“A classificação do património edificado”, In Actas das Jornadas realizadas em Arouca em 2004 «Cartas Arqueológicas – do inventário à salvaguarda e valorização do património», C.M. de Arouca, 2005

July 4, 2017 | Autor: Miguel Rodrigues | Categoria: Patrimonio Cultural, Salvaguardia Dei Beni Culturali, Salvaguardia Del Patrimonio Culturale
Share Embed


Descrição do Produto

 Miguel Areosa. Rodrigues, “A classificação do património edificado”, In Actas das Jornadas realizadas em Arouca em 2004 «Cartas Arqueológicas – do inventário à salvaguarda e valorização do património», C.M. de Arouca, 2005

A CLASSIFICAÇÃO DO PATRIMÓNIO EDIFICADO 1 Miguel Areosa Rodrigues2

Em Junho de 2004 completam-se 94 anos sobre o primeiro diploma legal de protecção do bens culturais nacionais, em que são definidos os imóveis considerados Monumentos Nacionais, lista em que se incluem a grande maioria dos monumentos que ainda hoje reconhecemos como símbolos nacionais ou mesmo exemplares excepcionais reconhecidos como Património Mundial – Mosteiro de Alcobaça, Mosteiro dos Jerónimos, Torre de Belém, A preocupação com os edifícios notáveis enquanto testemunhos do passado da nação, vai se impondo ao longo do século XIX entre as elites cultas 3. Num período de transformações significativas nos tecidos urbanos, especialmente na segunda metade do século XIX, verifica-se a ascensão definitiva da figura do Estado enquanto entidade tutelar e representativa do colectivo nacional. Por outro lado, o Estado encontrar-se agora na posse de um grande número de imóveis, de grande valor artístico, histórico e simbólico, cuja utilização original cessou e que começam a ser encarados como valores patrimoniais, no sentido em que são símbolos nacionais. Trata-se não só do património monástico que após a desamortização, permanece em parte na posse do Estado, por vezes com novas utilizações, mas também das fortificações que deixam de ter utilização militar. Deixando de ter uma manutenção que lhes era assegurada pela utilização, vão entrar em degradação, muitas vezes acelerada pelo desmonte e utilização das pedras na construção de novos edifícios. 1

Esta comunicação tem por base de trabalho e análise, o conjunto de imóveis classificados e em vias de classificação da Região Norte. Sendo a este universo que se referem todos os gráficos incluídos. 2 Arqueólogo, Direcção Regional do Porto do IPPAR - [email protected] 3 Sobre este assunto que não constitui objectivo desta comunicação, verificar p.ex.: CUSTÓDIO, 1993; MARTINS, 2003a e 2003b

Mas se datam deste período muitas destruições bem documentadas, verifica-se que, como depois se vai verificar frequentemente, é numa situação de “crise” para a preservação do património que também se começam a verificar as primeiras preocupações “modernas” com a preservação de monumentos, numa lógica não apenas utilitária mas já conservacionista.: -

intervenções de articulistas, desde logo Almeida Garrett, que logo em 1843 clama contra a degradação dos templos deixados ao abandono e Alexandre Herculano que, tendo demonstrado várias vezes a sua preocupação com este assunto, alerta para o estado de abandono em que se encontravam os monumentos históricos, procurando sensibilizar a opinião pública para a importância da salvaguarda dos “monumentos pátrios”, sugerindo a publicação de legislação protectora e alertando mesmo para as potencialidades turistico-económicas dos monumentos nacionais.

-

Constituição das primeiras associações dedicadas ao estudo e protecção do património:

em 1863 - a Real Associação dos Architectos Civis e

Archeólogos Portugueses; em 1882 - a Sociedade Martins Sarmento em Guimarães; em 1889 - a Comissão de Vigilância do Castelo da Feira e a Real Irmandade da Rainha Santa Mafalda em Arouca. -

Intervenções do Estado de conservação em imóveis de valor patrimonial.

-

Definição em 1880, pela Real Associação dos Architectos Civis e Archeólogos Portugueses, de um conjunto de monumentos enquanto símbolos nacionais, que genericamente se manterá até aos nossos dias.

O FINAL DA MONARQUIA E A REPÚBLICA O diploma de classificação publicado em Junho de 1910, corresponde a um dos poucos momentos ao longo de mais de 90 anos de classificações em que a selecção dos imóveis a classificar parece resultar de uma pré-selecção consciente, retrato de uma conceptualização do modelo de monumento que se pretendia preservar. Como quase sempre aconteceu e ainda acontece, classificaram-se os imóveis que já eram considerados monumentos, ou seja mais do que patrimonializar imóveis através da classificação o que aconteceu foi classificaremse os monumentos que o censo comum aceitava como notáveis e simbólicos. Seja

pela sua dimensão histórica – castelos, sítios arqueológicos, pelo seu valor artistico-arquitectónico – igrejas, capelas, mosteiros, palácios, pela sua afirmação –

simbólica

pelourinhos,

cruzeiros,

pontes.

