A Educação Patrimonial como Estratégia de Arqueologia Pública na Área do Parque Nacional Serra da Capivara

July 12, 2017 | Autor: Jaime Oliveira | Categoria: Arqueologia Publica, Educação Patrimonial
Share Embed


Descrição do Produto

1

UNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO CURSO DE GRADUAÇÃO EM ARQUEOLOGIA E PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL

Jaime de Santana Oliveira

A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL COMO ESTRATÉGIA DE ARQUEOLOGIA PÚBLICA NA ÁREA DO PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA

SÃO RAIMUNDO NONATO-PI 2014

2

JAIME DE SANTANA OLIVEIRA

A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL COMO ESTRATÉGIA DE ARQUEOLOGIA PÚBLICA NA ÁREA DO PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Arqueologia e Preservação Patrimonial pela Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF Orientadora: Dra. Gisele Daltrini Felice

São Raimundo Nonato-PI 2014

3

Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada à fonte.

São Raimundo Nonato – PI, 27 de Fevereiro de 2014.

[email protected]

Oliveira, Jaime de Santana

O48e

A educação patrimonial como estratégia de arqueologia pública na área do parque nacional serra da capivara / Jaime de Santana Oliveira. – São Raimundo Nonato, 2014. 95 f. : il. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial) – Universidade Federal do Vale do São Francisco, Campus Serra da Capivara, São Raimundo Nonato -PI, 2014. Orientadora: Dra. Gisele Daltrini Felice. 1. Arqueologia. 2. Patrimônio. 3. Educação Patrimonial. 4. Arqueologia Pública. 5. Parque Nacional Serra da Capivara. I. Título. II. Universidade Federal do Vale do São Francisco. CDD 930.1098122

Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema Integrado de Biblioteca. SIBI/UNIVASF

4

5

AGRADECIMENTOS A Deus em primeiro lugar por ter me guiado por caminhos percorridos e possibilitado a realização de meus sonhos. Em especial ao meu pai Aurélio Batista de Oliveira que foi uma pessoa presente demonstrando confiança nos meus estudos e pelo seu amor a mim destinado durante toda a vida, e a minha mãe Joana Francisca de Santana Oliveira (in memória) por ter me concedido a vida, maior presente que ela poderia dar. Agradeço a Professora Dra. Gisele Daltrini Felice, que foi uma educadora que transmitiu coragem, sabedoria, sempre muito elegante em suas falas contribuiu de forma significativa para o desenvolvimento da pesquisa com suas orientações e seu apoio durante o curso. Aos meus irmãos que muito contribuíram para os primeiros passos dessa caminhada e que vêm constantemente fornecendo apoio, o meu obrigado a vocês Joedson, Valmir, Eliana, Silene, Edilene, Vânia, Auricelio, Auristela, Aurea. A professa Selma Passos Cardoso pela amizade e confiança depositada ao longo do curso e pela aprendizagem do Grupo de Estudo. Aos demais professores que contribuíram para a construção do conhecimento ao longo dos últimos quatros anos, Jaime, Guilherme, Mauro, Leandro, Rodrigo, Nívia Paula, Waldemir Neto, Fatima, Daniela Cisneiro, Vivian, Pávula e Rafael. À Glaubia Santos pelo apoio, amizade e pela gentileza de ter que ouvir pacientemente eu falar sobre a pesquisa. A Lucas Manuel pela amizade e apoio técnico na pesquisa o meu obrigado, grande amigo que encontrei em São Raimundo Nonato. Agradeço de coração aos entrevistados que foram peça fundamental na construção do texto, produção da pesquisa, quero agradecer pela gentileza, dizer que foi uma grande aprendizagem poder dialogar com vocês. Aos funcionários da FUMDHAM e UNIVASF pela a paciência na busca dos arquivos, muito obrigado pelo apoio durante a graduação. Agradeço ao Vinícius, Sandro, Paulinho, João, Maninho e Neto (Fabricio). Obrigado as meninas da Biblioteca Rochele e Eliane pelo apoio concedido. Agradeço também a Andreia Macedo que foi muito atenciosa e pelo auxilio na (FUMDHAM).

6

Os amigos parceiros de batalhas e muitas vitórias conquistadas: Glauber Mota, Marcos Lima, José de Anchieta, José Walter, Marcos Paulo, Fred Paes Landim, Eunicio Nunes e Danilo Santana. Aos nobres companheiros de turma: Tamara Graziela, Jane Ribeiro e Geórgea Layla, Lucas, Leonel, Silvio Bruno, Marcelo, Diógenes, Clebinho, Iderlan, Fernanda, Cleiton, Felipe e Rafael. Agradeço aos amigos da UESPI, Luciano, Mauricio, Ariel, Waldeir, Joseimar, Silvano, Renan, Rafael (Rafinha). Aos meus Professores que tive na UESPI que foram além de tudo amigos, obrigado Ms. Deborah Gonçalves e Ms. Gabriel F. Oliveira. Ao Professor Coordenador do Programa de Educação e Tutoria (PET) Dr. Celito Kestering pelo apoio, aprendizagem e companheirismo e a todos os demais alunos e professores que fazem parte do grupo. Aos demais amigos e colegas que são muitos e nessa correria do trabalho não foram citados, mas que sabem que são especiais.

7

[...] Hoje me sinto mais forte Mais feliz, quem sabe Só levo a certeza De que muito pouco sei Ou nada sei [...]

Almir Sater

8

RESUMO O Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) considerado, em 1991, Patrimônio da Humanidade, pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura – UNESCO traz consigo uma variedade de sítios arqueológicos de grande importância para o país, esta concentração de sítios pré-históricos, em sua maioria com ocorrência de registros rupestres. Nesse contexto a Educação Patrimonial é vital para preservar a cultura material das sociedades do presente e do passado e incluir as diferentes comunidades da região do Parque, como pessoas descendentes e conscientes da importância e protetoras deste patrimônio. Portanto a presente pesquisa tem como objetivo investigar as práticas de Educação Patrimonial relacionadas ao Parque Nacional Serra da Capivara, com ênfase em Arqueologia Pública. O estudo estará divido em três partes: a primeira levantará a discursão sobre o conceito de patrimônio ao longo da história, partindo da lógica do mundo ocidental. Está parte contemplará mais dois tópicos, o do reconhecimento do conceito de patrimônio arqueológico e o histórico da arqueologia no Brasil e no Piauí. A segunda parte da pesquisa procederá uma análise sobre a Arqueologia Púbica no Brasil, sua estrutura e seu discurso. Na terceira parte se encaminhará um estudo de caso em Arqueologia Pública no Parque Nacional Serra da Capivara, entendendo que neste contexto a Arqueologia Pública irá se manifestar a partir da visitação realizada nos sítios arqueológicos do parque, nos projetos sociais desenvolvidos pela Fundação Museus do Homem Americano aos quais podem ser citados: os Núcleos de Apoio as Comunidades (NACs), Pró-Arte FUMDHAM, e a criação do Museu do Homem Americano, e em outras ações que partiram do desenvolvimento das pesquisas arqueológicas na região como a: graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial.

Palavras-Chaves: Arqueologia, Patrimônio, Arqueologia Pública, Educação Patrimonial, Parque Nacional Serra da Capivara.

9

ABSTRACT

The Serra Capivara National Park (PNSC) considered in 1991 Patrimony of Humanity by the United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) brings a variety of archaeological sites of great importance for the country, this concentration of pre - Historic sites, mostly occurring in rock art. In this context the Heritage Education is vital to preserve the substantive company's past and present culture and include the different communities of the Park area, as descendants and people aware of the importance of this heritage and protective. Therefore the present study aims to investigate the practices of heritage education related to the Serra Capivara National Park (PNSC) with an emphasis in Public Archaeology. The study is divided into three parts: the first raises the discussion of the concept of heritage throughout history, starting with the logic of the Western world. Is part two topics will include the recognition of the concept of archaeological heritage and history of archeology in Brazil and Piauí. The second part of the survey shall be an analysis of the Pubic Archaeology in Brazil, its structure and its discourse. The third section will submit a case study in Public Archeology in the Serra Capivara National Park (PNSC) understanding that in this context the Public Archaeology will manifest from the visitation held at archaeological sites in the park, in social projects developed by the Foundation American Man Museums which can be cited: the Core Support Communities (NACs), Pró-Arte FUMDHAM and the creation of the Museum of American Man, and other actions that started from the development of archaeological research in the region such as: degree in Archaeology and Heritage Preservation.

Key Words: Archaeology, Heritage, Public Archaeology, Heritage Education, National Park Serra da Capivara.

10

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

AP

ARQUEOLOGIA PÚBLICA

EP

EDUCAÇÃO PATRIMONIAL

FUMDHAM

FUNDAÇÃO MUSEU DO HOMEM AMERICANO

IBDF

INSTITUTO FLORESTAL

IBAMA

INSTITUTO BRASILEIRO DE MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS RENOVÁVEIS

ICMbio

INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

INTERPI

INSTITUTO TERRA DO PIAUÍ

IPHAN

INSTITUTO DE PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO ARTÍSTICO

NACs

NÚCLEOS DE APOIO A COMUNIDADE

PARNA

PARQUE NACIONAL

SPHAN

SERVIÇO DE PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO ARTÍSTICO

UNESCO

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA.

UNIVASF

UNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO

BRASILEIRO

DE

DESENVOLVIMENTO

11

LISTA DE FIGURA Figura 01: Parque Serra das Confusões Corredor Ecológico e Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC)...............................................................................................................

15

Figura 02: Entrevista com Dra. Niède de Guidon.............................................................

54

Figura 03: Entrevista com Senhor Nilson Alves Parentes.................................................

56

Figura 04: Pesquisas Arqueológicas desenvolvidas pela Missão-Franco Brasileira.........

59

Figura 05: Imagem da ave Zabelê...................................................................................... 63 Figura 06: Imagem de camponeses do Povoado Antigo Zabelê........................................ 65 Figura 07: Casa de pedra pertencente ao pai do Senhor Nilson Alves Parentes Antigo Povoado do Zabelê............................................................................................................. 66 Figura 08: Povoado Sítio do Mocó Localizado Município Coronel José Dias.................

70

Figura 09: Povoado Sítio do Mocó a 4 km da (BR 020)...................................................

71

Figura 10: Entrevista com Zilda Pereira de Sousa e Rafael Rodrigues de Sousa.............. 72 Figura 11: Capacitação de pessoas da comunidade para o trabalho de apicultura ao entorno do PNSC............................................................................................................... 73 Figura 12: Escola atualmente fechada no Povoado Sítio do Mocó onde funcionava os (NACs).............................................................................................................................. 75 Figura 14: Sede do Pró- Arte FUMDHAM em São Raimundo Nonato (PI)....................

77

Figura 13: Rosa Maria Educadora do Pró-FUMDHAM...................................................

78

Figura 15: Crianças em atividade educativa pelo Pró-Arte FUMDHAM no (PNSC)....... 79 Figura 16: Sítio Boqueirão da Pedra Furada (BPF)...........................................................

81

Figura 17: Centro de Pesquisas Interdisciplinares sede própria em São Raimundo Nonato................................................................................................................................ 82 Figura 18: Sala de exposição do Centro de Pesquisas Interdisciplinares sede própria em São Raimundo Nonato (PI)................................................................................................ 83 Figura 19: Sala com exposição digital das pesquisas desenvolvidas no (PNSC)..............

84

12

SUMÁRIO

1

INTRODUÇÃO....................................................................................................

13

1.1

Problema, hipótese e objetivo................................................................................

14

2

ARQUEOLOGIA, CIÊNCIA E SOCIEDADE.................................................. 18

2.1

Uma reflexão sobre a noção da arqueologia........................................................... 18

2.2

O histórico da arqueologia.......................................................................................

20

2.3

Arqueologia e duas perspectivas o arqueólogo e o público leigo........................

25

3

O PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO..............................................................

30

3.1

A noção de patrimônio....................................................................................

30

3.2

A arqueologia como discurso formal no Brasil......................................................

35

3.3

O histórico da educação patrimonial no Brasil....................................................... 41

4

PROCEDIMENTOS TEÓRICOS – METODOLÓGICOS.............................

4.1

História, memória e identidade............................................................................... 46

46

5 AS PESQUISAS ARQUEOLÓGICAS NO CONTEXTO DO PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA DESENCADEANDO POSSÍVEIS 52 ESTRATÉGIAS DE ARQUEOLOGIA PÚBLICA ............................................... 5.1. A criação o Parque Nacional Serra da Capivara e suas relação com as comunidades.................................................................................................................... 52 5.1.1

A comunidade Zabelê............................................................................................ 63

5.1.2

A comunidade Sítio do Moco...............................................................................

69

5.2

Projetos sociais, educativos de apoio as comunidades......................................

74

5.2.1 Núcleos de apoio a comunidade 74 (NACs)............................................................... 5.2.2 O Pró - Arte FUMDHAM.................................................................................... 77 5.2.3 O Museu do Homem Americano...........................................................................

80

5.2.4 A criação da Graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial ..............

85

6

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 88

7

REFERENCIA........................................................................................................ 91

13

1

INTRODUÇÃO Esta pesquisa teve início em meados do curso de graduação em Arqueologia e

Preservação Patrimonial e no começo o seu foco central era somente Educação Patrimonial. Com o desenvolvimento da mesma verificamos que pode-se discutir Educação Patrimonial dentro de um eixo maior que é o viés da Arqueologia Pública (AP). Seguimos esta linha por acreditar que não basta somente estudar o passado, mas é preciso refletir suas implicações no presente. Portanto, estamos de acordo com o pensamento de que “a incompreensão do presente nasce fatalmente da ignorância do passado, mas talvez não seja útil esforçarmos por compreender o passado, se nada sabemos do presente” Bloch (s/d), foi partindo desta reflexão que começamos a estudar o histórico das pesquisas arqueológicas no mundo e no Brasil. As pesquisas arqueológicas no país têm passado por um momento de muitas conquistas, pois contamos ultimamente com a ampliação do número de congressos, além do aumento dos cursos de graduação e pós-graduação, junto com a consolidação do debate voltado para o patrimônio arqueológico temos também a diversificação das temáticas que tornam fundamentais para olhar diferentes contextos, assim como refletir a prática da arqueologia. Na região Sudeste do Estado do Piauí conta-se com aproximadamente quarenta anos de pesquisa, e percebe-se que muito se avançou desde o início dos estudos arqueológicos, durante este tempo foram criadas Unidades de Conservação, implantados projetos sociais e sócios educativos para atender as comunidades do entorno. Portanto, propõe-se verificar uma possível prática da Arqueologia Pública (AP) no contexto da área do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) e as estratégias de Educação Patrimonial (EP). O levantamento de tal temática é de fundamental importância, pois possibilita uma reflexão no campo de gestão de patrimônio em arqueologia e seu engajamento com a proposta de Arqueologia Pública e Educação Patrimonial. Logo, esta pesquisa arqueológica torna-se uma ferramenta de avaliação das atividades praticadas, de forma que possibilita analisar acertos e erros e a partir dai cria condições para traçar novas estratégias para práticas futuras. Lembrando que este estudo é motivado também pelo fato de que durante o levantamento bibliográfico realizado na construção do projeto constatou-se uma carência de pesquisas que discutissem a Arqueologia Pública (AP), até mesmo por essa discussão ser bem recente no país. Portanto, este estudo torna-se pioneiro em propor esta temática, principalmente no do âmbito curso de Graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial

14

da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF) não tinha sido produzido nenhum trabalho monográfico sobre Arqueologia Pública (AP). Outro ponto importante é que um trabalho de pesquisa, nesse momento, permite trabalhar com fontes documentais como, por exemplo, relatórios, imagens e confrontar estes dados com relatos orais levantados juntos aos sujeitos envolvidos nesse processo de Educação Patrimonial (EP) e Arqueologia Pública (AP), que vivenciaram desde o início das pesquisas arqueológicas na região. Sendo fundamental este registro da medida que consideramos a efemeridade das fontes orais que vão se perdendo ao longo do tempo.

1.1

Problema, hipótese e objetivo

Este estudo foi desenvolvido a partir do quadro atual de conhecimento acerca das pesquisas arqueológicas, na área Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) localizado no Estado do Piauí, no nordeste do Brasil. Está delimitado pelas coordenadas 8°26’46” e 8°54’28” de latitude sul e 42°19’11” e 42°45’43” de longitude oeste. A superfície do Parque é de 130.000 hectares, e 129 quilômetros de perímetro e com uma concentração de sítios arqueológicos. Registra-se até o momento uma quantidade de 1348 sítios arqueológicos catalogados na região, destes 946 sítios possuem a ocorrência de registro rupestre1. A cronologia para ocupação humana pré-histórica na região vai desde enterramentos em urnas com idade de 280 anos, até fogueiras e pedras lascadas datadas em mais de 50 mil anos (FELICE, 2000) esta cronologia demonstra uma importância além da concentração de sítios, mas de diversidade de vestígios e de continuidade de ocupação. De acordo com Guidon (2007) o parque foi criado em 1979, a pedido de uma equipe de cooperação cientifica Franco-brasileira que realizava pesquisas na área desde o início dos anos 70 e que em 1978, solicitou ao governo federal a criação de uma área de proteção do tipo (Unidade de Conservação) (Figura: 01) sendo a categoria recomendada a parque para que fosse um patrimônio que houvesse turismo, possibilitando uma alternativa econômica para região do semiárido do Sudeste do Piauí. Além de visar a conservação e preservação dos sítios de arte rupestre e do meio ambiente, já que se tinha a preocupação com posseiros, a caça ilegal e o desmatamento. De inicio podemos nos dar conta do desafio de se construir uma Arqueologia Pública capaz de assegurar a preservação patrimônio ambiental e cultural.

1

Informação setor de documentação do (Acervo da FUMDHAM, 2014).

15

Figura 01: Parque Serra das Confusões Corredor Ecológico e Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC).

Fonte: (SEMAR, 2008 apud Sousa, 2009).

Compondo este cenário nasce a Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM) em 1986, uma organização civil, declarada de interesse público com sede em São Raimundo Nonato que em parceira com Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) e Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional (IPHAN) propõe gerir as políticas públicas de preservação deste patrimônio (GUIDON & BUCO, 2010). Com a efetivação desta unidade de conservação de tempo integral de acordo com Guídon (2007) surge também a necessidade de implementação de um sistema intensivo de preservação patrimonial. A qual a autora seleciona algumas políticas públicas voltadas para o desenvolvimento autossustentável, econômico e social das comunidades nas proximidades do Parque Nacional Serra da Capivara. Logo, as pesquisas arqueológicas na região contribuíram para que se tenha nos dias atuais um centro de cultura com reservas técnicas, biblioteca especializada, laboratórios e museu com exposição permanente do acervo arqueológico. Além da criação do curso de Arqueologia e Preservação Patrimonial pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF) em parceria com a Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM).

16

Diante desta realidade, desde a criação do (PNSC) tem-se mantido um constante esforço para sua preservação, manejo e integração com as comunidades de entorno. Projetos sociais foram criados, o museu e o centro de pesquisa foram construídos além de cinco escolas que hoje estão desativadas. O que nos leva a questionar quais aos meios eficazes para preservação deste patrimônio, quais os agentes responsáveis e como devem estar articulados os atores do processo educação/preservação patrimonial. Por sua vez a educação patrimonial estaria inserida intrinsicamente na efetivação prática da arqueologia pública? Visto o contexto das pesquisas arqueológicas na região levantamos o problema: as práticas desenvolvidas pela Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM), instituição responsável pela co-gestão do patrimônio arqueológico da região do PNSC, ao longo dos últimos trinta anos tem caracterizado estratégias de Arqueologia Pública. Este problema é abordado partindo da concepção que pesquisa e preservação patrimonial caminham lado a lado, sendo etapas necessárias do processo de construção da memória social. Dentro desta perspectiva a hipótese deste trabalho parte da premissa que a existência de projetos específicos sociais, educacionais e de preservação, integrado ao PNSC, ao museu, ao centro de pesquisa e ao IPHAN tem se configurado como instrumentos de educação/preservação patrimonial e estratégias de Arqueologia Pública, em São Raimundo Nonato, mesmo anterior a consolidação desta temática no país. De modo a responder o problema levantado e realizar a verificação de nossa hipótese proposta em destaque, esta pesquisa propôs como objetivo geral: Investigar as práticas de educação patrimonial relacionadas ao Parque Nacional Serra da Capivara e a ênfase da consolidação da Arqueologia Pública, buscando identificar as relações existentes entre instituições e comunidade. Como objetivos específicos foi proposto: a) Discutir o conceito de arqueologia pública b) Elaborar o contexto histórico da Educacão/Preservação Patrimonial do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) c) Realizar um diagnóstico preliminar sobre a arqueologia pública na região do (PNSC). Com base no contexto exposto acima a pesquisa está organizada de forma que: Na primeira parte é discutido o conceito de arqueologia, o histórico da pesquisa arqueológica e suas diferentes correntes teóricas (Histórico-Culturalismo, Processualismo e Pós-Processualismo), além do mais é feita a analise da relação entre o arqueólogo e o público leigo.

17

Na segunda parte procurou-se discutir o noção de patrimônio no mundo e no Brasil, além de apresentar algumas políticas preservacionistas voltadas para contexto brasileiro e dentro deste eixo também inseriu-se a discussão sobre Educação Patrimonial. Na terceira parte do trabalho foram detalhados os fundamentos teóricosmetodológicos, onde são discutidos os caminhos percorridos, como foram trabalhado as fontes e a abrangência do conceito de história oral com uma metodologia comum a vários campos das ciências humanas. Na quarta etapa da pesquisa trabalhou-se o objeto de estudo, onde discutiu-se: a criação do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), o histórico do desenvolvimento das pesquisas arqueológicas na região, a relação entre as pesquisas e a comunidade bem como projetos sócio educativos realizados na região, junto a estes a criação do Museu do Homem Americano e do curso de Arqueologia e Preservação Patrimonial da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF).

18

2

ARQUEOLOGIA, CIÊNCIA E SOCIEDADE

2.1

Uma reflexão sobre a noção de arqueologia

Nesta parte do estudo iniciamos com algumas reflexões que consideramos pertinentes para o entendimento da pesquisa, partindo deste ponto questionamos: o que é arqueologia? Como foi pensada a disciplina ao longo tempo? Qual o papel do arqueólogo na construção de uma arqueologia pública? Com proposito de chegar às respostas para estes pontos que fundamentam o estudo de arqueologia pública é discutido, o histórico da arqueologia, a construção de uma arqueologia pública como parte do papel do arqueólogo, relacionando com a problemática que envolve nossa pesquisa, que se concentra em saber como a Arqueologia Pública (AP) e a Educação Patrimonial (EP) têm sido estratégias constantes de integração entre as pesquisas arqueológicas, o Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) e a Comunidade. Nos últimos anos observamos um crescente desenvolvimento da arqueologia no cenário brasileiro. Tal observação se justifica pelo aumento do número de cursos de graduação que ultrapassa dez nos últimos anos, incrementando não somente a formação de novos profissionais como também o aumento das pesquisas principalmente no campo da arqueologia preventiva, que é uma prática da arqueologia que acontece quando existe a necessidade de resgatar um determinado patrimônio arqueológico que se encontra ameaçado por detrimento da construção de uma obra de grande porte, pela atividade de agricultura, crescimento urbano ou até mesmos por ações naturais. Visto que a arqueologia vem obtendo um aumento nas pesquisas no cenário nacional, as abordagens arqueológicas também diversificaram nos últimos anos, ampliando para além dos estudos de grupos pré-históricos, compreendendo os estudos de comunidades indígenas, quilombolas, campesinato, sítios de refugiados da ditadura, entre outros. No entanto nos questionamos como tem sido realizada essa arqueologia? E qual é o papel do arqueólogo nessa sociedade que está em constante contato com um público leigo, onde a visão que é passada é muitas vezes atrelada a um roteiro de cinema que apresenta uma imagem distorcida da noção de patrimônio, associando a arqueologia como uma procura de tesouros, descoberta de cidades perdidas ou dos grandes fatos presentes na historiografia. Como disserta (LIMA & FRANCISCO, 2006 p. 50):

19

É importante saber, de início, que a idéia que se tem sobre a Arqueologia, no senso comum, caminha entre um desconhecimento quase absoluto da disciplina (do que trata a Arqueologia? Nunca ouvi falar!...) e uma visão idealizada do arqueólogo (Indiana Jones, Tomb Raider etc.), bem como do objeto arqueológico (algo como uma relíquia, valioso materialmente e por suas características históricas). Tratar de Arqueologia fora de alguns centros especializados geralmente parte de uma situação de amplo desconhecimento do público leigo, entretanto, há um certo interesse [...].

