A chegada da ferrovia em Cordeirópolis e a primeira estação 1876-1878.pdf

May 27, 2017 | Autor: Paulo Tamiazo | Categoria: Brazilian History, Local and regional history, History of Railroads
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140 anos da ferrovia em Cordeiro e a construção da primeira estação (1876-1878) A Companhia Paulista de Estradas de Ferro tinha sido criada em 1868, com o objetivo de ligar os centros produtores de café do interior do Estado ao porto de Santos, visando baratear o custo de exportação. Com capital inglês, a estrada Santos-Jundiaí ligava este trecho, mas houve um impasse no prolongamento para atender aos fazendeiros desta região, por desistência da companhia inglesa. Em 1872, a ferrovia chega a Campinas, mas os proprietários rurais situados mais distantes, especialmente das regiões de Rio Claro e Araras, reivindicavam da administração da ferrovia a extensão do trecho. A extensão da linha férrea até a região de Rio Claro começou a tomar forma em 12 de maio de 1873, quando foi assinado um contrato entre o governo da Província de São Paulo e a Companhia Paulista, para a construção da “estrada de ferro de Campinas a Rio Claro”. Representando o governo de São Paulo, assinou o documento o Presidente da Província Dr. João Teodoro Xavier, e pela Companhia Paulista assinou seu Presidente, Dr. Clemente Falcão de Souza Filho. O embasamento legal para a construção do trecho era as Leis nº 44, de 12 de julho de 1869 e nº 34, de 29 de março de 1871. A primeira lei era chamada “garantia de juros”, ou seja, a certeza de que o empreendimento traria lucro sempre. Caso a empresa não conseguisse rendas suficientes, o governo de São Paulo daria uma subvenção que permitiria ter um lucro de 7% do capital aplicado, limitado a 5.000 contos de réis. A lei falava em privilegiar “qualquer individuo, ou companhia nacional, ou estrangeira, que encarregar-se do prolongamento da estrada de ferro de Campinas até o Rio-Claro, passando por Limeira, e também para conceder todas as mais vantagens que forão ou fôrem concedidas á Companhia Paulista”. Por fim, foi a própria companhia quem se encarregou do prolongamento. Parece que a construção da linha em bitola larga estava muito difícil, o que motivou o governo de S. Paulo a criar condições de construção de uma estrada, mesmo que fosse de bitola estreita. Pela Lei nº 34 já citada, “o Presidente da Provincia ficava autorisado a contratar com a companhia que tomar a si a construcção do prolongamento da estrada de ferro de Campinas até o Rio-Claro, passando pela Limeira, para que seja feita nas condições technicas das estradas de leito estreito (...)”. Neste caso, o capital garantido ficaria reduzido a 3.500 contos de réis. O contrato assinado naquele período determinava a “construção, custeio e gozo” de uma estrada de ferro que, vindo de Campinas e passando por Limeira, fosse terminar na cidade de São João do Rio Claro.