Estes

monumentos

eram

essencialmente propriedade da Igreja e do Estado, excluindo-se desse

Imóveis classificados, no Norte de Portugal, pelo decreto de 1910 – distribuição tipológica Sitios arq. 18% Igrejas 30% Outros 4% Fontes e aquedutos 3% Pontes 10%

Fortificações 11%

Casas solarengas 6% Edificios notáveis 4% Pelourinhos e cruzeiros 14%

enquadramento, alguns palácios, classificados pelo seu valor artístico de excepção (Brejoeira, Giela, Mateus, Freixo) e os sítios arqueológicos. O facto do Estado ser proprietário de um grande número destes imóveis classificados vai ser reforçado, pouco tempo depois, com a nacionalização dos bens da igreja na sequência da implantação da República, apenas 4 meses após a publicação do primeiro decreto de classificações. O Estado passa a ter a posse de grande parte do património artístico e monumental nacional. A Concordata de 1942 vai manter este statuo quo, no sentido em que, ao devolver os bens nacionalizados em 1910, o Estado mantém na sua posse, embora com usufruto da igreja, todos os imóveis que entretanto tinham sido objecto de classificação ou que o viessem a ser até 1945.

Esta situação explica que actualmente o Estado ou a Administração Local sejam, porque proprietários, directamente responsáveis pela manutenção e conservação de grande parte do património classificado

Decreto de 1910 – distribuição cronológica dos imóveis classificados Séc. XIX Pré-História Séc. XVIII 1% Idade do 6% 9% Ferro 7% Romanização 6%

Séc. XV/XVII 19%

Idade Média 52%

Analisando a listagem de imóveis classificados pelo decreto de 16 de Junho de 1910, teremos que salientar que constituem ainda hoje o corpus fundamental do património classificado português, a quase totalidade pertence ainda hoje ao Estado e constitui o essencial do imóveis que têm vindo a ser objecto de intervenções de restauro e valorização por parte do Estado ao longo de todo o século XX. Curiosamente, se é verdade que do ponto de vista artístico predominam os monumentos de raiz românico-gótica, encontram-se igualmente bem representados os monumentos manuelinos e renascentistas, e mesmo diversos palácios barrocos.

Será interessante salientar a presença de um número significativo de sítios e monumentos arqueológicos, mais uma vez a maioria dos que ainda hoje constituem o imaginário do cidadão comum e que se encontram visitáveis (as Citânias de Briteiros, Sabroso e Monte Padrão, as Antas de Chã de Parada (Baião), da Barrosa (V.P. de Âncora) e da Fonte Coberta (Alijó); o Santuário de Panóias e a Geira romana). A presença de um número tão significativo de sítios arqueológicos explica-se pelo desenvolvimento que a investigação arqueológica tinha sido objecto graças ao trabalho desenvolvido, nas últimas décadas do séc. XIX e no início do século XX, por um insigne grupo de estudiosos em que se destacam, José Leite de Vasconcelos, Martins Sarmento, e Possidónio da Silva. Ao longo do século continuarão a ser classificados sítios arqueológicos, de forma regular, com especial incremento a partir da década de 70, correspondendo ao ressurgir da investigação arqueológica que se verifica a partir do final da década, seja no meio universitário, com a criação das Variantes de Arqueologia no curso de História, seja na administração do Estado, com a criação dos Serviços Regionais de Arqueologia no âmbito do IPPC. . O ESTADO NOVO A matriz que infirma este primeiro lote de imóveis classificados vai-se manter ao longo de cerca de 50 anos. As classificações que se vão suceder confirmam e completam o quadro de monumentos definido pelo primeiro decreto de 1910, embora, na prática, claramente se estreitem os critérios que conduzem à escolha dos imóveis a classificar. Por um lado, embora a legislação de enquadramento preveja desde o início a classificação de imóveis privados vão ser essencialmente os bens do Estado que vão ser objecto de classificação, Se no primeiro decreto de classificações a pertença ao Estado de grande parte dos imóveis é consequência natural do processo de desamortizações e, depois, da nacionalização dos bens da igreja, já posteriormente podemos aventar que o facto de um determinado imóvel pertencer ao Estado se torna quase um critério não declarado para a classificação de um imóvel.

Por outro lado, conforme já acontecia no decreto de 1910, são muito poucos os imóveis com uma utilização de caracter privado. No Norte do País, onde se situam grande parte dos Solares e casa senhoriais, apenas em 1949 se voltam a classificar 2 solares – dos Biscainhos, em Braga e do Requeijo, nos Arcos de Valdevez

Imóveis classificados, no Norte de Portugal, entre 1920 e 1970 - distribuição tipológica Sitios arq. 13% Outros 2% Fontes e aquedutos 5% Pontes 6%

Igrejas 47%

Fortificações 12%

Pelourinhos e cruzeiros 12%

Edificios notáveis 2%

Casas solarengas 1%

Por fim, o critério histórico -artístico parece fixar-se no período da fundação da nacionalidade, com especial incidência nos estilos românico e gótico, incluindo-se aqui o manuelino, tendência que é acompanhada pelas intervenções de restauro conduzidas pela ideia de reposição da unidade estilística. Pelo que, mesmo quando alguns destes imóveis não correspondiam completamente ao modelo conceptual, passaram a corresponder após as intervenções de restauro de que foram alvo.