As pesquisas arqueológicas que buscam a consolidação de um campo de estudo, neste momento, têm o desafio de avançar para além de legitimar os grandes fatos presentes na historiografia nacional, as mesmas devem objetivar trazer para este cenário o modo de vida de grupos marginalizados no processo históricos, sendo, este patrimônio originário de diferentes grupos étnicos, indígenas, afro-brasileiros e europeus. Compreendendo a cultura material, pertencente a estes distintos grupos como sendo um patrimônio público, de forma que tornase importante sua preservação para gerações do presente, assim com para gerações futuras. Dentre as várias repostas que poderíamos dar para as indagações feitas sobre o que é arqueologia pode-se entender que a Arqueologia quer dizer estudos das coisas antigas, os arqueólogos estudam os modos de vida de grupos humanos a partir dos objetos produzidos e marcas deixadas nas paisagens (ALMEIDA & CAROMANO, 2012). Através do constate estudo pode-se constatar que nem sempre a arqueologia foi vista sob essa perspectiva, ou seja, a arqueologia nasce em um aspecto, a partir dos colecionadores antiquários e se modifica ao longo do tempo, tornando uma disciplina capaz de estudar o modo de vida de grupos humanos do passado através da cultura material. Compreende-se nesta pesquisa que cultura material constitui-se como toda materialidade produzida ou modificada pelo homem. Sendo importante ressaltar que é fundamental que esta materialidade esteja presente em contexto arqueológico, ou seja, que quando o objeto tenha sido colocado fora de circulação de um grupo social, algo que pode acontecer por diversas maneiras, em caso de serem deixados por descarte ou um repentino abandono em situação de perigo, entre outras (L. M. CASCON, 2012). A partir de então esses objetos passam por uma série de acontecimentos, onde quando forem encontrados não sejam retirados do local de origem sem que sejam coletadas as informações pertinentes as seu contexto, caso contrário pode-se inviabilizar a pesquisa arqueológica. Nos dias atuais a arqueologia abrange uma diversidade de estudos constituindo um campo interdisciplinar, sendo possível empreender um estudo de uma materialidade mais remota, como um conjunto de ferramentas líticas, ou trabalhar com uma cultura material de

20

tempos mais recentes a exemplo de lixos urbanos produzidos por determinados grupos. Portanto, a cultura material torna-se um elemento que possibilita um estudo arqueológico, de forma que a noção de arqueologia nos dias atuais esta pautada no estudo da cultura material, que denuncia a forma de vida de grupos humanos do passado, como se organizavam, a maneira que foram construídas suas habitações, seus hábitos alimentares e etc.

2.2

O histórico da arqueologia

Não distanciando do plano da discussão do tópico anterior, mas procurando abranger o dialogo para o ponto a qual estamos hoje, do que é a arqueologia, destacamos que sua concepção se modificou ao longo do tempo passando por diversas fases a qual nos propomos a discutir brevemente em seguida. Este estudo não é pioneiro em tentar elaborar um roteiro para identificar os diversos momentos vivenciados pela arqueologia, até mesmo pelo fato que esta não é nossa discussão central, mas sim, este é um ponto de partida fundamental para nos ajudar a pensar a arqueologia como disciplina, que em suma pressupõe um retorno ao público. Contudo ao fazer um retrospecto e olhar o processo histórico de construção do pensar arqueológico vamos ter os trabalhos de Glyn Daniel publicados pela primeira vez em 1950 com o titulo A Hundred Years of Archaeology que sofrerá modificações com complementações em suas edições posteriores. Além deste destacamos o trabalho de Gordon Willey e Jeremy Sabloff que publicam A History of American Archaeology (1980), e mais recentemente os estudos desenvolvidos por Bruce G. Trigger com título Archaeology Thougt (1989) que nos traz uma visão mais completa da história da arqueologia e da evolução do pensamento arqueológico (BICHO, 2006). Ao fazer uma leitura de obras que são exemplares neste assunto destacamos a pesquisa de Bruce G. Trigger, por ser mais atual e conter estudos os quais compartilhamos das interpretações, sendo assim Trigger (2004) ao organizar seu trabalho propõe uma divisão da arqueologia em seis fases: Antiquarismo, desenvolvimento da arqueologia científica, arqueologia histórico-cultural, funcionalismo e arqueologia ocidental, nova arqueologia, e explicação da diversidade. Mesmo acreditando ser este um roteiro conhecido ao mundo dos arqueólogos, optouse por fazer uma breve apresentação sobre como foi pensada a arqueologia ao longo tempo e

21

trazer esta abordagem para a pesquisa, pois a nossa proposta de debate se contrapõe a uma pesquisa arqueológica que atenda somente ao campo daqueles que são conhecedores da arqueologia, logo, esta revisão do pensar arqueológico é importante para que essa pesquisa tenha uma linguagem acessível ao professor do ensino básico, ao guia de turismo, ao líder sindical entre outras pessoas. Quando se tenta explicar como surgiu a arqueologia ou sobre que concepção a mesma nasceu, observamos que o pensar arqueológico está relacionado com a própria concepção de mundo, porém para fins deste estudo tomamos como referência a concepção de mundo para o ocidente. A arqueologia no ocidente surge num momento bem diferente do que nos deparamos hoje, isso se explica pelo fato que no inicio do século XIX, pensava-se para idade da terra uma idade bem curta com relação a idade que temos nos dias atuais. Segundo designação do arcebispo Ursher a terra teria 4004 anos, esta era uma concepção das ciências bastante difundida e aceita no meio social na época (BICHO, 2006). No entanto do meio para o fim do século XIX, ocorrerá a desmistificação deste paradigma, concluído que a terra é mais antiga do que vem afirmando a Bíblia, em razão de tal acontecimento vai-se expandir o campo da arqueologia pré-histórica, fato que ocorre com as novas perspectivas evolucionistas e com a publicação do trabalho de Charles Darwin, A Origem da Espécies por Meio da Seleção Natural em 1859. Neste contexto a arqueologia passa primeiro por uma fase de descoberta da existência dos materiais arqueológicos e consequentemente fascínios dos colecionadores pelos mesmos. Este fato dá-se pelo desejo do homem de conhecer e admirar o passado e tentar buscar explicações que muitas vezes serão encontradas nas narrativas dos mitos. Com este constante interesse de conhecer o passado e as sociedades antecedentes os colecionadores e admiradores de relíquias antigas avançam para exploração de estudos com grandes civilizações que deixaram registros arqueológicos mais notórios como, por exemplo, os Astecas no México, as pirâmides do Egito, Pompéia na Itália entre outros. Frente ao desafio de explorar estes momentos que trazem marcas de populações antigas, vamos ter o aumento de ações de colecionadores que costumeiramente terão o habito de coletar relíquias antigas desses povos. Posteriormente no período do Renascimento século XIV ao XVII, momento que vamos ter maior valorização da cultura clássica romana estes colecionadores, cheios de curiosidade, começaram a colecionar essas relíquias antigas em gabinetes de curiosidade, onde os artefatos antigos serão depositados desordenadamente juntos a objetos exóticos, naturais, sendo de classes diversificadas (RENFREW & BAHN, 1998; BICHO, 2006).

22

Esta fase da arqueologia chamada por Bahn e Renfrew (1998) de fase especulativa e denominada por Trigger (2004) de Antiquarismo passará por um período de transição, dos antiquários (colecionadores) no século XVIII para os empreendedores de escavações em alguns sítios no início do século XIX: Fue entonce, em el siglo XVII, cuando los investigadores más emprendedores iniciaron la excavació de algunos de yacimento mas destacados. Pompeya, em Italia, com sus impresionates hallazgos romanos, fue uno de los primeros, auques la excavación propriamente dicha no comenzó haste el siglos XIX (RENFREW, 1998 p. 21)2.

É importante considerar que este momento da arqueologia antiquarista ou especulativa não será um momento de estagnação. Para Trigger (2004) estes antiquários do período do século XVI a XVII, tinham aprendido a descrever e classificar monumentos e artefatos, escavar e registrar achados, usar métodos de datação. Portanto a arqueologia traz consigo mudanças significativas no século XIX principalmente pela implementação de um estudo sistemático. Nesta segunda fase que Bahn e Renfrew (1998) classificam como o surgimento da Arqueologia Moderna ocorrem mudanças, pois neste momento estes pesquisadores vão levantar questões referentes a profundidade temporal da história humana. Logo, a criação de uma cronologia controlada que não seja apoiada nos registros escritos, vai ser importante, pois possibilitará aos arqueólogos buscarem explicações que não fossem tomadas como referência os registros bíblicos. Para este novo avanço Renfrew e Bahn (1998) destacam que a arqueologia moderna obteve sua consolidação a partir do século XIX, em três pontos principais, primeiro o reconhecimento da antiguidade do homem, que se tornou fundamental para disciplina, o segundo concepção de evolução fundamentada na obra de Charles Darwin, A Origem das Espécies, que melhor explicou a origem e desenvolvimentos das plantas e animais, e o terceiro ponto foi o estabelecimento do sistema das três idade. A arqueologia voltará suas atenções para aspectos presentes nas diferentes culturas, a qual três campos teóricos nortearam seus estudos e interpretações dos dados. Serão três momentos ou três fases que marcaram a arqueologia do final do século XIX para segunda metade do século XX, sendo estas as fases: Histórico Cultural, Nova Arqueologia e Arqueologia Contextual. 2

Tradução: (Foi então, no século XVII, quando os pesquisadores começaram as escavações em alguns dos sítios mais destacados. Pompeia, na Itália em, seu com impressionantes achados Romanos, foi um dos primeiros, mas as escavações propriamente ditas começaram nos séculos XIX).

23

Na fase histórico-cultural acentua-se o estudo de questões referentes à origem e modificação das culturas, a diversidade cultural será observada como resultado da difusão. Nesta vertente de interpretação vamos ter aspectos importantes no desenvolvimento da metodologia de campo, com gradativo avanço em problemas relativos à escavação e datações de vestígios. Este será um momento de profissionalização da arqueologia pré-histórica, contando com grandes nomes na arqueologia como Pitt-Rivers (1827-1900), William Mathew F. Petrie (1853-1942), Mortimer Wheeler (1890-1976) (cf. RENFREW & BAHN, 1998; BICHO, 2006). Sustentados na ideia de “empréstimo cultural” princípio da difusão, de acordo com Schiavetto (2003) no início do século XX, os seguidores da corrente histórica tiveram mais aceitação partindo da perspectiva que a cultura era produzida a partir de três princípios básicos, invenção, difusão e migração. O enfoque histórico cultural floresceu na arqueologia em um contexto europeu, com o trabalho de Gustav Kossinna, filosofo e pré-historiador alemão, com ampla descrição e classificação empirista em seu método, a Cultura Material será identificada como sendo de antigos alemães, os mesmos eram priorizados em detrimento de outros grupos. Devido o enfoque de Gustav Kossinna estar centrado na materialidade germânica o seu trabalho foi bastante utilizado pelos alemães nazistas cujo objetivo era demonstrar a superioridade da raça ariana sobre as demais raças (SCHIAVETTO, 2003). A segunda fase vamos ter a arqueologia, com influência de estudiosos estadunidenses como Julian Steward (1902) e G. Childe que iram se aproximar de um enfoque mais ecológico para explicar os processos culturais, atrelado ao avanço das técnicas de pesquisa e acompanhado pela busca de bases interpretativas a arqueologia vive a fase denominada da Nova Arqueologia. Nesta perspectiva as inovações não serão mais explicadas apenas com base de ideias de difusão de culturas, a inovação decore da adaptação da sociedade às modificações ambientais, mediante as dinâmicas internas dessas sociedades e pela interação com outras a sociedades. Partindo deste pressuposto a Nova Arqueologia, para nosso entendimento tem como seu ponto de partida a recusa dos conceitos de cultura, difusão e migração, adotando o adaptacionismo como conceito chave para as variações na sociedade (SCHIAVETTO, 2003). Posteriormente em seqüência a esta Nova Arqueologia ou Arqueologia Processual, tem-se a fase chamada de arqueologia pós-processual ou arqueologia contextual. Nesta fase a inovação é explicada em decorrência da dinâmica interna das sociedades, condicionada pelo seu contexto ambiental e antrópico. Tendo como expoente da arqueologia contextual Ian Holdder, que propõe que a arqueologia contextual baseia-se na perspectiva de que na

24

arqueologia devam ser analisados todos os aspectos internos possíveis de uma cultura arqueológica para que se possa conhecer cada uma das partes dos seus elementos (BICHO, 2006). De acordo com Schiavetto (2003), a Arqueologia Contextual está em geral associada ao pós-modernismo e ao pós-estruturalismo, devido a sua semelhança com esses dois movimentos, de forma que um dos primeiros pontos da arqueologia pós-processual é a notada crítica feita aos padrões positivistas da arqueologia processual, sendo importante destacar que o movimento “pós” nasceu da constatação de que o mundo social, seja ele passado ou presente, não corresponde ao criado pelos cientistas. De fato pode-se analisar que ao longo destes anos nós tivemos uma arqueologia, com múltiplas faces e que a mesma ganhou diferentes contornos ao longo dos tempo. No entanto esses diferentes momentos da arqueologia vão lidar com um objeto em comum, que é a constante curiosidade em entender a existência do homem, e mais recentemente compreender como está organizado seu modo de vida. Dentre os vários campos de investigação da arqueologia, chega-se a um ponto que não necessariamente a arqueologia tenha que ser o estudo do “outro”, porém o arqueólogo vai direcionar seu estudo também para seu próprio meio, para a cultura material do tempo presente. Na arqueologia como disciplina assim como na história e na antropologia o arqueólogo sempre vai direcionar um estudo, sofrendo influência de fatores externos da pesquisa, sendo estes os fatores econômicos, sócias, políticos. No entanto já é válido considerarmos que os mesmos sejam considerados fatores internos, pois por mais que busquemos a objetividade os autores respondem aos pressupostos de sua época. De acordo com Oliveira (2005 apud, Funari, 1998,1999/2000; Trigger, 1989, 1990) a arqueologia, assim como qualquer outra ciência não é, e nunca foi e jamais será neutra, pois o arqueólogo enquanto cidadão da polis está inserido em contexto econômico e político social, que marca a vida em sociedade. Logo, a profundidade do grau de reflexão da arqueologia possibilitará a investigação da sua própria prática e a ação do arqueólogo como educador e sujeito transformador no meio social, pois não se faz arqueologia somente por fazer. Neste novo ângulo de visão a arqueologia vai ser denominada de arqueologia pública, ou arqueologia-ação, arqueologia comunitária, ou ainda arqueologia colaborativa (ALMEIDA E CAROMANO, 2012). De acordo com Almeida e Caromano (2012) todas estão preocupadas em compreender as relações entre as pessoas e as coisas do passado, para a partir daí construir um diálogo com diferentes grupos e promover uma gestão compartilhada com patrimônio arqueológico.

25

2.3

Arqueologia e duas perspectivas o arqueólogo e público leigo.

Esta parte da pesquisa propõe-se fazer uma reflexão sobre arqueologia pública que em concordância com Funari, et alli (2008) é entendida como a interação da disciplina com a sociedade. Vem a nos dar suporte teórico nesta discussão Almeida (2001) que compreende que arqueologia pública não se resume somente à divulgação dos dados das pesquisas, uma vez que este é um pressuposto de toda ciência. De fato concordamos com Almeida (2001) que coloca como sendo a arqueologia pública como uma atividade de maior envolvimento dentro do planejamento e um conjunto de práticas tendo objetivo definido, que pode levar ao público o conhecimento da natureza daquele estudo e a importância da preservação do patrimônio arqueológico, logo a divulgação da pesquisa faz parte de um conjunto de ações, estudos e atividades educativas que envolvam o público leigo, sendo afinal construída uma memória social. A arqueologia pública tal como é compreendida, engloba um conjunto de ações e reflexões que objetivam saber a quem interessa o conhecimento produzido pela arqueologia, pensando a forma como a atividade afeta a sociedade, e como estudos arqueológicos estão sendo apresentados ao público, sendo mais do que somente uma linha de pesquisa a arqueologia pública é inerente a profissão (MCMANAMO,1988 apud ALMEIDA, 2001). Com o intuito de tornar clara a importância da arqueologia pública em nosso meio propõe-se que quando se pensar em arqueologia púbica, tome como partida um ponto de reflexão que é bem recorrente na arqueologia “Por que escavar?”. Na arqueologia é freqüente nos depararmos com esse questionamento, pois além de uma escavação ser muito dispendiosa e por requerer recursos econômicos, a escavação como técnica intrusiva acontece somente uma vez. Portanto pode-se ter a escavação como a leitura das páginas de um velho livro que ao terminar de ler terá se perdido, logo, todo o registro é de fundamental importância, pois possibilitará a sociedade do presente e do futuro seu conhecimento. De acordo com esta reflexão podemos concluir que além da importância de se justificar a escavação temos que ser conscientes quanto a importância que aquele estudo tem para a comunidade. Frente a este desafio de questionar, “por que escavar” propõe-se a reflexão sobre “para que escavar?” qual o retorno a comunidade? Como vamos envolver a comunidade em nossa pesquisa? Como vamos fazer para interagir nossas pesquisas arqueológicas e trazer diferentes públicos para conhece – lá? Não isentando a responsabilidade da comunidade em assegurar a preservação da área arqueológica.

26

Considerando que assim como o fato desta problemática da escavação, pela condição de conservação, pelo financeiro, questionamos o conhecimento da comunidade desta escavação, pois os bens provindos dos registros arqueológicos são pertencentes a população. De fato, um estudo arqueológico que não há o reconhecimento do público pode ser classificado como uma luz que se acende e se coloca abaixo de uma caixa, local que sua função será totalmente desconsiderada. Pensar a arqueologia tem que pensar uma construção social em que ocorra um sentimento de pertencimento da comunidade com aquele patrimônio. Logo, esta construção social vem no momento que existe um envolvimento entre o arqueólogo e o público que desconhece o que seja um fóssil, um artefato, uma pintura rupestre. E que neste contato este público que muitas vezes é reconhecido como uma ameaça ao patrimônio se transforme em um agente que colabore para sua preservação, não pela punição prevista em lei, mas pelo sentimento de pertencimento com aquele bem. Para isso Almeida (2001 p. 10) vem mostrando que “nosso compromisso como profissionais passa por mostrar ao público uma Arqueologia que – longe de ser uma atividade de entretenimento – seja um instrumento na construção de sua memória, de sua identidade e de sua cidadania”. Seguindo esta reflexão pensa-se que para uma proposta de pesquisa em arqueologia, seja com técnicas intrusivas ou não, é importante que seja produzido um conhecimento que possa dar retorno a comunidade. Partindo desta perspectiva a arqueologia pública tornar-se-á fundamental para que a comunidade se identifique com seu patrimônio, pois a partir do mesmo pode-se potencializar outros ramos como um turismo sustentável, despertar um sentimento de identidade e valorização da cultura, que contribuirá para a preservação do patrimônio arqueológico. Oliveira (2005) trata do tema de forma que vem a corroborar, com afirmação da necessidade da arqueologia em interação com a sociedade. Conforme o autor, os arqueólogos devem interagir com o público em geral, pois essa é, com efeito, uma forma eficaz de estratégia para socializar velhos e novos conhecimentos e contribuir para preservação do patrimônio arqueológico. Parte dessa estratégia consiste em dar maior visibilidade possível aos resultados das pesquisas, de acordo com Oliveira (2005), a visibilidade que pode vir com a inclusão de pessoas da comunidade na atividade técnica de pesquisa, na execução de palestras e oficinas nas escolas ou outras estratégias pensadas a longo prazo como a criação de museus na comunidade, assegurar as visitas aos sítios de forma que seja possível sua preservação entre outras atividades.

27

Tratando do tema, Bahn e Renfrew (1998, P.504) expõem:

Los arqueólogos tienen el deber, tanto hacia sua colegas como hacia el público em genenal, de explicar qué hace y por que . Esto seginifica, sobre tudo, la publicação y difución de susdescubrimentos, de forma que outros investigadores disongan de los resultados y el público, que por lo geral há pagado el trabajo,auque indirectamente, pueda disfrutarlos comprenderlos [...] ( Negrito - grifo do nossso)3.

Estando em concordância com Oliveira (2005), Renfrew & Bahn (1998), acreditamos que não basta os arqueólogos produzirem novos conhecimentos científicos e apenas os divulgarem em revistas especializadas. Eles precisam fazer esses saberes alcançarem o maior número de pessoas, principalmente aquelas que não frequentam o círculos acadêmicos onde ocorrem os mais variados debates sobre temas de interesse da arqueologia (OLIVEIRA, 2005). Para Oliveira (2005 p.120):

Em meio a essas mudanças, a discussão em torno da Arqueologia Pública, aqui compreendida como uma arqueologia aberta para o público em geral e que aspira, para mais ou para menos, a um certo engajamento social por partes dos arqueólogos, torna-se necessária para uma reflexão continua e permanente sobre o rumo da arqueologia brasileira.

A primeira vez que o termo arqueologia pública aparece na bibliografia especializada foi na publicação da obra Public Archaeology, do arqueólogo americano Charles Mc Gimesey III, em 1972. Neste livro o autor discute a questão referente a destruição de sítios arqueológico devido ao crescimento acelerado, nas décadas de 1960 e 1970, fruto do processo de crescimento urbano e industrialização nos Estados Unidos; esta discussão esteve atrelada ao desenvolvimento da legislação referente ao gerenciamento de recursos culturais (Cultural Resource Management - CRM), livro que também apresenta discussões sobre problemas de vandalismos e atuações de amadores na escavação de sítios arqueológicos além atuação de profissionais (MARRIMAN, 2004; JAMESON, 2004; FERNANDES, 2007 apud, CARNEIRO, 2009).

3

Tradução: (Os arqueólogos tem o dever, tanto para com os seus colegas como para o público em geral, de explicar o que fazem e por quê. Isso significa, sobretudo, a publicação e a divulgação de suas descobertas, de forma que outros pesquisadores disponham dos resultados e o público, que em geral tem pagado o trabalho, ainda que indiretamente, os possam desfrutar e compreender).

