A Educação em Portugal

August 28, 2017 | Autor: Dora Caetano | Categoria: Portugal, Educação
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A Educação em Portugal UMA REFLEXÃO

Dora Catarina Caetano

Índice INTRODUÇÃO

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A CONSTRUÇÃO DA EDUCAÇÃO EM PORTUGAL

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UM OLHAR SOBRE A “SERPENTINA DO TEMPO”

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ANTES DE 50 DÉCADA DE 50 DÉCADA DE 60 DÉCADA DE 70 DÉCADA DE 80 DÉCADA DE 90 SÉCULO XXI – ENTRADA DA MOEDA ÚNICA - EURO PROGRAMA EDUCAÇÃO 2015 RESUMINDO

6 6 6 7 9 11 13 15 15

BARROSO, J. (2006)

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O ESTADO E A EDUCAÇÃO: A REGULAÇÃO TRANSNACIONAL, A REGULAÇÃO NACIONAL E A REGULAÇÃO LOCAL

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CANÁRIO, R. (2005)

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A ESCOLA COMO CONSTRUÇÃO HISTÓRICA

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CHARLOT, B. (2007)

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EDUCAÇÃO E GLOBALIZAÇÃO: UMA TENTATIVA DE COLOCAR ORDEM NO DEBATE

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AFONSO, N. & COSTA, E. (2009)

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A INFLUÊNCIA DO PROGRAMME FOR INTERNATIONAL STUDENT ASSESSMENT (PISA) NA DECISÃO POLÍTICA EM PORTUGAL: O CASO DAS POLÍTICAS EDUCATIVAS DO XVII GOVERNO CONSTITUCIONAL PORTUGUÊS 28 CORREIA, J. (1999)

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AS IDEOLOGIAS EDUCATIVAS EM PORTUGAL NOS ÚLTIMOS 25 ANOS

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BIBLIOGRAFIA

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Introdução

A educação não é uma ciência recente. Podemos mesmo considerar que desde os seus primórdios que o Homem sentiu a necessidade de transmitir conhecimentos de geração em geração. No entanto, a Escola como instituição não existia. A transmissão de conhecimentos acontecia em “ritos de iniciação”. Foram vários os autores que contribuíram para a construção da História da educação em Portugal, nomeadamente na segunda metade do século XX, sendo que a mesma só se conseguiu afirmar já na década de 90, tendo passado por algumas fases mais ou menos conturbadas durante as décadas precedentes. A “Escola” teve um percurso, por vezes, acidentado, desde a sua origem até aos nossos dias. Para que se consiga perceber melhor o seu percurso em Portugal, este documento apresentará um breve resumo sobre a construção política da educação, em Portugal, mas irá focalizar-se mais no período pós década de 50, do século XX, perseguindo a “serpentina do tempo”1. Por ser um tema com interesse, inclui-se igualmente, nesta análise, uma breve perspectiva sobre a evolução da educação de adultos em Portugal. Este documento pretende ser apenas uma reflexão sobre a Educação em Portugal. Esta reflexão terá como suporte cinco dos textos base selecionados, bem como o recurso a outras referências bibliográficas.

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GEPE, (2009: 12)

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A construção da educação em Portugal Portugal foi o primeiro país católico onde o Estado assumiu o encargo e superintendência do sistema educativo, com reformas que, no final do século XVIII constituíram uma referência para outros países europeus. Ainda no século XIX, em 1835, Portugal foi o quarto país do mundo a consagrar em lei o princípio da escolaridade obrigatória. Segundo António Teodoro, no início do século XX, a taxa de inscrições no ensino primário era de 22,1% e, trinta anos mais tarde, em 1930, ainda era de 37,7%. No seguimento de queixas enviadas à Direcção Geral de Instrução Pública, em 1902 foi realizada uma investigação ao Liceu Central de Lisboa. Estas queixas incidiam especialmente sobre a forma como tinham ocorrido os exames. “A Portaria do dia 28, assinada por Hintze Ribeiro, explicitava a necessidade de “apurar se estes e outros factos congéneres são consequência da actual organização do ensino secundário em vigor e ponderar as alterações que convenha fazer-se em algumas das suas disposições.”” (Brás, 2009:104) No entanto, foi com a reforma de 1905 que se iniciou o processo de reestruturação da educação em Portugal. Em 29 de Agosto de 1905, Eduardo José Coelho, o então ministro do reino, assina o decreto que traria as primeiras alterações ao sistema liceal, mas foi Abel Andrade, então director geral de instrução pública, quem preparou pormenorizadamente a referida reforma, ao ter-se dedicado ao estudo da problemática da educação e ao organizar um plano de reestruturação do ensino em Portugal. A educação em Portugal passa por uma reforma, de 24 de Dezembro de 1901, da qual é Hintze Ribeiro o responsável, e fica regulamentada pelo decreto de 19 de Setembro de 1902. Segundo este decreto, o ensino primário dividia-se em dois graus, sendo que o primeiro era obrigatório e gratuito para todas as crianças que tivessem entre seis e doze anos e que residissem a uma distância de 2km de qualquer escola, fosse ela pública ou privada. O segundo grau não era obrigatório, os alunos tinham que pagar uma propina de exame e destinava-se a candidatos ao ensino liceal. A reforma de 24 de Dezembro de 1901 propunha igualmente a criação do ensino infantil, destinado a crianças entre os quatro e os seis anos.

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No final da monarquia, e no inicio da primeira República, existiam apenas 5300 escolas em funcionamento, os professores estavam mal preparados, quer ao nível pedagógico, quer ao nível científico e a taxa de analfabetismo atingia 75% da população. Perante este cenário, a politica educativa da primeira República assentou num grande investimento quer na educação quer na cultura. Foi com António José de Almeida, com o decreto de 30 de Março de 1911 que tem inicio uma intensa reforma educativa, que veio criar a distinção entre ensino primário e ensino infantil. Com esta reforma, o ensino primário foi dividido em três graus. O elementar, destinado a crianças com o mínimo de sete anos, tinha a duração de três anos. Seguia-se o grau complementar, para o qual as crianças só poderiam entrar com o mínimo de 10 anos, e com a duração de dois anos. Por fim existia o grau superior, para crianças com idade superior a doze anos, com a duração de três anos. Após completar o terceiro grau, as crianças estavam aptas para ingressar em cursos das escolas industriais, comerciais, técnicas, etc. Dá-se início, por esta altura, a uma orientação pedagógica, para os programas do ensino primário, baseada nos interesses das crianças e moldada às suas necessidades. A reforma de 1911 sofreu vários reajustes e readaptações, tendo sido revogada em Maio de 1919. As alterações à reforma de 1911 passaram, essencialmente, pela alteração da escolaridade obrigatória de três para cinco anos. Deixam de existir o grau primário e o grau complementar e passa a existir apenas o ensino primário geral, sendo este de frequência obrigatória. Esta reforma não conseguiu atingir os objectivos a que se propunha, uma vez que se vivia, em Portugal, um clima de instabilidade política e governamental. Entre Maio de 1926 e Abril de 1974, viveu-se, em Portugal, o período conhecido como Estado Novo. Trata-se de um período de estabilidade, ordem e poder, em que a escola é vista como uma instituição indicada para o desenvolvimento dos cidadãos, de acordo com os princípios e valores exigidos pelo Estado: Deus, Pátria, Família e Autoridade. Em 1930, a taxa de analfabetismo é de 62%. A escola está ao serviço da nação, reforçando, junto dos seus alunos, os valores ideológicos do Estado. Em 1932, o então Ministro da Instrução, Cordeiro Ramos, através do decreto n.º 21014, de 19 de Março, faz publicar uma lista de frases que deveriam, obrigatoriamente, ser incluídas e todos os livros de leitura. Estas frases apelavam ao respeito pelas hierarquias sociais e à valorização do patriarcado. Em 1936, os professores são proibidos de fazer citações,

