A EDUCAÇÃO AMBIENTAL TRANSFORMADORA E A NEGAÇÃO DO CAPITALISMO COMO MODELO SUSTENTÁVEL

June 3, 2017 | Autor: Fábio Leite | Categoria: Educação Ambiental
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A EDUCAÇÃO AMBIENTAL TRANSFORMADORA E A NEGAÇÃO DO CAPITALISMO COMO MODELO SUSTENTÁVEL Fábio Alves Leite da Silva Mestrando Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro E-mail: [email protected]

Introdução O presente artigo tem como intuito demonstrar uma necessidade presente e atual: a superação, por meio da Educação Ambiental Transformadora, do modelo econômicosocial capitalista, por ter esse caraterísticas contraditórias à uma sociedade ambientalmente sustentável1. A educação ambiental tem hoje diversas identidades, que possuem no seu cerne teórico aproximações, que as fazem parecer lutar por um mesmo conjunto de idéias, e distaciamentos, quando analisadas de maneira histórica e sob o ponto de vista da construção dos valores que as norteiam. Dentre as várias vertentes teóricas existentes em educação ambiental, aquela que visa a emancipação e a autonomia do homem, tornando-o capaz de vislumbrar todo o processo que constrói a atualidade dos fatos de maneira crítica; a que possui fundamentação teórica para uma construção mais justa e real de um futuro socioambientalmente2 sustentável; a que possui como foco de análise as relações, como relações dialéticas em constante construção, conduzindo a superação da atual realidade, torna-se necessária, por deflagrar as aparentes oposições entre os diversos discursos em educação ambiental e os fundamentos do capitalismo, propondo uma nova ótica dos fatos. 1

Entendemos a idéia de sustentabilidade no seu conjunto de todos os seus fatores, incluindo os sociais e éticos, que promovam o desenvolvimento no sentido da igualdade de direitos e deveres em uma sociedade 2 Utilizo este expressão em concordância a iniciativa de uma busca da “superação da tendência fragmentária, dualista e dicotômica, fortemente presente na sociedade, buscando assim, preencher de sentido essa expressão com a idéia de que as questões sociais e ambientais da atualidade encontram-se imbricadas em sua gênese e que as consequências manifestam essa interposição em sua concretude” (Guimarães, 2004)

Vemos na educação ambiental transformadora a estrutura metodológica e o escopo teórico capaz de problematizar essas relações atualmente estabelecidas pela cultura hegemônica, com vistas a uma ampliação da visão de totalidade, imprescindível para a abordagem do tema. É possível o capitalismo ser ambientalmente sustentável? Existem hoje inúmeras técnicas matemáticas, contábeis, econômicas, de valoração ambiental, que procuram demonstrar a possibilidade da redução dos impactos socioambientais através da lógica de mercado. Todos esses são instrumentos valiosos de análises estatísticas que colaboram com os processos decisórios de preservação dos ecossistemas. Porém muitos desses instrumentos têm obtido poucos resultados no intuito de manter os índices de sustentabilidade da vida planetária. Várias pesquisas têm demonstrado que o processo predatório sobre os sistemas ambientais têm aumentado, haja visto a preocupação mundial com o aumento da temperatura global e da redução da disponibilidade de água no planeta. A pergunta que surge é: por que não há êxito nesta proposição de preservação? Por que, ao utilizar as mesmas tecnologias e lógicas usadas no mercado, não se consegue construir mecanismos que possibilitem o controle no aumento dos impactos socioambientais? Uma análise sobre os fundamentos do capitalismo talvez nos indique um dos vários caminhos para responder a essas perguntas, e buscar possíveis soluções para esses problemas. Segundo Max Weber, um dos objetivos do capitalismo é o aumento da riqueza, alcançada através do trabalho. Dentro desse objetivo capitalista inclui-se a superação quantitativa da simples subsistência, culminando na acumulação do objeto de enriquecimento, e na idéia de aplicação “virtuosa”, que é a aplicação da riqueza para gerar mais riqueza, pois possuia (ou ainda possui) um caráter religioso, devido a sua origem no interior do movimento da Reforma, principalmente no calvinismo, e a medida que confere àquele que consegue tal acumúlo a alcunha de “predestinado”. Em Marx encontramos vários aprofundamentos, principalmente na definição das idéias de valor e da própria condição de existência do capital, devido aos seus estudos terem como base uma complexa busca histórica dessas condições de existências. Ele define