28

Entretanto de acordo com MC MANAMON (2000) apud ALMEIDA (200), CARNEIRO (2009), embora pela primeira vez sistematizada em uma publicação proposta por McGimesey (1972) a apresentação da arqueologia para o público não é uma tema novo. No início da segunda década do século XX, nos Estados Unidos, o Antiquities Act – criado para regulamentar o tratamento dos sítios arqueológicos em terras públicas e assegurar o acesso público aos resultados das escavações - apontava a tarefa de tornar a Arqueologia alcançável ao público como dever profissional. Quando é analisada a arqueologia pública para o Brasil observa-se que a partir da década de 80, com fim do regime militar (1964-1985) e início oficial do processo de (re) democratização do país, a Arqueologia demonstra estar passando para outro momento, sendo este marcado por uma visível maturidade e por uma série de transformações epistemológicas. Sendo fruto destas transformações o surgimento de novos arqueólogos pós-graduados durante a última década do século XX (OLIVEIRA, 2005). De acordo com Oliveira (2005) dentre os principais nomes destacam-se o de Pedro Paulo A. Funari (1992), Pedro Ignácio Schumitz (1994), Walter Neves (1998), Cristiane Barreto (1998), Tânia Andrade Lima (2000) e Jorge Eremites de Oliveira (2002). Tais nomes foram responsáveis por uma arqueologia brasileira cada vez mais aberta a crítica reflexiva, uma arqueologia engajada do ponto de vista social e melhor preparada em termos teóricos metodológicos. Além destes nomes mencionados por Oliveira (2005) lembramos renomados autores como Niède Guidon, Gabriela Martin, Anne-Marie Pessis, Carlos Etchevaene, Marcia Bezerra, Scott Allen e Marcos Albuquerque, pesquisadores que muito têm contribuído para um aumento vertiginoso da arqueologia no Nordeste. Neste contexto a pesquisadora Niède Guidon tem uma participação destacada na região Sudeste do Piauí. A revolução tecnológica das últimas duas décadas conduziu uma enorme disseminação de informações arqueológicas de maneira que o Brasil foi muito afetado por este processo. Graças à promulgação de legislações patrimoniais nas instâncias federal, estadual e municipal, pesquisas arqueológicas têm sido realizadas por todo o país. A principal questão ética, porém, está relacionada à inclusão do público na prática arqueológica e em seu discurso (FUNARI E GONZÁLEZ 2008). No entanto para Funari e Gonzáles (2008) no que se refere a prática de Arqueologia Pública (AP) e a busca de usar novos meios tecnológicos o rádio a televisão, para tornar o conhecimento cientifico popular no ramo da arqueologia ainda é incipiente, de forma que novos passos devem ser dados e novas estratégias devem ser pensadas.

29

Outro ponto crítico exposto por Funari (2004) apud Funari & Gonzáles (2008) dá-se por conta das condições de emprego para os arqueólogos dentro do sistema capitalista, onde tem-se uma priorização mais do lucro ao invés de uma proposta cientifica, portanto torna-se, desvantajoso para o profissional priorizar uma carreira cientifica na medida que se tem salários baixos para quem está empregado em instituições públicas como universidades, museus instituições de pesquisa. Já na arqueologia preventiva tem-se um melhor rendimento. Por outro lado, não há uma política oficial de fazer respeitar e que organize a publicação de relatórios arqueológicos e a inclusão de interesses e preocupações das comunidades.

30

3

O PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO

Devemos trabalhar de forma que a memória sirva para libertação e não para a servidão dos homens. Jacque Le Goff

3.1

A noção de patrimônio

Esta parte está estruturada de maneira a discutir a trajetória do conceito de patrimônio como elemento pertencente à história e à memória. Além de debater a construção do discurso sobre o patrimônio arqueológico no Brasil. Em sequência discorre-se sobre a educação patrimonial contextualizada com a cultura local. Quando nos propomos a escrever sobre a noção de patrimônio é importante lembrar que a concepção de patrimônio sofreu modificações ao longo dos anos, incorporando valores e perdendo antigos referenciais. No primeiro momento a noção de patrimônio para os romanos surge como um bem pertencente a um individuo devendo o mesmo ser transmitido por herança, com passar do tempo vai existir a ideia de patrimônio como uma concepção de passado que garantiria a continuidade de uma determinada cultura (COSTA, 2004). Para esse patrimônio que pode ser individual ou coletivo também pode ser designada uma segunda categoria de classificação, patrimônio material e imaterial, o qual fica difícil verificar um ponto transitório para ambos, pelo fato do patrimônio material eventualmente poder ser carregado de uma carga simbólica, de construção de sentimento, ao tempo que e o imaterial também traz consigo toda uma comunicação com espaço, e, com as matérias que compreendem o mundo material, logo, entendemos que um esteja inteiramente ligado a outro. De acordo com Funari & Pelegrini (2006) a noção de patrimônio pode ser identificada pela sua etimologia que está ligada a “herança paterna”, então, este termo na língua romana deriva do latim patrimonium e faz alusão à “propriedade herdada do pai ou dos antepassados” ou ainda “aos monumentos herdados das gerações anteriores”. Neste contexto pode ser discutida a noção para patrimônio individual que de acordo Funari (2006) é algo que depende de nós, pois o mesmo deriva do que decidimos que é interessante, já o patrimônio coletivo é sempre algo mais distante, pois é algo que pode ser determinado por outras pessoas, ou por um determinado grupo. É válido lembrar que a

31

construção da noção de patrimônio está interligada às lembranças e a produção da memória, que contribui e mantem o sentimento de pertencimento e identidade. Entretanto a noção de patrimônio para o ocidente europeu que nos deixou um grande legado na forma de ver o mundo surge, no âmbito privado do direito de propriedade, ligada ao ponto de vista aristocrático, de forma que difere de um patrimônio público que pertence a uma comunidade de cunho coletivo. De acordo com Funari e Pelegrini (2006) ao explicar como este patrimônio está inserido dentro do contexto do europeu, estes autores apontam, por exemplo que os romanos colecionavam esculturas gregas em suas casas. O patrimônio era patriarcal individual e privado da aristocracia. Vem a corroborar com este posicionamento de Funari e Pelegrini (2006), Choay (2001) que escreve que os romanos não entendiam as esculturas gregas como monumentos históricos, o desejo por sua coleção dava-se pelo fato de admiração a cultura grega como algo grandioso, vencedor a ser seguido. No entanto posterior a esta fase, no período da antiguidade tardia do século IV ao V d. C e em especial a Idade Média do século VI até XV com a difusão do cristianismo acrescenta-se o caráter aristocrático, simbólico e religioso ao patrimônio coletivo. Podemos destacar ainda a forma como o homem do período renascentista entrou em contato com este patrimônio, que pela proposta dos intelectuais da época voltavam suas intenções para uma valorização das culturas antigas provocando um rompimento com muitos valores obtidos na Idade Media. Essa valorização da cultura clássica, principalmente por esculturas gregas e romanas, além de objetos de construções que remetessem a memória dos mesmos, se deu por meio de colecionadores que tornaram possível a leitura de muitas obras, fato que foi motivado pelo surgimento da impressa (FUNARI; PELEGRINE, 2001). Em decorrência deste período, caminhamos para uma fase que irá predominar a teoria iluminista, embasados na razão e no método cientifico, desde o século XVIII, os mesmos vinham alterando relações na arquitetura, sua teoria e aplicação. De fato é o advento da revolução industrial que consolida uma mudança na arquitetura, mas sobre tudo no modus vivendi dos povos ocidentais. De acordo com Simões (2006) com a grande transformação no habitat e nas relações dos homens surge a preocupação com a preservação dos monumentos do passado. Sendo importante frisar que este passado, que até o renascimento era admirado, com o desenvolvimento do iluminismo, passará a ser visto sob outra perspectiva, ao passado são atribuídos a ignorância, obscurantismo, será visto como idade das trevas que dominavam o mundo ocidental. De forma que nessa nova fase onde há predominância do sentido da razão o

32

saber científico, é analítico e crítico, fragmentado o objeto do conhecimento e substituído por um modelo abstrato. (SIMÕES 2006). Com o emergir do Mundo Moderno o patrimônio terá um avanço da condição de privado para uma ampliação no âmbito público. De acordo Choay (2001) é organizada a primeira comissão, na França em 1837, dos Monumentos Históricos sendo definidas três categorias de monumentos históricos, uma constituída pelos remanescentes da Antiguidade, outra pelos edifícios registros da Idade Media e para terceira categoria os castelos. De acordo com Costa (2004) A noção de patrimônio consolida-se com o processo de formação dos estados nacionais onde serve como justificativa para construção de uma identidade nacional

A ênfase no patrimônio nacional atinge seu ápice no período que vai de 1914 à 1945, quando duas guerras mundiais eclodem sob o impulso do nacionalismo. Alguns exemplos extremos mostram como mesmo os vestígios mais distantes, no tempo e no espaço, podiam servir para a construção da nacionalidade (FUNARI; PELEGRINI, 2006, p.20).

No contexto de formação dos Estados Nacionais surge o conceito de patrimônio, mas esta relação não é aparente, principalmente porque o uso em uma variedade de discursos, tais como patrimônio econômico, financeiro, familiar, cultural, arquitetônico e ecológico. Mais recentemente a noção de patrimônio se confunde com a de propriedade, principalmente com a herdada, reforçando a conotação utilitarista (SILVA, 2010). Para Funari & Pelegrini (2006), o nacionalismo exagerado associado ao imperialismo seria superado com o fim da segunda guerra mundial e com a criação da Organizações das Nações Unidas (ONU) e a Organizações das Nações Unidas para Educação Ciência e Cultura (UNESCO) em 1945. Após a Segunda Guerra Mundial, os bens e inventários aumentam em grande número, porém sua natureza é mantida em sua essência, provindo da arqueologia, da história, e da arquitetura erudita, apenas posteriormente que os ingleses vão ampliar a concepção de bem patrimonial para toda arte de construir, eruditas e populares (CHOAY, 2001). De acordo com Choay (2001) até a década de 60 a inscrição de monumentos históricos esteve bastante restrita a monumentos arqueológicos, fato que resulta a perda de significativos monumentos, pelo mundo. A arqueologia como categoria de patrimônio, compreende diferentes espaços patrimoniais, pertencentes a distintos grupos. No entanto, a negligencia e perda de espaço patrimonial mencionados por Choay (2001) como o caso do desaparecimento em 1968 da

33

Maison du Peupe na Bélgica a obra prima de Horta do Hotel Imperial de Tóquio em 1915, obra prima de F. L. Wright, decorre da própria dimensão do que é tido como arqueologia neste momento. Visto acontecimentos como estes mencionados, torna-se possível constatar um século XX, em que se tem maior preocupação em assegurar a proteção destes patrimônios nacionais na medida em que verificamos a organização de conferências e convenções, que são responsáveis pela elaboração das Cartas Patrimoniais e recomendações. A primeira Conferencia Internacional para a Conservação dos Monumentos Históricos acontece em Atenas em 1931, algo que é resultado das preocupações de nações em decidir medidas que assegurem a preservação patrimonial. A partir da conferência de Atenas foram lançadas legislações cujo objetivo era proteger monumentos de interesse histórico, artístico e científico pertencente às diferentes nações. O patrimônio enquanto categoria de pensamento, tal como apontou Gonçalves (2003) apud Silva (2010), é polissêmico, envolve vários sentidos e assume no mundo moderno três dimensões, pois é categoria jurídica, categoria política, categoria pública e instrumento de comunicação social, o patrimônio é um bem que porta Valor. Após a segunda guerra mundial as conferências e convenções as quais tiveram como resultados a Carta de Veneza, a Declaração de Amsterdã realizadas respectivamente em 1964 e 1975, atuaram de forma significativa para a ampliação da concepção de patrimônio, contribuindo para contextualizar as formas estéticas assim como consolidar a discursão sobre o patrimônio edificado.

À medida que foram sendo ampliadas estas concepções

proporcionaram na década de 1980, que os artistas e intelectuais reconhecessem como patrimônio as criações anônimas oriundas da alma popular. A primeira convenção referente ao patrimônio mundial, cultural e natural foi adotada pela conferência geral da UNESCO em 1972. A partir do reconhecimento da importância da diversidade um patrimônio da humanidade pertencia à todos os povos do mundo (FUNARI & PELEGRINI, 2006). Segundo essa convenção da UNESCO de 1972, subscrita por mais de 150 países, serão considerados como patrimônio cultural e natural: Os monumentos. – Obras arquitectónicas, de escultura ou de pintura monumentais, elementos de estruturas de carácter arqueológico, inscrições, grutas e grupos de elementos com valor universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência;

34

Os conjuntos. – Grupos de construções isoladas ou reunidos que, em virtude da sua arquitectura, unidade ou integração na paisagem têm valor universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência; Os locais de interesse. – Obras do homem, ou obras conjugadas do homem e da natureza, e as zonas, incluindo os locais de interesse arqueológico, com um valor universal excepcional do ponto de vista histórico, estético, etnológico ou antropológico. (Negrito-grifo nosso).

Outra categoria designada pela convenção da UNESCO é o património natural onde constam: Os monumentos naturais constituídos por formações físicas e biológicas ou por grupos de tais formações com valor universal excepcional do ponto de vista estético ou científico; As formações geológicas e fisiográficas e as zonas estritamente delimitadas que constituem habitat de espécies animais e vegetais ameaçadas, com valor universal excepcional do ponto de vista da ciência ou da conservação; Os locais de interesse naturais ou zonas naturais estritamente delimitadas, com valor universal excepcional do ponto de vista da ciência, conservação ou beleza natural (CONVENÇÃO DA UNESCO, 1972).

A UNESCO lançou várias campanhas internacionais para salvaguarda do patrimônio cultural, a maioria na Ásia e nos países árabes, sendo também realizadas no Brasil. No entanto evidencia-se que boa parte dos monumentos reconhecidos como patrimônio da humanidade encontram-se no continente, chegando ao um percentual de 60%, de encontro a este expressivo número a América Latina apresenta um percentual bastante reduzido em comparação com os europeus, logo quando aprofunda esta avaliação constata-se o continente africano com apenas 4 % dos monumentos reconhecidos como patrimônio da humanidade (FUNARI; PELEGRINI 2006). A política de centralização dos projetos de preservação mencionada por Funari e Pelegrini (2006) pode ser entendida pela própria designação do que vem a ser patrimônio. Lembrando que o processo que elege um patrimônio acontece por meio de contexto, o qual pode ser resultado de influências políticas, econômicas e sociais. Atrelado a isso é importante destacar que a política que assegura a preservação do patrimônio na América Latina é um tanto recente, principalmente quando trata de grupos que de inicio não tiveram destaque na historiografia nacional como o negro e o indígena. Na América Latina a preservação deste patrimônio concentra-se na reabilitação dos centros históricos, que entre outras metas procura potencializar a identidade coletiva, contribuir para o desenvolvimento econômico e social e aperfeiçoar os custos financeiros e ambientais do desenvolvimento urbano.

35

É importante ter em mente que as políticas de preservação do patrimônio cultural nos países da América Latina ainda são muito recentes tendo surgido a partir do reconhecimento da UNESCO como patrimônio da humanidade (FUNARI; PELEGRINI 2006).

3.2

A arqueologia como discurso formal no Brasil

A partir da exposição do tópico anterior pode-se constatar que a noção de patrimônio cultural foi modificando com tempo. Quando abordamos essa discussão para o Brasil, Marcia Chuva (2012) expõe que a concepção de patrimônio tem-se formado em um contexto que apresenta uma dicotomia ao dividir em duas categorias material e imaterial. Portanto é consensual e notório que se trata de uma divisão. Conforme o estudo de Chuva (2012) no ano de 1980 tem-se a primeira publicação que propõe refletir sobre a história da preservação patrimonial brasileira.

A primeira noticia que se tem alguma iniciativa visando a proteção de monumentos históricos já data de meados do século XVIII, D. André de Melo e Castro, Conde das Galveias vice rei do estado do Brasil de 1735 a 1749, ao tomar conhecimento das intenções do governo de Pernambuco a respeito das construções ali deixadas pelos holandeses, escreveu-lhe uma carta onde demonstra notável percepção da complexidade que envolve o problema da preservação de monumentos históricos (IPHAN, 1980)4 . (Negrito-grifo nosso).

Neste estudo vamos ter a primeira periodização a qual remonta a intenção de preservação patrimonial para o século XVIII, partida do governo de Pernambuco D. Luiz Pereira de Freitas Andrade que demonstra a preocupação com as construções deixadas pelos holandeses (CHUVA, 2012). Esta versão oficial organizou a periodização que se tornou consagrada em dividir a trajetória nacional em suas grandes fases a fase heróica e a fase moderna. Além daquela passagem referida da publicação do IPHAN de 1980, o nosso estudo levantou que após esta primeira menção de proteção de construções do século XVIII, um século depois quando o Ministro do Império, Conselheiro Luiz Pereira do Couto Ferraz, mais tarde Visconde de Bom Retiro, transmite ordem ao presidente da província para que obtivesse 4

Publicação da Secretaria de Preservação do Patrimônio Nacional e Fundação Pró-Memória: intitulada Proteção e revitalização do patrimônio cultural do Brasil.

36

coleções epigráficas para a Biblioteca Nacional e ao diretor das Obras Públicas da Corte para que tivesse cuidado na reparação dos monumentos afim de não destruir as inscrições neles gravadas (IPHAN, 1980). Em continuidade às políticas de preservação, após trinta e dois anos da última medida pelo governo de Pernambuco, o Chefe da Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional, Alfredo do Vale Cabral, percorreu as províncias da Bahia, Alagoas, Pernambuco e Paraíba a fim de recolher a epigrafia dos monumentos da região. Em continuidade a essa periodização é importante destacar que apesar do interesse do Imperador D. Pedro II pelos estudos históricos, durante o seu reinado nenhuma providência foi tomada para proteção dos monumentos nacionais estendendo um longo, período entre a Monarquia e a Republica Vella sem que houvesse estratégia do poder público em assegurar a proteção e conservação dos bens patrimoniais (IPHAN, 1980). Conforme a publicação do Iphan (1980 p. 09):

Em, 1920, o Professor Bruno Lobos, então presidente da sociedade de belas Artes, encarregou ao professor Albert Childe, conservador da Antiguidade Clássica do Museu Nacional, para elaborar um projeto de lei de defesa do patrimônio artístico nacional. Este arqueólogo fez uma série de sugestões que visava mais à proteção dos bens mais arqueológicos do que históricos e, ele propunha a desocupação. Inciativa não teve seguimento.

Como explicou Chuva (2012) toda pesquisa tem que ser entendida em seu tempo, para que não sejamos anacrônicos, no entanto fica notório o contexto em que as pesquisas estão sendo desenvolvidas. De forma que a citação acima nos dá uma possibilidade de entender que conforme a publicação de IPHAN de 1980, vamos ter uma valorização maior dos monumentos deixados pelos europeus. A partir desta publicação de 1980 foi disseminada a ideia que centraliza na pessoa de Mario de Andrade em 1936, os créditos pela criação do Serviço de Proteção ao Patrimônio Artístico Nacional (SPHAN) e a consolidação do texto do decreto da Lei 25/1937 proposto no ano seguinte por Rodrigo de Melo Franco de Andrade (CHUVA, 2012). Entretanto Chuva (2012) faz uma reflexão crítica na qual traz relatos que vêm relativizando o papel atribuído a Mario de Andrade, pois a sua recorrência como fundador da prática de preservação cultural no Brasil, é uma memória histórica que tem obscurecido as tensões que historicamente caracterizaram o campo do patrimônio cultural no Brasil.

37

Sem duvida a versão oficial de 1980 foi construída em um contexto de lutas, as quais devem ser compreendidas, de modo a ultrapassar o anacronismo, que para demonstrar a pertinência da filiação com Mario de Andrade na constituição desta trajetória, forjou uma linha de continuidade histórica, obscurecendo a complexidade e os antagonismos presentes naquele âmbito político (CHUVA 2012 p.148).

É importante destacar que Chuva (2012) não desconsidera a influência do poeta para geração de intelectuais daquela época, no entanto chama atenção para os danos “étnicospolíticos” causados pela adoção de uma visão histórica a qual a autora classifica como essencialmente cronológica e linear. Portanto, estudos como o de Bastos (2011, p. 53) afirmam que:

O Patrimônio Histórico no Brasil tem sua origem orgânica no projeto modernista de Mario de Andrade (1937). O Brasil necessitava de uma identidade e esta seria histórica, etnográfica, e seus elementos formariam aquilo que se denomina Patrimônio Histórico. (Negrito-grifo nosso).

Algo que corrobora em parte com o posicionamento da leitura de Chuva (2012) que classifica isto com um centralismo na figura de Mario de Andrade e deixa de perceber os outros que também estavam envolvidos nesse processo de lutas para avanços nas políticas preservacionistas. O patrimônio Histórico é uma vertente particular da ação desenvolvida pelo poder público para a instituição da memória social. O patrimônio se destaca dos demais lugares de memória uma vez que o às disputas econômicas e simbólicas que o torna um campo de exercício de poder (RODRIGUES, 1996 p.195 apud BASTOS, 2011 p.53)

Em termos jurídicos a noção de patrimônio histórico nacional passou a ser abordada nas constituições desde os primeiros anos de 1930, a constituição da Republica Federativa do Brasil em 1934, por exemplo, declarou o impedimento a evasão de obras de arte do território nacional (Fonseca, 2005). Neste mesmo período vai se introduzir o abrandamento do direito de propriedade nas cidades históricas mineiras, quando estas se revestem de uma função social. Na constituição de 1934. Diz o Artigo 10 das disposições preliminares:

Art. 10 compete concorrentemente à união e aos estados: III. Proteger as belezas e os monumentos de valor histórico ou artístico, podendo impedir a evasão de obras de arte. (Negrito-grifo nosso).