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devendo-se restringir unicamente ao livro único para o ensino primário, institucionalizado por Carneiro Pereira, então Ministro da Instrução. Enquanto na primeira República se valorizou a escola e a instrução da população, no Estado Novo a escola foi descurada, chegando mesmo a fechar escolas e a substituir os professores por regentes escolares, sem conhecimentos que lhes permitissem ensinar as crianças. Não interessava a este regime alfabetizar e escolarizar a população. No campo da educação de adultos, em Portugal esta realiza-se de uma forma bastante tardia, assim como a própria intervenção do Estado nesta problemática. Durante a primeira República, o Estado tenta promover algumas iniciativas ligadas à Educação Popular, apesar das mesmas não terem alterado o triste cenário da população adulta. Com Salazar, estas iniciativas foram interrompidas, tendo sido apenas nos anos 50 que a intervenção do Estado neste campo ganha algum significado, se bem que as actividades de educação de adultos ficam centradas no próprio Estado, isto é, essas actividades são caracterizadas por serem muito idênticas aos programas adoptados para o ensino básico.

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Um olhar sobre a “Serpentina do tempo” Antes de 50 Na década de 40 assiste-se a um aumento de escolas primárias, estando este fenómeno estreitamente ligado ao Plano dos Centenários. Este aumento do número de escolas primárias vai contribuir para que a taxa de analfabetismo, entre as crianças com idades compreendidas entre os 7 e os 11 anos, diminua de 46,2%, em 1940 para 20,3%, em 1950. Assiste-se, igualmente a uma reabertura de escolas para a formação de professores do ensino primário.

Década de 50 Ao crescimento da rede pública de escolas e à entrada de professores formados no sistema, junta-se um Plano de Educação Popular decretado em 1952, que vem permitir a alfabetização de adolescentes e adultos, mas, acima de tudo, vem promover a escolarização das crianças. Em 1956 assiste-se, em Portugal a uma descida do número de menores sem educação e a um aumento do número de alunos matriculados na 4ª classe, de frequência não obrigatória. No final de 1956, com o Governo de Salazar, a escolaridade mínima obrigatória passa a ser de quatro anos para as crianças do sexo masculino e de três anos para as crianças do sexo feminino.

Década de 60 Em 1960, no ano em que Portugal apresenta uma redução do ritmo de crescimento da população, e uma quebra na natalidade, apresenta, igualmente, uma taxa de analfabetismo que ronda os 34%. É neste ano que a escolaridade obrigatória para as meninas passa de três para quatro anos. No início dos anos 60, a UNESCO lançou um método de alfabetização, cuja principal orientação aconselhava que se fizesse uma estreita combinação entre a aquisição da leitura e da escrita e a formação de base. Esta orientação da UNESCO tinha alguns pontos comuns com a perspectiva de qualificação profissional abrindo, assim, novos caminhos para uma interligação entre aprendizagem elementar e formação cívica e política. O conceito de educação de adultos começou a evoluir no sentido de

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transformar o adulto num ser humano realizado, passando este a ser o seu centro de interesse, como pessoa e não apenas como cidadão. Em 1964 a escolaridade mínima obrigatória passa de quatro para seis anos. No entanto, nem toda a população em idade escolar foi abrangida por esta alteração. Isto ficou-se a dever ao facto de não terem sido asseguradas as condições para o alargamento da rede escolar. Já em 1965 arranca a telescola em Portugal. Trata-se de um sistema de ensino via televisão. A emissão do programa fazia-se dos estúdios da Radiotelevisão Portuguesa e os alunos eram acompanhados, nas escolas (postos de recepção) por monitores. A criação da telescola veio, assim, combater a falta de professores e colocar em prática a escolaridade obrigatória. As emissões de televisão realizavam-se em directo e, na sala de aula, o monitor acompanhava as actividades e trabalhos dos alunos. A telescola permitia servir todas as zonas do país, desde as zonas rurais às zonas suburbanas, com escolas superlotadas. Em 1967 foi criado o ciclo preparatório do ensino secundário, igualando os anteriores ciclos do liceu e das escolas técnicas. A opção de prosseguimento de estudos passa a ser feita após o 6º ano de escolaridade. Foi também a partir de 1967 que passa a ser obrigatória a frequência dos seis anos de escolaridade para se poder ter acesso ao emprego. Salazar sai do Governo em 1968 e é Marcelo Caetano quem passa a conduzir o rumo do Estado Novo. No seu primeiro governo, Marcelo Caetano conta com José Hermano Saraiva na pasta da educação, responsável pela proposta de lei de reforma do ensino médio e a repressão sobre o movimento estudantil. Portugal enfrenta um crescimento populacional negativo, com grande emigração. A quebra na natalidade mantém-se.

Década de 70 Na década de 70 a economia portuguesa sofre uma viragem para o espaço europeu. Apesar de os anos de viragem na política educativa se possam descobrir nos anos 50, com a implantação da reforma do ensino técnico e do Plano de Educação popular, e

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nos anos 60 com a participação no Projecto Regional do Mediterrâneo, é na década de 70 que a educação vai assumir um papel central no processo de reorganização do Estado. No inicio da década dá-se um novo momento de reforma do ensino, sendo que este momento decorre da condição insuportável causada pela quase inércia do sistema. Em 1972 dá-se a criação dos cursos técnicos gerais e complementares. No ano seguinte, em 1973, a Veiga Simão foi proposto o objectivo de realização de uma grande reforma do ensino tendo este apresentado o Projecto do Sistema Escolar, que integrava algumas alterações/inovações, nomeadamente a oficialização da educação pré-escolar, a descida da idade das crianças para ingresso no ensino primário, o alargamento da escolaridade obrigatória para oito anos, o aumento de um ano ao ensino secundário, a criação de cursos de pós-graduação e a estruturação da educação permanente. A partir desta década assiste-se a um agravamento da situação do país. A população está insatisfeita, e esta insatisfação culmina com a revolução de 25 de Abril de 1974, e consequente instauração da democracia. Este foi um período de grandes transformações, quer a nível social, quer ao nível da escola. A escola passou a ser indispensável para a formação dos cidadãos. Os responsáveis pelas políticas educativas preocupam-se em alterar os conteúdos programáticos e em gerir as escolas com o recurso à comunidade escolar, incluindo professores, alunos e pessoal não docente. A escola deve romper com o passado e transformar-se. Assiste-se a uma passagem dos alunos, de uma postura passiva, para uma postura activa e participante. São elaborados os programas para o ensino primário, apostando no desenvolvimento da criança e valorizando a actividade lúdica, a integrar os programas. É por esta altura que Matilde Rosa Araújo escreve o poema “Os Direitos da Criança”. Os professores vêem as suas funções alargadas para além do ensino das matérias. Agora o professor é visto como um animador, e tem a capacidade de promover a integração e socialização correcta das crianças e dos adultos. Entre 1974 e 1976, Portugal passou por um período agitado e instável, assinalado por uma forte luta política, o que não permitia que se efectuasse reformas de fundo no

