 636 estudantes frequentavam cursos de pós-graduação; 952 a parte curricular de cursos de Mestrado promovidos pelas Faculdades e ICS; e 278 o primeiro ano de cursos de Doutoramento.

6.1.3. Políticas e recursos das unidades orgânicas da UL dirigidas aos estudantes com deficiência Em função da autonomia que lhe foi atribuída, cada unidade orgânica da UL pode ou não estabelecer as suas próprias políticas de protecção dos direitos dos estudantes, bem como a afectação de recursos humanos, materiais e financeiros a essa área. Nesta matéria, cabe apenas aos Serviços de Acção Social Escolar a execução da política de acção social da UL.

Lília Aguardenteiro Pires

129

Apresentação dos Resultados

6.1.3.1. Serviços de Acção Social Escolar Os Serviços de Acção Social da Universidade de Lisboa (SASUL) são uma unidade orgânica da UL dotada de autonomia administrativa e financeira, cujo objectivo é a execução da política de acção social, através da prestação de apoio, benefícios e serviços nela compreendidos, de modo a proporcionar aos estudantes melhores condições de estudo. No âmbito das suas atribuições, compete aos SASUL, designadamente: atribuir bolsas de estudo, promover o acesso à alimentação em cantinas, bares e snack-bares, promover o acesso ao alojamento, promover o acesso a serviços de saúde e apoiar as actividades desportivas e culturais. Constituem os órgãos de gestão dos SASUL, o Administrador, nomeado pelo Reitor, ao qual compete assegurar o funcionamento e dinamização dos Serviços e a execução dos planos e deliberações aprovados pelos órgãos competentes; e o Conselho Administrativo, constituído pelo Reitor da UL, Administrador dos SASUL e Director dos Serviços, que secretaria. Os SASUL abrangem, no que diz respeito à atribuição de benefícios sociais, apenas as Faculdades da UL. Infra-estruturas No domínio da alimentação, os SASUL dispõem de cinco refeitórios, dois quais instalados em edifícios privados das Faculdades de Belas-Artes e Ciências e um no edifício de uma residência universitária (Lumiar). Actualmente, os SASUL dispõem de treze residências universitárias destinadas a estudantes a frequentar cursos de licenciatura na UL que, pela distância e/ou dificuldade de conciliação entre os horários dos transportes e os horários das suas aulas, não possam residir com o agregado familiar durante o ano lectivo e que, por circunstâncias inerentes à sua condição socio-económica, necessitem de alojamento a baixo custo, como condição fundamental para a normal prossecução dos seus estudos. As residências localizam-se no centro de Lisboa, havendo seis residências mistas, quatro exclusivamente femininas, e três exclusivamente masculinas, numa oferta disponível de 708 camas distribuídas por 68 quartos individuais, 248 quartos duplos e 48 quartos triplos. No ano lectivo de 2005/2006 a taxa de ocupação foi de 98% (695 camas). Lília Aguardenteiro Pires

130

Apresentação dos Resultados

Na atribuição de alojamento, têm prioridade os estudantes bolseiros e, de entre estes, os que apresentem uma situação económica mais desfavorável. Os SASUL disponibilizam ainda serviços de saúde aos estudantes, através do Centro de Saúde Escolar, apoio à infância, através do Jardim-de-infância acessível a toda a comunidade da UL, e acesso ao desporto, através do Gabinete de Desporto, instalado nos próprios SASUL. Bolseiros Em 2005/2006 foram atribuídas 3.338 bolsas de estudos, segundo o Quadro 9: QUADRO 9 – Número de estudantes bolseiros em 2005/2006 N.º de

Faculdade

Bolseiros

FLUL

251

FDUL

500

FCUL

543

FPCEUL

184

FBAUL

891

FFUL

235

FMDUL

140

FMDUL

294

Do número total de bolsas 23 destinaram-se a alunos com deficiência conforme Quadro 10: QUADRO 10 – Número de estudantes bolseiros com deficiência em 2005/2006 N.º de Alunos Faculdade

Bolseiros com deficiência

FLUL

5

FDUL

4

FCUL

9

FPCEUL

3

FBAUL

1

FFUL

1

FMUL

0

FMDUL

0

Lília Aguardenteiro Pires

131

Apresentação dos Resultados

Apoios atribuídos pelos SASUL aos alunos da UL com deficiência Na base do estipulado no n.º 4 do art.º. 20.º da Lei de Bases para o Financiamento do Ensino Superior86 os SASUL devem considerar apoios específicos a conceder a estudantes portadores de deficiência. Os SASUL procuram, desde que solicitado e comprovada a necessidade, e em função da disponibilidade orçamental, conceder apoios específicos aos estudantes com deficiência da UL. Assim, até à actualidade, foram concedidos complementos de bolsas de estudo a estudantes com deficiência visual, para aquisição de materiais de estudo em formato alternativo adaptado, despesas de transporte público ou particular, e ainda, a título excepcional, subsídios para a reparação de cadeiras de rodas e comparticipação na aquisição de cadeira de rodas a um aluno. Estes apoios foram sempre atribuídos a título excepcional, constituindo critério da sua atribuição o baixo nível socio-económico dos estudantes, bem como a necessidade dos mesmos (pois na ausência desses apoios aqueles estudantes estariam privados de participar nas actividades académicas) Das treze residências que estão sob administração dos SASUL nenhuma está adaptada para receber alunos em cadeira de rodas. Além disso, não é possível o alojamento de uma terceira pessoa que os auxilie em actividades fundamentais da sua vida diária. Os estudantes nessa condição que requereram alojamento até ao ano passado foram colocados em residências de gestão particular. Até ao presente ano lectivo, apenas um caso não foi atendido, devido não só às limitações de mobilidade, mas essencialmente devido ao grau de dependência de apoio de terceiros em todas as actividades, quer académicas, quer pessoais. Em consequência, e após alguns anos de tentativas, a estudante nunca frequentou o curso onde estava inscrita. A grande maioria das residências universitárias sob administração dos SASUL é alugada87 e está instalada em edifícios já muito antigos onde não são viáveis obras de adaptação. Encontra-se, no entanto, em fase de projecto uma nova residência, sem previsão para o início da sua construção.

86 87

Lei 37/2003 de 22 de Agosto Segundo Relatório Anual da UL (RUL, 2005) apenas 4 residências são da propriedade da UL.

Lília Aguardenteiro Pires

132

Apresentação dos Resultados

A nível de acessibilidade aos refeitórios, apenas um não apresenta barreiras arquitectónicas. No Refeitório I, Refeitório II e Refeitório de Ciências, a entrada para estudantes em cadeira de rodas é pelo acesso aos armazéns e cozinha, local onde se situa o elevador que dá acesso ao piso onde são servidas as refeições. A entrada para o Refeitório de Belas-Artes está vedada a estudantes em cadeira de rodas devido à falta de acessos alternativos. Em termos de prática desportiva, até ao momento o Gabinete de Desporto da UL recebeu apenas um pedido de um estudante com deficiência, tendo este sido encaminhado para o Estádio Universitário de Lisboa, dado o facto de as actividades pretendidas não fazerem parte do leque de ofertas do Gabinete.

6.1.3.2. Faculdade de Letras A Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL) foi instituída em 1911, dando continuidade ao projecto do Curso Superior de Letras de Lisboa fundado em 1859 por D. Pedro V e entretanto reformulado por duas vezes, em 1878 e 1901. A FLUL é uma pessoa colectiva de direito público que goza de autonomia estatutária, científica, pedagógica, patrimonial, administrativa e financeira e da autonomia disciplinar permitida pela lei, com sede em Lisboa, na Alameda da Universidade. A FLUL é ainda uma instituição vocacionada para a investigação e para o ensino nas áreas das Ciências Humanas, centrando a sua actividade científica e pedagógica, em particular, nas áreas do saber da Filosofia, Geografia, História, Línguas e Literaturas Clássicas, Línguas e Literaturas Modernas. Para o desenvolvimento das suas actividades, a FLUL, além do edifício principal propriamente dito, conta ainda com mais três outros edifícios. Num Anexo, no Campo Grande, cerca de 500 metros a nascente do edifício principal, estão centralizadas as actividades do curso de formação do Ramo Educacional e de alguns centros de investigação. Adjacente ao edifício principal, do lado poente, encontra-se um pequeno edifício, construído no início dos anos setenta, conhecido por Pavilhão Novo, utilizado como espaço lectivo suplementar. A norte do edifício principal encontra-se um novo

Lília Aguardenteiro Pires

133

Apresentação dos Resultados

edifício que acolhe a Biblioteca, salas de conferência e de reuniões, anfiteatros, e alguns serviços de apoio. População estudantil Durante o ano lectivo de 2005/2006 estavam inscritos na FLUL 4.455 (903 1.º ano/1.ª vez) distribuídos segundo o Quadro 11: QUADRO 11– Número de estudantes inscritos na FLUL no ano lectivo de 2005/2006 Alunos Inscritos no ano lectivo 2005/2006 FORMAÇÃO INICIAL POS-LICENCIATURA

4.107 348

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO

156

MESTRADOS - PARTE CURRICULAR

135

DOUTORAMENTOS - 1.º ANO

57

TOTAL

4.455

Do total de estudantes inscritos, foram identificados pela FLUL 11 estudantes com deficiência, distribuídos conforme o Quadro 12: QUADRO 12 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência TIPOLOGIA DA DEFICIÊNCIA Visual

Auditiva

Feminino

Masculino

3

Motor

Feminino

3

Masculino

-

Feminino

1

Masculino

1

3

Os estudantes com deficiência inscritos, identificados pelo FLUL estavam distribuídos por cursos, segundo o Quadro 13: QUADRO 13 – número de alunos da FLUL por curso e tipologia da deficiência CURSO

Visual Auditiva Motora

Estudos Europeus

1

-

-

Filosofia

1

-

-

História

1

-

-

Língua e Cultura Port.

1

-

2

-

3

Geografia

-

-

1

R. Formação Educacional

1

-

-

TOTAL

6

1

4

L. Lit. Modernas

Lília Aguardenteiro Pires

134

Apresentação dos Resultados

Organização pedagógica e sistemas de avaliação Na FLUL, a grande maioria das disciplinas ou unidades curriculares dos cursos são semestrais. A avaliação é contínua, caracterizada pelo recurso a formas diversificadas de avaliação de acordo com a natureza e conteúdo de cada unidade curricular, valorizando a participação regular dos estudantes nos trabalhos das turmas, bem como a assiduidade. Os estudantes têm também a opção de poderem recorrer ao método de avaliação final alternativa, que ocorre normalmente no final do ano lectivo, e para a qual os alunos ordinários terão de ter nota mínima de 8 valores, critério que não se aplica aos estudantes com estatuto de regime especial de avaliação. Políticas e recursos para o apoio aos Estudantes com deficiência Desde o primeiro dia em que entra na FLUL, o estudante com deficiência toma conhecimento da existência de um serviço que o poderá acolher e acompanhar durante o seu percurso académico. Infra-estruturas especificas para o apoio ao estudante com deficiência Desde 1988, a Faculdade de Letras tem procurado responder às necessidades dos estudantes com deficiência através do que então se designava por Serviço de Apoio a Alunos Deficientes (SAAD), bem como de um regulamento que previa medidas fundamentais para que estes estudantes pudessem ter condições propícias a um bom desempenho em igualdade de oportunidades. Até 2003, o SAAD estava incluído nos Estatutos da FLUL e dependia directamente do Conselho Directivo. Até esse ano, o SAAD procurou dar resposta aos pedidos de apoio, principalmente de adaptação de materiais de estudo, de um modo formal, no âmbito do projecto APM88, e informal, a todos os estudantes da UL e de outras instituições de ensino superior, mediante o pedido individual do estudante. A partir desse ano e por decisão da Presidente do Conselho Directivo, o SAAD suspendeu o apoio aos estudantes com

88

APM – Área de Produção de Materiais, foi um projecto apresentado em 1994 à Reitoria da UL e que recebeu financiamento da UL e dos SASUL. O objectivo era proporcionar todos os materiais de apoio adaptados aos alunos com deficiência através do apoio dos colegas, que eram pagos para o efeito. Entre 1994 e 1995, recorreram a esse serviço, apenas alunos da FPCEUL, FDUL e FCUL com deficiência visual. O projecto teve a duração de um ano lectivo e não teve continuação.

Lília Aguardenteiro Pires

135

Apresentação dos Resultados

deficiência de todas as unidades orgânicas inscritos no serviço, limitando-se apenas a responder aos estudantes com deficiência da FLUL. Em 2005, o SAAD é integrado na Unidade de Apoio a Alunos da Divisão dos Serviços Académicos, mas com a designação de Serviço de Apoio ao Aluno competindo-lhe, segundo o Regulamento Orgânico dos Serviços89, o seguinte: a) O acolhimento, informação e acompanhamento de alunos com necessidades educativas especiais; b) Promover acções que facilitem a adaptação e integração de novos alunos; c) Dinamizar e coordenar acções de voluntariado na FLUL; d) Coordenar a produção de materiais didácticos em suporte alternativo ao material livro; e) Dinamizar o acesso a algumas modalidades de apoio psicopedagógico; f) Organizar, realizar e divulgar eventos e acções de formação na área das necessidades educativas; g) Exercer as demais competências que lhe sejam cometidas pela DSAc. Deste modo, o âmbito da intervenção do Serviço de Apoio ao Aluno (SAA) é alargado a outros estudantes da FLUL com necessidades especiais. Os recursos humanos afectos ao SAA são uma Técnica Superior Principal, com formação em Serviço Social, e um psicólogo em regime de avença. O SAA recorre ao Programa de Voluntariado na FLUL, em que uma das áreas de intervenção é o apoio ao estudante com deficiência. São consideradas como actividades dos voluntários nessa área: 1) Colaboração na área de produção de materiais em suporte especial, nomeadamente: a) Digitalização e correcção de textos de apoio; b) Gravação de apontamentos de aulas e pequenos textos; c) Preparação de textos para impressão em Braille; d) Reprodução por escrito de aulas gravadas; e) Pesquisa e downloads de obras literárias online.

89

Deliberação n.º452/2005 de 19/01/05, publicada no DR n.º 64 de 1/04/05

Lília Aguardenteiro Pires

136

Apresentação dos Resultados

2) Estudo acompanhado. 3) Apoio individual a estudantes com mobilidade reduzida em actividades inerentes à sua vida quotidiana (académica e pessoal). No ano lectivo 2005/2006, estiveram inscritos nessa área cerca de 30 estudantes, dos quais apenas 15 mantiveram uma actividade constante nos dois semestres. Normalmente, sempre que um estudante com deficiência chega ao local onde se estão a realizar as matrículas, são encaminhados pelos funcionários para o SAA. No Serviço, o estudante recebe orientação relativa à organização académica da FLUL. Posteriormente, são também negociados e programados os apoios que lhe irão ser prestados ao longo do ano e fornecidas orientações sobre o funcionamento do curso e o modo como deve actuar junto dos docentes. Nessa altura, e sempre que o estudante autorizar, o SAA inicia o contacto com todos os docentes, de modo a orientá-lo na forma de proceder a fim de serem proporcionadas as melhores condições ao estudante. No SAA o estudante encontra ainda um espaço destinado a ele, onde poderá realizar as provas de avaliação, sempre que não seja possível fazê-lo junto dos colegas, ou eventualmente, estudar, recorrendo ao equipamento específico disponível: computador, scanner, impressora Braille, sistema de ampliação de caracteres e leitor áudio. Desde a sua existência, outras instituições e estudantes com deficiência do ensino superior têm recorrido ao SAA na procura de informação sobre a legislação, orientação sobre os procedimentos a ter em conta no acompanhamento desses estudantes e produção de materiais adaptados, alguns deles provas de avaliação e provas de concursos públicos. Medidas e orientações dirigidas aos estudantes com deficiência Desde muito cedo90 a FLUL tem demonstrado interesse em salvaguardar os direitos dos alunos com deficiência através de regulamentação. O primeiro regulamento especifico surgiu em 1988, considerando apenas medidas de protecção aos estudantes com 90

Foi o primeiro estabelecimento de ensino universitário a possuir um regulamento específico do apoio ao estudante com deficiência e, no mesmo ano que a Universidade Coimbra, a instituir um serviço de produção de materiais de estudo em formato alternativo.

Lília Aguardenteiro Pires

137

Apresentação dos Resultados

deficiência visual. Dez anos depois, o mesmo regulamento é alterado passando a incluir medidas dirigidas a estudantes com outras deficiências. A última revisão de 2005, abandona a expressão alunos com deficiência e adopta a expressão alunos com necessidades educativas especiais, de âmbito mais pedagógico, alargando assim a sua aplicação a outros alunos com necessidades especiais. São consideradas no referido regulamento a aplicação de medidas em termos de regime de frequência, regime de avaliação, e competências do SAA. Para o regime de frequência, estão previstos, entre outros, os seguintes apoios: •

Prioridade no atendimento dos Serviços na FLUL;



Atribuição de salas a turmas onde estejam inscritos estudantes com deficiência tendo em conta aspectos de acessibilidade física, bem como a reserva de lugares nas mesmas.



Informação e esclarecimento dos docentes sobre a condição do estudante e respectivas estratégias de apoio;



Apoio documental e/ou bibliográfico, o qual é produzido pelo SAA, segundo orientações do estudante e docentes;



Apoio suplementar nos casos em que a deficiência dificulte o regular acompanhamento dos conteúdos programáticos;



Permissão de gravação de aulas para fins exclusivamente escolares.

Quanto ao regime de avaliação, os estudantes com deficiência têm a possibilidade de serem avaliados sob formas ou condições adequadas à sua situação, as quais deverão ser estabelecidas por mútuo acordo entre o docente e o estudante, recorrendo se necessário a parecer do SAA. Acessibilidade e Mobilidade No domínio da acessibilidade, a FLUL tem tentado progressivamente eliminar as barreiras arquitectónicas existentes nos edifícios onde está instalada. Para o efeito, recorreu ao orçamento privativo e a apoios de instituições privadas para a construção da rampa de acesso ao edifício, junto à entrada principal, para adquirir uma plataforma elevatória vertical, que possibilita a passagem do átrio principal para o corredor de acesso aos departamentos, serviços e anfiteatros, e adaptar uma casa de banho no

Lília Aguardenteiro Pires

138

Apresentação dos Resultados

edifício principal, que actualmente se encontra muito degradada. Neste aspecto muito há a fazer dado que as únicas casas de banho que podem ser utilizadas por estudantes em cadeira de rodas situam-se no edifício novo. Com a ligação do edifício principal ao edifico novo, a FLUL pôde finalmente contar com um elevador no edifício principal em condições de ser usado por todos, contudo a sua localização não é a mais favorável, dado que se situa numa das extremidades do edifício, onde quase não existem salas de aula. Apesar dos investimentos já feitos, a FLUL continua longe de ser uma Faculdade livre de barreiras físicas e arquitectónicas. O novo edifício que alberga a Biblioteca, embora recente, apresenta inúmeras e incompreensíveis barreiras, não só para os estudantes com mobilidade condicionada (com ou sem cadeira de rodas) como para técnicos. No interior, o edifício não possui um único elevador que percorra todos os andares. Para o efeito, existem plataformas elevatórias, que de tanta quantidade, e da morosidade com que chegam ao piso do balcão de atendimento (2.º andar), têm provocado a renúncia de estudantes e visitantes com mobilidade condicionada ao seu direito de usufruir dos serviços da Biblioteca. No exterior existem duas rampas, uma das quais de tão inclinada que é, só pode ser usada por um estudante em cadeira de rodas auxiliado por alguém com alguma robustez física. A outra, em forma de caracol, não cumpre o que está regulamentado em termos de largura, dificultando a descida e subida, além de, chegando ao fim, a única saída possível ser a entrada do snack-bar, que oferece algumas dificuldades de acesso.

6.1.3.3. Faculdade de Direito A Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL) foi instituída em 1911, porém só entraria em funcionamento em 1913, como Faculdade de Estudos Sociais e de Direito, passando, a partir de 1918, a designar-se como Faculdade de Direito. A FDUL é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia científica, pedagógica, patrimonial, administrativa e financeira e da autonomia disciplinar permitida pela lei, com sede em Lisboa, na Alameda da Universidade.

Lília Aguardenteiro Pires

139

Apresentação dos Resultados

A FDUL é ainda uma instituição vocacionada para a investigação e para o ensino nas áreas das ciências jurídicas, centrando a sua actividade científica e pedagógica, no domínio das disciplinas jurídicas em todas as suas vertentes e das demais disciplinas com elas conexas. Para além do edifício sede, a partir de 2001 a FDUL veio a beneficiar de mais um edifício para o desenvolvimento das suas actividades. É neste edifício que funciona actualmente a Biblioteca. População estudantil Durante o ano lectivo de 2005/2006 estavam inscritos na FDUL 3.711 estudantes (660 1.º ano/1.ª vez) distribuídos do modo representado no Quadro 14:

QUADRO 14– Número de estudantes inscritos na FDUL no ano lectivo de 2005/2006 Alunos Inscritos no ano lectivo 2005/2006 FORMAÇÃO INICIAL POS-LICENCIATURA

3.370 341

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO

138

MESTRADOS – PARTE CURRICULAR

190

DOUTORAMENTOS – 1.º ANO

13

TOTAL

3.711

Do total de estudantes inscritos, foram identificados pela FDUL, 14 alunos com deficiência, segundo o Quadro 15: QUADRO 15 - Distribuição do Número de estudantes com deficiência na FDUL em 2005/2006 TIPOLOGIA DA DEFICIÊNCIA Visual Feminino

3

Auditiva

Masculino

5

Feminino

Motor

Masculino

-

Lília Aguardenteiro Pires

1

Feminino

2

Masculino

3

140

Apresentação dos Resultados

Organização pedagógica e sistemas de avaliação Na FDUL, as unidades curriculares ou disciplinas funcionam em regime anual e semestral. Os docentes de cada unidade curricular organizam-se em regentes, aos quais são atribuídas as competências de direcção dos serviços nas subturmas; e assistentes e assistentes-estagiários aos quais são atribuídas as subturmas, que abrangem a exposição e a discussão de temas, o comentário de textos, a apreciação de relatórios, a resolução de casos práticos e, necessariamente, a realização de um teste escrito numa disciplina semestral e de dois testes numa disciplina anual. Coexistem dois sistemas de avaliação, que podem ser escolhidos inicialmente pelos estudantes: o sistema A de avaliação contínua, que assenta no diálogo pedagógico ao longo das aulas, tendo como pressuposto a participação assídua dos estudantes, completado por exame final, e o sistema B de apenas exame final, o qual compreende uma prova escrita e uma prova oral. Após o término das aulas de cada semestre há uma época de exames91, uma época de recurso em Setembro e uma época especial para finalistas em Dezembro.

