A Cripta como Espaço de Aprendizado: Educação Patrimonial na Catedral Metropolitana de Porto Alegre

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  Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) S47182

Anais eletrônicos do II Seminário de História e Patrimônio : diálogos e perspectivas / Carmem G. Burgert Schiavon; Marcelo França de Oliveira; Janaina Schaun Sbabo (orgs). Rio Grande : Universidade Federal do Rio Grande, 2014. 979p. Bibliografia ISBN: 978-85-7566-354-7 1. História. 2. Patrimônio. I. Schiavon, Carmem G. Burgert. II Oliveira, Marcelo França de. III Sbabo, Janaina Schaun. IV. Título. CDD:930/342

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A CRIPTA COMO ESPAÇO DE APRENDIZADO: EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA CATEDRAL METROPOLITANA DE PORTO ALEGRE Juarez Fraga Junior202  Resumo: O presente trabalho tem por objetivo ressaltar o potencial da cripta da Catedral Metropolitana de Porto Alegre como espaço para a prática de ações educativas. Atendendo a Lei nº 11.645/08, pelo viés da Educação Patrimonial, pretende-se utilizar a cripta como fonte de projetos de reflexão e questionamento sobre os patrimônios históricos de Porto Alegre, com ênfase em seu Centro Histórico. Realiza-se, sobre a Catedral e sua cripta, uma análise histórica, estética e arquitetônica, evidenciando o conjunto de representações de diversos grupos ameríndios da América Latina e seu potencial como espaço não formal de ensino. Palavras-chave: Educação Patrimonial. Catedral Metropolitana de Porto Alegre. História Indígena. Cripta. Porto Alegre.

Introdução ao Centro Histórico de Porto Alegre Edificações, monumentos, ruas históricas. O bairro Centro Histórico, localizado em Porto Alegre, é conhecido popularmente como o coração da cidade, onde seu crescimento está ligado diretamente a formação da própria capital do Rio Grande do Sul. A riqueza cultural do centro de Porto Alegre, no que concerne à diversidade arquitetônica, revela-se ímpar. Contribuíram para tal, na região, as diversas fases de ocupação e a concretização de diversas influências, principalmente europeias, que atingiam diretamente a formação arquitetônica e estética da urbe. Conforme estudo recente sobre a relação entre arquitetura e história no centro da cidade: Vários estilos se manifestam, formando um conjunto rico e heterogêneo, abrangendo as mais variadas manifestações arquitetônicas. Monumentos neoclássicos, arquiteturas ecléticas e protomodernistas e as chamadas reminiscências de um passado colonial – casas baixas, de porta e janela e platibanda simples, construídas em lotes estreitos – configuram os diálogos, as memórias e as lembranças do local de fundação de Porto Alegre (CARDOSO; CARVALHO, 2013, p. 77-78).

A mais reconhecida dessas influências foi a positivista. As principais edificações realizadas na transição do século XIX para o XX, por exemplo, foram construídas sob a égide de adeptos aos pensamentos de Auguste Comte, encarnadas em figuras do cenário político gaúcho, como Júlio de Castilhos e Borges de Medeiros. Além da Biblioteca  202

Graduando no Curso de Licenciatura em História (UFRGS). Contato: [email protected]







Pública do Estado (construída em 1912) e do Arquivo Público do Estado (1912), são obras desse período os edifícios onde estão instalados, hoje, o Museu de Arte do Rio Grande do Sul (1912), e o Memorial do Rio Grande do Sul (1913), ambos localizados na Praça da Alfândega. A Praça Marechal Deodoro, conhecida como Praça da Matriz, é um dos mais antigos espaços públicos de Porto Alegre, cercada por edifícios significativos que refletem o porquê de sua importância social. Em seu entorno se encontram: a Catedral Metropolitana de Porto Alegre; o Palácio Piratini, sede do Governo do Estado; o Palácio Farroupilha, sede da Assembleia Legislativa; o Palácio da Justiça; o Theatro São Pedro e o Museu Júlio de Castilhos. Localiza-se também, no centro da Praça, o monumento Júlio de Castilhos, uma ode à sua figura política e intelectual. Logo, a acumulação das funções religiosa, cultural e das três esferas do poder político impõe-se como uma importante característica da Praça da Matriz (FIORE, 1996, p. 96) e denota a essencialidade do espaço por ela ocupado para a população porto-alegrense: A presença de todas essas instituições na praça confere a esta significação arquitetônica, cívica, política, religiosa, cultural e histórica, gerando ou atraindo um numeroso público e eventos culturais e políticos, que contribuem decisivamente para o significado do lugar para a cidade (FIORE, 1996, p. 101)