38

Esta política preservacionista da década de 30 será importante, para assegurar a proteção de bens patrimoniais, contudo, não podemos esquecer que já desde muito antes os naturalistas realizavam pesquisas em território brasileiro como o botânico dinamarquês Peter Wilhelm Lund, que também foi paleontólogo amador, fixou residência na aldeia de Lagoa Santa, região na qual pesquisou mais de oitocentas grutas (PROUS, 1992). Já a arqueologia no Brasil surge com estudos de arqueólogos amadores, por volta de 1870 a 1910, de acordo com Prous (1992), entendendo como arqueólogos amadores estudiosos que faziam escavações arqueológicas sem um rigor cientifico, desprovidos de uma abordagem do contexto e controle estratigráficos, pontos que serão fundamentais para sistematização da arqueologia brasileira. Esta tendência de uma arqueologia amadora perdurou até 1960, de fato tivemos importantes nomes na arqueologia amadora como Ladislau Neto, Guilherme Tiburtiu, João José Bigarella, no entanto com a profissionalização da arqueologia os arqueólogos amadores serão impedidos de realizar pesquisas sendo acusados de destruir sítios (PROUS, 1992). Logo, entendemos que a arqueologia vem se transformar em um discurso formal, na medida em que se tem a institucionalização das pesquisas faz uma prática elitista. Entretanto ao refletir sobre a forma em que foi criada a institucionalização do arqueólogo na década de 30, podemos perceber que tornou-se vantajoso por assegurar a proteção de dados de um bom número de sítios, porém negligenciou os direitos de estudiosos que eram os arqueólogos amadores de desenvolver estudos e conhecer o seu patrimônio. Entendemos que práticas como estas distanciam de uma arqueologia pública, pois medidas como qualificação e preparação destes amadores poderiam ter dado um impulso na arqueologia brasileira. Contudo nos dias atuais com a formalização das pesquisas arqueológicas, às vezes, observa-se o ingresso de pessoas descompromissadas com a construção da pesquisa cientifica a fim de obtenção do meio financeiro. Neste cenário a arqueologia como discurso formal no Brasil surge na segunda metade do século XX. A criação em 1937 do Serviço do Patrimônio Artístico Nacional (SPHAN) vem legitimar os sítios arqueológicos como patrimônio e a partir daí são criadas normas de salvaguarda deste patrimônio. Sendo uma das principais normas o Decreto Lei nº 25 de 30 de 1937 que organiza a proteção do patrimônio histórico artístico nacional, instituindo o tombamento para uso de sítios pesquisados de grande valor a nível nacional ou para reserva de áreas para gerações futuras. Tal dispositivo tão logo sancionado na Constituição de 1937, tornou-se decisivo para proteção do patrimônio brasileiro, por meio deste Decreto Lei de Nº. 25/1937 anterior ao

39

decreto o principal dispositivo criado foi o Serviço do Patrimônio Histórico Artístico Nacional (SPHAN) em 1936, pelo ministro Gustavo Campanema, responsável pela Educação e Saúde Pública. Ao analisar os procedimentos adotados pelo SPHAN para a proteção do patrimônio cultural no Brasil, recordamos o que vem ser inscrito nas convenções sobre a proteção do patrimônio cultural nacional. Logo, o IPHAN se encarrega-se da identificação, catalogação, restauração, conservação, preservação, fiscalização e difusão dos bens culturais em todo o território brasileiro (FUNARI & PELEGRINI 2006, p.45). Nota-se que no primeiro momento os arquitetos tiveram papel importante na administração do SPHAN. Conforme Funari & Pelegrini (2006), em um projeto mais amplo, as principais ações em defesa do patrimônio nacional incluíram a seleção de edifícios do período colonial estilo barroco e palácios governamentais, em sua maioria prédios ecléticos, essa escolha ocorre através dos vínculos com a história oficial. Enquanto a arquitetura foi elevada a condição de marca nacional capaz de promover a solidez do Estado brasileiro os bens não pertencentes às elites acabaram relegados ao esquecimento. Tal premissa foi alterada mais de 60 anos após a criação do IPHAN, mediante a implementação do Decreto Nº 3.551/2000 que instituiu o registro de bens culturais de natureza imaterial (FUNARI & PELEGRINI 2006, p.46) (Negrito-grifo nosso).

Dissertaram Funari & Pelegrini (2006) que em continuidade a política do patrimônio a constituição de 1946 vem a inaugurar a preocupação com a proteção dos documentos históricos. Logo o período democrático de (1946-1964), proporciona, assim, que fosse aprovada a única lei de proteção do patrimônio arqueológico (Lei 3.942/1961): A lei nº 3924 de 26 de julho de 1961 – que dispõe sobre monumentos arqueológicos e pré-históricos determina que os sítios e os elementos que contem, são bens patrimoniais da União, ficando sob guarda do poder público, dando ao IBPC, as incumbências sobre o licenciamento das pesquisas arqueológicas e da remessa de objetos para o exterior, as de fiscalização e manutenção de um cadastro atualizado, assim como determina outros procedimentos, como a proibição de destruição de sítios arqueológicos antes da prévia pesquisa ou a necessidade de comunicação desta descoberta fortuna, e ainda determina as infrações como crimes e outras coisas (MAE, 1994 p.231).

Após uma campanha humanista encabeçada pelo intelectual paulista Paulo Duarte, juntando-se a esses novos avanços a Carta Constitucional de 1967 criou novas categorias como patrimônio as jazidas e os sítios arqueológicos, anteriormente classificados apenas como de valor histórico.

40

De acordo com Bastos (2011) o Patrimônio arqueológico surge a partir de 1961 com a lei federal que protege os monumentos arqueológicos e os sítios pré-históricos. Para Bastos (2011) o patrimônio arqueológico compreende a porção do patrimônio material para os quais os métodos de arqueologia fornecem conhecimentos primários. É importante lembrar ainda que a primeira lei de proteção especifica do patrimônio arqueológico foi editada primeiramente no estado de São Paulo em 1955, em função de pesquisadores e intelectuais da Universidade de São Paulo (BASTOS, 2011). Pela Carta Constitucional promulgada em 1988 retomaram-se alguns pressupostos preservacionistas sugeridos por Mário de Andrade e Aloísio Magalhães, reafirmando que a ação em prol do patrimônio deveria se desenvolver através do tombamento e deveria se basear com referencia aos bens, além disso, as disposições contidas no Artigo 215 reiteraram a proteção das manifestações populares indígenas e afrodescendentes ou de qualquer outro segmento étnico racial (FUNARI & PELEGRINI 2006). Desta forma a Constituição Federal (1988) estabelece que:

Constituem Patrimônio Cultural Brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tombados individualmente ou em conjuntos portadores de referencias a identidade, à ação, à memoria dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: os conjuntos urbanos e sítios de valor históricos artísticos, arqueológicos, ecológicos e científicos.

Neste contexto o registro oficial de sítios arqueológicos será fundamentado no IPHAN, pela esfera governamental, municipal, estadual, distrital, federal e sociedade civil para garantir a formação dos acervos, valorização e preservação dos vestígios. Algo que vem a legitimar e formalizar o que vem a ser patrimônio sendo este celetista em um processo histórico. Outro ponto que pode ser colocado em evidencia quando abordamos o patrimônio no Brasil é lembrar que a construção da noção de patrimônio brasileiro é formada a partir de um dialogo com a história nacional onde no primeiro momento vamos ter uma quantidade maior de monumentos preservados ligados à cultura europeia. Contudo já à partir da constituição de 1988, que marca um período de redemocratização do Brasil, vamos ter uma valorização da cultura indígena e afro-brasileira, sendo este ponto importante para se pensar e estudar como fator contribuinte da consolidação de uma arqueologia no Brasil que não tivesse somente preocupada em estudar a classe dominante.

41

3.3

O histórico da Educação Patrimonial no Brasil.

A escolha do tema Educação Patrimonial (EP) como estratégia de Arqueologia Pública (AP) para discutir nesta pesquisa dá-se pelo fato de que, ao contrario de outras vertentes, a educação constitui-se desde o início um elemento transformador e capaz de conduzir o sujeito para sua emancipação e pelo conjunto desse eixo o ensino associado ao desenvolvimento intelectual e cultural encaminha para entendimento do passado e fortificação do laço de identidade. Atualmente lidamos com o problema de romper com a “educação bancaria” que é um modelo educacional onde o educador torna-se somente um transmissor de conteúdos, para poder caminhar rumo a uma educação libertadora, onde o educando possa construir o conhecimento de forma que o espaço de aprendizagem não seja somente a sala de aula. Freire (2005), apresentou uma proposta de educação organizada com objetivos claros e definidos podendo levar o educando a condição de construir conhecimento e não somente reproduzi-lo. Acreditamos que a arqueologia, visto que é um campo interdisciplinar, pode compartilhar conhecimento construído por teóricos da educação a fim de criar estratégias de Arqueologia Pública (AP), onde neste caso em especifico a Arqueologia Pública (AP) torna-se efetiva, essa interação através da educação patrimonial que pode ser construída com aulas de campos, visitas aos museus ou em construções antigas entre outras atividades. Na visão “bancaria” da educação, o saber é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais das ideologias da opressão – a absolutização da ignorância, que se constitui o que chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no outro (FREIRE 2005 p.67).

Em contraponto a esta educação excludente representada pela educação bancaria, surgiram na década de 90 as discussões sobre a proposta de educação contextualizada no semiárido, quando um grupo de organização comunitária e movimentos sociais ligados à Igreja Católica, no sertão da Bahia, iniciou um movimento com o propósito de construir um plano estratégico de desenvolvimento sustentável para o semiárido, pautado no principio da convivência com características socioambientais da região, indo de encontro com ás políticas assistencialistas desenvolvidas (LIMA, 2011). Neste cenário entende-se que a educação é um processo continuo de aprendizagem, informação, conhecimento, que leva a um comportamento ou mudança de comportamento visando a melhoria pessoal e melhoria do coletivo.

42

No entanto acreditamos que trabalhar o patrimônio, tanto ambiental, como cultural, do semiárido, seja uma forma que temos de contribuir com a construção de uma educação que possa trabalhar a emancipação do sujeito, mas para que tal fato ocorra não basta somente pensar a educação contextualizada com patrimônio, mas sim pensar com a comunidade e as instituições que a representam, pois estas devem estar envolvidas nesse processo já que a educação não acontece somente no espaço escolar, mas em todos os setores sociais em que o educando participa. É buscando alcançar essas qualidades que o tema Educação Patrimonial (EP) vem se tornando cada vez mais familiar e presente nos trabalhos dos museus e dos responsáveis pela preservação, identificação e valorização do patrimônio cultural em nosso país (HORTA, 1999). Pensar a educação dentro de uma perspectiva em que seja vista como principio norteador, para que se possa conhecer e preservar, é algo que vem desde o início dos anos 80, logo que é criado pela Fundação Pró-Memória, o projeto de interação entre a educação básica e os diferentes contextos culturais existentes no país (FONSECA, 1996 apud SILVEIRA, 2007). A proposta metodológica para um desenvolvimento da Educação Patrimonial (EP) com intuito de apropriação dos bens foi introduzida, em termos conceituais e práticos a partir do 1º Seminário realizado em 1983 no Museu Imperial em Petrópolis no Estado do Rio de Janeiro, inspirado em trabalhos pedagógicos desenvolvidos na Inglaterra (HORTA, 1999). A partir dessa experiência inicial as atividades com ação educativa passam a ser desenvolvidas no Brasil voltadas para a realidade do patrimônio local. O patrimônio cultural pode ser classificado de diversas formas, como por exemplo, patrimônio cultural material, imaterial, ambiental ou natural ou construído de outras denominações como: patrimônio histórico, arqueológico, bibliográfico, artístico paleontológico etc. (TEIXEIRA, 2008). Logo, interrogamos, mas o que séria mesmo a atividade de Educação Patrimonial? Uma autora que se tornou referencia no estudo foi Maria de Lurdes Pereira Horta que junto com a equipe do Instituto do Patrimônio Artístico Nacional (IPHAN), vem estudando constantemente o tema. De acordo com Horta (1999) a educação patrimonial trata de um processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no patrimônio cultural como fonte primaria de conhecimento e enriquecimento individual e coletivo. Entendemos que o espaço restrito a sala de aula, composto com carteiras e quadro não seja por si só, suficiente para que se possa construir um saber capaz de despertar a atenção dos

43

alunos para a valorização do patrimônio cultural. Contudo Horta (1999) disserta que é a partir da experiência e do contato direto com as evidências e manifestações da cultura, que vamos ter um agente ativo na construção de uma consciência crítica, sendo a mesma indispensável no processo de preservação sustentável e fortalecimento dos sentimentos de identidade e cidadania. De acordo com Horta (1999, p.6) ao definir Educação Patrimonial expõe: A Educação Patrimonial é um instrumento de “alfabetização cultural” que possibilita ao individuo fazer a leitura do mundo que o rodeia, levando-o a compreensão do universo sociocultural e da trajetória temporal em que o aluno inserido. Este processo leva ao esforço da auto-estima do individuo e comunidade e a valorização da cultura brasileira compreendida como múltipla e plural.

De acordo com a autora referida acima, a metodologia especifica da educação patrimonial pode ser aplicada através da manifestação da cultura e estando à critério dos agentes poder explorar qualquer tipo de bens, seja histórico, arqueológico ou passagens naturais entre outros diversos. Gostaríamos de registrar que a discursão à respeito da Educação Patrimonial hoje, está vinculada a alguns patrimônios em especifico e nas áreas de museus ou locais com a presença de patrimônio arqueológico. Logo, destaca-se que o aumento das pesquisas de campo em arqueologia preventiva ou de contrato têm feito dessa prática um caminho para exercício de novas experiências, porém as ações podem ser aplicadas à contextos históricos diferentes seja patrimônio material, ou imaterial ou pré-histórico ou natural e etc. Atualmente o IPHAN vem concentrando seus esforços na gestão, proteção e conservação dos bens patrimoniais do país, procurou-se redigir uma legislação específica, preparando técnicos e realizando tombamentos e restaurações que assegurem a permanência da maior parte do acervo arquitetônico e urbanístico brasileiro, bem como do acervo documental, etnográfico, das obras de arte integradas e dos bens móveis. Em sua luta pela proteção do patrimônio cultural, estendendo sua ação à proteção dos acidentes geográficos notáveis e das paisagens agenciadas pelo homem, com essas atividades acentua-se um aumento nas ações educacionais (IPHAN, 1999, apud MORAES, 2005). Conforme Teixeira (2008) existem diversas formas de se trabalhar com o patrimônio em sala de aula, articulando todas as disciplinas do currículo escolar. Podemos destacar algumas formas e sugestões como: visitar museus da escola, caso não possua, planejar juntamente com demais um projeto interdisciplinar que se possa, viabilizar a construção de um memorial, ou de um museu que tenha o objetivo de contar a história do estabelecimento

44

escolar e conscientizar os alunos da importância, fazer um circulo de conversa com um morador antigo da comunidade, visitar uma casa antiga que preserve um pouco da história da comunidade e através de jogos educativos sobre a cultura local etc. Estando em concordância com Horta (1999), a cultura é um processo eminentemente dinâmico, transmitido de gerações para gerações, que se aprende com antepassados e se cria e recria no cotidiano do presente. Quanto à cultura brasileira pontuamos que a mesma é rica em diversidade, pois é o resultado do nosso processo histórico e social e das dimensões territoriais do nosso país. Fernandes (2005) dissertou que, apesar da influência marcante da cultura matriz europeia, por força da colonização ibérica em nosso país, a cultura tida como dominante não conseguiu, de tudo, apagar a cultura indígena e africana ao contrário o colonizador europeu deixou se influenciar pela riqueza da pluralidade de índios e negros, criando uma diversidade cultural que se manifesta através da religiosidade, crenças, na gastronomia e também no patrimônio material, criando uma própria miscigenação entre diferentes grupos. Devido a este contexto tem-se a necessidade de que seja trabalhada a valorização das diversidades culturais. Mesmo o país sendo formado por grupos diferentes, Fernandes (2005) faz uma reflexão que o livro didático, sobretudo o de história, ainda está permeado por uma concepção positivista da historiografia brasileira que primou pelos relatos dos grandes fatos e feitos dos “heróis nacionais” geralmente brancos, esquecendo assim a participação de outros segmentos sociais no processo histórico do país. Logo, este ponto reforça a importância da Educação Patrimonial (EP), com uma proposta inovadora que vem aproximar a aula com a realidade e a vida social do aluno, além de possibilitar desconstruir alguns paradigmas da história oficial e mostrar outro lado que não seja somente a história dos vencedores. Para Fernandes (2005) os currículos e manuais didáticos silenciam e chegam até a omitir a condição do sujeito histórico, provocando aumento nos índices de evasão e repetência de crianças provenientes dos estratos sociais mais pobres, pertencentes a grupos de ameríndios e afrodescendentes. Grande maioria dessas crianças que entram nas escolas sai precocemente sem concluir nem o ensino fundamental por não se identificarem com uma escola moldada ainda nos padrões eurocêntricos, que não valoriza a diversidade étnicocultural de nossa formação. Contudo a educação patrimonial vem buscando reverter este quadro por meio de uma metodologia que motiva o aluno a desenvolver a habilidade de interpretar e adquirir a aquisição dos conceitos, de forma que se possa interessar em conhecer o passado.

45

O desafio de inserir a história e o patrimônio cultural da região dentro do currículo escolar pode ser verificado em São Raimundo Nonato, de acordo com Oliveira (2013) no trabalho de pesquisa: Por uma Educação Contextualizada com Patrimônio Arqueológico em São Raimundo Nonato – PI ficou constatado por meio de relatos dos professores uma dificuldade de colocar em práticas aulas de campo em que aproximasse os alunos do patrimônio arqueológico, foram apresentados resultados de quatro escolas pesquisadas, onde os docentes relataram dentre os fatores que se tornam desafiantes para execução de prática educativa contextualizada com patrimônio arqueológico, a falta de material didático para elaboração das aulas, a carência de cursos de extensão para qualificar os docentes, e de políticas públicas com financiamento de projetos interdisciplinares e no currículo escolar anualmente. Partindo da definição do que é Educação Patrimonial (EP) exposta por Horta (1999) acreditamos que a mesma pode se configurar como uma estratégia de Arqueologia Pública (AP), no entanto para isto, se faz necessário um envolvimento tanto da comunidade escolar quanto das instituições que cuidam da gestão do patrimônio cultural/arqueológico em articulação com a comunidade geral. Observando este panorama das escolas municipais fomos estimulados a pesquisar como as instituições que são responsáveis para preservar e estudar o patrimônio cultural/arqueológico têm-se articulado para construção de um dialogo que colabore para o desenvolvimento de uma prática educativa que valorize o patrimônio local. Portanto, foi elaborado um estudo em que as pesquisas encontram-se concentradas principalmente nos trabalhos desenvolvidos pela Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM) instituição co-gestora e responsável pelas pesquisas arqueológicas na região.

46

4

PROCEDIMENTOS TEÓRICOS - METODOLÓGICOS

4.1

História, memória e identidade.

A arqueologia tem-se configurado nos últimos anos como um campo interdisciplinar, trazendo consigo a possibilidade de trabalhar diferentes temáticas em diferentes contextos. De forma que os estudos arqueológicos vão desde a possibilidade de estudos pré-históricos de milhares de anos até estudos mais recentes de períodos históricos e com campos de atuação também bem distintos, a exemplo de arqueologia em ambientes terrestres e ambientes subaquáticos, fato que demostra tamanha diversidade. Entretanto, além de pensar e estudar sobre diferentes contextos, surgiu a necessidade de refletir sua própria prática enquanto disciplina capaz de transformar o meio social e possibilitar a compreensão dos fatos passados. Esta reflexão no campo da Arqueologia Pública (AP) é de fundamental importância para entender a relação entre pesquisador e comunidade. Nesse cenário para o desenvolvimento de uma pesquisa em Arqueologia Pública (AP), assim como na arqueologia histórica, pode-se trabalhar com diferentes tipos de fontes como: artefatos, estruturas, contextos de sítios arqueológicos, documentos, etnografia, mapas, fontes imagéticas, desenhos, fotos, assentamentos paisagísticos e testemunho oral. Portanto podemos a partir disso verificar pontos de semelhas entre a Arqueologia Pública (AP) e a arqueologia histórica, sendo possível desenvolver Arqueologia Pública (AP) a partir de sítios de contextos históricos, como tem sido bem comum a realização de tal prática, pois torna-se mais fácil trabalhar o sentido de pertencimento quando existe uma memória social das comunidades. O conceito de Arqueologia Histórica foi nos últimos anos amplamente discutido não restringindo somente a sociedades de documentos escritos, Orser Jr. (1992 p. 62) definiu Arqueologia Histórica como: O estudo arqueológico dos aspectos materiais em termos históricos, culturais e sociais concretos dos efeitos do mercantilismo e do capitalismo que foi trazido da Europa em fins do século XV em que continua em ação ainda hoje.

Frente toda a possibilidade de uso das fontes citadas em nossa pesquisa optou-se pelo uso das fontes orais auxiliadas por outras fontes como documentação escrita e fontes imagéticas de mapas e fotografias, que possibilitaram a representação dos fatos debatidos e contextualização dos mesmos. Quanto a fonte oral a mesma é semelhante as fontes escritas

47

podendo ser estudadas em sítios de tempos recentes, assim como conhecer a história do sítio após seu uso pelo povo que originalmente o construiu e usou (ORSER, 1992). Em nosso estudo o testemunho oral e a memória coletiva foram muito úteis para estudar a relação das comunidades tradicionais com os sítios arqueológicos no passado e no presente e as estratégias de Arqueologia Pública (AP) na Área do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC). A pesquisa com fontes orais tem se consolidado principalmente no campo da história, no entanto a arqueologia como campo interdisciplinar tem utilizado destes instrumentos de pesquisa, na medida em que se trata de um passado mais próximo. Vale ressaltar que de acordo com Beaudry et all (2007) no estudo arqueológico não existe uma relação de sobreposição de uma fonte sobre a outra, ou seja tanto a cultura material como documentos escritos, fontes imagéticas e testemunho oral, são equivalentes, o que vai determinar, a viabilidade da sua utilização é sua contextualização, assim como as informações contidas nas fontes. A pesquisa com testemunho oral que é utilizada amplamente pelas ciências humanas, História, Antropologia, Arqueologia, Etnografia, Geografia, entre outras é um procedimento metodológico que busca, pela construção de fontes e documentos, registrar, através de narrativas induzidas e estimuladas, testemunho, versões e interpretações sobre a pesquisa em suas múltiplas dimensões: factuais, temporais, espaciais, conflituosas e consensuais (DELGADO, 2010). Portanto, a pesquisa em história oral é um procedimento, um meio, um caminho para a produção do conhecimento. De maneira que o passado reproduz, através de narrativas, a dinâmica da vida pessoal em conexão com processos coletivos. Criando ao longo do tempo uma memória nutrida por lembranças de famílias, tradições, histórias escutadas, registradas e vivencias na comunidade (DELGADO, 2010). A pesquisa com utilização de fontes orais é desafiadora, pois requer um estudo minucioso das fontes, devido a relação das múltiplas temporalidades, visto que, uma entrevista ou depoimento, fala o jovem do passado, pela voz do adulto, ou do ancião do tempo presente. Adulto que traz em si memórias de suas experiências e também lembranças a ele repassadas, mas filtradas por ele mesmo, ao disseminá-las. Fala-se de um tempo sobre outro tempo. E enfim registra-se sentimentos, testemunhos, visões, interpretações em narrativas entrecortadas pelas emoções renovadas ou ressignificadas pelas emoções do hoje. Logo, não é História em si mesma, mas um possível registro sobre o que passou e sobre o que ficou como herança ou como memória (DELGADO, 2010).