Políticas e recursos para o apoio aos estudantes com deficiência A FDUL é uma das unidades orgânicas da UL com mais estudantes com deficiência visual ao longo destes últimos anos. Como resposta às reivindicações desse grupo estudantil foram levadas a cabo algumas medidas (poucas) para melhorar as condições de estudo dos estudantes com deficiência. Infra-estruturas especificas de apoio ao estudante com deficiência No ano lectivo de 1997/98, por iniciativa de alguns estudantes e com o apoio do Conselho Directivo da FDUL, foi estabelecida uma sala para uso dos estudantes com deficiência visual. Esse espaço foi equipado com um computador, scanner, impressora Braille e sistema de ampliação de caracteres. Desde essa data, esteve situado em vários locais, sempre de fácil acesso. Este é um espaço de livre acesso, não havendo qualquer

91

A época de exames subsequente ao 2.º semestre tem por objecto, as disciplinas anuais e as disciplinas do 2.º semestre

Lília Aguardenteiro Pires

141

Apresentação dos Resultados

serviço da FDUL responsável pela sua vigilância e manutenção, facto que tem contribuído para o desaparecimento e degradação de algum equipamento. Medidas e orientações dirigidas aos estudantes com deficiência Em termos de condições especiais de avaliação, o regulamento de avaliação da FDUL prevê que em caso de incapacidade física devidamente comprovada é admitida a substituição de uma prova por outra, na mesma data (art. 6.º, n.º 22), ou seja, as provas escritas podem ser substituídas por provas orais; e a atribuição de prolongamento da duração da prova "a algum aluno com dificuldades motoras ou de conhecimento da língua portuguesa" (art. 65, n.º 33). Apesar de não estarem regulamentados, podem ainda ser concedidos prazos alargados para entrega de trabalhos escritos. Para usufruir dessas condições, o estudante deverá apresentar anualmente, na Secretaria, requerimento instruído pela respectiva prova documental, ou seja, relatório clínico e/ou outro que ateste a sua condição. Acessibilidade e Mobilidade Nos últimos anos, a FDUL tem realizado alguns investimentos na melhoria das condições de acessibilidade no interior e exterior do edifício principal. Para o efeito, foram colocadas rampas junto à entrada principal e no átrio da FDUL e adaptadas algumas casas de banho. Salienta-se, ainda, que a construção do novo edifício da Biblioteca veio melhorar significativamente o acesso a locais outrora inacessíveis, como por exemplo o snack-bar. Nos bares e restaurantes, qualquer aluno com deficiência tem ao seu dispor um serviço personalizado no fornecimento de refeições. 6.1.3.4.

Faculdade de Ciências

A Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL) foi criada por Decreto de 19 de Abril de 1911. Desde a sua criação e até 1985, ano em que ocorreu a transferência para as novas instalações do Campo Grande, a Faculdade de Ciências esteve sediada no edifício que anteriormente acolhia a Escola Politécnica.

Lília Aguardenteiro Pires

142

Apresentação dos Resultados

A FCUL é uma pessoa colectiva de direito público que goza de autonomia estatutária, científica, pedagógica, patrimonial, administrativa e financeira e da autonomia disciplinar permitida pela lei. A FCUL é ainda uma instituição vocacionada para a investigação e para o ensino na área das ciências, centrando a sua actividade científica e pedagógica, em particular, nas áreas do saber da Biologia Vegetal, Educação, Estatística e Investigação Operacional, Física, Geologia, Informática, Matemática, Química, Zoologia e Antropologia. A cada área do saber está associado um Departamento, unidade orgânica permanente, de ensino graduado e pósgraduado, de investigação fundamental e aplicada, de apoio ao desenvolvimento tecnológico, de prestação de serviços à comunidade e de divulgação da cultura nos domínios que lhe são próprios, possuindo regulamento próprio e autonomia científica e pedagógica. Integram ainda a FCUL o Instituto de Oceanografia, Instituto de Biofísica, Instituto de Engenharia Biomédica e o Instituto de Ciências Aplicadas e Tecnologia. Para o desenvolvimento das suas actividades, a FCUL dispõe actualmente de 8 edifícios no campus universitário, e ainda as instalações do Observatório Astronómico de Lisboa na Ajuda, do Laboratório Marítimo da Guia em Cascais e da Estação de Campo do Centro de Biologia Ambiental em Grândola. População estudantil No ano lectivo de 2005/2006 estiveram inscritos na FCUL, 4.429 alunos (687 pela primeira vez) distribuídos conforme o Quadro 16: QUADRO 16 – Número de estudantes inscritos na FCUL no ano lectivo de 2005/2006 Alunos Inscritos no ano lectivo 2005/2006 FORMAÇÃO INICIAL POS-LICENCIATURA

3.782 647

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO

229

MESTRADOS – PARTE CURRICULAR

314

DOUTORAMENTOS – 1.º ANO

104

TOTAL

4.429

Lília Aguardenteiro Pires

143

Apresentação dos Resultados

Do total de estudantes inscritos, foram identificados pela FCUL 15 alunos com deficiência, distribuídos segundo o Quadro 17: QUADRO 17 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência na FCUL em 2005/2006 TIPOLOGIA DA DEFICIÊNCIA Visual Feminino

Auditiva

Masculino

4

Feminino

2

Motor

Masculino

2

Feminino

2

Masculino

2

3

Esses estudantes estavam inscritos nos seguintes cursos (Quadro 18): QUADRO 18 – Número de alunos da FCUL por curso e tipologia da deficiência CURSO

Visual Auditiva

Biologia

Motora 1

Bioquímica

1

Ens. Biologia e Geologia

2

Física

1

Informática Matemática

2

TOTAL

6

2

2

3 1

4

5

Organização pedagógica e sistemas de avaliação O regime de funcionamento das Licenciaturas da FCUL é semestral e organiza-se pelo sistema de unidades de créditos. As unidades de crédito atribuídas a cada disciplina adequam-se às componentes de aulas teóricas (15 horas), práticas (40 horas), teóricopráticas (22 horas) e de estágios ou seminários (30 horas). O regime de avaliação de conhecimentos é definido no âmbito de cada disciplina, porém há a possibilidade de realização de exames em épocas específicas (uma no final de cada semestre e época especial de Dezembro). O exame pode consistir na realização de uma prova escrita e/ou de uma prova referente às aulas práticas e/ou ainda de uma prova oral. Especificamente para os estudantes com deficiência, e em relação às formas de avaliação, o Regulamento Pedagógico da FCUL prevê que se deve ter em consideração “a especificidade de cada caso, de modo a criar condições favoráveis a uma avaliação justa” (art. 1.º)

Lília Aguardenteiro Pires

144

Apresentação dos Resultados

Políticas e recursos para o apoio aos estudantes com Deficiência Na FCUL os alunos têm conhecimento das medidas e recursos que lhes são destinados no momento das inscrições e no primeiro dia de aulas. No início de cada ano lectivo, cada Departamento organiza uma sessão de acolhimento aos novos alunos, com o objectivo de dar a conhecer o funcionamento do curso e do Departamento bem como dos docentes que leccionam algumas das disciplinas. É ainda nessas sessões que o estudante com deficiência pode vir a saber que apoios estão previstos pela FCUL e pelo Departamento que irá frequentar. Infra-estruturas especificas de apoio ao estudante com deficiência Em 1997, o Conselho Directivo da FCUL instituiu o Gabinete de Apoio Psicopedagógico (GAPsi), com o objectivo de promover o acompanhamento psicopedagógico e/ou terapêutico junto da comunidade académica. Além dessas funções, o GAPsi viria também a assumir a dinamização de projectos e iniciativas relacionadas com os estudantes com deficiência. O GAPsi é formado por uma equipa de quatro psicólogos. Além do apoio do GAPsi, os alunos com deficiência usufruem ainda de uma sala de trabalho na Biblioteca Central, situada no edifício C4, com equipamento adaptado – scanner, computadores com software de reconhecimento de voz, impressora Braille, um sistema de ampliação de caracteres fixo, terminais de conexão à Internet, cacifos – e algum mobiliário de apoio. Para o ano de 2006/2007, a FCUL procurará fomentar a produção de materiais de estudo adaptados através de um programa de voluntariado, contando com a participação de todos os outros estudantes da FCUL. Medidas e orientações dirigidas aos estudantes com deficiência Em 1999, a FCUL criou uma Comissão de Acompanhamento com o intuito de dar resposta às questões relacionadas com os estudantes com deficiência. Nesta, têm assento um representante do Conselho Directivo, dois representantes dos alunos abrangidos pelo Estatuto do Deficiente, um representante da Associação dos Estudantes e o GAPsi. A Comissão de Acompanhamento trabalha em colaboração com os representantes que os Departamentos nomeiam bianualmente para esta área.

Lília Aguardenteiro Pires

145

Apresentação dos Resultados

A Comissão de Acompanhamento tem como objectivos: •

Centralizar informação relacionada com os assuntos dos alunos portadores de deficiências.



Realizar o levantamento de necessidades relativas a estes alunos.



Encontrar soluções de compromisso face às diferentes questões que surjam.



Proporcionar canais de comunicação mais rápidos e eficazes entre estes estudantes, os docentes, os Departamentos, o Conselho Directivo e restantes serviços da Faculdade.



Desenvolver iniciativas que contribuam para a melhoria da condição destes estudantes na Faculdade de Ciências.



Divulgar informação útil quer junto dos estudantes, quer dos restantes órgãos ou agentes da Faculdade de Ciências.



Realizar o encaminhamento dos estudantes portadores de deficiência, nos diferentes assuntos que lhes concernem.



Dar apoio aos docentes nas dificuldades com que deparam no enquadramento e prossecução dos objectivos contidos no Estatuto do Deficiente.



Dar apoio aos docentes em outras questões que se relacionem com os alunos com deficiência.

A Comissão de Acompanhamento não tem poder deliberativo, mas sim consultivo, de acompanhamento e encaminhamento dos diferentes assuntos que dizem respeito aos alunos abrangidos por este estatuto. A FCUL tem também vindo a apoiar directamente os estudantes com deficiência na aquisição de material de compensação, nomeadamente linhas Braille, computadores portáteis, aparelhos auditivos, gravador áudio e cadeiras de rodas. O Estatuto especial para estudantes portadores de deficiência física ou sensorial define algumas condições especiais no domínio: •

da frequência – onde são, entre outras, consideradas as possibilidades de reserva de lugares específicos nas salas de aula, prioridade na inscrição em turnos de aulas práticas, gravação de aulas, adaptação de mobiliário (sobretudo ao nível dos laboratórios);

Lília Aguardenteiro Pires

146

Apresentação dos Resultados •

da avaliação – conferindo ao estudante a possibilidade de ser avaliado na forma ou condições adequadas à sua condição e acesso a época especiais sob o mesmo regime aplicável aos estudantes finalistas.



do apoio documental – onde são dadas orientações aos docentes das disciplinas relativas aos fornecimento, em tempo útil, da bibliografia básica.

O referido Estatuto apresenta ainda algumas orientações relacionadas com o apoio suplementar e adaptação dos planos de estudos. Acessibilidade e Mobilidade A FCUL tem vindo ao longo destes últimos anos a realizar alguns investimentos em estruturas e equipamentos que facilitem a acessibilidade e mobilidade dos estudantes com deficiência, nomeadamente ao nível do acesso aos edifícios, salas de aula e casas de banho. No entanto, algumas barreiras persistem mesmo em edifícios de construção muito recente, como é o caso do edifício C6, em que as características do edifício – boa luminosidade e paredes totalmente brancas – e o facto das escadas e patamares não possuírem uma faixa de aproximação constituída por um material de revestimento de textura diferente e cor contrastante com o restante piso, dificultam a mobilidade das pessoas com baixa visão. 6.1.3.5.

Faculdade de Farmácia

A Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa (FFUL) foi uma das primeiras unidades orgânicas a integrar a Universidade de Lisboa em 1911, nessa altura como Escola de Farmácia que, em 1921, seria instituída como Faculdade de Farmácia. Actualmente, a FFUL está sediada na Cidade Universitária. A FFUL é uma pessoa colectiva de direito público que goza de autonomia estatutária, científica, pedagógica, patrimonial, administrativa e financeira e da autonomia disciplinar permitida pela lei. A FFUL é ainda uma instituição vocacionada para a investigação e para o ensino nas áreas das ciências farmacêuticas e das actividades profissionais decorrentes.

Lília Aguardenteiro Pires

147

Apresentação dos Resultados

População estudantil No ano lectivo de 2005/2006 estiveram inscritos na FCUL 1.446 alunos (257 1.º ano/1.ª vez) distribuídos conforme o Quadro 19: QUADRO 19– Número de estudantes inscritos na FFUL no ano lectivo de 2005/2006 Alunos Inscritos no ano lectivo 2005/2006 1.369

FORMAÇÃO INICIAL POS-LICENCIATURA

77

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO

63

MESTRADOS – PARTE CURRICULAR

0

DOUTORAMENTOS – 1.º ANO

14

TOTAL

1.446

Do total de estudantes inscritos, foram identificados pela FFUL 4 alunos com deficiência a frequentar o curso de licenciatura em Ciências Farmacêuticas, distribuídos do seguinte modo (Quadro 20): QUADRO 20 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência na FFUL em 2005/2006 TIPOLOGIA DA DEFICIÊNCIA Visual Feminino

Auditiva

Masculino

-

1

Feminino

Motor

Masculino

-

Feminino

-

2

Masculino

1

Organização pedagógica e sistemas de avaliação Na FFUL, o ensino das disciplinas assenta na seguinte metodologia: aulas teóricas clássicas, em que a abordagem dos temas pode ser básica, avançada ou aprofundada, consoante a natureza das matérias; aulas práticas dirigidas, nas quais são realizados exercícios de revisão e aplicação dos conhecimentos adquiridos, através da resolução de problemas, estudo e discussão de casos, e treino de consulta de fontes bibliográficas e respectiva compilação e utilização; aulas de prática laboratorial e/ou experimental para aprendizagem e treino em organização do trabalho de bancada, manuseamento de material e instrumentos, técnicas especiais de laboratório de física, química, biologia e farmácia.

Lília Aguardenteiro Pires

148

Apresentação dos Resultados

Na FFUL a modalidade de avaliação de conhecimentos varia em função das características de cada disciplina e métodos pedagógicos utilizados, podendo assumir a forma de avaliação por trabalhos, por testes, contínua e exame final. Em cada ano lectivo os alunos dispõem de duas épocas para a realização das provas de exame final em cada disciplina: a época normal e a época de recurso. Existe ainda época especial, para os alunos que se encontram em situação de conclusão de Licenciatura e época para alunos em regime especial, que, no caso da FFUL, abrange apenas os casos consignados na Lei. Políticas e recursos dirigidos aos estudantes com deficiência Na FFUL não estão consignadas medidas ou Estatuto especial para estudantes com deficiência, porém, no caso de escolha de horários, tem sido informalmente dada prioridade a alguns estudantes com deficiência. Este ano lectivo foi ainda colocado à disposição de um estudante com deficiência visual um assistente para apoio em trabalho de laboratório e provas de avaliação ampliadas. Acessibilidade e Mobilidade A FFUL possui dois edifícios para o desenvolvimento das suas actividades, um deles de construção recente que não oferece grandes dificuldades aos alunos com mobilidade reduzida; porém, o edifício mais antigo, que alberga essencialmente uma parte dos laboratórios, além de bastante degradado, apresenta-se inacessível a estudantes em cadeira de rodas. Quanto a lugares reservados para pessoas com deficiência, foi mencionada pela FFUL a existência de alguns lugares (desconhecendo-se o número) nos dois parques sob exploração do estabelecimento de ensino. 6.1.3.6.

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação

A Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa (FPCEUL) é uma das unidades orgânicas mais recentes da Universidade de Lisboa. Criada em 1980 tem a sua sede na Alameda da Universidade.

Lília Aguardenteiro Pires

149

Apresentação dos Resultados

A FPCEUL é uma pessoa colectiva de direito público que goza de autonomia estatutária, científica, pedagógica, patrimonial, administrativa e financeira e da autonomia disciplinar permitida pela lei. A FPCEUL é ainda uma instituição vocacionada para a investigação e para o ensino nas áreas das ciências humanas, centrando a sua actividade científica e pedagógica nos vários domínios da Psicologia e das Ciências da Educação. População estudantil Durante o ano lectivo de 2005/2006 estavam inscritos na FPCEUL 1.141 estudantes (250 pela primeira vez em cursos de Licenciatura) distribuídos do seguinte modo (Quadro 21): QUADRO 21 – Número de estudantes inscritos na FPCEUL no ano lectivo de 2005/2006 Alunos Inscritos no ano lectivo 2005/2006 FORMAÇÃO INICIAL POS-LICENCIATURA

1.008 133

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO

12

MESTRADOS – PARTE CURRICULAR

83

DOUTORAMENTOS – 1.º ANO

38

TOTAL

1.141

Do total de estudantes inscritos, foram identificados pela FPCEUL 6 alunos com deficiência, distribuídos do seguinte modo (Quadro 22): QUADRO 22 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência na FPCEUL em 2005/2006 TIPOLOGIA DA DEFICIÊNCIA Visual Feminino

1

Auditiva

Masculino

Feminino

-

Motor

Masculino

1

Feminino

-

4

Masculino

-

Organização pedagógica e sistemas de avaliação Na FPCEUL, as unidades curriculares ou disciplinas funcionam em regime semestral e são do tipo teóricas, teórico-práticas e práticas, algumas destas em laboratório.

Lília Aguardenteiro Pires

150

Apresentação dos Resultados

A FPCEUL não dispõe de um regulamento geral de avaliação, sendo da responsabilidade de cada docente a definição dos respectivos critérios. Políticas e recursos dirigidos aos estudantes com deficiência Na FPCEUL não são conhecidas medidas formais de apoio aos estudantes com deficiência; no entanto, os alunos poderão sempre apresentar na Secretaria da Faculdade um requerimento fundamentado com prova da sua deficiência, para obtenção de algumas condições especiais na realização de provas de avaliação. Esse pedido é posteriormente dado a conhecer aos docentes. Acessibilidade mobilidade Na concepção do edifício da FPCEUL foram tidos em consideração alguns princípios de acessibilidade física e arquitectónica; alguns locais estão contudo totalmente inacessíveis, como o caso das instalações da Associação de Estudantes, e as opções escolhidas para o acesso a outros locais não são as mais eficazes, dado que, para o efeito, os estudantes têm de percorrer o edifício de uma ponta a outra. Além disso, o percurso alternativo não se encontra assinalado. 6.1.3.7.

Faculdade de Belas-Artes

A Faculdade de Belas-Artes é uma instituição que se enraíza na sua herança históricocultural, designadamente na fundação da Academia de Belas-Artes de Lisboa, por Decreto Régio de 25 de Outubro de 1836, e nas suas sucessoras, que deram origem, em 1911, à Escola de Belas-Artes de Lisboa, e à que lhe sucedeu, a Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, criada por Decreto de 1950 e integrada na Universidade de Lisboa em 18 de Agosto de 1992. A FBAUL é uma pessoa colectiva de direito público que goza de autonomia estatutária, científica, pedagógica, patrimonial, administrativa e financeira e da autonomia disciplinar permitida pela lei, com sede em Lisboa, no Largo da Academia Nacional de Belas-Artes, no edifício do antigo Convento de São Francisco da Cidade. A FBAUL é ainda uma instituição vocacionada para a investigação e para o ensino nas áreas das artes, centrando a sua actividade científica e pedagógica, em particular, nas

Lília Aguardenteiro Pires

151

Apresentação dos Resultados

áreas do saber da pintura, escultura, design de equipamento, design de comunicação e arte e multimédia. População estudantil Durante o ano lectivo de 2005/2006 estavam inscritos na FBAUL 1.317 (226 1.º ano/1.ª vez) distribuídos segundo o Quadro 23: QUADRO 23 – Número de estudantes inscritos na FPCEUL no ano lectivo de 2005/2006 Alunos Inscritos no ano lectivo 2005/2006 FORMAÇÃO INICIAL POS-LICENCIATURA

1.236 81

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO

-

MESTRADOS - PARTE CURRICULAR

66

DOUTORAMENTOS - 1.º ANO

15

TOTAL

1.317

Do total de estudantes inscritos, foram identificados pela FBAUL 5 estudantes com deficiência, distribuídos do seguinte modo (Quadro 24): QUADRO 24 – Distribuição do Número de estudantes com deficiência TIPOLOGIA DA DEFICIÊNCIA Visual Feminino

Auditiva

Masculino

-

Feminino

-

Motor

Masculino

4

Feminino

-

1

Masculino

-

Há a salientar que, para ingressar em qualquer dos cursos de Licenciatura da FBAUL, o candidato terá de satisfazer o pré-requisito de capacidade visual e motora adequadas às exigências dos cursos. Organização pedagógica e sistemas de avaliação Na FBAUL, a natureza das disciplinas pode variar entre teóricas, práticas e teóricopráticas, podendo funcionar em regime anual e semestral. A avaliação pode ser de três tipos: contínua, que se realiza ao longo do ano mediante as respostas de trabalho que o estudante vai produzindo e pressupõe a participação assídua do aluno; a avaliação periódica, que se traduz numa prova escrita como complemento da avaliação contínua; e avaliação final, prova pública obrigatória para todos os alunos inscritos. Além disso, os estudantes contam ainda com uma época de avaliação de recurso e uma época especial, à

Lília Aguardenteiro Pires

152

Apresentação dos Resultados

qual podem apresentar-se os estudantes em regime especial consignado na Lei e alunos finalistas. Políticas e recursos para o apoio aos Estudantes com deficiência Apesar de não ser uma instituição com tradição no acolhimento de estudantes com deficiência, a FBAUL contempla algumas medidas e recursos dirigidos a esses estudantes. Recordamos que os estudantes com deficiência motora e visual não têm acesso aos cursos da FBAUL devido à obrigatoriedade na candidatura de preenchimento de pré-requisitos no acesso. Medidas e orientações dirigidas aos estudantes com deficiência A Secção V do Regulamento Pedagógico da FBAUL prevê um Estatuto Especial para estudantes com deficiência. Para usufruir desse Estatuto, o estudante deverá apresentar os documentos comprovativos da sua condição no acto da matrícula ou no decorrer do ano lectivo, junto da Secretaria ou da Comissão de Acompanhamento do Conselho Pedagógico, nomeada para o efeito. São competências da Comissão de Acompanhamento: •

Emitir um memorando em que sucintamente se explicitem quais os Artigos deste estatuto que deverão ser observados para efeitos da frequência e avaliação das disciplinas, e dele dar conhecimento aos docentes respectivos;



Dar conhecimento ao Conselho Directivo, no sentido de informar e sensibilizar o pessoal auxiliar e os serviços diversos da FBAUL.

