A EFETIVIDADE DA ATUAÇÃO DO TERCEIRO SETOR NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE

June 14, 2017 | Autor: V. Nascimento Mil... | Categoria: Direito Ambiental
Share Embed


Descrição do Produto

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO

VALMIR NASCIMENTO MILOMEM SANTOS

A EFETIVIDADE DA ATUAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES CIVIS NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE NO BRASIL

CUIABÁ/MT 2005

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO

VALMIR NASCIMENTO MILOMEM SANTOS

A EFETIVIDADE DA ATUAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES CIVIS NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE NO BRASIL

Monografia apresentada à Universidade Federal de Mato Grosso/Fundação Escola Superior do Ministério Público, como exigência parcial para obtenção do título de especialista em direito Agroambiental. Sob a orientação do Prof. Msc. Patryck de Araújo Ayala.

CUIABÁ/MT 2005



APRECIAÇÃO ______________________________ ______________________________ ______________________________ ______________________________

Agradeço

ao

incomparável,

Deus Criador

único

e

soberano,

fonte de toda ciência e sabedoria; pelo dom da vida e a dádiva da inteligência. Ao meu orientador, Prof. Patryck Ayala, pelo incansável apoio na condução pesquisa.

e

orientação

dessa

Dedico este trabalho à minha esposa Carla Marcele Milomem Santos pela compreensão e cooperação; Ao

meu

filho

Vinícius,

cujos

primeiros dias de vida coincidiram com as linhas finais desta pesquisa.

“Pois acontece muito não darmos ao que temos o justo valor, enquanto o temos; mas se o perdemos ou nos é tirado, exageramos-lhe então o valor, e só então descobrimos as qualidades que aquilo não nos mostrava quando era nosso”. Willian Shakespeare

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 10 CAPÍTULO I: A QUESTÃO AMBIENTAL ................................................. 13 1.1. A crise ecológica ................................................................................................. 14 1.2. O desenvolvimento sustentável e uma nova visão sobre a consideração do meio ambiente .......................................................................................................................... 15 1.3. Estado de direito ambiental ................................................................................. 18 1.4. Cidadania ambiental cosmopolita ....................................................................... 21 1.5. Cidadania ambiental coletiva .............................................................................. 25

CAPITULO II: PROTEÇÃO JURÍDICA DO MEIO AMBIENTE NO BRASIL ....................................................................................................................... 27 2.1. Tutela jurídica do ambiente: desafios aos Estados Nacionais e a realidade brasileira 27 2.2. O meio ambiente na ordem constitucional.......................................................... 29 2.2.1. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado .......................... 29 2.2.2. Meio ambiente: bem de uso comum do povo ........................................... 31 2.2.3. Divisão de responsabilidades entre o Poder público e a sociedade ........... 35 2.2.4. O princípio da equidade intergeracional: preservação para as futuras gerações ......................................................................................................................................... 36 2.2.5. Função sócio-ambiental da propriedade .................................................... 37 2.3. O meio ambiente na ordem infra-constitucional ................................................. 40 2.3.1. Lei federal - 6.938/81 ................................................................................. 40 2.3.2. Lei federal - 8.159/91 ................................................................................. 40

2.3.3. Lei federal - 9.795/99 ................................................................................. 40 2.3.4. Lei federal - 9.985/00 ................................................................................. 41 2.3.5. Decreto federal - 99.274/90 ...................................................................... 41 2.3.6. Decreto federal - 3.834/01 ........................................................................ 41 2.3.7. Lei federal - 9.433/97 ................................................................................ 41 2.3.8. Lei federal - 9.605/98 ................................................................................ 41 2.4. Os deveres do Poder Público na tutela do meio ambiente .................................. 41 2.4.1 A administração pública e o seu poder de policia...................................... 42 2.4.2. O papel do Ministério Público .................................................................. 43

CAPÍTULO III: A ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NO BRASIL: CONTEXTO E REALIDADE NORMATIVA ......................... 46 3.2. O Terceiro Setor: conceito e controvérsias ........................................................... 48 3.3. Definições terminológicas das organizações civis ................................................ 50 3.3.1. As organizações não-governamentais (ONGs) ......................................... 51 3.3.2. As organizações sociais (OS).................................................................... 52 3.3.3. As organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP) ........... 53 3.4. Natureza jurídica das organizações da sociedade civil no Brasil ......................... 55

CAPÍTULO IV: A EFETIVIDADE DA ATUAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES CIVIS NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE 58 4.1. O principio da participação e a atuação das organizações ambientalistas ............ 58 4.2. Instrumentos e condições para a eficácia da atuação das organizações ambientalistas ......................................................................................................................................... 61 4.2.1. Informação ambiental ............................................................................... 61 4.2.2. Educação ambiental .................................................................................. 63 4.2.3. Participação em órgãos de proteção ambiental ......................................... 64 4.2.4. Participação no âmbito administrativo...................................................... 66

4.2.5. Monitoramento e fiscalização ................................................................... 67 4.2.6. Envolvimento em projetos e pesquisas ..................................................... 67 4.2.7. Denunciação .............................................................................................. 67 4.2.8. Assessoramento......................................................................................... 68 4.2.9. Influência nas políticas públicas ............................................................... 68 4.2.10. Atuação na esfera judicial ....................................................................... 68 4.4. Ministério Público x organizações civis: quem efetivamente atua na esfera judicial? ......................................................................................................................................... 71

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 75 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS................................................................ 78

INTRODUÇÃO

A questão ambiental tem merecido amplo destaque no contexto internacional, partindo da constatação de que o desenvolvimento econômico e social, imprescindível à civilização moderna, está sendo alcançado às custas de acelerada, e em alguns casos, irreversível, degradação dos recursos naturais, gerando a perda da qualidade de vida e colocando em risco a própria sobrevivência humana. Situações graves como a contaminação das águas, o uso imoderado de agrotóxicos, a transformação de rios em corredores de esgotos a céu aberto, chuvas ácidas, destruição da vegetação natural, contaminação das águas, a desertificação de grandes regiões desmatadas, os altos índices de desemprego, o crescimento da criminalidade, a exclusão, o aumento dos cinturões de miséria, a falta de acesso à educação e à saúde, à fome, a banalização de mortes humanas, servem para dimensionar o problema, ao mesmo tempo que evidenciam a quase total ineficácia dos mecanismos jurídicos, principalmente aqueles destinados a evitar a degradação ambiental A crise ecológica global, portanto, se converte num processo social na medida em que os impactos de agressões ao meio ambiente repercutem de forma interdependente em escala planetária. A consciência ambiental se amplia e com isto cresce a percepção da noção de risco e o entendimento de que as transformações em curso estão se convertendo em ameaças cada vez mais preocupantes para toda a sociedade. Nesse contexto, as coalizões na sociedade civil estão se fortalecendo, explicitando escolha de temas e questões a serem enfrentadas em nome da busca de objetivos comuns, configurando a inflexão de uma dinâmica reativa para uma dinâmica propositiva, que aproxima as organizações não-governamentais (ONGs) e movimentos da mídia e que centra sua atuação nacoleta, sistematização e disseminação de informações. Destarte, a sociedade civil coloca-se hoje como a consciência política do mundo. Na medida em que se verifica a inaptidão e incapacidade dos Estados nacionais para lidar com diversas temáticas sociais relevantes, a sociedade civil, passa a ocupar espaços políticos cada vez mais importantes. Registra-se hoje a articulação de diversos movimentos

11

sociais e organizações não-governamentais em forma de rede e coalizão, possibilitando a atuação conjunta de diversos atores sociais regionais e internacionais na defesa de uma causa comum. Nessa teia social mundial, o elo de ligação é a informação. Através das redes de informação, possibilitadas principalmente pela Internet, as ONG’s e movimentos sociais trocam informações e articulam com muito mais eficiência as suas ações políticas de forma conjunta. A democratização e o acesso à informação configuram-se como as principais armas à disposição da sociedade civil para exigir ações e motivar a responsabilização de Estados e empresas privadas. As organizações civis ambientalistas se fortalecem no plano político e institucional, sendo cada vez mais reconhecidas pela sociedade e pelos governos, e crescentemente solicitadas a participar dos processos decisórios. Têm estimulado parcerias que potencializem ações que articulam o poder público local com associações de cidadãos para pensar o desenvolvimento sócio-econômico sob bases democráticas. Nos últimos anos diversas ONGs têm concentrado parte significativa das suas atividades na coleta e sistematização de informações estratégicas sobre a função dos ecossistemas a partir de levantamentos completos e detalhados sobre impactos dos processo de devastação e desflorestamento. A sua capacidade de diagnosticar áreas de risco - que vincula aspectos ambientais aos sócio-espaciais - possibilita uma influência crescente na formulação de políticas públicas sustentadas na adoção de cautelas ambientais. Nesse cenário, o objetivo geral deste estudo será, mediante um exame crítico responder os seguintes questionamentos: Como se dá a atuação das organizações civis na tutela do meio ambiente? E, até que ponto ela é efetiva? Especificamente, pretende-se analisar a questão ambiental que, compreende a valorização pelo homem, em nível internacional, da preservação ecológica para as presentes e futuras gerações. A importância da pesquisa repousa no aspecto social que apresenta o estudo, uma vez que a degradação ecológica produz fenômenos sociais. Os indivíduos se organizam em grupos buscando meios de conservação ecológica. O estudo também propõe análise doutrinária e legislativa, objetivando investigar alguns aspectos jurídicos relevantes, relacionados à tutela do meio ambiente pelo Poder Público e pelas organizações civis. Para melhor compreensão do que está a discorrer, o desenvolvimento do presente estudo nessa monografia divide-se em quatro partes principais.

