A dimensão antropológica da vocação – Ir José Sobrero sdb

June 4, 2017 | Autor: Pepe Sobrero | Categoria: Filosofía De La Historia
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A dimensão antropológica da vocação – Ir José Sobrero Bosch sdb

A criação do homem

Senhor Deus, Vós criastes todas as coisas.
Destes-lhes o ser, assentaste-las em seus fundamentos
e fixastes-lhes as mediadas.
Estão cheias do vosso mistério,
que nos comove o coração, quando se inclina para Vós.

Também a nós, criaturas humanas,
nos chamastes à existência, Senhor,
e nos colocastes entre Vós e as coisas.
Criaste-nos à vossa imagem
e tornastes-nos participantes do vosso domínio.

Colocastes o vosso mundo em nossas mãos,
para que ele nos sirva e realizemos nele a nossa tarefa.

Mas devemos estar-Vos sujeitos, e o nosso domínio
transforma-se em revolta e latrocínio
quando não nos inclinamos diante de Vós
que sois o único que leva na cabeça a coroa eterna
e sois Senhor por direito próprio.

É maravilhosa, Senhor, a vossa magnanimidade.

Não temestes pela vossa soberania ao criardes seres
que dispõem de si mesmos e ao confiardes a vossa vontade
à sua liberdade.

Sois grande, Senhor, e verdadeiramente real.
Deixastes em minhas mãos a honra da vossa vontade.

Cada palavra da vossa revelação repete que Vós me estimais
e confiais em mim, que me dais grandeza e responsabilidade.

Ensinai-me a compreendê-lo.

Dai-me a santa maioridade de alma capaz de receber
o direito que concedeis e de tomar sobre ela
a responsabilidade que lhe encargais.

Conservai acordado o meu coração para que esteja sempre diante de Vós,
e fazei que todos os meus atos se transformem
nesta dominação e obediência a que me chamastes.
Amem.
O ser humano como vocação

É necessário que, ao realizar uma opção tão fundamental como a vocacional que, em princípio envolve toda a vida, sejamos convidados a aproximar-nos, a perguntar-nos sobre o sentido e finalidade do nosso existir. Às questões normalmente colocadas como "o que gosto de fazer?", "o que me dá prazer realizar?", "o que sei fazer?", "com qual profissão me darei bem na vida?", devem ser acrescentadas: "a que sou chamado?", "que sentido pode haver no trabalho que desejo realizar?", "qual a finalidade do meu existir?". Assim, no processo de orientação vocacional, além das dimensões psicossociológicas, devem ser igualmente consideradas as dimensões antropológicas e filosóficas, que são fundamentais para o entendimento da vocação humana.

A vocação no sentido mais profundo e radical envolve a pessoa em sua totalidade e singularidade: a vocação concreta é única, rigorosamente pessoal; é a vocação em que cada um consiste mais propriamente, e coincide com o eu de cada um.

Dedicar um tempo para falar da vocação é uma necessidade básica, no âmbito antropológico, porque capta rapidamente a direção da vida do ser humano. Isto significa aprofundar na tarefa ética que conduz a fazer o bem, por exemplo. Quando pensamos nesta realidade essencial, achamos o sentido das nossas ações: nós fazemos o bem porque é um constitutivo da nossa própria natureza. De esta maneira, o bem é para cada indivíduo a correspondente realização de si mesmo.

Realização de si mesmo comporta conhecer-se, valorizar-se e dar uma resposta. São os componentes da vocação.


A vocação pessoal, de uno mesmo, dentro de cada ser humano, que tem direito a realizar-se.


Um conceito que fica claro é o seguinte: desde o ponto de vista ético podemos afirmar que o bem é a autorrealização do ser humano acorde com a verdade da sua natureza. Ainda, devemos sublinhar que esta autorrealização não é autónoma, nem centrada sobre si mesmo. A lei fundamental da autêntica autorrealização, como é a vocação, diz que a pessoa encontra-se a si mesma na medida em que sai dos seus próprios limites e se entrega a sua tarefa, de forma que se realiza na medida em que, esquecendo-se de si mesma, cumpre a exigência que em cada momento se lhe patenteia.

Assim começamos a falar da vocação, neste caso como resposta, tarefa, ato real do ser humano, no curso da vida. Poderíamos falar de destino, busca de sentido ou de ocupar um lugar no mundo. Mas todo isso ajudar-nos-á na medida que saibamos aprofundar o tema da vocação como expressão da ação ética.


A vocação pessoal, porém, terá este atrativo prático que conduzirá a pessoa no compromisso social.




Na dinâmica da direção, compreensão e explicação do sentido da vida

O sentido da vida constitui um questionamento filosófico a cerca do propósito e significado da existência humana. O significado do sentido da vida é a interpretação do relacionamento entre o ser humano e seu mundo.

Há uma quantidade inumerável de possíveis respostas para "o sentido da vida", frequentemente relacionadas a convicções religiosas ou filosóficas. Opiniões sobre o sentido da vida podem por si próprias se distinguir de pessoa para pessoa, bem como também podem variar no decorrer da vida de cada ser humano.

