A CRISE INTELECTUAL DO PENSAMENTO NA ERA CONTEMPORÂNEA E COMO SUPERÁ-LA

July 25, 2017 | Autor: Fernando Alcoforado | Categoria: Sociology, Economics, Philosophy, Political Philosophy
Share Embed


Descrição do Produto

A CRISE INTELECTUAL DO PENSAMENTO NA ERA CONTEMPORÂNEA E COMO SUPERÁ-LA Fernando Alcoforado* O mundo se defronta na era contemporânea com várias crises, econômica, política, social e ambiental. A cada dia que se passa, essas crises se aprofundam, seja nos planos nacionais, seja em escala planetária. Mas, a maior crise vivida hoje pela humanidade é, sem sombra de dúvidas, a crise intelectual do pensamento que se constitui no principal obstáculo à superação das demais crises e à construção de uma nova sociedade e nova ordem mundial centradas no real progresso econômico, político, social e ambiental. A crise intelectual do pensamento da era contemporânea é que faz com que o mundo em que vivemos funcione de forma caótica como uma nave à deriva rumo ao desastre. O mundo passa por um período conturbado na era contemporânea em que tudo é varrido pela velocidade das mudanças nos campos econômico, político, social, tecnológico e ambiental. Se por um lado existe otimismo com a perspectiva de avanço do progresso científico e tecnológico, existe também um grande pessimismo diante da perda dos valores e referenciais do passado e da falta de sentido da vida. Embora nos séculos XVIII e XIX o progresso da civilização europeia despertasse entusiasmo, esse sonho se dissipou ao longo do século XX que foi uma época devastada por guerras em escala jamais vista, ditaduras, explosão populacional, vastas áreas de pobreza extrema, entre outros problemas, que contribuíram para que fosse colocada em xeque a ideia de progresso. No século XX, desapareceram as utopias como a da edificação de um mundo melhor, de uma sociedade sem classes sociais com o fim da União Soviética, e em seu lugar surgiram distopias como as do sociólogo Oswald Spengler com sua obra Le Déclin de L´Occident (O declínio do Ocidente) (Paris: Gallimand, 1976) que dizia no início do século XX que o Ocidente já havia há muito atingido o seu apogeu e que, portanto, só lhe restava o declínio e as de Aldous Huxley com sua obra Admirável mundo novo (Rio: Editora Globo de Bolso, 2015) e George Orwell com sua obra 1984 (São Paulo: Companhia das Letras, 2009) que vislumbravam um futuro sombrio para a humanidade. Este clima pessimista não se limitou à primeira metade do século XX se estendendo também para o período posterior à Segunda Guerra Mundial. Embora neste período tenha havido momentos de grande otimismo como durante os “anos gloriosos” das décadas de 1950 e 1960 de expansão da economia mundial que logo tenderam a se dissipar em meio às sombrias décadas de 1970 e 1980 de declínio do sistema capitalista mundial culminaram atualmente com a crise econômica mundial de 2008 e a escalada global do terrorismo. Na era contemporânea, a razão e a ciência entraram também em crise profunda com a derrota dos paradigmas do Iluminismo e da Modernidade na segunda metade do século XX que foram substituídos pelo novo paradigma da Pós-Modernidade que, segundo seus ideólogos, não existem verdades. Após declarar que todos os sistemas anteriores estavam errados, o pós-modernismo chegou também à trágica conclusão de que nada pode ser conhecido. Os pós-modernistas não acreditam na razão. Para os pósmodernistas, mesmo a ciência seria apenas uma entre várias formas de se conhecer a realidade, sem nada dizer respeito à verdade. O pensamento pós-moderno é convergente com o niilismo do filósofo alemão Friedrich Nietzsche que em sua obra, A Vontade de Potência (Petrópolis: Editora Vozes, 2011), afirmou que a solução para a crise estava na 1

