A CIGARRA E A FORMIGA: A EDUCAÇÃO MUSICAL COMO AUXÍLIO NO ENSINO REGULAR

June 13, 2017 | Autor: Thais Rabelo | Categoria: Música, Educação Musical, Fabulas
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Núcleo de Música (NMU) – Universidade Federal de Sergipe (UFS) II Simpósio Sergipano de Pesquisa e Ensino em Música – SISPEM 20 a 23 de setembro de 2010

A CIGARRA E A FORMIGA: A EDUCAÇÃO MUSICAL COMO AUXÍLIO NO ENSINO REGULAR

Thais Fernanda Vicente Rabelo1 [email protected] Resumo: Este artigo tem por objetivo a reflexão sobre a valorização da disciplina de música no ensino regular brasileiro, sendo este público ou particular. A fábula “A Cigarra e a Formiga” foi utilizada como elemento mediador do paralelo estabelecido entre a educação na Grécia Antiga e a realidade do ensino de música nas escolas brasileiras, levando-se também em conta alguns fatos históricos. Sabe-se que a cultura grega exerceu grande influência sobre a cultura ocidental atual e tal fato se evidencia também no que diz respeito à música como disciplina educacional, tendo em vista que esta ocupava lugar de destaque na educação da Antiga Grécia, fundamentada na paidéia. Grandes nomes da história Grega ocuparam-se com a reflexão sobre a música, dentre os mais importantes destacam-se Pitágoras e Platão. Deve-se levar em conta que o universo musical grego era bem diferente do que atualmente o Ocidente (sobretudo) entende por música. Todavia, apesar destas diferenças alguns valores permaneceram e se fazem presentes na educação atual. Com relação à educação musical brasileira devese levar em conta as transformações ocorridas neste processo, que tem início com a chegada dos jesuítas, e através da análise dos fatos avaliar o nível de valorização da disciplina curricular no ensino regular. Palavras-chave: Educação Musical; Fábula; História.

Introdução Antes de adentrar ao tema propriamente dito, faz-se necessário acompanhar a fábula a seguir, recontada por Canton (2006, p. 19): Era verão. A formiga carregava suas folhas e seus alimentos de um lado para outro, enquanto a cigarra, caçoando dela, passava os dias cantando e se divertindo. Mas não tardou e o inverno chegou. A cigarra, faminta e com frio, foi pedir alimento à formiga, que lhe disse assim: - Por que é que você não trabalhou no verão e guardou comida para o inverno? - Eu não fiquei à toa não! Criei as mais doces melodias (...). - Ah! você flauteou no verão? Agora dance no inverno! (...)”.

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Graduanda do curso de Licenciatura em Música, na Universidade Federal de Sergipe. Formada pelo Conservatório de Música de Sergipe, habilitação: piano.

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A conhecida fábula, atribuída ao grego Esopo (séc. VI a.C.), assim como todas as outras, que supostamente escrevera, foram comunicadas por meio da tradição oral e somente foram reunidas e escritas duzentos anos após sua morte, por Demétrio de Falero (325 a.C.). Trata-se de uma narrativa que engloba duas personagens: de um lado a formiga, que desempenha seu trabalho com seriedade, de outro a cigarra, boêmia, mas que na verdade era agradável à formiga, por tornar seu trabalho menos árduo. No entanto, a cigarra foi entendida, pelo próprio Esopo, como alguém que vagueava enquanto a formiga trabalhava sem cessar. Apesar de parecer bastante clara, a lição de moral desta fábula sugere um questionamento, se analisada por outro ângulo. Será que a personagem representada pela cigarra estava realmente a vadiar? E ainda: não haveria utilidade em sua atividade musical?

Um olhar sobre a Grécia Antiga Muitos deverão estar a se perguntar sobre qual a relação existente entre a educação musical no ensino regular brasileiro e essa antiqüíssima fábula. Porém, para que haja uma melhor compreensão desta ligação (comparação), se faz necessária uma abordagem sobre o panorama histórico musical da Antiga Grécia, pois além de ter sido este território helênico o berço da civilização ocidental, foi este o ambiente no qual o suposto autor da obra escrevera suas fábulas. Foi na Grécia Antiga que surgiu a preocupação em formalizar o processo educacional. A palavra pedagogia vem do grego e é referente ao escravo que levava os jovens à escola (Cf. SOUZA, 2006). A educação grega estava fundamentada em dois pilares fundamentais: a saúde física e espiritual. Tais pilares seriam sintetizados pela palavra Paidéia no séc. V (Cf. WERNER JAEGER, apud SOUZA, 2006, p. 33). A educação da antiga Grécia divide-se macroscopicamente em dois períodos. O Período Antigo, que abrange a Idade Homérica e a Idade Histórica e o Novo Período, que tem início no séc. V a.C. e compreende o Período Clássico e o Período Helenístico. Desde o Período Homérico já se tem notícia de uma preocupação com a educação musical, pois apesar de ser um tempo onde a cultura ainda era transmitida oralmente, há registros sobre a educação musical até mesmo nos poemas épicos de Homero. Todavia,