Apenas fogem a este modelo as igrejas conventuais que pelas suas características monumentais, reúnem com frequência uma miriade de intervenções realizadas ao longo dos tempos, e constituem um palimpsesto estilístico que sobreviveu às intervenções mais radicais realizadas nas pequenas igrejas. Refira-se como curiosidade que a primeira igreja barroca a ser classificada no Norte do país foi a igreja matriz de Sambade, em Alfândega da Fé, em 1935. O que faz com seja actualmente, no Norte do país, a única igreja paroquial com estas características na posse do Estado. Só passados mais de 20 anos, em 1958, é novamente classificada uma igreja paroquial barroca, a igreja de São Pedro de Miragaia, no Porto. Aos critérios histórico, arqueológico, artístico, arquitectónico e de interesse nacional, referidos na legislação inicial, e que enquadram as classificações na primeira metade do século, vão sendo acrescentados novos critérios. Em 1949 4 inclui-se o valor paisagístico; em 1973 5, o valor etnográfico. O processo de actualização da legislação é lento e só com muito atraso são seguidas as metodologias que desde 1931, com a Carta de Atenas, são propostas internacionalmente. O número de imóveis classificados cresce de forma lenta e embora não se conheça nenhuma acção de inventário patrimonial generalizado, verifica-se que a lógica essencial das novas classificações, entre 1920 e 1970, é de complementaridade em relação à listagem inicial, concentrando-se nas fortificações e imóveis religiosos de origem medieval. Cabe aqui referir que, quer na escolha dos monumentos a classificar quer nas características das intervenções de restauro, existe uma concepção ideológica de matriz nacionalista que procurava, através da utilização quase obsessiva da pedra sem revestimentos, associar a rudeza, solidez e pureza dos materiais em presença, à imagem de um povo austero, honesto e simples. Verifica-se também a classificação de conjuntos de imóveis tipologicamente semelhantes e para o que terá sido indispensável uma acção de inventariação

4 5

Decreto-lei 2032/49 de 11 de Junho Decreto-lei 582/73 de 5 de Novembro

prévia. É o caso das classificações dos pelourinhos portugueses6 em 1933 , de todos os marcos pombalinos que delimitavam o Alto Douro Vinhateiro 7 em 1946, de uma série de fontanários da cidade do Porto8 em 1938 e das fortificações abaluartadas do litoral a Norte do Douro em 19679 Existe também uma intenção de protecção de sítios arqueológicos, por vezes de descoberta recente, através da sua classificação. Por fim, existem classificações cuja motivação parece ter um caracter mais pontual ou localizado, surgindo por eventual acção de individual ou de instituições de origem local. . ANOS 70 e 80 Apenas na segunda metade da década de 70 pudemos verificar alterações substanciais à prática de classificação exercida ao longo da primeira metade do século e que se expressam, por um lado, no aumento significativo do número de imóveis objecto de classificação, por outro, no aumento exponencial da classificação de imóveis particulares, principalmente casas solarengas e capelas, por fim na diversificação dos critérios que conduzem à classificação, num movimento que se expressa em diversas direcções, dando sequência a algum desenvolvimento

legislativo

anterior

e

às

indicações

das

convenções

internacionais até então realizadas (Carta de Veneza de 1964; Carta Europeia do Património Arquitectónico de 1975; Carta de Florença de 1981 sobre os jardins históricos) e que se manifesta nos seguintes pontos:

6

Decreto-lei Decreto-lei 8 Decreto-lei 9 Decreto-lei 7

23122/33 de 11 de Outubro 35909/46 de 17 de Outubro 28536/38 de 22 de Março 47508/67 de 24 de Janeiro e 47984/67 de 6 de Outubro

Imóveis classificados, no Norte de Portugal, entre 1970 e 1990 – distribuição tipológica

Sitios arq. 14% Outros 2% Fontes e aquedutos 2%

Igrejas 32%

Pontes 7% Fortificações 4% Pelourinhos e cruzeiros 3% Edificios notáveis 10% Casas solarengas 26%

-

Protecção de conjuntos urbanos, nomeadamente pela classificação de centros históricos, ruas e áreas urbanas de interesse patrimonial e pela definição de Zonas Especiais de Protecção abrangendo um conjunto de imóveis classificados num determinado centro urbano. Esta preocupação tem inicio ainda na década de 70 por exemplo com a definição da ZEP do Centro Histórico de Viana do Castelo e com as classificações cos conjuntos urbanos do Passeio Alegre na Póvoa de Varzim10 e da Praça da Ribeira e suas extensões, no Porto11.

-

Concepção dos imóveis a classificar como um conjunto indissociável composto por parte edificada, jardins, parte agrícola, florestal, cercas, muros, caminhos, etc,

10

Conjunto ou espaço urbano designado por "Passeio Alegre" na Póvoa de Varzim; classificado como IIP através do Decreto Nº 129/77 de 29-9 11 Conjunto urbano constituído pela Praça da Ribeira e suas naturais extensões no Porto; classificado através do Decreto Nº 516/71 de 22-11

não só enquanto elementos contextualizantes que poderiam ser abrangidos por uma ZEP, mas como elementos fundamentais para a sobrevivência

e

compreensão do conjunto classificado. As classificações dos solares e casas em contexto urbano passam a incluir os jardins; nos solares e quintas rurais procura-se classificar o conjunto da propriedade, entendida como um complexo monumental mas

também

como

um

sistema

produtivo

coerente

indispensável

à

sustentabilidade económica do edificado. No caso dos mosteiros a classificação passa a abranger a totalidade do complexo monástico, incluindo os edifícios e a cerca, entendido como conjunto indispensável à compreensão do Mosteiro e à sua preservação, na medida a actividade agrícola e artesanal desenvolvida no espaço da cerca é indispensável para a compreensão do Mosteiro na sua globalidade. Nos casos em que a paisagem envolvente ainda se encontra bem preservada e se relaciona com o conjunto monástico procura-se através da criação de uma ZEP proteger e reconstituir o contexto do couto primitivo. Este novo entendimento conduziu frequentemente à redefinição de anteriores classificações e surge aplicado num primeiro momento aos solares e aos respectivos jardins (Paço de Campo Belo 12, em V.N. de Gaia; Casa da Prelada 13, no Porto; Casa da Soenga14, em Resende). -