O referido Estatuto contempla orientações relativas às condições de frequência, nomeadamente: •

Prioridade no processo de matrícula e inscrição;



Adaptações ou aquisição de equipamento, sempre que se verifique inadequação nos acessos ou noutras particularidades funcionais;



Reserva permanente de lugar em salas de aula;



Gravações das aulas.

Lília Aguardenteiro Pires

153

Apresentação dos Resultados

No domínio da avaliação, é conferida a possibilidade de o estudante com deficiência ter uma avaliação sob forma e condição mais adequada à sua situação, designadamente, alteração de data de realização de prova e isenção do critério de assiduidade. Estão ainda previstos alargamentos para o dobro dos prazos de empréstimo domiciliário de livros na Biblioteca aos estudantes abrangidos. Os estudantes com deficiência têm conhecimento do Estatuto Especial em vigor na FBAUL no acto da matrícula na Secretaria da Faculdade. Acessibilidade e mobilidade As características do edifício sede da FBAUL constituem o principal obstáculo para estudantes com mobilidade reduzida. Além de bastante degradado, o principal e único acesso não possui rampa e, no interior, apenas as salas de aula estão acessíveis por elevador. A FBAUL não possui parque de estacionamento nem lugares reservados no estacionamento público junto às suas instalações.

6.2. Os Estudantes com Deficiência Neste ponto apresentamos os elementos fundamentais para a caracterização da amostra, bem como a experiência dos estudantes com deficiência e sua opinião relativamente aos apoios concedidos pelas unidades orgânicas onde estão colocados.

6.2.1.

Caracterização da amostra

A amostra é constituída por 16 estudantes com deficiência de 6 unidades orgânicas da UL, dos quais 7 com deficiência visual, 3 com deficiência auditiva e 6 com deficiência motora (Quadro 25).

Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados QUADRO 25 – Distribuição da amostra por unidade orgânica DEFICIÊNCIAS VISUAL

AUDITIVA

3 Estudantes cegos 4 Estudantes com baixa visão

3 Estudantes com surdez profunda (uso de aparelho auditivo)

7

3

MOTORA 2 Estudantes com paralisia cerebral (1 em cadeira de rodas) 1 Estudante com deficiência nos membros superiores 3 Estudantes em cadeira de rodas 6

Dos 15 estudantes cujas entrevistas constituem o corpus da análise, 7 pertenciam a unidades orgânicas da UL com apoio formalizado (Grupo A) e 8 a unidades orgânicas sem apoio formalizado (Grupo B), conforme Quadro 26.

QUADRO 26 – Distribuição da amostra por unidade orgânica APOIO INSTITUCIONAL Grupo A – Unidade orgânica com apoio formalizado Grupo B – Unidade orgânica sem apoio formalizado TOTAL

DEFICIÊNCIAS VISUAL

AUDITIVA

MOTORA

3

2

2

4

1

4

7

3

6

Os estudantes que pertencem ao grupo A são todos do género feminino, enquanto o grupo B é composto por 6 elementos do género feminino e 3 do género masculino. A maioria dos estudantes, tanto do grupo A como do grupo B, encontram-se na faixa etária dos 18 aos 24 anos. A média de idades do grupo B é mais elevada porque é constituído por 3 elementos com idades acima da faixa etária dos 30 anos. Dos 16 estudantes, apenas 7 adquiriam a deficiência após o seu nascimento, 3 na infância (1 deficiência auditiva e 2 deficiência visual) e 4 na adolescência (1 com deficiência visual e 3 deficiência motora). Os estudantes que fazem parte do grupo A estavam inscritos, no ano lectivo de 2005/2006, em cursos das áreas das Artes, das Humanidades e das Ciências. Os

Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

estudantes que constituem o grupo B estavam inscritos em cursos das áreas de Direito, Ciências da Saúde e Ciências Sociais, conforme se pode verificar pela análise do Quadro 27: QUADRO 27 – Distribuição da amostra por área de estudo Grupo A

Grupo B

n

n

Artes

2

-

Humanidades

2

-

Ciências

3

-

Direito

-

4

Saúde

-

3

Ciências sociais

-

2

ÁREA DE ESTUDO

Relativamente ao ano curricular, a maioria dos estudantes (9) seleccionados encontra-se nos primeiros dois anos do curso e os restantes distribuem-se pelos 3.º, 4.º e 5.º ano, conforme Quadro 28: QUADRO 28 – Distribuição da amostra por ano curricular ANO CURRICULAR

Grupo A

Grupo B

n

n



2

3



2

2



-

1



1

1



2

2

Dos 16 estudantes seleccionados, 6 nunca reprovaram (2 concluíram o 1.º ano nesse ano lectivo, 3 transitaram para o 3.º ano e 1 transitou para o 5.º ano), 2 decidiram dividir cada ano curricular em dois (estudante com paralisia cerebral e estudante com deficiência visual do curso da área das Humanidades), 3 estão há mais de três anos para concluir a licenciatura (com deficiência motora e auditiva da mesma instituição e da área das Ciências Jurídicas), 4 reprovaram pelo menos num ano lectivo (2 estudantes de Ciências e 2 estudante de Ciências Farmacêuticas) e 1 mudou de curso mantendo-se na mesma área de estudo. A maioria dos estudantes (13) que constituem a amostra reside com a família, um mora em residência universitária e dois em casa própria. Analisando os dados individuais recolhidos dos dois grupos de estudantes, podemos considerar que não existem diferenças significativas no âmbito do estatuto socio-

Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

económico, zona de residência e transporte usado nas deslocações para o estabelecimento de ensino, conforme se verifica no Quadro 29: QUADRO 29– Comparação entre os dois grupos da amostra nas variáveis de notação social, zona de residência e transporte e acompanhamento nas deslocações Variáveis

NOTAÇÃO SOCIAL DA FAMÍLIA (GRAFFAR ADAPTADO)

ZONA DE RESIDÊNCIA

TRANSPORTE PARA A FACULDADE

ACOMPANHAMENTO PARA A FACULDADE

Grupo A

Grupo B

n.º

n.º

Classe Alta

-

1

Classe Média Alta

1

2

Classe Média

4

4

Classe Baixa

1

2

Média

Classe Baixa

1

-

LISBOA

2

5

ARREDORES ZONA NORTE

4

1

ARREDORES ZONA SUL

1

3

Carro pais

1

2

Próprio

-

1

Transporte público

5

4

Transporte público especial

-

2

Sim

2

3

Não

5

6

6.2.2. A experiência e percepções dos estudantes com deficiência da Universidade de Lisboa Prosseguindo o nosso objectivo de conhecer a experiência e percepção dos estudantes sobre as condições de inclusão nas instituições, faremos em primeiro lugar uma abordagem, ainda que breve, da experiência nos níveis de ensino anterior e de alguns aspectos relacionados com o processo de candidatura ao ensino superior. No âmbito da experiência no ensino superior, classificámos as experiências dos estudantes em positivas ou negativas no domínio da recepção e acolhimento, relacionamento interpessoal e institucional e actividades académicas. Por último, classificámos as opiniões e percepções dos estudantes sobre as condições de apoio oferecidas pela instituição, bem como as suas sugestões para o aumento da qualidade dos

Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

serviços prestados aos estudantes com deficiência, na instituição onde estão inscritos e no ensino superior em geral. Recordamos que os estudantes com deficiência que constituíram a nossa amostra se encontravam inscritos, no ano lectivo de 2004/2005, em unidades orgânicas em função da seguinte distribuição apresentada no Quadro 30: QUADRO 30 – Distribuição da amostra por unidade orgânica e deficiência DEFICIÊNCIAS

APOIO INSTITUCIONAL Grupo A – Unidade orgânica com apoio formalizado Grupo B – Unidade orgânica sem apoio formalizado TOTAL

VISUAL Filipa Margarida Patrícia Beatriz Bruno Dulce Francisco 7

AUDITIVA Daniela Elsa Rodrigo 3

MOTORA Andreia Leonor Catarina Marta Paula Sofia 6

As estudantes Andreia e Marta sofreram um acidente em idade adulta, numa fase próxima da candidatura ao ensino superior, que lhes afectou definitivamente a sua condição física. Sofia teve um agravamento do seu estado de saúde durante a frequência do ensino secundário e, consequentemente, da sua condição física que lhe condicionou a sua mobilidade autónoma.

6.2.2.1.

A experiência dos estudantes antes de ingressarem no Ensino Superior

Dos discursos dos estudantes relativos à sua experiência no ensino antes de ingressar no ensino superior, emergem três categorias (conforme Quadro 31): o modelo de ensino, onde é tida em conta a frequência de escolas do ensino regular, com ou sem apoio de professores de apoio educativo, e frequência de escolas de ensino especial; os apoios recebidos, onde se inserem os relatos que referem o apoio concedido nas escolas; e, por último, a percepção dos estudantes relativamente às condições de estudo que tiveram nessas instituições.

Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

QUADRO 31 – Síntese do Tema Experiência no ensino antes de frequentar o ES TEMA

CATEGORIAS Modelo de ensino

Experiência no frequentar o ES

ensino

antes

de Apoios recebidos Percepção sobre as condições de estudo Preparação para o ensino superior

Modelo de ensino Da análise efectuada aos discursos dos estudantes constatou-se que nove iniciaram a sua escolaridade em escolas do ensino regular e apenas três (duas estudantes com deficiência visual, Margarida e Beatriz, e uma estudante com deficiência motora, Leonor) referiram ter frequentado escolas de ensino especial nos primeiros anos de escolaridade. Apoios recebidos Em termos dos apoios recebidos nas escolas, foi dada maior importância pelos estudantes ao apoio pedagógico acrescido a determinadas disciplinas (Patrícia, Daniela, Carolina); ao material didáctico especial, principalmente referido pelos estudantes com deficiência visual (Filipa, Patrícia, Margarida, Dulce, Bruno), que incluía manuais didácticos e outros documentos ampliados, gravados e em Braille; e das condições especiais de avaliação, nomeadamente mais tempo para a realização dos testes, testes adaptados (ampliados ou em Braille) (Margarida, Bruno, Dulce, Paula, Catarina). Percepção sobre as condições de estudo Relativamente à percepção sobre as condições de estudo, alguns estudantes expressaram-se, de modo positivo ou negativo, consoante a sua experiência em diferentes anos curriculares. No 10.º ano […] eu não tinha todos os livros, sobretudo os livros de género de Filosofia, História, Português, que são livros bastantes importantes, ou que são importantes a leitura […] No 12.º ano não tive direito a professor de apoio, não foi colocada, houve bastantes problemas em relação a isso, mas eu acabei o ano e não conseguiram colocar o professor de apoio (Beatriz).

Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados A partir do 7.º ano a Directora de turma e a professora de ensino especial da escola contactaram comigo. Nessa altura não tive muito apoio, emprestaram-me uma lupa e alguns professores começaram a fazer os exames ampliados.[…] E depois, no 10.º ano, mudou o professor de ensino especial, mudou também a directora de turma, mas passei a ter mais apoio. […]A partir do secundário o apoio foi muito bom, pois os professores do ensino especial foram incansáveis. Houve mesmo uma professora que me leu em voz alta duas obras que eu tive de ler para filosofia, e ela leu-mas todas em voz alta enquanto eu ia tomando nota. (Margarida)

Houve outros que se manifestaram em termos gerais e de um modo muito positivo Eles comprometeram-se a ampliar tudo, quer as fichas, quer os testes, tudo o que fosse preciso de material de apoio ao estudo e nunca faltou nada. Portanto, foi sempre bem. Nos testes, tinha também direito a mais um bocadinho, porque demoro mais tempo a ler as coisas (Bruno). A intervenção da professora de apoio junto de todos os meus professores, também foi muito importante para que eles compreendessem como era importante às vezes estarem mais junto de mim para me ajudarem nas aulas. Foi um bom apoio. (Filipa)

Ou de um modo negativo, associando as suas opiniões às dificuldades de acesso a materiais de estudo adaptados: As dificuldades que eu tive, eram às vezes a falta de existência dos livros. Às vezes quando tinha livros mas quando não eram iguais, se fossem actuais eu não tinha qualquer problema, nenhum, mas se fossem mais antigos já tinha. Como me aconteceu durante um ano. E tive um ano que nem sequer tive livros, nem de Ciências, nem de Geografia. Eu é que os tive de fazer com a minha mãe.(Patrícia)

Leonor foi a estudante que revelou ter tido maiores dificuldades, não só em relação à sua experiência na escola de ensino especial, mas também na transição e frequência da escola de ensino regular: Aos 12 vim cá para fora, fazer a 4.ª classe onde eu moro, foi o pior ano da minha vida porque foi tudo novo para mim e não tinha nenhum apoio […] eu fui para 4.ª classe ninguém queria ficar com uma aluna deficiente […] A professora explicava à minha mãe para ela me ensinar em casa, ou seja, enquanto eu ia dormir a minha mãe ia estudar para no dia seguinte explicar-me.

Duas das estudantes, uma com paralisia cerebral e outra com tetraparésia espástica, afirmaram que as professoras de apoio educativo demonstraram pouca confiança nas suas capacidades e potencialidades, tentando dissuadi-las de prosseguirem para o ensino superior e aconselhando a frequência de cursos profissionais. A minha professora do Ensino Especial não queria que eu fosse para o 10.º ano. […] A partir do 11.º ano, não queriam que eu continuasse a estudar, diziam que eu não tinha capacidades e devido à minha idade, tinha de tirar um curso

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Apresentação dos Resultados profissional e trabalhar para ganhar para o meu dinheiro porque, diziam, os meus pais não duram para sempre e eu tinha que me habituar, mas eu continuei sempre a estudar. (Leonor) “Porque elas [professoras do ensino especial] queriam sempre que eu fizesse menos do que aquilo que eu conseguia. Era do género, testes adaptados, queriam impingir cursos de informática, ir para uma variante de informática. Eu nunca queria. Então no secundário fiquei assim com uma certa aversão. (Paula)

Preparação para o ensino superior Apenas Francisco fez referência directa à questão da preparação para o ensino superior recebida no ensino secundário. Embora, lá está, outro problema em Portugal, as pessoas nunca sabem o que é que vão apanhar na Faculdade, não é? Porque o Secundário não prepara ninguém para nada. Acho que antes até preparava melhor que agora, acho que agora prepara menos…

Beatriz e Margarida consideram que o ensino superior é mais exigente, concluindo que se sentem preparadas para esse desafio e que e conseguem responder ao mesmo nível que os colegas, sempre que lhe são concedidas as condições de apoio necessárias. Apresentados que estão os aspectos mais significativos para os estudantes do seu percurso anterior, iremos no ponto seguinte abordar o processo de candidatura.

6.2.2.2. O processo de candidatura ao Ensino Superior Da análise do discurso dos estudantes sobre o processo de candidatura ao ensino superior emergem três categorias (Quadro 32), o contingente de acesso, geral ou para estudantes com deficiências físicas e sensoriais, a relação entre a opção de candidatura e frequência actual e os factores que influenciaram a escolha do curso e da instituição. QUADRO 32 – Síntese do Tema Processo de Candidatura ao ES TEMA

CATEGORIAS Contingente de acesso

Candidatura ao ES

Relação entre a opção de candidatura e frequência actual Factores que influenciaram a escolha do curso e da Instituição

Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

Contingente de acesso Quanto ao processo de candidatura, apenas uma estudante (Andreia) não ingressou no ensino superior pelo contingente especial para deficientes, dado ter tido média suficiente para ser colocada através do contingente geral. Dois dos estudantes concorreram pelo contingente especial pois consideravam que essa seria uma oportunidade de ter acesso ao curso que escolheram. Tinha um livro com os pré-requisitos e outras coisas assim e vim-me informar das condições, se podia ou não, devido ao meu problema, diziam que não havia problema. (Bruno) […] consultei um manual de acesso ao ensino superior, li aquilo, não é?, informei-me que existia um contingente especial, depois fiz vários telefonemas para tentar saber melhor no que é que consistia. […] Soube que tinha que preencher pré-requisitos… estava com receio na altura que não pudesse entrar porque os pré-requisitos diziam que não podia ter deficiências que afectassem… as aulas… frequentar as aulas, e assim. Pronto e depois informei-me acerca disso, vim fazer os pré-requisitos e… tentei.(Marta)

Como se pode verificar, ambos os estudantes tiveram o cuidado de se informar sobre se satisfaziam o pré-requisito exigido para a frequência do curso escolhido, de ausência de deficiência psíquica, sensorial ou motora que interferisse gravemente com a capacidade funcional e de comunicação interpessoal a ponto de impedir a aprendizagem própria ou alheia (Grupo B), cuja forma de comprovação é uma auto-declaração e atestado médico. Uma estudante, apesar de ter média suficiente para se candidatar ao contingente geral, optou pelo contingente especial para deficientes: Porque achei que ia ser mais fácil em termos de secretaria, caso os meus professores quisessem depois perguntar, confirmar se realmente eu via mal, quando eu fizesse a requisição para os exames, para os testes, para depois não haver divergência de informações, para que eles quando chegassem à secretaria e dissessem - "ah, não! Essa aluna não vê mal, não temos informação nenhuma", assim candidatei-me pelo contingente especial embora não fosse necessário (Beatriz)

A estudante refere ainda que viria, mais tarde, a constatar que a secretaria da escola não dispunha dessa informação, obrigando-a a entregar novamente toda a documentação.

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Apresentação dos Resultados

Relação entre a opção de candidatura e a frequência actual Relativamente à opção do curso e instituição na candidatura e frequência actual, apenas uma estudante não ficou na sua primeira opção em virtude de “um engano nos códigos quando me candidatei para a Faculdade” (Daniela). Porém, apesar de frequentarem o curso que corresponde à sua primeira opção, para alguns estudantes (Patrícia, Catarina), esse não corresponde à primeira preferência, devido às limitações associadas à sua condição física ou por receio de não reunirem as condições físicas desejáveis para a frequência desse curso com sucesso. Factores que influenciaram a escolha do curso e do estabelecimento de ensino Quando questionados sobre os factores que influenciaram a sua escolha do curso e do estabelecimento de ensino onde se encontravam na altura, a maioria (Dulce, Paula, Filipa, Margarida, Rodrigo, Leonor, Andreia, Elsa, Paula) refere que o interesse por essa área de estudo foi o factor determinante para a sua escolha. Além desse, foram ainda referidos como factores de ponderação na escolha do curso a frequentar: •

A influência de amigos e familiares (Patrícia, Sofia, Bruno)



As oportunidades de saídas profissionais (Sofia, Beatriz, Marta).



A proximidade da instituição da área de residência e os meios de transporte que a servem (Patrícia, Dulce, Beatriz)



Motivos económicos (Paula, Rodrigo)

Apenas cinco estudantes (Filipa, Leonor, Sofia, Patrícia, Beatriz) referiram ter considerado como factor de ponderação na escolha do curso as condições de frequência nos estabelecimentos de ensino. Relativamente a este tema, é interessante a experiência de Sofia, que opta por Direito: Porque na altura queria ir para Filosofia, para a Faculdade de Letras, eu vim cá porque vim fazer cá as específicas, Filosofia e História, e a minha razão foi, eu não tenho acesso aqui a nada […] Na altura era um elevador muito pequenino que estava ali, portanto, aqueles dos antigos, que era preciso pôr…. Eu então cheguei a ir ver como é que faziam… Lembro que estava aqui na altura uma menina, que punham um banquinho e ela saía da cadeira e ia sentada no banquinho e subia ao primeiro… e disse: não! Nem pensar! porque isto seria um martírio. […] Optei então por Direito.”

No entanto, mais tarde, já na Faculdade que escolheu, Sofia vê, nos primeiros anos, limitada a sua mobilidade ao piso zero, precisando constantemente do auxílio dos Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

colegas para frequentar as aulas e usufruir de alguns serviços em outros pisos e locais cujo acesso se fazia apenas por escadas. Nos primeiros tempos, não tinha cadeira eléctrica, mas sim manual, tinha ajuda dos colegas. Tinha muito medo porque tinha de subir aquela escadaria toda, portanto, praticamente ia ao colo, mas sempre tive ajuda. […] Nunca entrei na Biblioteca […] porque era no primeiro andar, era impossível estar a subir para lá […] Ao bar nunca fui… […] Tinha de me deslocar por fora da Faculdade e abria uma porta e, então lá ia. Mas, no Inverno raramente, pedi às minhas colegas que me trouxessem o que precisava. Portanto, a minha vida académica era sempre feita ali no piso 0.”

Apresentados que estão os resultados relativos à fase de candidatura, debruçar-nos-emos de seguida sobre a experiência dos estudantes nos diversos estabelecimentos de ensino ou unidades orgânicas da UL onde foram colocados.

6.2.2.3.

A experiência dos estudantes com deficiência no Ensino Universitário

Ao analisarmos os dados obtidos através das entrevistas, surgem neste tema quatro categorias, enunciadas no Quadro 33. Dessa análise, destacam-se para cada categoria as experiências positivas e negativas vivenciadas pelos estudantes. QUADRO 33– Síntese do Tema Experiência no ES universitário TEMA

CATEGORIAS Recepção e acolhimento Relacionamento interpessoal e institucional

Experiência no ES universitário

Acessibilidade física e arquitectónica Actividades académica Apoio social

Recepção e Acolhimento A fase de transição para o ensino superior constitui uma etapa de grandes mudanças, na qual uma boa recepção ou acolhimento por parte da instituição poderá contribuir para suavizar as primeiras dificuldades. Referindo-se aos primeiros dias na instituição, os estudantes destacaram como experiências positivas, o acolhimento organizado, quer por um serviço especializado, com actividades específicas para este grupo estudantil, quer por departamentos, em sessões de boas vindas.

Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados Tive uma entrevista com a responsável do Serviço. Tive uma visita guiada pela Faculdade com dois voluntários. Tive uma reunião […] com dois professores do departamento, do conselho pedagógico. Quiseram saber… quiseram-me conhecer, perguntaram-me como eu era, como era a minha deficiência. (Leonor) Quando fui fazer as inscrições, fui também saber o que era preciso e assim. Tentei na altura saber se havia professor que estivesse a orientar-nos, específico para os nossos casos. […] Consegui através da professora actual conhecer quem iria ser a nova tutora. Desde aí comecei logo a saber as coisas que poderia ter, o que não poderia ter, as cadeiras, os materiais. Além disso, ela chegou a ir à secundária ver como os professores lá trabalhavam comigo e esteve a falar com a minha professora de apoio, para saber mais ou menos o sistema de coisas. (Patrícia) […] fui à recepção de Matemática, porque eles fazem uma recepção aos alunos novos, estava lá o presidente do departamento, alguns professores, fazem uma apresentação, mostram-nos como funcionam os horários […] falámos logo com […] a secretária geral do departamento de Matemática… e a partir dai é que decidimos então pedir voluntários para fazer esse trabalho de gravações. Numa das primeiras aulas, houve logo um professor que disse isso em voz alta, […] havia muita gente e nós pedimos voluntários e apareceram vários voluntários para lerem coisas em voz alta. (Margarida)

Margarida e Andreia referem ainda que foram informadas logo no primeiro dia de que podiam usufruir de um Estatuto específico para estudantes com deficiência. Andreia e Leonor destacam ainda o apoio e incentivo de colegas nessa fase: Na Associação prestaram-se logo para me ajudar. Eu quando cheguei, no primeiro dia que fui fazer a matricula, houve um rapaz da Associação que foi logo falar comigo, dizer que podia ter o Estatuto […] foram eles que me disseram para arranjar um gravador, não havia problema… várias coisas, arranjar métodos para ultrapassar os problemas. (Andreia) Entretanto conhecia uma voluntária no Serviço de Apoio, que por coincidência também era do meu curso e senti necessidade de contar a ela que estava em dúvida porque eu disse “para o ano vou mudar de curso” e ela explicou-me e disse-me “tu nunca vais ser deficiente. (Leonor)

Porém, para alguns dos estudantes, a fase inicial do processo de integração na instituição representou para eles uma experiência negativa, principalmente devido, para alguns casos, à dificuldade em estabelecer contactos com os colegas (Marta e Catarina), para outra, à dificuldade de adaptação ao novo sistema e ambiente (Elsa) e ainda ao facto de se encontrarem na fase de adaptação e aceitação da sua nova condição física (Francisco, Marta e Andreia, que viria a suspender a matrícula nesse mesmo ano). Para alguns estudantes, a experiência que se revelou mais negativa nos primeiros dias de Faculdade, ficou a dever-se a atitudes preconceituosas e discriminativas, tanto de docentes como de colegas e funcionários:

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Apresentação dos Resultados No primeiro dia a senhora que estava a fazer as inscrições disse-me que não conseguia compreender muito bem como eu lá tinha entrado porque diziam que naquela Faculdade não havia direito a entrar por contingente especial, mas depois disse-me, "uma vez que já cá está, não é? Não vai voltar para trás" e, começou assim um bocadinho turvo. (Bruno) O primeiro dia foi estranho. Ninguém… toda a gente que vê uma pessoa diferente fica um bocadinho… não sabem como lidar com essa situação, também porque naquela Faculdade, daquilo que eu sei, há muito pouca gente assim com deficiência. […] Toda a gente fica um bocadinho com ar de espanto, acho eu, e por outro lado, não sabe como lidar com a situação”. (Catarina) A primeira reacção quando eu fui à Faculdade falar que me tinha candidatado e que ia para lá, a reacção foi muito estranha, porque disseram logo: “aqui não há acessibilidade para si. E nem sequer temos condições, nem pessoal preparado para a sua situação […] A reacção foi um bocado… negativa. (Sofia)

Após a descrição da fase inicial de integração na instituição, iremos apresentar os resultados das experiências destes estudantes quanto ao relacionamento interpessoal e institucional. Relacionamento interpessoal Nesta categoria serão observadas as afirmações dos estudantes que revelem experiências positivas ou negativas no relacionamento com os colegas, docentes, funcionários e com órgãos ou serviços do estabelecimento de ensino onde estão inscritos (Quadro 34).

QUADRO 34 – Síntese do Categoria Relacionamento interpessoal e institucional CATEGORIAS Relacionamento institucional

SUB-CATEGORIAS Colegas interpessoal

e

Docentes Funcionários Órgãos de gestão e Serviços

Relacionamento com os colegas A opinião geral dos estudantes sobre o relacionamento com os colegas é muito positiva, sendo o seu suporte em diversas actividades académicas, nomeadamente: •

No acesso a documentação e bibliografia (Andreia, Daniela, Filipa, Francisco, Margarida, Patrícia, Rodrigo)



Na compreensão da matéria dada nas aulas (Daniela);

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Apresentação dos Resultados •

Nas deslocações dentro e fora da instituição (Leonor, Patrícia, Filipa, Sofia, Beatriz);



Em actividades de vida diária (Leonor, Sofia);



No trabalho de laboratório (Marta, Bruno);



Em saídas de campo (Leonor).

Segundo alguns estudantes, os colegas relacionam-se com eles com normalidade, sem diferenciação, porém, nos primeiros tempos, alguns demonstraram alguma curiosidade em saber mais pormenores sobre a sua condição. Com o meu grupo de amigos, isso é que importa, estou muito bem, eles encaramme como uma deles, sem diferença nenhuma. (Paula) Com os meus colegas, nunca me trataram diferente, por ser… por ter o problema de visão que tenho. (Bruno) Os meus colegas tratam-me como uma pessoa qualquer. Há uns que tenho de dizer para perceberem, porque há quem diga que se não me dissessem então não sabia. (Daniela) Praticamente tinha de contar a história da minha vida, nos primeiros meses. Mas a integração foi óptima, dei-me perfeitamente bem com os meus colegas. Eles acharam bastante curioso, embora tenham lidado com alguma naturalidade com isso. (Beatriz) Agora há relações com os meus colegas que foi sempre bastante razoável. Portanto aceitavam. Nunca tive problemas. Porque repare, aqueles com quem eu me dava eram de facto aqueles que me viam como uma pessoa normal. Pelo menos era do que eu me apercebia. (Francisco)

Contudo, há outros que reconheceram nos colegas estranheza, discriminação e preconceito, relacionados com a falta de conhecimento sobre a sua condição, traduzindo-se, em alguns casos, na desconfiança sobre a sua competência e/ou capacidade para a realização de determinadas tarefas: Os meus colegas às vezes ficam um bocado de pé atrás, porque eu vejo mal, mas não sou cega é um bocado difícil de enquadrar … ao mesmo tempo não sabem se me hão-de ajudar ou não é preciso, o que é, o que não é… vêem muito mais como um frete de ter me ajudar a levar aqui ou além… às vezes dizem: "Queres mesmo que te leve?". "Tenho mesmo que ler isto? Tenho que te ajudar aqui e além" alguns têm um bocadinho de má vontade. (Margarida) A nível de colegas, acho que o pior de tudo é as relações, as pessoas não estão habituadas e reagem de forma diferente, se calhar, inconscientemente. É muito mau. Mas, não sei, aquela coisa de fazerem muitas festas, e coitadinha… não é muito bom, não é muito agradável. (Andreia)

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Apresentação dos Resultados Eu tenho situações e experiências que não sabem que eu oiço mal e depois a partir do momento em que detectam que tenho uma dificuldade em ouvir, quase que me discriminam…. (Rodrigo) Acho que me encaram assim como ser um bocadinho menos capaz que eles. Pelo menos até me conhecerem até estarem no meu grupo. Se calhar prende-se muito porque tenho uma outra colega que entrou ao mesmo tempo que eu. […] Eles às vezes diziam-me. “Oh Paula a tua colega está lá em cima sozinha”. Queriam que eu fosse ter com ela para compartilharmos este estigma, vá lá. (Paula) Nunca me senti excluída mas, senti em relação aos meus colegas, pelo facto de fazer os exames no computador, por ex., senti que eles se achavam injustiçados em relação a mim, por eu fazer o exame no computador. “ah, que sorte que tu tens. Assim também eu… punha as cábulas no computador” qualquer coisa assim. Senti que eles às vezes, não sei se por inveja, sentiam que estava a ser beneficiada em relação a eles, por fazer os testes no computador.(Beatriz)

Tal como Paula, Rodrigo e Marta também são da opinião de que, com o convívio, os colegas começam a ter uma ideia diferente das suas capacidades. Relacionamento com os docentes Quanto ao relacionamento com os docentes, alguns estudantes (Bruno, Catarina, Elsa, Marta, Paula, Sofia) têm uma percepção positiva sobre ele e afirmaram que os docentes reagem bem, que os tratam normalmente, sem diferenciação, facto que se revela de grande importância para Sofia: Mas nunca tive [razão de queixa] e pelo contrário, acho que sempre me trataram igual, como os outros colegas. Isso é uma coisa que devo muito, porque sempre lutei naquela Faculdade, nunca tive privilégios nem nada, isso dá-me força, porque tudo o que faço é derivado realmente ao estudo e ao empenho.

Bruno viria mais tarde a contradizer-se, afirmando que a mentalidade das pessoas já está feita, não é? Um maior humanismo entre professores e alunos… não se muda assim de um dia para o outro, deixando transparecer que nem sempre as atitudes dos docentes para com

ele foram as mais compreensivas. Margarida considera que os docentes reagiram muito bem à sua presença porque estavam habituados, porque estavam sensibilizados pela experiência com outros colegas e por uma ex-aluna. Tenho ouvido relatos de outros departamentos em que a situação não é tão favorável.

Beatriz, Dulce, Filipa, Leonor, Margarida e Rodrigo afirmaram que os docentes são compreensivos e sensíveis aos seus problemas, procurando ajudá-los naquilo de que

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Apresentação dos Resultados

necessitam. Embora alguns estudantes afirmem existir maior ou menos afinidade com um ou outro docente, houve ocasionalmente situações de conflito com alguns deles, por não lhes ter sido dado resposta às suas necessidades específicas. Alguns estudantes (Catarina, Francisco, Margarida, Patrícia) afirmaram que os docentes não lidam bem com a sua presença em aula, em certa medida porque não estão preparados para os acompanhar, mostrando-se um pouco desorientados, e apresentando, em alguns casos, dificuldades em compreender as suas limitações, sendo o relato de Margarida um exemplo: “Não duvidam que eu veja mal, mas às vezes parece que duvidam daquilo que eu preciso, duvidar de que eu realmente preciso de tanto tempo, ou que eu realmente não consiga ler… não sei tipo […] ela tem óculos, os olhos dela parecem perfeitos, como é que ela não vê o que está no quadro, ela anda por ai tão normalmente…demoraram um bocadinho a encaixar, mas acho que acabei por convencê-los.” (Margarida)

Ainda relativamente à preparação dos docentes para lidarem com os estudantes com deficiência, Francisco questiona: Um professor até ao 12º ano tem de ser preparado em educação especial, tem de não sei quê […] e um professor universitário não tem preparação pedagógica absolutamente nenhuma. É uma coisa que eu também não entendo neste país. Porque é que um professor universitário não tem preparação pedagógica? Porque é que se os professores até ao 12º ano precisam de ter aulas de pedagogia, porque é que um professor universitário nunca as teve? Explique-me. É isso que eu não consigo entender, nem ninguém me dá resposta.

Alguns dos estudantes afirmaram ainda que houve docentes que demonstraram pouco interesse tanto por eles como pelos estudantes em geral. Na Faculdade, os professores não tem nenhuma ligação com os alunos e não conseguem perceber que eu tenho dificuldades e que eu tenho este problema […] Só quando chegam ao exame e vêem eu a escrever, ou vêm ter comigo para dizerem que acabou o tempo, eu digo, eu tenho mais tempo, só aí percebem que eu tenho dificuldades. (Catarina) Eu acho que a maior parte deles não está lá… parece não estão lá… interessados em nós, não sei. (Andreia) Vão dando as aulas à maneira deles e se nós conseguirmos, conseguimos, se não conseguirmos, paciência... (Patrícia) Aquilo é uma selva autêntica, o professor... não há um apoio de um professor, não há uma explicação, não há nada, nada, nada. Aquilo é assim: chega-se ali desbobina-se matéria. (Francisco)

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Apresentação dos Resultados No inicio cheguei a falar com um professor, até a escrever na ficha, "aluno com uma certa deficiência auditiva", mas nem o professor perguntava nada, nem dizia "está ouvir bem? Está a ouvir mal?", nem "quer mais tempo para escrever. Não quer mais tempo". Nunca. (Rodrigo)

Além disso, foram ainda relatadas pelos estudantes experiências pontuais em que os docentes evidenciaram preconceito e discriminação para com eles. Eu tive um professor que […] disse que eu não tinha capacidades para estar no curso em que estava. Essa foi logo a primeira que eu ouvi, como aluna do primeiro ano e tal, pronto. (Patrícia) Uma vez estávamos numa aula, estavam para aí uns 60 e tal alunos, e de repente, o docente começou a falar do Ministério do Trabalho e que havia lá uma pessoa cega, e que tinha sido muito mal atendido por essa pessoa. Depois, diante de todos os alunos, […] começou-me a julgar-me pela outra pessoa. Começou-me a comparar. Disse-me para eu não ser mal-educada. Eu nunca fui mal-educada com o docente. Para mim foi muito desagradável. Foi muito mau. Foi diante dos meus colegas. Mesmo que não fosse. Outra, num seminário no ano passado, distribuiu uns textos por todos e depois disse-me para descrever a imagem. Nessa altura, senti-me muito mal. Não percebo o que ela queria provar! Como é que eu podia descrever a imagem se sou cega!!! Foi mesmo mau…. (Filipa) Houve uma professora de Geometria que me perguntou como é que me tinham deixado entrar na Faculdade, porque eu fui falar com ela, para dizer que eu estava com dificuldades em Geometria, não conseguia passar as coisas do quadro. Não foi nada receptiva, mas pronto. (Andreia) Eu tinha trabalhado o bastante para aquela cadeira, e participava bastante nas aulas, e ele deu-me treze, e eu no fim da aula cheguei ao pé dele e disse: você deve estar a gozar comigo, não é? “ai não, sabe que você é... o Francisco não é como os seus colegas que faça umas orais, e não sei quê..” “O quê? Você está-me dizer que está a dar-me essa nota por eu ser invisual?” (Francisco) O professor responsável por esse módulo [chegou a dizer-me] que este ano, no próximo semestre seria bem difícil porque tem o laboratório de química orgânica que é só experiências, totalmente só disso, dizia que eu não iria conseguir fazer porque já se trabalha com produtos mais perigosos e que comigo era difícil. Esse foi mesmo assim, deitou-me um bocadinho abaixo. (Bruno) Nessa cadeira eu estava completamente sozinha. Aquilo era feito em pares e eu era a única que estava sozinha, e mesmo que eu pedisse ajuda, algum colega para me ajudar a verter liquido e assim, a professora não queria, queria que eu fizesse sozinha. […] Não sei o que é que a professora quis […] O facto de estar sozinha nem chateava muito. O peso da responsabilidade é maior, mas eu gosto de fazer as coisas, mas aquilo é realmente uma coisa perigosa para mim [os colegas tentavam ajudar] Sim, sempre. Ela ralhava com eles. Era uma maneira de puxar por mim, mas por outro lado, era complicado. (Catarina)

O relato de Catarina é bastante revelador da atitude implícita da docente em marginalizála, porém, para a estudante, estar sozinha constituía um desafio para ela, uma forma de Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

conseguir demonstrar aos outros que também era capaz, apesar de estar consciente dos perigos que corria. Ainda sobre o relacionamento com os docentes, alguns estudantes revelaram algumas dificuldades no contacto directo com eles, quer para os elucidar sobre a sua condição física e estratégias pedagógicas a adoptar no seu caso, quer no pedido de materiais dados nas aulas, quer ainda em pedir ajuda para a compreensão da matéria. Para uns, subjacente a esse comportamento está o receio de serem discriminados posteriormente pelos docentes, para outros, a dificuldade em conseguir explicar a sua condição, mas em todos a vontade de não ser diferente, de não se expor. Eu pessoalmente tenho vergonha de perguntar novamente a matéria ao professor. (Elsa) Em relação aos professores não tomam a iniciativa para falar comigo e eu também tenho uma certa vergonha… (Catarina) Com os professores tiveram que se sujeitar. Porque eu não via, era verdade. Perguntavam-me o que é que eu tinha, dizia "tenho uma retinopatia, vejo 1/10 mas, pronto, não sei explicar muito melhor. (Bruno) Mas outra coisa que eu nunca pedi… que nunca tive a ousadia de pedir foi as aulas que eles dão, por onde se seguiam para eu tirar fotocópias para poder estudar por aí. […] Nunca tentei porque tenho medo de levar uma… vamos lá…. ser rejeitado… isso também. (Rodrigo) No início os professores não sabiam que eu ouvia mal, porque eu também não lhes dizia, não falava, era um bocado… estava um bocado lá para trás […] Não queria ser diferente dos outros, queria ser avaliada de forma igual e foi isso que mais ou menos aconteceu. (Daniela)

Daniela mudaria de opinião neste último ano lectivo, Porque vi que valia a pena, era uma grande diferença entre saberem e não saberem. Se sabiam, ajudavam-me… falavam mais na frente, escreviam no quadro, falavam mais alto, falavam mais para mim, claro para perceber.

Relacionamento com os funcionários Quanto ao relacionamento com os funcionários, os estudantes que se manifestaram sobre o assunto (Filipa, Paula, Marta, Patrícia, Sofia), afirmaram não ter razão de queixas, uma vez que estes sempre se mostram disponíveis para ajudar. A este respeito,

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apenas Sofia teve, no início, uma experiência bastante negativa, porém actualmente, precisando apenas do seu apoio pontual, considera que não tem tido problemas. Para Margarida, o modo como os funcionários reagem à sua presença depende da sua formação pessoal. Em termos de funcionários, depende do nível dos funcionários, a D. Conceição, as pessoas da secretaria foram sempre simpáticos e prestativos dentro daquilo que podiam, outro tipo de funcionários, empregadas da limpeza, empregadas das fotocópias, de um nível mais baixo social ou cultural, reagiram pior, do género, "O quê? Você não vê então como é que você estuda?", "como é que você não é capaz de ler o aviso que está ali pendurado e anda aqui pelos corredores.

No entanto, Margarida admite que a razão para esse comportamento possa estar relacionado com o facto de não usar uma bengala e aparentemente não ver tão mal quanto isso. Relacionamento com os órgãos de gestão No decorrer das entrevistas, três estudantes relataram alguns episódios em que estiveram envolvidos os órgãos de gestão das instituições que frequentam. Bruno mostrou-se bastante satisfeito com o diálogo que conseguiu estabelecer com o Conselho Pedagógico. Nessa conversa, breve, Bruno obteve o compromisso desse órgão em estabelecer o contacto com os docentes, de modo a que, a partir desse momento, fosse garantida a ampliação dos enunciados dos exames e outros materiais de apoio às aulas, medidas que viriam a ser seguidas em algumas cadeiras do 2.º semestre, contribuindo, desta forma, para a melhoria das condições no trabalho de laboratório. Porém, Marta e Paula têm uma experiência completamente diferente. Marta esteve um ano a tentar que lhe fosse concedido apenas o acesso ao parque de estacionamento dos funcionários, o único que oferece as melhores condições de acessibilidade ao edifício. No final do primeiro semestre, e após várias tentativas junto do órgão de gestão da Faculdade, a aluna conseguiu finalmente ter acesso ao referido parque, mediante o pagamento da taxa que é cobrada aos utilizadores habituais, mas sem direito a estacionamento em lugar reservado, o que forçava o seu familiar a estacionar na área destinada à passagem automóvel. Além disso, Marta receia que não possa frequentar as aulas de laboratório do próximo ano, dado que o acesso a essas salas se faz através de

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Apresentação dos Resultados

escadas e, apesar de ter comunicado essa situação ao órgão de gestão, ainda não tem garantia de que a instituição vá resolver essa questão. Paula, por outro lado, queixou-se da falta de diálogo por parte dos órgãos de gestão, afirmando sentir-se mesmo desiludida. Paula conta que nunca houve nenhum membro desses órgãos, apesar de lhes ter sido pedido apoio, que a recebesse pessoalmente, ou que se mostrasse disponível para a ajudar a ela e à sua colega: a mim parece-me quase pessoas invisíveis que estão ali, não há aquele à-vontade para propor seja o que for, porque parece que vou ser um pouco ignorada […] sei que a minha colega foi ter com eles, na altura precisava de aulas complementares, era para ver se os professores aceitavam dar, e eles na altura disseram que isso era completamente utópico, não valeria a pena pôr-se a questão. Nem sequer disseram que iam tentar!

Acessibilidade física e arquitectónica Da análise dos discursos dos estudantes (Paula, Leonor, Sofia), é possível verificar que ao nível da acessibilidade física e arquitectónica, tem havido uma melhoria gradual das condições, principalmente com a construção de novos edifícios. Contudo, esses edifícios, apesar de terem sido construídos a partir dos finais dos anos 9092, apresentam algumas características que dificultam a mobilidade dos estudantes. Patrícia considera que o acesso ao novo edifício da sua Faculdade é bastante difícil. Para Margarida, é dentro desse edifício que sente maiores dificuldades, Ainda agora no pavilhão novo, aquilo não está lá grande coisa, o chão é branco, os degraus são brancos, não nos permitiram pôr marcas nos degraus, as portas são de vidro… é bem iluminada, é verdade, mas é tudo branco, portanto, continua a haver dificuldades em mobilidade […] Nós queríamos pôr marcas nos degraus, como por exemplo no Metro, aquela barrinha mais escura, anti-derrapante na ponta do degrau, não nos permitiram, o arquitecto não deixou, o projecto é dele e nós não podíamos alterar… supostamente os edifícios públicos devem ter acessibilidade e tal e coisa.

Tanto para Margarida como para Patrícia os primeiros tempos são sempre muito difíceis dado que, nessa fase, terão que aprender a orientar-se e recorrer à ajuda de outros para identificar e localizar as salas,

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Em 1997 foi publicado o Decreto-Lei n.º 123/97 de 22/05 que torna obrigatório a eliminação de barreiras arquitectónicas em edifícios públicos para melhoria da acessibilidade das pessoas com mobilidade reduzida.

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Apresentação dos Resultados […] porque em absoluto os números na porta das salas não dá para ver, nem estão marcados em Braille ao lado, nem nada que se parece, nem existe nenhuma planta em relevo, nem coisíssima nenhuma desse género. (Margarida)

Para Catarina a maior dificuldade está no acesso a um lugar reservado no parque de estacionamento e no facto de ter de pagar esse acesso, apesar de não ter alternativa. Para alguns estudantes, a maior dificuldade prende-se com o acesso a determinadas salas e laboratórios (Marta, Leonor) ou à Associação de Estudantes, uma vez que o acesso só é possível através de escadas. Leonor afirma que a existência de um corrimão nas escadas que dão acesso a um dos anfiteatros facilitava muito a sua mobilidade e a ajuda dos colegas. Paula acrescenta ainda que o facto de a porta de entrada não ser automática e ser pesada força-a a pedir sempre ajuda para entrar na Faculdade. Actividade Académica Nesta categoria incluímos os relatos dos estudantes sobre o modo como têm acesso à documentação e bibliografia fundamental ao sucesso académico, as condições de avaliação que obtiveram durante o seu percurso, os equipamentos especiais de compensação, individual e/ou institucional, que têm ao seu dispor, e a participação em actividades específicas, como participação em grupos de trabalho, saídas de campo, trabalho laboratorial e programa europeu de intercâmbio de estudantes (Quadro 35).