rejeição da razão e no retorno dos profetas, que deveriam, não através da razão, mas da determinação, fundar novos valores que iriam guiar os povos e erguer novas civilizações. É preciso não esquecer que Nietzsche foi o grande ideólogo do nazismo. Nietzsche via como inevitável em um mundo relativista, a tolerância a todos os valores e modos de vida, pois todos eram igualmente válidos. Esta visão é convergente com a opinião de muitos autores pós-modernos que define a Pós-modernidade como a época das incertezas, das fragmentações, das desconstruções, da troca de valores. Esta nova interpretação de Nietzsche está nas bases do pensamento do século XX. Desta forma, o irracionalismo nietzscheano penetrou na sociedade contemporânea. Tudo leva a crer que prevalecendo no mundo de hoje o pensamento niilista de Friedrich Nietzsche reforçado pelo paradigma pós-moderno, a humanidade caminhará inevitavelmente para o desastre econômico, político, social e ambiental que poderá ameaçar sua sobrevivência. O desaparecimento no mundo de hoje das ultimas reservas de racionalidade crítica preconizada pelo Iluminismo e pela Modernidade, que se degradaram em sucessivos processos de autodestruição ao longo do tempo do século XVIII aos tempos atuais, abriram caminho para a Pós-Modernidade que representa uma gigantesca ameaça para o progresso da humanidade. Ressalte-se que os ideólogos da Pós-Modernidade defendem a tese de que, na construção de seu futuro, os povos do mundo inteiro devem se limitar às seguintes alternativas: 1) capitulação/resignação/conformismo com a vitória histórica do capitalismo globalizado neoliberal; ou então, 2) contestar a ordem vigente, mas não a partir de uma perspectiva totalizante, global que leve à substituição do capitalismo, mas sob uma ótica fragmentada de lutas. A postura prática do pós-modernismo é de não contestar a lógica capitalista como ela é de fato. Deliberadamente, a Pós-modernidade defende a tese de que é impossível contestar um sistema vitorioso e que veio para ficar, o capitalismo neoliberal. Pelo exposto, trata-se de um imenso desafio para os pensadores contemporâneos estabelecer novos paradigmas e novos valores de comportamento racional a serem formulados para a sociedade humana na era atual visando derrotar a nefasta influência política e ideológica da Pós-Modernidade que, do ponto de vista político, sustenta ideologicamente o neoliberalismo e a globalização contemporânea. Não resta outro caminho para os homens e mulheres de pensamento da era contemporânea senão reinventar o Iluminismo ajustado aos tempos atuais para que ele possa indicar os caminhos que a humanidade terá de trilhar visando a construção de um mundo melhor. Os pensadores contemporâneos precisam se mobilizar urgentemente na reinvenção do projeto iluminista como fizeram os pensadores do século XVIII visando a construção de um mundo novo que leve ao fim o calvário sofrido pela humanidade. Sobre o Iluminismo do século XVIII, é importante observar que seus ideólogos usaram valores da ciência clássica para forjar uma nova visão de mundo, baseada na igualdade de todos os seres humanos. Precisamos de um novo Iluminismo, para o século XXI. No centro do novo pensamento, deve estar a proteção de todas as formas de vida e do planeta. O único progresso humanamente relevante é o que contribui de fato para o bem-estar de todos que os automatismos do crescimento econômico não bastam para assegurá-lo. O progresso, nesse sentido, não deve ser visto como uma doação espontânea da técnica, mas uma construção intencional pela qual a humanidade decide o que deve ser produzido, como e para quem, evitando ao máximo os custos sociais e ecológicos do capitalismo selvagem. Esse progresso não pode depender nem de 2

decisões empresariais isoladas nem das diretrizes burocráticas de um Estado centralizador, e sim de decisões tomadas pela própria sociedade. O Iluminismo do século XXI deve manter sua fé na ciência que precisa ser controlada socialmente e que a pesquisa científica e tecnológica precisa obedecer a fins e valores estabelecidos com base no consenso social, para que ela não se converta numa força cega, a serviço da guerra e da dominação. Deve assumir sua bandeira mais valiosa que é a dos direitos humanos, sem ignorar que só profundas reformas sociais e políticas podem assegurar sua efetiva realização. Deve combater o poder ilegítimo, consciente de que ele não se localiza apenas no Estado tirânico, mas também no seio da sociedade. Deve lutar sem quartel pela liberdade e contra a opressão de qualquer espécie e edificar uma nova ordem mundial que seja capaz de organizar não apenas as relações entre os homens na face da Terra, mas também suas relações com a natureza. Deve elaborar um contrato social planetário que possibilite o desenvolvimento econômico e social e o uso racional dos recursos da natureza em benefício de toda a humanidade. * Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

3

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.