Não apenas capaz de atrair o público e de servir de local para a realização de eventos, a Praça da Matriz é também espaço de diversas práticas turísticas e/ou educativas. Não é raro encontrar grupos e turmas escolares reunidos em torno do monumento central ou de fronte aos prédios históricos. Trabalhos escolares e acadêmicos, mediações, roteiros turísticos e projetos municipais utilizam a Praça da Matriz como um local de aprendizado, se tornando fonte de reflexão, desconstrução e construção do saber histórico, arquitetônico e cultural não só de Porto Alegre, mas também do Rio Grande do Sul. Nesse espaço se tornam reais diversos projetos de Educação Patrimonial, agregando historicidade e reconhecimento frente ao patrimônio. No que se refere a ideia de Educação Patrimonial, é importante salientar que se utilizará, aqui, o mesmo conceito utilizado pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e apresentado em seu site, que concebe a Educação Patrimonial como: Todos os processos educativos que primem pela construção coletiva do conhecimento, pela dialogicidade entre os agentes sociais e pela participação efetiva das comunidades detentoras das referências culturais







onde convivem noções de patrimônio cultural diversas.

O conceito e sua clara amplitude permite que sejam aplicadas diversas metodologias no que se refere às ações educativas. No entanto, deve ser desconsiderada como ação educativa a simples contemplação do patrimônio. É entendido como essencial para a prática da Educação Patrimonial, aqui, a construção coletiva baseada em reflexão a partir de questionamentos - seja sobre a ideia de pertencimento e identidade, seja pela busca dos reais motivos que levam um determinado bem a ser considerado um patrimônio. Além de turmas da rede pública do ensino da capital convidadas por seus professores, alguns projetos realizados por estudantes universitários em estágios patrimoniais já utilizaram do processo histórico vivenciado pela Praça nos últimos dois séculos, para fins de reflexão e questionamento sobre o patrimônio e a cidade. O levantar da problemática das intensas pichações presentes em seus monumentos e nas edificações da região (no caso, o Museu Júlio de Castilhos), resultou em questões ligadas à recusa ou questionamento sobre o reconhecimento daquele monumento como parte da identidade cultural e social. O autor da atividade na Praça da Matriz e no Museu conclui que ambos os espaços não possuem, junto à sociedade, a mesma integração que possuía no passado. Eles, segundo o autor: Carregam consigo representações da identidade e memória de diferentes grupos; são espaços de manifestação artística, cultural e histórica. [...], no entanto, ao longo do tempo, são sempre ressignificados por diferentes grupos e memórias em disputa. Sua apropriação pela comunidade também influencia e é influenciada por essas dinâmicas (ABREU, 2014, p. 146).

A reflexão sobre essas mudanças de significados, adquiridas por determinados patrimônios ao longo do tempo, possibilitam pensar em questões envolvendo a busca de agentes sociais pela criação, formalização e manutenção de uma identidade própria, de uma única análise histórica. E, dentro desse processo, surte o efeito devastador da contemplação passiva: aborda-se o patrimônio apenas do modo como ele foi projetado e construído para ser abordado. A abordagem interrogativa, crítica, permite que a percepção se aguce e, assim, se reconheça a presença de outros grupos nos mesmos monumentos, nos mesmos patrimônios. O Mercado Público de Porto Alegre, construído em 1869, é um caso elucidativo desse processo. Conhecido como um espaço, como o próprio nome indica, de comércio e serviços, torna-se, sob uma ótica distinta, um patrimônio cultural ligado à religiosidade: eventos ocorridos no centro do Mercado fizeram com que este fosse







considerado um local consagrado e de grande referência para as religiões afroumbandistas. Nesse sentido, embora ampliando para o conceito de nação, o antropólogo José Gonçalves acredita que: O espaço público é pensado enquanto dividido pela diversidade de pontos de vista, pela diversidade dos gêneros de discurso que nele circulam. A nação não é algo acabado, cuja essência seria representada pelo patrimônio. A nação é heterogênea e está em permanente processo de transformação. Os patrimônios fazem parte do dia-a-dia da vida dos diversos segmentos sociais (GONÇALVES, 2007, p. 154).