como sendo valores de uso toda coisa ou objeto que satisfaça uma necessidade qualquer do homem, ou seja, que possua utilidade. Como valor de troca (ou simplesmente valor), a relação ou proporção na troca de um certo número de valores de uso de uma espécie com o número de valores de uso de outra espécie (Catani, 1980). Não nos cabe discutir neste artigo todos os atributos concernentes a idéia de valor. Utilizamo-nos brevemente desses conceitos para esclarecer como o surgimento do dinheiro sendo o equivalente geral de valor, mais tarde, redireciona o fluxo geral de trocas, e como esta idéia estimula o expansionismo ilimitado do capitalismo, tornando esse mesmo expansionismo um de seus fundamentos constituintes, que a nosso ver é o cerne do caráter de insustentabilidade socioambiental desse sistema econômico. Inicialmente, nas relações comerciais, quando o dinheiro aparece como o equivalente geral, as trocas ocorriam baseadas nas necessidades humanas, isto é, relacionadas à utilidade das mercadorias para os indivíduos. Como consequência disso, as trocas eram mediadas pelo dinheiro: a mercadoria trocada por dinheiro, que novamente era trocada por outra mercadoria. Essa relação foi nomeada por Marx de circulação simples de mercadoria. Com o dinheiro sendo o valor equivalente geral, o mesmo ganha importância nas relações de troca, surgindo indivíduos que compram mercadorias para depois (re)vênde-las. Neste caso o processo de circulação simples se transforma: agora dinheiro compra mercadorias, que com a venda das mesmas, gera novamente dinheiro. Este processo parece então carente de sentido em relação ao valor de uso, já que dinheiro por si só não se traduz em utilidade (necessidade). Mais ainda: não há garantia de que o proprietário desta mercadoria conseguirá vendê-la pelo mesmo preço com que a comprou. Marx caracteriza este ponto, onde o dinheiro gera dinheiro, como o surgimento do capital; torna-se capital o dinheiro que circula dessa forma. Esta espécie de relação comercial só faz sentido se a quantidade de dinheiro conseguido ao final da troca for maior do que o gasto ao comprar a mercadoria. Ou seja, “o processo de expansão do capital é sem limites”3 . Além dessa premissa, que é um dos pilares históricos da construção do atual capitalismo, existem outros como o surgimento da mais-valia, convertendo a força humana de trabalho em mercadoria, e o lucro, o

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Ver Catani (1980)

dinheiro a mais conseguido ao final desta modalidade de troca, que tem como origem o trabalho não pago. Esses temas, porém, apesar de relevantes, não nos cabe discutir neste artigo, por não se tratar do foco central do mesmo. Com tudo que já foi exposto, pode-se notar a tendência expansionista do próprio sistema capitalista, e não apenas no comportamento de alguns indivíduos, como nós. O próprio sistema é predatório, e nós estamos ligados a ele por relações extremamente estreitas de subordinação a condições dadas de subsistência e sobrevivência, através principalmente da necessidade da venda de nossa força de trabalho. O capitalismo tem, por definição, o objetivo da expansão, do acúmulo de riquezas, e consequentemente da manutenção da desigualdade. Não é ciclíco. Funciona, na verdade, como uma espiral, onde sua “curva” mais recente deve ser sempre maior do que a “curva” anterior, demonstrando um crescente ilimitado. Torna-se necessário dizer a esta altura que, não é por isso que devemos voltar a formas primitivas de relações humanas, ou mesmo que todos os recursos atuais de gestão ambiental devem ser descartados por estarem concordes com o discurso hegemônico. Mas é preciso haver um aclaramento da visão sobre o que realmente está por trás da insustentabilidade; o que realmente significa desenvolvimento dentro deste sistema econômico e como ele se efetiva, antes mesmo de tornar significativo o termo desenvolvimento sustentável. Exposto isso, creio estar clara a intenção de demonstrar a necessidade de se problematizar a questão ambiental num âmbito muito maior do que a simples mudança comportamental, que é importante, mas não suficiente. Promover a discussão de que é preciso superar o próprio modelo econômico vigente, visto que os seus fundamentos e tudo mais que o constrói já o torna socioambientalmente insustentável. O “ecologicamente correto” nos moldes do mercado: quais são as prioridades? Umas das questões importantes a ser problematizada no discurso oficial em educação ambiental é o que venha a ser um cidadão “ecologicamente correto”. Esse discurso, em várias ocasiões, declina-se sobre a questão do consumo relacionada com a mudança de comportamento individual, como o caminho para a efetivação da sustentabilidade. Esta