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até então, eram atribuídos à música características místicas e sua importância estava, de certa forma, simplesmente subjugada a efeitos psicológicos e performáticos. Na obra “Teogonia: a origem dos deuses” de Hesíodo está representada a mística musical, a arte das Musas, deusas filhas de Zeus e da Memória (Mnemosyne) que, segundo o autor, fundamentam o mundo. Hesíodo está inserido no Período Arcaico, época na qual começa a desenvolver-se o alfabeto fonético. Todavia, a marca da oralidade está presente em seu poema Teogonia onde o aedo busca explicar o poder exercido pelas Musas no mundo. De acordo com Hesíodo, as Musas se manifestam no canto e na dança. Importante ressaltar que para os antigos gregos a música e a palavra estavam intimamente ligados. O poeta, portanto, tem na palavra cantada o poder de ultrapassar e superar todos os bloqueios e distâncias espaciais e temporais, um poder que só lhe é conferido pela Memória (Mnemosyne) através das palavras cantadas (Musas) (Cf. HESÍODO, 1995, p.11). Eis que surge, no séc. VI a.C. (período histórico no qual começa a surgir a tradição escrita na Grécia) um estudioso chamado Pitágoras, o matemático que traria grandes contribuições à música, tanto por enxergá-la como uma ciência, como por estabelecer, com esta ciência, especulações teóricas. Pitágoras e seus seguidores tentam explicar a música por meio da matemática, dos números que regiam todo o universo. Segundo Lia Tomás (2002, p.22) a escola pitagórica foi a primeira a fazer tentativas de teorização da linguagem musical. No entanto, pode-se perceber claramente, desde esta época o caráter interdisciplinar desta ciência: O que se pode dizer em linhas gerais é que o pensamento musical grego concebe o fenômeno musical de um modo complexo e multiforme, visto que entre os gregos a música mantinha vínculos muito íntimos com a medicina, a astronomia, a religião, a filosofia, a poesia, a métrica, a dança e a pedagogia (Ibdem, 2002, p. 28).

Pitágoras está então inserido no período em que surge o pensamento racional na Grécia. Tal fato, portanto, pode explicar o motivo pelo qual o célebre matemático pensou a música de modo racional. O fato de ser considerada ciência pelos pitagóricos traz também, para a música, uma valorização peculiar, pois apesar de o universo musical da Antiga Grécia ser claramente distinto do universo musical no atual Ocidente, o fato de poder ser explicada cientificamente é muito importante para sua valorização 3

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posterior não somente como elemento místico, mas como ciência que, apesar disto, apresentaria características bem peculiares.

O ensino da música na estrutura educacional grega Segundo Fonterrada (2008 p.26), a busca do valor da música e da educação musical inicia-se na Grécia. Visto que influenciava tanto na ordem social, quanto política, os gregos entendiam que a música deveria fazer parte do currículo educacional das crianças e dos jovens, não ficando a cargo somente dos executantes. “Em Esparta, em seu sistema de educação para os jovens e para o povo, Licurgo exigia que a música fizesse parte da educação da infância e da juventude, e que fosse supervisionada pelo Estado” (Op. cit. p. 26). Toda esta preocupação deve-se sobretudo à Doutrina do Éthos, que tem longínquas raízes orientais e se estabeleceu na Grécia como forma de explicar a influencia modeladora que a música exercia sobre o caráter do indivíduo (Cf. GROUT; PALISCA, 2007, p. 20). Tal fato fica bem exemplificado em um trecho da República escrita por Platão: - Quais são as harmonias lamentosas? Diz-me, já que és músico: - São a mixolídia, a sintonolídia e outras que tais. - Portanto essas são as que se devem excluir, visto que são inúteis para as mulheres, que convém que sejam honestas, para já não falar dos homens. - Certamente (...). - Quais são, pois, dentre as harmonias, as moles e as dos banquetes? - Há umas variedades da jônia e da lídia, a que chamam efeminadas. - E essas poderás utilizá-las na formação de guerreiros, meu amigo? - De modo algum, respondeu. Mas arrisca-te a que fiquem apenas a dórica e a frigia. (PLATÃO, 2000, p. 90-91)

No diálogo, citado anteriormente, entre Sócrates e Glauco (nesta ordem), notase o quanto a doutrina do Éthos estava enraizada na cultura grega e era justamente esta ideologia que regia sua força no contexto educacional.