Verifica-se a introdução da noção de sítio arqueológico, alargada a áreas urbanas, assumindo, neste aspecto, o caso de Bracara Augusta, no final dos anos 70, um papel fundamental como alerta para a importância da protecção dos sedimentos arqueológicos em contextos urbanos. Abordagem dos sítios arqueológicos enquanto

contextos

complexos,

constituindo-se

com

frequência

como

palimpsestos de ocupações humanas ao longo dos tempos, identificados, não apenas por

estruturas construídas

mais

evidentes

mas,

também,

pela

transformação da paisagem e do território para cuja percepção contribui o desenvolvimento, ao longo dos anos 90, de técnicas do âmbito das ciências exactas, aplicadas à investigação arqueológica. O desenvolvimento, pelos Serviços Regionais de Arqueologia do IPPC, ao longo dos anos 80, de 12

Paço do Campo Belo, incluindo a capela e todo o seu conjunto circundante, nomeadamente os jardins, Vila Nova de Gaia; classificado como IIP através do Decreto Nº 129/77 de 29-9 13 Casa da Prelada, com o conjunto que a envolve, designadamente a mata e o jardim, Porto, classificado como IIP através do Decreto Nº 129/77 de 29-9 14 Casa da Soenga, incluindo os jardins, as estátuas e a Capela de Nossa Senhora do Carmo, Resende; classificado como IIP através do Decreto Nº 129/77 de 29-9

levantamentos arqueológicos no âmbito da elaboração de uma Carta Arqueológica Nacional, permitiu a selecção de sítios arqueológicos, a classificar, com base no potencial arqueológico observado através de técnicas de prospecção arqueológica; surgindo o conceito de reserva arqueológica aplicado a sítios arqueológicos ainda não objecto de investigação arqueológica intensiva. -

Atenção aos estilos arquitectónicos mais recentes, com a generalização das classificações de exemplares do período barroco (essencialmente igrejas, capelas e solares), mas também das arquitecturas do final do séc XIX (Teatro de S. João 15 e Edifícios no Porto nas ruas da Galeria de Paris e Cândido dos Reis 16), da Arquitectura do Ferro, com as classificações do Mercado Ferreira Borges17 e das Pontes de D. Maria e de D. Luís 18 e da Arquitectura Modernista com a classificação do Edifício do Frigorífico do Peixe 19, no Porto, da autoria do Arqtº

ANOS 90 Com a década de 80 o enquadramento legislativo de protecção ao património edificado conheceu significativa alteração, primeiro com a criação do Instituto Português do Património Cultural (IPPC), em 1979 e, em 1985, com a publicação da Lei de Bases do Património Cultural (Lei 13/85), que actualizava a legislação nacional, nomeadamente acolhendo no seu articulado, as propostas da então recente Convenção de Granada.

15

Teatro São João no Porto; classificado como IIP através do Decreto Nº 28/82 de 26-2 Edifícios na Rua Cândido dos Reis e na Rua da Galeria de Paris, no Porto; classificados como IIP através do Decreto Nº 735/74 de 21-12 16

17

Mercado Ferreira Borges no Porto; classificado como IIP através do Decreto Nº 28/82 de 26-2 18 Pontes D. Luís e de D. Maria Pia no Porto; classificadas como IIP através do Decreto Nº 28/82 de 26-2 19

Edifício do Frigorífico do Peixe no Porto; classificado como IIP através do Decreto Nº 129/77 de 29-9

Igrejas 21%

Sitios arq. 38%

Casas solarengas 17%

Outros 5%

Edificios notáveis Pontes Pelourinhos e 7% cruzeiros 9% 3%

Imóveis classificados, no Norte de Portugal, na década de 90 – distribuição tipológica

A nova legislação, embora nunca regulamentada, o crescimento, no âmbito do IPPC / IPPAR, de um corpo técnico especializado e actualizado pelas metodologias expressas nas diversas cartas e convenções internacionais; (Resolução 813, de 1983, do Conselho da Europa sobre a arquitectura contemporânea; Convenção de La Valette de 1992 sobre património arqueológico; Documento de Nara de 1994 sobre a noção de autenticidade em conservação de Património) e o desenvolvimento de uma opinião pública e publicada atenta e desperta para as questões relacionadas com a protecção do Património, reflectem-se na generalidade da actuação da Administração Pública na protecção do património e, evidentemente numa maior abrangência das tipologias e caracterização do imóveis a proteger e, consequentemente, a classificar:

-

A atenção à paisagem construída como testemunho maior do empreendimento humano colectivo ao longo de séculos. A paisagem vai passar de elemento de enquadramento a objecto fulcral de protecção. Salientem-se os contributos que a Arqueologia e a Geografia trouxeram para a compreensão da evolução e estruturação das paisagens humanizadas. O exemplo evidente a nível nacional é a classificação como Património Mundial do Alto Douro Vinhateiro, mas podemos

referir as classificações da Barragem romana da Aboboleira 20, em Chaves e das também romanas, minas de Trêsminas 21, em Vila Pouca de Aguiar, e, ainda, as ZEP’s definidas para as áreas envolventes dos Mosteiros de São João de Tarouca22, Santa Maria de Pombeiro 23 e Santa Maria do Bouro24. A salvaguarda deste tipo de áreas implica sempre uma actuação que ultrapassa as medidas estritas previstas na legislação de protecção do Património, para exigir intervenções ao nível do Ordenamento do Território. -

Valorização da noção de autenticidade, reflectindo-se numa maior exigência na análise dos imóveis a classificar e consequentemente na intervenção pós classificação no âmbito das intervenções de salvaguarda. Em consequência classificam-se imóveis e conjuntos que embora de menor impacte monumental, preservam características originais de âmbito estrutural, decorativo ou de utilização.