Pelo investimento a ser realizado pela empresa, seria dado um privilégio, ou como se fala atualmente, uma concessão por 90 anos, além de uma “reserva de mercado”, ou “privilégio de zona”, de 31 quilômetros de cada lado dos trilhos, onde seria impedida a construção de ferrovias concorrentes, mas autorizadas as que tomassem direção diferente. A bitola seria a mesma das estradas de Santos a Jundiaí e de Jundiaí a Campinas. Um dispositivo do contrato é interessante, pois está claramente representado na foto, inicialmente retratada pelo livro “História da Viação Pública em S. Paulo”, de 1902, e no quadro do pintor Francisco Frederico Olivatto, que retrata a estação de Cordeiro antes da sua reforma, há cem anos. A cláusula indicava que “o terreno ocupado pela estrada” seria separado por meio de cercas ou valos. Ao mesmo tempo em que se construía a estrada de ferro para servir aos municípios de Limeira e Rio Claro, foi contratada a construção de outra estrada de ferro, desta vez para servir à região de Araras, em direção ao Rio Mogi-Guaçu. Por contrato de 1º de maio de 1875, o Governo de São Paulo e a Companhia Paulista de Estradas de Ferro entraram em acordo para a construção de uma “estrada de ferro que seja ramal do tronco da estrada de Campinas a Rio Claro”. Este ramal era descrito como “estrada de ferro que, partindo do lugar denominado - Cordeiro – na linha principal, vá às margens do Rio Mogy-Guassu, no lugar que for mais conveniente”. Por este contrato, a ferrovia seria de bitola estreita, com um metro de largura. Em agosto deste ano, foi aberto ao tráfego a estrada de ferro de Campinas a Santa Bárbara, com 38 quilômetros, além de ser estabelecida uma linha telegráfica pela companhia. Em janeiro de 1876, foi modificado o contrato anterior, para que a estrada fosse construída com largura padrão de 1,60 m. Segundo relatório deste período, constavam dentre os acionistas da ferrovia diversos proprietários rurais, como Martinho Prado, o Barão de Souza Queiroz, proprietário de fazendas em Limeira; José Vergueiro, proprietário da Fazenda Ibicaba; Bento de Lacerda Guimarães, fazendeiro e um dos fundadores de Araras; o Barão de Três Rios, àquela época proprietário da Fazenda Santa Gertrudes, Albino José Barbosa de Oliveira, que dá nome à avenida principal de Barão Geraldo, em Campinas, antigo proprietário da fazenda onde foi instalada, há 50 anos, a Unicamp – Universidade Estadual de Campinas. Também era acionista deste trecho Francisco Detlef Brune, conforme citamos em artigo anterior, de 2013, publicado neste espaço: “A família Vergueiro volta a ser manchete nos jornais, tanto no “Estado de S. Paulo” como no “Correio Paulistano”, no final de novembro de 1887, devido à notícia do falecimento de Catharina Vergueiro Brune. Sua história foi divulgada recentemente

(...), ressaltando que ela era filha de Catharina Drenklen, nascida em 1852, que faleceu logo após a chegada ao Brasil. Comovido com a situação, o Comendador Vergueiro adota Carolina, dando-a seu sobrenome, tendo ela depois se casado com o então administrador da Fazenda, Detlef Brune. Com ele teve nove filhos e, após seu falecimento, a família voltou para a Alemanha, cujos descendentes lá ainda residem.” Os esforços para a construção do ramal do Mogy-Guassu, chamado posteriormente de “Ramal de Araras”, continuaram durante o ano de 1876, quando, em 1º de fevereiro, Bento da Silveira Franco assinou contrato de empreitada com o Engenheiro Joaquim Galdino Pimentel, com anuência da Companhia Paulista, para “movimentação de terras e obras de arte” na bifurcação com a linha de Rio Claro até o quilômetro 20”. Ao mesmo tempo, as obras do tronco estavam em franco progresso, conforme relatório apresentado aos acionistas naquele mesmo ano. O responsável pelos trabalhos dizia que “O estado das obras permite esperar-se que em junho entreguemos ao tráfego a parte da linha que vai de Santa Bárbara a Limeira e em agosto, a linha toda, até São João do Rio Claro”. A motivação para o sucesso nos trabalhos, segundo o responsável, era devido a situação em que se tirava partido “da abundância de empreiteiros (...), da baixa do salário da Província, da baixa do preço do ferro na Europa e das condições favoráveis do câmbio” (Relatório do 2º semestre de 1875). Neste período, foram contratadas com José Antonio Coelho e João Pinto Carneiro e Angelo Fenile a expansão da ferrovia por mais 12 quilômetros cada. O relatório de 1º de setembro de 1876, referente ao primeiro semestre daquele ano, indicava: “Em 30 de junho, ainda com a autorização do Governo, foi entregue ao tráfego a parte da estrada entre a ponte [do Rio Piracicaba] e a cidade da Limeira, e em 11 do mez de Agosto último fez-se o percurso de toda a linha até a cidade de São João do Rio Claro”. Quanto ao chamado Ramal do Mogy-Guassu, que deveria abranger a região de Araras, era dito que “o material de ferro está encomendado na Inglaterra e para o contrato aproveitamos uma época muito favorável pela baixa do preço do ferro”. Relatório datado de 19 de agosto indicava, para a Linha do Rio Claro, que “A 30 de junho, tendo-se assentado a linha telegráfica até Limeira, abriu-se ao tráfego essa estação, que estava acabada (...). O assentamento de trilhos prosseguiu com atividade e chegou a Rio Claro em fins de julho, seguindo-se-lhe pouco depois o da linha telegráfica. A 11 do corrente abriu-se ao tráfego provisório a última parte da estrada de ferro.” Ou seja, a tarefa estava cumprida.