QUADRO 35– Síntese da Categoria actividades académicas CATEGORIA

SUB-CATEGORIAS Documentação e bibliografia em formato adaptado Frequência de aulas

Actividades académicas

Condições de avaliação Equipamentos especiais de compensação Participação em programas específicos

Documentação e bibliografia em formato adaptado Em termos de actividade académica, o acesso à documentação e bibliografia fundamental, principalmente em formato adaptado, foi o assunto que mereceu maior interesse por parte dos estudantes. Segundo estes, a colaboração dos colegas, a título individual ou promovida por iniciativas de voluntariado, tem sido fundamental. São os colegas que lhes gravam ou digitalizam os textos de apoio às disciplinas (Filipa, Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

Margarida, Patrícia), que lhes cedem apontamentos das aulas (Daniela, Patrícia, Rodrigo, Andreia), que ajudam na pesquisa e acesso a livros da Biblioteca, ou de textos em Bibliotecas de texto integral online (Leonor, Sofia, Bruno). Para Beatriz, Francisco, Margarida Patrícia e Rodrigo, o lado mais negativo desse apoio é depender da vontade deles ou da sua disponibilidade. Além dos colegas, alguns estudantes referem que houve docentes que lhes forneceram directamente materiais de apoio dados nas aulas (Rodrigo, Beatriz), ampliados (Bruno) ou em suporte digital (Dulce). Nesse domínio, além do apoio de colegas e docentes, alguns estudantes referem ainda a ajuda de amigos e familiares (Beatriz, Patrícia, Filipa). Outros dos recursos referidos pelos estudantes para acesso a materiais de estudo são as Bibliotecas e áreas de disciplinas online (Filipa, Bruno, Margarida), os Serviços especiais de Bibliotecas de entidades externas (Beatriz, Francisco) e o serviço de produção de uma das unidades orgânicas (Beatriz, Margarida, Filipa). Apesar de serem variados os meios a que recorrem, os estudantes afirmaram sentir muitas limitações na quantidade de materiais de apoio que estão disponíveis em tempo útil (Filipa, Francisco, Margarida, Patrícia), facto que, para Margarida, a fazia sentir em situação de desvantagem em relação aos colegas, com repercussões nos resultados finais: A única coisa difícil, é que nem sempre havia gravações para todas as disciplinas e eu demoro muito tempo a ler em folhas ampliadas, portanto, houve muitas coisas que eu não consegui estudar, e de alguma maneira sentia-me prejudicada em relação aos meus colegas por causa disso. Quer dizer, eu tirei muitas vezes más notas, e tive imensa pena porque eram coisas que se eu pudesse ter estudado mais um bocadinho eu tinha conseguido eu tinha feito melhor, só que não consigo, não consigo ler mais depressa, não havia mais gravações…

Bruno acrescenta ainda que, apesar de parte dos materiais de apoio às aulas se encontrar online, só lhe é possível aceder aos mesmos a partir de casa, porque a sala de informática da Faculdade não dispõe de um único computador que reúna as condições de acessibilidade de que necessita. Por esta razão e pelo facto de alguns conteúdos estarem bloqueados à impressão quando acedidos a partir de casa, Bruno acaba por continuar a estar sujeito ao apoio dos colegas. Lília Aguardenteiro Pires

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Apresentação dos Resultados

Por outro lado, o acesso aos livros da Biblioteca com condições especiais de empréstimo é apenas referido por duas estudantes da mesma instituição, Filipa e Leonor. Por outro lado, Beatriz afirma que nunca recorreu à Biblioteca porque não há serviço de empréstimo, e Francisco, que pertence à mesma instituição, declara a bibliotecária teve a boa vontade, porque nem sequer está regulamentado, a não ser que agora já esteja, de nos deixar levar os livros para nós digitalizarmos. Um dia se mudar de bibliotecária, perde a boa vontade, já ninguém leva livros para casa. Porque ninguém pode levar livros para casa da biblioteca actualmente, […] Só nós é que podemos.

Francisco afirma que os docentes se escudam nos direitos de autor para não disponibilizarem obras ou materiais produzido por eles referindo ainda a questão da inexistência de livros de consulta para os cursos de ensino superior em CD-ROM. As editoras, conforme vendem dicionários e enciclopédias em CD-ROM, deviam ser obrigadas a fazerem igualmente esses livros, livros escolares principalmente. Também haver um suporte informático para as pessoas comprarem. Está a entender? Isto não existe. Uma coisa tão simples, eu estou farto de dizer isto a toda gente, e não consigo que as coisas mudem.

Frequência de aulas Como foi referido no ponto anterior, a natureza das unidades curriculares dos diversos cursos promovidos pelas Faculdades da UL pode variar entre teóricas, teórico-práticas, práticas, laboratoriais e estágios. Pela análise dos discursos dos estudantes, podemos constatar que os estudantes com deficiência auditiva (Elsa, Rodrigo, Daniela) sentem muitas dificuldades no acompanhamento das aulas teóricas, sobretudo devido à dimensão das salas onde são ministradas (Elsa, Daniela) e ao facto de os docentes não estarem atentos a algumas estratégias úteis, como usar microfone nas aulas, principalmente nos anfiteatros (Elsa, Daniela) ou manter-se no mesmo lugar, falando de frente para os alunos (Daniela, Rodrigo). Daniela e Rodrigo preferem as aulas práticas, dado que as turmas são mais pequenas e o contacto com os estudantes é mais individualizado. Ainda em relação a aulas práticas, Margarida e Patrícia relataram experiências muito positivas. Em ambos os casos, em disciplinas em que era necessário o recurso a

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computadores e software específico, os docentes tiveram a preocupação de instalar, nas salas de aula, os programas específicos de ampliação e de voz, que permitiram às estudantes participar nas aulas em igualdade de circunstâncias com os seus colegas. Experiências diferentes tiveram Catarina e Bruno em trabalho de laboratório. A falta de material ampliado, essencial ao trabalho a desenvolver com o equipamento do laboratório, e a falta de um assistente pessoal, no 1.º semestre, remeteram Bruno para mero espectador nas aulas de laboratório. Esta situação foi, no entanto, alterada no 2.º semestre, porém, sem garantias de continuidade no semestre seguinte. Catarina, que se encontra no mesmo curso e instituição, não teve a mesma oportunidade que o colega. Como já foi referido, além de ter sido discriminada por trabalhar sozinha, enquanto os colegas executavam as tarefas em pares, não teve a oportunidade de dispor de um assistente pessoal. Pelo contrário, segundo a estudante, no ano lectivo seguinte, será dispensada dessa componente, sendo apenas avaliada na parte teórica. No curso frequentado por Leonor são frequentes as visitas de estudo ou saídas de campo. Como depende de outros para as refeições, para usar os sanitários e para se deslocar, Leonor tem muitas dificuldades em participar nessas actividades. No entanto, durante o seu primeiro ano curricular, com o apoio de docentes e colegas, a aluna pôde participar em algumas delas. Para a estudantes esta foi uma experiência muito positiva, Eu acho que vai ficar marcada para a minha vida toda. […] Foi uma experiência muito boa, foi fora dos meus pais, é sempre bom termos a nossa vida privada mas sempre com ajuda de alguém.

Por fim, a modalidade de estágio, experiência em local de trabalho, nos cursos da UL, decorre no último ano de licenciatura. Paula e Daniela são as estudantes que se encontram nessa fase, porém, com perspectivas diferentes. Daniela já sabe onde vai estagiar. Para a estudante não foi fácil encontrar um local, tendo sido preterida em alguns por causa da sua condição. Contudo, o local de estágio, que conseguiu com o apoio de um amigo, mostra-se muito favorável: Mas para onde fui [aceite] foram, muito, muito simpáticos comigo, senti-me muito à vontade, também é uma firma pequena, acho que vai ser fácil, também tenho dificuldade em compreender um grupo grande, tenho de estar sempre a olhar para eles, não é? São rápidos, não dá para ler os lábios todos, e depois não percebo.

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Apresentação dos Resultados

Paula, por seu lado, apesar de não conhecer ainda os coordenadores do processo de atribuição de estágios, estava confiante em que eles vão dizer quais estão adaptados quais não estão; no entanto, sentia-se um pouco apreensiva relativamente à garantia da sua pontualidade, dado que nem sempre o transporte especial cumpre os horários. Condições de avaliação No que diz respeito ao acesso a condições especiais de avaliação, a maioria dos estudantes mostraram uma percepção positiva. Alguns referiram que não tiveram problemas em obter os enunciados das provas adequados às suas necessidades (Filipa, Patrícia, Margarida, Leonor, Dulce), nomeadamente desdobramento de prova e alteração de conteúdos (Leonor); em usar meios alternativos para a sua execução, como por exemplo computador portátil (Filipa, Patrícia, Paula, Leonor), e apoio de um assistente, em alguns dos casos o próprio docente (Margarida, Patrícia, Leonor); duração de prova superior ao estabelecido, (Margarida, Patrícia, Filipa, Andreia, Catarina, Beatriz), adiamento da prova (Filipa) e substituição de prova escrita por prova oral (Francisco). Para beneficiar destas condições, alguns estudantes afirmaram que tiveram de entregar na Secretaria da Faculdade um requerimento instruído com documentação comprovativa da sua deficiência (Beatriz, Elsa, Dulce, Francisco, Paula), confirmando posteriormente se os docentes possuíam essa informação. Outros afirmaram recorrer aos serviços específicos da Faculdade onde estão inscritos e à negociação directa com os docentes, com base na regulamentação interna, como meio para alcançar as condições mais adequadas (Filipa, Francisco, Margarida, Patrícia, Leonor). Foram, porém, relatadas pelos estudantes algumas experiências negativas nesta matéria. Francisco destaca o facto de, mesmo tendo apresentado o pedido na Secretaria, os docentes afirmarem, no dia da prova, que não tinham conhecimento da existência de uma situação particular; e também que outras vezes eles não estão preparados para responder às necessidades individuais dos estudantes. Olhe as vezes chegamos lá, cai-se em coisas tão ridículas como esta: está o exame marcado, chega lá o professor “ai, não sabia que havia uma pessoa invisual, não tenho ninguém que faça o exame. Não pode vir cá amanha à tarde?” […] eles próprios, muitos deles não sabem que as pessoas com deficiência visual fazem prova oral em vez da escrita, e depois muitos deles adaptam muito mal porque nos

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Apresentação dos Resultados obrigam a fazer o mesmo exame que os outro fizeram e, por ex, naquelas cadeiras que têm casos práticos, é aquilo que lhe estava a dizer, é muito complicado…

Bruno mencionou que durante o primeiro semestre alguns enunciados de provas de avaliação não estavam ampliados, prejudicando-o ao ponto de ter de repetir um exame em época especial, que estava desta vez ampliado, e no qual teve muito boa nota. Rodrigo e Elsa afirmaram que não lhes foi concedido mais tempo para realizar os exames. Elsa acrescenta: Acho que para os alunos com deficiência auditiva deviam ter mais uns minutos de tolerância, porque a compreensão deles é muito lenta, é muito mais difícil do que os outros. Até porque há certas perguntas que eles não percebem, precisam muito tempo para fazerem as respostas às perguntas que muitas vezes são abstractas, diferentes dos outros.

Equipamentos especiais de compensação Para o desenvolvimento dos seus estudos alguns dos estudantes necessitam de recorrer a equipamentos especiais de compensação, que na maioria dos casos são computadores, blocos de notas electrónicos, scanners, sistemas de ampliação de caracteres (hardware e software), e sistemas de ampliação de som. Beatriz, Bruno, Filipa, Francisco, Leonor, Paula e Patrícia referem que usam os seus próprios equipamentos para estudar e/ou tirar apontamentos nas aulas. No caso de Beatriz, Filipa e Paula, estes foram adquiridos através do Programa Nacional de ajudas técnicas, e de Leonor, com o auxílio de um mecenas. Dois estudantes beneficiaram ainda do apoio das próprias Faculdades na aquisição de um computador (Francisco) e de uma linha Braille (Patrícia). Nos casos de Bruno (software e equipamento de ampliação), Filipa (um bloco de notas electrónico que leva para as aulas para tirar apontamentos) e Francisco (um portátil) foram os próprios que os adquiriram, no caso de Bruno, com o auxílio dos pais, e no de Filipa e Francisco, com as suas poupanças da pensão social. Bruno, Leonor e Patrícia fizeram ainda referência a um programa promovido pela UL para atribuição de ajudas técnicas. Leonor e Patrícia informaram que tinham conhecimento de que lhes tinha sido autorizada a atribuição dos equipamentos que solicitaram, mas que ainda aguardavam o financiamento para o adquirirem. Bruno

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Apresentação dos Resultados

afirmou que tinha sido excluído do mesmo, porque uma vez que o meu pai era rico, eu não precisava de apoio. As Faculdades onde se encontram Leonor, Filipa, Margarida, Patrícia e Beatriz criaram um espaço próprio com equipamento específico que permite aos estudantes com deficiência preparar o seu material e estudar. Quanto à sua gestão, um encontra-se inserido na Biblioteca, outro, num serviço de apoio especializado no apoio aos estudantes com necessidades educativas especiais e o terceiro, autónomo, é gerido pelos próprios estudantes. Participação em programas específicos Por último, duas estudantes com deficiência visual, inscritas em unidades com apoio formalizado, relataram a sua experiência como estudantes ERASMUS. Ambas tomaram conhecimento desse programa através dos respectivos Serviços de Apoio, tendo a sua candidatura sido orientada pelo Gabinete responsável por esse programa que, na opinião de Margarida, foi bastante positivo, e na de Filipa, bastante negativa. Eu quando decidi ir para ERASMUS […] o Gabinete de Relações Externas foi contra […]Fez tudo por tudo para que eu não conseguisse resolver o meu processo e isso fez com que eu tivesse que recorrer ao Serviço de Apoio e explicar a situação para que as coisas fossem resolvidas. Os argumentos utilizados eram do género: as Faculdades lá fora não têm condições. O que é mentira. Na Bélgica há boas condições. E mais grave do que isso, foi terem pedido uma declaração à pessoa que estava responsável por mim, que se me acontecesse alguma coisa essa pessoa seria responsável. E eu já tinha 22 anos. Portanto, isso é mesmo muito grave.

Filipa acabaria por ver a sua situação resolvida com o apoio do Serviço de Apoio ao Aluno e de um docente. Questionadas sobre as diferenças entre as duas realidades, Filipa considera que as mais significativas diziam respeito ao tipo de documentos que os docentes utilizavam nas aulas. Na Faculdade de origem recorrem mais a antologias de textos em papel, e na Faculdade de acolhimento ao texto informatizado. Além disso, existia o serviço de transporte da própria Faculdade, que fazia o trajecto da residência para a Faculdade e vice-versa, o que foi muito útil para Filipa, pois sentiu algumas dificuldades de mobilidade devido às características da cidade.

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Apresentação dos Resultados

Margarida considerou que a grande diferença estava nas verbas de que a Faculdade dispunha para o apoio aos estudantes com deficiência, Tinham sobretudo mais meios financeiros para nos apoiar. No fundo era essa a grande diferença, porque aqui têm feito os possíveis, só com os voluntários. Lá não, pagavam.

Esta diferença, segundo a estudante, traduzia-se em melhores condições, sobretudo numa maior variedade e qualidade dos recursos materiais e humanos que estavam ao seu dispor.

Apoio Social Nesta categoria incluíram-se as afirmações dos estudantes acerca do apoio financeiro concedido pelos Serviços de Acção Social da UL, do atendimento nos refeitórios e residências da UL (Quadro 36).

QUADRO 36 – Síntese do Categoria Apoio social CATEGORIAS

SUB-CATEGORIAS Bolsa de Estudo

Apoio Social

Alimentação Alojamento

Dos estudantes que constituíram a amostra, apenas 5 eram bolseiros (Patrícia, Leonor, Marta, Elsa, Paula). Questionados sobre a bolsa que lhes foi atribuída pelos SASUL, todos se mostraram satisfeitos, considerando que supria as suas necessidades. No que diz respeito à alimentação, parte dos estudantes (Filipa, Leonor, Paula, Sofia) referiu que recorria com mais frequência aos bares e restaurantes sediados nas instalações dos estabelecimentos de ensino onde estão inscritos, em virtude de constrangimentos de horário e da distância a que se encontra o Refeitório. Todos os estudantes que declararam ter ido aos Refeitórios da UL (Bruno, Catarina, Francisco, Leonor, Margarida, Paula, Patrícia), disseram que o faziam normalmente na companhia dos colegas, mostrando-se satisfeitos com o atendimento, que incluía levar o

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tabuleiro até à mesa por parte dos funcionários. Apenas Bruno e Francisco relataram situações em que os funcionários se mostraram menos acessíveis para o fazer. Filipa foi a única estudante entrevistada que se encontra hospedada numa residência universitária, mostrando-se muito satisfeita com as condições que lhe são oferecidas. Sofia, que no início do curso teve necessidade de recorrer a alojamento em residências universitárias, afirmou que teve imensas dificuldades, porque a UL não dispõe de quartos adaptados, tendo sido colocada numa residência para idosos, que era mais onerosa que as residências universitárias, o que se reflectiu no valor da bolsa disponível para outras despesas.

6.2.2.4. A percepção dos estudantes com deficiência sobre o apoio prestado pelas Faculdades As percepções dos estudantes com deficiência sobre o apoio prestados pelas Faculdades subdividem-se em duas categorias, conforme o Quadro 37.

QUADRO 37 – Síntese do Tema Percepção do apoio prestado pelo estabelecimento de ensino TEMA Percepção do apoio prestado pelo estabelecimento

CATEGORIAS Positiva Negativa

Dez dos estudantes entrevistados (Bruno, Catarina, Daniela, Dulce, Filipa, Leonor, Margarida, Marta, Patrícia e Sofia) têm uma percepção positiva do apoio prestado pelo estabelecimento de ensino onde estão inscritos. Catarina, Daniela e Dulce consideraram que não têm razão de queixas, que sempre tiveram o apoio que pediram ou de que necessitavam. Margarida e Sofia afirmaram que o apoio é positivo e que tem vindo a melhorar ao longo dos anos, circunstância que, para Margarida, é consequência da insistência dos próprios estudantes que ainda não é o ideal devido à falta de recursos financeiros da instituição. Leonor considera que o apoio foi exacto, desde que frequenta o ensino superior ainda não teve de recorrer ao apoio da mãe, seu suporte nos anos

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anteriores. Por fim, Marta considera o apoio positivo, apesar de ainda não ter sido garantido para o próximo ano lectivo o acesso aos laboratórios. Bruno e Filipa consideraram que o apoio foi razoável. Filipa, no entanto, acrescenta que sempre teve o apoio de que precisava. Patrícia considerou que o apoio foi contraditório, em virtude de nem sempre ter usufruído do apoio necessário em termos de materiais em igualdade de circunstâncias com os colegas. Andreia, Beatriz, Francisco, Elsa, Paula e Rodrigo têm uma percepção negativa das condições de estudo nos estabelecimentos onde estão inscritos. Beatriz afirmou estar bastante desiludida, porque não teve apoio da instituição, e que conseguiu concluir o ano graças à boa relação que estabeleceu com os docentes e aos recursos que conseguiu obter por iniciativa própria. Rodrigo e Francisco, que frequentam a mesma instituição, também partilham da mesma opinião, Rodrigo, acrescentando que tem sido muito difícil sozinho e Francisco afirmando Não há apoio. […] Se não fosse a boa vontade… estávamos tramados. Por outro lado, Andreia e Elsa associam a sua opinião à falta de sensibilidade e compreensão demonstradas pelos docentes relativamente às suas dificuldades. Quanto a Paula, o factor que influencia a sua opinião diz respeito ao modo como os órgãos de gestão e serviços tratam os estudantes com deficiência. É muito má. Eu acho, por exemplo nunca ninguém veio ter comigo […] não houve preocupação nenhuma em saber se precisava de alguma coisa, não houve ninguém que fosse falar comigo a perguntar como as coisas estavam a correr […] há um desconhecimento, naquela Faculdade, um desconhecimento sobre os nossos direitos e nosso estatuto.

6.2.2.5.

Sugestões para a melhoria das condições de estudo no ES

Tendo em consideração a sua própria experiência e a de outros colegas, os estudantes entrevistados deram algumas sugestões para a melhoria das condições de estudo, que se aplicam tanto ao estabelecimento de ensino onde estão inscritos, como a outros do mesmo nível de ensino, que se sintetizaram nas categorias indicadas no Quadro 38. Sobre esta questão, apenas uma estudante (Dulce) não deu o seu contributo.

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Apresentação dos Resultados QUADRO 38 – Síntese do tema Sugestões para a melhoria das condições de estudo dos alunos com deficiência no ES TEMA

CATEGORIAS Sensibilização e formação de docentes

Apoio formalizado Sugestões para a melhoria das condições de estudo dos alunos com Recursos materiais deficiência no ensino superior Divulgação de boas práticas Sem opinião

Daniela, Andreia, Bruno, Catarina, Elsa e Francisco fazem incidir as suas sugestões na formação e sensibilização dos docentes. Catarina, Daniela e Elsa consideram que os docentes deviam compreender, por um lado, as dificuldades dos estudantes com deficiência auditiva, e, por outro, conhecer e aplicar as estratégias a utilizar em sala de aula, Eles no princípio usavam o microfone… nos anfiteatros, nas salas maiores, isso ajudava muito [...] Essas coisas são boas para todos não só para mim. Escrever mais no quadro, não sei, as coisas principais… estar sempre à frente a olhar para os alunos, não para o quadro ou para o lado… são coisas assim pequenas que podem fazer uma grande diferença… Ah!, não falar muito rápido… e pouco mais. (Daniela)

Nesse sentido, Bruno defende uma maior proximidade entre docentes e estudantes. Catarina parece concordar, afirmando, Primeiro têm que tomar conhecimento das pessoas, dos alunos e das suas deficiências, e tomar uma atitude que possa melhorar.

Andreia recomenda que os docentes se informem, todos os anos, do Estatuto Especial vigente na sua Faculdade, porque Eles só se lembram dos alunos que trabalham. Noto muito isso. Com os alunos trabalhadores é diferente, têm mais atenção, pelo menos é o que eu sinto.

Francisco afirma que a instituição não se deve limitar a aceitar os estudantes na sua condição, mas igualmente criar condições e formar os docentes.

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Apresentação dos Resultados Consagrar de uma vez por todas [o apoio aos estudantes com deficiência] e informar os professores devidamente como é que se trabalha com pessoas com deficiência, como se faz a avaliação, como a avaliação está prevista… a existência de livros e manuais para que as pessoas não terem de andar a correr de um lado para o outro e andarem a pedir aos pais.