Logo, um mesmo monumento ou edificação pode possuir inúmeras interpretações quanto à sua existência, sem deixar de se tornar um patrimônio, desde que este possua algum significado e motivação por parte dos grupos para continuar existindo. Conforme dirá Hilda Fraga, a cidade não deve ser vista só como espaço físico e político: Mas também como um espaço antropológico onde se produzem inumeráveis interações e experiências do habitar e do narrar que expõem sutilmente os múltiplos traços de sua história, tornando a paisagem urbana um documento a ser lido e decifrado pelos alunos (FRAGA, 2010, p. 228).

Nesse ínterim, é imprescindível exercer as ações de interpretações de objetos e fenômenos culturais, ampliando a capacidade de compreensão de que “cada produto da criação humana, seja utilitário ou simbólico, é portador de significados e sentidos que devem ser lidos e decodificados através de sua forma, conteúdo e expressão.” (GRUNBERG, 2008, p. 39). A Educação Patrimonial serve de ferramenta na busca da compreensão sobre o patrimônio através da reflexão, do questionamento e da provocação de situações de aprendizado sobre seu processo de formação. Consequentemente, esse processo auxilia no despertar dos cidadãos ao interesse em “resolver questões significativas para sua própria vida, pessoal e coletiva” (GRUNBERG, 2008, p. 39). Educação Patrimonial na Catedral Metropolitana de Porto Alegre Dentro dos questionamentos sobre a Praça da Matriz e arredores, é interessante observar o que há de representação daqueles que não pertenciam aos grupos responsáveis pelas projeções arquitetônicas, estéticas e urbanísticas de Porto Alegre. Onde é possível encontrar objetos de valor patrimonial pertencentes a outro grupo religioso e/ou étnico, tais como afrodescendentes e indígenas, que não estejam relacionados na categoria arqueológica? As práticas sócio-educativas sobre a participação afrodescendente ativa na







construção da cidade, provindas graças aos impulsos realizados por anos de luta de movimentos sociais, vêm remodelando e criando novas formas de se ver o Centro Histórico de Porto Alegre, expondo a importância fundamental de locais que antes eram encontradas às margens do saber histórico tradicional, para incluí-la entre os principais pilares da formação de Porto Alegre. No que concerne, aos indígenas, no entanto, será dito que: Dando a origem da cidade aos portugueses que aqui chegaram, os manuais esquecem dos primeiros habitantes, os grupos indígenas que já estavam no território a partir dos quais se formou Porto Alegre. A história dos Guaranis e grupos de caçadores-coletores existentes na área do município somente recentemente passou a ser foco de descobertas de pesquisas arqueológicas que tentam melhor situar a presença desses grupos em terras porto-alegrenses, um dos quais encontrado até hoje vendendo seu artesanato na Rua da Praia e no Bric da Redenção (POSSAMAI, 2010, pp. 214-215).

A historiadora Zita Possamai se refere às tradições indígenas Guarani e Kaingang, que habitam em localidades da periferia da capital e da região metropolitana de Porto Alegre onde, frequentemente, são denunciados sinais de hostilidade por parte dos moradores de condomínios e residências próximos aos agrupamentos. Rua da Praia, antigo nome da atual Rua dos Andradas, no Centro Histórico, e Bric do Parque da Redenção são pontos culturais de grande movimento, onde são vendidos objetos de decoração, artesanatos, entre outros produtos. Além deles, há forte presença indígena pelas ruas do centro da capital, geralmente em dois grupos: homens tocando flauta, violão e vendendo discos com músicas suas; e famílias compostas por mulheres e crianças, vendendo artesanato e/ou cantando músicas de sua tradição. A cultura imaterial indígena está presente nas ruas, mas sua existência parece estar ausente, senão ignorada, na ideia de cidade de outros grupos étnicos. É nesse ambiente que percebemos, ao observar a estética e a arquitetura da Catedral Metropolitana de Porto Alegre, a fachada exterior da Cripta: um conjunto de alusões às sociedades ameríndias que habitam a América Latina. Em pesquisa posterior sobre o porquê do projeto arquitetônico, percebemos a complexidade de sua construção e o forte significado que ela impõe aos observadores mais atentos. Alguns fatores da idealização e motivação do projeto já se apresentam interessantes. O projeto vencedor do concurso de arquitetura pra eleger qual Catedral seria construída em Porto Alegre tinha a autoria do arquiteto espanhol Jesus Maria Corona.