visão comportamentalista incide em algumas distorções da realidade. A primeira delas é a ingênua pretensão de que a soma das mudanças das partes influenciará na mudança do todo. Para entender a questão, citamos Quintas (2002): “(...) o fato de ‘cada um fazer a sua parte’, por si só, não garante, necessariamente, a prevenção e a solução dos problemas ambientais. Numa sociedade massificada e complexa, assumir no dia-a-dia condutas coerentes com as práticas de proteção ambiental pode estar além das possibilidades da grande maioria das pessoas.”

Várias questões pairam sobre a proposta de mudançã comportamental: quais partes estarão sendo realmente mobilizadas para este fim? De quais dessas partes emanam a proporção de degradação que realmente causa impactos ambientais? É preciso analisar o que norteia esses discursos; o que/quem eles defendem, quais são as suas prioridades, suas intenções, ou seja, situa-los num conjunto de relações que possam traçar a sua história e assim revelar suas identidades. Um bom exemplo desta análise está em Layrargues (2002), onde o autor faz uma análise do processo de reciclagem, especificamente da reciclagem de latas de alumínio, e nos revela as reais intenções da intensificação da reciclagem desse produto. O autor nos mostra que as latas de alumínio tornaram-se a grande estrela das campanhas publicitárias sobre reciclagem, com discursos que variavam desde a colaboração dessas latas com a questão do volume de lixo produzido até a de uma diminuição da exploração das jazidas de bauxita em virtude de uma reciclagem desse produto. Layrargues nos aponta um desvio na discussão da questão do consumismo, mostrando que os reais beneficiários da reciclagem das latas de alumínio são as próprias indústrias que produzem as mesmas latas, devido à diminuição do custo de produção, quando da re-entrada das mesmas no processo de produção. Essas indústrias obedecem fielmente (e não se esperava o contrário) ao fundamento precípuo do capitalismo, e seu objetivo é a expansão, com uma maior produtividade, no sentido de acúmulo de riquezas. Realiza este intento ao reciclar seu próprio produto e transformar o que antes seria descartado, em matéria-prima para produção, porém agora com um discurso de não poluente. Mais que isso: com um discurso “ambientalmente correto”.

Quanto ao esgotamento das jazidas de bauxita, ele nos revela que muitos outros metais mereceriam maior atenção quanto a instauração de processos de reciclagem do que o alumínio, visto que esse metal é o que possui uma das maiores reservas mundiais. Dentro da política dos 3 R’s (Redução, reutilização e reciclagem) os dois primeiros R’s não são efetivamente realizados pelas indústrias atuais, talvez por não retornarem benefícios financeiros, já que em um processo de reutilização ou mesmo de redução há o risco de estagnação e prevista paralisação da própria indústria produtora das latas de alumínio. Mais uma vez, o fundamento do acúmulo de riquezas do modelo capitalista entra como processo determinante de ações no que concerne as práticas e discursos ambientais. Por isso a aposta na reciclagem, como discurso ambiental oficial, e por isso também a escolha da lata de alumínio. No que confere ao aumento do volume do lixo, o autor nos revela que, mesmo com a campanha da reciclagem da lata de alumínio os índices que acompanham o seu uso aumentaram4. Uma outra questão é o aspecto contraditório da mesma campanha nos chamados Projetos Escolas, promovido pela própria industria de latas. Sobre isso destacamos o seguinte trecho de Layrargues (2004), quando o mesmo cita Zacarias (1998): “A autora verificou que o Projeto Escola é contraditório, pois, em primeiro lugar, em muitas escolas o motivo principal da adesão ao programa foi a aquisição de equipamentos; em segundo, mesmo quando a preocupação principal era a questão ambiental, e não a premiação, essa preocupação reduzia-se à reciclagem, e não à reflexão sobre o consumismo. Tal fato mostrou-se recorrente em todas as escolas que não possuíam um compromisso pedagógico crítico.”