Vivemos imersos nesta ampla perspectiva, recebendo mensagens desde o exterior. Contudo, ficamos desnorteados porque a resposta a este questionamento não se construi desde fora, senão desde dentro.

A dinâmica da direção, compreensão e explicação do sentido da vida está na nossa interioridade, no profundo do nosso ser.

Daí que consideramos seriamente a totalidade da nossa pessoa que vive num contexto determinado, comprometida com a história pessoal e coletiva, fazendo um percurso inteligente, carregando esforços quotidianos para realizar-se plenamente, encarnando valores e vivendo em paz. Aliás devemos aprofundar aspetos antropológicos tais como a autenticidade, a liberdade, a historicidade, a experiência, as relações humanas e efetivas.



A vocação é um apelo que exige uma resposta livre e responsável

«Nos desígnios de Deus, cada homem é chamado a desenvolver-se, porque toda a vida é vocação. E dado a todos, em germe, desde o nascimento, um conjunto de aptidões e de qualidades para as fazer render: desenvolvê-las será fruto da educação recebida do meio ambiente e do esforço pessoal, e permitirá a cada um orientar-se para o destino que lhe propõe o Criador. Dotado de inteligência e de liberdade, é cada um responsável tanto pelo seu crescimento como pela sua salvação. Ajudado, por vezes constrangido, por aqueles que o educam e rodeiam, cada um, sejam quais forem as influências que sobre ele se exerçam, permanece o artífice principal do seu êxito ou do seu fracasso: apenas com o esforço da inteligência e da vontade, pode cada homem crescer em humanidade, valer mais, ser mais».

«É necessário promover um humanismo total (por exemplo, J. Maritain, L'humanisme intégral, Paris, Aubier,1936). Que vem ele a ser senão o desenvolvimento integral do homem todo e de todos os homens? Poderia aparentemente triunfar um humanismo limitado, fechado aos valores do espírito e a Deus, fonte do verdadeiro humanismo. O homem pode organizar a terra sem Deus, mas "sem Deus só a pode organizar contra o homem. Humanismo exclusivo é humanismo desumano" (H. de Lubac S. J., Le Brame de l'humanisme athée, 3ª ed., Paris, Spes, 1945, p.10). Não há, portanto, verdadeiro humanismo, senão o aberto ao Absoluto, reconhecendo uma vocação que exprime a idéia exata do que é a vida humana. O homem, longe de ser a norma última dos valores, só se pode realizar a si mesmo, ultrapassando-se. Segundo a frase, tão exata de Pascal: "O homem ultrapassa infinitamente o homem" (Pensées, ed. Brunschviecg, n. 434. Cf. M. Zundeil, L'homme passe l'homme, Le Caire, Editions du Lien,1944)».

«A constituição do ser humano é composto de corpo e alma. O homem torna-se realmente ele mesmo, quando corpo e alma se encontram em íntima unidade; o desafio do eros pode considerar-se verdadeiramente superado, quando se consegue esta unificação. Se o homem aspira a ser somente espírito e quer rejeitar a carne como uma herança apenas animalesca, então espírito e corpo perdem a sua dignidade. E se ele, por outro lado, renega o espírito e consequentemente considera a matéria, o corpo, como realidade exclusiva, perde igualmente a sua grandeza. O epicurista Gassendi, gracejando, cumprimentava Descartes com a saudação: «Ó Alma!». E Descartes replicava dizendo: «Ó Carne!» (R. Descartes, Œ uvres, editado por V. Cousin, vol. 12, Paris 1824, pp. 95ss). Mas, nem o espírito ama sozinho, nem o corpo: é o homem, a pessoa, que ama como criatura unitária, de que fazem parte o corpo e a alma. Somente quando ambos se fundem verdadeiramente numa unidade, é que o homem se torna plenamente ele próprio. Só deste modo é que o amor — o eros — pode amadurecer até à sua verdadeira grandeza».



Comentários do YOUCAT sobre a pessoa humana

A criação do ser humano é nitidamente distinta da criação dos outros seres vivos. O ser humano é pessoa, isto é, ele pode, pela vontade e pela inteligência, decidir-se pelo amor ou contra ele.

O ser humano não é algo, mas alguém. Assim como dizemos que Deus é pessoal, dizemos o mesmo do ser humano. Um ser humano logra pensar para além do seu horizonte imediato e estimar toda a amplitude do ser: ele até consegue, a uma distância crítica, conhecer-se a si próprio e trabalhar em si mesmo; enquanto pessoa, ele pode perceber os outros, compreendê-los na sua dignidade e amá-los. Entre todas as criaturas visíveis apenas o ser humano é capaz de conhecer e amar o seu Criador. O ser humano está orientado a viver em amizade com Ele.

Os seres humanos são corporais e espirituais. O espírito do ser humano é mais que uma função do corpo enão se compreende a partir da composição material do ser humano. A razão diz-nos que tem de haver um princípio espiritual que esteja unido ao corpo, embora não lhe seja idêntico, e que designamos por «alma». Embora a alma não se possa «comprovar» pela ciência natural, o ser humano não se consegue entender enquanto ente espiritual sem a admissão deste princípio espiritual, que excede a matéria.

