A construção da democracia participativa no Brasil de 1822 a 2015.

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A construção da democracia participativa no Brasil de 1822 a 2015.



Apresentação



Neste momento histórico, quando se questiona o respeito à democracia
no Brasil, Ismayr nos oferece um estudo atualizado sobre a história da
democracia em nosso país, desde a proclamação da independência até a
contemporaneidade. Com a autoridade de quem transita pelos movimentos
populares, pelo ambiente acadêmico e pelas instituições governamentais, o
autor constrói sua narrativa baseando-se em uma pesquisa bem fundamentada
pelo rigor dos números e pela intimidade com os fatos e com os
protagonistas das diversas classes sociais. Notadamente, no caso da cidade
de Belo Horizonte, foco de parte de suas análises e paradigma para suas
propostas. Mas o trabalho não e restringe aí, temas contemporâneos, como o
conflito entre os poderes executivo e legislativo, em 2015, são abordados e
trazem o olhar crítico sobre a uniformidade das opiniões dos meios de
comunicação.

As competências do autor permitiram-lhe estudar o percurso histórico e
pensar a democracia como a condição política para se garantir a cidadania,
particularmente quando considera a relação entre democracia representativa
e democracia participativa. Por isso, uma análise da representatividade e
da concentração do poder. Pois, se uma pessoa que represente o poder é
necessária, essa necessidade não implica a concentração do poder em suas
mãos ou em seu grupo político. A proposta que o texto nos faz é uma
descentralização que permita tanto a ação dos poderes locais quanto a
participação democrática da população em geral.

A especial atenção dedicada ao recente período democrático, com atenta
análise das implicações decorrente da constituição de 1988, a constituição
cidadã, traz uma cuidadosa apresentação das influências que em grande parte
configuraram o momento que estamos vivendo, no que se pode referir à
participação popular no processo democrático e na demanda de mais autonomia
e participação cidadã. É a voz da sociedade civil quem deve nortear o
Estado para se consolidar a democracia participativa.

Como demonstra Ismayr, as manipulações dos representantes
governamentais, quando se tratava das participações populares nos
conselhos, refletem o movimento das esferas políticas para afastar a
sociedade civil dos órgãos que poderiam minimizar o peso do Estado e dos
políticos na democracia participativa.

Na análise histórica do exercício do poder no Brasil, Ismayr observa
que o estado tradicionalmente se importou em controlar as manifestações
populares e conservar a ordem do poder, deixando de lado o investimento na
qualidade educacional e social da população. E não deixa de ser curioso que
as manifestações populares tenham fugido de controle no mandato de um
governo que pregou a melhoria social e o investimento na educação. Mesmo
assim, o autor nota que essas manifestações cresceram e desapareceram sem
uma unidade identitária nem, tampouco, uma identidade de propósitos.

Não havia lideranças significativas que coordenassem as manifestações
de modo organizado nem frutífero. Não se identificaram lideranças nem foram
sustentados objetivos claros que correspondessem ao alcance nacional do
movimento. O justo argumento de se enfrentar o aumento das tarifas dos
ônibus não poderia ser suficiente para tamanha mobilização. Faltaram
argumentos para se consolidar uma lista de negociações a partir da qual
seria possível negociar e concretizar mudanças que reconhecessem a
participação popular como uma fonte de exercício do poder democrático. O
texto consistente é corroborado pela farta quantidade de dados que se
organizam esquematicamente em tabelas e gráficos

Inevitavelmente somos levados a questionar se um avanço dessa
magnitude seria possível. Pelo menos em tese, sim. Existe, desde 1988 uma
perspectiva constitucional para isso.

A descentralização do poder e o fortalecimento dos municípios,
orientação da constituição, está de acordo tanto com as tendências
contemporâneas de gestão, no que diz respeito a delegar tarefas, quanto ao
fortalecimento do papel do cidadão em suas ações cívicas sobre o espaço
geográfico em que constrói sua vida.

O aumento da força executiva do município, em sua autonomia política,
deve se estender proporcionalmente ao ganho de força cívica dos cidadãos. A
efetividade da participação dos cidadãos ao colaborarem com o plano
diretor, por exemplo, oferece mais consciência a respeito do funcionamento
de seu município e em seu comportamento de cuidado com o espaço público.

Ainda que alguns modelos de gestão municipal sejam identificados ao
Partido dos Trabalhadores, o que Ismayr apresenta com pertinência é algo
suprapartidário. Trata-se de uma instigação para que toda pessoa que se
reconhece com interesses pelo bem comum possa se oferecer para colaborar
com o fortalecimento do exercício da cidadania e da melhoria da vida em seu
município. Essa célula da federação, quando dotada de um funcionamento que
garanta o compromisso com a qualidade de vida de sua população, configura-
se como efeito multiplicador virtuoso para o sucesso do país. Como um órgão
provedor e gestor de uma democracia participativa.

A municipalização é um recurso político não para o aumento do poder do
prefeito, mas para a efetiva descentralização do poder e sua capilarização
por meio das associações e demais grupos organizados pelos munícipes. É o
fortalecimento do cidadão como verdadeiro ator social e político.

O principal "laboratório" que serviu de ambiente de estudos e análises
foi a cidade de Belo Horizonte, sob as gestões que adotaram o Orçamento
Participativo. Sempre com o recurso de números, tabelas e gráficos, Ismayr
deixa fluir seu texto com a autoridade de quem é, além de uma importante
testemunha ocular desse processo, um pensador crítico da política.
Consequentemente, foi capaz de elaborar esse importante trabalho para se
conhecer a dinâmica do oscilante processo de participação popular na
administração pública da cidade de Belo Horizonte ao longo das últimas
décadas.

Esse laboratório demonstrou, entre tantas coisas, o crescimento e a
queda das participações populares. Se, a princípio, essas participações
correspondiam tanto ao interesse da gestão pública (de governos
autodenominados "de esquerda") quanto a reivindicações populares, o
exercício dessa democracia participativa em Belo Horizonte perdeu força. O
papel dos cidadãos no trânsito entre os representantes políticos (como os
vereadores, secretários e prefeitos) e as organizações comunitárias (como
associações de bairros) não foi eficaz. O protagonismo popular não teve
forças para suportar os fracos resultados palpáveis, ao mesmo tempo em que
os vereadores não se engajaram com essa proposta e o orçamento
participativo se tornou um processo de votação pela internet, sem o corpo-a-
corpo.

Como "pano de fundo", ressalte-se a qualidade da bibliografia
(Norberto Bobbio; Robert Putnam; Boaventura Santos, Francisco Weffort,
entre outros). Bibliografia ampla em autores e datas.

E, se os autores conferem a necessária consistência ao texto, em
alguns momentos até edificam pontes entre a teoria, a análise dos fatos e
as propostas do autor. É o caso, por exemplo, da antiga ideia de
"poliarquia", proposta por Dahl (1971), para quem a democracia deve,
obrigatoriamente, ampliar a participação dos cidadãos. Ou seja, há mais de
quarenta anos se aponta que a centralização do poder desvirtua a democracia
por se distanciar do cidadão, ainda que seja um poder eleito por voto
popular.

Portanto, a leitura desta obra conjuga a extensão histórica do
exercício do poder no Brasil, a análise do processo de democratização do
país, o estudo de uma política pública municipal na direção de uma
participação popular protagonista e, até, a visão sobre as grandes
manifestações populares de 2013. Metodologicamente, louve-se a virtuosa
coerência do autor, pensador político que argumenta em prol da
descentralização do poder e da participação popular.



Dr. Bernardo Monteiro de Castro
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