A autora citada por Layrargues coloca que a campanha de Coleta Seletiva de Lixo, quando realizada em parceria com as indústrias de reciclagem “restringe o processo pedagógico a uma finalidade mercantil e utilitarista.” (Zacarias, 1998). É previsível reconhecer, portanto, que educação ambiental da maneira como acreditamos, ou seja, transformadora das atuais relações existentes, não tem a possibilidade de basear-se numa visão mercadológica capitalista, para a formulação de 4

os referidos índices podem ser encontrados em Layrargues (2004)

seus processos pedagógicos, haja visto a insustentabilidade do sistema capitalista e a distorção das informações por ele produzidas, contraditórias com a realidade, e como forma de manutenção do pensamento hegemônico. Por isso a necessidade de se definir desenvolvimento a partir de outros parâmetros, para poder atribuir novos valores e assim identificar mais fielmente a razão da idéia de sustentabilidade. Precisamos então, para este intento, uma proposta pedagógica que seja a negação do processo capitalista de produção, e que volte o olhar para as relações homem/ambiente/sociedade, permitindo observar este complexo como uma totalidade que possui variadas particularidades. Algumas identidades em educação ambiental e suas relações com o pensamento hegemônico. Para que possamos realizar educação ambiental faz-se necessário a sua identificação, denunciando com isso o seu norteador teórico e suas propostas de ação. Portanto vale a adjetivação sobre a própria educação ambiental, na intenção de tornar clara a sua identidade, traçando através disso suas redes de relações e os motivadores de seus discursos. Neste processo de identificação encontramos um tipo de educação ambiental comprometida com o discurso oficial, chamada de Convencional por Loureiro (2004: 65) ou Conservadora, na denominação de Guimarães (2004: 26). Nessa vertente, bastante em voga atualmente, encontra-se a ênfase no discurso da mudança de comportamento, na reciclagem como estratégia de preservação, dentre outros, que fortalecem o dizer hegemônico. Esclarece-nos Quintas (2002): “Para quem se identifica com a primeira perspectiva, está implícita a idéia de que a prevenção e a solução dos problemas ambientais dependeriam, basicamente, de ‘cada um fazer sua parte’. Assim, se cada pessoa passasse a consumir apenas o necessário (aquelas que podem), a reaproveitar ao máximo os produtos utilizados e a transformar os rejeitos em coisas úteis, em princípio estariam economizando recursos naturais e energia e, desta forma, minimizando a ocorrência de impactos ambientais negativos.”

Isto significa que a sustentabilidade está diretamente relacionada ao nível de consumo do indivíduo, e que a mudança de seu comportamento, somada a mudança de

comportamento dos outros indivíduos da sociedade, geraria a sustentabilidade. É uma abordagem isenta de crítica do modo de produção vigente, do consumismo, da definição do que venha a ser desenvolvimento, sendo uma “prática pedagógica prescritiva e reprodutiva” (Quintas, 2002), repetindo o discurso expansionista, agora vestido do discurso “ambientalmente sustentável” do capitalismo. Presente também nesta abordagem está a desarticulação do ser humano como parte constituinte da natureza. A partir dessa desarticulação, o indivíduo rompe sua relação com o meio natural, rompendo as relações metabólicas naturais5, e vendo-se como um ser separado do meio natural, quando ele é natureza6. Esta concepção de educação ambiental, a nosso ver, traz pouca contribuição à crítica que pretende construir o novo, a partir de novos paradigmas, de novos referenciais teóricos e de realidade, procurando esclarecer a totalidade dos fatores envolvidos com a questão socioambiental. Nos dizeres de Guimarães (2004): “Acredito que essa concepção de educação ambiental não é epistemologicamente instrumentalizada, nem comprometida com o processo de transformações significativas da realidade socioambiental, presa que é aos seus próprios arcabouços ideológicos. Essa educação ambiental busca a partir dos mesmos referenciais constitutivos da crise, encontrar a sua solução7.(...) Essa concepção de Educação, ao se colocar inapta de transformar uma realidade (a qual ela própria é um dos mecanismos de reprodução), conserva o movimento de constituição da realidade de acordo com os interesses dominantes – a lógica do capital.”