Beatriz, Francisco, Paula e Sofia centram as suas sugestões nas estruturas formais de apoio. Para estes estudantes é fundamental existirem nos estabelecimentos de ensino serviços especializados ou pelo menos uma pessoa de contacto que tenham a responsabilidade de acolher os estudantes com deficiência, de organizar e providenciar os apoios necessários. [os apoios aos estudantes com deficiência] essas coisas deviam estar igualmente regulamentadas, as pessoas têm de ser... se existe um regulamento para estudantes na generalidade, teria de haver igualmente as condições especiais para pessoas, ou seja, tratar de forma diferente aquilo que não é igual. (Francisco) Era importante que houvesse um departamento, nem que não fosse especial mas… pronto, vai chegar alguém com problemas então vai ter com essa pessoa e vamos perceber realmente o que ela necessita… não sei, com um professor e um aluno, por ex., ou então, qualquer coisa, que por muito pequenina que fosse, acho que valia a pena… (Paula) Eu conheço pessoas […] que estão em outras Faculdades que não têm qualquer tipo de apoio, não há material não há nada, portanto, eu acho que o que falta, é um gabinete de apoio, ou um departamento, um sítio onde as pessoas saibam onde possam recorrer. Um sítio onde sejam facultado um maior tipo de apoio em termos livros, em termos de enunciados de testes, na altura dos exames, das frequências... enfim, onde as pessoas possam recorrer sempre que tenham um problema na própria Faculdade. (Beatriz) Eu acho que não só ali naquela Faculdade, como em todas eu penso que deveria existir um funcionário para acompanhar o deficiente […] Portanto, a quem o aluno se pode dirigir no caso de ter uma necessidade. (Sofia)

Margarida, por seu lado, defende a existência de um Estatuto Especial para estudantes com deficiência que possa ser aplicado em todas as instituições de ensino superior, porque considera que o Estatuto Especial em vigor na sua Faculdade Foi uma grande base, acho que aquilo se não estivesse lá, teria sido mais difícil a convencer professores a darem-nos tempo para exames tipo, negociar quanto tempo temos direito ou não, e esse tipo de coisas. […] Isso iria ajudar os alunos a lutar contra os professores, entre aspas, que não acreditam, ou que não querem ajudar.

Opinião partilhada por Francisco que está inscrito numa instituição sem apoio formalizado

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Apresentação dos Resultados […] essas coisas deviam estar igualmente regulamentadas, as pessoas têm de ser... se, existe um regulamento para estudantes na generalidade, teria de haver igualmente as condições especiais para pessoas, ou seja, tratar de forma diferente aquilo que não é igual.

As preocupações e sugestões de Rodrigo, Patrícia e Filipa vão para o acesso a materiais de estudo. Rodrigo sugere que os docentes forneçam os seus apontamentos que levam para as aulas aos estudantes surdos. Patrícia e Filipa dão sugestões para a produção de materiais disponíveis em formato alternativo, É ajudar-nos a passar os diversos materiais ou tentar arranjar alternativas quando nós não temos os materiais em formato electrónico. (Patrícia) Embora haja muita coisa na Internet, a Internet não tem tudo. Há muita bibliografia que é preciso consultar na biblioteca. Obviamente que isso não está preparado. (Filipa)

Filipa e Rodrigo concluem Se as pessoas pagam propinas têm de ter os mesmos direitos que outros. Se os nossos colegas têm direito aos materiais, nós também.” Um curso sem existir livros, não é curso. Se não há acesso à cultura, aos livros, as pessoas nunca podem fazer as coisas igualitariamente. Se já temos um handicap e se não temos à mão as coisas para que nos facilite de certa forma a levar uma vida como os outros, é complicado… é complicado.

Francisco sugere ainda, A adaptação da biblioteca. Ter computadores, porque é que havemos de ter uma sala e…. se a biblioteca tem gabinetes, porque é que… porque não… os computadores… os computadores que lá estão… um computador dá perfeitamente para pôr uns auscultadores, já não está a incomodar ninguém, não é? Porque é que os computadores não têm instalado lá o nosso programa, o software de leitura do ecrã, para nós podermos utilizar a Internet, para fazermos… para podermos utilizar o computador como utilizam as outras pessoas…

Leonor e Marta, nas suas sugestões, dão ênfase à divulgação de boas práticas e de experiências bem sucedidas de estudantes com deficiência, nomeadamente em áreas que tradicionalmente não são escolhidas por esses estudantes. Eu acho, primeiro não está muito divulgado as condições que as Faculdade têm para deficientes. Depois as escolas preparatórias e secundárias não têm conhecimentos do que é o ensino superior, quais as vantagens que o ensino superior dá aos deficientes […] Eu acho que há pouca informação. Acho que há falta de informação nas escolas. (Leonor)

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Apresentação dos Resultados Acho também que deveriam ser feitas talvez mais campanhas de sensibilização acerca dos cursos porque, pelo que tenho visto, as pessoas com deficiência limitam-se a ir para aqueles cursos onde não têm de ter algum trabalho, entre aspas, por exemplo cursos de informática, cursos de gestão. São aqueles cursos que não têm, sei lá… não têm nada prático. Tudo bem que nós temos algumas limitações mas, acho que poderíamos ir mais longe. Ficar naquele meio. Há outras coisas que podemos fazer noutras áreas. (Marta)

Concluímos com as sugestões de Francisco e Marta que consideram que se os estudantes com deficiência têm os mesmos direitos que os outros colegas, e que, se os estabelecimentos de ensino não oferecem condições de estudo favoráveis aos estudantes com deficiência, então, esses estabelecimentos devem impedi-los de frequentarem os cursos que promovem; em vez de defenderem que se criem as condições de acessibilidade necessárias para que os estudantes possam demonstrar as suas aptidões e conhecimentos. Acho que deveria ser feita talvez uma fiscalização às Faculdades para saberem se realmente tem condições. E se não tiverem condições, acho que realmente não devem aceitar as pessoas nas Faculdades, ou então, por exemplo, quando não nós fazemos as candidaturas, se somos seleccionados para aquela Faculdade, é porque temos meios para frequentar, acho que se não tiverem meios, realmente acho que, não devem aceitar, ou dizerem à partida que não é possível, acho que não deveriam aceitar as candidaturas se realmente não tem condições para receberem esses alunos.

Ainda para Francisco o cerne da questão está na responsabilização das instituições de ensino perante os estudantes que acolhem. As Faculdades limitam-se a admiti-los [os estudantes com deficiência] e depois lavam as mãos daí para fora. E não há mais apoio nenhum. […] E dar condições, lembrar-se… "espera ai…nós temos cá alunos com deficiência… e de uma vez por todas as pessoas assumirem que as coisas existem, que há pessoas diferentes que estudam de maneira diferente, têm ritmos diferentes, se calhar. Os alunos com deficiência até acabam por ser bons alunos… a maior parte, só que lá está, não se imagina o esforço que é preciso fazer.

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Capítulo 7 - DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Procuramos neste capítulo, num primeiro ponto, discutir os dados obtidos no nosso estudo, considerando-os em dois domínios: o das políticas, medidas e recursos disponibilizados na UL para a uma melhor qualidade de ensino oferecido aos estudantes com deficiência, e o das experiências e percepções dos estudantes sobre essas mesmas iniciativas. Num segundo ponto, fazemos uma breve referência aos apoios que os estudantes obtiveram nos níveis de ensino anterior e aos factores que influenciaram a sua decisão de ingressar no ensino superior; discutimos ainda os dados relativos à experiência dos estudantes, abordando a fase de entrada no estabelecimento de ensino, o relacionamento interpessoal, a acessibilidade física e a actividade académica, sendo que a classificação e análise em factores negativos (barreiras) e positivos (facilitadores) corresponde a uma apreciação subjectiva do investigador.

7.1. Políticas e recursos das unidades orgânicas da UL dirigidos aos estudantes com deficiência A Universidade de Lisboa é uma instituição de ensino universitário público em que cada Faculdade goza de autonomia científica, pedagógica, administrativa e financeira, regendo-se pelos princípios de gestão democrática onde todos os corpos participam nos órgãos de gestão (excepto o do científico, onde apenas participa o corpo docente doutorado). Em termos formais, as unidades orgânicas da UL têm a mesma estrutura interna de gestão, embora na prática cada uma siga modelos diferentes de gestão. A UL não possui uma política de apoio a estudantes com deficiência comum a todas as unidades orgânicas. Em situação de conflito entre instituições e estudantes, na maioria das vezes esse conflito é resolvido caso a caso pelos Serviços Académicos, salvaguardando a autonomia das unidades orgânicas e os recursos humanos, técnicos e financeiros que estas afirmam possuir ou não. Na prática, tal como se pode constatar pelos exemplos de outras instituições estrangeiras congéneres, este é um argumento muitas vezes usado para desculpar alguma inércia na procura de soluções que respondam às necessidades sentidas pelos estudantes, constituindo uma forma de discriminação passiva, segundo Fitchen (1998).

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Discussão dos Resultados

Ao não definir uma políticas comum de não descriminação com base na deficiência, a Reitoria da UL é, por Lei, responsável pelas práticas de discriminação que possam ocorrer nas unidades orgânicas que a constituem, dado que em termos estatutários lhe compete, no âmbito das actividades do Senado, entre outras, estabelecer as grandes linhas da política universitária e acompanhar e apreciar a sua execução. No que diz respeito às orientações e medidas veiculadas pelas Faculdades da UL constatámos três realidades distintas: as instituições, duas ligadas à área da saúde, que afirmam não ter inscritos nos seus cursos estudantes com deficiência, e por conseguinte, não possuem quaisquer medidas ou orientações nesse domínio; as Faculdades frequentadas por estudantes com deficiência com apoio formalizado (serviços de apoio especializado e comissões específicas), três ligadas às áreas das Humanidades, Ciências e Artes; e as Faculdades sem apoio formalizado, uma, ligada à área das Ciências Jurídicas, com referência a algumas orientações específicas para o processo de avaliação, no Regulamento Geral de Avaliação, e outras duas, nas áreas da Saúde e Psicologia, sem qualquer orientação ou medida específica para estes estudantes. Na Faculdade de Belas-Artes constatámos que a Comissão de Acompanhamento pertence ao Conselho Pedagógico e é constituída apenas pelo presidente do referido órgão, e a sua função restringe-se à informação de docentes e serviços sobre a condição do estudante e sobre os apoios a conceder previstos no Estatuto especifico destes estudantes. Os estudantes entrevistados que se encontravam na Faculdade de BelasArtes, revelaram que desconheciam a existência da Comissão e que foram informados, durante o processo de inscrição, pelos colegas da Associação de Estudantes da existência de um regulamento específico. Os serviços de apoio formalizados situam-se nas duas unidades orgânicas da UL com maior número de estudantes e que outrora foram igualmente frequentados por mais estudantes com deficiência. Tal como se verificou em outros estudos, também neste os estudantes com deficiência expressaram uma opinião bastante positiva relativamente à intervenção desses serviços. No caso da Faculdade de Ciências, dado a sua organização interna, os estudantes têm ao seu dispor, além do serviço especializado, uma comissão específica onde estão representados, que consulta anualmente todos os estudantes com deficiência procurando

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definir as estratégias de intervenção em função das necessidades expressas por estes e, em cada departamento, um docente nomeado como seu tutor. Em contraste, na Faculdade de Letras cabe apenas ao serviço especializado o contacto com cada estudante e a organização dos apoios em função das necessidades individuais, recorrendo a programas de voluntariado para a produção de materiais em suporte alternativo e apoio individual, sendo ainda da sua responsabilidade o contacto com os docentes. O serviço tem ainda promovido algumas iniciativas de formação relacionadas com as necessidades educativas especiais, contudo, com muito pouco sucesso devido à pouca adesão da comunidade académica, principalmente do corpo docente. Experiências semelhantes produzidas por serviços especializados sediados em outras instituições universitárias nacionais comprovam que, quando essas iniciativas são apoiadas por órgãos de gestão dessas instituições, a comunidade académica participa em maior número. Pudemos constatar, na linha das políticas emergentes neste domínio em outros países (EUA, Reino Unido e Austrália), bem como dos autores que citámos anteriormente (Correia, 2003; Rodrigues, 2003; Canário, 2006), que a valorização da participação dos estudantes nas iniciativas institucionais que lhes são dirigidas a estes e a formação da comunidade académica são alguns dos requisitos para uma escola mais inclusiva. Ambas as instituições, através dos serviços especializados, parecem determinadas na melhoria dos serviços prestados a estes estudantes, promovendo algumas iniciativas, no caso da Faculdade de Ciências, um programa de Voluntariado com as mesmas finalidades que o da Faculdade de Letras, e nesta, um programa de formação para a diversidade dirigido à comunidade académica e o levantamento de barreiras arquitectónicas. Os programas de Voluntariado, têm como objectivo primordial responder às necessidades imediatas dos estudantes, porém, afiguram-se igualmente como um meio de formação e educação dos estudantes universitários em valores como a solidariedade, tolerância e mudanças de atitude face à diferença. A Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação parece igualmente estar a dar os primeiros passos nesta área, ao criar um serviço de apoio ao aluno, com entrada em funcionamento prevista para o ano lectivo de 2006/2007, tendo como um dos públicos alvo os estudantes com deficiência.

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Ambos os serviços actualmente em funcionamento tentam, por um lado, responder às necessidades individuais dos estudantes, procurando encontrar as melhores soluções para as suas dificuldades, por outro, propor alterações ao meio, de modo a que este se torne mais inclusivo. Na prática, a sua intervenção decorre num continuum entre o modelo médico e o modelo social, muito próxima do modelo que Brown et al. (1991) designaram por modelo tradicional, apresentando algumas iniciativas que também os aproxima um pouco do modelo integrado, proposto por Van Meter (1993). A comunidade académica é constituída por membros que pertencem à sociedade, e como tal transmitem para a universidade os seus valores. Neste domínio os serviços específicos têm um papel fundamental em informar e formar essa mesma comunidade, promovendo mudanças de atitude e de cultura. Iniciativas como as já referidas de: voluntariado, formação junto da comunidade académica e intervenção directa junto de docentes, constituem um primeiro passo nesse sentido. No desenvolvimento de um acompanhamento eficaz aos estudantes com deficiência é essencial o desenvolvimento de um trabalho técnico especializado e interdisciplinar em articulação com os órgãos de gestão das instituições de ensino (Patrício, 2002). Todavia, a falta de recursos humanos e financeiros, e a dependência dos órgãos de gestão, quando aqueles que pertencem a esses órgãos estão pouco sensíveis a esta problemática, limitam a intervenção e influência dos serviços. O percurso e a intervenção dos serviços especializados em funcionamento comprovam essa mesma ideia, tanto mais que ambos os serviços foram inicialmente institucionalizados e dinamizados por mediação de elementos que pertenciam, à data, aos Conselhos Directivos de cada instituição.

Nas Faculdade de Ciências, Direito e Letras estão disponíveis, em locais reservados, tecnologias para os estudantes com deficiência, adquiridas pelas próprias instituições. Estas procuram assim não excluir os estudantes permitindo-lhes o acesso a meios essenciais ao seu trabalho, mas, por outro, segregam-nos, criando espaços próprios que os afastam dos locais onde está instalado o mesmo tipo de meios que se destinam ao uso de todos os estudantes. Deste modo, as instituições desperdiçam meios e recursos,

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porque o mesmo espaço, e, em alguns casos, o mesmo equipamento, podem ser utilizados por estudantes com e sem deficiência, e, principalmente, desperdiça-se uma excelente oportunidade de mostrar as aptidões e potencialidades dos estudantes com deficiência quando lhes são dadas condições de autonomia, o que iria naturalmente contribuir para uma mudança de atitudes da comunidade académica. Comprovam-se assim as razões apontadas pela UNESCO (2003) para que as instituições façam mais investimentos em ambientes mais inclusivos. O argumento mais usado pelas instituições para justificar a opção de colocarem os equipamentos específicos em locais reservados é que esse equipamento é muito oneroso e, se estiver num espaço público, acabará por se danificar com maior facilidade por mau uso em virtude da curiosidade daqueles que não necessitam dele. Não obstante, a realidade da Faculdade de Direito, relatada pelos próprios estudantes, comprova que a atribuição de um espaço isolado e reservado para o efeito, que não pertence a ninguém, não garante a protecção e conservação desse mesmo material. A menção dos direitos dos estudantes com deficiência em regulamentos internos das unidades orgânicas reflecte, em certa medida, o modo como essas mesmas instituições encaram a sua responsabilidade de lhes garantir um ensino de qualidade. Verificámos, no entanto, que alguns estudantes de instituições com e sem apoio formalizado, revelaram estar pouco informados sobre os regulamentos existentes nas suas instituições. Uns mostraram-se convictos de que as condições especiais para a realização de provas de avaliação e exames estavam regulamentadas, quando isso não corresponde à realidade, tanto mais que, num dos casos, a instituição nem sequer possui qualquer tipo de regulamento pedagógico; outros afirmaram desconhecer o teor do estatuto do estudante com deficiência em vigor na instituição que frequentam. Em consonância com o afirmado por Beilke e Yssel (1999) e Kowalsky e Fresko (2002) aferimos que tem havido alguma preocupação das unidades orgânicas da UL em investir directa ou indirectamente na eliminação de barreiras arquitectónicas. A construção de novos edifícios veio melhorar a mobilidade dos estudantes com deficiência, não obstante, a experiência relatada pelos estudantes mostra que ainda persistem algumas barreiras que lhes condicionam a sua mobilidade e acesso a determinadas áreas determinantes para a sua formação, o que também é corroborado pelos estudos de Riddell et al. (2005), entre outros. Lília Aguardenteiro Pires

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Neste domínio, uma das instituições mostrou algumas reservas em proceder à eliminação das barreiras que impedem uma estudante de ter acesso a uma das áreas de trabalho no estabelecimento. Os argumentos apresentados são a falta de financiamento que cubra a despesa inerente à remoção dessas barreiras e o facto de os cursos promovidos pela instituição terem pré-requisitos: por isso não compreendem como é que a estudante está inscrita no curso que frequenta. O pressuposto subjacente a esta argumentação está na acepção de que o problema é da estudante, por conseguinte, a instituição assume que não é responsável pela sua resolução. O pretexto da falta de financiamento serve assim, mais uma vez, para justificar a inércia da instituição na garantia do direito da estudante à educação, nomeadamente à igualdade de oportunidades de ensino-aprendizagem. Uma outra estudante relatou que, na sua instituição, apesar da intervenção do serviço de apoio e comissão de acompanhamento e dos esforços do órgão de gestão, o arquitecto que projectou o novo edifício não autorizou a inserção de alterações pouco significativas no edifício, que iriam melhorar substancialmente a mobilidade dos estudantes com baixa visão, atitude que contraria o estipulado pelo Decreto-Lei 123/97 de 22/05 em vigor na altura. Em síntese, a Universidade de Lisboa não possui uma política comum de protecção dos direitos dos estudantes com deficiência, sendo da competência das unidades orgânicas a implementação dessas mesmas políticas. Nas instituições em que existem serviços específicos, a sua preocupação fundamental incide na resposta às necessidades individuais dos estudantes, desenvolvendo, pontualmente e em função do apoio recebido dos órgãos de que dependem e dos recursos humanos e materiais de que dispõem, actividades que visam produzir modificações no meio e na cultura da comunidade académica local. A acessibilidade física tem melhorado em algumas das unidades orgânicas, em consequência de investimentos das instituições nessa área e da construção de novos edifícios. O acesso à informação é possível a alguns estudantes com deficiência que frequentam instituições que investiram em serviços de produção de materiais em suporte alternativo e que adquiriram tecnologias para uso individual.