48

Para a pesquisa em história oral, autores como José Meihy (2005) e Delgado (2010) identificam três tipos de entrevistas como as mais utilizadas em projetos de pesquisas que auxiliam na produção de fontes orais, que são testemunhos de história de vida, as entrevistas temáticas e a tradição oral. A Historia oral pode ser entendida também como um processo sistêmico que se inicia na elaboração do projeto e faz uso de depoimentos gravados em aparelhos eletrônicos, vertidos do oral para o escrito, com o fim de promover o registro e o uso de entrevista (JOSÉ MEIHY, 2005). Para o desenvolvimento desta pesquisa foi entendida como sendo útil a história oral temática, já que procuramos elucidar um tema que parte de um acontecimento importante que foi a criação do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) bem como as estratégias de Arqueologia Pública (AP) e Educação Patrimonial (EP) realizadas em seu entorno. São entrevistas que se referem às experiências de processos específicos vividos ou testemunhados pelos entrevistados. A entrevista temática pode, por exemplo, construir um desdobramento dos depoimentos da trajetória de vida, ou compor um elenco específico vinculado a um projeto de pesquisa. As trajetórias de vida neste contexto são depoimentos de vida mais sucintos e menos detalhados. Tomando como escolha a história oral temática para nossa pesquisa, em razão da mesma se adequar melhor ao nosso objeto de estudo, destacamos algumas etapas que foram organizadas a fim de construir uma proposta metodológica sistemática: - Definição do objeto de estudo e preparação das entrevistas, por meio de roteiro a serem realizados de maneira que possam contribuir para que os objetivos propostos sejam alcançados. - Elaboração de um roteiro com a síntese das questões levantadas e realização da entrevista. - Processamento e análise das entrevistas que compreendem três etapas: a) transcrição das Entrevistas: será a primeira versão escrita dos depoimentos, buscando reproduzir com fidelidade, tudo que foi dito, sem cortes nem acréscimos. b) conferência de confiabilidade da transcrição e c) análise das entrevistas. Seguindo as etapas acima, em nosso estudo distinguimos três categorias de entrevistados. Categoria (A): Pessoas das comunidades tradicionais da área do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) Categoria B – Pessoas das Comunidades inseridas em ações de Arqueologia Pública (AP) ou Educação Patrimonial (EP) e Categorias C – Arqueólogos e demais pesquisadores das áreas afim da Arqueologia

49

Tabela 1. Categorias de Análise da para pesquisa em história oral, Categoria (A): Pessoas das comunidades tradicionais das áreas do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC). ENTREVISTADO

PERFIL DO ENTREVISTADO

Nilson A. Parentes

Agricultor

Exp. em Trabalho de Arqueologia5 Sim

Pedro Alcântara

Agricultor

Sim

Novo Zabelê

Valdemar P. Landim

Agricultor

Não

Sítio do Mocó

Antônio L. Barbosa

Agricultor

Sim

Sítio do Mocó

Rafael R. de Sousa

Agricultor

Sim

Sítio do Mocó

Zilda P. de Sousa

Domestica

Não

Sítio do Mocó

Gaspar Dias Ferreira

Ex-prefeito

Não

São Rai. Nonato

Profissão.

Comunidade Novo Zabelê

A escolha deste perfil de entrevistados dá-se pela importância que estes sujeitos têm para a pesquisa arqueológica, primeiro por se tratar de um público leigo, onde a maior parte não teve acesso a educação escolar, é uma classe desfavorecida, no processo social. Pertencente a esse grupo, mas com característica diferente no que toca a parte social vamos ter o ex-prefeito. Logo, a arqueologia enquanto uma disciplina que deve oferecer um papel de construção social do sujeito tem como dever oferecer condições para que os diferentes públicos tenham acesso aos estudos arqueológicos, pois a partir deste viés vamos contribuir para a construção de uma memória social. A categoria (B): definida para analise foram os sujeitos que receberam ações de Educação Patrimonial (EP) que lhe conduziram para um maior conhecimento e compreensão das pesquisas arqueológicas. Este grupo torna-se fundamental para uma analise dos resultados obtidos no processo de construção de uma arqueologia social.

5

Nesta variável é analisado se o entrevistado já desenvolve algum trabalho relacionado à pesquisa arqueológica.

50

Tabela 2. Categorias de Análise da para pesquisa em história oral, Categoria (B): pessoas das comunidades inseridas em ações de Arqueologia Pública (AP). ENTREVISTADO

PERFIL DO ENTREVISTADO Profissão Educador

Exp. em Trabalho de Arqueologia Sim

São Rai. Nonato

Ariclenes da C. Santos

Téc. Topografia

Sim

São Rai. Nonato

Natanael B. J. Santos

Alunos do Pró- Arte

Sim

São Rai. Nonato

Agente de Portaria

Não

Sítio do Mocó

Recepcionista

Não

São Rai. Nonato

Agnaldo dos Santos

Beatriz Salomé de Lima Riquelma Pereira Dias

Comunidade

Foram cinco entrevistados, sendo que três pessoas foram alunos do Pró-Arte (FUMDHAM) que em relatos nos trazem informações, das vivencias da prática educativa a partir da memória. De acordo com Delgado (2010) a memória individual é a base construtora de identidade de consciência individual, já que a memória coletiva é um elemento constitutivo do autorreconhecimento como pessoas e/ou membros de uma comunidade pública, como uma nação, ou privada, como a família. De acordo com Matos & Sena (2011 p. 97):

Portanto, a memória é sempre uma construção feita no presente a partir de vivências ocorridas no passado. Memórias individuais e coletivas se confundem; não somos ilhas e, portanto, estamos sujeitos a influências, bem como a influenciar, os grupos a que pertencemos e com os quais nos identificamos.

Já a terceira categoria de estudo refere-se aos pesquisadores da área de arqueologia que atuam na área do Parque Nocional Serra da Capivara (PNSC).

Com os mesmos

procuramos identificar os seus posicionamentos quantos as atividades realizadas.

Tabela 3. Categorias de Análise da para pesquisa em história oral, Categoria (C): Arqueólogos e demais pesquisadores das áreas afins da Arqueologia. ENTREVISTADO

PERFIL DO ENTREVISTADO Profissão

Rosa M. Gonçalves Dra. Niéde de Guidon

Educadora

Exp. em Trabalho de Arqueologia Sim

Comunidade São Rai. Nonato

Arqueóloga

Sim

São Rai. Nonato

Para este grupo foi escolhida uma das coordenadoras das pesquisas na região Sudeste do Piauí que esteve inserida desde inícios nas atividades Dra. Niède de Guidon e a educadora

51

Rosa Maria que trabalhou no Pro-Arte (FUMDHAM) e que é conhecedora das atividades desenvolvidas por este projeto. Obedecendo aos métodos expostos, utilizado uma câmera filmadora, foram realizadas gravações de áudios e vídeos, exceto com entrevistados que optaram somente por gravação de áudio. Contudo a narrativa contém em si força ímpar, visto ser também instrumento de retenção do passado e, por consequência, suporte do poder do olhar e das vozes da memória, onde de acordo com Delgado (2010) os melhores narradores são aqueles que deixam fluir as palavras na construção de um enredo que inclui lembranças, registros, observações, silêncios, análises, emoções, reflexões, testemunhos.

A memória é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no eterno presente; a história, uma representação do passado. Porque é afetiva e mágica, a memória não se acomoda a detalhes que a confortam: ela se alimenta de lembranças vagas, telescópicas, globais ou flutuantes, particulares ou simbólicas, sensível a todas as transferências, cenas, censuras ou projeções. A história, porque operação intelectual e laicizante, demanda análise e discursos críticos. A memória instala a lembrança no sagrado, a história a liberta e a torna sempre prosaica [...] (NORA, 1993, p. 9 apud MATOS & SENNA 2013 p.103).

Para Matos e Senna (2011), a memória é a base constituidora da oralidade. Portanto, como discorreu Pierre Nora, a mesma, apesar de sempre atual, não apresenta precisão, pois está constantemente ajustada às crenças e imaginários dos indivíduos, e ao lugar social do sujeito entrevistado. Assim, a fonte oral pode ser confrontada com outros tipos de documentação e analisada não apenas como uma complementação do documento escrito nos estudos históricos, uma vez que ambos os documentos produzem informações sobre as transformações das sociedades humanas. Contudo no trabalho de pesquisa em história oral, destacamos uma pesquisa documental realizada nos acervos da (FUMDHAM) com intuito de levantar tanto bases bibliográficas que dialogassem com nossa pesquisa tanto documentos imagéticos, como fotografias, mapas e desenhos. De forma que os trabalhos que antecederam esta pesquisa foram de fundamental importância para contextualizar o processo histórico da região nos últimos 40 (quarenta) anos, assim como nos orientar para novos questionamentos.

52

5 AS PESQUISAS ARQUEOLÓGICAS NO CONTEXTO DO PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA DESENCADEANDO POSSÍVEIS ESTRATÉGIAS DE ARQUEOLOGIA PÚBLICA

Este lugar deixado em branco ou escondido pela análise que exorbitou a relação de um sujeito individual com seu objeto é uma instituição do saber. Michel de Certeau

5.1 A criação do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) e suas relação com as comunidades. Certamente acreditamos que para pensarmos uma estratégia de arqueologia pública em nosso local de estudo temos que tratar da criação do Parque Nacional Serra da capivara que é uma Unidade de Conservação de tempo integral, criada em função das pesquisas arqueológicas na região. Para compreensão de como se dá a criação dos parques e reservar destacamos o estudo desenvolvido por Diegues (2008) que trata da temática em especifico, de acordo com o autor a criação de parques e reservas tem sido um dos principais elementos de estratégia para conservação da natureza em particular do Terceiro Mundo. A concepção dessas áreas protegidas é preservar espaços ecológicos importantes e dentre as medidas para preservação, os parques, são criados para que suas riquezas naturais, estéticas ou culturais e cientificas sejam apreciadas pelos visitantes, não sendo permitido ao mesmo tempo a moradia de pessoas no seu interior. A criação do primeiro parque nacional no mundo, o de Yellowstone, em meados do século XIX, foi resultado de ideias preservacionistas que se tornaram importantes nos Estados Unidos desde o inicio daquele século, a fim de proteger a vida selvagem ameaçada, pois segundo seus idealizadores a expansão urbana-industrial tornou-se um elemento destruidor da natureza. É visto que nesta ideia mais do que um espaço físico, existe uma concepção especifica homem e natureza, própria de um tipo de naturalismo. Para o naturalismo da proteção da natureza do século passado, a forma de proteger a natureza era afastá-la do homem, de modo a provocar um isolamento do tipo “ilha” onde fosse possível admirá-la e reverenciá-la servindo como locais paradisíacos e também como locais selvagens onde o

53

homem pudesse refazer as energias gastas na vida estressante das cidades e no trabalho monótono (DIEGUES, 2008). De acordo com Diegues (2008) atualmente podemos observar que a proposta que deu surgimento aos parques nacionais é amplamente criticada, pois tenta realizar a reprodução do mito do paraíso perdido, lugar desejado e procurado pelo homem depois da expulsão do Éden. No Brasil a primeira bandeira levantada para a criação dos parques nacionais partiu do abolicionista André Rebouças, em 1876, que tinha como modelo os parques norte-americanos (PÁDUA & FILHO, 1979 apud, DIEGUES, 2008). O primeiro parque nacional brasileiro foi criado em Itatiaia, em 1937, com o proposito de incentivar a pesquisa cientifica e oferecer lazer às populações urbanas. Observamos que o modelo conservacionista norte-americano espalhou-se rapidamente pelo mundo recriando a dicotomia entre “povos” e “parque” na perspectiva de Diegues (2008): [...] É fundamental enfatizar que a transposição do “modelo Yellowstone” de parques sem moradores de países industrializados e de clima temperado para países do Terceiro Mundo, cujas florestas remanescentes foram e continuam sendo, em grande parte, habitada por populações tradicionais, está na base não só de conflitos insuperáveis, mas de uma visão inadequada de áreas protegidas (DIEGUES, 2008 p.39).

De fato não nos isentamos das críticas propostas pelo autor por considerarmos pertinentes e validas. No entanto acreditamos que os intelectuais que encaminham solicitações de criação de reservas ambientais, manifestam ações que representam aos postulados de sua época, e de que a reflexão na maneira de como conduzir a criação dos parques, vem a contribuir para que se possam encontrar caminhos menos conflituosos. Portanto, as instituições de pesquisa e gestão se defrontam com grande desafio de fazer uma analise dos modelos de conhecimento e gestão ainda hoje utilizados e propor novas alternativas de conservação que sejam mais democráticas e participativas beneficiando a biodiversidade e a diversidade cultural. A respeito da criação do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC) é válido considerar dois pontos importantes para entender como ocorreu tal acontecimento, primeiro o cenário da arqueologia no processo que antecede a criação, depois a figura da Dra. Niéde Guidon, personagem que tem significativa importância neste processo. A arqueologia na década de 30 no Brasil vai estar, fundamentada nas ideias defendidas por Paulo Duarte, que terá influência de Paul Rivet, onde ambos vão seguir uma linha de uma arqueologia humanista, cujas funções foram lutar contra o preconceito e a exclusão social,

54

através do fortalecimento da identidade, assentada em uma visão global da humanidade (BORGES, 2007) De acordo com Borges (2007) o movimento liderado por Paulo Duarte traz consequências para a história da arqueologia do Estado do Piauí, uma vez que desencadeará a vinda de arqueólogos, vinculados a Ècole des Hautes Études em Sciecncies Soceiles, Joseph Emperaire e Annette Laming Emperaire, coordenadores da Missão Franco Brasileira de Minas Gerais. Esta impulsionou as pesquisas sobre a arte rupestre, fornecendo bases metodológicas que contribuiram para o continuo estudo da pesquisadora Dra. Niéde Guidon no Piauí. Em 1964, Dra. Niéde Guidon ligada ao Museu Paulista, tem contato pela primeira vez com os vestígios arqueológicos do Piauí, através de fotografias. Ainda em 1964 a mesma tenta chegar ao Piauí, sem sucesso em sua incursão devido às condições do tempo na época, falta de estradas, transporte e por estar em um período chuvoso. Dra. Niéde Guidon nos concedeu uma entrevista (Figura: 02) em sua residência em que contribuiu para nossa pesquisa de campo. Tivemos a oportunidade abordar diferentes temas, o inicio das pesquisas arqueológicas, a criação do (PNSC), os projetos sociais e educativos desenvolvidos pela FUMDHAM e a criação do curso de Graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial da (UNIVASF).

Figura 02: Entrevista com Dra. Niède de Guidon.

Fonte: Pesquisa de Campo – 2014 (Acervo Pessoal do Autor).

55

Abordando questões referentes os primeiros anos de pesquisa a pesquisadora relatou:

Assim tudo começou, quando eu era arqueóloga na Universidade de São Paulo no Museu Paulista, organizamos uma exposição sobre as pinturas rupestres de Minas Gerais que era as únicas no Brasil que se conhecia até então e uma pessoa que foi visitar pediu pra falar com o responsável e me chamaram e ele me mostrou umas fotos e disse lá perto da minha cidade tem esses desenhos de índios e eu olhei as fotos e vi que era algo completamente diferente perguntei a ele onde era ele me disse como fazia pra vir até aqui. Isso foi em junho e nas férias de dezembro eu peguei meu carro e vim só que dezembro chovia muito e uma ponte do rio São Francisco tinha arrombado e eu não consegui passar, depois então em 64 eu sai da USP fui embora pra Franca fiquei trabalhando na Franca, mas aquelas pinturas eu fiquei com elas na cabeça né. E em 1970 eu vim numa Missão Francesa aos índios de Goiás quando terminou o trabalho lá, eu disse não agora eu vou passar pelo Piauí e cheguei no povoado que naquela época se chamava Várzea Grande que hoje e Coronel José Dias né, e conversei com as pessoas e eles disseram assim tem ai foram me mostrar, me mostraram 5 (cinco) sítios ali no desfiladeiro da Capivara então eu fiz as fotos levei pra França e com isso eu consegui criar uma missão6.

Gaspar Dias Ferreira também nos concedeu entrevista e relata quais as motivações que levaram a enviar as fotos para Universidade de São Paulo. De acordo com ex-prefeito as fotos foram enviadas por ter recebido um comunicado convidando todas as prefeituras a enviar fotos do que eles achavam que poderiam ser explorado no turismo da região. Visto isso Gaspar Dias Ferreira contrata um fotografo para tirar as fotos e então envia para São Paulo. Em entrevista Sr. Nilson Alves Parentes nos conta sua visão das primeiras incursões da Missão Franco-Brasileira:

[...] Em 70 (setenta) a Niède chegou aqui com aquelas fotos procurando o pessoal por Gaspar Ferreira, Gaspar Ferreira me manda ela lá ponta eu, ela chego lá com as fotos perguntando, digo conheço foi eu quem tirei, ai ela me convidou pra que eu fosse com ela mostra ela ai eu fui, e dali criou-se ela do 10(dez) anos, eu fazia estrada, fazia aqueles camizin de facão pra andar com jumento, pra anda com as sacas nas costa, mostrando aquelas pinturas pra ela ne, quando foi em 80(oitenta) ela criou o parque nacional em 80(oitenta) ai começou o desmantelo do povo do zabelê.

O Sr. Nilson Alves Parentes (figura: 03) sujeito de nossa pesquisa foi um dos primeiros guia a acompanhar a pesquisa arqueológica na região ele relata que diferentes fatos, ficaram na memória. Para o nosso entrevistado no seu tempo de criança as pessoas da comunidade olhavam as pinturas existentes nos paredões rochosos, porém todos davam pouca importância, atribuindo ao índio como autor das pinturas.

6

Entrevista Dra. Niéde Guidon, Fevereiro de 2014.

56

Figura 03: Entrevista com Senhor Nilson Alves Parentes.

Fonte: Pesquisa de Campo – 2013 (Acervo Pessoal do Autor).

O Senhor Nilson Alves Parentes relata como a comunidade se deparava com as pinturas rupestres: Olha a humanidade ninguém nunca ligou para aquilo, nunca ligaram, ali ninguém envolvia com nada, ninguém riscava nada, ninguém desmanchava nada, ninguém nunca ligou para aquilo não [...] todo mundo via aquilo ali mas num valia nada pra turma, ninguém mexia com nada que ninguém entendia aquilo, só dizia que era dos índios, foi eles que fizeram, ninguém sabia pra que prestava nem sabia se era atividade nenhuma, ninguém mexia naquilo não, nunca mexeram com aquilo.

Analisados os relatos de Nilson Alves Parentes, podemos observar que por mais que aquelas pessoas não tivesse o conhecimento da dimensão do patrimônio existente naquele lugar existia um respeito, o denota uma ideia de conservação do patrimônio. Outro ponto a ser destacado é que de acordo com classificação de Pollak (1992) onde o autor discorre que memória é um resultado de acontecimentos vividos pessoalmente ou acontecimentos em que o mesmo chamaria de “vividos por tabela” onde o entrevistado compartilha de experiências vivenciadas e contadas por outras pessoas. Identificamos o relato de Nilson Alves Parentes encaixa no primeiro caso e que além de relatar suas vivências, os espaços que são relatados com pinturas rupestres, representam para ele como lugar de memória.

57

Analisado os anos iniciais das pesquisas arqueológicas na região do PNSC, levantamos que em 1970, a pesquisadora Dra. Niède Guidon quando ainda estava vinculada como o Centro Nacional de la Recherche Scientique – Centro Nacional de Pesquisa Cientifica (CNRC) retorna ao Piauí, de maneira que obtendo dimensão previa da potencialidade arqueológica da região a mesma elabora um projeto intitulado: O Homem do sudeste do Piauí, da Pré-História aos dias atuais e a Interação Homem-Meio, com o objetivo as aprofundar pesquisas na região (BORGES, 2007). Dra. Niède Guidon fala em entrevista como era relação das comunidades com os sítios com pinturas rupestres e apresenta pontos que vêm a corroborar com relatos dos demais moradores da comunidade:

Na verdade quando eu comecei a trabalhar aqui muitas pessoas daqui diziam. mas o que a senhora quer tanto com esses desenhos, desenhos de índio? Índios eram os bichos que viviam por aqui pelados porque infelizmente no Brasil a população não tem nenhum respeito pelos índios então para eles aquilo não tinha a mínima importância você esta entendendo eles ficavam assim como a senhora esta perdendo tempo com isso dai então porque não existe no povo brasileiro o reconhecimento das culturas indígenas das culturas pré-históricas7.

Em 1970 quando chega a São Raimundo Nonato a primeira missão exploratória composta pela arqueóloga Niéde Guidon e a antropóloga Vilma Chiara, os primeiros locais escolhidos foram a Serra da Capivara, Gruta do Gongo e Zabelê e, logo os resultados evidenciaram o grande potencial arqueológico da região, sendo encontrados 55 sítios a maior parte com pinturas rupestres e outros com característica de aldeias onde se encontravam dispersos fragmentos de cerâmica e material lítico (BORGES, 2007). Incialmente o trabalhos desenvolvidos compreendiam a seguintes etapas:

Tabela 04: Etapas das pesquisas arqueológicas nos primeiros anos das pesquisas. Etapas

Atividades desenvolvidas na região do PNSC no inicio de 1970



Localização e mapeamento das áreas prospectadas.



Descrição dos abrigos e elaboração de croquis dos mesmos.



Decalques das pinturas em plásticos transparentes.



Levantamento fotográfico completo dos painéis.



Descrição e localização dos painéis.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 – (Acervo da FUMDHAM).

7

Entrevista Dra. Niéde Guidon, Fevereiro de 2014.

58

Destacamos que o apoio da comunidade foi muito importante neste momento, pois o trabalho de prospecção aconteceu com um diálogo com as pessoas da comunidade que passavam as informações dos locais que possivelmente tinham sítios arqueológicos. Considerando a realidade da época existiam poucas estradas, muitos sítios eram de difícil acesso necessitando assim o apoio de uma pessoa para ajudando abrir um caminho para passagem dos pesquisadores, observamos o relato de Nilson Alves Parentes.

[...] Quando a Niède chegou ai eu conhecia todas. As tocas que eu conhecia, então eu levava ela a lugar que dava pra nos ir de a pés nós ia, chamava pra ir de animal nós ia levava a carga nos animal nos de saca as costas as vezes tinha lugares que eu abria pinicadas saia com o facão abrindo pinicadas e ela atrás, todo mundo de saca as costas, ela mais duas, duas mulheres fazia três, eu muitas vezes mas ela as vezes arranjava mais gente pra levar as patrulhas dela, máquina, comida para passar de um dia pro outro, a gente ajuntava mais pessoas pra ir com a gente mas que a missão foi andada a pé, cortando mato fazendo umas pinicadinha pra passar de um dia pro outro no mato, a chegada da Niède Guidon aqui a gente sofreu muito8.

A própria Dra. Niéde Guidon reconhece a relevância da comunidade nos anos inicias das pesquisas arqueológicas e nos conta como eram às comunidades que viviam ao entorno do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), antes do mesmo ser criado.

Bem a realidade Várzea Grande era um povoado pequeno, São Raimundo era uma cidade muito pequena onde não tinha nada, não tinha correio, não tinha banco, não tinha absolutamente nada e era inclusive difícil conseguir a comida pra os alunos e prá gente passar a semana no campo né, era sempre na feira do sábado que agente vinha pra fazer compras e tivemos nos primeiros anos 1973 e 1975 não havia estradas pra lugar nenhum, todo acesso foi feito a pé com os guias que eram então pessoas da comunidade e todos os lugares que agente foi na zona rural, nas roças que estavam isoladas por ai sempre fomos muito bem recebidos às pessoas inclusive faziam beiju, café pra gente quer dizer ajudaram muito sem o auxilio deles não teríamos descoberto tudo isso 9. (Negrito - Grifo do autor).

Na primeira metade da década 70 o projeto da Missão Franco-Brasileira no Piauí (Figura: 04), iniciado com a colaboração cientifica entre do Museu Paulista da USP e o Centro Nacional de Pesquisa Cientifica (CNRS), vai ter maior consolidação, de forma que é realizada pela UFPI em pareceria com a USP a primeira especialização em Antropologia Préhistórica com o estágio prático em São Raimundo Nonato (PI) no ano de 1973.

8 9

Entrevista: Nilson Alves Parentes, Setembro de 2013. Entrevista Dra. Niéde Guidon, Fevereiro de 2014.