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sistema educativo. As reformas que aconteceram foram isoladas e serviram apenas para corrigir algumas situações consideradas mais críticas. 1975 foi o ano da criação do ensino básico unificado e extinção do ensino técnico. A ampliação do ensino secundário unificado teve efeitos no rápido aumento do acesso ao secundário complementar e, posteriormente no aumento da procura do ensino superior. A unificação das vertentes liceal e técnica criou-se dando mais ênfase ao ensino liceal, e deixando cair progressivamente o ensino técnico. Também a Universidade, entre 1974 e 1986, passou por algumas reestruturações, tendo estas sido feitas, igualmente, de forma isolada, mas que tendiam a regularizar o seu funcionamento. Entre 1976 e 1986, Portugal assistiu a uma crescente estabilização, o que permitiu que se desenvolvessem algumas actividades experimentais, que permitiram reorientar o sistema educativo e da formação profissional. Foi nesta altura que se fez reflectir o final dos cursos técnicos. A escola, mesmo com as suas vias profissionalizantes, não conseguia dar resposta, com qualidade técnica, ao mercado de trabalho Não eram formados alunos suficientes, nem com preparação profissional adequada, para a ocupação de quadros médios nas empresas. A Assembleia Constituinte, reunida na sessão plenária de 2 de Abril de 1976, aprova e decreta a Constituição da República Portuguesa. Em 1977, as carências motivadas pelo término dos cursos técnicos, obrigou as Universidades a criarem cursos de curta duração, que em 1979 deram origem ao ensino politécnico, passando este a dar a resposta adequada ao mercado de trabalho, naquilo que se refere a quadros intermédios. É em 1977 que são criadas as comissões instaladoras do ensino pré-escolar, e em que Portugal assiste a um aumento da sua população, incrementado pelo retorno das excolónias.

Década de 80 Ao nível da Educação, em 1980, Portugal assiste à criação do 12º ano de escolaridade e extinção do ano propedêutico. São aprovadas normas para o cumprimento da escolaridade obrigatória por parte de todas as crianças portuguesas e é incluído o ensino

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de Religião e Moral Católicas no ensino primário. É este o ano em que se dá a integração dos professores efectivos dos antigos liceus e escolas técnicas no sistema de ensino. São criados os Conselhos Pedagógicos nas escolas preparatórias e secundárias, bem como os exames ad hoc para obtenção de equivalência de estudos. Em 1983, com o objectivo de diversificar as modalidades de ensino, em 1983 é (re) lançado o ensino técnico-profissional, através do despacho normativo n.º 194-A/83, de 21 de Outubro. No ensino secundário passam a existir quatro tipos de cursos: Cursos Gerais (via de ensino); Cursos Profissionais (equivalentes aos 10º, 11º e 12º anos); Cursos Profissionais (10º ano, seguido de um estágio) e os Cursos Complementares Liceais e Técnicos (equivalentes aos 10º, 11º e 12º anos, em regime nocturno). No dia 1 de Janeiro de 1986 Portugal adere à Comissão Económica Europeia. Em 14 de Outubro de 1986, em sessão legislativa é aprovada a Lei n.º 46/86: Lei de Bases do Sistema Educativo. Esta lei define os princípios organizativos a que deve atender a nova estrutura do sistema de ensino; determina os apoios e complementos educativos necessários ao sucesso escolar; estabelece os princípios da formação dos educadores e professores, bem como das respectivas carreiras; determina a organização dos recursos materiais; estabelece os princípios de administração do sistema; determina os meios de desenvolvimento e de avaliação do sistema educativo; define o papel do ensino particular e cooperativo e, aponta disposições finais e transitórias relativas à implementação e aplicação da lei. A formação profissional inclui-se no sistema educativo, em 1989, uma vez promovida pelo Ministério da Educação e operacionalizada pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade, bem como por outras entidades responsáveis pela criação das escolas profissionais. Durante o ano de 1989 é realizada uma reforma curricular dos ensinos básico e secundário e é criado o ensino recorrente. Dá-se a criação de dois tipos de cursos no ensino secundário:

os

Cursos

Secundários

Predominantemente

Orientados

para

o

Prosseguimento de Estudos e os Cursos Secundários Predominantemente para a Vida Activa, também conhecidos como Cursos Tecnológicos.

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Em 3 de Fevereiro de 1989, o Decreto-Lei n.º 43/89, estabelece o regime jurídico da autonomia das escolas, dos 2º e 3º ciclos do Ensino Básico e Secundário, onde, no seu artigo 2º, do Capítulo I, se pode ler: “1- Entende-se por autonomia da escola a capacidade de elaboração e realização de um projecto educativo em benefício dos alunos e com a participação de todos os intervenientes no processo educativo. 2- O projecto educativo traduz-se, designadamente, na formulação de prioridades de desenvolvimento pedagógico, em planos anuais de actividades educativas e na elaboração de regulamentos internos para os principais sectores e serviços escolares. 3- A autonomia da escola desenvolve-se nos planos cultural, pedagógico e administrativo, dentro dos limites fixados pela lei.”

Década de 90 O Despacho n.º 141/ME/1990 aprova o modelo de apoio à organização das actividades de complemento curricular que são definidas como um “conjunto de actividades não curriculares que se desenvolvem, predominantemente, para além do tempo lectivo dos alunos e que são de frequência facultativa.” As actividades não curriculares devem ter um carácter lúdico, cultural e formativo. A este despacho encontra-se anexado o Modelo de Apoio à Organização das Actividades de Complemento Curricular, elaborado pelo Instituto de Inovação Educacional. A Área Escola deve implementar a animação cultural na escola, sendo este o palco ideal para a formação pessoal e social de cada aluno, não devendo nunca menosprezar as motivações e interesses de cada aluno. Em 10 de Maio de 1991, o Decreto-Lei n.º 172/91, faz algumas alterações ao Decreto n.º 43/89, de 3 de Fevereiro. Este decreto estabelece o ordenamento jurídico dos órgãos de direcção, administração e gestão dos estabelecimentos de ensino pré-escolar, básico e secundário. Por via da regulamentação da Lei de Bases do Sistema Educativo, foi constituído o quadro geral de reorganização e desenvolvimento da educação de adultos, nas vertentes de ensino recorrente e de educação extra-escolar.

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O despacho normativo 338/1993 vem trazer a reforma curricular do ensino secundário e criação dos cursos tecnológicos. A fim de reforçar a qualidade da acção educativa, nota-se um esforço na criação de novas entidades com competência nos domínios da investigação e apoio à educação/formação, nomeadamente o Observatório do Emprego e Formação Profissional (1991), a Comissão Permanente de Certificação (1992), o Instituto de Inovação Educacional (1993) e o Centro Nacional de Recursos para a Orientação (1993). Em 1997 são criados os cursos de educação/formação (CEF), constituindo uma oportunidade para poder concluir a escolaridade obrigatória, através de um percurso flexível e ajustado aos interesses dos alunos, podendo, ainda, permitir uma entrada qualificada no mercado de trabalho. Cada curso corresponde a uma etapa de educação/formação, cujo acesso este relacionado com o nível de habilitação escolar e profissional já alcançado. No final da etapa, o aluno obtém uma certificação escolar e uma qualificação profissional. Seja qual for a tipologia do CEF, tem que integrar obrigatoriamente as quatro componentes de formação: sociocultural; científica; tecnológica e prática.