Porém, pelo elevado valor da construção do projeto, o Arcebispo Dom João Becker se viu obrigado a paralisar as obras. Um ano depois, no entanto, foi-lhe indicado o projeto arquitetônico de uma catedral que estava sendo construída em Patrasso, na Grécia, com autoria do arquiteto e simpático ao estudo da História Giovanni Battista Giovenale (CHEIUCHE, 2012, p. 28). O modelo arquitetônico, inspirado no Renascentismo Romano, rompia com muitas das edificações neoclássicas erguidas alguns anos antes pelos positivistas. Construída com pedras de granito róseo retirados de uma pedreira localizada em um morro de Porto Alegre, sua edificação possui, ás extremidades da Catedral, 80 metros de comprimento por 47 metros de largura. São perceptíveis, nos detalhes presentes na parte mais baixa da edificação, na planta do projeto de Giovenale, as diferenças arquitetônicas entre a Cripta e o restante do edifício.

 Figura 3 - Fachada lateral e em Perspectiva do projeto do arquiteto italiano Giovanni Battista Giovenale (CHEUICHE, 2012, pp. 38-39).

Em seu processo de construção da Catedral, que iniciou em 1919, a Cripta foi a primeira parte do projeto a ser concluída, em 1929, para dar continuidade ao culto religioso e poder, assim, demolir a antiga igreja matriz em estilo barroco-colonial, que estava no local desde 1773 (CHEUICHE, 2012, p. 21). Dom Antônio do Carmo Cheuiche, intelectual e bispo auxiliar de Porto Alegre, crê na idealização da Cripta como uma inspiração das criptas das grandes catedrais do ocidente europeu, esteticamente alusivas às primitivas catacumbas do período imperial romano (CHEIUCHE, 2012, p. 83). Porém, pelo fato da Catedral ser construída na América, Giovenale teria decidido optar pelo conceito de arquitetura primitiva mais adaptada ao Novo Mundo: a ameríndia. As paredes do exterior da Cripta são cópias fidedignas dos







muros do Peru incaico, segundo CHEIUCHE (2012, p. 85), 85), lembrando à arquitetura prépré colombiana lombiana com valor esquecido, expondo à luz do sol valor da arquitetura original do continente.

 Figura 4 - Paredes da Cripta inspiradas nos muros da cidade de Cuzco (Peru), onde se localizava o Vale Sagrado dos Incas. (Ano da imagem: 2013. Foto do autor)

A Cripta apresenta, também, quatro gigantes cabeças de indígenas. Em alusão às famosas esculturas dos Olmecas, originários do México. Porém, diferentemente diferentemen da fisionomia olmeca, Giovenale deu às cabeças a fisionomia fisionomia de grupos indígenas originários do sul americano. Segundo o bispo auxiliar,, os rostos “expressam a força física que, qual atlantes aborígenes, estão condenadas a absorver esforços para manter erguida er a coluna renascentista, cujo peso recai sobre elas” (CHEIUCHE, 2012, p. 90).







 Figura 5 - A esquerda, um exemplar de uma escultura cefálica Olmeca (FLORESCANO, 2008, p. 6). A direita, uma das cabeças gigantes da Cripta. (Ano da imagem: 2013. Foto do autor)

Uma cimalha, localizada na divisa entre a Cripta e o restante da Catedral e que percorre toda a sua extensão, é decorada com motivos da arte marajoara, grupo habitante da Floresta Amazônica.

 Figura 6 - Arte marajoara utilizada na decoração da cimalha, dividindo esteticamente a Cripta do restante da Catedral. (Ano da imagem: 2013. Foto do autor)

 A Cripta como espaço de aprendizado O conjunto que dá forma à Cripta da Catedral Metropolitana de Porto Alegre é reflexo de expressões culturais de diversos grupos ameríndios da América Latina e, como







tal, representa uma edificação rica de significado e fonte de inúmeras reflexões e questionamentos. Desde a elaboração de seu projeto até a sua ressignificação hoje, é possível problematizar, junto a grupos e turmas escolares diversos momentos históricos ocorridos desde o período da conquista e posterior catequização, até a reflexão sobre quem são os indígenas hoje. Até mesmo as hipóteses do bispo auxiliar de Porto Alegre podem ser discutidas: No caso da Catedral de Porto Alegre, a elevação da arquitetura renascentista sobre uma base arquitetônica pré-colombiana oferece-nos, hoje, um belo exemplar representativo do encontro histórico de duas culturas. Encontro esse, do qual resulta uma síntese entre as duas culturas ou a imposição da mais vigorosa sobre a mais frágil. Talvez tenha sido essa a ideia de Giovenale, além de também querer celebrar, ao mesmo tempo, a vitória do cristianismo sobre o paganismo na América Latina (CHEIUCHE, 2012, p. 87-89).