59

Figura 04: Pesquisas Arqueológicas desenvolvidas pela Missão-Franco Brasileira.

Fonte: Acervo de Fotografias da Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM).

Considerando a importância dos sítios, a quantidade, variedade e qualidade dos vestígios arqueológicos, além destes pontos fortes, outros fatores como a beleza da paisagem, e da cobertura natural foi possível verificar um potencial turístico na região, considerando também os impactos causados pela presença humana que cada vez mais se fazia notar, os pesquisadores tomaram por escolha levar a conhecimento das autoridades existência do patrimônio10. No ano de 1975, após três meses de trabalhos em que as equipes de pesquisadores fizeram um balanço dos trabalhos realizados e das mudanças perceptíveis nos ecossistemas regionais, assim como as mudanças nas estruturas socioeconômicas do local a Dra. Niède de Guidon enviou uma carta ao então governador do Estado do Piauí, Dr. Dirceu Arcoverde, expondo os fatos e solicitando a criação do Parque Nacional na área para proteger o meio ambiente e preservar os sítios arqueológicos.

Senhor Governador [...] Minha intenção é realizar a cobertura dessas lapas antes que elas sejam destruídas, de modo que fiquem documentadas para sempre. [...] Tenho verificado 10

Plano de Manejo do Parque Nacional Serra da Capivara.

60

de 1970 para 1973 e para 1975 que certas pinturas foram destruídas. Lapas imensas cobertas de desenhos hoje estão nuas nas paredes erodidas, pedaços de rochas com restos de figuras caídas no solo. Procurando saber as razões obtivemos a informação de que durante a seca os habitantes queimaram a vegetação dos baixões e, às vezes, o vento empurrava o fogo de tal modo que ele chega até as lapas das beiradas das falésias e o calor fez explodir as paredes estragando para sempre esse patrimônio cultural brasileiro. Seria impensável proibir essas queimadas, mas talvez a solução que o governo do Piauí conseguisse junto ao Governo Federal que toda essa região, incluindo zonas dos municípios São Raimundo Nonato, São João do Piauí, Canto do Buriti e Caracol, fosse transformada em Parque Nacional 11.

Conforme solicitado o pedido no dia 05 de junho de 1979, dia do Meio Ambiente, foi assinado o Decreto Nº 83548 e publicado no Diário Oficial de 06 de junho de 1979, criando o Parque Nacional da Serra da Capivara. Parque este que tinha como finalidade proteger a flora, a fauna, as belezas naturais, e os monumentos arqueológicos.

Art. 1º - Fica criado, no Estado do Piauí, o Parque Nacional da Serra da Capivara, com a área de aproximadamente 100.000 ha, subordinado ao Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal - IBDF Autarquia Federal vinculada ao Ministério da Agricultura, compreendida dentro do seguinte perímetro: o ponto inicial (ponto 1) é determinado a 1.000 m a oeste da nascente principal do Riacho Nova Olinda sobre o paralelo 08º50'S, desse ponto segue em linha seca de aproximadamente 20.500m coincidente ao paralelo 08º50'S até o ponto geograficamente determinado pelas coordenadas 42º32'28"W E 08º50'S. Deste ponto segue por aproximadamente 16.000 m no sentido W-L (oeste-leste) acompanhando a cota de 400 m até encontrar linha telegráfica que liga São João do Piauí a São Raimundo Nonato12.

Todo o processo que desencadeou a criação do Parque Nacional Serra da Capivara acaba por responder as questões políticas e sociais que são daquele momento, de forma que uma análise feita após quase quarenta anos tem que ser feita considerando o distanciamento do contexto da época. Assim como apresentou Certeau (1982) as pesquisas no campo das ciências humanas articulam-se com o lugar de produção sócio econômico, político e cultural. Compreende um meio de elaboração circunscrito por determinações próprias: uma profissão liberal, um posto de observação ou de ensino, uma categoria de letrados, etc. O pesquisador está, submetido a imposições, ligado a privilégios, enraizado em uma particularidade. É em função deste lugar que se instauram os métodos, que se delineia uma topografia de interesses, que os documentos e as questões, que lhes serão propostas, se organizam. Em concordância com a documentação do plano de manejo, (1991 p.5 - 6)13 a criação do PNSC teve múltiplas motivações a quais podemos elencar: 11

Carta encaminhada ao Governador do Estado do Piauí. Decreto Presidencial a qual cria o Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC). 13 Plano de Manejo do PNSC. 12

61

A)- Ambientais: situado em áreas semiáridas, fronteiriça ente duas grandes formações geológicas a bacia sedimentar do Maranhão-Piauí (atualmente Bacia Sedimentar do Parnaíba) e a depressão periférica do São Francisco no escudo cristalino pré-cambriano, e em domínios morfológicos da caatinga, região que apresenta uma rica biodiversidade da fauna e flora, pouco estudadas, além de algumas espécies em extinção. B) - Turísticas - com paisagens de uma beleza natural surpreendente, com pontos de observação privilegiados, esta área possui importante potencial para o desenvolvimento de um turismo cultural e ecológico, tornando uma alternativa de desenvolvimento para a região, cujos recursos naturais são limitados pela época de seca. C) - Culturais - na unidade encontra-se a maior concentração de sítios arqueológicos atualmente conhecidos nas Américas, a maioria com pinturas e gravuras rupestres, nos quais são encontrados vestígios extremamente antigos da presença do homem. Quase uma década após a criação do Parque Nacional Serra da Capivara em 16 de maio de 1984, Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos recursos Renováveis (IBAMA) da Secretaria do Meio Ambiente, antigo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), assinou um convênio com Instituto Terra do Piauí (INTERPI) a fim que procedesse a demarcação do Parque e sua caracterização fundiária. Quando nesta ocasião, por erro de informação considerava-se que o Parque Nacional da Serra da Capivara não tivesse ocupantes14. Através da documentação existente, observamos certo descompasso que decorre na criação do Parque Nacional Serra da Capivara, pois é determinada a criação do Parque Nacional, sem conhecer a área a qual é designado, fato que provocara uma delicada situação de conflito com a desapropriação das comunidades tradicionais.

O pessoal ficou com a reação triste, uns queria vender as terra, chegava gente que vendia terra, já outros chegava dizia tal, aquelas pessoa aqueles políticos vinha com aquelas historinha e a reação lá foi grande, foi uma tristeza quando o pessoal foi pra sai do Zabelê, ai foi desativado, modo o Parque Nacional, algumas pessoas foram indenizadas, outras muito pouco, ai foi aquele desbandai danado, a reação deles era grande. Então teve gente que com o que recebeu lá não dava pra compra uma casa em lugar nenhum e outros deu pra compra carro, outros deu pra compra propriedades, quem se interessou por propriedade deu pra compra e outros não deu pra compra nada, senhor sabe que em todo lugar tem pessoas com as coisas mais do que os outros né, aqueles que tinham mais roça mais terra mais gado, ai deu mais dinheiro né! As pessoas que tinham a casinha e a rocinha de pouco dinheiro, ai quando saiu dali não deu pra compra nada e ai ficaram perambulando (13) treze anos pelas periferias de São Raimundo15.

14 15

Plano de Manejo do Parque Nacional. Entrevista: Nilson Alves Parentes, Setembro de 2013.

62

Em meio ao relato do nosso entrevistado Sr. Nilson Alves Pereira fica a impressão de uma memória muito forte com o antigo povoado de maneira que sua narrativa trata de um sentimento de perda e desligamento de suas origens. Na pesquisa de campo teve um momento que questionamos ao senhor Pedro Alcântara como os filhos e familiares veem o antigo povoado Zabelê? Emocionado o ele respondeu:

Rapaz eles não tem uma visão boa, até porque quando chega o mês de novembro que é obrigado a gente visitar os nossos antepassados que estão lá enterrados, a gente pra visitar precisa ir lá no IBAMA pegar uma autorização para poder viajar e também precisa de um guarda pra nos acompanhar. Então nessa parte eles veem assim, uma visão como nos quase criminoso, porque até pra visitar o que e nosso precisa de um acompanhamento dos guias para poder visitar então não e bom não 16.

De acordo com as colocações do Senhor Pedro Alcântara verificamos que a forma de desapropriação e indenização causaram impactos e grande insatisfação na comunidade do Zabelê, principalmente para aqueles que receberam indenização pequena ou nem foram indenizados. Em sua entrevista Pedro Alcântara relata ainda o descompasso ocorrido com a desapropriação: [...] pra que o povo fosse indenizado pra desocupar a área ai foram fazer, só que não foi do jeito que eles disseram, por que primeiro o povo recebeu a indenização muito baixa e outros não receberam de maneira nenhuma e a terra que ela prometia ao povo que quando saísse de lá já ia pra outra terra também não foi arrumada não deu, então o povo recebeu uma pequena indenização lá foram obrigados a saírem com tempo marcado pra desocupar a área e não tendo pra onde ir aquele dinheiro da indenização, muitos num dava nem pra fretar um carro pra trazer as coisas do zabelê pra cidade e outros dava pra fretar mas não sobrava. Então o povo vieram quase tudo morar em são Raimundo ficaram ali naqueles altos daquelas periferias de são Raimundo sem trabalho e também sem dinheiro, ai foi aonde ocorreu o sofrimento17.

Diante da fala acima notamos que a desocupação da comunidade do Antigo Zabelê pela forma a qual sucedeu, deixou uma marca de perda, considerando o lado financeiro, mas também uma perda de pertencimento a um lugar que era um lugar de memória construído a partir das vivencias. Por outro lado é possível verificar nos relatos de Sr. Pedro Alcântara o reconhecimento do quanto é importância de preservar esse patrimônio cultural existente na área do (PNSC). Perguntado se o mesmo considera importante a preservação do Patrimônio existente no PNSC, Pedro Alcântara responde: “[...] Eu não sou contra, eu sofri, mas não sou contra a 16 17

Entrevista Pedro Alcântara, Setembro de 2013. Entrevista Pedro Alcântara, Setembro de 2013.

63

preservação que hoje a gente vê dentro da área do parque, eu do valor, do 100 pra Dra. Niède que preservou essa área que hoje agente encontra quando chega lá faz gosto agente vê”18.

5.1.1 A Comunidade Zabelê

Um importante trabalho de pesquisa realizado sobre o antigo povoado Zabelê foi desenvolvido por Emília Godoi (1993) em sua dissertação de mestrado, onde a autora faz uma documentação do histórico, por meio da memória, registrando uma série de hábitos culturais, presentes no cotidiano daquela comunidade. No entanto a ausência das entrevistas realizadas pela mesma dificulta uma melhor análise das fontes orais, presentes em sua pesquisa. O Assentamento Novo Zabelê foi criado no ano de 1997, e está localizado a aproximadamente 10 km da cidade de São Raimundo Nonato, as margens da PI 140 (LIMA NETO, 2013). A respeito do nome do povoado de acordo com Godoi (1993) em resultado obtido atraves de relatos orais, o mesmo surge ocasionalmente decorrido com uma ave deste mesmo nome. Conforme os relatos, um trabalhador em atividade diária de derrubada da caatinga para ser preparada a terra para a roça, capturou uma ave Zabelê, devido a isso o local ficou como referência conhecido como: Zabelê (Figura 05).

Figura 05: Imagem da ave em extinção Zabelê.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 (Site: Guia Petecia).

18

Entrevista: Nilson Alves Parentes, Setembro de 2013.

64

Destacamos que é algo da cultura local colocar os nomes dos lugares relacionados a eventos significativos do dia-a-dia, diferente de outras comunidades de que atribuem o nome a lideranças locais. No entanto, as comunidades tradicionais têm sofrido constantemente, com uma recente mudança de seus nomes tradicionais por nomes de lideres políticos, que têm pouca relação com as mesmas. Por este fato achamos significativo buscar registrar e dar continuidade no nome de origem das comunidades tradicionais. O povoado Zabelê conforme documentação escrita, era uma comunidade de pouco mais de duzentas pessoas que moravam na região onde foi criado o Parque Nacional Serra da Capivara, como observamos na documentação do plano de manejo. O Decreto a qual assegurou a criação do PNSC vem a nos mostrar que não se tinha conhecimento por parte do Governo Federal da existência de moradores nesta área, o que vem a demostrar uma falha no sistema público, pois o estudo e demarcação da Unidade de Conservação deveria ter ocorrido anteriormente a sua criação. De acordo com o Plano de Manejo do Parque Nacional Serra da Capivara que posteriormente vai ser tombado pela UNESCO19 como patrimônio da humanidade inscrito em dezembro de 1991:

Foram identificados pelo IPARJ (cf. do IPARJ ao IBDF) 251 ocupantes, sendo 130 proprietários, 118 posseiros e 2 incluindo na categoria outros ( total de 250, o que discrepa do primeiro dado). Noventa e um ocupantes residiam dentro da área de 167 eram não residentes (total de 258, o que é uma nova discrepância) 20.

Estas famílias que residiam no antigo povoado Zabelê, tinham as condições de sobrevivência, baseado em boa parte nos alimentos retirados da própria localidade, através da caça e do plantio de uma agricultura de subsistência. Contudo, a atividade de caça contribuía para que alguns animais que corriam risco de extinção tornassem cada vez mais escassos como, por exemplo, o tatu-bola (Tolypeutes tricinctus), caititu (Tayassu tajacu), o veado (Mazama gouazoupira), para agricultura conforme Nilson Alves Parente compreendia o plantio do milho, mandioca, feijão e melancia. Além das atividades expostas acima é importante considerar que tinham outras economias paralelas a essas como a criação de animais dentre eles cabras, ovelhas, porcos, vacas e galinhas, ainda vamos ter a extração do látex da maniçoba como uma fonte de renda. Na (Figura: 06) observamos uma imagem que demostra cenas do cotidiano na comunidade e os camponeses reunidos após o abate de um boi para o açougue local. 19 20

Organizações das Nações Unidas para Ciências E Educação. Plano de Manejo do PNSC, p. 9.

65

Figura 06: Imagem de camponeses do Povoado Antigo Zabelê.

Fonte: Pesquisa de Campos, 2013 – (Acervo da FUMDHAM).

De certo estes moradores viviam em uma comunidade tradicional pautada em costumes comunitários e convívio coletivo, onde alguns costumes eram passados através de uma educação familiar ou até mesmo através de lendas, segundo Albertina Araújo Landim ao narra a lenda da Porca da meia noite expõe:

A porca da meia noite era uma mulher que por ter abusado sexualmente de seu filho, virava uma porca. A mesma quando ia virá porca se esfregava no local onde o jumento tinha se deitado, e quando alguém a feria com uma faca ou mesmo com revolver, sem que ninguém a reconhecesse, mas no outro dia a mesma ficava sem nenhum ferimento21.

O exemplo desta lenda que tinha como finalidade exercer um controle moral e criar condição própria de organização contribuindo para consolidação de uma unidade pautada em costumes. Esta lenda vem a caracterizar essa comunidade como sendo uma comunidade tradicional que conserva entre os seus sujeitos uma série de valores presentes no dia-a-dia.

21

Disponível em: < http://www.fumdham.org.br/culturaimaterial/contos_lendas.asp>Acessado 28/09/2013.

66

O convívio coletivo compreendia desde buscar água em um “olho d’água”, atividade popular de “buscar agua na fonte”, praticar a caça de animais, estes ainda construíam casas utilizando como predominou do uso de rochas ou ainda a construção pau-a-pique e a produção de olaria como telhas e tijolos artesanal caracterizando arquitetura vernácula (Figura: 07).

Figura 07: Casa de pedra pertencente ao pai do Senhor Nilson Alves Parentes, Antigo Povoado do Zabelê.

Fonte: Pesquisa de Campos, 2008 – Biblioteca da FUMDHAM (apud Borges 2008).

É importante lembrar que os habitantes quando viviam no povoado Antigo Zabelê não tinham conhecimento de que aquelas pinturas fazem parte de um conjunto de sítios arqueológicos, na comunidade quando um morador se referia as pinturas, dizia que era algo deixado pelos indígenas, era muito usual chamar as pinturas de letreiros de caboclo. A comunidade não via os índios como sendo seus antepassados, embora que muitos deles tenham descendência indígena. O processo de colonização no sudeste do Piauí e o contexto que por sua vez valorizou os pecuaristas e colocou o indígena como não civilizado acabou por levar estes camponeses a negar seu pertencimento a grupos indígenas e afirmar uma descendência dos “desbravadores” da região.

67

Questionado o senhor Nilson Alves Parentes, sobre qual a relação da comunidade com as pinturas rupestres antes da chegada dos pesquisadores? Foi respondido:

[...] As pinturas não eram nem todo mundo que conhecia, e quando eu era da idade de 8 (oito) anos a 10(dez) anos eu gostava de andar mas meu avô nas pedras, ai eu via aquelas pinturas ai eu perguntava vô e oque e isso? Ele disse isso aqui, isso ai foram os índios que fizeram, ai as pinturas traduzindo, traduzindo era dos índios, então eu achava muito bonito e toda toca que eu chegava eu ia olha se os índios tinham andado, tinham escrito do aquilo ali, então tomei conhecimento daquilo, daquelas pinturas desde menino, então na região que eu andava tinha muitas então eu conheci varias e varias tocas com aquelas pinturas22. (Negrito-grifo nosso).

De acordo com Brito (2011) a desocupação da daquela área foi favorável a legitimação da implantação do Parque Nacional Serra da Capivara, a desapropriação das comunidades tradicionais, em especial o povo do Zabelê, que vivia no interior da região delimitada como reserva ambiental, é também parte integrante deste processo, pois traz consigo a essência do conflito e da animosidade entre as comunidades tradicionais e os órgãos administradores do Parque Nacional Serra da Capivara. Pedro Alcântara fala sobre o legado que foi deixado ao ter que sair do Parque:

Olha a minha resposta sobre aquele pessoal, o Parque Nacional ele veio deixando muita vantagem criando emprego, formando gente, muita gente se formando, dentro do conhecimento de parque, agente vê hoje as pessoas tão tudo se formando em linguagem em língua de recebimento do povo de turismo foi uma coisa muito boa, mas menos pras pessoas que vieram lá de dentro da área do parque, essas pessoas que vieram de dentro do parque têm sido muito poucas os beneficiados pela equipe do parque. Até eu quero lhe dizer sinceramente que desse povo que vieram lá de dentro do parque não existe nenhum empregado pela FUMDHAM pela fundação, aqui dentro desse povo que foi obrigado a sair não existe nenhum. A outra parte que quero lhe dizer é que no meu ponto de vista foi muito bom porque hoje dentro da área do parque existe muito tipo de animal que já estava pode dizer em extinção de acabar, hoje se a gente entra no parque se vê muito tatu encontra muito com eles tem demais, cutia que é uma praga parece moco ali na serra de cutia, bandeira estava pouco hoje existe muito bandeira e lapiche de bola, até as onças que naquela época era pouco por causa que o couro da onça dava muito dinheiro e acabo o valor hoje dentro da área do parque não só dentro da área mas na região toda já existe muita onça então essa parte aí foi muito boa, , aquela parte que eles beneficia dentro da área quer dizer que agente chega lá já acha uma diferença grande, porque hoje existe muito animal dentro da área e também a conservação das tocas das matas, porque muitos deixaram aquele trabalho aquelas roças mataram tudo hoje é só a mata então isso pro meu ponto de vista é muito bom, só que se ela tivesse cumprido o que ela prometeu pra nos ainda melhor agente podia fazer uma entrevista dizendo que pra nos da comunidade tinha sido muito bom, só que pra nós do Zabelê foi muito ruim.23.

22 23

Entrevista Nilson Alves Parente, Setembro de 2013. Entrevista Pedro Alcântara, Setembro de 2013.

68

Na pesquisa de campo quando tivemos a oportunidade de entrevistar a pesquisadora Dra. Niéde Guidon levantamos questões referentes à desocupação e indenização dos moradores da área do PNSC e em depoimento a pesquisadora fala dos problemas burocráticos para o pagamento da indenização. [...] O que nos fizemos, eu fui a Brasília e conversei com o pessoal e consegui que eles pagassem pelas benfeitorias, pelas casas, pelas roças e tudo ai. A Fundação foi encarregada fomos nós que fizemos a avaliação então o que nos fizemos, por exemplo, todo aquele Zabelê tudo aquilo foi completamente estudado e fizemos de maneira que o valor dessa indenização cumprisse o valor da terra se fosse deles, tudo isso foi feito e eles receberam, todos receberam inclusive receberam terras pra isso tem o Novo Zabelê que foram terras doadas pras pessoas que saíram de lá24.

Por outro lado partindo da analise da pesquisa por intermédio da história oral, fica registrado que os entrevistados, antigos moradores do povoado Zabelê, criaram um sentimento de perda de identidade com seu antigo modo vida, pois muitas das suas falas já direcionam para a construção de um enredo, que apresenta o antigo povoado como lugar ideal, na construção do imaginário. Pedro Alcântara fala das lembranças que traz do antigo povoado Zabelê:

[...] É muitas, muitas lembranças tras demais, primeiro vem à lembrança de quando nos tudo morava ali, vem à lembrança de quando era noite juntar todo mundo, fica uns na casa do outros palestrando até às 10 horas da noite. Outras pessoas aquelas mocidade iam brincar de roda, brincar de muita brincadeira. Agente também tem a lembrança quando chega naquele lugar daqueles amigos da gente que vivia tudo junto naquele lugar e hoje uns vivem esbandaiado pra todo canto uns tão no Pará outros estão em Brasília outros estão em São Paulo porque não arrumaram como sobreviver mais aqui, tiveram que ir embora e não tiveram mais a oportunidade de serem cadastradas no assentamento então trás todo esse tipo de recordação umas recordações boas e outras ruins porque aquilo que agente passou lá que agente tem como lembrança que nem que agente sofresse, mas aquele sofrimento pra gente era uma bondade vista hoje, então agente tem aquela lembrança àquela sensação que já foi que já passou muita coisa boa naquele lugar e hoje não tem, mas aquele direito de passar25. (Negrito-grifo nosso).

Quando terminou a entrevista de Sr. Pedro Alcântara, procurando saber de uma outra pessoa para dar informação, era dada como reposta o seguinte [...] entrevista determinada pessoa, pois a outra não sabe contar a história não, pois é da comunidade depois de estar aqui instalada. Então existe uma eleição informal de quem tem guardado na memória os fatos ocorridos no Antigo Zabelê e que tem a mesma visão da desapropriação. Uma grande parte desse assentamento, Novo Zabelê, é composta de famílias que viviam no antigo povoado e tiveram que deixar suas terras no período de desapropriação e 24 25

Entrevista, Dra Niède Guidon, Fevereiro de 2014. Entrevista, Pedro Alcântara, Setembro de 2013.

69

implantação do PARNA. Para as pessoas, a qualidade de vida quando residiam no antigo povoado Zabelê era melhor. A maioria dessas famílias que foram desapropriadas foi indenizada, no entanto, os entrevistados afirmam que a terra desvalorizou-se desde o período de avaliação até o recebimento da verba correspondente, o que segundo eles, dificultou a compra de nova casas. Nota-se que as condições inflacionarias da época provocavam esta instabilidade financeira, fato que motivou muitas pessoas a deixarem suas terras para viverem em outros Estados como: São Paulo, Pará, Distrito Federal, Brasília, outras vivem de pequenas roças que existem aos arredores do Parque ou trabalham na cidade de São Raimundo Nonato.