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Século XXI – Entrada da moeda única - Euro Em 2001, várias estatísticas e estudos apontavam para fazer de Portugal um país do terceiro mundo, ao invés de pertencer à União Europeia, já que era precisamente nesse momento que se cumpriam todas as condições económicas e financeiras para entrar na zona euro, era incrivelmente má a diferença entre os indicadores macroeconómicos e os indicadores socioeducativos e culturais (Teodoro, 2001). Mais de dois terços da população activa portuguesa apenas tinha frequentado seis anos ou menos de escolaridade e apenas 20% (entre os 25 e os 64 anos) possuía uma educação de nível secundário – 10,7% da população adulta ainda se mantinha analfabeta. Dá-se uma nova reorganização curricular do ensino básico e cria-se o Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC). No seguimento das grandes linhas de reforma do ensino secundário enunciadas no programa do XV Governo Constitucional, estabelece-se pelo, pelo decreto-lei n.º 74/2004, de 26 de Março, a reforma do ensino secundário, em que se estabelecem os princípios orientadores da organização e gestão do currículo e da avaliação das aprendizagens. A política da educação do XV Governo Constitucional está determinada a obter resultados, efectivos e sustentados, na formação e qualificação dos jovens portugueses, para os desafios contemporâneos e para as exigências do desenvolvimento social e pessoal. No ano seguinte, em 2005 é criada a Escola a tempo inteiro, após dados divulgados pelo PISA. O objectivo da escola a tempo inteiro é a criação de um “espaço para as actividades de apoio aos alunos com dificuldades e também a realização de um conjunto de actividades extracurriculares (…) muito importantes para o desenvolvimento médio dos alunos (…)” (DAR, 6/5/2005, citado por Afonso, 2009: 60) no 1º ciclo e o inglês é introduzido no 1º ciclo do ensino básico. Em 2006 assiste-se à criação das Novas oportunidades. Após entrar no Centro de Novas Oportunidades, o candidato é acolhido é-lhe feito um diagnóstico (em que se analisa o seu perfil através de uma entrevista individual ou colectiva) e, após o diagnóstico, faz-se o encaminhamento para modalidades de educação/formação de adultos (EFA) ou para RVCC

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Ainda, em 2006, é criado o Plano Nacional de Leitura (resolução do Conselho de Ministros n.º 86/2006), resultante de uma decisão política tomada com base no PISA, e são definidas as orientações relativas às actividades de enriquecimento curricular No ano de 2007, a resolução do Conselho de Ministros n.º 137/2007 aprova o Plano Tecnológico da Educação. Em 2008 Portugal tinha 2,2 milhões de portuguesas matriculados em instituições de ensino, mas apenas 500 mil alunos no primeiro ciclo do ensino básico, 260 mil no segundo ciclo do ensino básico e 425 mil no terceiro ciclo do ensino básico. Neste ano, a taxa de crescimento natural é praticamente nula. O decreto-lei n.º 212/2009 estabelece o regime de contratação de técnicos que asseguram o desenvolvimento das actividades de enriquecimento curricular (AEC) no 1º ciclo do ensino básico nos agrupamentos de escolas da rede pública. Em 2010, “O Programa do XVIII Governo Constitucional na área da Educação define como objectivos prioritários a concretização de uma educação pré-escolar, básica e secundária de qualidade para todos e a valorização da escola pública como instrumento para a igualdade de oportunidades. Portugal poderá vencer com mais confiança os desafios do futuro e ocupar um lugar mais favorável na competição internacional se reforçar o rigor e a exigência na promoção e na consolidação das aprendizagens, as quais deverão naturalmente ser expressas em melhores resultados escolares.” (http://www.minedu.pt/index.php?s=white&pid=5#i) “Dados divulgados pelo Eurostat revelam que Portugal continua a ter a maior taxa de abandono escolar da União Europeia, apesar de ser o País que teve uma descida mais acentuada, Portugal continua a ser o país da União Europeia com a maior taxa de abandono escolar, apesar dos valores terem vindo a descer desde 1999. No ano passado, a taxa de abandono escolar precoce foi de 31,2%, representando uma descida de 4,2% em

relação

a

2008.”(http://noticias.universia.pt/publicacoes/noticia/2010/07/15/389368/31-dosportugueses-no-acabaram-escolaridade-obrigatoria.html)

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Programa Educação 2015 Foi lançado no ano lectivo 2010/2011 e tem como objectivo elevar as competências básicas dos alunos e aprofundar o envolvimento das escolas na concretização dos compromissos em matéria de política educativa.

Resumindo “O nascimento histórico dos modernos sistemas escolares ocorre no processo de transição das sociedades de Antigo Regime para as modernas sociedades industriais.” (Canário, 2005:63) A escola moderna vem tirar a educação da alçada da Igreja, pela criação de um sistema nacional de escolas. No campo das políticas da educação, a revolução de Abril de 74 veio possibilitar um novo olhar sobre as questões da educação, permitindo o acesso a diferentes níveis de escolarização da população portuguesa. Esta escolarização foi amplificada no início da década de 70, abrindo portas nos planos da participação na gestão escolar e na reformulação das estruturas e conteúdos do ensino. Durante este período, em que se atravessava uma crise revolucionária e de lutas políticas, a escola tornou-se no palco privilegiado de legitimação da nova situação democrática, que aposta em mostrar uma mudança radical face às anteriores políticas do Estado Novo. Nos finais das décadas de 70 e 80, e já na primeira metade da década de 90, a educação colocou-se no plano da ideologia da modernização, tendo dominado o processo de integração europeia. Aos poucos vai-se traçando um discurso baseado no entendimento comum e orientador dos estados membros, que estabelece um conceito de educação intimamente ligado à economia e ao mercado de trabalho. Entre 1992 e 1995, ainda durante o Governo do Primeiro-ministro Cavaco Silva, é reforçado o discurso político que salienta a estreita relação da educação com a competitividade económica, entendida como um caminho obrigatório para a modernização do país. A Ministra da Educação, Manuela Ferreira Leite refere que todos se devem empenhar para que as politicas educativas se centrem na eficácia do sistema e que este se deve adequar às necessidades do mercado.

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Os Governos socialistas que sucedem a este período tentam “apagar” os modos de governação anteriores, cortando principalmente no tipo de discurso. Abandona-se a reforma top down do Governo anterior e tenta-se criar uma unanimidade nacional como o campo privilegiado na educação. As políticas educativas estão sujeitas a regulação transnacional, nacional e a microrregulação local, o que levou a que, durante anos e anos, e atravessando vários séculos, a educação em Portugal tem sido alvo de avanços e recuos, que a conduziram àquilo que se nos apresenta hoje. Hoje em dia a escola assumiu o papel, não só de educadora, mas de formadora de indivíduos criativos, participantes, autónomos e com sentido crítico. São actores de um teatro que se pretende democrático e justo. Hoje, a escola deixou de ser apenas um espaço físico, um número obrigatório de anos de escolaridade ou uma simples definição de objectivos de educação. Hoje pode-se olhar para a escola numa perspectiva organizacional. A escola passou a ter características muito próprias, onde a educação caminha, lado a lado com a formação e aprendizagem A escola é um teatro constituído por diversos tipos de actores: alunos, pais e encarregados de educação, professores e formadores, representantes do poder autárquico, representantes do poder económico e social, funcionários e auxiliares. Estes actores partilham um argumento comum e, em conjunto, estreiam uma peça com uma dinâmica muito própria e com características específicas. Alguns autores consideram a escola como uma empresa que tem por finalidade produzir com eficiência e eficácia bens úteis reclamados pela sociedade, neste caso, alunos instruídos, socializados, capazes de intervir em diferentes sistemas. Desde que apareceu, a verdade é que a escola tem tido um importante papel na educação e formação pessoal das populações, independentemente do sistema político em vigor. No entanto, não se pode descartar a influência que o poder político exerce sobre as politicas de educação em Portugal. De acordo com Rui Canário, “os alunos “sofrem” na escola e esse sofrimento está relacionado com a natureza do trabalho que realizam e com a dificuldade ou impossibilidade de construir um sentido positivo para esse trabalho”. A meu ver, é necessário que, desde tenra idade, se consiga incutir nas crianças a necessidade de