Dentre esses “arcabouços ideológicos” explicitados pelo autor, estão aqueles que são fundandores do sistema capitalista, quais sejam: a lógica de acúmulo de riquezas e o expansionismo predatório, dos quais esta educação é porta-voz e reprodutora. Portanto fica evidente a ineficácia de tal discurso pedagógico em educação ambiental, visto que esse não se relaciona dialéticamente com as questões que envolvem a tríade indissociável homem/natureza/sociedade. Ainda nos dizeres de Guimarães (2004):

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Atrelamos a essa idéia o conceito de “falha metabólica”, que pode ser visto em Foster (2005) “Afirmar que a vida física e espiritual do homem e a natureza são interdependentes significa apenas que a natureza se inter-relaciona consigo mesma, já que o homem é uma parte da natureza” Karl Marx (Manuscritos econômicos-filosóficos de 1844) 7 Grifo nosso 6

“A educação ambiental que denomino conservadora se alicerça nessa visão de mundo que fragmenta a realidade, simplificando e reduzindo-a, perdendo a riqueza e a diversidade da relação”

Antes de expor a outra visão sobre educação ambiental é importante frisar a minha concordância com diversos autores de que a Educação Ambiental Transformadora não se identifica como “uma evolução conceitual ou desenvolvimento metodológico de algo que era anteriormente conservador” Guimarães (2004), mas sim como uma outra visão, que parte de referenciais teóricos distintos, que acreditamos ser dotados de instrumentos mais abrangentes para a análise dos problemas socioambientais atuais. Convém ainda esclarecer que, para uma melhor clareza na identidade de uma Educação Ambiental Transformadora entendemos a mesma em concordância com Loureiro (2004: 65), que diz: “(...) estritamente na condição de uma nuance inserida no campo libertário da educação ambiental, no qual se inscrevem abordagens similares (emancipatória, crítica, popular, ecopedagógica, entre outras), que se aproximam na compreensão da educação e da inserção de nossa espécie em sociedade.”

Portanto vemos neste viés da Educação Ambiental, a possibilidade e o estímulo ao diálogo democrático, que favorece, dentre outras coisas, a uma visão crítica, possuindo como objeto de suas observações as relações. Nesta vertente de Educação Ambiental as transformações são vista de forma global, conjunta, atreladas a ações políticas e de re-modelação de estruturas de relações sócioeconômicas. Em resumo, vemos nesta vertente a possibilidade de estabelecer um patamar crítico onde, inevitavelmente se demonstrará a contradição entre o sistema capitalista e a sustentabilidade das relações entre homens/natureza/sociedade. Esta face da Educação Ambiental Transformadora se delinea a partir do seu próprio arcabouço teórico estruturante, que tem como tradições constituintes de sua base as pedagogias libertárias e emancipatórias, as marxistas e humanistas, dentre outras, que permitem escapar da reprodução educacional vigente, propondo novos planos de discussão dos paradigmas presentes atualmente.