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- Não é então por este motivo, Glauco, que a educação pela música é capital, porque o ritmo e a harmonia penetram mais fundo na alma e afetam mais fortemente, trazendo consigo a perfeição e tornando aquela perfeita, se se tiver sido educada? (PLATÃO, 2000, p. 94)

No entanto, apesar deste ideal de integração entre música e universo ser condizente com o pensamento racional de Pitágoras e as teorias aristotélicas e platônicas distingui-se, neste ponto, duas variáveis que irão diferenciar o modo pelo qual os gregos entendiam a música. Uma das variáveis “[a] concebe como regida por leis matemáticas universais e outra que acredita que seu poder emana da relação estreita entre ela e os sentimentos- éthos”. (FONTERRADA, 2008, p.28). Esta dualidade existente na cultura grega, com relação à arte das musas, com certeza não diminuíram seu valor no âmbito educacional daquela realidade.

Educação Musical no Brasil Fazendo-se um breve apanhado sobre o desenvolvimento da educação musical no Brasil poder-se-á notar que esta esteve, por muito tempo, subjugada a interesses políticos nacionais. Desde os jesuítas, os primeiros a implantar o ensino de música no Brasil2, a transmissão do conhecimento musical não tem sido a principal finalidade do ensino da música no Brasil visto que, para os jesuítas, a educação musical era antes de tudo um meio de catequizar os povos nativos. Durante todo o período colonial brasileiro a educação musical estaria mais voltada para a prática instrumental e para o canto. O ensino de música em si distinguiase bastante do que hoje se entende por educação musical, pois naquela época a prática musical estava principalmente ligada à Igreja e o processo de ensino-aprendizagem fundamentava-se nos métodos de repetição e memorização. Durante o período que se estendeu desde a chegada da Família Real até a primeira metade do séc. XIX não houve grandes mudanças na realidade da educação musical, que continuava ligada às práticas européias. No entanto, segundo Fonterrada (2008, p. 210) “foi somente em 1854 que se instituiu oficialmente o ensino da música 2

É válido ressaltar que já havia produção musical no Brasil, praticada pelos povos nativos, e que esta cultura musical era transmitida oralmente e informalmente. Os Jesuítas, no entanto, foram os primeiros a formalizar o ensino no Brasil e a esquematizá-lo. Para este item, veja: FONTERRADA, 2008, p. 208.

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nas escolas brasileiras”. Foi no séc. XX que ocorreram as primeiras grandes modificações na educação musical brasileira, em especial na Era Vargas, onde por meio do compositor Villa-Lobos a disciplina ganha uma atenção especial. De acordo com Juzamara Souza3 (2002, p. 13) : A política educacional autoritária de Vargas e o projeto de nacionalização emergentes no início dos anos trinta influenciam diretamente a educação musical nas escolas. Com a reforma de ensino em 1931 (Decreto n. 19.890 de 18 de abril, art. 3) a aula de música passa a ser obrigatória para todos os níveis.

Apesar de fazer parte do currículo escolar a música ainda não possuía carga horária fixa e era tida como auxílio às demais disciplinas. “Neste contexto surge a proposta pedagógica do canto orfeônico de Villa-Lobos (...), um programa de educação musical que abrangia todos os níveis escolares e que deveria ser implantado em todo território nacional” (SOUZA, 2002, p. 14). A intenção de Villa-Lobos era estabelecer uma educação musical eficiente nas escolas, através do canto coral. Todavia, com o Estado Novo, a música passa a ser utilizada na educação como meio de fortalecer o ideal nacionalista, fortalecendo assim o poder e o prestígio da política dominante. No entanto, se a situação parece grave, o quadro piorou ainda mais no período da ditadura militar, quando foi promulgada a lei n. 5692/71 que “extinguiu a disciplina educação musical do sistema educacional brasileiro, substituindo-a pela atividade da educação artística” (FONTERRADA, 2008, p. 217-218, grifo nosso). A partir de então a visão da música como elemento lúdico e auxiliador na educação regular tornou-se cada vez mais comum, visto que os professores graduados em educação artística possuíam formação geral e polivalente, evidenciando assim sua falta de preparo para o ensino da música. Nos anos de 1990 retoma-se a preocupação com o ensino das artes na escola. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n. 9394/96 veio justamente destacar a importância do ensino da arte no currículo. Com promulgação da nova LDB, o MEC elaborou “documentos orientadores, destinados a servir de guia a escolas e profissionais envolvidos com Educação” (FONTERRADA, 2008, p. 216). Estes documentos são o Referencial Curricular Nacional (RCN) e os Parâmetros Curriculares 3

Veja: OLIVEIRA, A. CAJAZEIRA, R. (org.) Educação Musical no Brasil. Salvador, P&A, 2007.