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frequentarem a escola e de o fazerem com bons resultados. Muitas crianças vão para a escola, não de livre vontade, mas por uma imposição das políticas educativas. Ao não perceberem o seu papel na escola, desmotivam, desinteressam-se e tornam a missão do professor quase impossível. Como diria Derek Bok (presidente da universidade de Harvard entre 1971 1 1991), “If you think education is expensive, try ignorance.” É um facto que a ignorância um dia sairá muito mais cara que a educação, mas pensarão os nossos jovens nisto? A opção pela educação está no íntimo das decisões familiares e individuais. O que convém é que as famílias tenham a capacidade de transmitir às suas crianças a importância da sua educação e formação, enquanto indivíduos capazes de exercer o seu direito cívico, numa sociedade em constante mutação e cada vez mais exigente. A educação e a procura por mais e melhores qualificações são aspectos fundamentais para que os indivíduos persigam uma carreira de sucesso e com adequadas remunerações. No entanto, não basta que se tenha conseguido atingir um patamar de currículos estabilizados e de um percurso educativo/formativo longo. É imprescindível que se criem as condições necessárias à avaliação da qualidade do sistema de ensino em Portugal. Não se podem ignorar os números que nos dão conta das taxas de insucesso, de abandono escolar e de iliteracia. É neste sentido que se valoriza o Programme for International Student Assement (PISA), uma vez que foi ele a grande alavanca para se avançar com o sistema de avaliação de professores, em Portugal, bem como com o Plano Nacional de Leitura. Este Programa ajuda-nos, ainda, a tomar consciência da distância que ainda nos separa dos restantes países da Europa.

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Barroso, J. (2006) O Estado e a Educação: a regulação transnacional, a regulação nacional e a regulação local Existem três níveis de regulação diferentes mas complementares: a regulação transnacional; a regulação nacional; a regulação local. Regulação transnacional é um conjunto de normas, discursos e instrumentos, no domínio da educação, e que são adoptados pelos decisores, na área, para proporem decisões ao nível do sistema educativo. A regulação transnacional pode ter origem nos países centrais, fazendo parte de um sistema de dependências em que se encontram os países periféricos ou semi-periféricos, ou também pode resultar da existência de estruturas supra-nacionais (ex. União Europeia), que controlam e coordenam a execução das políticas nesse domínio. Esta regulação processa-se através da observação de outras realidades educativas e utilização das mesmas para legitimação de vários argumentos políticos. As outras realidades educativas são vistas como “lições que vêm de fora”. Esta “importação” de lições, por vezes pode ser retórica e destinada a legitimar, recorrendo a exemplos do estrangeiro, soluções internas. Pode, igualmente, traduzir uma convergência real com finalidades políticas mais alargadas, ou pode, ainda, substituir os poderes públicos por entidades privadas. Regulação nacional é o modo como as autoridades públicas exercem a coordenação, o controlo e a influência sobre o sistema educativo, orientando os diferentes actores sociais e os seus resultados. Em Portugal, o sistema público de educação teve origem no poder e na autoridade existente entre o Estado e os professores, não tendo contado com o envolvimento de pais, de alunos e da comunidade em geral. Esta forma de regulação combina “burocracia” e “profissionalismo”. A história da escola foi marcada por uma tensão permanente entre uma “racionalidade administrativa” (regulação estatal, burocrática e administrativa, em que a escola é vista como um serviço do Estado) e uma “racionalidade pedagógica” (corporativa, de tipo profissional, em que a escola é vista como uma organização profissional). Esta conflitualidade acabou por se transformar numa política de compromisso que se traduziu na coexistência entre a zona de influência dos administradores e dos professores. O colapso deste regime burocrático-

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profissional veio a transformar-se numa das principais causas da crise do Estado de Providência que originou a reforma do serviço público de educação. A introdução, através da regulação transnacional, de discursos e práticas descentralizadoras é mediatizada pela influência do contexto nacional e tem como principal efeito o hibridismo enquanto sobreposição de diferentes lógicas, discursos e práticas na definição de acções políticas. Este hibridismo nota-se quer nas relações entre países, quer na utilização (dentro do mesmo país) de modos de regulação procedentes de modelos distintos. No entanto, este hibridismo traz consequências: por um lado, pondo em causa a utilização da taxonomia com que se procuram descrever, comparar e classificar as políticas e modos de regulação entre diversos países; por outro lado, faz com que a caracterização dos processos de regulação não se possa fazer a partir de normas isoladas. Microrregulação local é um conjunto de estratégias, negociações e acções de vários actores locais, pelo qual as normas e constrangimentos da regulação nacional são (re) ajustadas localmente. Pode ser vista como um processo de coordenação da acção dos actores no terreno e que resulta do conforto, interacção, negociação ou compromisso de diferentes interesses e estratégias. Os pólos de influência da microrregulação local podem situar-se em serviços da administração, desconcentrados ou descentralizados, com intervenção directa nas organizações educativas e em grupos de interesses. A existência de múltiplos espaços de microrregulação local produz um efeito “mosaico” dentro do sistema educativo, que contribui para acentuar a sua diversidade e a sua desigualdade. Metarregulação: a regulação do sistema educativo resulta de um sistema de coordenações com diversos níveis, finalidades, processos e actores, interagindo entre si. Carácter redutor da dicotomia Estado – Mercado: Não se pode reduzir a análise da regulação em educação a uma simples passagem entre a regulação pelo Estado e a regulação pelo mercado. Não é possível combater as falhas de um recorrendo ao outro. “Governance” e “Metagovernance”: a “governance” distingue-se quer da “mão invisível” de um mercado não coordenado, quer do “punho de ferro” que caracteriza a coordenação estatal, conduzida de modo imperativo de cima para baixo. Para que este

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processo de regulação seja possível é necessário que existam “meta-estruturas de coordenação inter-organizacional que assegurem a metagovernance, ou seja, a governance da governance”. Um Estado regulador… das regulações: embora no quadro do sistema público de ensino o Estado constitua uma fonte essencial de regulação, ele não é a única, nem a mais decisiva nos resultados finais obtidos. A regulação do sistema educativo não é um processo único, autónomo e previsível, mas sim um processo que resulta mais da regulação das regulações, do que do controlo directo da aplicação de uma regra sobre a acção dos “regulados”. Para assegurar este “sistema de regulações” o Estado deve assumir a função essencial de “regulador das regulações”, ou seja, de uma “metarregulação” que permite equilibrar a acção das diversas forças e continuar a garantir a orientação global e a transformação do sistema. As escolas deixam de ser lugares de aplicação de um projecto educativo único, construído a partir do centro, e passam a ser lugares de construção de projectos educativos relativamente autónomos, tornando-se necessário passar de uma “regulação pelas normas” para uma “regulação pelos resultados”.