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7.2. A Experiência e percepções dos estudantes com deficiência

Experiência antes de ingressar no ensino superior Todos os estudantes com deficiência entrevistados frequentaram anteriormente escolas de ensino regular tendo usufruído de apoios educativos, previstos pela regulamentação em vigor, como material didáctico especial, condições especiais de avaliação, apoio pedagógico acrescido. Nos níveis de ensino anteriores, os estudantes referiram que sentiram fundamentalmente dificuldades no acesso atempado a materiais didácticos especiais e a tecnologias de apoio concedidas através dos fundos do Ministério da Educação. O apoio dos professores de ensino especial também foi referido pelos estudantes, uns como facilitador, organizando todos os apoios necessários aos estudantes, outros como uma barreira do seu processo de inclusão, pelo facto de não terem sido colocados, ou então, por proporcionarem o apoio aos estudantes em função dos próprios referenciais. Pelo que podemos depreender das afirmações de duas das estudantes com deficiência, foram os próprios professores de apoio que tentaram contrariar as suas pretensões em continuar os estudos além do ensino secundário. Na perspectiva de Wolanin e Steele (2004), essa atitude tem consequências negativas no futuro, visto os professores não prepararem convenientemente os estudantes para os desafios do nível de ensino que se segue, nem lhes proporcionarem oportunidades de contactar com a realidade que lhe está subjacente. Aferimos deste e de outros factos relatados pelos estudantes que tanto os professores de apoio como as próprias escolas não estão informados da realidade dos estudantes com deficiência no ensino superior. Este facto contribui para um agravamento das dificuldades de adaptação comuns na transição para o ensino superior. Não obstante, os próprios estudantes e familiares não devem restringir-se à informação veiculada pelos Guias de Acesso oficiais, mas tomarem a iniciativa de contactarem os estabelecimentos de ensino superior e, dentro destes, os departamentos ou coordenadores dos cursos que pretendam frequentar, aliás, prática seguida em parte por alguns dos estudantes

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entrevistados. Deste modo, com o conhecimento da dinâmica da instituição e dos próprios cursos (deveria ser igualmente dada a possibilidade de os estudantes assistirem a algumas aulas de unidades curriculares nucleares), tanto estudantes como estabelecimentos de ensino superior poderão preparar-se antecipadamente, minimizando alguns dos problemas de inserção no novo sistema, referidos pelos estudantes participantes neste estudo e por Wolanin e Steele, (2004). Lourtie (1999) defende igualmente uma maior aproximação das estruturas de apoio do ensino secundário com as instituições de ensino superior. Candidatura ao ensino superior O ingresso no ensino superior através do contingente especial de acesso foi visto pelos estudantes como um meio facilitador da sua inserção no ensino superior, em alguns casos, como uma garantia de acesso ao curso que pretendiam. Deste modo, apenas uma estudante não ingressou na primeira opção de candidatura, por problemas administrativos no decorrer do processo. No estudo realizado por Mazzoni (2003), a maioria dos estudantes manifestaram-se discordantes quanto à proposta da reserva de vagas, argumentando que possuem as mesmas competências que os seus pares para concorrer ao concurso geral, encarando esta medida como um incentivo à discriminação social com repercussões negativas em termos de mercado de trabalho. Nas escolhas dos cursos/estabelecimentos de ensino, os estudantes referiram factores que influenciaram as suas escolhas que parecem estar em consonância com os relatados pelos estudantes que participaram no estudo realizado por Shevlin et al. (2004): preferência ou fascínio pela área de estudo em questão, influência de amigos, experiência de familiares, motivos económicos, condições de acessibilidade que a instituição oferecia e facilidade de transportes. Experiência no ensino superior Acolhimento No momento da transição, além dos desafios habituais de uma mudança de escola e de nível de ensino, a experiência relatada pelos estudantes mostra que estiveram sujeitos aos olhares de estranheza e aos comentários discriminatórios de colegas, docentes e funcionários; além destes, factores relacionados com a sua própria subjectividade e

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atitude perante a sua condição foram referidos como condicionantes das relações interpessoais iniciais. Nos primeiros dias, as actividades de acolhimento organizadas pelos serviços de apoio formalizados e pelos departamentos foram referidas de um modo muito positivo, afigurando-se como um factor facilitador da inserção dos estudantes nos estabelecimentos de ensino. No decurso dessas actividades, os estudantes ficaram a conhecer de que recursos dispunham na instituição e estabeleceram os primeiros contactos com docentes, técnicos e tutores que os iriam acompanhar ao longo do percurso académico. Relacionamento interpessoal e institucional Ainda em relação ao relacionamento interpessoal e institucional, dos discursos dos estudantes emergem claramente barreiras e factores facilitadores da sua inclusão. Os estudantes entrevistados manifestaram que encontram nos colegas apoio, incentivo e compreensão e expressam isso em frases como: eles encaram-me como uma deles, tu nunca vais ser deficiente e eles ajudavam-me. Os estudantes com deficiência destacaram, como factores facilitadores, a sensibilidade e compreensão e tratamento com normalidade ou sem diferenciação evidenciado por alguns docentes e colegas, e ainda o auxílio destes em algumas actividades académicas e pessoais, por iniciativa própria ou inseridos em projectos de voluntariado, o que parece estar em consonância com as afirmações de Fuller et al. (2004). O facto de determinados departamentos e docentes terem tido alguma experiência no trabalho com estudantes com deficiência parece, segundo uma das estudantes, facilitar a integração do estudante, o que parece estar em consonância com as conclusões de Rao (2004). Os comportamentos de discriminação, de estranheza e desconforto de colegas, docentes e funcionários são igualmente referidos pelos estudantes como barreiras à sua inclusão, relacionando-os com a falta de conhecimento sobre a sua condição e formação, o que parece estar em consonância com as afirmações de Kowalsky e Fresko (2002), Ouellett (2004) e Rao (2004) e com os resultados do estudo realizado por Massini et al. (2006). Por outro lado, alguns dos estudantes são de opinião que os docentes falham nas práticas pedagógicas, muitas vezes porque aparentam pouco interesse, não só para com eles mas

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por todos os estudantes. É então pertinente questionar que tempo e atenção dedicam os docentes aos seus estudantes, em particular a este grupo estudantil. A experiência dos estudantes cuja condição não é tão perceptível, em particular os estudantes com baixa visão, comprova as afirmações de Beilke e Yssel (1999) e Mazzoni (2003) de que estes estudantes estão sujeitos à desconfiança de colegas, funcionários e docentes. Alguns estudantes afirmaram que não informaram os docentes da sua condição por vergonha ou por medo de serem discriminados, acabando, como diria Fitchen (1998), por criar as suas próprias barreiras, enfrentando dificuldades eventualmente desnecessárias, como acabaria por concluir uma das estudantes do presente estudo. As dificuldades e insegurança dos estudantes em comunicar tanto a docentes como às próprias instituições os problemas que sentem e os apoios que necessitam, segundo Wolanin e Steel (2004) revelam pouca autonomia, eventualmente consequência de demasiada protecção e pouca participação no próprio projecto educativo nos níveis de ensino anterior. Acessibilidade física e arquitectónica Contrariamente aos resultados de estudos referidos anteriormente (Borland e James, 1999; Tinklin e Hall, 1999; Holloway, 2001, Mazzoni, 2004; Shevlin et al., 2004; Wolanin e Steele, 2004), os estudantes entrevistados assinalam algumas barreiras em termos de acessibilidade, porém não lhes atribuíram grande significado, visto que, segundo as suas opiniões, essas barreiras condicionam-lhes o acesso a determinados locais na instituição mas não os privam de ter acesso aos locais que obrigatoriamente têm de frequentar, e tem alternativas. Apenas uma estudante centrou as suas principais preocupações na acessibilidade física, referindo, em conjunto com outra colega, referiram a dificuldade ter acesso a lugares de parqueamento adequados e gratuitos. As dificuldades em termos de acessibilidade física e arquitectónica são variadas e, conforme a condição de deficiência, o que é considerado uma barreira para uns talvez não o seja para outros, o que significa que, mesmo que este grupo considere as barreiras físicas e arquitectónicas, que lhes condicionam o acesso a vários locais, como ultrapassáveis, poderão não o ser para outros que frequentam ou que venham a

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frequentar essa instituição de ensino. Daí que se considere pertinente a adopção dos princípios da antecipação enunciado na SENDA (2001) actualmente em vigor no Reino Unido para o contexto nacional e que, em certa medida, estão pressupostos pela aplicação da actual legislação portuguesa sobre a matéria.

Actividades académicas Na categoria das actividades académicas, o acesso à documentação e à bibliografia em suporte adaptado às suas necessidades pareceu ser uma das preocupações comuns à maioria dos estudantes. Neste domínio, e apesar de serem variados os meios a que recorrem, os estudantes afirmaram sentir muitas limitações na quantidade de materiais de apoio que estão disponíveis em tempo útil, facto que os coloca em desvantagem em relação aos colegas, tendo, em alguns casos, consequência nos resultados finais. Foi ainda referido como uma barreira a resistência dos docentes em conceder documentação por eles produzida e publicada e a inexistência de obras essenciais a este nível de ensino publicadas em formato digital pelas editoras. Neste domínio, os estudantes salientaram a importância do serviço que produz esse tipo de materiais, o programa de voluntariado e a colaboração dos docentes como essenciais ao seu sucesso académico. O empréstimo de apontamentos por parte dos colegas e dos docentes, a leitura, a gravação e transcrição de textos e a ajuda na pesquisa e acesso a livros da Biblioteca, tarefas realizadas por colegas por iniciativa própria ou inseridos em programas de voluntariado, foram considerados como factores facilitadores da sua inclusão. Porém não deixaram de referir como uma barreira a dependência da boa vontade dos colegas para cumprirem essa tarefa. Em relação a este aspecto, Parker (1999) refere que os estudantes com deficiência reconhecem o valor do apoio prestado por terceiros, porém, a autora conclui, que mesmo que este seja remunerado, há factores que não podem deixar de ser relevantes para o seu sucesso, como o ajuste entre a formação individual e específica daqueles que se oferecem para o fazer, a actividade que irão desenvolver e ao perfil do estudante beneficiado. Ainda neste domínio, e considerando as orientações provindas das directrizes internacionais sobre o Desenho Universal e a sua aplicabilidade ao ensino (Wray, 2003; Campbel, 2004; Pliner e Johnson, 2004; Ouellett, 2004), alguns docentes e instituições

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da UL parecem começar a prestar mais atenção aos recursos que as tecnologias da informação e da comunicação proporcionam, nomeadamente ao seu contributo para o processo de ensino-aprendizagem. A aposta na produção de materiais de apoio às unidades curriculares e a sua divulgação em sites das unidades orgânicas parecem sem dúvida, pela experiência de alguns dos estudantes participantes, um excelente recurso para o acesso à documentação e informação atempada, possibilitando de igual modo uma ferramenta de grande utilidade para todos. Apesar de existir informação útil disponível nas páginas online das unidades orgânicas, a experiência dos estudantes mostra que uma parte dela ainda continua inacessível por não estarem a ser cumpridas as regras de acessibilidade estabelecidas na Resolução do Conselho de Ministros N.º 97/99 de 26 de Agosto. Neste domínio, não podemos deixar de destacar a importância das bibliotecas de texto integral online, às quais os estudantes entrevistados parecem recorrer com frequência. Este facto leva-nos à questão do acesso a tecnologias e equipamentos referida pelos estudantes. Um factor que parece favorecer a inclusão dos estudantes com deficiência neste nível de ensino é o uso de equipamento individual. No estudo ficou evidente que alguns dos estudantes possuem o seu próprio equipamento, uns tendo-o adquirido por receitas próprias ou de familiares, outros através dos programas nacionais de atribuição de ajudas técnicas, ou através de apoio concedido pelas próprias instituições de ensino, tendo-se neste caso salientado a morosidade na sua atribuição. Em relação a este aspecto específico, Schevlin et al. (1004) e Riddell et al. (2005) salientam que a ausência ou os atrasos na concessão deste tipo de ajudas têm repercussões negativas no desempenho académico dos estudantes, o que parece estar em consonância com os relatos dos estudantes entrevistados. No presente estudo, foi ainda possível comprovar que há alguns estudantes que ainda resistem à utilização dos meios informáticos tal como verificado no estudo de Mazzoni, 2003, que existem docentes que oferecem alguma resistência ou desconfiança do seu uso por parte dos estudantes em provas de avaliação, e que os próprios colegas podem considerar essa circunstância como uma vantagem e não como um requisito essencial para o desempenho do colega. As experiências relatadas mostram-nos que o equipamento disponível em duas das instituições com apoio é bastante útil aos estudantes, até para aqueles que possuem o seu próprio equipamento, pois permite-lhes trabalhar na Faculdade sem que para isso tenham

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que levar todos os dias o seu equipamento. Parece, no entanto, que o equipamento que está disponível numa outra instituição não é muito utilizado, em virtude do seu mau estado de conservação. Relativamente à frequência das aulas, constatámos que os estudantes são unânimes em considerarem as aulas práticas com muito favoráveis dada a proximidade entre docentes e estudante que as caracteriza. Ao invés, foi nas aulas teóricas e de laboratório que os estudantes encontraram maiores dificuldades. Nas aulas teóricas, a dimensão das salas, a ausência ou a não utilização de microfones pelos docentes, foram considerados pelos alunos com deficiência auditiva os maiores obstáculos. Já os estudantes com deficiências físicas e visuais consideraram como barreira a falta de apoio nas aulas de laboratório. Em contraste, as alunas que tiveram aulas em laboratórios de informática, tiveram uma experiência muito diferente, dado que os docentes tiveram o cuidado de procurarem instalar os meios que lhes permitiam participar nas aulas em igualdade de circunstâncias com os restantes colegas. As visitas de estudo, que são consideradas fundamentais no curso que é frequentado por uma estudante com deficiência física, foram identificadas por esta como uma barreira, dado que nem sempre lhe era possível participar, umas vezes porque o tipo de visita não o permitia, outras por não lhe terem sido garantidas as condições necessárias à sua participação. O estágio, comum a alguns cursos, é também uma modalidade que cria grande ansiedade aos estudantes, principalmente se os locais com os quais as instituições de ensino estabelecem protocolos não garantem as condições necessárias em termos de acessibilidade. Das duas estudantes que se encontravam nesta fase do seu percurso académico, uma já tinha ultrapassado a fase de negociação e, após algumas dificuldades, estava convicta de que o local para onde iria estagiar aparentemente oferecia todas as condições para que se realizasse um bom trabalho; a outra, encontrava-se na expectativa que os coordenadores de estágios, conhecedores da sua condição, lhe conseguissem encontrar um local acessível e apenas a preocupava o transporte para o local. Esta preocupação reflecte as dificuldades que a estudante sentiu, no decorrer da sua frequência, em relação ao funcionamento do serviço de transporte especial.

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No momento em que redigimos o presente trabalho, temos conhecimento, em virtude do contacto posterior estabelecido pela aluna, que esta teve inúmeras dificuldades em conseguir um estágio, dado que, por um lado, a coordenadora de estágios parecia ter uma visão estereotipada em relação à condição da aluna, considerando que esta apenas poderia desenvolver o seu estágio numa instituição ligada ao apoio de pessoas com deficiência mental, por outro, as suas tentativas individuais tinham sido igualmente frustradas, porque, como diria a aluna, como disse que não conseguia abrir a porta, disseram-me que aquele lugar não era para mim. No que diz respeito à avaliação, a maioria dos estudantes parece ter tido boa receptividade dos docentes para a garantia das condições essenciais à sua concretização, em algumas ocasiões porém, sentiram a necessidade de relembrar os docentes, sempre que se aproximava a data programada para a prova de avaliação ou exame, dado que algumas das experiências negativas relatadas parecem ter sido consequência do esquecimento consciente ou inconsciente dos docentes (Mazzoni, 2003). Tal parece estar em consonância com as afirmações de Borland e James, (1999), Holloway (2001) e Riddell (2003): que mesmo em instituições onde haja apoio formalizado, o estudante tem de requerer continuamente condições apropriadas e já negociadas; e com as conclusões de Heiman e Kariv (2004) e Shevlin et al. (2004), sendo que os estudantes vivenciam níveis de stress mais elevados que os seus pares. Por último, pudemos constatar no presente estudo que a participação em programas de mobilidade de estudantes entre instituições de ensino superior, nomeadamente o programa ERASMUS, parece ser possível e gratificante para estudantes com deficiência. As duas estudantes que participaram no referido programa expressaram-se muito positivamente em relação a essa experiência, apesar de uma delas ter tido de enfrentar atitudes de discriminação por parte do gabinete que gere o referido programa na instituição de ensino que frequenta, circunstância que acabariam por ser ultrapassada com a ajuda do serviço de apoio. Ambas, a estudar em unidades orgânicas com apoio formalizado e com experiências em países diferentes, consideraram que as diferenças que encontraram se centravam apenas nos meios e recursos que estavam à sua disposição, em virtude, segundo uma delas, dos serviços da instituição que a acolheu possuírem mais financiamento.

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Relativamente ao apoio social, poucos recorrem aos serviços de restauração oferecidos pelos SASUL ou fazem-no esporadicamente. Da experiência relatada constatámos que a esse nível os estudantes têm uma percepção positiva, mesmo que em alguns momentos a atitude dos funcionários não tenha sido a mais compreensiva. Quanto às barreiras arquitectónicas que anteriormente referimos existirem nesses edifícios, a única estudante com deficiência motora que recorre a esses serviços, afirmou que ultrapassava essas barreiras com a ajuda dos colegas, indo por um percurso alternativo. Por outro lado, foi ainda focado por uma estudante a inexistência de residências com quartos adaptados para pessoas com deficiência motora. Opiniões e Sugestões para a melhoria das condições de apoio no ensino superior Quando questionados sobre a sua opinião relativamente às condições de estudo existentes na instituição de ensino onde se encontravam inscritos, a grande maioria mostrou uma percepção positiva sobre as mesmas. Apenas cinco estudantes consideraram que as condições de estudo não eram as melhores, por causa das dificuldades que encontraram em receber materiais de estudo em formato apropriado às suas necessidades e de apoio em determinadas tarefas e pela falta de sensibilidade de docentes e dos órgãos de gestão ou instituição face às suas necessidades. No geral, podemos constatar que uma parte dos estudantes revelou desconhecer os seus direitos e os seus deveres, adoptando um comportamento conformista e aceitando, sem reclamar ou negociar, aquilo que a instituição e docentes lhes apresentaram, ou enfrentando barreiras que não existiriam se se tivessem informado das medidas e recursos que a instituição estabeleceu para eles. A ignorância quanto aos seus direitos cívicos está bem patente na expressão proferida por uma estudante: […] se somos seleccionados para aquela Faculdade, é porque temos meios para frequentar, acho que se não tiverem meios, realmente acho que, não devem aceitar, ou dizerem à partida que não é possível, acho que não deveriam aceitar as candidaturas se realmente não tem condições para receberem esses alunos.

Naturalmente, num modelo de universidade inclusiva, o estudante não teria de reclamar esses apoios, mas enquanto não atingirmos esse ideal, é fundamental que os estudantes tomem uma atitude mais activa e auto-determinada (Trainor, 2002 e Hampton e Gosden, 2004), que lhes será igualmente útil no momento em que transitarem para o mercado de trabalho. O conformismo a que nos referimos foi notório, no final da entrevista, nas

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dificuldades que demonstraram em propor mudanças para a melhoria das condições de estudo, tanto para os estabelecimentos de ensino que frequentam, como para o ensino superior no geral, evidente nas expressões não sei e sei lá como que respondiam ou iniciavam a sua resposta. A maioria das sugestões apresentadas pelos estudantes surge na consequência das barreiras que identificaram, no domínio das relações com os docentes, na falta de estruturas de apoio no seu percurso académico, no acesso a materiais de estudo adaptados, na adopção da regulamentação específica para todas as instituições de ensino superior e na divulgação de boas práticas e de experiências bem sucedidas de estudantes com deficiência, nomeadamente em áreas que tradicionalmente não são escolhidas por esses estudantes, pelo mesmo motivo que Torres (2002) e Ryan e Struhs (2004) referiram: menor exigência académica. As experiências mais negativas vividas pelos estudantes relacionam-se com o seu contacto como os docentes e as estratégias pedagógicas adoptadas por estes, com a dificuldade no acesso à documentação e informação em tempo útil e, no caso dos estudantes inscritos em unidades orgânicas sem apoio, com a ausência de uma estrutura de apoio e de um estatuto que lhes permita alcançar as condições de estudo fundamentais à sua participação no meio académico. Por outro lado, as suas experiências positivas correspondem ao bom relacionamento com os colegas, à sensibilidade e compreensão demonstrada por alguns docentes, à existência de estruturas formais de apoio, principalmente na garantia de determinadas condições de apoio e, sobretudo, ao apoio de colegas. As experiências relatadas pelos estudantes reforçam a ideia de que as unidades orgânicas devem investir mais no Desenho Universal ou Desenho para todos, tanto em termos de conteúdos Web e estratégias pedagógicas como nas estruturas físicas. Por último, relativamente às experiências de estudantes com o mesmo tipo de deficiência, constatámos que, independentemente de estarem inscritos em instituições com ou sem apoio formalizado, parecem existir barreiras comuns em alguns domínios. Assim, os estudantes com deficiência auditiva mostraram sentir mais dificuldades no acesso à informação, principalmente aquela que é veiculada em salas de maiores dimensões; os estudantes com deficiência visual parecem ter tido maiores dificuldades em ter acesso a documentação em formato adaptado, ou em que esta lhes chegasse atempadamente; e os estudantes com deficiência motora referiram a existência de Lília Aguardenteiro Pires

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algumas barreiras físicas e arquitectónicas nos edifícios das unidades orgânicas em que estão inscritos, mas só alguns consideraram que elas lhes impediam o seu livre acesso a salas de aula e a usufruírem de determinados serviços.

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Capítulo 8 - CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES Attitudes are the real disability Henry Holden

A democratização do ensino superior contribuiu para a emergência de novos públicos confrontando as instituições de ensino superior com o desafio de acolhê-los, independentemente das suas problemáticas, e de lhes proporcionar um ensino de qualidade. A escola inclusiva, nomeadamente a universidade inclusiva, pressupõe mudanças ao nível de toda a estrutura, organização e cultura da escola. O seu sucesso depende da informação/formação, sensibilização, cooperação e empenho de todos: órgãos de gestão, docentes e estudantes com deficiência. Tendo em conta este desiderato, o presente estudo teve como objectivos gerais conhecer e compreender as experiências e percepções dos estudantes com deficiência sobre as condições de apoio no ensino superior e compreender a importância de serviços estruturados para uma melhor qualidade de ensino prestado a esses estudantes. A apresentação e a discussão dos resultados, desenvolvidas ao longo dos capítulos anteriores, corroboram os resultados que foram apresentados por outros investigadores, porém, não são passíveis de serem generalizáveis além do contexto e população em causa. Ao centrarmo-nos, fundamentalmente, na análise e descrição dos vários aspectos equacionados, temos consciência de não estarem esgotadas todas as vias de análise que este corpus poderia proporcionar, nomeadamente descrever e examinar as possíveis relações entre variáveis para se compreender a realidade local com maior profundidade. Como já referimos, propusemo-nos analisar as experiências e percepções dos estudantes relativamente às condições de estudo numa universidade pública, concretamente a Universidade de Lisboa, concluindo que as principais barreiras apontadas pelos estudantes foram: −

Atitudes estereotipadas, de estranheza e de discriminação manifestadas pela comunidade académica, consequência da ignorância ou da dificuldade em lidar com as pessoas com condição de deficiência; Lília Aguardenteiro Pires

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Conclusões e Recomendações



Dificuldades no acesso a documentação e informação em tempo útil;



Dificuldades dos docentes em adoptarem metodologias e estratégias pedagógicas adequadas às necessidades individuais dos estudantes;



Por parte dos docentes, escasso recurso às tecnologias da informação, nomeadamente a materiais em formato digital;



Inacessibilidade a serviços e locais comuns em virtude da existência de barreiras arquitectónicas;



Falta de um serviço ou pessoa de contacto e regulamentação específica do apoio a estudantes com deficiência.

Por outro lado, foram referidos pelos estudantes como principais factores facilitadores: −

Bom relacionamento com os colegas, funcionários e docentes;



Sensibilidade e compreensão para responder às suas necessidades individuais evidenciada por alguns docentes;



Apoio de colegas, funcionários e docentes em algumas actividades, quer por iniciativa própria quer inseridos em projectos de voluntariado;



Existência de equipamento adequado às suas necessidades nas Faculdades;



Existência de serviços e regulamentos específicos do apoio a estudantes com deficiência.