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Nacionais (PCN), que apresentam, inclusive, muitas orientações direcionadas para a música, que está inserida na atividade de educação artística. Apesar de parecerem um tanto vagas, a proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais exigem uma boa formação musical do professor de artes, pois sua falta de formação adequada acarretaria o não cumprimento destas propostas. Cria-se então um novo impasse para a educação musical, pois sua problemática a partir desde momento não estariam em torno da falta de orientações e até mesmo de leis, mas no não cumprimento destas leis. Que problemática seria esta?

Retorno à Fábula Na fábula grega, citada no início deste artigo, a cigarra, personagem que desempenhava atividade musical, não fora valorizada pela formiga. No entanto a cigarra havia sido útil para a formiga pois tornara seu trabalho mais brando. É preciso, pois, fazer-se uma reflexão sobre esta fábula e lançar o seguinte questionamento: No contexto atual da Educação Regular, a quem poderia ser atribuído a personagem da cigarra? Não se faz necessária uma longa reflexão para tanto, visto que logo seria apontada para tal personagem a figura do educador musical, ou ainda, da educação musical. No ensino regular brasileiro (público ou privado) as aulas de música, em boa parte dos casos, giram em torno das festividades da escola4; Quando não, a música é tida como apoio às demais disciplinas (como português, matemática, etc.) como uma forma lúdica de auxílio no processo de ensino aprendizagem destas matérias. Eis que no ano de 2008 um fato de grande importância ocorreu. É promulgada a Lei n. 11.769/2008, que torna a música conteúdo obrigatório no ensino regular, tanto público quanto privado. Todavia, esta lei ainda deixa uma brecha para discussões sobre a qualificação profissional, ou formação necessária para o exercício desta atividade. Além disso, o fato de ser conteúdo obrigatório não lhe confere, necessariamente, um caráter disciplinar.

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Esta é uma pratica comum, de modo especial nas datas comemorativas (dia dos pais, das mães, etc.)

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Música como agente na formação global do indivíduo É certo que o estudo da música desenvolve na criança e no adolescente a criatividade, a intelectualidade, melhora a concentração e a integração social dos mesmos. Tais estudos ainda estão em andamento, mas já apontam como sendo verdadeiras essas afirmações. Obviamente estas revelações devem entusiasmar os educadores musicais por poderem participar deste processo. Porém, é preciso ter cautela com relação a todas estas “vantagens”, pois não devem ser estes os motivos pelos quais deve haver o ensino da música nas escolas. Bastian (2009, p.124) declara: A música apresenta um campo de exercícios que pode, acima de tudo, ajudar nas deficiências de concentração das crianças. (...) Portanto a educação musical pode agir de maneira preventiva, vale dizer compensatória, contra a deficiência de concentração.5

Retoma-se então o ideal grego que creditava à musica o poder de influenciar no caráter do indivíduo. Tal pensamento parece ter permeado ao longo dos séculos. Além disso, há também a idéia de integração entre educação musical e a problemática social, defendida por Koellreutter que pensa a música como elemento contribuinte para o desenvolvimento integral do indivíduo (Cf. CALEDEIRA; FONTERRADA, 2005, p. 1281). De acordo com o líder do Movimento Música Viva, o ensino de música deve, portanto, estar relacionado com a nova sociedade. A mais importante implicação desta tese no que toca a música – ou melhor, à educação pela música – na nova sociedade é a tarefa de despertar, na mente dos jovens, a consciência da interdependência de sentimento e racionalidade, tecnológica e estética; noutras palavras, de desenvolver a capacidade para um pensamento globalizante, integrado, perdido em muitas culturas (KOELLREUTTER, 1977, p. 6, grifo nosso).

A citação acima exprime bem claramente a visão integradora de Koellreutter. No entanto, tal pensamento finda por criar ainda mais questionamentos a cerca do ensino da música. É importante ressaltar que existem outras abordagens sobre a utilidade da música na escola, mas a questão torna-se ainda mais indagadora quando se considera a realidade do ensino brasileiro como um todo, as carências pelas quais

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Bastian refere-se a resultados provenientes de uma avaliação comparativa realizada com alunos do ensino fundamental, de nacionalidade alemã.