Considerações finais Procuramos ao longo deste artigo demonstrar, minimamente, que a questão da sustentabilidade/insustentabilidade encontra suas primeiras barreiras nos fundamentos constituintes do capitalismo. A própria idéia formadora desse sistema é por si só insustentável. Porém não podemos, diante disto, cair no imobilismo, na inação. A busca por novos olhares, por novas formas de pensar e viver as questões, respondendo-as de forma real e concreta, é possível. Por outro lado, diante das diversas vertentes existentes em educação ambiental, há aquelas que pouco influem neste “estado revolucionário” que a sustentabilidade da vida no planeta necessita, visto que seus discursos e práticas são construídos com os elementos formadores da própria crise, o que as faz cair no reprodutivismos e na reafirmação do discurso hegêmonico, qual seja, a lógica do capital. Portanto, faz-se necessária uma educação ambiental que fundamente um processo crescente de emancipação e autonomia. Que possua uma visão da totalidade complexa e vislumbre todas as frentes que compõem a problemática ambiental, principalmente as de cunho social e político. Esta vertente deve, pelo menos, problematizar tais situações e trazer a tona o que é real. Nos dizeres de Loureiro (2004): “A Educação Ambiental transformadora é aquela que possui um conteúdo emancipatório, em que a dialética entre forma e conteúdo se realiza de tal maneira que as alterações da atividade humana, vinculadas ao fazer educativo, impliquem mudanças individuais e coletivas, locais e globais, estruturais e conjunturais, econômicas e culturais. Em que a dimensão política da educação seja ‘a arte do compromisso e da intransigência’ (Morin, 2002: 43) – compromisso com a transformação societária e intransigência na defesa dos valores, atitudes individuais e ações coletivas condizentes com a emancipação.”

A Educação Ambiental Transformadora traz, como seu norte teórico, tradições do pensamento humano que procuram romper com o discurso vigente, não como uma forma de evolução do mesmo, mas com a idéia de “negação da negação”, da síntese para a superação. É uma educação ambiental voltada para a práxis, para o real, o pensar e agir, num exercício constante de aplicação e reflexão do concreto. Nos dizeres de Morin (1999: 188):

“trata-se ao mesmo tempo de mudar de vida e transformar o mundo, de revolucionar o indivíduo e de unir a humanidade.”

Assim, no nosso entender, a Educação Ambiental Transformadora é a que traz as condições necessárias para ampliar as discussões sobre a questão ambiental, trazendo a uma valiosa contribuição na promoção desta ‘revolução’ do indivíduo e do mundo, do local e do global, tudo num só tempo. Possibilita a demonstração das contradições existentes no processo fundante do capitalismo, sem no entanto arvorarsse por um caminho idealístico de uma vida asceta, na tentativa de fugir dos incômodos que o sistema vigente proporciona, haja visto que sofre-os todos, porque é este o discurso hegemônico. Permite-nos ainda entender a diversidade na totalidade, sem que essas duas idéias se confrontem, ou que uma seja o oposto da outra, servindo de instrumento de mediação de interesses e conflitos, entre atores sociais distintos, que se apropriam dos recursos naturais de maneiras distintas. Por isso vemos na Educação Ambiental Transformadora um conjunto de características teórico-metodológicas e pedagógicas que possibilitam a reflexão para a ação, conduzindo-nos a uma real mudança, através da crítica sobre os valores que atualmente têm colaborado para a insustentabilidade da permanência da vida no planeta.

Referências Bibliográficas CATANI, A.M. O que é capitalismo?. São Paulo: Brasiliense, 1980. CHAUÍ, M. O que é ideologia?. São Paulo: Brasiliense, 2004. FOSTER, J.B. A ecologia de Marx: materialismo e natureza. Rio de Janeiro: Civilização Brasilieira, 2005. GUIMARÃES, M. Educação Ambiental Crítica. In: LAYRARGUES, P. P. (org.). Identidades da educação ambiental brasileira. Brasília: IBAMA/MMA, 2004. LAYRARGUES, P. P. o Cinismo da reciclagem: o significado ideológico da reciclagem da lata de alumínio e suas implicações para a educação ambiental. In: LOUREIRO, C. F. B., LAYRARGUES, P. P. & CASTRO, R. S. (orgs.). Educação Ambiental: repensando o espaço da cidadania. São Paulo: Cortez, 2002. LOUREIRO, C. F. B. Trajetória e fundamentos da educação ambiental. São Paulo: Cortez, 2004. LOUREIRO, C. F. B. Educação Ambiental Transformadora. In: LAYRARGUES, P. P. (org.). Identidades da educação ambiental brasileira. Brasília: IBAMA/MMA, 2004. QUINTAS, J. S. Por uma educação ambiental emancipatória: considerações sobre a formação do educador paa atuar no processo de gestão ambiental. In: QUINTAS, J. S. (org.). Pensando e praticando a Educação Ambiental na gestão do meio ambiente. Brasília: IBAMA, 2002

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