12

Em primeiro lugar, será assentado o tema da questão ambiental. Discorrendo-se acerca dos principais acontecimentos que motivaram maior preocupação do homem com a preservação ecológica. Essa preocupação, de certa forma, permitiu a organização de um novo modelo de Estado e de cidadania, o Estado de Direito ambiental, e a cidadania ambiental cosmopolita. Nestes, a coletividade passa a atuar mais ativamente em prol da preservação do meio ambiente. Em seguida, no capítulo dois, será analisada a proteção jurídica do meio ambiente no Brasil. Partindo-se da investigação das diretivas constitucionais de 1988 relativas ao meio ambiente, bem como, dos princípios daí auferidos. Em seguida, uma rápida listagem das principais leis que regem o direito ambiental nacional, culminando com a análise da atuação do Poder Público frente ao problema ecológico. No terceiro capítulo, será abordada a organização da sociedade civil no Brasil. Faz-se, de início, uma rápida visão histórica no Brasil e, logo após, propõe-se a investigação das referências mais utilizadas para a consideração das organizações civis de proteção ao meio ambiente e, por fim, a análise da sua natureza jurídica. Na última parte do estudo, será analisada a maneira como se dá atuação das organizações civis na proteção do meio ambiente nas suas diversas frentes de trabalho, finalizando com o levantando da atuação judicial em relação ao trabalho do Ministério Público. In fine, a conclusão do estudo estabelecerá entre os títulos propostos, o resultado da presente pesquisa para, então, oferecer um entendimento completo e global do assunto. Inferindo, então, os resultados que se visa atingir.

13

CAPÍTULO I

A QUESTÃO AMBIENTAL

A questão1 ambiental - o conjunto de temáticas relativas não só à proteção da vida no planeta, mas também à melhoria do meio ambiente e da qualidade de vida das comunidades -, compõe a lista dos temas de relevância internacional mais abordados atualmente. Segundo RAMONET2, a temática ambiental percebido outrora como uma questão à parte, é cada vez mais apreendido como transversal a todos os campos. A proteção do meio ambiente impõe-se como um imperativo comum ao conjunto das sociedades. A convicção de que o planeta está em perigo aparece como uma das mais importantes tomadas de consciência política deste final de século. A proeminência da temática ambiental intensifica-se na medida em que o homem percebe o perigo a que está exposto, ocasionado pelo cenário de constantes degradações ambientais que se registram nas realidades local e global. A sociedade tem se conscientizado do imenso valor que possui o meio ambiente, levando, por conseguinte a adotar medidas que compreendam a proteção e o equilíbrio ecológico, tanto para a presente quanto para as futuras gerações3. Percebe-se que o grande chamariz para esse “retorno” da sociedade para a preservação ecológica não é outro senão o medo. O receio do quadro de catástrofes, destruição ambiental e desregramento ecológico tem impulsionado o homem a reavaliar a

1

“A questão ambiental constitui, nos últimos trinta anos, em uma das mais importantes dimensões de atenção e análise por parte dos múltiplos setores que compõem a sociedade contemporânea. Por diferentes motivações e necessidades, praticamente todo sujeito, individual ou coletivo, menciona o ambiente como aspecto indissociável da vida humana e mesmo para a possibilidade de vida na Terra”. LOUREIRO, Carlos Frederico B. Cidadania e globalização: contribuições para a educação ambiental. Disponível em: http://www.arvore.com.br/artigos/htm/ar2610_2.htm. Acesso em 05 de dezembro de 2004. 2 RAMONET, Ignácio. Geopolítica do caos. Tradução de Guilherme João de Freitas Teixeira. 4 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998, p. 32

14

importância da preservação ambiental. Tal conscientização tem como um de seus fundamentos as crescentes catástrofes ecológicas; principalmente as de natureza química, petrolífera e nuclear. Eventos como o caso de Chernobyl, devido à sua vasta amplitude e gravidade, desempenharam um papel expressivo na modificação de consideração humana em relação ao meio ambiente. Sobre esse ponto explicam ALPHANDERY, BITOUN E DUPONT: “Ao fim deste segundo milênio, a expressão mais manifesta da ecologia é o medo. Não um medo surdo, apático e com vergonha de si mesmo, mas um medo ostensinvo, que é dito e escrito, apregoado e filmado, e se oferece em um espetáculo nas dimensões da mundialização da comunicação. O medo ecológico é um grande medo planetário. “A Terra ameaçada”, “A Terra com a corda no pescoço”, “A Terra em perigo de morte”, “A Natureza na U.T.I, “Nós só temos um planeta”, dizem as manchetes dos jornais, as capas das revistas, os programa de televisão, construindo a ecologia espetáculo que incrédulos ou persuadidos, habituamo-nos agora a contemplar. Os fenômenos da moda, o gosto da mídia não são, no entanto, os únicos responsáveis. O grande medo ecológico cresce em terra fértil. Ele se alimenta da incessante descoberta de novos estragos do progresso, tanto em nossa porta quanto do doutro lado do mundo (...)”4 Esse cenário de constantes degradações ambientais que se registra cotidianamente nas realidades local e global provocadas pela ação antrópica no meio natural, colocou e coloca homens e mulheres contemporâneos diante de um desafio sem precedentes na história. 1.1.

A crise ecológica O crescimento econômico mundial trouxe graves conseqüências ambientais.

MILARÉ define bem a crise ambiental na qual estamos vivendo: “Tudo decorre de um fenômeno correntio, segundo o qual os homens, para satisfação de suas novas e múltiplas necessidades, que são ilimitadas, disputam os bens da natureza, por definição limitados. E é o fenômeno, tão simples quanto importante, que está na raiz de grande parte dos conflitos que se estabelecem no seio da comunidade. O homem, portanto, se depara com a finitude dos recursos ambientais, eis que sua preocupação sempre foi no

3

ALPHANDÉRY, Pierre; BITOUN, Pierre e DUPONT, Yves. O equívoco ecológico – Riscos Políticos. Brasiliense: São Paulo; p. 15. 4 Idem

15

sentido de procurar o máximo de benefício com o mínimo de investimento e no mais curto prazo possível”. 5 Os custos sociais e ambientais dessa busca do crescimento econômico eram e ainda são ignorados no cômputo da produção. Em busca de produtos cada vez mais atraentes, o homem degrada o meio ambiente, sem considerar as perdas ambientais ocasionadas pelo uso indiscriminado dos recursos naturais. Essa atitude coloca em risco a própria existência do ser humano. Os efeitos da utilização do meio ambiente de forma indiscriminada estão sendo sentidos em todos os locais do planeta. Some-se a isto o fato de que existem bases reais para uma preocupação séria com a proteção ambiental, pois alguns problemas ecológicos começam a tornar-se dramáticos e exigem um rápida resposta de toda a coletividade planetária.6 O fator preponderante, portanto, para que o homem alterasse seu modo de ver o meio ambiente foi, sem dúvida nenhuma, a realidade da crise ambiental, que tem trazido reflexo direto na vida do homem. 1.2.