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Canário, R. (2005) A escola como construção histórica Crise ou mutação? No final dos anos 60 existia uma crise mundial da educação, que se entendia como uma crise da escola. Esta crise referia-se a uma escola que tinha nascido no início dos anos 60. Tratava-se de um problema estrutural, comum a todos os países industrializados, que surge associado ao facto de a escola aparecer “simbolicamente desarmada perante a massificação (…) sem outra ideologia legitimadora que não seja o prometido destino profissional dos alunos “ (Villaverde Cabral, 2001: 62). Esta contestação crítica à escola foi fundamentada: num movimento social de contestação à escola, a nível mundial, representado pelos acontecimentos de Paris em Maio de 1968; na emergência do movimento de educação permanente que suscitou a procura e construção de soluções educativas em oposição ao modelo escolar; nos livros A pedagogia do oprimido, de Paulo Freire e Uma sociedade se escola, de Ivan Illich; na crítica cerrada à escola por parte da corrente sociológica de Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron. Alguns dos paradoxos que marcaram a expansão da escolarização: o triunfo da escolarização, no final do milénio, ser contado como uma história de “progresso” e de “vitórias”; a “erosão” a que foi submetida a educação escolar era contemporânea da supremacia do modelo escolar que contaminou todas as modalidades educativas; a crescente escolarização das sociedades foi coincidente com o agravamento de problemas de natureza social; a missão de promoção da cidadania atribuída à escola contrasta com um retrocesso na participação política nas sociedades mais ricas e escolarizadas; a “corrida à escola” não mostra sinais de abrandamento. A crescente insatisfação com a escola traduz-se numa intensificação da procura e na opção por percursos escolares mais longos. A escola sofreu mutações que criaram as contradições estruturais e os paradoxos em que hoje se move. Escola: os níveis de debate. A escola é uma forma que representa uma nova maneira de conceber a aprendizagem, baseada na revelação, na cumulatividade e na exterioridade, possui autonomia própria e pode existir independentemente da organização e da instituição escolar. Equivalendo à dimensão da pedagogia, a forma escolar é a que mais tem polarizado uma tradição de crítica à escola, centrada nos

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métodos. A escola é uma organização que viabilizou a emergência dos sistemas escolares modernos. A dimensão organizacional da escola constitui aquela que menos debate e polémica permite. Este tipo de organização sofreu um processo de naturalização que lhe confere um carácter invencível e que o faz aparecer como natural. A escola é uma instituição que desempenha um papel privilegiado na integração social. A escola desempenha um papel fundamental de unificação cultural, linguística e política, afirmando-se como um instrumento fundamental da construção dos modernos estadosnação. Uma outra forma de analisar a escola e compreender as suas mutações corresponde a adoptar uma perspectiva diacrónica que permite identificar três períodos distintos: o período da “escola das certezas” (Estado educador); o período da “escola das promessas” (Estado desenvolvimentista); e, a era de uma “escola de incertezas” (erosão do Estado-providência). A escola num “tempo de certezas”: o nascimento histórico dos modernos sistemas escolares ocorre no processo de transição das sociedades de Antigo Regime para as modernas sociedades industriais, fundadas no capitalismo liberal e num sistema de estados-nação, representando a escola uma invenção recente que corresponde a uma “revolução nos modos de socialização”. A “escola das certezas” aparece associada à produção de uma nova ordem política, uma nova ordem social e uma nova ordem económica. Uma nova ordem política: a escola moderna subtraiu à Igreja a tutela sobre o ensino, a partir da criação de um sistema nacional de escolas. No processo de emergência do Estado-nação, a escola desempenha um papel fundamental na construção de uma coesão e solidariedade nacionais, funcionando como o principal suporte de um sistema político baseado na representação. O professor beneficia de uma “autoridade carismática”. Presta-se-lhe obediência. A disciplina escolar deve ser encarada menos como um conjunto de regras impostas pela força e mais como um processo de interiorização pessoal, em que cada um as descobre e assimila de forma indutiva. Uma nova ordem social: a escola participa na construção de um novo tipo de laço social, construído em torno da relação salarial, contribuindo para acelerar o declínio do rural tradicional e a transferência da população para as zonas urbanas industriais.

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Representa a transformação das sociedades tradicionais em sociedades modernas, baseadas na produção industrial, o que leva à transformação e/ou criação de grupos sociais. Uma nova ordem económica: a escola participa na construção de uma sociedade industrial, tendo como referência o capitalismo. A educação representa uma necessidade assenta na disciplina dos trabalhadores. É chamada a desempenhar um papel importante na produção de uma força de trabalho disciplinada e capaz de se integrar em modalidades de crescente racionalidade da organização de trabalho, baseada na hierarquia, na segmentação das tarefas e na dissociação entre o trabalhador e o produto do seu trabalho. Uma coerência dupla: a escola goza de uma forte legitimidade social, uma vez que é socialmente percebida como justa, apesar de funcionar num registo claramente elitista. A escola favorece a mobilidade social ascendente de alguns que se destacam pelo seu mérito. A supremacia da forma escolar: a forma escolar introduz e generaliza uma forma de aprender em ruptura com os processos que tinham sido dominantes e que privilegiavam a continuidade da experiência individual e social. O modo escolar propõe processos de aprendizagem baseados na exterioridade relativamente aos sujeitos. A aprendizagem é pensada com base na desvalorização da experiência dos alunos e na desvalorização de atitudes de pesquisa e descoberta. Na escola, as crianças deixam de fazer perguntas e passam a dar as respostas que lhes são ensinadas. O trabalho escolar: entre o prazer e o enfado: os alunos tendem a ser encarados, pelos professores, como o principal problema da escola. A aprendizagem corresponde a um trabalho realizado por quem aprende e os professores, cuja missão é ensinar, confronta-se com a impossibilidade de ensinar a quem não quer aprender. O facto de os alunos se manifestarem refractários ao cumprimento dos seus deveres escolares, esteve, desde o período salazarista, no centro das preocupações políticas do regime. O que está em causa na organização do trabalho escolar é alterar o “critério de obrigação pelo de necessidade, o constrangimento pela espontaneidade, a incompatibilidade pelo entendimento, o enfado pelo prazer”

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Onde está o problema? A escola define-se como um lugar destinado a dar e receber instrução, em que a acção exercida sobre os alunos é realizada à força e não por livre vontade. Assim, o trabalho do professor pode ser visto como uma espécie de “missão impossível”. Os alunos “sofrem” na escola e esse sofrimento está relacionado com a natureza do trabalho que realizam e com a dificuldade de construir um sentido positivo para esse trabalho. Se o problema dos professores e o problema dos alunos é o mesmo, então devem desenvolver uma relação de cooperação e não de confronto. Os professores só podem resolver o seu problema se se modificar a forma e o conteúdo do trabalho escolar que a escola tradicionalmente atribui aos alunos: receber e repetir informações. Popper afirmava que os professores amargos e infelizes tornam os alunos amargos e infelizes também. A escola num “tempo de promessas”: o período posterior à II Guerra Mundial é marcado pelo crescimento exponencial da oferta educativa escolar, como efeito combinado do aumento da oferta e da procura. O fenómeno da “explosão escolar” assinala um processo de democratização de acesso à escola que marca e passagem de uma escola elitista para uma escola de massas e a sua entrada no “tempo das promessas”. Escola e desenvolvimento: a economia mundial, no período compreendido entre a II Guerra Mundial e a década de 70, cresceu de forma exponencial, traduzindo-se numa era de prosperidade. A conflitualidade social é amortecida pelo papel regulador do Estado-providência, que assegura mecanismos de redistribuição da riqueza produzida sob a forma de um acesso generalizado a bens e serviços sociais. A “explosão escolar” que marcou este período corresponde ao reconhecimento do crescimento dos sistemas educativos como factor económico de primeira importância. A construção de uma escola de massas é realizada à imagem dos mesmos princípios reguladores presentes na produção económica. Da euforia à decepção: no início dos anos 70, o primeiro choque petrolífero marca o fim de um ciclo marcado pelas “ilusões do progresso” e pela tentativa de construção das “sociedades de abundância”, mas também vem a coincidir com a verificação da falência das promessas da escola. A escola torna-se menos elitista e é encarada como um aparelho ideológico do Estado que, através da violência simbólica, assegura a reprodução de desigualdades sociais.