5.1.2 A Comunidade Sítio do Mocó

A região onde localiza-se hoje o município de Coronel José Dias, até á chegada das fazendas de gado era ocupado por grupos indígenas. Como resultado da expansão da pecuária extrativista que predominou até o século XIX, tem-se a colonização da região Sudeste do Piauí, por intermédio de instalação de fazendas, uma delas é a Várzea Grande que surge por volta do século XVIII, sendo constante neste meio o conflito e dizimação de grupos indígenas (GODOI, 1999). Como líder desta bandeira que atinge essa região por volta da metade do século XIX, vamos ter Vitorino Paes Landim, que será reconhecido pelos relatos orais dos moradores mais velhos como o fundador, e de onde parte as várias linhagens para formação das famílias que habitaram a região. Com as instalações das fazendas onde localiza-se hoje o Parque Nacional Serra da Capivara surgem as comunidades tradicionais, entre as quais podem ser citadas, povoado Zabelê e o Sítio do Mocó, selecionados para análise neste estudo. A primeira é atualmente pertencente ao município de São Raimundo Nonato e a segunda a Coronel José Dias, no entanto na década de 70 quando se inicia as pesquisas na região ambas pertenciam ao município de São Raimundo Nonato que tinha uma dimensão territorial maior. O Sítio do Mocó (Figura: 08) é uma das localidades em que parte da população teve que desocupar as terras em virtude da criação do parque, no entanto o impacto foi menor que o Povoado Zabelê, pelo fato que houve a possibilidade dos moradores residirem nas proximidades do PNSC.

70

Figura 08: Povoado Sítio do Mocó Localizado Município Coronel José Dias.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013, (Biblioteca da FUMDHAM).

Criado em 1992, o município de Coronel José Dias surgiu a parir do desmembramento de São Raimundo Nonato. Possui uma população de aproximadamente 4.511 mil habitantes, sendo que parte significante reside em áreas fronteiriças com Parque Nacional Serra da Capivara e sofreram modificações em seu modo vida, pois a própria dinâmica na comunidade acabou sendo modificada, devido ao contato com os turistas que vêm visitar o PARNA. De acordo com Senhor Valdemar Paes Landim com a chegada do Parque Nacional houve grandes mudanças na região aumentou o número de habitantes, melhorou com a chegada de energia e de escolas, além de também ter sido uma fonte de renda já que moradores da localidade trabalham no PNSC.

[...] Há melhorou muita coisa. Aumentou tudo. Aumentou os moradores, aumentou tudo aqui, e depois isso aqui não tinha quase nada, era pouca mesmo, daí pra cá melhorou muito, vem melhorando ai depois do Parque já tem muita gente empregada daqui trabalhando ali dentro [...] Porque não tinha ganhado pra gente, não tinha nem uma escola pra botar o filho não tinha nada, só trabalhava na roça mesmo, era o sofrimento daqui era matando um tatu era pegando uma coisa no mato pra comer pra da um filho 26.

O povoado Sítio do Mocó (Figura: 09), foi uma das comunidades que vive no entorno do PNSC que obteve mais benefícios com sua criação, pois muitos moradores foram 26

Entrevista, Valdemar Paes Landim, Setembro, 2013.

71

qualificados e inseridos em diversos trabalhos da FUMDHAM, alguns em escavações, condutores de pesquisadores (guias), outros se tornaram agentes de segurança, entre outras atividades.

Figura 09: Povoado Sítio do Mocó a 4 km da BR 020.

Fonte: Pesquisa de Campo – 2013 (Acervo Pessoal do Autor).

Uma de nossas entrevistadas neste povoado foi Beatriz Salomé de Lima, que trabalha como Agente de Portaria do PNSC e teve filhos inseridos em projetos sociais desenvolvidos pela FUMDHAM, a respeito da criação do parque Beatriz relata: E até que tem umas partes que ficaram achando meio ruim, mas só que não tinha como num desfazer das terras porque o Parque tinha que continuar e não podia continuar com as pessoas entrando pra dentro pra ficar trabalhando, porque atrapalhava muito o desenvolvimento e a conservação, também das coisas ai tiveram que ceder as terras. Comprou as terras do pessoal ai, ai ficou tudo bem o pessoal começou a arrumar emprego todos tão trabalhando agora 27.

Zilda Pereira de Sousa e Rafael Rodrigues de Sousa concederam entrevistas. A senhora Zilda fala que chegou a trabalhar auxiliando pesquisadores em escavação na área do

27

Entrevista Beatriz Salomé Lima, Outubro 2013.

72

PNSC e analisa os pontos positivos da criação do Parque. “[...] Aqui foi bom demais que, aqui era tudo atrasado, aqui não tinha estrada, criou estrada, não tinha água criou água, a energia não tinha criou energia tem escola, tem emprego, tem tudo, aqui só esta faltando chuva, tivesse chovendo aqui era beleza”.

Figura 10: Entrevista com Zilda Pereira de Sousa e Rafael Rodrigues de Sousa.

Fonte: Pesquisa de Campo – 2013 (Acervo Pessoal do Autor).

Foi questionado também referente aos pontos negativos com a criação do PNSC, o Senhor Rafael Rodrigues de Sousa respondeu que:

Não, não aqui foi tudo no acordo, tudo que veio pra dentro do Parque foi bom de mais, aqui num tinha estrada mesmo, de São Raimundo pra cá tinha que passa uns poucos de dia para ir em São Raimundo, e agora não, agente vai dentro de meia hora, num existia energia aqui era tudo na base do candinheirinho, que dizer que se ela (Dra. Niéde Guidon) não vem talvez já tivesse, mas não estava adiantado como está, aqui contava as casas que existia, aqui e hoje ai esta um povoado beleza 28. (Negrito - informação adicionada pelo autor).

Outro entrevistado em nosso estudo foi o Senhor Antônio Luís Barbosa, que já apresenta uma visão diferente dos entrevistados mencionados acima o senhor Antônio Luís Barbosa relata sobre a relação das pessoas com as pinturas rupestres é ele nos fala; “[...] Conhecia não, a gente que trabalhava nesse povoado a gente via aquelas pinturas, pra mim 28

Entrevista, Rafael Rodrigues de Sousa, Outubro 2013.

73

não valia nada né, mas pra eles hoje esta valendo muita coisa, a gente via aqueles desenhinhos lá e achava que não era nada [...]29”. O Senhor Antônio Luís Barbosa fala também sobre suas terras dentro do limite do PNSC, e como é vista por ele a indenização: “[...] Eu mesmo era de uns que tinha 10 hectares (ha) de terra ai dentro do povoado do Parque e ela me desativou, me deu uma mincharia no tempo, ai ela tomou as propriedade de muita gente aí, mas fazer o que né [...]”30. A maior parte dos moradores da localidade do Sítio do Mocó que tiveram suas terras anexadas ao PNSC, e receberam indenização e ainda contaram com projetos de apoio da FUMDHAM, como escolas e outros projetos sócios-culturais, foram implantados como o da Cerâmica, Apicultura (Figura: 11), Confecção de roupas, arqueólogos Mirins. Estes projetos visavam qualificar as comunidades e gerar alternativas econômicas.

Figura 11: Capacitação de pessoas da comunidade para o trabalho de apicultura ao entorno do PNSC.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 – (Biblioteca da FUMDHAM).

De acordo com depoimentos obtidos a partir da história oral, a exemplo do relato de Rosa Maria diz, que a FUMDHAM tomando conhecimento do processo impactante da criação do Parque Nacional Serra da Capivara, desenvolveu algumas atividades sociais buscando reparar danos sofridos por estas comunidades. 29 30

Entrevista Antônio Luís Barbosa, Outubro de 2013. Entrevista Antônio Luís Barbosa, Outubro de 2013.

74

Dra. Niéde Guidon relatou em entrevista que a ideia sempre foi usar o PNSC, para desenvolver a região. Então esses projetos como o da cerâmica e da apicultura foram criados com o apoio do Banco Interamericano, pois já até existia a prática de obtenção do mel, mas de forma acabavam por matarem as abelhas no final, visto isso a FUMDHAM conseguiu recursos trouxemos técnicos pra ensinar pessoas da comunidade. Partindo deste ponto de analise, surgem algumas estratégias que vêm a beneficiar as comunidades que localizavam nas proximidades do PARNA e vem a ser classificadas como sendo ações de Arqueologia Pública (AP).

5.2 Projetos Sociais e Educativos no contexto das pesquisas arqueológicas do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC).

5.2.1

Núcleos de Apoio a Comunidade (NACs)

Antes de iniciar a redação desta parte da pesquisa abro espaço para destacar algumas produções acadêmicas que trabalharam a implantação do PNSC e educação patrimonial, e as mudanças ocorridas no meio social. Dentre as principais pesquisas destacamos o estudo de Síria Borges (2007) e Marlene Costa (2008), pois estes são estudos que nos possibilitam compreender

o

desencadeamento

dos

fatos

assim

como

nos

estimulam

outros

questionamentos. É consensual entre diversos estudos e a até mesmo da própria FUMDHAM, que o processo da criação do PARNA da Serra da Capivara repercutiu de diversas formas na vida das pessoas que anteriormente habitavam terras que passou a ser área do Parque Nacional. O sentimento de perda, de despedida é manifestado nos relatos orais que hoje constituim a memória dos sujeitos envolvidos nesse processo. Entendendo que a desocupação dessas áreas era necessária em vista dos diversos fatores que ocasionavam a degradação ambiental e descaracterização da paisagem, a ameaça da fauna e da flora e ainda pelas ações de risco como queimadas que dificultavam assegurar a preservação dos sítios arqueológicos, a FUMDHAM começou a trabalhar estratégias que pudessem minimizar os impactos e problema vivenciados por aquelas populações que foram

75

desalojadas, sendo que um destes programas implantados foi o de Núcleos de apoio a comunidade - NACs (FUMDHAM, 1992 apud COSTA, 2011). Os NACs foram implantados pela FUMDHAM, em convênio com a ONG Terra Nuova (Itália) no início de década 90, com a finalidade de melhorar as condições de Ensino Básico e profissional no município de São Raimundo Nonato (COSTA, 2011). Um dos locais em que funcionou uma dessas escolas foi na comunidade do Sítio do Mocó no município de Coronel José Dias, a escola recebia aproximadamente 40 crianças das comunidades. No prédio em que eram desenvolvidas essas atividades contavam além da escola com um posto de saúde e alojamento para os professores. Posteriormente o projeto foi expandido para outras comunidades atendendo um número de 750 crianças e adolescentes. Eram ofertadas desde a Creche até o Ensino Fundamental Maior, cursos de alfabetização para adultos, além de cursos técnicos para a comunidade (COSTA, 2011). Na figura abaixo segue a imagem do prédio escolar em que eram desenvolvidas as atividades.

Figura 12: Escola atualmente fechada no Povoado Sítio do Mocó onde funcionava os (NACs).

Fonte: Pesquisa de Campo – 2013 (Acervo Pessoal do Autor). .

De acordo com a pesquisadora Dra. Niéde Guidon, a ideia era que com a criação do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), pudesse criar novas alternativas para a população

76

local, e compreendendo a realidade da região, ficou percebido que as escolas não eram acessíveis para todos, devido a isso surge a implantação das escolas que apoiassem essas comunidades, sendo aplicado práticas educativas que estivessem comprometidas com a valorização do patrimônio da comunidade. De acordo com Borges (2007), foi observada uma situação de conflito entre as relações políticas desenvolvidas pela FUMDHAM e o governo municipal, Estadual e Federal, onde os interesses educacionais voltados para a preservação do patrimônio foram suplantados pelos interesses econômicos e políticos, que levaram ao fechamento de 05 escolas do entorno do PNSC, que recebiam mais de 750 alunos do Ensino Fundamental, Médio e Técnico. Com o fechamento dessas escolas a educação nessas comunidades ficou ao encargo do poder público municipal sendo de caráter obrigatório. Até mesmo pelo fato que é previsto nas Leis Diretrizes de Base da Educação Nacional 9.394/96 Artigo 11, que incumbir-se-ão os municípios de:

I-Organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições de ensino, integrando as políticas e planos educacionais da União e dos Estados; II-Exercer ação redistributiva em relação as suas escolas; III-baixar normas complementares para seu sistema de ensino; IV-Autorizar, credenciar e supervisionar, os estabelecimentos de ensino; [...] (LDB, p.50)

Então por uma questão de escolha dos líderes municipais, prefeitos optaram por gerir a verba municipal que era direcionada a essas escolas destes municípios e não fazer o repasse para a FUMDHAM. Devido a tal acontecimento após alguns anos de funcionamento dos NACs, a FUMDHAM, declarou a falta de condições para manter essas escolas e consequentemente ocorreu o fechamento das mesmas.

Fizemos um acordo com as prefeituras, primeira coisa Prefeito foi lá como tinha tudo tinha geladeira, congelador roubaram tudo que tinha na escola e levaram pra casa ate as bombas dos poços, porque tinha poço pra ter agua na escola ai eu peguei botei eles todos pra forra e ficou tudo fechado, quer dizer o problema que nos temos e isso com as pessoas que seriam as autoridades eles seriam autoridades só pra pegar pra eles e isso e um problema muito grave 31.

31

Entrevista, Niède de Guidon, Fevereiro de 2014.

77

A partir da pesquisa de campo identificamos que entre os fatores que impossibilitaram a continuação das escolas foi o fato da FUMDHAM não estar de acordo com administração a local e entender que determinas práticas dificultam a construção do processo ensino aprendizagem, como, por exemplo, problemas na administrativo, a falta de estruturas, falta de investimento e treinamentos de mão-de-obra adequada.

5.2.2

Pró-Arte FUNDHAM: A Busca de Novos Caminhos.

Visto o fechamento dos NACs, a FUMDHAM continuou a desenvolver algumas atividades educativas de maneira não-formal no campo da educação pela arte, nos locais das escolas e nas mediações do Museu do Homem Americano. No primeiro momento essas atividades não tinham um nome especifico, com o surgimento do Edital do Instituto Airton Sena as criadoras do projeto, Cristiane Buco (Fundadora) e Lina do Carmo (Co-fundadora) inscreveram um projeto que vai ser denominado PRÓ-ARTE FUMDHAM32.

Figura13: Sede do Pró- Arte FUMDHAM em São Raimundo Nonato (PI).

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 – (Biblioteca da FUMDHAM).

Portanto, o Pró Arte FUMDHAM surge formalmente quando o projeto é ganhador do Edital, torna-se o principal projeto sócio-educativo da Fundação Museu do Homem 32

Entrevista concedida por Rosa Maria, na sede do Museu do Homem Americano em Setembro 2013.

78

Americano iniciado em 2001 e finalizado em 2013, viabilizando oportunidades educativas através da Arte Educação. Essas ações sociais, educacionais e artísticas são iniciativas que valorizam o potencial regional, propiciando novas alternativas e oferecendo oportunidades aos moradores dessa região, por meio principalmente da educação por meio e ainda de cursos técnicos de curto prazo (COSTA, 2011). A partir deste cenário de acordo com Costa (2011) o PRÓ-ARTE FUMDHAM concentrou seus trabalhos na sede de São Raimundo Nonato, pois teria melhores condições para gerir estas atividades. Um dos questionamentos que surgiam em nosso estudo é se as atividades desenvolvidas pelo Pró - FUMDHAM Arte encaixavam-se dentro do rol das atividades de educação patrimonial. Constatamos que o Pró-Arte FUMDHAM trabalhava sim com o patrimônio arqueológico tanto de forma direta como indiretamente. Uma das entrevistas realizadas foi a Educadora Rosa Maria (Figura: 13) que relata sobre as atividades desenvolvidas, assim como o objetivo das atividades. Figura 13: Rosa Maria Educadora do Pró-FUMDHAM.

Fonte: Pesquisa de Campo – 2013 (Acervo Pessoal do Autor).

Conforme Rosa Maria relatou a princípio foram poucos educadores inseridos nas atividades do Pró-Arte FUMDHAM, em sua maior parte eram profissionais da FUMDHAM, os arqueólogos, as pessoas que trabalhavam na FUMDHAM a Cristiane, Elaine Ignácio a própria Lina do Carmo (Figura: 14), pesquisadores que vinham fazer pesquisas por 1(um)ou 2(dois) anos na FUMDHAM acabavam contribuindo com o trabalho de educação do PróArte, a medida que a primeira geração de educandos foi adquirindo conhecimento sobre o

79

próprio programa de educação eles tornaram-se em educadores, também com cargos de monitores, mais frente na eles assumiram a função de educadores. É importante destacar que alguns alunos posteriormente se inseriram no trabalho de arqueologia uns como técnicos em laboratórios da FUMDHAM, outros seguiram outras áreas. Na entrevista com uma educadora do Pró-Arte (FUMDHAM), Rosa Maria relata que neste projeto eram desenvolvidas diversas atividade, de maneira que compreendiam: capoeira, dança, música e o teatro. Trabalhando em contra turno escolar que permitia a participação dos alunos sendo um projeto que também oferecia atividade de leitura, com momentos que destinados ao reforço escolar também.

Figura 14: Crianças em atividade educativa pelo Pró-Arte FUMDHAM no (PNSC).

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 (Site: de Lina do Carmo).

Marilene dos Santos Costa era a educadora que trabalhava com educação patrimonial, abordando questões referentes a criação do PNSC, realizando visitas ao museu, aos laboratórios, além de trabalhar o potencial do patrimônio cultural que existia nestas comunidades tradicionais e em São Raimundo Nonato (PI) de onde vinham essas crianças.

80

Lembramos também que algumas atividades educativas aconteciam e apoiavam alguns eventos realizados pela FUMDHAM como festivais de artes33.

5.2.3

A Criação do Museu do Homem Americano.

Nesta parte da pesquisa propõe-se uma reflexão sobre a criação do Museu do Homem Americano, devido a sua importância na construção de uma arqueologia que oferece a divulgação dos estudos, e até mesmo levar a comunidade regional a conhecer um pouco do homem pré-histórico, o museu tornou-se ao longo do tempo uma ferramenta pedagógica com a possibilidade do desenvolvimento de aulas de campo pelas escolas municipais e estaduais da região de São Raimundo Nonato (PI). Consideramos que a exposição das pesquisas arqueológicas nesta cidade compreende uma grande quantidade de materiais, poderíamos falar de duas exposições diferentes: primeiro destacamos os muitos sítios arqueológicos presentes no Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), que constituem um museu a céu aberto, segundo o material exposto para visitação no Museu do Homem Americano na cidade de São Raimundo Nonato (PI), local onde também funcionam os laboratórios de pesquisas, onde são guardados os materiais nos acervos, nas reservas técnicas e depositos. Em entrevista Dra. Niéde Guidon relata, que são necessárias as exposições e o acondicionamento adequado do material em São Raimundo Nonato (PI), por diferentes fatores dentre eles, pelo fato de ser importante que o material permaneça em São Raimundo Nonato para futuras pesquisa e ainda para que os municípios do entorno sejam beneficiados pelo fluxo de turistas.

[...] Uma das coisas que pensamos é que primeiro para ajudar o desenvolvimento da região precisa de um museu, em todos esses locais vocês tem um lugar onde os turistas vão ver o que foi descoberto. Então criamos um museu no início desse Museu quando você entrava tinha informação das formações geológicas da região e tudo sobre os povos que aqui viveram. Depois a parte humana ficou tão grande que teve que tirar parte da natureza por isso que a gente vai fazer agora o museu da natureza no município de Coronel José Dias porque a ideia é que todos os municípios do entorno do Parque serem beneficiados pelo Parque34.

33 34

Entrevista, Rosa Maria, na sede do Museu do Homem Americano, Setembro 2013. Entrevista, Niède Guidon, Fevereiro 2014.

81

O investimento feito para criar condições de visitação ao patrimônio natural e cultural, sem que fosse prejudicada sua conservação, denota um esforço para pensar em uma infraestrutura adequada sendo atualmente existem 170 sítios arqueológicos preparados para visitação dos quais 16 tem acesso para pessoas portadoras de necessidades especiais. Portanto as estruturas têm sido pensadas de forma que permitam a acessibilidade ficando claro um projeto de inclusão social. Figura 15: Sítio Boqueirão da Pedra Furada (BPF).

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 – Biblioteca da (FUMDHAM).

Vale ressaltar que a interação com a comunidade acontece a partir de dois meios: primeiros a exposição do material arqueológico, e a inserção de pessoas da comunidade em atividades remuneradas, como técnicos em arqueologia, guardas do PNSC, agente de portaria e outros setores. Uma de nossas entrevistadas foi Riquelma Pereira Dias recepcionista do Museu do Homem Americano e ela fala sobre suas expectativas estando inserida nessas atividades:

Antes de vir trabalhar aqui, é como eu falei para você eu tinha ido morar fora. Eu vim conhecer depois de que eu comecei trabalhar aqui no Museu. Aí eu conheci o Parque, não todo aqui é enorme e ter conhecimento dessa parte da história saber mais, interessar mais, até voltei a estudar, que estava parada a um tempão, comecei a estudar de novo35.

35

Entrevista, Riquelma Pereira Dias, Agosto de 2013.

82

Em nosso estudo tornou-se objeto de investigação o desenvolvimento das pesquisas arqueológicas o interação das pesquisas com a comunidade. Aprofundado nossa pesquisa na região de São Raimundo Nonato constatou-se que desde os anos inicias a coordenadora das pesquisas arqueológicas Drª Niéde Guidon teve o interesse em fazer a divulgação dos estudos até então desenvolvidos. O primeiro acervo foi para as dependências do prédio do Movimento Brasileiro de Alfabetização MOBRAL, (Figura: 16) onde o Sr. José Bastos Lopes ficou responsável por receber e cuidar de todo o material arqueológico tanto o doado quanto o descoberto nas pesquisas de campo. Devido o aumento da quantidade dos achados arqueológicos desde a primeira Missão Franco-Brasileira, de 1973, houve a necessidade de encontrar outro local mais adequado para expor o acervo (BORGES, 2007).

Figura 16: Centro de Pesquisas Interdisciplinares sede própria em São Raimundo Nonato.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 – Biblioteca da FUMDHAM.

No ano de 1974 o Museu Paulista da Universidade de São Paulo efetuou a Segunda Missão de Estudos do Estado Piauí, tendo a primeira ocorrido um ano antes em 1973, quando a segunda missão foi concluída já existiam 60 sítios cadastrados. De acordo com o relatório do referido ano, e a potencialidade levantada, os pesquisadores justificaram a criação de um

83

núcleo de pesquisa em São Raimundo Nonato com apoio da prefeitura local através do prefeito Sr. Newton de Castro Macedo, que segundo consta em relatório era consciente da importância do potencial cientifico daqueles sítios36. A partir da leitura de Costa (2011) as pesquisas interdisciplinares realizadas com o objetivo de promover a interação homem e meio ambiente, cultura material e imaterial e a população local foi instigada através de atividades acadêmicas e culturais, buscando criar um sistema de produção alternativa, para que aproximasse a comunidade das pesquisas através da exposição, propiciando também a geração de empregos. As práticas interdisciplinares além de proporcionar novas aprendizagens, esta é uma prática de Arqueologia Pública (AP), que fortalece o laço de pertencimento com patrimônio cultural existente, que até então, como observamos nos relatos orais, havia um desconhecimento por parte dos entrevistados. Na figura abaixo fica o registro de moradores da comunidade visitando os acervos arqueológicos:

Figura 17: Sala de exposição do Centro de Pesquisas Interdisciplinares sede própria em São Raimundo Nonato (PI) década de 80.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 – (Acervo da FUMDHAM).