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padece, em especial a rede pública de ensino, fator que acaba gerando também dificuldades com relação ao exercício da educação musical. De acordo com Koellreutter, citado por Brito (2001, p. 41-42) o objetivo da educação musical está fundamentado no humano, considerando-a como arte funcional, que não tem como primordial pretensão (de modo especial no ensino regular) formar musicistas, mas contribuir para sua formação humanística.

Conclusão Desde a Grécia Antiga há uma preocupação com a educação musical. No entanto, apesar de Pitágoras ter declarado ser a música uma ciência e de tê-la explicado matematicamente, a ideologia que permaneceu ao longo dos séculos foi a derivada essencialmente da Doutrina do Éthos, música como arte que molda o caráter, que auxilia o indivíduo no equilíbrio social, além do que o próprio Pitágoras, como autentico grego, acreditada que a importância desta ciência estava relacionada com tal doutrina, uma música que era regida pelo universo e que portanto regia todos os indivíduos. A fábula de Esopo, apesar da longínqua data na qual foi contada, permanece atual no que diz respeito sobretudo à realidade da educação musical brasileira. Apesar de todas as tentativas para tentar justificar a utilidade do ensino da música na escola regular o processo continua ainda lento devido aos vários fatores apresentados neste estudo. Porém, uma coisa é certa: a importância do ensino da disciplina Música não se resume ao fato de ser ela um importante auxílio às demais disciplinas, um meio de integração social, ou um método eficaz de melhorar a concentração do indivíduo, de desenvolver a criatividade etc. Tais fatores são de suma importância, porém não devem ser entendidos como causa da educação musical, mas como possíveis conseqüências. A importância da música na escola regular reside no fato de ser ela uma forma de conhecimento (Cf. FONTERRADA, 2008, p.13), uma ciência como geografia, matemática ou qualquer outra disciplina que faz parte do currículo das escolas regulares, sejam elas da rede pública ou particular. Uma ciência que possui seu conteúdo próprio. Sobretudo agora com a promulgação da lei 11.769/2008, as reflexões acerca do ensino de música, devem fazer-se urgentes e concretas.

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Por fim, acreditamos que enquanto não for entendida como forma de conhecimento a música permanecerá “cigarra” no contexto educacional.

Referências Bibliográficas BASTIAN, Hans Günther. Música na Escola: a contribuição do ensino da música no aprendizado e no convívio social da criança. Tradução de Paulo F. Valério. São Paulo: Paulinas, 2009. BRITO, Teca Alencar de. Koellreutter Educador: o humano como objetivo da educação musical. São Paulo: Péirópolis, 2001. CALDEIRA, Zóica Andrade; FONTERRADA, Marisa Trenh de Oliveira, O papel mediador da educação musical no contexto hospitalar: uma abordagem sócio-histórica. In: CONGRESSO DA ANPPOM, 15, 2005, São Paulo. Anais... São Paulo: ANPPOM, 2005, p. 1281-1289. CANTON, Kátia. Era uma vez Esopo. São Paulo: DCL, 2006. FONTERRADA, Marisa Trench de Oliveira. De tramas e fios: Um ensaio sobre música e educação. São Paulo: UNESP; Rio de Janeiro: Funarte, 2008. GROUT, Donald J.; Palisca, Claude V. História da Música Ocidental. Lisboa: Gradiva, 2007. HESÍODO. Teogonia: a origem dos deuses. Estudo e tradução de Jaa Torrano. 3. ed. São Paulo: Iluminuras, 1995. KOELLREUTTER, Hans-Joachim. O ensino da música num mundo modificado. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE COMPOSITORES, 1, 1977, São Paulo. Anais... 1977, p. 1-6. MATEIRO, Teresa da Assunção N. Educação Musical nas escolas brasileiras: retrospectiva histórica e tendências atuais. Arte online - Periódico online de Artes, UDESC - Florianópolis, v. 2, fev.2000, p. 1-9, 2000. PLATÃO. A República. Tradução de Pietro Nassiti. São Paulo: Martin Claret Ltda, 2000. SOUZA, Jusamara. A Educação Musical no Brasil dos Anos 1930 – 45. In: OLIVEIRA, Alda; CAJAZEIRA, Regina (Org.). Educação Musical no Brasil. Salvador: P&A, 2007, p. 13-17.

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SOUZA, Neuza Maria Marques de. (Org.); MANCINI, Ana Paula Gomes et al. História da Educação. São Paulo: Avercamp, 2006. TOMÁS, Lia. Ouvir o lógos: música e filosofia. São Paulo: UNESP, 2002.

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