O Desenvolvimento Sustentável e uma nova visão sobre a consideração do meio ambiente Já com essa preocupação em mente, em 1972, realizou-se em Estocolmo,

Suécia, a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, que reuniu representantes de 113 países. Foi considerado um marco na história ambiental mundial, visto que colocou a dimensão do meio ambiente na agenda internacional. Nela discutiu-se a degradação ambiental causada pelo homem, e a poluição que ultrapassa as fronteiras dos países, aquela que não reconhece os limites políticos ou geográficos e afeta populações de regiões distantes do local em que ocorreu o dano ambiental. Esta Conferência gerou a Declaração sobre o Meio Ambiente Humano, que contém princípios que devem servir de norte nas questões relativas ao meio ambiente e afirmou a necessidade de reformulação do conceito de desenvolvimento. Esta tarefa ficou a cargo de uma comissão, sob a responsabilidade da então primeira ministra da Noruega Gro Brundtland, denominada Comissão Brundtland, a quem competia avaliar também os resultados na Conferência de Estocolmo. Esta comissão elaborou o Relatório Nosso Futuro Comum. 5 6

MILARÉ. Edis. Direito do ambiente, op. cit, p. 39. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6º edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002; p.12

16

Referido relatório, cuja conclusão ocorreu em 1987, traz como premissa, que o problema ambiental é um desafio global e que, portanto, deve envolver todos os países buscando minimizar os efeitos catastróficos dos problemas ambientais. Assim disposto: “Até recentemente, o planeta era um grande mundo no qual as atividades humanas e seus efeitos estavam nitidamente confinados em nações, setores (energia, agricultura, comércio) e amplas áreas de interesse (ambiental, econômico, social). Esses compartimentos começaram a se diluir. Isto se aplica em particular às várias “crises” globais que preocupam a todos, sobretudo nos últimos 10 anos”.7 Essa visão seccionada, portanto, deve ser alterada eis que, é cada vez maior a interligação e interdependência entre as nações na esfera econômica, e também deve existir também no âmbito do meio ambiente. O objetivo do desenvolvimento sustentável constante em referido relatório é o seguinte: A humanidade é capaz de tornar o desenvolvimento sustentável - de garantir que ele atenda as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras atenderem também às suas.8 Pode-se inferir, portanto, que as autoridades políticas começaram a perceber que nosso planeta possui recursos finitos e, a concepção que ainda vigora, deveria ser modificada objetivando garantir a própria sobrevivência da humanidade. Nota-se que desenvolvimento sustentável envolve a participação de toda humanidade, ou seja, de cada um, buscando atender às nossas necessidades, sem, no entanto, prejudicar as futuras gerações. O desenvolvimento sustentável não pode ser entendido, como estado de permanente harmonia, mas um processo de mudança na forma de exploração dos recursos naturais, visando sua preservação, para as gerações atuais e as futuras. Neste sentido parece de pouca valia a atitude de alguns países do primeiro mundo que, visando a resolução do problema ambiental em seus países, têm migrado suas indústrias de alto potencial poluidor para os países de Terceiro Mundo, permanecendo em seus países apenas indústrias chamadas limpas, ou de baixo impacto transfronteiriço. A prática do desenvolvimento sustentável passa necessariamente pela mudança de atitudes, eis que as conseqüências dos danos ambientais, têm ultrapassado as fronteiras dos países, causando impacto longe do lugar em que estes aconteceram. 7 8

Nosso futuro comum. O Relatório Brundtland. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1990. p. 4 Idem; p. 9.

17

Há só uma Terra, mas não um só mundo. Todos nós dependemos de uma biosfera para conservarmos nossas vidas. Mesmo assim, cada comunidade, cada país luta pela sobrevivência e pela prosperidade quase sem levar em consideração o impacto que causa sobre os demais.9 O desenvolvimento, portanto, não pode estar desconectado do meio ambiente, visto que ambos estão umbilicalmente ligados. O desenvolvimento necessita da existência dos recursos naturais, estes devem interagir em busca de um equilíbrio. O processo produtivo não precisa necessariamente prejudicar o meio ambiente, visto que este está calcado no próprio ambiente natural, se o homem o destrói, de nada adiantará o processo produtivo, eis que também a própria existência humana estará ameaçada. No dizer de IGNACY SACHS: “Estamos, portanto, na fronteira de um duplo imperativo ético: a solidariedade sincrônica com a geração atual e a solidariedade diacrônica com as gerações futuras. Alguns, como Kothari, adicionam uma terceira preocupação ética: o respeito pela inviolabilidade da natureza: ‘O respeito à diversidade da natureza e a responsabilidade de conservar essa diversidade definem o desenvolvimento sustentável como um ideal ético. A partir da ética do respeito à diversidade do fluxo da natureza, emana o respeito à diversidade do fluxo da natureza, emana o respeito à diversidade de culturas e de sustentação da vida, base não apenas da sustentabilidade, mas também da igualdade e justiça.’(Kothari, 1995:285)”10 A meta a ser alcançada com o desenvolvimento sustentável é buscar a aliança entre o desenvolvimento econômico com o aproveitamento racional e ecologicamente sustentável da natureza, preocupando-se em conservar a biodiversidade, sem que haja o esgotamento dos recursos ambientais, garantindo ainda, uma condição mais digna aos habitantes de nosso planeta, principalmente os que vivem em condições sub-humanas. Várias empresas têm adotado esta meta, utilizando-se de recursos como a reciclagem de produtos, que tem trazido como resultados econômicos, desde a diminuição de despesas, até a geração de lucros. A palavra ‘desenvolver’ significa dar origem a alguma coisa, desembrulhar, desenrolar, libertar. Nesse sentido, podemos perceber, que o desenvolvimento ocorre sempre de dentro para fora. “Ele é sempre o desabrochar natural de algo que já existia em gérmen ou em embrião”.11 9

Nosso futuro comum; op. cit., p. 29. SACHS, Inacys. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. 2ªed. Rio de Janeiro: Garamond. 2002. p. 67 11 BRANCO, Samuel Murgel. O meio ambiente em debate. São Paulo: Moderna. 2002. p. 88.

10

18

Cumpre ressaltar ainda, que desenvolvimento não se confunde com crescimento, pois neste último prioriza-se a acumulação de capital sobre os demais componentes do processo, o que não acontece quando se fala em desenvolvimento, eis que neste, há uma harmonia entre esses componentes. Deve-se, portanto, buscar um desenvolvimento em que haja a preocupação com o meio ambiente. 1.3.

Estado de Direito Ambiental Até esse ponto da presente análise pode-se delinear as linhas mestras da

questão ambiental: a constatação da crise ambiental, ocasionada pela atuação devastadora do homem no meio ambiente, num quadro de catástrofes e destruição sem precedentes; a instauração da temática ambiental que alçou a questão ecológica às agendas internacionais; a elevação do meio ambiente à condição de direito fundamental do homem e, finalmente, a reorganização política dos estados nacionais rumo à uma nova estruturação política e jurídica com vistas à gestão e defesa do meio ambiente. De forma indireta, essa defesa é efetuada mediante a ação estatal, através dos órgãos que as esferas de governo criam para este fim. Nos Estados de democracia representativa, os governantes agem segundo a representação que lhes é outorgada pelos cidadãos, pelo menos em tese. Assim, teoricamente, o Poder Público, ao agir, estará fazendo-o em nome do povo, tornando legítima a atuação dos diversos órgãos encarregados da normatização, da fiscalização e da sanção por atos lesivos. Estaria, pois, resolvida a questão da responsabilidade pela preservação ambiental com essa atuação do Estado, enquanto representante do povo? Seria o Poder público o único ente responsável pela tutela do meio ambiente? Estaria cada cidadão desobrigado da participação em prol da questão ambiental, à vista da atuação do Poder Público? Em um primeiro momento, diante da clássica concepção de estado democrático12 de direito, as respostas a essas indagações poderiam ser um retórico – sim -, dada a legitimidade dos representantes dos cidadãos investidos de poder e autoridade para solucionar as mazelas sociais, inclusive aquelas atinentes à crise do meio ambiente. Entretanto, inserido num contexto de profundas mudanças sociais e o estabelecimento de um

12

“Quando se diz que o Estado Constitucional é um Estado democrático, quer-se afirmar que o domínio político e o exercício do poder encontram sua base na soberania popular”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Apud

19

repensar ecológico, o paradigma da democracia acaba por sofrer grandes transformações em suas bases, colocando o tema ambiental no núcleo das atenções e elevando o interesse dos cidadãos no tocante ao desenvolvimento com responsabilidade, fazendo surgir, destarte, a necessidade da construção de um novo Estado de direito, um Estado de Direito ambiental.13 Sobre a construção desse Estado de direito ambiental AYALA E MORATO LEITE argumentam, inicialmente, que “em horizonte de inicio de milênio na reconfiguração das forças políticas de um mundo marcado por desigualdades sociais, empobrecimento das maiorias e degradação ambiental, em escala planetária, a construção de um Estado do Ambiente parece uma utopia realista”.14 Mais adiante, porém, escritores trazem à baila a lição de BOAVENTURA DE SOUZA SANTOS para desmistificam essa hipótese inicial, proposta nos seguintes termos: “(...) no entanto, é uma utopia democrática ‘por que a transformação a que aspira a repolitização da realidade e o exercício radical da cidadania individual e coletiva, incluindo nela a carta dos direitos humanos da natureza. E mais, para a sua realização há necessidade de uma transformação global, não só nos modos de produção, ma também dos conhecimentos científicos, dos quadros de vida, das formas de sociabilidade e dos universos simbólicos e pressupõe, acima de tudo, uma nova relação paradigmática com a natureza, que substitua a relação paradigmática moderna”.15 Para a compreensão da construção desse novo Estado de direito ambiental, é importante, à priori, verificar a necessidade da evolução do Estado democrático de direito. FENSTERSEIFER inicia a investigação do tema lançando mão das lições do constitucionalista português José Joaquim Gomes Canotilho: “O Estado de Direito, conforme lição de Canotilho, apresenta as seguintes dimensões fundamentais: juridicidade, democracia, sociabilidade e sustentabilidade ambiental. A seqüência das dimensões apresentada pelo constitucionalista português traça a evolução civilizatória na conquista e reconhecimento dos seus valores e princípios fundamentais. Desde a sua forma primitiva, o Estado de Direito vem passando por um processo evolutivo contínuo, reconhecendo e agregando novas dimensões jurídicas: o Estado Constitucional, o Estado Democrático, o Estado Social e o Estado Ambiental. MEDEIROS, Flávia de Paiva Medeiros & GUIMARÃES, Flávio Romero: Direito, meio ambiente e cidadania: Uma abordagem interdisciplinar. Madras. São Paulo, 2004, p.92. 14

MORATO LEITE, José Rubens; AYALA, Patrick de Araújo. Direito Ambiental na Sociedade de Risco: Forense Universitária. 2º ed. Rio de Janeiro; 2004, pág. 30. 15 SANTOS, Boaventura de Sousa, Apud MORATO LEITE, José Rubens; AYALA, Patrick de Araújo: Direito Ambiental na Sociedade de Risco: Forense Universitária, op. cit. p. 30.