Algumas abordagens já foram por nós idealizadas, tais como a comparação entre a Catedral Metropolitana de Porto Alegre com o Convento de São Domingos, que fora construída sobre o antigo Templo do Sol incaico, na cidade de Lima, no Peru. Essas ações de sobreposição arquitetônica refletem um pensamento que, entre outros pontos importantes de serem refletidos, categorizava sociedades de forma hierárquica e discriminatória. A partir de pontos como esse, podem-se fazer questionamentos como: Por que se destruía os templos indígenas durante o período da Conquista?; Por que construíam igrejas cristãs sobre os templos?; O que são os traços presentes no rosto das cabeças gigantes da Cripta: pêlos alusivos ao dos felinos, ou marcas de tinta lembrando a pintura utilizada por muitos grupos em momento de guerra? E eles estão bravos ou sentindo dor?; Os indígenas ilustrados na Cripta são os mesmos encontrados nas ruas do Centro Histórico?; Existiam culturas indígenas tão diferentes na América?; entre outras tantas questões já levantadas. Considerações finais A Cripta se apresenta como um patrimônio estético, arquitetônico, religioso e cultural com grande potencial para aplicação de diversas ações educativas sobre a história e a cultura ameríndia, sendo possível realizar recortes geográficos e temporais. Sua prática atende, pelo viés da Educação Patrimonial, a Lei nº 11.645/08, que, entre outros objetivos, torna obrigatório o estudo, justamente, da história e cultura indígena. Há grande dificuldade por parte dos profissionais da educação, em Porto Alegre, realizar atividades







extra-muros que envolvam a temática indígena. Ida de escolas a regiões como o Morro do Osso (localizado no bairro Lomba do Pinheiro, zona leste de Porto Alegre), onde habitam dois grandes grupos indígenas, demanda de grande diálogo, custo de transporte e tempo de deslocamento. A Cripta, localizada em pleno Centro Histórico de Porto Alegre, surge não como uma alternativa apenas, mas como ponto de partida para o estudo de um espesso e essencial assunto que diz respeito à formação não só da cidade de Porto Alegre, mas da sociedade como um todo. Espera-se que a Lei não fique apenas no papel, mas que esteja presente nas ruas e nas escolas, nos livros e nos diálogos. Para que este assunto não fique, enfim, inativo, apenas como um objeto de contemplação. Bibliografia ABREU, Gabriel Fleck de. O Museu e a Praça: Educação Patrimonial e Ensino de História. In: GIL, Carmem; ZALESKI, Rhuan Targino (Org.) Patrimônio Cultural: Ensino de História. Porto Alegre: Edelbra, 2014. CARDOSO, Simone. CARVALHO, Eder dos Santos. Centro Histórico de Porto Alegre: uma relação entre arquitetura, mídia e história. Revista Latino-Americana de História. São Leopoldo: UNISINOS, 2013. v. 2, nº 7. CHEIUCHE, Dom Antônio do Carmo. Catedral Metropolitana de Porto Alegre: Guia Histórico-Artístico. Porto Alegre: Diagramme, 2012. FIORI, Renato Holmer. O caráter histórico da Praça da Matriz em Porto Alegre: significados do lugar, permanência e mudança. Revista eletrônica ARQTEXT. Porto Alegre: UFRGS, 1996. v. 09. FLORESCANO, Enrique. Los olmecas: el primer reino de Mesoamérica. México: Revista de La Universidad de Mexico, 2008.v. 17. FRAGA, Hilda Jaqueline de. A cidade como documento no ensino de história. In: POSSAMAI, Zita Rosane (Org). Leituras da Cidade. Porto Alegre: Evangraf, 2010. GIL, Carmem; ZALESKI, Rhuan Targino (Org.) Patrimônio Cultural: Ensino de História. Porto Alegre: Edelbra, 2014. GONÇALVES, José Reginaldo Santos. Antropologia dos Objetos: coleções, museus e patrimônios. Rio de Janeiro: IPHAN/Departamento de Museus e Centros Culturais, 2007. GRUNBERG, Evelina. Educação Patrimonial: trajetórias. In: BARRETO, Euder Arrais et al. Patrimônio Cultural e Educação: artigos e resultados. Goiânia: IPHAN, 2008. POSSAMAI, Zita Rosane (Org). Leituras da Cidade. Porto Alegre: Evangraf, 2010.







POSSAMAI, Zita Rosane. Cidade: escritas da memória, leituras da história. In: POSSAMAI, Zita Rosane (Org). Leituras da Cidade. Porto Alegre: Evangraf, 2010.

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