-

Surgem as primeiras classificações de arquitectura vernacular, que se podem associar às preocupações de protecção do património etnográfico, presentes na lei a partir dos anos 70. Trata-se de um tipo de património arquitectónico que tem sido pouco objecto de protecção legal através da classificação. Seja no caso de conjuntos rurais, seja no caso de exemplares isolados – moinhos, azenhas, pontes, serrações, etc.. Por um lado porque se trata de um património que tem na maior parte dos casos uma relevância de âmbito local, e que, no entanto, por ser património não monumental e de utilização diária tende a não ser valorizado pelas comunidades locais, mesmo pelo facto de estar frequentemente ligado a condições de vida difíceis num passado próximo.

Temos no entanto alguns casos de

classificação de conjuntos rurais (Aldeia de Drave, em Arouca, aldeias de Antas, Castelo e Sabugueiro em Lamego, aldeia de Limões em Ribeira de Pena), nem sempre com bons resultados na preservação das suas características após a classificação. Tratando-se geralmente de edifícios construídos em alvenarias 20

Barragem romana de Aboboleira em Chaves; classificada como IIP pelo Decreto Nº 26A/92 de 1-6 21 Minas romanas de Trêsminas em Vila Pouca de Aguiar; classificada como IIP pelo Decreto Nº 67/97 de 31-12 22 Mosteiro de São João de Tarouca, ZEP, D.R., 2ª Série, Nº 56 de 08/03/1999, Portaria nº 189/99 (2ª Série) 23 Mosteiro de Pombeiro, ZEP, Portaria nº 651/2002, de 14-6, D.R., Nº 135, I Série B, de 1406-2002 24 Mosteiro de Santa Maria do Bouro, ZEP - homologada em 23/10/2002 por S.E. o Ministro da Cultura

pobres, muitas vezes em mau estado de conservação, é muito difícil impedir as intervenções informais, com utilização de materiais exógenos – tijolo, cimento, telha, fibrocimento, chapas, azulejos, etc. Por outro lado, o desaparecimento dos saberes tradicionais ligados a este tipo de construção contrasta com a facilidade de utilização das novas técnicas construtivas. Por fim, as próprias regulamentações de edificações urbanas, pouco flexíveis em relação a casos excepcionais dificultam a requalificação e utilização das antigas construções. A experiência mostra-nos não

ser viável a preservação um conjunto rural habitado sem o

empenhamento da comunidade em presença, das autarquias envolvidas e de um apoio técnico e financeiro que permita a elaboração dos instrumento de gestão territorial adequados e os meios para a sua implementação. Já no que se refere a conjuntos rurais abandonados (Aldeia de Drave, em Arouca, aldeia de Antas, em Lamego), cada vez mais presentes no interior do país, sejam as tradicionais brandas ou mesmo antigas povoações agora desertificadas, a questão coloca-se na forma de conter, ou não, a lenta transformação em ruína. No que se refere a exemplares etnográficos, normalmente ligados a actividades artesanais, estamos aqui em presença de séries de imóveis ligados a uma mesma actividade, semelhantes do ponto de vista morfológico, em que não sendo possível a preservação e valorização de todos os exemplares, torna-se necessário proceder a um trabalho de inventariação prévia que permita detectar as variantes técnicas ou arquitectónicas por forma a proceder à seriação e selecção dos exemplares a preservar. Nestes casos a classificação de âmbito nacional tem sido pouco frequente, incluindo apenas alguns exemplares que pela sua exemplaridade e raridade ultrapassam o âmbito local. (Conjuntos de Espigueiros no Soajo e no Lindoso, Fojos de Lobo da Serra da Cabreira, Serra Hidráulica de Pereiras em Santo Tirso, Moinhos de Vento de Montedor em Viana do Castelo, etc.). -

A expansão urbana do último quartel do século XX, com alteração qualitativa na utilização de áreas que na primeira metade do século estavam destinadas a actividades industriais, assim como a transformação dessas mesmas actividades, veio colocar o problema da preservação deste património, de constituição recente, muitas vezes em mau estado de conservação e, mais uma vez, nem sempre valorizado pelas comunidades locais. Encontramos dois tipos de valores patrimoniais em presença, por um lado a arquitectura industrial, dos exemplares

ligados à arquitectura do ferro do final do séc. XIX aos edifícios modernistas da primeira metade do séc. XX;

por outro, a exemplaridade técnica de cada

actividade com todos os elementos que lhe estão associados – modos de produção e comercialização, maquinaria, documentação, etc. A preservação do edifício com todos os elementos característicos da produção no seu interior é rara e está normalmente associada a projectos de musealização, ( Edificio das Moagens Harmonia / Museu da Indústria ) sendo a classificação um dos elementos de um processo naturalmente complexo, que tem por objectivo a utilização exemplar de uma determinada unidade como ilustrativa de um determinado tipo de actividade industrial. É mais frequente e menos condicionante, a preservação de edifícios industriais, notáveis pelas suas características arquitectónicas e que, graças à amplidão dos espaços interiores, são facilmente adaptados a novos usos (Frigorifico do Peixe no Porto, Fabricas de Curtumes em Guimarães, Fabricas de Conservas em Matosinhos). -