36

Relatório da 2ª Missão-Franco Brasileira 1974.

84

Ações como criação do museu, palestras na comunidade empregos vinculados a pesquisas no Parque vem a caracterizar uma prática Arqueologia Pública (AP) ocorrida desde o início das pesquisas, fortalece nossa hipótese de que a arqueologia pública nessa região já era praticada bem antes da consolidação do conceito de Arqueologia Pública no Brasil. De acordo com os relatos de Dra. Niéde Guidon a ideia de expor o material arqueológico e criar um Museu vem desde 1973 e o grande incentivador foi o professor José Lopes. No entanto o Museu do Homem Americano foi inaugurado apenas em 21 de Janeiro de 1994 com o apoio financeiro do Ministério da Educação e a colaboração do governador do Piauí daquela época. Por falta de verbas para a instalação das exposições passam-se quatro anos para a conclusão das mesmas, em 1998 inaugura-se a exposição permanente retratando 500 do Brasil. Recentemente no ano ao de 2009 o Museu passa por uma reforma, adequando em sua exposição com o uso de novas tecnologias, possibilitando uma maior interação da comunidade com as pesquisas arqueológicas (Figura: 18).

Figura 18: Sala com exposição digital das pesquisas desenvolvidas no (PNSC).

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013 (Biblioteca da FUMDHAM).

Avaliamos que durante os 40 anos de pesquisas muito se avançou sobre o conhecimento arqueológico e o acesso do público ao Parque Nacional Serra da Capivara e nos

85

sítios arqueológicos. De acordo com Rosa Maria mudou também a preocupação da FUMDHAM, pois a realidade já é outra diferente de trinta anos atrás, devido a isso se enceram algumas práticas educativas para que outras sejam colocadas em práticas a partir da realidade de hoje.

5.2.4

A Criação da Graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial

Depois que apresentamos o potencial arqueológico da área do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), talvez fique um pouco mais compreensível o porquê da criação de um curso de graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial na cidade de São Raimundo Nonato (PI), somado isso acreditamos que a criação do curso é uma maneira de qualificar e aproximar mais ainda a comunidade de seu patrimônio. Entretanto nos questionamos, o curso de arqueologia pode ser considerada uma estratégia de arqueologia pública? Frente a essa indagação procuramos saber a partir da entrevista com Dra. Niéde Guidon de onde parte a ideia de criar a graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial? Conforme seu relato, a mesma informou que foi solicitada para que ela e Dra. Anne Marie Pessis elaborassem um programa para criação de um curso de Arqueologia em Petrolina (PE) pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF). No entanto, visto que a município de Petrolina apresentava pouco potencial a Dra. Niéde Guidon e Dra. Anne Marie Pessis apresentou-se o projeto do curso, desde que o mesmo fosse criado em São Raimundo Nonato-PI. Sendo atendida a sugestão apresentada, nasce o curso de graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial a partir de ação de colaboração entre a UNIVASF e a FUMDHAM local onde funcionavam as primeiras turmas até a construção do prédio da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF). De acordo com Barbosa (2011) o curso de Arqueologia e Preservação Patrimonial têm como proposta desenvolver ações para o desenvolvimento e proteção do semiárido. A Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF) iniciou suas atividades, a partir da publicação da Lei N. 10.473 de 27 de junho de 2002, e após 2 anos, ou seja em 2004 é implantado o curso de Arqueologia e Preservação Patrimonial

efetivando a primeira

graduação em arqueologia em uma Universidade Federal no Brasil - sendo instalado no campi de São Raimundo Nonato, PI, junto ao Parque Nacional Serra da Capivara, por motivos estratégicos.

86

A criação do curso de Bacharelado em Arqueologia e Preservação Patrimonial, responde à crescente demanda de arqueólogos, demonstrando uma vontade política nacional de preservar o patrimônio cultural e atendendo ao interesse renovado dos municípios da região Nordeste em resgatar seu passado pré-histórico e histórico com vistas a estimular a visitação turística37. A documentação vem apresentando de forma clara que a localização do curso na cidade de São Raimundo Nonato, Estado do Piauí, dá-se por conta de o curso ter como campo de atuação para as áreas de ensino e pesquisa o Parque Nacional Serra da Capivara, que abriga um grande acervo cultural. Verificamos que a criação do curso no município de São Raimundo Nonato é uma forma de gerar novos arqueólogos na região, fator importante como relatos a Dra. Niéde Guidon que enfatiza a necessidade formar arqueólogos locais, pois os arqueólogos que vem de outro regiões terminando seus estudos retornam à suas cidades de origem. Em pesquisa de campo foi constado que um total de 60 (sessenta) estudantes concluiram a graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial até a o período de 2013.1como mostra o (Gráfico: 02). Gráfico 01: Dados referente a número de estudantes formados em Arqueologia e Preservação Patrimonial, nos ultimos seis anos38.

FONTE: Pesquisa de Campo, 2014 - Arquivos da Coordenação do Curso de Arqueologia e Preservação Patrimonial da UNIVASF. 37 38

Projeto Pedagógico em Arqueologia e Preservação Patrimonial – UNIVASF. Dados com referência a data de 27 de Fevereiro de 2014

87

Observando dados quando falamos de Arqueologia Pública (AP) em São Raimundo Nonato (PI), uma análise da criação da graduação em Arqueologia, viabiliza a constatação da preocupação em tentar potencializar a formação profissional na região e possibilitar a interação com a comunidade. Logo, o Projeto Pedagógico (PP) denota em seu texto que a UNIVASF traz consigo mecanismos de inserção no desenvolvimento regional, procurando não deixar dúvidas quanto ao seu compromisso e a responsabilidade social. Acreditamos que a discussão sobre a prática de Arqueologia Pública (AP) torna-se efetiva à partir da realidade do próprio curso, pois existem atividades de extensão desenvolvidas como, por exemplo, através do projeto de extensão: Patrimônio Cultural e turismo comunitários em áreas quilombolas: o sítio arqueológico e paleontológico sob a ótica da ciência e da sabedoria popular39 e ainda pelo Programa de Educação e Tutoria (PET)40, entre outras atividades.

39

Projeto de extensão realizado sob a coordenação de Professora Ms. Nívia Paula de Assis e apoio da ProReitoria de Extensão da Universidade Federal do vale do São Francisco. 40 Programa de Educação e Tutoria, intitulado São Raimundo Nonato: para além dos 100 anos, voltado para estudos sobre a arqueologia de histórica, sob coordenação de Professor Dr. Celito Kestering.

88

6

CONSIDERAÇÕES FINAIS Iniciamos este estudo discutindo o que é arqueologia, pois consideramos sua

concepção importante para refletir sobre a prática da Educação Patrimonial (EP) e Arqueologia Pública (AP), dentro desta discussão constatamos que toda Arqueologia é pública ou ao menos deveria ser, já que o estudo da arqueologia só faz sentido quando buscamos razões que possibilitem elucidar questões do presente e nos auxiliar na compreensão dos fatos históricos. Nesse contexto a memória que é um fenômeno coletivo e social torna-se fundamental para construirmos uma relação com nosso passado. Para que possamos cultivar a memória, preservar e relacionar com a cultura material é fundamental manter os lugares de memórias, os artefatos e vestígios que marcam os processos históricos que constroem nosso passado. A partir do histórico da arqueologia verifica-se que a mesma passa por diferentes momentos e que em sua última fase, a arqueologia pós-processual ou arqueologia contextual, tivemos uma maior abertura para estudos dos grupos marginalizados no processo histórico e junto a esta nova vertente surge a preocupação com as comunidades que estão envolvidas com as pesquisas de forma direta e indiretamente, nascendo um novo campo designado de Arqueologia Pública (AP), que concentra sua preocupação em inserir a comunidade e fazer com que está possa compartilhar da memória coletiva dos bens patrimoniais, sendo a mesma conhecedora e sujeito importante no processo de Educação/Preservação Patrimonial para gerações futuras. Diante de tais concepções direcionamos nosso estudo para o contexto das pesquisas arqueológicas na região do Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), desde já, adiantamos que a questão é um tanto complexa, principalmente pela forma como se deu a implantação do Parque Nacional Capivara (PNSC) e os impactos causados nas comunidades desapropriadas por outro lado, os empregos gerados, os projetos sociais e educativos realizados no contexto das pesquisas arqueológicas minimizam os impactos. Não propomos a chegar a resposta conclusiva, mas levantamos uma problemática que consideramos importante, que é discutir se as atividades desenvolvidas pela FUMDHAM podem estar inseridas dentro das práticas de Arqueologia Pública (AP). Para obtermos qualquer resposta adiantamos se faz necessário analisar o papel da FUMDHAM, das comunidades e, sobretudo do Governo que é a instituição maior representada em seus três poderes (Legislativos, Executivo e Judiciário).

89

Destacamos que ficou claro que o processo de desapropriação e de indenização das comunidades foi um processo falho, que deixou de prever uma série de fatores, desde a criação do Parque que acontece sem ter o conhecimento de comunidades dentro da área da Unidade de Conservação, provocando problemas que se prolongaram por bom tempo e seguem até dias atuais. Frente a todos estes problemas verificamos o reconhecimento da comunidade sobre a importância de se preservar o patrimônio arqueológico existente e que o Parque Nacional Serra da Capivara (PNSC), projeta a região de São Raimundo Nonato (PI) como um lugar que abriga um importante patrimônio cultural. Observamos que a arqueologia pública é entendida como a interação da arqueologia com as sociedades (FUNARI, et ali 2008). Durante estes 40 anos de pesquisas científicas na região, vários foram os projetos criados para as comunidades como por exemplos os NACs que foram os Núcleos de Apoio a Comunidade, além deste, outros projetos foram implantados como o Pró-Arte FUMDHAM, arqueólogos Mirins. São projetos educativos que trazem consigo particularidades em comum, por exemplo, os Núcleos de apoio a Comunidade (NACs), eram mais voltados para a educação e alfabetização em escolas de tempo integral. O Pró-Arte FUMDHAM foi um projeto que surgue em reposta ao fechamento dos NACs, ambos trabalharam com uma proposta de Educação Patrimonial (EP). O projeto dos Arqueólogos Mirins foi menos duradouro é especifico da área de arqueologia, vêm denunciando uma preocupação praticar Arqueologia Pública (AP). Uma das vertentes que caracteriza a Arqueologia Pública (AP) é inserir pessoas da comunidade nos trabalhos de escavações e outras atividades de pesquisa, fato que pode-se verificar que foi ocorrido nas pesquisas Arqueológicas do (PNSC). Não somente a preocupação em inserir em atividades de pesquisas, mas observamos a criação de projetos sociais que pudessem gerar uma nova alternativa de renda como o projeto da cerâmica da apicultura, e confecção de roupas. A construção de um Museu em São Raimundo Nonato (PI) que funciona desde os primeiros anos de pesquisas e mais recentemente a criação de uma graduação em Arqueologia e Preservação Patrimonial que é a primeira em Universidades públicas, no país, são concretizações de práticas de Arqueologia Pública (AP). Diante do que foi apresentado pontuamos que a pesquisa ainda não esta concluída, pois seria interessante obter mais dados através do aprofundamento das pesquisas, entrevistando um maior número de pessoas envolvidas neste contexto do Parque Nacional

90

Serra da Capivara (PNSC) e poder verificar ações de educação patrimonial e os prós e contras da criação do Parque Nacional.

91

7

REFERÊNCIAS

BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, Márcia Bezerra. O australopiteco corcunda: as crianças e a arqueologia em um projeto de arqueologia pública na escola. Tese (Doutorado em Arqueologia) – MAE, Universidade de São Paulo, 2002. ALMEIDA, Márcia Bezerra & CAROMANO, Caroline F. O que é arqueologia. IN: Arqueologia e Educação Patrimonial em Serra Leste, Curionopólis, Pará. (org. Márcia Bezerra, Denise Pahl Schaan, Caroline Fernandes Caromano), 1 ed. Belém GKNoronha, 2012. BAHN, Paul; REFREW, Colin. Arqueologia - Teorias, Métodos y Practica. Madrid: Akal, 1998. BARBOSA, Maria Fátima. O curso de Arqueologia e Preservação Patrimonial da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), campi de São Raimundo Nonato, PI. Jornal da Sociedade Brasileira de Arqueologia: Arqueologia em Debate. Nº. 3 de Junho de 2011. BASTOS, Rossano. Registro Arqueológico como Instrumento de Memória Social. Revista de Arqueologia Pública. (Laboratório de Arqueologia Pública) Campinas, Nº 4, 2011. BICHO, N. Ferreira. Manual de Arqueologia Pré-Histórica. Ed. 70. Rio de Janeiro, 2011. BEAUDRY, M. C.; COOK, L. J.; MROZOWSKI, S. A. Artefatos e Vozes Ativas: cultura material como discurso social. Vestígios – Revista Latino-Americana de Arqueologia Histórica, Belo Horizonte - MG, v. 1, n. 2, p. 73-113, Jul/Dez 2007. BLOCH, Marc. Introdução a Historia. Portugal: Publicações. Europa-América, s/d. BORGES, Síria E. N.; Invenção do patrimônio mundial: Parque Nacional Serra da Capivara. (Dissertação de Mestrado em História do Brasil), UFPI, 2007. BRITO, Ariel Da Mata. Implantação do Parque Nacional Serra da Capivara e a criação forçada de uma nova identidade, o novo Zabelê. (Monografia Apresentada no Curso de graduação em História) UESPI, 2011. BUCO, C. de Andrade & GUIDON, Niéde. “O estado da Arte”: As pesquisas Arqueológicas e o Desenvolvimento Regional na Região do Parque Nacional Serra da Capivara. IN: Tempo, Memória e Patrimônio Cultural. (Org. Áurea da Paz Pinheiro & Sandra C. A. Pelegrini. EDUFPI, 2010. CARNEIRO, Carla Gibertoni. Ações educacionais no contexto da arqueologia preventiva: Uma proposta para Amazônia. Tese (Doutorado em Arqueologia) MAE, Universidade de São Paulo, 2009. CASCON, Leandro Matthews. Cultura Material e Arqueologia. IN: Arqueologia e Educação Patrimonial em Serra Leste, Curionopólis, Pará. (org. Márcia Bezerra Almeida, Denise Pahl Schaan, Caroline Fernandes Caromano), 1 ed. Belém GKNoronha, 2012. CHOAY, Francoise. Alegoria do patrimônio. Tra. Luciano Vieira Machado – São Paulo: Estação Liberdade. Ed. UNESP, 2001.

92

CHUVA. Márcia. Por uma História da Noção de Patrimônio Cultural no Brasil.IN: Revista do Patrimônio Histórico Artístico Nacional. Nº 34, 2012. COSTA, Diogo Menezes. Arqueologia Patrimonial: O pensar do Construir. Revista Habitus, Goiana, vol.2, 2004. DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. História oral: memória, tempo, identidade. 2ª edição Belo Horizonte: Autêntica, 2010. DIEGUES, Antônio Rodrigues. O Mito Moderno da Natureza Intocada. São Paulo : Hucitec,1996. GODOY, Emília Pietrafesa de. O trabalho da memória: Cotidiano e História do Sertão do Piauí. Campinas, SP: editora da UNICAMP, 1999. GUIDON, Niède. Parque Nacional Serra da Capivara: modelo de preservação do Patrimônio arqueológico ameaçado. Revista do Patrimônio Histórico Artístico Nacional, Nº 33, 2007. FERNANDES, José Ricardo Oriá. Ensino de História e diversidade cultural: Desafios e Possibilidades. Cad. Cedes, Campinas, vol. 25, n. 67 p. 378-388 set/ dez. 2005 disponível em < http:/www.cedes.unicamp.br>. FONSECA, Maria Cecilia Lurdes. O Patrimônio em Processo: Trajetória da Política de Preservação no Brasil. 2 ed. Rio de Janeiro, Editorial UFRJ, IPHAN, 20005. FUNARI, P. Paulo & PELEGRINI, Sandra C. A.; Patrimônio História e Cultura. Rio de Janeiro; ed. Jorge Zerar, 2006. FUNARI, P. P. et ali. Arqueologia Pública no Brasil e as Novas Fronteira. São Paulo. Revista Praxis Archeologica . V. 3 UPC. 2008. FUNARI, P. Paulo & GONZÁLEZ, Erika. Ética, Capitalismo e Arqueologia Pública no Brasil. História, São Paulo, 27 (2): 2008. FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 18. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra , 2005. HORTA, Maria de L. P; GRUNBERG, Evelina & MONTEIRO, Adriane Queiroz. Guia Básico de Educação Patrimonial - Brasília: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Museu Imperial, 1999. IPHAN, Proteção e revitalização do Patrimônio Histórico e Artísitico do Brasil – Trajetória. Brasília. Fundação Nacional Pró-memória, 1980. LIMA, Elmo de Souza. Formação continuada de professores no semiárido: Ressignificando saberes e práticas. Teresina: EDUFPI, 2011. LIMA, Leiliane P. & FRANCISCO, Gilberto da Silva. O que é isso? Para que serve? Quem são vocês? O que fazem? Uma experiência de Arqueologia Pública em Paranã – TO. Revista de Arqueologia Pública. (Laboratório de Arqueologia Pública) Campinas, Nº 1, 2006. LIMA NETO, Marcos Pereira. Por uma educação contextualizada. Ensino e aprendizagem de história modalidade eja na escola elzair rodrigues de oliveira povoado novo zabelê São Raimundo Nonato - PI: um estudo de caso. (Monografia Apresentada no Curso de Especialização em Educação do Campo) UESPI, 2013.

MATOS, Julia Silveira & SENNA, Adraina Kivanski. História Oral como Fonte: problema e métodos. Historia, Rio Grande, 2 (1): 95-108, 2011.

93

MEIHY, José Carlos S. B. & HOLANDA, Fabíola. História Oral: como fazer como pensar. 2 ed. – São Paulo, Contexto, 2010. MORAES, Allana Pessanha de. Educação Patrimonial nas Escolas: Aprendendo a Resgatar o Patrimônio Cultural. Laboratório de Estudos do Espaço Antrópico-LEEA, na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, 2005. OLIVEIRA, Jaime de Santana. Por uma Educação Contextualizada com Patrimônio Arqueológico em São Raimundo Nonato - PI: O Caso do Parque Nacional Serra Da Capivara. (Monografia Apresentada no Curso de Especialização em Educação do Campo) UESPI, 2013. OLIVEIRA, Jorge E. Por uma arqueologia socialmente engajada: arqueologia pública, universidade pública e cidadania. In: FUNARI, P. P. A.; ORSER, C. Jr; SCHIAVETTO, S. N. O. (Org.). Identidades, discurso e poder: estudos da arqueologia contemporânea. Editora Annablume, São Paulo, 2005; pp. 117-132. PARDI, Maria Lucia. SPHAN/IBPC: Informações sobre os órgãos de preservação do patrimônio arqueológico brasileiro. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia. Publicação Anual Nº 4 São Paulo, 1994. PLANO de Manejo, Parque Nacional Serra da Capivara, Brasília, 1991. POLLAK, Michael. Estudos. Memória e Identidade Social. Históricos, Rio de Janeiro, vol. 5, n. 10, 1992. PROJETO Pedagógico do Curso de Arqueologia e Preservação Patrimonial. (Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF) Petrolina-PE, 2008. SIMÕES, Maria Cristina Rocha. Preservação do Patrimônio Cultural em Cidades. 1ª Edição, Belo Horizonte, Autêntica, 2006. SILVA, Lucia. Trajetória de um Conceito: Patrimônio entre Memória e História. Mosaico – Revista Multidisciplinar de Humanidades, Vassouras, v. 1, n. 1, p.36-42, 2010. SILVERA, Leonel Abreu da. & ALMEIDA, Márcia Bezerra; Educação patrimonial: perspectivas e dilemas. ABA - Associação brasileira de antropologia. Ed. Novas letras, 2007. SOUSA, Maria Sueli Rodrigues de. O Povo do Zabelê e o Parque Nacional Serra da capivara no Estado Piauí: tensões, desafios de gestão principiológica da complexidade constitucional. (Tese de Doutorado) UnB, 2009. TRIGGER Bruce G. História do Pensamento Arqueológico. Tradução: Ordep Trindade Serra) São Paulo, Odysseus Editora, 2004. TEIXEIRA, Cláudia Adriana Rocha. A Educação Patrimonial no Ensino de História. Biblos, Rio Grande, 22 (1): 199-211, 2008. VAZ, Gláucio Luiz. A implantação do Parque Nacional Serra da Capivara e as consequências sócio-econômicas para as comunidades tradicionais/ Gláucio Luiz Vaz. – Botucatu: [s.n.], 2005.

94

ENTREVISTAS

ALCÂNTARA, Pedro. Depoimento: Agricultor (trabalhou como auxiliar em atividade pesquisas em atividade na FUMDHAM). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (37:32 Min), [08 SET, 2013]. BARBOSA Antônio Luís. Depoimento: Agricultor (Morador do entorno do PNSC). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (11 Min) [05 OUT, 2013]. LIMA, Beatriz Salomé de. Depoimento: Agente de Portaria (trabalha como Agente de Portaria do PNSC). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (16 Min), [05 OUT, 2013]. DIAS, Riquelma Perreira. Depoimento: Recepcionista (trabalha como recepcionista no Museus do Homem Americano). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (18:13 Min), [17 SET, 2013]. GUIDON, Niède. Depoimento: Pesquisadora (Coordenadora das pesquisas no PNSC). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (30:00 Min), [10 FEV, 2013]. FERREIRA, Gaspar Dias. Depoimento: Ex-prefeito do Município de São Raimundo NonatoPI. Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora. [16 OUT. 2013]. PAES LANDIM, Valdemar. Depoimento: Agricultor (Morador do entorno do PNSC). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (13 Min) [08 SET, 2013]. SANTOS, Agnaldo Ribeiro dos. Professor ( Ex-Educador do Pró-Arte FUMDHAM) Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (18 Min) [05 OUT, 2013]. SANTOS, Ariclenes da Costa. Depoimento: Técnico em Topografia ( ex-Aluno do Pró Arte FUMDHAM). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (18 Min) [12 OUT, 2013]. SOUZA, Zilda Pereira de. Depoimento: Dona de Casa (Moradora do entorno do PNSC). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (19 Min) [05 OUT, 2013]. SOUZA, Rafael Rodrigues de. Depoimento: Agricultor (Morador do entorno do PNSC). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (19 Min) [05 OUT, 2013]. GONÇALVES, Rosa Maria. Depoimento: Educadora (trabalhou como educadora no PRÒFUMDHAM). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (1h 4 Min), [19 SET, 2013]. PARENTE, Nilson Alves. Depoimento: Agricultor (Guia nos primeiros anos da pesquisa). Entrevistador: Jaime de Santana Oliveira, São Raimundo Nonato-PI. Câmera Filmadora (49 Min) [08 SET, 2013].

95

ELETRÔNICAS BRASIL. Decreto nº 83.548, de 5 de junho de 1979. Cria, no Estado do Piauí, o Parque Nacional da Serra da Capivara, com os limites que específica e da outras providências. Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, Disponível no site: . Acessado em 27/09/2013. >

ACERVO Biblioteca FUMDHAM São Raimundo Nonato - PI São Raimundo Nonato - Piauí. (Setor de documentação pesquisa arqueológicas 1970-2014).

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.