20

Da mesma forma que ocorre com a evolução dos direitos fundamentais, as dimensões do Estado de Direito se agregam e se somam para formar o arcabouço de princípios e valores, consagra os pela Humanidade em seu processo histórico contínuo.”16 FENSTERSEIFER argumenta que o conceito de democracia se recria a cada nova tomada de consciência política e avanço civilizatório. Segundo ele, não se pode aceitar a fórmula democrática vendida pela modernidade como a sua possibilidade última. A democracia vai ser sempre a bandeira na luta contra a dominação e espoliação dos mais favorecidos economicamente para com os desprovidos de poder econômico. E, na medida em que enfrenta novas realidades políticas e sociais, a democracia vai se adaptando e transformando, mas sem nunca perder o seu ideal emancipatório e libertário. Assim, ele aduz: “Na nova fórmula democrática, evidenciado o seu caráter supranacional e extraterritorial, a defesa do meio ambiente projeta-se como um dos seus elementos mais importantes. A composição que se extrai entre política e meio ambiente diz respeito diretamente com o princípio democrático, pois está em contraposição à postura opressora e dominante que o poder econômico impõe à grande maioria dos habitantes mundiais”. 17 Essa conscientização da sociedade é a semente que construirá o Estado Direito ambiental, o que segundo CAPELLA é definido como “a forma de Estado que se propõe a aplicar o princípio da solidariedade econômica e social para alcançar um desenvolvimento sustentável, orientado a buscar a igualdade substancial entre os cidadãos, mediante o controle jurídico do uso racional do patrimônio natural”.18 Ou ainda, segundo a definição de PUREZA: “O Estado ambiental é um quadro de mais sociedade, mais direitos e deveres individuais e mais direitos e deveres coletivos e menos Estado e menos mercantilização. Neste novo contexto, não é o prioritário o doseamento entre público e privado, mas sim o reforço da autonomia (logo, dos direitos e das

16

CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Apud FENSTERSEIFER, Tiago: “Cidadania ambiental cosmopolita: um novo conceito em construção”. In Teses do 8º Congresso Internacional de Direito Ambiental: Fauna, políticas públicas e instrumentos legais. São Paulo 31 de maio a 03 de junho de 2004, pág. 741. Disponível em http://www.planetaverde.org/teses. Acesso em 29 de novembro de 2004. 17 FENSTERSEIFER, Tiago, Idem. 18 CAPELLA, Vicente Bellver, Apud, LEITE, José Rubens Morato; CAVALCANTI FERREIRA, Maria Leonor Paes: Estado de Direito Ambiental: O antropocentrismo alargado e o direito da fauna. Disponível em: http://www.dbjv.de/dbjv-high/mitteilungen/04-02/DBJV_Mitteilungen_02-2004.pdf. Acesso em: 05 de dezembro de 2004.

21

responsabilidades) individual e social frente à mercantilização e à burocratização”.19 Trata-se de um Estado no qual a noção restritiva de que os direitos fundamentais serviriam unicamente à defesa do indivíduo contra o Estado foi substituída pelo reconhecimento de direitos fundamentais que servem à proteção e materialização de bens considerados importantes para a comunidade, dentre eles o bem ambiental. Com tais considerações, há de se concluir que, embora o Estado de Direito Ambiental tenha uma concepção teórica, seu valor está em servir como um ideal a ser seguido. Obviamente, a otimização das características desse Estado não resolve os problemas da crise ecológica, contudo serve como transição da irresponsabilidade organizada para uma condição em que o Estado e a sociedade passam a influenciar nas situações de risco, tomando conhecimento da verdadeira realidade ambiental e se municiando de aparatos jurídicos e institucionais capazes de fornecer a mínima segurança necessária para que se garanta qualidade de vida sob o aspecto ambiental. 1.4.

Cidadania Ambiental Cosmopolita Dentro do contexto desse novo Estado de Direito Ambiental, a atuação

participativa da sociedade na questão ecológica impulsionam, sobremaneira, uma nova mentalidade, voltada para o desenvolvimento sustentável e para o uso racional dos recursos. Essa participação dá, sem dúvida alguma, uma redefinição no conceito de cidadania. O atual momento histórico não permite a inércia e a neutralidade de outros tempos, mas exige cidadãos planetários, conscientes da realidade que os permeia e capazes de agir em defesa da vida. Nessa conjuntura, o direito, nas suas dimensões nacional e internacional, insurge-se como um instrumento de luta e de resistência contra uma realidade que violenta os valores máximos do Estado Democrático de Direito e da humanidade. Toda e qualquer atividade lesiva ao meio ambiente, antes de ser efetivada, deve ser subordinada a um processo decisório democrático, dando-se voz e vez a todos os representantes dos grupos sociais interessados na questão. O livre acesso às informações ambientais que as autoridades públicas dispõem é indispensável para a conscientização e participação cidadã na política ambiental. 19

PUREZA, José Manuel, Apud, MORATO LEITE, José Rubens; AYALA, Patrick de Araújo Direito Ambiental na Sociedade de Risco, op. cit. pág, 36.

22

Nesses mesmos termos leciona FENSTERSEIFER: “O conceito de cidadania emerge com uma nova roupagem no universo político e jurídico contemporâneo. As novas realidades enfrentadas pelos cidadãos atingem cada vez mais uma dimensão global, colocando os cidadãos de diferentes e longínquos países diante dos mesmos problemas. Nesse contexto, a questão ambiental coloca-se como a pedra fundamental da construção política hodierna, impondo às nações e cidadãos mundiais uma aliança planetária na formulação e ação política internacional”.20 Na esteira desse entendimento, AGUIAR aduz: “Hoje, a cidadania apresenta outra dimensão. A questão de seu exercício transcende a internacionalização e invade a planetarização. Isso se dá pelo fato de a produção apresentar efeitos destrutivos em todo o planeta, não mais se circunscrevendo aos parâmetros geopolíticos do internacionalismo, mas avançando para a questão da própria sobrevivência do planeta e da espécie humana. O que leva à necessidade do ser humano conceituar-se de modo diferente. Não mais um cidadão que domina a natureza para criar seu mundo, mas um ser da natureza que cria seu mundo convivendo com ela. Esse cidadão planetário tem na questão ambiental um dos problemas políticos e humanos mais sérios da contemporaneidade. O ser humano chegou ao ponto de poder se destruir enquanto espécie”.21 O ponto nodal a ser analisado dentro desse novo conceito de cidadania é exatamente o meio ambiente; assim, idealiza-se o que a comunidade científica têm chamado de cidadania ambiental, compreendida como aquela em que existe a atuação da sociedade no tocante à defesa do meio ambiente. Entretanto, deve-se observar que essa cidadania ambiental acompanha os mesmo contornos da problemática ambiental internacional. Assim, não há que se falar numa cidadania ambiental regional ou nacional; tal cidadania volta-se cada vez mais para uma dimensão planetária, mundial, cosmopolita. Os movimentos sociais contra a degradação do meio ambiente vêm se articulando crescentemente através das lutas democráticas pela implantação de um novo modelo de cidadania. A defesa dos direitos ambientais das populações unifica lutas sociais com distintos objetivos específicos: o acesso a bens coletivos como a água e o ar puro, em níveis e qualidade compatíveis com condições adequadas de existência; o acesso a recursos naturais de uso comum necessário à existência de grupos sócio-culturais específicos como

20

FENSTERSEIFER, Tiago; op. cit, pág. 733.