Correspondendo ao gradual estudo científico e reconhecimento público das arquitecturas do séc. XX, foram sendo objecto de classificação, edifícios e conjuntos, exemplares de momento diversos da arquitectura contemporânea e notáveis pelas características estéticas e/ou técnicas. Neste aspecto insere-se a participação do IPPAR no DOCOMOMO e no apoio a iniciativas como a Exposição de Arquitectura Moderna Portuguesa, com natural reflexo no desenvolvimento de procedimentos de salvaguarda entre os quais a classificação.

Imóveis em vias de classificação, no Norte de Portugal – distribuião tipológica Sitios arq. 13% Conj Urbanos 5%

Igrejas 27%

Patr. Industrial 3% Etnografico 3%

Fontes e aquedutos 1%

Pontes 5%

Fortificações 2% Edificios notáveis 6%

Casas solarengas 35%

Analisado historicamente o procedimento da classificação verificamos nunca ter existido uma base de inventário generalizado de valores culturais a partir da qual fossem seleccionados os imóveis a classificar. Com excepção do decreto de 1910 que podemos considerar como resultante de um levantamento nacional de valores patrimoniais, sendo que os impulso que leva à classificação de um bem é, normalmente de caracter pontual, seja de origem local ou do próprio organismo que procede à classificação. Verificamos que as razões que levam ao início do procedimento são as seguintes: -

proposta do proprietário, essencialmente no caso de casas solarengas, com o objectivo de prestigiar o bem e protegê-lo de agressões exteriores, nomeadamente pela existência de uma área de protecção. Verifica-se também neste aspecto a importância dos benefícios fiscais previstos na Lei e o acesso a programas de financiamento, nomeadamente na área turística que apoiam preferencialmente os imóveis classificados.

-

Proposta de associações de defesa do património, geralmente em situações limite de destruição iminente do bem a classificar.

-

Proposta de autarquias locais, normalmente na sequência de levantamentos do património concelhio, muitas vezes sem seriação prévia da globalidade dos imóveis inventariados.

-

Iniciativa dos serviços do Estado responsáveis pelo procedimento de classificação, seja em situações pontuais, mais uma vez normalmente associadas a situações de crise, do bem ou da sua envolvente; ou na sequência de acções de inventário limitadas, normalmente de caracter específico, dirigidas a um tipo determinado de valor patrimonial e nem sempre com caracter formal. (Classificação dos pelourinhos, classificação dos chafarizes do Porto, carta arqueológica dos Serviços Regionais de Arqueologia nos anos 80, inventário do Património industrial na década de 90).

A Lei 107/2001 que estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural prevê no seu artigo 16º que, para além da protecção através da classificação, os bens culturais poderão ser protegidos através do registo patrimonial de inventário.

Independentemente de a Lei não se encontrar ainda regulamentada e portanto não existir uma definição exacta do que poderá vir a concretizar-se neste registo de inventário, verifica-se que não existe actualmente qualquer inventário nacional, sistemático e unificado dos bens patrimoniais.

Número de imóveis classificados, no Norte de Portugal, por décadas

200 180 160 140 120 196

100 92 80

109

161

151

146

60 40 20

73

0 33

44

42

28

0 Década Década Década Década Década Década Década Década Década de 1910 de1920 de1930 de1940 de1950 de1960 de1970 de1980 de1990

Existem no entanto uma multiplicidade de inventários e levantamentos de património, executados por entidades diversas e com objectivos e critérios múltiplos. – Planos de Ordenamento do Território, Estudos de Impacte Ambiental, Levantamentos de caracter académico e científico, iniciativas de Associações de Defesa do Património, etc. A definição do caracter do registo patrimonial de inventário poderá ajudar a ordenar alguma desta informação que actualmente se encontra muito dispersa e, consequentemente é de difícil utilização.