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A escola num “tempo de incertezas”: o desencanto com a escola aumentou a partir da década de 70, em consequência das mudanças que afectaram os sectores económicos, político e social. Estas mudanças afectaram a juventude, quer na sua relação com a escola, quer na relação com o mercado de trabalho, passando-se para uma relação onde predominavam as incertezas. A escola tem futuro? A construção da escola do futuro deverá orientar-se por três finalidades fundamentais: a de construir uma escola onde se aprenda pelo trabalho e não para o trabalho; a de fazer da escola um local onde se desenvolva e estimule o gosto pelo acto intelectual de aprender; a de transformar a escola num local onde se viva a democracia e onde se aprende a ser intolerante com as injustiças. A transformação da escola actual implica agir em três planos distintos: pensar a escola a partir do não escolar; desalienar o trabalho escolar e pensar a escola a partir de um projecto de sociedade.

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Charlot, B. (2007) Educação e Globalização: uma tentativa de colocar ordem no debate No decorrer da história, o que se opunha à educação foi chamado de Diabo; nas décadas de 60 e 70, foi identificado como Reprodução; hoje em dia é simbolizado pela Globalização. Para se entender as relações entre Educação e Globalização, é preciso distinguir quatro fenómenos: O facto de a educação ser pensada numa lógica económica, facto este que aconteceu nas décadas de 60 e 70. A maior mudança da escola ocorre nas décadas de 60 e 70. Consiste em pensar a escola numa lógica económica e social do desenvolvimento. A ambição é construir uma escola fundamental, escola de nove anos que começa aos seis e vai até aos quinze. Prolonga-se a escolaridade obrigatória, abre-se o primeiro segmento do que era o ensino secundário e acontece a massificação da escola; As novas lógicas socioeconómicas, que se impuseram na década de 80. O Estado regulador dá lugar ao Estado desenvolvimentista. Esta mudança incide sobre a escola, seja ela pública ou privada. As novas lógicas requerem trabalhadores e consumidores mais formados e qualificados, quer para produzirem mercadorias ou serviços, quer para utilizá-los. Não se trata apenas de desenvolver competências técnicas novas, mas também de aumentar o nível de formação básica da população. A escola encara um novo desafio. Apesar de ainda não ter resolvido os problemas relativos à generalização do ensino fundamental, ela deve acolher jovens de classe popular no que era a parte mais elitista do sistema escolar: do ensino médio ao superior; A globalização neoliberal, integração entre as economias, entre as sociedades de vários países. O neoliberalismo progride na área da educação. Proliferam as empresas de management das escolas públicas. Empresas privadas são contratadas pelo Estado para gerirem escolas públicas. Desenvolvem-se redes de escolas particulares. Prosperam os cursos de línguas estrangeiras. As multinacionais entram nas escolas. A globalização é um processo socioeconómico, que também traz consequências culturais, através do encontro entre culturas e do aparecimento e proliferação de novas formas de expressão; O movimento para a solidarização da espécie humana. Acabar com a fome no mundo, proteger a saúde de todos, alfabetizar e educar todos os seres humanos, salvar

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o nosso planeta dos perigos que vêm crescendo. O movimento altermundialista considera a educação como “um direito humano prioritário e inalienável para toda a vida”. Só uma escola pública de qualidade pode garantir o acesso de todos à educação. A escola deve ser transformada num lugar de sentido, de prazer de aprender, de construção da igualdade social. A escola deve tanto valorizar a dignidade de cada ser humano e a solidariedade entre os homens, como respeitar o que pode ser chamado de homo diversidade, em referência à expressão “biodiversidade”; A escola deve resolver os problemas oriundos da democratização escolar. Cabe destacar o da nova relação com o saber: há cada vez mais alunos que vão à escola para “passar de ano”, sem encontrar nela sentido nem prazer. A educação tende a ser considerada uma mercadoria entre outras, num mercado livre onde prevalece a lei da oferta e da procura. A escola tem que enfrentar novos desafios culturais e educativos, decorrentes dos encontros entre culturas, da divulgação mundial de informações e imagens da ampla difusão de produtos culturais em língua inglesa.

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Afonso, N. & Costa, E. (2009) A influência do Programme for International Student Assessment (PISA) na decisão política em Portugal: o caso das políticas educativas do XVII Governo Constitucional Português O Estado vê-se acometido por novas formas de governação e de regulação e o conhecimento emerge como um instrumento de fazer política e de regular os actores sociais. É um Estado regulador, que se inclui numa rede mais ampla de relações políticas, transpostas para além das fronteiras nacionais. Trata-se de uma nova governança negociada (Rothes, 1996; Salamon, 2002), modo de governo não hierárquico, onde intervêm actores não estatais que participam na formulação e implementação de políticas públicas. O PISA e o processo de decisão política em Portugal Em Portugal, o momento de viragem, na mobilização do Programa para a elaboração de políticas educativas dá-se em 2005, com a entrada em funções do XVII Governo Constitucional. Com o XVII Governo Constitucional Português, a tomada de decisão, no campo das políticas educativas, surge orientada para a posse de evidências e assente em resultados. O decisor político é levado a desenvolver novas formas de conhecimento e a procurar novos modelos de legitimação, com repercussões na utilização crescente de instrumentos de medição e de avaliação comparada, concebidos na tentativa de redução da complexidade da realidade e de suporte à tomada de decisão. A comparação entre países transforma-se num elemento categórico do processo de melhoria da prestação pública de contas, tendo em vista avaliar a eficiência dos sistemas de educação e definir novos esboços para as políticas educativas nacionais Esta dimensão simbólica da OCDE, contribuindo para que o conhecimento “PISA” se afirme pela sua credibilidade, possibilita aos governantes legitimarem políticas mais controversas. O PISA parece concorrer para a configuração de uma decisão política mais centrada em resultados e em números. É este o momento para avaliar a qualidade das escolas e da educação dada aos jovens.

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O PISA promovendo a construção de sentido em educação O aluno português apresenta 22% de “desempenho abaixo do nível 1 (nível que caracteriza os maus leitores) no PISA de 2003 (…) em comparação com o valor da EU, que se situou nos 19,8%”, o que compromete o sucesso académico e profissional do aluno português, colocando em causa os objectivos referenciais designados pela EU para valores de 15,5% até 2010. O Plano Nacional de Leitura foi apresentado como uma “resposta institucional à preocupação pelos níveis de literacia dos jovens, significativamente inferiores à média europeia.” A legitimidade técnica do PISA permite criar uma estrutura informal, adicional de autoridade e de soberania para além do Estado de meios de comunicação, socialização, institucionalização e integração. O Programa não só promove a construção de referenciais internacionais, como faz circular, internacionalmente, concorrendo para a regulação dos sistemas educativos através do conhecimento que detém sobre indicadores. Legitimar a decisão política pelo ângulo do PISA significa participar na construção de sentido e na difusão de normas e valores específicos, tendo em vista fomentar uma determinada visão da educação. Legitimação do conhecimento e medidas políticas pré-existentes Os dados do PISA reforçam a capacidade de argumentação dos governos e apoiam a tomada de decisões, consolidando o conhecimento evidenciado por ferramentas nacionais de avaliação como os exames e as provas de aferição. Segundo o PISA, Portugal é um dos países em que as elevadas taxas de retenção mais influem nos maus resultados obtidos: os alunos portugueses que se encontram no ano de escolaridade certo obtêm bons resultados, em muitos casos, superiores à média da OCDE. Legitimando a acção governativa: entre a qualidade e a equidade O conjunto de políticas consolidadas pelo governo, e legitimadas com o recurso ao Programa, incluem dois vectores privilegiados pela OCDE/PISA: por um lado o combate à ineficácia e ineficiência dos sistemas educativos; por outro lado, uma resposta às questões da desigualdade e de segregação dos alunos.

