A Comissão da Verdade e o Ensino de Literatura Indígena

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A Comissão da verdade e o Ensino de Literatura Indígena na Escola (pública e particular) (Um comentário de Edson krenak) [email protected] O relatório da conclusão da Comissão da Verdade a respeito do que aconteceu com vários povos indígenas durante a Ditadura, os quais desapareceram, confirmando mais caso genocídio de comunidades indígenas em pleno século XX, confirma a necessidade de olharmos com atenção para dois aspectos da Educação Brasileira: o impacto do colonialismo e o ensino da Cultura e Literatura Indígena na Escola. Um dos impactos do Colonialismo é criar uma sociedade emergente racista e que valoriza pouco seu passado – por muito motivos, dentre eles, a vontade de esquecer, de que esse passado terrível jamais tivesse acontecido, a necessidade de ignorar que os próprios ancestrais foram capazes de tamanhas atrocidades... O pensamento colonial termina por criar uma forma de agir colonialista por parte da elite que herdou os privilégios e as benesses da antiga Metrópole. Isto contra os outros ex: ex-donos da terra, ex-escravos... Diante disso, professores e estudantes precisam olhar seriamente para tópicos que escondem ou “esquecem” os impactos, não somente econômicos, mas culturais e socais do colonialismo, como racismo, discriminação, injustiça social, entre outros. Nossa proposta, neste breve comentário sobre o tema, é que a partir do Fundamental II, 6º ano comecem a estudar para que continue a ignorância sistêmica a respeito da História do Brasil no capítulo indígena. Os livros de História, Geografia e Literatura ainda mostram uma visão colonizada, equivocada do indígena, quando não somente o ponto de vista do Europeu. Sugerimos dois pontos de partida. O estudo do relatório da Comissão Nacional da Verdade – um instrumento que na América Latina tem sido importantíssimo para compreender a história do continente e corrigir as injustiças, assim como replanejar um novo futuro. Este relatório apontou a morte de pelo menos 8.350 indígenas decorrentes de políticas de Estado, no período entre 1946 e 1988 – o período do governo militar -, além de inúmeras violações, como assassinatos, remoção forçada ou sob coação de suas terras tradicionais, perseguições, prisões ilegais, estupros, trabalhos forçados ou em condições de semi-escravidão, expulsões, torturas, prisões, maus tratos e desassistência. O ex-coordenador da CNV, Pedro Dallari, afirmou que as investigações não começaram com os trabalhos da Comissão e não estão encerradas. “Nós estamos só começando a luta. É o fim do processo de investigação, mas o começo de um processo que vai dar efetividade ao que está escrito”. Uma educação que mostre a verdade, que considere a memória e reflita sobre a história, a própria história é libertadora.

Outro ponto de partida é a adoção séria da literatura indígena – ainda emergente, difusa e pouco lida – por parte das escolas públicas e PARTICULARES do país. Um professor do ensino Médio na rede particular do Estado de São Paulo me confidenciou a tamanha falta de informação por parte de colegas e alunos ingressantes no vestibular a respeito dos povos indígenas. Ele propôs uma atividade de leitura de um livro do Daniel Munduruku, aplicando uma avaliação aos seus alunos. Ele colheu verdadeiras pérolas que revelam não somente o desconhecimento, como também o preconceito, a discriminação e o racismo por parte das famílias e dos alunos que estão ingressando nas universidades. Veja na imagem ao lado o comentário de um aluno. Este aluno, como outros de séries diferentes, ficaram surpreendidos com o fato de indígenas poderem passar em um vestibular, estudarem em uma universidade como a USP – sem cotas!! –, já que no caso do Daniel Munduruku, as cotas vieram depois. Outros, em suas respostas à questão como "O que você acha da participação dos indígenas na sociedade brasileira?" são contra cotas para indígenas, assim como para negros.

Figura 1 Arquivo pessoal

Outro dado que se repetiu nas avaliações é o fato de os alunos se surpreenderem com a capacidade humana dos indígenas aprenderem a ler e escrever em língua alfabética, pois nas aldeias e nas “tribos” eles não escrevem, não têm escrita – todos seriam ágrafos - ou um código, ou outra marca gráfica com a qual possam registrar a memória, somente as “conversas” preservar o conhecimento...Obviamente, as populações indígenas do mundo inteiro valorizam a oralidade, mas afirmar que são ágrafos revela ignorância a respeito dos complexos sistemas gráficos usados por muitos povos nativos até os dias de hoje – e não somente os Astecas, Maias e Incas usavam nos tempos deles. Estes pouquíssimos exemplos mostrar a necessidade de toda a rede de ensino do país conhecerem os povos que vivem, sim, vivem na mesma terra chamada Brasil, povos que estão na mídia reivindicando seus direitos, povos que sofrem há séculos – antes e depois do Estado Democrático de direito – inúmeras injustiças embora tenham um capítulo especial sobre ele na Constituição Federal de nosso país. Voltando ao tópico disciplinar, sobre o currículo. Racismo como conteúdo precisa ser revisto, pois como vimos no exemplo acima a crença de que existem raças e de que isto (diferentes raças) explica as diferenças de caráter humano, habilidade ou capacidade, assim como que determinadas raças são superiores às outras.

A literatura indígena, tal como vem sendo feita, revela um universo ainda muito novo e pouquíssimo explorado pela sociedade acadêmica. Ele procura preencher um buraco de diálogo com a sociedade brasileira sem a intervenção de especialistas, como antropólogos e linguistas, um protagonismo relativamente novo no Brasil. Nesta literatura, não somente os chamados mitos e narrativas indígenas são compartilhados, mas também modos de ser, de pensar e de viver, de registrar os conhecimentos e de construir relações com outros povos. O Ensino da Literatura Indígena é, pois, um divisor de águas na educação para a convivência entre povos e grupos diferentes numa mesma sociedade. É também uma proposta afirmativa, positiva diante dos horrores revelados pela Comissão da Verdade, ao invés de vingança, ressentimento e raiva, o movimento da Literatura indígena chama para o diálogo, convida para tomar um caxiri...

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