No relatório do segundo semestre de 1876 foi destacada a assinatura de escritura de contrato de prestação de serviços entre a companhia e os srs. Squire Sampson e William Burnett, para assentamento de via permanente, ou seja, trilhos e dormentes no trecho do Ramal de Mogy Guassu. Assim descreve o relatório os trabalhos realizados: “Com celeridade notável, foram assentados os trilhos entre o Cordeiro e a Villa das Araras, dentro de poucos dias deve ser entregue ao tráfego esta seção da estrada.” Em fevereiro de 1877, outro relatório informava que “fez-se o levantamento da linha na chegada a Cordeiro e preparou-se o local para a estação e dependências. Na estação do Cordeiro acha-se em construção o armazém de cargas (...). Falta ainda a estação de passageiros, casa de máquinas e algumas outras dependências em Cordeiro.” No relatório referente ao primeiro semestre deste ano, o responsável informava: “Restavam, porém, algumas obras a terminar, que tem sido concluídas, faltando muito pouco da casa de máquinas no Cordeiro e da estação de passageiros no mesmo ponto”. Quanto às obras do “Ramal do Mogy-Guassu”, o relatório informava: “Concluidas as obras desde o Cordeiro até Araras (...), começou a estrada a funcionar a 10 de abril p.p. [de 1877]. A parte da linha que vai ser aberta ao tráfego, de Cordeiro ao Manoel Leme [futuro município de Leme], mede 45 quilômetros e fica a uma distância de 3 e meia léguas [aproximadamente 23 quilômetros] de Pirassununga”. Neste período, também a conformação da estação de Cordeiro, adaptada à sua função de ramal, estava sendo concluída: “Na estação de Cordeiro ficou acabado o armazém de cargas e muito pouco falta na casa de máquinas. Está ainda em construção as obras da estação de passageiros, o que é devido em grande parte ao estorvo que foi causado por uma edificação provisória.” No relatório referente ao segundo semestre de 1877, quanto à Linha de Rio Claro, informava-se que “As obras da estação de passageiros em Cordeiro não ficaram concluídas. Faltam ainda portas, janelas, canos de chuva e quase toda a pintura.” Finalmente, no primeiro semestre de 1878 se concluem as obras da estação de Cordeiro, cuja destruição e degradação transformaram-na num fantasma dos seus velhos tempos de glória: “Concluiram-se as obras empreitadas pelo Sr. Comendador Vergueiro na estação de Cordeiro e liquidaram-se as respectivas contas”. O fato interessante, e que precisa ser mais bem estudado, é que as obras não foram feitas pela Companhia Paulista em si, através de seus funcionários, mas contratadas com um de seus acionistas, o proprietário da Fazenda Ibicaba naquela época. Após o início do seu funcionamento, foi instalado uma agência postal na estação, que funcionou até data desconhecida.

Conforme nos propomos, o objetivo deste artigo é recuperar os trabalhos realizados pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro (CPEF) para a criação da Estação de Cordeiro e do ramal de Araras, que partiu deste local e funcionou por aproximadamente cem anos. Também serve para corrigir uma data que, apesar do que circulou nos últimos anos, não representa a construção e o início do funcionamento da estação ferroviária de Cordeiro, posteriormente Cordeirópolis, que ocorreram entre 1877 e 1878, com a colaboração fundamental do proprietário da Fazenda Ibicaba, o comendador José Vergueiro. Depois de quase quarenta anos servindo ao distrito e à região, a estação de Cordeiro adquiriu a configuração que manteve, até chegar à situação em que se encontrava, antes do processo de degradação que vem sofrendo nos últimos 20 anos. De acordo com o Relatório da Diretoria da Companhia Paulista de Estradas de Ferro referente ao 2º semestre de 1914, foram investidos um valor superior a 25 contos de réis na “transformação e aumento da estação de Cordeiro”. Vale destacar que este artigo não seria possível sem o acervo do Museu da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, em Jundiaí, que guarda exemplares dos relatórios da empresa, bem como a cessão pela Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Eventos de Cordeirópolis, de arquivos digitalizados destes relatórios, cedidos pelo centro cultural jundiaiense. Salve a Companhia Paulista de Estradas de Ferro!

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