O IPPAR tem centrado a sua actuação, conforme previsto na Lei, na salvaguarda e valorização dos bens culturais classificados ou em vias de classificação, não tendo desenvolvido uma intervenção sistemática na área do inventário. No entanto, foram desenvolvidas acções de inventário específicas. Desde logo do património arqueológico, ainda enquanto IPPC e no âmbito da actuação dos então Serviços Regionais de Arqueologia que executaram acções de inventário sistemático, que se concretizaram na publicação da Carta Arqueológica do Algarve e no desenvolvimento na primeira metade dos anos 90 do Sistema de Informação Endovélico que está na base do actual Inventário Arqueológico Nacional disponibilizado pelo Instituto Português de Arqueologia. Aqui se incluem também acções como o Inventário de Património Industrial desenvolvido pelo IPPAR no âmbito do DOCOMOMO Ibérico, o Inventário de Arquitectura Moderna Portuguesa 1920-1970 que deu origem a uma série de exposições que correram o território nacional e o Projecto Itinerários de Cister que permitiu inventariar a globalidade do património monumental de origem cisterciense em Portugal e que tem tido continuidade numa série de intervenções de valorização, restauro e reconstituição desse património. Saliente-se, no entanto, que estas e outras acções de inventário específico promovidas pelo IPPAR não se esgotam apenas na elaboração de listagens, pelo contrário pretende-se, sempre, que sejam intervenções de investigação científica e procurando reunir-se um corpus documental, constituído por estudos, bibliografia, documentação gráfica e fotográfica, caracterização cadastral, etc. que permita apoiar intervenções de salvaguarda e propiciar elementos de registo e estudo à comunidade científica. Pela sua qualidade de entidade responsável pela salvaguarda e valorização do património classificado, o trabalho de inventário desenvolvido pelo IPPAR é centrado tendencialmente em imóveis, conjunto e sítios de excepção, compagináveis com uma protecção de âmbito nacional e implicando um nível de recolha de informação não compatível com um levantamento sistemático e necessariamente superficial de todos os valores patrimoniais. Nesse sentido, o IPPAR tem vindo a desenvolver, desde 1997, e na sequência de um anterior projecto de inventário de património arqueológico que transitou para o Instituto Português de Arqueologia, um sistema informático, designado Sistema Integrado de Gestão do Património Imóvel que, tendo por base o inventário do

património classificado e em vias de classificação, pretende possibilitar a sua gestão integrada seja nos aspectos de intervenção, conservação e valorização dos imóveis, seja nas questões relacionadas com a salvaguarda dos imóveis e das suas áreas de protecção, seja ainda na gestão de toda a informação documental referente aos imóveis classificados.

Quadro comparativo de classificações no Norte de Portugal 50 45 40 35

1910

30

1920-1970 1970-1990

% 25

Década de 90

20

Em vias

15 10

Sitios arq.

Outros

Fontes e aquedutos

Pontes

Fortificações

Pelourinhos e cruzeiros

Edificios notáveis

Igrejas

0

Casas solarengas

5

O sistema, em permanente crescimento e desenvolvimento, disponibiliza actualmente, através do site do IPPAR na Internet, um conjunto de informações e serviços ao público em geral de que se destacam: -

O inventário geral de todos os imóveis classificados e em vias de classificação, com informação diversa associada.

-

Cartografia digitalizada à escala 1:1000, em ambiente SIG, de diversos concelhos, disponibilizando os imóveis classificados e as respectivas áreas de protecção.~

-

Sujeição, via Internet, ao IPPAR de pedidos de certidões e declarações diversas

-

Consulta, pelos requerentes de processos de licenciamento sujeitos a parecer prévio e vinculativo do IPPAR, da tramitação processual interna e dos pareceres emitidos pelo IPPAR.

Pretende-se ainda que este sistema informático, nomeadamente na sua valência de inventário, possa servir como modelo e apoio ao desenvolvimento de acções de levantamento patrimonial desenvolvidas por outras entidades, nomeadamente pelas autarquias locais.

As competências atribuídas aos municípios, pelas novas Leis do Património Cultural e das Autarquias Locais, conferindo-lhes a capacidade de classificação de Imóveis de Interesse Municipal, concomitantemente com o facto de serem as entidades responsáveis pelo desenvolvimento de Planos de Ordenamento de Território ao nível municipal, parece aconselhar centrar nas Câmaras Municipais a base do inventário patrimonial sistemático, até porque a protecção de muito deste património de caracter difuso, não monumental, vernacular e de âmbito local, não devendo ser objecto de qualquer classificação específica poderá e deverá ser objecto de atenção e protecção no âmbito dos planos de ordenamento do território à escala municipal, entendidos este bens como mais valias a potenciar, não tanto como atracção turística, mas principalmente como referência na implementação de melhores níveis de qualidade de vida no desenvolvimento urbano e rural. Evidentemente caberá ao IPPAR, enquanto entidade tecnicamente apta, e na sequência do que actualmente acontece com a presença de seus representantes nas Comissões de Acompanhamento dos Planos de Ordenamento do Território ou na colaboração que tem vindo a ser desenvolvida com as autarquias no âmbito das suas novas competências na classificação de Imóveis de Interesse Municipal, o desenvolvimento de acções de coordenação, no sentido de permitir alguma adequação de critérios e mesmo a utilização de bases de dados sempre que possível compatíveis.

CONCLUSÕES

Verifica-se na última década que o património edificado, enquanto realidade multifacetada e símbolo identitário tem vindo adquirir visibilidade e uma presença crescente nas preocupações de indivíduos e entidades vocacionadas para a intervenção na gestão do território. Esta preocupação não pode ser desligada do sentimento de perda que as nossas sociedades urbanas exprimem quando confrontadas com um passado rural, por vezes mitificado, e que tem consequência na valorização do que se julga serem as marcas físicas desse passado, da gastronomia ao património edificado. A preservação do património tem hoje uma imagem positiva, associada à melhoria da qualidade de vida, nomeadamente nos centros urbanos. Assistimos a uma multiplicidade de intervenções urbanas que tem por objecto motivador a preservação e requalificação de zonas de interesse patrimonial. Diga-se no entanto que nem sempre estas intervenções, por deficiente enquadramento ou por se querer aplicar por mimetismo soluções vistas noutros contextos, contribuem para a preservação do património construído. Quase sempre intervenções apressadas de alindamento reduzem os centros históricos a locais idênticos, no Norte ou no Sul, no Este ou no Oeste, reproduzindo e mimetizando representações quando pelo contrário se deveria privilegiar as diferenças, as especificidades e os elementos de autenticidade. E aqui se deveriam incluir os novos patrimónios que não são, ao contrário do que muita boa gente acha, o construir à antiga com muita pedra à vista mas, pelo contrário, assumir, mesmo em áreas patrimoniais, intervenções actuais e que pela sua especificidade ajudem a reforçar o caracter único do contexto patrimonial em que se integram. Dito isto, se analisarmos o contexto de actuação do IPPC e depois IPPAR, nos últimos 20 anos verificamos que a intervenção de pontual e excepcional passou a normal e frequente. Actualmente só na Direcção Regional do Porto do IPPAR são emitidos anualmente cerca de 2000 pareceres sobre uma multiplicidade de intervenções em áreas com salvaguarda patrimonial. Mas não foi só ou principalmente, uma alteração quantitativa, pelo contrário o factor mais relevante é a presença, hoje imposta por lei, da vertente Património em todas as intervenções com reflexo no Planeamento e Ordenamento do Território, nomeadamente, através de representantes do IPPAR e do IPA, nas Comissões de Acompanhamento de Planos Directores Municipais, Planos de Pormenor ou Estudos de Impacte Ambiental.