A alma de uma pessoa não pode ser produto de um desenvolvimento evolutivo da matéria nem o resultado de uma fusão genética do pai e da mãe. Ao ser humano (pessoa única e espiritual) Deus dá uma alma imortal, ainda que ele, pela morte, perca o seu corpo, para o reencontrar na ressurreição. Dizer «Tenho uma alma» significa afirmar: «Deus crio-me não apenas como um ente, mas como pessoa, e chamou-me a uma relação com Ele que nunca mais termina».



As dimensões da formação: valores e atitudes

"Cada um de nós é chamado por Deus a fazer parte da sociedade salesiana recebe dEle dons pessoais e, respondendo fielmente, encontra o caminho da sua plena realização em Cristo".

A vocação é um chamado que passa por mediações e circunstâncias externas. Mas é em primeiro lugar o chamado de Deus que se manifesta por meio de um conjunto de dons pessoais (aspirações, expectativas, projetos, qualidades) - obra do Espírito - que estão em sintonia com o projeto vocacional salesiano e tornam o indivíduo idôneo a vivê-lo. Tal vocação se reconhece na pessoa: envolve-a em sua totalidade, em todas as suas dimensões e por toda a sua vida.

Compete à formação ajudar a reconhecer, interiorizar e desenvolver os valores e as atitudes que constituem a idoneidade vocacional, sinal do chamamento e fruto da resposta.

Consequentemente, a formação deve ser integral: compreende a dimensão humana, espiritual, intelectual e pastoral. São dimensões que estão presentes, se integram, e "uma chama a outra": não se podem pensar separadamente e "devem harmonizar-se numa unidade vital".

Por outro lado, a formação é permanente e dinâmica. As dimensões de que se trata e os elementos que as constituem não devem considerar-se de forma estática, como se quase fossem condições que se cumprem ou metas que se alcançam de uma vez para sempre. Devem ser vistos no dinamismo e segundo o desenvolvimento de cada pessoa, na perspectiva de uma resposta continuada, estimulada e requerida pela evolução de cada um, pelas exigências da situação, e pelas circunstâncias que marcam a vida.

É a ótica do carisma salesiano que constitui o ponto de síntese e a perspectiva peculiar de onde são vistas as dimensões. E é a partir dela que nelas se evidenciam conotações e aspetos específicos.

A verdadeira relação do homem com Deus

Senhor Deus, Vós criastes o homem
e fundastes maravilhosamente a sua natureza.

Quisestes que ele vivesse no meio das obras da vossa sabedoria,
que desenvolvesse aí as suas forças em encontro sempre renovados com elas
e que se tronasse senhor da sua própria liberdade.

Mas as relações com as coisas deste mundo
devem preparar o encontro convosco.

Vós sois aquele que é;
Sois para cada um de nós o Outro supremo,
o único que plenamente nos satisfaz.

Estamos orientados para Vós, e é em Vós somente
que se realiza o nosso ser segundo a vossa vontade.

Sois a verdade que dá a sua caução a toda verdade finita.
Sois a santidade que torna intangível tudo o que é bom.

Sois o coração que nós procuramos: «para Vós nos criastes
e o nosso coração anda inquieto até poder descansar em Vós».

Na estima que me tendes, ó meu Deus, se funda a minha dignidade.
É na vossa honra que repousa a minha honra.

Se Vos abandonar, sou como o homem de quem fala o vosso apóstolo:
«Olho o espelho e viu o seu rosto; depois partiu e esqueceu o que era».

Sois o único espelho santo onde fico seguro do meu eterno rosto
e consciente da minha responsabilidade.

Quando me afasto de Vós, fujo de mim mesmo
e os poderes deste mundo que me deveriam servir
exercem sobre mim o seu domínio.

Fazei que eu permaneça estreitamente ligado a Vós.

Tornai o meu coração incorruptível
a fim de que seja perspicaz em relação a tudo quanto afasta de Vós.

E assim como o instinto e defesa desperta quanto a vida é ameaçada,
fazei que o mais profundo do meu ser se levante contra tudo
o que me quer separar de Vós.
Amem.




GUARDINI, Romano, Na tua Luz, (Editorial A.O.,Braga,1993), 27.
PAULO VI, Populorum Progressio, (Libreria Editrice Vaticana, 1967), 15.
Idem, 42.
BENTO XVI, Deus Caritas est, (Libreria Editice Vaticana, 2005), 5.
YOUCAT, Catecismo jovem da Igreja Católica, (Paulus, Lisboa, 2011), 56, 58, 62,63.
RATIO FUNDAMENTALIS INSTITUTIONIS ET STUDIORUM, A formação dos Salesianos de Dom Bosco, Princípios e normas, (Roma 2000, Terceira edição), 54.
C 22.
GUARDINI, Romano op. Cit., 36.
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