No que se refere à opinião sobre os apoios e medidas estabelecidas pela instituição, a maioria expressou-se positivamente, nos termos de não tive razão de queixas, mesmo alguns daqueles que estavam inscritos em Faculdades em que não há qualquer apoio institucionalizado. Este facto pode eventualmente estar relacionado com as características individuais e implicações da sua condição no desempenho do estudante, bem como com o modo como o próprio estudante aceita a sua condição e se relaciona com os outros, variáveis que não foram aprofundadas no presente estudo e que podem ser objecto de análise em outros que se lhe sucedam. Pese embora as poucas referências directas aos serviços e comissões específicas, foi possível perceber que a sua intervenção e a sua importância eram reconhecidas pelos estudantes entrevistados, nomeadamente na resposta às suas necessidades individuais dos estudantes e no contacto com os docentes e outros serviços. Na prática, a intervenção dessas estruturas, em particular dos serviços específicos, decorre num

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Conclusões e Recomendações

continuum entre o modelo médico e o modelo social, restringindo a sua acção às instituições a que pertencem, sem grande influência nas grandes linhas da política da Universidade. Da análise das experiências dos estudantes inscritos em instituições com apoio formalizado e as daqueles que frequentam instituições sem apoio, averiguámos que os serviços de apoio contribuíram: −

para experiências mais positivas em termos de acolhimento e acompanhamento inicial;



no apoio individual essencial em tarefas da vida pessoal e académica através da organização de programas específicos de voluntariado;



na negociação e concessão de melhores condições de estudo junto de órgãos de gestão, docentes e serviços da instituição;



para o acesso a materiais de estudo em formato adequado às necessidades individuais dos estudantes;



para o acesso a tecnologias de informação, para uso pessoal ou geral, que permite aos estudantes ter acesso à informação digital e trabalhar autonomamente;

As sugestões apresentadas pelos estudantes surgem na consequência das limitações que sentiram, incidindo sobre: −

Formação e sensibilização dos docentes que os habilitem a adequarem as suas metodologias e estratégias pedagógicas às necessidades dos estudantes com deficiência;



Criação de estruturas a que os estudantes possam recorrer para obter materiais de estudo em formato adaptado às suas necessidades;



Adopção de regulamentação específica em todas as instituições de ensino superior que lhes garanta os seus direitos consignados por Lei;



Divulgação de boas práticas e de experiências bem sucedidas de estudantes com deficiência no ensino superior, nomeadamente em áreas que tradicionalmente não são escolhidas por esses estudantes;



Apetrechamento de salas de aula e de estudo destinados aos estudantes com tecnologias que permitam aos estudantes com deficiência usufruir das mesmas

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Conclusões e Recomendações

oportunidades de acesso à informação nos mesmos locais e condições que os colegas. Os resultados do presente estudo revelaram ainda que os estudantes manifestam algum conformismo, notório no modo como encaram e reflectem sobre a sua experiência. Essa atitude é reflexo de a protecção que receberam (ou recebem) não lhes permitindo desenvolver alguma autonomia e espírito critico? Esta questão não foi aprofundada pelo presente estudo, porém parece-nos que seria pertinente que no futuro se lhes desse especial atenção. Na discussão sobre a inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior, tão importante como inventariar as condições de apoio na sua frequência é aprofundar o conhecimento sobre os motivos que estiveram subjacentes à decisão destes em progredirem nos seus estudos até este nível de ensino, nomeadamente os factores facilitadores ou as barreiras a esse processo, alguns dos quais referidos pelos estudantes que participaram no presente estudo, e reflectir sobre as práticas de transição desenvolvidas junto dos alunos do ensino secundário e suas famílias. Neste estudo foi possível constatar que existe algum desconhecimento parte de estudantes e professores de apoio da realidade do ensino superior e que os estudantes sentiram dificuldades na transição, tanto em termos académicos como pessoais, o que nos parece passível de análise e reflexão num futuro estudo. Um outro aspecto que devemos acentuar, no conjunto de questões inerentes à discussão sobre a inclusão dos estudantes com deficiência no ensino superior, é a sua transição para o mercado de trabalho. O ensino superior apresenta-se como um nível de ensino no qual o estudante adquire conhecimento e competências para o desempenho de uma determinada profissão. No presente estudo, constatámos que alguns estudantes fizeram as suas escolhas tendo em consideração a sua posterior integração profissional, escolhendo áreas com maiores probabilidades de empregabilidade mas menos requeridas por estudantes nas suas condições, e que outros iriam iniciar as suas experiências num local de trabalho, no âmbito do estágio, sentindo as primeiras dificuldades subjacentes às limitações oriundas da sua condição e aceitação ou discriminação por parte da sociedade. Neste âmbito, o do conformismo e da pouca autonomia que os estudantes revelaram, parece-nos pertinente questionar se têm consciência das barreiras que lhes podem vir a ser impostas e se estão preparados paras as enfrentar, daí que nos pareça Lília Aguardenteiro Pires

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Conclusões e Recomendações

relevante a produção de um estudo que observe e analise as percepções dos estudantes universitários com deficiência acerca desta fase, igualmente de transição, e que papel eventualmente podem ter os serviços universitários específicos nesta matéria. Tendo em consideração o novo enquadramento legal sobre a não descriminação e das acessibilidades, parece-nos ser oportuno que a UL, no âmbito da autonomia que a Lei lhe confere e tal como outras instituições congéneres no estrangeiro, assuma uma atitude pro-activa e afirmativa na defesa dos direitos dos estudantes com deficiência que a frequentam definindo uma políticas comum para a protecção dos direitos desses estudantes com deficiência. A nomeação de um coordenador, com influência na UL, tendo por função a garantia do cumprimento dessa mesma políticas e o desenvolvimento de iniciativas que promovam a adopção do Desenho Universal nos domínios da acessibilidade física, conteúdos Web e metodologias e estratégias pedagógicas, parecenos uma iniciativa possível e exequível. Nesta matéria, o Estado, em cumprimento do estabelecido pela Lei e à semelhança do que é realizado em outros países, deveria incentivar as instituições de ensino superior a em criar os seus próprios planos de acção, a fim de cumprirem as novas directivas comunitárias e nacionais sobre a não discriminação; nesses planos estaria enunciado: a política a seguir pela instituição em termos de acessibilidade física e arquitectónica, serviços a prestar, definição e respectiva calendarização. As recentes iniciativas governamentais parecem-nos ser um primeiro passo no caminho para um ensino superior inclusivo, mas não podemos deixar de salientar que alterações legislativas só por si não produzem mudanças de mentalidades essenciais à construção de uma educação inclusiva. Por outro lado, algumas delas afiguram-se-nos como medidas ad hoc, visto que não foram publicados estudos que nos que permitam conhecer o peso relativo e respectiva participação destes estudantes no contexto do ensino superior. Concluímos com a questão que serve de título do presente trabalho: estará a Universidade de Lisboa no caminho de uma escola superior mais inclusiva? Como se constatou, já encontramos em algumas das suas unidades orgânicas boas práticas que nos indicam que se caminha nessa direcção, porém, são localizadas e sem qualquer

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Conclusões e Recomendações

efeito nas restantes, em virtude da pouca cooperação e partilha de recursos, e competitividade, que impera nessa Universidade, em nome da autonomia.

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Lília Aguardenteiro Pires

224

ANEXOS

Lília Aguardenteiro Pires

225

ANEXO 1 GUIÃO DE DADOS DE CARACTERIZAÇÃO DAS UNIDADES ORGÂNICAS DA UL

Lília Aguardenteiro Pires

226

GUIÃO DE CARACTERIZAÇÃO DAS UNIDADE ORGÂNICAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA Objectivo: Recolha de dados de caracterização referentes a cada unidade orgânica da UL

1. IDENTIFICAÇÃO E LOCALIZAÇÃO a) Designação b) Nota histórica c) Localização d) Vias de acesso 2. FUNCIONAMENTO E FINANCIAMENTO a) Enquadramento Legal b) Financiamento c) Estrutura organizacional d) Infra-estruturas e) Recursos humanos f) População estudantil g) Organização pedagógica e sistemas de avaliação a. Tipologia das Aulas b. Regime de avaliação

3. POLÍTICAS E RECURSOS DA UNIDADE ORGANICA PARA A INTEGRAÇÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA a) Acolhimento b) Políticas e recursos para o apoio aos Estudantes com Deficiência a. Infra-estruturas b. Medidas e orientações específicas c. Acessibilidade e mobilidade

Lília Aguardenteiro Pires

227

ANEXO 2 GUIÃO DE DADOS DE CARACTERIZAÇÃO DOS ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA

Lília Aguardenteiro Pires

228

GUIÃO DE CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDANTE Objectivo: Recolha de dados para caracterização do aluno no âmbito sócio-familiar, clínico e escolar

Nome Fictício: __________________________________________________________________ Idade: ________________________ Entrevistador: _____________________________________________ data: _____/_____/_____

1. INFORMAÇÃO SOCIO-FAMILIAR e) Agregado familiar f) Local de Residência (localidade/Concelho) g) Habilitações Literárias dos Pais/cônjuge h) Profissão dos pais e/ou do próprio i)

Situação na profissão dos pais e/ou cônjuge

j)

Nível sócio-económico

2. INFORMAÇÃO CLÍNICA DO ALUNO h) Diagnóstico i)

Severidade da Deficiência

j)

Instrumentos usados

k) Grau de dependência /mobilidade e transporte

3. CARACTERIZAÇÃO ESCOLAR c) Faculdade d) Curso e) Ano curricular f) Ano da primeira inscrição no ensino superior

__________________________________________________________________________________________ Data: _____/_____/_____ Recolha a partir de: _______________________________________________________________________________________________

Lília Aguardenteiro Pires

229

ANEXO 3 INQUÉRITO SOBRE OS APOIOS DADOS AOS ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA PELAS FACULDADES DA UL

Lília Aguardenteiro Pires

230

INQUÉRITO SOBRE OS APOIOS PREVISTOS PARA OS ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA NAS FACULDADES DA UNIVERSIDADE DE LISBOA Objectivo: identificar as políticas e os recursos previstos nas Faculdades da UL para os estudantes com deficiência

I. IDENTIFICAÇÃO DA INSTITUIÇÃO Faculdade ______________________________________________________________ Morada

______________________________________________________________

Telefone ________________ Fax _________________ Pessoa que respondeu ao inquérito ___________________________________________ Cargo _________________________________________________________________ Telefone ___________________ E-mail _____________________________________

II. ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA 1. Existem estudantes com deficiência a frequentar os cursos da Faculdade/Instituto: Não ___ Sim ___ 2. Se respondeu sim à pergunta anterior, qual o numero de estudantes identificados com: Deficiência auditiva: Deficiência visual: Deficiência motora: Múltiplas deficiências Outras: Quais 3. Qual o número total de estudantes com deficiência identificados na instituição: _____

Lília Aguardenteiro Pires

231

III. APOIOS A ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA 1. Acolhimento e acompanhamento 1.1. Na instituição existe algum serviço ou pessoa de contacto responsável pelo acolhimento e acompanhamento dos estudantes com deficiência? Não:___ Sim____ Qual:______________________________________________________________ 1.2. O estudante com deficiência beneficia de condições especiais no processo de inscrição? Não: ____ Sim: ____ Quais? _____________________________________________________________ ___________________________________________________________________

2. Actividade Académica 2.1. A instituição possui um regulamento ou estatuto especial para estudantes com deficiência? Não: ____ Sim: ____ (se sim, anexar um exemplar) 2.2. Estão previstas adaptações curriculares para estes estudantes? Não: ____ Sim: ____ Quais? _____________________________________________________________ _______________________________________________________________________ 2.3. Que tipo de condições especiais para a realização de trabalhos e de provas de avaliação pode o estudante com deficiência usufruir? Tipo de Condições Especiais Sim Não   a) Prazos alargados para entrega de trabalhos escritos   b) Tempo extra para a realização de provas escritas presenciais   c) Provas adaptadas à condição do aluno   i) Informatizado ___   ii) Ampliado ____   iii) Registo áudio _____   iv) Caracteres Braille ____   v) Outras. Quais? ________________________________   ________________________________

Lília Aguardenteiro Pires

232

Tipo de Condições Especiais d) Possibilidade de respostas sob forma não convencional i) Por registo áudio ______ ii) Em Braille _______ iii) Por ditado _______ iv) Registo informático _______ a. No computador pessoal ______ b. Num computador da Instituição________ v) Outras. Quais? ________________________________ ________________________________

Sim

Não

        

        

2.4. Qual(is) o(s) tipo(s) de formato(s) alternativo(s) em que o(s) material(is) de apoio ao estudo se encontra(m) disponível(is)? Tipo de Formatos Alternativos Sim  Braille _____  Áudio _____  Ampliado _____  Informatizado _____  Outros. Quais?__________________________ ___________________________________  ___

Não

     

2.5. Qual o tipo de ajudas técnicas para apoio ao estudo em sala de aula e no domicilio que se encontram disponíveis? Tipo de Ajudas Técnicas Impressora Braille Transcritor Braille CCTVs (Lupa TV) Software de Ampliação Software de leitura de ecrã Linha Braille Sintetizador de fala Software de varrimento Teclado de conceitos (hardware) Teclado Virtual no Ecrã (software) Manípulos (Switch) Dispositivos apontadores controlados com a cabeça (Tracker) OCR OBR (Reconhece Braille para Texto) Outros. Quais?___________________ ___________________

Lília Aguardenteiro Pires

Não

Sim





          

          

   

   

Nº ____ ____ ____ ____ ____ ____ ____ _____ _____ _____ _____ _____ _____ _____ _____ _____

233

2.6. O estudante com deficiência pode usufruir dos serviços de um(a): Tipo de Serviços Tutor(a) Assistente pessoal:  para apoio nas aulas  para ajudar em actividades especificas da vida diária (mobilidade, apoio às refeições, etc.) Intérprete de Língua Gestual Outras. Quais?__________________________ ______________________________________

Sim

Não

   

   

  

  

3. Acessibilidade e mobilidade 3.1. Considera o(s) edifício(s) da instituição acessíveis aos estudantes com deficiência? Não



Porquê __________________________________ ___

Sim



Porquê ___________________________________ __

3.2. Qual o tipo de adaptações e a frequência com que foram aplicadas? Poucas

Algumas







    

    

    

 

 

 

b) Nas salas de aula: i) reserva lugares ii) instalação de sistemas de ampliação de som iii) alteração as condições de luminosidade iv) Outras. Quais?________________________ ________________________

    

    

    

c) No edifício: i) rampas ii) plataformas elevatórias iii) casas de banho

   

   

   







a) No acesso a: i) salas de aula ii) bibliotecas iii) laboratórios iv) salas de estudo v) casas de banho vi) parques de estacionamento vii) Outros. Quais?_________________________ _________________________

c) No que se refere à sinalética i) que facilite a mobilidade e o acesso à informação a estudantes cegos e surdos

Lília Aguardenteiro Pires

Muitas

234

ii) Outras. Quais?________________________ ________________________ d) NS/NR







3.3. Existe no campus parque(s) de estacionamento(s) com lugares reservados para pessoas com deficiência? Sim



Onde estão situados? Interior Exterior Nível Térreo Nível Subterrâneo

Nº lugares ____

Não

Porquê



__________________________________ ___

____ ____ ____

3.4. Nos bares e restaurantes é oferecido ao estudante com deficiência um serviço personalizado? Não



Porquê __________________________________ ___

Sim



Quais as funções oferecidas? ___________________________________ __ ___________________________________ __ ___________________________________ __

4. Apoio financeiro, social e/ou material 4.1. Foi atribuído pela instituição apoio financeiro a algum estudante com deficiência? Não



Porquê Sim Especifique _________________________________  ___________________________________ ____ ___ ___________________________________ ___

Lília Aguardenteiro Pires

235

ANEXO 4 GUIÃO DE ENTREVISTAS AOS ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA

Lília Aguardenteiro Pires

236

BLOCO

GUIÃO DA ENTREVISTA A ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA NA UNIVERSIDADE DE LISBOA OBJECTIVOS TÓPICOS EXEMPLOS DE QUESTÕES OBSERVAÇÕES ∗ Informar acerca do objectivo da entrevista e do contexto em que ela surge

∗ Objectivos de entrevista e do trabalho de investigação ∗ Posição, estatuto e papel do investigador/ entrevistador ∗ Utilização dos resultados

Legitimação da entrevista

∗ Valorizar o contributo do entrevistado

∗ Importância da participação do entrevistado

∗ Deseja saber mais alguma coisa acerca deste trabalho? ∗ E acerca da entrevista? Há alguma coisa que não tenha ficado clara?

∗ Colocar-se à disposição para esclarecer eventuais dúvidas, ou questões dos sujeitos. ∗ Garantir a confidencialidade da fonte de informação e o anonimato das respostas dos discursos produzido

∗ A confidencialidade será garantida pela omissão dos nomes dos sujeitos (e/ou dos elementos que referirem não pretender serem difundidos), garantindo-se, assim, também o anonimato

∗ Confidencialidade e anonimato

∗ Importa-se que a entrevista seja gravada? ∗ Ou que tome algumas notas?

∗ Registo ∗ Agradecer a participação no estudo

BLOCO Bloco A Experiência do Estudante antes de ingressar no ES

∗ Frisar que se trata de um estudo sobre a inclusão dos estudantes com deficiência no ensino superior, nomeadamente, conhecer em concreto a experiência dos alunos com deficiência da UL e a sua percepção do apoio que lhes é dado pela Faculdade. ∗ Sublinhar que apesar do investigador pertencer a uma das unidades orgânicas da UL, não tem poder de influência para alterar as condições de apoio em outras unidades ∗ Os resultados serão única e exclusivamente para o estudo em causa ∗ O entrevistado poderá ter alguma expectativa, sobre o presente trabalho, que importará clarificar e esclarecer.

OBJECTIVOS ∗ Conhecer as condições de apoio que ∗ os estudantes com ∗ deficiência obtiveram nos ensinos básico e secundário

∗ Garantir a protecção e a não difusão dos registos (de modo que não se possa tornar identificável a pessoa em causa). ∗ Agradecer antecipadamente a colaboração no estudo.

TÓPICOS Apoios recebidos Aspectos positivos e negativos

EXEMPLOS DE QUESTÕES ∗ Fale-me da sua experiência antes de entrar no ensino superior. ∗ Que tipo de escola andou? ∗ Teve algum apoio? De que natureza? ∗ Como avalia esse apoio?

Lília Aguardenteiro Pires

OBSERVAÇÕES ∗ Estas questões só se aplicam aos alunos que se encontravam na condição de pessoa com deficiência antes de ingressarem no ES ∗ Identificar o tipo de apoio recebido pelo aluno no nível de ensino anterior e conhecer a sua opinião sobre o mesmo

237

BLOCO

Bloco B Candidatur a ao Ensino Superior

BLOCO

OBJECTIVOS ∗ Identificar os fac-tores que influencia-ram o aluno relativa-mente ao curso e instituição ∗ Identificar o contingente de acesso escolhido

OBSERVAÇÕES

∗ O curso e instituição que escolheu foram a sua primeira escolha? Porquê?

∗ Pretendemos saber que razões levaram o aluno a escolher o curso (pessoais; influência dos pais; apoios conhecidos na instituição)

Curso



Instituição



Contingente especial para deficientes Contingente geral

∗ A qual dos contingentes apresentou a sua candidatura? Porquê?

TÓPICOS

EXEMPLOS DE QUESTÕES



∗ Factores que o aluno dá mais importância desde seu primeiro contacto com a instituição

∗ Identificar os apoios recebidos pelos estudantes e conhecer eventuais dificuldades e obstáculos encontrados

EXEMPLOS DE QUESTÕES



OBJECTIVOS

∗ Bloco C Experiência do estudante na instituição de ensino

TÓPICOS



Actividade académica

∗ Acessibilidade e mobilidade

∗ Fale-me da sua experiência na Faculdade. ∗ Sentiu alguma dificuldade? ∗ Encontrou alguns obstáculos? ∗ Que repercussões tiveram na sua vida académica? ∗ Como conseguiu ultrapassá-las? ∗ Teve apoios? Dê exemplos ∗ Existe algum regulamento/ estatuto especial? ∗ Teve acesso a métodos de avaliação adequados à sua condição? ∗ Como conseguiu os apontamentos nas aulas ∗ Conseguiu ter os materiais de estudo adaptados? Como e onde? ∗ Obteve materiais de apoio em suporte digital? Onde e como? ∗ Teve acesso aos conteúdos apresentados em aula? Em que circunstâncias? ∗ Tem acesso a condições especiais na requisição de obras e outros materiais na biblioteca?

OBSERVAÇÕES ∗ Começar sempre por colocar a questão de forma geral e neutra, para não induzir o sujeito numa determinada direcção

∗ Não abordar de início estas temáticas. Introduzi-las apenas quando o aluno nas as referir e desenvolvê-las quando eles as mencionarem. ∗ Falar numa linguagem coloquial e pouco abstracta ou técnica. ∗ Pedir exemplos e descrições de casos concretos.

∗ Como avalia as condições de acesso na sua Faculdade? ∗ Tem acesso a todas as salas de aulas, biblioteca, laboratórios, etc? ∗ Como são as condições dentro das salas de aula, laboratórios, bibliotecas? ∗ Tem acesso a transporte adaptado? ∗ ∗

Como tem reagido os docentes à sua presença? Os docentes têm em consideração os seus pedidos?

Lília Aguardenteiro Pires

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∗ ∗ ∗

Relacionamento

∗ ∗ ∗ ∗ ∗ ∗

∗ ∗ ∗

Apoio Técnico

∗ ∗

BLOCO Bloco C Avaliação do apoio recebido e proposta



Apoio Social

OBJECTIVOS TÓPICOS ∗ Conhecer a ∗ Apreciação avaliação global global que os alunos fazem ∗ Propostas do apoio dado para a futura pela intervenção instituição, ou o como ponderam os aspectos positivos e negativos.

Como tem sido o relacionamento com os seus colegas? Os seus colegas costumam ajudá-lo? De que forma? Como tem sido a reacção de colegas, docentes e funcionários à sua situação? Como avalia a sua relação com docentes, colegas e funcionários? Os funcionários da instituição oferecem-se para ajudá-lo? Usa algum equipamento especial? Qual/is? Como é que teve acesso a esse equipamento? Existe algum local onde possa ter acesso à documentação online, fazer pesquisas, etc? Tem acesso ao catálogo geral da biblioteca? Precisa do apoio de um intérprete de língua gestual? Obteve apoio de um técnico de orientação e mobilidade? Recebe bolsa? Que despesas foram ponderadas? Considera-a suficiente para suprir as suas despesas? Teve acesso a apoio para aquisição de ajudas técnicas?

EXEMPLOS DE QUESTÕES ∗ Tendo em conta a sua experiência, como avalia o apoio dado pela instituição? ∗ Na sua opinião o que pode ser melhorado na sua Faculdade? ∗ Que sugestões faria para a melhoraria das condições de estudo no ensino superior?

OBSERVAÇÕES ∗



Lília Aguardenteiro Pires

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BLOCO

Bloco D

Validação da Entrevista

OBJECTIVOS ∗ Recolher informação não prevista ou não solicitada anteriormente e que se afigure importante para o entrevistado. ∗ Averiguar acerca das suas reações à situação de entrevista ∗ Recolher sugestões do entrevistado acerca dos aspectos a incluir na entrevista. ∗ Avaliar exaustividade da planificação (do guião) e da realização da entrevista

TÓPICOS ∗ Aspectos importantes não abordados e a referir ∗ Reacções (à entrevista, a o tipo de trabalho eao entrevistador)

EXEMPLOS DE QUESTÕES ∗ Há ainda alguma coisa que queira acrescentar? ∗ Houve algum aspecto que não foi abordado?

OBSERVAÇÕES ∗

∗ O que achou da entrevista? ∗ E do trabalho que se lhe associa?

∗ Concluir a entrevista

∗ o final agradecer mais uma vez a participação e disponibilidade do entrevistado e valorizar o seu contributo

Lília Aguardenteiro Pires

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Lília Aguardenteiro Pires

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