23

seringueiros, apanhadores de castanha e comunidade indígenas; a garantia de uso público do patrimônio natural constituído por áreas verdes, cursos d’água e nascentes, freqüentemente degradados pelos uso privado incompatível com os interesses coletivos da sociedade. A questão ambiental deve ser tratada de forma global, considerando que a degradação ambiental é resultante de um processo social, determinado pelo modo como a sociedade se apropria e utiliza os recursos naturais. Não é possível pretender resolver os problemas ambientais de forma isolada. É necessário introduzir uma nova abordagem decorrente da compreensão de que a existência de uma certa qualidade ambiental está diretamente condicionada ao processo de desenvolvimento adotado pelas nações. O advento da cidadania mundial não é mais mera hipótese, embora ainda estejamos longe de alcançá-la. A cidadania estatal e a cidadania mundial formam um continuum, cujos contornos, pelo menos, já se tornam visíveis22. Não se trata, evidentemente, de romantizar a sociedade civil global emergente, que está longe de ser perfeita. Em alguns contextos, forças sociais liberadas manifestam tendências religiosas e políticas regressivas, como nos diversos casos de repulsa fascista aos estrangeiros, especialmente refugiados, de apoio de importantes parcelas da sociedade à pena de morte e de limitações rígidas aos direitos reprodutivos das mulheres. Mas, para impedir uma globalização catastrófica, o principal caminho será a resistência e a perspectiva da sociedade civil global embrionária.23 A cidadania ambiental cosmopolita ou planetária pontifica que é necessária a ação local do cidadão, mas sempre com uma visão voltada para os reflexos que a degradação ambiental traz para todo o ecossistema planetário. Pode-se citar, por exemplo, a poluição atmosférica gerada pelos países desenvolvidos, que tem reflexos diretos na qualidade ambiental e condições de vida dos países em desenvolvimento. Dessa forma, é inevitável a proposição de uma nova concepção de cidadania, reconhecendo-se o papel e a importância que todos têm na defesa do Planeta Terra24; cidadania essa que deve se materializar com a efetiva participação dos indivíduos. A participação é uma das dimensões do princípio democrático. O aperfeiçoamento dessa dimensão se faz com o exercício da cidadania, com o seu

21

AGUIAR, Roberto Armando Ramos de. Direito do Meio Ambiente e participação popular. Brasília: Edições Ibama, 1998, p. 46. 22 HABERMAS, Jurgen, Apud, LIZT, Vieira: Cidadania global e estado nacional. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/direitosglobais/cidadaniaglobal/cidadania_global.html. Acesso em 02 de abril de 2005. 23 FALK, Richard, Apud, LIZT, Vieira: op. cit. 24 FENSTERSEIFER, Tiago; op. cit. pág. 733.

24

aprofundamento na vida cotidiana. Nas sociedades atuais, os cidadãos se tornam cada vez mais cúmplices como decorrência da existência de objetivos comuns.25 Dada a relevância contida em seu bojo, essa necessidade da atuação da sociedade foi elevada à condição de Principio quando da realização da Conferência das Nações Unidas sobre meio ambiente e desenvolvimento, realizada em 1992.26 Assim preceitua o Princípio 10: Princípio 10. A melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisórios. Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e participação popular, colocando as informações à disposição de todos. Será proporcionado o acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que se refere à compensação e reparação de danos.27 Tal Princípio foi também relembrado na Agenda 21, durante a ECO/92, com os seguintes termos: “A Agenda 21 está voltada para os problemas prementes de hoje e tem o objetivo, ainda, de preparar o mundo para os desafios do próximo século. Reflete um consenso mundial e um compromisso político no nível mais alto no que diz respeito a desenvolvimento e cooperação ambiental. O êxito de sua execução é responsabilidade, antes de mais nada, dos Governos. Para concretizá-la, são cruciais as estratégias, os planos, as políticas e os processos nacionais. A cooperação internacional deverá apoiar e complementar tais esforços nacionais. Nesse contexto, o sistema das Nações Unidas tem um papel fundamental a desempenhar. Outras organizações internacionais, regionais e sub-regionais também são convidadas a contribuir para tal esforço. A mais ampla participação pública e o envolvimento ativo das organizações nãogovernamentais e de outros grupos também devem ser estimulados”. A crise ecológica requer atuação participativa e colaborativa, onde a cooperação e a solidariedade despontam como os melhores paradigmas para a solução dos problemas ambientais. A individualização da responsabilidade pela tutela ambiental é, de fato,

25

MEDEIROS, Flávia de Paiva Medeiros & GUIMARÃES, Flávio Romero; op. cit. p.93. Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUCED), realizada de 3 a 14 de junho de 1992. A reunião ficou conhecida como Rio-92, e a ela compareceram delegações nacionais de 175 países. Foi, ainda, a primeira reunião internacional de magnitude a se realizar após o fim da Guerra Fria. 27 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. 3. ed. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2001, p. 595. 26

25

um dos grandes óbices para o estabelecimento de uma cultura de desenvolvimento sustentável. Como remate, veja-se a notória afirmação de AYALA: “A conjugação da falência do projeto democrático da representação política, a afirmação de uma democracia ambiental, autenticamente republicana, e, sobretudo, da reconstrução do conceito de cidadania, conduzindo-o à formação de um particular sentido de uma cidadania ambiental, republicana e pluralista em seu conteúdo: exprimem formas de atuação e comportamentos que não se satisfazem com a simples representação de interesses para a organização dos processos de decisão e também não satisfazem com a demonstração da regularidade do processo de composição dessa vontade, como pressuposto de um consenso legítimo, em um precário e formal regime procedimental. A nova racionalidade ambiental exige a participação efetiva dos sujeitos políticos potencialmente afetados pelas decisões, não só na fiscalização dos procedimento, mas na própria formação da vontade decisória”.28 Assim, pelo principio da participação, deve-se permitir a todos a possibilidade de influenciar na tomada de decisões sobre as questões relativas ao meio ambiente. 1.5.

Cidadania Ambiental Coletiva Segundo AYALA, a cidadania ambiental deve ser exercida de forma dúplice,

individual e coletiva, mediante a ação das ONGs. O Estado de direito ambiental deve dar preferência ao exercício da cidadania coletiva, pois só assim exercerá mais pressão e força nas suas reivindicações. A participação da sociedade civil demonstra-se completamente ineficaz quando efetuada apenas individualmente pelos cidadãos. A amplitude do problema ecológico requer a ação conjunta da sociedade, a união para a materialização da cidadania ambiental. Nesses termos é a afirmação de JOSÉ MARIA GOMES: “Pode-se dizer que já há um início de materialização de uma cidadania ativa global na emergência e na expansão de redes de atividades transnacionais, concebidas como projetos e realidades preliminares, abrangendo uma diversidade de movimentos sociais transnacionais, associações ou grupos de cidadãos, organizações internacionais não governamentais, etc. (por exemplo, Anistia Internacional, Greenpeace, Médecins sans Frontéres, movimentos de mulheres, ambientalistas, de defesa dos direitos humanos). Tal ativismo transnacional, ao construir espaços institucionais rudimentares de ação e 28

MORATO LEITE, José Rubens; AYALA, Patryck de Araujo. Op. Cit. pg. 311.

26

lealdade desenvolvidos em e através dos Estados, produz novas orientações com relação à identidade e à comunidade política que estão na base de uma ‘sociedade civil global’ em gestação”.29 Destarte, a sociedade civil organizada surge como um grande agente em prol da defesa do meio ambiente, na medida em que abriga vários indivíduos que comungam suas idéias e forças para atuarem na preservação ecológica. A sociedade civil coloca-se hoje como uma modalidade de consciência política do mundo. Na medida em que se verifica a inaptidão e incapacidade dos Estados nacionais para lidar com diversas temáticas sociais relevantes, a sociedade civil, passa a ocupar espaços políticos cada vez mais importantes. Registra-se hoje a articulação de diversos movimentos sociais e organizações não-governamentais (ONGs) em forma de rede e coalizão, possibilitando a atuação conjunta de diversos atores sociais regionais e internacionais na defesa de uma causa comum. Tal articulação, que talvez tenha a sua representação máxima no Fórum Social Mundial, possibilita unidade de atuação e força política para a sociedade civil, vivenciando o local e o universal simultaneamente”.30 Importante frisar ainda que, no cenário internacional, destacam-se algumas ONG’s ambientalistas com alcance e representatividade mundial: Amigos da Terra, Greenpeace, WWF, entre outras. No exemplo do Greenpeace, suas campanhas ultrapassam fronteiras locais e nacionais, buscando uma ação política integrada no plano internacional. A projeção mundial das ONG’s reflete a necessidade de uma ação conjunta e integrada de diversas sociedades mundiais na proteção ambiental”. Conforme todo o exposto, vislumbramos a importância da preservação ecológica, a entronização da temática ambiental, a instauração da criação de um Estado de direito ambiental, bem como o surgimento da cidadania ambiental em nível internacional, o qual tem impulsionado a sociedade civil a organizar-se em prol da defesa do meio ambiente. No próximo capitulo será analisada a proteção jurídica do meio ambiente no Brasil. Partindo-se da investigação das diretivas constitucionais de 1988 relativas ao meio ambiente, bem como, dos princípios daí auferidos. Em seguida, uma rápida listagem das principais leis que regem o direito ambiental nacional, culminando com a análise da atuação do Poder Público frente ao problema ecológico. 29

GÓMEZ, José Maria. Política e democracia em tempos de globalização. Petrópolis/RJ: Vozes; Buenos Aires: CLACSO; Rio de Janeiro: LPP - Laboratório de Políticas Públicas, 2000, p. 72. 30 FENSTERSEIFER, Tiago, op. cit, pág. 743.