A intervenção do IPPAR, embora continuando a ter como ponto de partida a protecção de imóveis classificados, tem vindo a adaptar-se à necessidade de actuar como interlocutor, principalmente das autarquias locais, mas também de organismos da administração descentralizada do Estado e indivíduos ou associações particulares, com uma intervenção não restrita a acções pontuais de salvaguarda e valorização de um conjunto de imóveis notáveis mas pelo contrário entendendo a salvaguarda patrimonial como elemento decisivo, ao lado da preservação ambiental, para a melhoria da qualidade de vida das populações. Esta preocupação crescente com o Património e o seu papel de potencial contributo para o desenvolvimento económico tem contribuído para reforçar a sua importância social. Nomeadamente pelo facto de a presença de valores patrimoniais estar normalmente associada ao reforço de apoios financeiros, seja para requalificação urbana (p. ex. Programa Polis), seja para intervenção directa na recuperação de imóveis de excepção (p.ex. Programa Operacional da Cultura e Medidas Cultura e Património dos Programas de Desenvolvimento Regional), seja pela majoração de apoios em Programas de Desenvolvimento Turístico.

Passados quase 100 anos das primeiras classificações verificamos que continuamos, do ponto de vista quantitativo, a classificar tendo como principais critérios os valores histórico e artístico, conforme se atesta pela presença dominante nos imóveis em vias de classificação de igrejas, capelas, solares, casas solarengas, etc., no entanto estes critérios mais tradicionais têm vindo a ser enquadrados por novos critérios de análise, nomeadamente - a autenticidade, a integridade, a exemplaridade, o valor científico e técnico, a concepção arquitectónica, urbanística e paisagista. A assunção da globalidade destes critérios se conduziu a uma evidente alteração quantitativa nos tipos de imóveis classificados tem, no entanto levado a uma dupla consequência qualitativa: Por um lado, na análise a que são sujeitos os processos de classificação dos imóveis que têm tradicionalmente por base o critério histórico / artistico – igrejas e solares, introduzindo-se na análise e selecção dos processos por exemplo critérios de autenticidade, integridade da propriedade, valorização de concepções técnicas

específicas ou de preservação de aspectos paisagísticos. Assim, os imóveis que agora propomos para classificação deverão Por outro lado verifica-se uma alteração, lenta, mas que tende a consolidar-se, no tipo de imóveis que são objecto de processo de classificação. Desde logo porque as tipologias tradicionalmente objecto de classificação, são necessariamente finitas, vejase o caso das fortificações, pelourinhos e cruzeiros, mas mesmo das igrejas, embora aqui se trate de universo mais alargado e, principalmente mais complexo. Mas a alteração está na atenção que progressivamente vai sendo dada aos novos patrimónios, no cumprimento de critérios de valorização das concepções arquitectónica, urbanística e paisagística (arquitectura contemporânea, conjuntos urbanos e rurais, jardins e áreas de valor paisagístico), do valor científico e técnico (sítios arqueológicos, património industrial e artesanal), a importância para a memória colectiva (património etnográfico). A classificação de novos patrimónios colocam novos problemas de salvaguarda e preservação. O património de raiz histórica, artística e simbólica, principalmente se em meio urbano, tem hoje regras de preservação genericamente aceites pelas entidades e pela população em geral. Os novos patrimónios, embora correspondam a preocupações que tendem a generalizar-se, colocam novos problemas de preservação, não só das áreas envolventes, mas principalmente do próprio objecto classificado, seja porque ainda não suficientemente valorizado pela totalidade da comunidade, seja porque as técnicas, usos e meios financeiros que são utilizados na preservação e valorização de igrejas, castelos, solares e pelourinhos não são aqui aplicáveis. Refiro-me por exemplo a unidades industriais, conjuntos rurais, áreas urbanas contemporâneas, paisagens; conjuntos e imóveis que assumem, por vezes, um caracter difuso e não monumentalizado. Assume aqui especial importância a intervenção das entidades responsáveis pela protecção do património na elaboração dos instrumentos de gestão e ordenamento do território - PRD’s PDM’s, PP’s, PU’s. É também a esse nível que poderão ser encontradas soluções, nomeadamente pelo planeamento de novos usos, que permitam contribuir para a preservação e valorização destes novos patrimónios.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.