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Em Portugal, no domínio da eficácia e qualidade dos sistemas, são duas as medidas levadas a cabo pelo Governo Sócrates com base no PISA: o plano de acção para a matemática e o programa de formação em ensino experimental de ciências. No segundo domínio da igualdade, incluem-se medidas políticas no âmbito da acção social escolar, dos territórios educativos de intervenção prioritária, na revalorização dos edifícios escolares, do plano tecnológico e do conceito de escola a tempo inteiro. Para o PISA, mais importante do que a origem social e económica dos alunos, parece ser a sua condição sociocultural, isto é, mesmo com dificuldades económicas, se uma criança tem acesso a recursos escolares e formativos, consegue melhores resultados. Assim, outra medida reflectida é a iniciativa “e-escolinha”. Um outro exemplo é a escola a tempo inteiro, que é um espaço para as actividades de apoio aos alunos com dificuldades e também um conjunto de actividades extracurriculares muito importantes para o desempenho médio dos alunos.

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Correia, J. (1999) As ideologias educativas em Portugal nos últimos 25 anos Da ideologia democratizante à definição política da educação Os discursos educativos de legitimação da Reforma de Veiga Simão associavam educação e democracia para defenderem uma democratização do acesso à escola que legitimasse e naturalizasse uma ideologia educativa, mas também assegurasse uma modernização do sistema educativo português seguindo os padrões dos países da Europa Ocidental. O binómio educação/democracia legitimou o crescimento acelerado dos sistemas educativos ocidentais após o fim da II Guerra Mundial. A união entre a democracia e a educação legitimou o princípio da igualdade de oportunidades como único critério de definição de uma justiça educativa suportada numa intervenção do Estado. Em Portugal, no contexto revolucionário de Abril de 74, a definição da problemática educativa conduziu a uma politização da educação. No tecido educativo português, a contribuição da educação para a democracia é inseparável da construção da educação democrática. Os discursos democratizantes envolveram-se num processo político onde se procurava compatibilizar duas ordens de legitimidade democrática referenciáveis a lógicas distintas de pensar a governabilidade da educação. Por um lado importava assegurar a governabilidade do Sistema Educativo, por outro, insinuava-se um princípio de governabilidade mais contextualizado. O projecto educativo não se limita a definir um conjunto de finalidades e de estratégias mais ou menos consistentes, mas visa instituir um espaço comunicacional tendencialmente democrático onde. Tanto as finalidades como as estratégias estão submetidas às regras de um acordo intersubjectivo. Permeáveis à complexidade, os discursos educativos são discursos construídos na gestão de tensões contraditórias e na compatibilização de desafios formalmente incompatíveis. Eles desenvolveram-se na expansão de um processo de escolarização vocacionado para a crítica do modelo escolar e para a afirmação das potencialidades educativas da descolarização. Eles sustentam o desenvolvimento de uma justiça educativa construída e torno da igualdade de oportunidades; afirmam-se, opondo-se à

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manipulação ideológica dos saberes universais e propõem o estreitamento das relações entre educação e trabalho. Da ideologia democrática à definição jurídica da educação A ideologia democrática no campo educativo afirmou-se em torno de uma cultura cívica onde as subjectividades se devem subordinar à codificação jurídica das colectividades que as integram. A ideologia democrática é a ideologia da estabilidade democrática, a ideologia da subordinação do particular ao geral, da subordinação das individualidades às entidades jurídicas que as integram e que lhes conferem uma personalidade social. A preocupação em assegurar a ordem educativa constitui uma manifestação desta subordinação das comunidades ao Estado. A ideologia democrática é a ideologia dos imperativos da universalidade cognitiva que impõem a negação do subjectivo, do pessoal, em benefício do transpessoal e do objectivo. É a ideologia dos imperativos de uma universalidade ética que subordina os interesses individualizados e contextualizados aos interesses das comunidades ao interesse desinteressado do Estado democrático. A ideologia da modernização e a definição económica da educação A década de 80 saldou-se por uma progressiva desreferencialização do campo e dos discursos educativos relativamente à problemática da contribuição da educação para a construção da democracia. Ao nível da estrutura curricular assistiu-se a um aprofundamento da escolarização da ciência e da tecnologia, e também a uma transformação dos pressupostos que legitimam essa escolarização. Nas décadas de 80 e de 90, assiste-se a um aumento da importância da ciência e da tecnologia nos currículos escolares, uma vez que estas áreas são janelas de oportunidade de emprego e para a retoma do crescimento económico. A diferenciação pedagógica e administrativa tendeu a ser assegurada através de uma reorganização do campo educativo, onde o mundo empresarial desempenha um papel importante. A construção de projectos educativos de escola, o reforço do papel da escola na definição dos planos de estudo, o reforço das relações da escola com os pais,

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constituem sistemas estratégicos de incitação à criação de condições que garantam a visibilidade social e a diferenciação dos estabelecimentos escolares para que os pais possam exercitar o direito à livre escolha das condições de cumprimento da escolaridade dos filhos. A ideologia da inclusão e a definição organizacional da educação A definição pedagógica da questão social da educação e a possibilidade de se pensar o combate à desigualdade social perante a escola em torno da criação de condições favoráveis ao desenvolvimento dos indivíduos instituíram-se como os instrumentos cognitivos privilegiados na definição da questão educativa. Tanto a educação como a intervenção do Estado na sua gestão e definição são objecto de um questionamento político promovido por discursos críticos. O abandono progressivo desta semântica, a subordinação da definição política da educação à sua definição organizacional e a substituição da problemática da universalidade pela problemática da utilidade, parecem constituir as marcas mais características da actual semântica educativa que se insinua como uma nova gramática totalizante, susceptível tanto de definir os problemas educativos como de configurar as soluções.

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Bibliografia Afonso, Natércio & Costa, Estela (2009). A influência do Programme for International Student Assessment (PISA) na decisão política em Portugal: o caso das políticas educativas do XVII Governo Constitucional Português. Sísifo. Revista de Ciências da Educação, 10, pp. 53-64. Retirado de http://sisifo.fpce.ul.pt/pdfs/Revista%2010%20PT%20D4.pdf. Barroso, João (org) (2006) A regulação das políticas públicas de educação. Lisboa: Educa. Brás, José Viegas; Gonçalves, Maria Neves. (2009). Revista Lusófona de Educação, 13, pp. 101121. Retirado de http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/rle/n13/13a07.pdf. Canário, Rui (2005). O que é a Escola? Um “olhar sociológico”. Porto: Porto Editora. Charlot, Bernard (2007). Educação e Globalização: uma tentativa de colocar ordem no debate. Texto da conferência proferida na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, a 14 de Junho de 2007. Sísifo. Revista de Ciências da Educação, 04, pp. 129-136. Retirado de http://sisifo.fpce.ul.pt/pdfs/04-14-Conf2.pdf. Correia, José Alberto (1999). As ideologias educativas em Portugal nos últimos 25 anos. Revista Portuguesa de Educação, 12, pp. 81-110. Universidade do Minho. Cortesão, Luiza. (1988). Escola, sociedade que relação? Biblioteca das Ciências do Homem. Porto: Edições Afrontamento. GEPE: Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação. (2009). 50 Anos de estatísticas da educação. Volume 1.Lisboa: Instituto Nacional de Estatística. Lima, Licínio; Afonso, Almerindo (2002). Reformas da educação pública. Democratização, modernização, neoliberalismo. Porto: Edições Afrontamento. Nogueira, António Inácio. (1996). Para uma Educação Permanente à Roda da Vida, Lisboa: Instituto de Inovação Educacional. Pires, Eurico Lemos et al. (1989). O ensino básico em Portugal. Porto: Edições Asa. Teodoro, António (org.).(2001). Educar, Promover, Emancipar. Porto: Edições Afrontamento. Teodoro, António. (2001). A construção política da educação: Estado, mudança social e políticas educativas no Portugal contemporâneo. Porto: Edições Afrontamento.

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