27

CAPITULO II

PROTEÇÃO JURÍDICA DO MEIO AMBIENTE NO BRASIL

2.1. Tutela jurídica do ambiente: Desafios aos Estados Nacionais e a realidade brasileira

A problemática ocasionada pela crise ecológica e a conscientização ambiental percebidas no capítulo inicial desta pesquisa, bem como a pressão internacional31 em favor da proteção do meio ambiente, provocou nos Estados Nacionais a necessidade da elaboração de um regime legal aplicável à relação sociedade-natureza, de forma a conjugar desenvolvimento com qualidade ambiental, evolução tecnológica com ambiente ecologicamente equilibrado. Com a instauração dessa ‘ética ambiental’, fez-se necessário repensar o regime jurídico até então vigente, os quais encontravam-se sobremaneira despreparados para proteger essa nova ordem de valores, com vistas a idealizar um novo estatuto jurídico que considerasse o valor intrínseco do ambiente e seus elementos, chegando-se até às teorias que prevêem a possibilidade de expansão do rol dos sujeitos de direito para além dos seres humanos.32 A criação de um arcabouço jurídico que vise tutelar o bem ambiental não se mostra, porém, das tarefas mais fáceis. Uma das dificuldades para apresentar um estatuto jurídico do meio ambiente está ligada à sua complexidade. Trata-se, pois, de um bem que traduz a superposição em um mesmo espaço, de várias prerrogativas distintas relacionadas com usos e titulares diferentes33. Essa variedade de usos proporcionada pelo meio ambiente, enquanto macro e micro-bem, acaba relativizando as diferentes possibilidades de apropriação 31

BENJAMIN argumenta que “embora o movimento ambientalista venha se fortalecendo e se impondo enormemente nos últimos anos, multiplicando-se as entidades ambientais privadas, forçoso é reconhecer que boa parte da legislação promulgada da década de 80 é mais fruto de pressões internacionais no que propriamente resposta a uma mobilização nacional irresistível”. BENJAMIN, Antonio Herman V. A proteção do meio ambiente nos países menos desenvolvidos: o caso da América Latina; op. cit, pág. 412. 32 CAVEDON, Fernanda de Sales. Considerações ético-jurídicas acerca do estatuto jurídico do animal: novos sujeitos de direitos?. In: Teses do 8º Congresso Internacional de Direito Ambiental. 33 BENATTI, José Heder. Direito de propriedade e proteção ambiental no Brasil: apropriação e o uso dos recursos naturas no imóvel rural. Tese de Doutorado. Belém, 2003, p. 219.

28

(pública e privada). Incidem no meio ambiente o interesse geral da sociedade, o interesse privado, o interesse estatal (soberania) e o interesse internacional.34 Nos países menos desenvolvidos, como é o caso da América Latina, os óbices à construção de um regimento jurídico protetivo ao ambiente demonstraram-se mais notórios. A principal barreira, não diretamente relacionada com o sistema jurídico, é a pobreza. O Relatório “Nosso Futuro Comum” reconhece que “a maioria dos países em desenvolvimento tem agora renda per capita mais baixa do que no início da década. Pobreza e desemprego crescentes aumentaram a pressão sobre os recursos ambientais, na medida em que um número maior de pessoas tem sido forçado a depender mais diretamente deles. Muitos governos reduziram seus esforços destinados a proteger o meio ambiente e a introduzir considerações ecológicas no planejamento do desenvolvimento”.35 No aspecto jurídico, BENJAMIN36 apontou – naquele contexto - as seguintes barreiras: a) apego exagerado a uma concepção individualista da propriedade; b) a inserção dos problemas ambientais na esfera privada dos indivíduos; c) a ausência de tradição de qualquer preocupação com a natureza; d) a consagração, ainda geral, do princípio da culpa na responsabilidade civil; e) a percepção do Direito – e de sua implementação – como preventiva de interesses e direitos individuais e, só excepcionalmente, coletivos; f) a visão de que o Direito apenas indiretamente tem a função preventiva; g) a falta de consciência e educação da população para a problemática ambiental. Nos últimos anos, no entanto, essas barreiras têm sido uma a uma quebradas. Iniciando pela disposição do meio ambiente nas Constituições Nacionais37, bem como com o crescimento da legislação no plano infraconstitucional, manifestando-se a tutela ecológica através de leis ambientais “gerais”, algumas até denominadas Códigos, dando um regramento amplo à disciplina jurídica do meio ambiente. Como explica COSTA NETO:

34

Idem BENJAMIN, Antonio Herman V. A proteção do meio ambiente nos países menos desenvolvidos: o caso da América Latina; op.cit, p. 420. 36 Idem 37 “As Constituições modernas têm-se incumbido da tarefa de repercutir, no plano interno dos Estados, a generalização da convicção quanto à efetiva e fundamental proteção do meio ambiente. Apenas para exemplificar, destaquem-se: a Constituição da Espanha, de 1978 (art. 45); a Constituição da Suíça, de 1971 (art. 24); a Constituição de Portugal, de 1976 (art. 66); a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988 (art. 225); a Constituição da Argentina, de1994 (art. 41), e a Constituição do Paraguai de 1992 (art. 8º)”. COSTA NETO, Nicolao Dino de Castro e. Proteção Jurídica do Meio Ambiente: I - Florestas. Ed. Del Rey. Belo Horizonte, 2003, p.14. 35

29

“São leis que prevêem, a um só tempo, dispositivos substantivos – criando novos direitos e obrigações – e procedimentais – estabelecendo instrumentos adequados de implementação (sanções administrativas e penais, e mecanismos de facilitação do acesso à justiça)”.38 Nesse contexto, o Brasil também merece ênfase, especialmente através da criação de modernos instrumentos normativos para a proteção ambiental. Alias, é um dos países que mais dispõem sobre a tutela ambiental. Nesse ponto, será verificada a atual situação normativa de proteção ambiental no Brasil, iniciando-se pela ordem constitucional e, logo após, verificando a legislação infraconstitucional. 2.2. O meio ambiente na ordem constitucional A Constituição Federal de 1988 trouxe grandes inovações em referência à tutela ambiental, sendo considerado por alguns como “Constituição Verde”. Ao contrário da abordagem realizada pelas constituições anteriores, o constituinte de 1988 procurou dar efetiva tutela ao meio ambiente, criando mecanismos para sua proteção e controle. O artigo 225 é o texto áureo dessa inovação, trazida com a seguinte redação em seu caput: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Analisa-se, a seguir, os pontos fundamentais contidos na norma constitucional em alusão, bem como as principais diretivas contidas no mesmo documento. 2.2.1. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado A primeira observação que deve ser realizada em relação ao dispositivo constitucional em apreço, diz respeito à consagração do meio ambiente ecologicamente equilibrado na condição de direito fundamental.

38

BENJAMIN, Antonio Herman V. A proteção do meio ambiente nos países menos desenvolvidos: o caso da América Latina. Op. cit. pág. 425.

30

Inspirada na Constituição Portuguesa39, a Carta Magna brasileira de 1988 elevou o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado a direito fundamental da pessoa humana, traduzindo uma nova projeção do direito à vida40, uma vez que este direito abrange a manutenção daquelas condições ambientais que são suportes da própria existência. Tal direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito fundamental insculpido inicialmente no Princípio 1º da Declaração de Estocolmo41, de 1972, e reiterado no Princípio 1º da Declaração do Rio, proferida na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, que se situa dentre os direitos fundamentais de terceira geração, também denominados direitos de fraternidade ou de solidariedade, os quais trazem como nota distintiva o fato de se desprenderem, em princípio, da figura do homemindivíduo como seu titular, destinado-os à proteção de grupos humanos (família, povo, nação), e caracterizando-se conseqüentemente, como direitos de titularidade difusa coletiva. Sob outro enfoque, os direitos da terceira geração têm por destinatário precípuo o “gênero” humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta.42 A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem afirmado que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é a consagração constitucional de um típico direito de terceira geração43. O surgimento do direito ao meio ambiente e os demais direitos de terceira geração são explicados por BOBBIO como tendo sido: “(...) uma passagem da consideração do individuo uti singulus, que foi o primeiro sujeito ao qual se atribuíam direitos naturais (ou morais) – em outras palavras, da ‘pessoa’ – para sujeitos diferentes do individuo, como a família, as minorias étnicas e religiosas, toda a humanidade em seu conjunto (como no atual debate, entre filósofos da moral, sobre o direito dos pósteros à sobrevivência); e, além dos indivíduos humanos considerados singularmente ou nas diversas comunidades reais ou ideais que os representam, até mesmo para sujeitos diferentes os homens, como os animais”.44 39

STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Discricionariedade administrativa e dever de proteção do meio ambiente. In: Revista IDAF – Informativo de Direito Administrativo e Responsabilidade Fiscal. Ano III, n.º 26, set/2003. p. 137 40 “Ao ser promovida à categoria constitucional de direito fundamental, a proteção do meio ambiente tornou-se um elemento importante para assegurar a implementação do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana”. BENATTI, José Heder. Op. cit. pág. 213. 41 Princípio 1º, da Declaração de Estocolmo: “O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade, e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio cuja qualidade lhe permite levar uma vida digna e gozar de bem estar e tem a solene obrigação de protege e melhorar esse meio para as gerações presentes e futuras”. 42 STEIGLEDER, Annelise Monteiro; op. cit., p. 137. 43 RE nº 134297-8, SP, Relator Min. Celso de Mello, D.J.22.09.95. 44 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1992, p. 69

31

Este direito, reivindicado pelos movimentos ecológicos, tornou-se um dos mais importantes direitos fundamentais da pessoa humana, pois, como a proteção do meio ambiente, resta salvaguardada não apenas a vida nas suas várias dimensões (individual, coletiva e até das futuras gerações), mas as “próprias bases da vida, o suporte planetário que viabiliza a existência da integralidade dos seres vivos”.45 Sobre a matéria, BITTENCOURT e MARCONDES lecionam o seguinte: “(...) o reconhecimento do direito do homem ao meio ambiente harmônico e produtivo posicionou-se como bem jurídico fundamental à vida humana. Este status o insere ao lado do direito à vida, à igualdade, à liberdade, possuindo, contudo, um espectro bem mais amplo, de cunho social e histórico, e não meramente individual. Donde se extrai, como características desse direito, a sua indisponibilidade, oponibilidade a direitos individuais ou coletivos, bem como a sua imprescritibilidade e, ainda, a impossibilidade de haver direito adquirido sobre ou contra o meio ambiente”.46 2.2.2. Meio ambiente: bem de uso comum do povo

Ao tratar sobre meio ambiente na Constituição Federal, o art. 225 dispõe ser este “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”. Como o constituinte utilizou a expressão “bem de uso comum do povo”, prevista no Código Civil de 1916 e replicada no de 2002, impõe-se verificar qual o regime jurídico desse tipo de bem naquele primeiro diploma que estava em vigor à época da promulgação da Carta Magna. Caio Mário da Silva Pereira47 ensina que os bens de uso comum do povo são aqueles que, embora pertencentes a um ente público, estão franqueados a todos, tais como mares, rios, estradas, ruas, praças, sendo inalienáveis e imprescritíveis. Por via de regra, podem ser utilizados de forma franqueada, sem restrições e sem ônus, embora a realização de pagamento não descaracterize essa natureza. Da simples leitura do referido artigo percebe-se que a Constituição, quando tratou do meio ambiente, atribuiu a titularidade a todos indiscriminadamente e a ninguém particularmente, nem mesmo ao Poder Público e muito menos a qualquer pessoa física ou 45

BENJAMIN, Antônio Herman V. Responsabilidade Civil pelo dano ambiental. In: Revista do Direito Ambiental. Ed. RT, v.9, ano 3, jan/mar. 1998, p. 12. 46 BITTENCOURT, Darlan Rodrigues e MARCONDES, Ricardo Kochinski. Lineamentos da responsabilidade civil ambiental. Revista dos Tribunais. Ed. RT, v. 740, 86º ano, jun, 1997, p.69. 47 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. São Paulo: Forense, 1997. v. 1., p. 280.

32

jurídica de direito privado. Nem mesmo a coletividade deste momento histórico é proprietária desse bem, sendo ela mera detentora em prol das presentes e futuras gerações. Impõe-se, assim, tomar cautela para não fazer uma interpretação retrospectiva, de forma a interpretar a Constituição com base nos conceitos previstos na legislação anterior, inovando o mínimo possível, conforme adverte BARROSO48 ao mencionar que se deve “[...] rejeitar uma das patologias crônicas da hermenêutica constitucional brasileira, que é a interpretação retrospectiva, pela qual se procura interpretar o texto novo de maneira que ele não inove nada, mas, ao revés, fique tão parecido quanto possível com o antigo [...]” Portanto, parece-nos que pretender aplicar ao meio ambiente a visão privada do Código Civil, seja o de 1916, seja de 2002, é um equívoco, pois esta não se coaduna com a visão moderna da teoria dos direitos difusos, que ganhou força com a Constituição Federal de 1988. É esta a lição de FIORILLO49: “Dessa forma, em contraposição ao Estado e aos cidadãos, ao público e ao privado, iniciou-se no Brasil, com a Constituição Federal de 1988, uma nova categoria de bens: os bens de uso comum do povo e essenciais à sadia qualidade de vida. Esses bens não se confundem com os denominados bens públicos, tampouco com os denominados bens particulares (ou privados)”. Esse enfoque é reproduzido pela Lei Federal n. 8.078, de 1990, que, além de estabelecer nova concepção, vinculada aos direitos das relações de consumo, cria, a partir da orientação estabelecida pela Carta Magna de 1988, a estrutura infraconstitucional que fundamenta a natureza jurídica de um novo bem, que não é público e não é privado: o bem difuso. Criado no plano mais importante do sistema jurídico, como já aludido, pela Constituição Federal de 1988, o direito difuso passou a ter clara definição legal, com evidente reflexo na própria Carta Magna, configurando nova realidade para o intérprete do direito positivo. Aludido bem, definido como transindividual - tendo como titulares pessoas indeterminadas - e ligadas por circunstâncias de fato (art. 81, parágrafo único, I, da Lei n. 8.078/90); pressupõe, sob a ótica normativa, a existência de um bem ‘de natureza indivisível’.

48 49

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 66 e 67. FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 49-50.

33

Não se pode, dessa forma, atribuir ao bem difuso a qualidade de bem público propriamente dito, pois este não está no patrimônio de qualquer ente público, ao contrário, é pertencente a toda a coletividade, e não só das presentes, mas também das futuras gerações. FIORILLO traça como critério diferenciador entre o bem público e o bem difuso a titularidade, sendo que o primeiro tem como titular o Estado (ainda que deva geri-lo em função e em nome da coletividade), ao passo que o de natureza difusa repousa a sua titularidade no próprio povo, tanto que eventuais indenizações decorrentes de lesões a esses bens têm natureza diversa: a indenização do bem público volta-se aos cofres do ente prejudicado; a indenização do bem difuso, ao fundo de defesa dos direitos difusos (Lei n. 7.347/85, art. 13). Em assim sendo, o primeiro elemento do regime jurídico do meio ambiente é sua qualidade difusa. Outro elemento caracterizador desse regime jurídico é a indisponibilidade do bem. Também característica do meio ambiente é sua insuscetibilidade de apropriação, seja pelo próprio Estado, seja pelos particulares, fato este decorrente diretamente do princípio da indisponibilidade. Em conclusão, o regime jurídico do meio ambiente como bem autônomo – sem prejuízo de outras características a serem mais exploradas – é o de bem difuso de uso comum do povo, incorpóreo, indisponível e insuscetível de apropriação. Situação diversa é a que diz respeito ao regime jurídico dos recursos ambientais, pois, nesse caso, cada um considerado individualmente pode ter um regulamento próprio, não havendo necessariamente um regime jurídico único para todos eles, tendo como único traço comum a impossibilidade de seu uso ser lesivo ao meio ambiente como bem autônomo. Ocorre que os recursos ambientais individualmente considerados podem ter regime inclusive de direito privado, como é o caso das árvores, que segundo o Código Civil (art. 79) são consideradas bens móveis e, assim que removidas – com o devido licenciamento –, podem ser objeto de comércio. De igual maneira, um prédio histórico ou com valor arquitetônico relevante – ainda não tombado – não perde sua condição de propriedade particular, podendo ser alienado, hipotecado, locado, usado, desde que isso não influencie em sua característica histórica ou arquitetônica. Ora, é possível afirmar-se que uma árvore, isoladamente, ou um conjunto restrito delas ou, ainda, o prédio histórico mencionado são bens de uso comum do povo, indisponíveis, insuscetíveis de apropriação etc.? A resposta é negativa, pois ambos – mesmo considerados como recursos ambientais – têm regime de direito privado com titularidade pertencente a uma pessoa – física ou jurídica – particular. Essencial, assim, a distinção entre macro e micro-bem, pois somente o primeiro é difuso, de uso comum do povo, indisponível e

34

insuscetível de apropriação, e os demais seguem regime jurídico próprio a ser analisado caso a caso. Dessa maneira, alguns recursos ambientais são plenamente apropriáveis e utilizáveis – desde que essa apropriação não leve à apropriação individual (exclusiva) do meio ambiente –, como pode ser constatado na lição de MIRRA: “Na mesma ordem de idéias, não podem os particulares pretender apropriar-se do meio ambiente como bem imaterial, ou seja, como conjunto de condições, relações e interdependências que condicionam, abrigam e regem a vida. O que pode eventualmente ser apropriado, o que pode eventualmente ser utilizado pelos particulares, sobretudo para fins econômicos, são determinados elementos corpóreos que compõem o meio ambiente e os bens ambientais (como as florestas, os solos, as águas, em certos casos os exemplares da fauna e da flora, determinados bens móveis e imóveis integrantes do patrimônio cultural) e, mesmo assim, como se verá a seguir, de acordo com condicionamentos, limitações e critérios previstos em lei e desde que essa apropriação ou utilização dos bens materiais não leve à apropriação individual (exclusiva) do meio ambiente como bem imaterial”.50 Nada obsta, portanto, a que certo recurso ambiental (p. ex., as árvores existentes fora de áreas de preservação permanente e reserva legal ou o prédio de valor histórico) tenha regime jurídico de direito privado e outros (p. ex., a caça) sejam regidos por regime de direito público, em razão da titularidade. Com base nessas assertivas é possível reconhecer que a indisponibilidade existente no meio ambiente não é aplicável imediatamente ao caso dos recursos ambientais, pois a estes pode ser aplicada indisponibilidade total (p. ex., em relação à impossibilidade de apropriação do ar atmosférico ou à vedação à caça, com raras exceções), restrita (p. ex., em relação à pesca, que é vedada em alguns períodos nos rios, bem como mediante certos petrechos) e até mesmo nenhuma (p. ex., nos casos de florestas na propriedade fora da área de preservação permanente e reserva legal, que pode ser suprimida mediante simples ato administrativo autorizativo, ressalvadas as espécies protegidas). Não se conclua, contudo, que em decorrência de alguns recursos ambientais deterem essa condição de regime privado poderá o proprietário utilizar-se deles a seu juízo, de forma irresponsável, pois além de ser imperioso o exercício da função social e ambiental da propriedade, a utilização de tais recursos está limitada à atividade sustentável, de forma que não prejudique o macrobem de que ele faz parte: o meio ambiente. 50

MIRRA, 2002, p. 38

35

Nesses casos, como bem adverte Mirra51, o regime jurídico do meio ambiente adotado no Brasil, além de se direcionar aos recursos ambientais que pertencem a todos, indivisível e indistintamente (p. ex., ar, praias etc.), incide igualmente sobre todos os elementos corpóreos configuradores do seu substrato material, qualquer que seja a sua titularidade, e em relação a todas as atividades ou práticas que de alguma forma estão relacionadas com o meio ambiente e com os bens ambientais, para orientá-los e condicionálos – uns e outras – à preservação da qualidade ambiental propícia à vida. Esclarecendo-se ainda mais, afirma-se, com certeza, que a limitação de utilização desses recursos ambientais pelos seus titulares – sejam eles entes públicos ou privados – é justamente aquela pautada pela legalidade e pela não influência negativa sobre o meio ambiente. O que permite concluir que é vedada a utilização de recursos ambientais de forma que influencie negativamente no meio ambiente como macrobem autônomo, por ser esse bem difuso, indisponível e insuscetível de apropriação. Justamente em razão dessas limitações que atingem indistintamente a todos os recursos ambientais – de forma que sua utilização seja racional e não prejudique o bem maior, meio ambiente –, a doutrina vem procurando configurar outra categoria de bens – os bens de interesse público –, na qual estão inseridos tanto bens pertencentes a entidades públicas quanto particulares. Ficam eles subordinados a um regime jurídico mais rígido em relação à intervenção estatal e de tutela pública, surgindo aí duas categorias, os de circulação controlada e os de uso controlado. É esse aspecto que estabelece identidade no regime jurídico dos bens ambientais, qual seja: eles podem ser utilizados por seus titulares – sejam particulares (solo, árvores fora de áreas protegidas, prédio histórico etc.), públicos (área pública, recursos minerais etc.) ou a coletividade (ar, praias etc.) – desde que essa utilização não se mostre nociva ao meio ambiente como bem autônomo (macrobem). 2.2.3. Divisão de responsabilidades entre o Poder público e a sociedade Outro ponto importante que deve ser observado acerca da disposição constitucional em referência ao meio ambiente, diz respeito ao fato de o legislador não ter se limitado a impor ao Poder Público, única e exclusivamente a condição de guardião e promotor dos pressupostos de um modelo de desenvolvimento sustentável. Ao revés, procurou construir uma noção próxima do conceito de cidadania ambiental: ao mesmo tempo em que a 51

MIRRA, 2002, p. 48

36

preservação ambiental é considerada como interesse de todos, conferindo-se à toda coletividade o direito de exigir a manutenção do equilíbrio ecossistêmico indispensável à sadia qualidade de vida. Essa mesma coletividade é convocada a defender e preservar as condições ambientais como patrimônio comum. O mesmo dispositivo constitucional (art. 225) que garante o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à qualidade de vida é o mesmo que impõe ao Poder público e à coletividade, o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Reúnem-se, portanto, no centro ou núcleo do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado uma atribuição subjetiva e transindividual de poder, um dever objetivo e outro reflexo, projetados para o passado, para o presente e para o futuro na perspectiva de um pacto entre gerações. Nesse mesmo diapasão, AYALA52 argumenta que apesar do legislador ter considerado o meio ambiente como res communes omnium, não atribuiu, exclusivamente, ao Poder Público o dever de tutela jurisdicional civil, como interesse difuso. Ao fazê-lo, distinguiu o meio ambiente da estrita visão de bem público; ao que tudo indica, situou o bem ambiental como disciplina autônoma e a título jurídico autônomo. Quando a Constituição define que cabe ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e futuras gerações, estabelece como um dos princípios constitucionais a responsabilidade ambiental, não somente pública, mas a responsabilidade privada também. Nesse cenário, tem-se o que se pode chamar de modelo compartilhado de responsabilidades, na qual cada ente social é responsável por uma parcela da tutela do meio ambiente. Destarte, passaremos a verificar, a seguir, como se dá os atuação dos diversos atores na proteção ambiental no Brasil. Verificar-se-á, para tanto, a atuação do Poder Público nas suas diversas esferas, incluindo-se aí a tarefa do Ministério Público e, por fim, a atuação das organizações civis. 2.2.4. O princípio da equidade intergeracional: preservação para as futuras gerações Depreende-se também do texto constitucional brasileiro, a preocupação do legislador em preservar o meio ambiente, não somente para a presente mais também para as futuras gerações. A matriz desse dispositivo enfoca que as presentes gerações não podem 52

LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patrick de Araújo. Direito Ambiental na Sociedade de Risco: Forense Universitária. 2º ed. Rio de Janeiro; 2004. pág. 59.

37

deixar para as futuras gerações uma herança de déficits ambientais ou do estoque de recursos e benefícios inferiores ao que receberam das gerações passadas.53 Rompe com o padrão de individualização da atuação dos atores sociais e proporciona o estabelecimento de vínculos de coletivização das relações em torno de bens jurídicos e novos direitos substancialmente distintos daqueles tutelados pelos sistemas privados ou mesmo pelos sistemas públicos clássicos.54 Nesse bojo encontra-se o Princípio da Equidade Intergeracional, o qual pondera a solidariedade entre os membros de diferentes gerações tendo como cerne a questão ambiental. Nessa condição os “pais” sãos co-responsáveis pela qualidade ambiental que será vivenciada pelos “filhos”, devendo a presente geração deixar de herança, no mínimo, a natureza no atual estado em que se encontra, zelando pela qualidade ambiental em todos os seus aspectos, com vistas às gerações vindouras. Para AYALA a constituição da equidade intergeracional revela a formulação de uma ética de alteridade intergeracional, reconhecendo finalmente que o homem também possui obrigações, deveres e responsabilidades compartilhadas, em face do futuro.55 Evidencia-se a necessidade de integração do discurso ético do respeito à alteridade, mas, sobretudo, da alteridade intergeracional constituído-se, pois, elemento de revisão do moderno discurso ecológico, como elemento de revisão do moderno discurso de inclusão do outro, propulsor de uma democracia ambiental, qualificada pelo novo Estado democrático do ambiente. A equidade intergeracional tem como essência, portanto, a comunitariedade e a alteridade56, em que os direitos e relações só podem ser reconhecidos, a princípio, no coletivo. Trata-se, pois, de um pacto de gerações tendo a preservação ambiental como objeto. 2.2.5. Função sócio-ambiental da propriedade O direito ao ambiente ecologicamente equilibrado não foi, no entanto, tratado exclusivamente no caput do artigo 225. Não se trata de uma norma isolada no corpo constitucional. Pelo contrário, é um direito sintonizado e abordado vezes outras pelo

53

SAMPAIO, José Adércio Leite; WOLD, Chris; NARDY, Afrânio. Princípios de direito ambiental: na dimensão internacional e comparada. Belo Horizonte: Del Rey, pág. 53. 54 WOLKMER, Antonio Carlos & LEITE, José Rubens Morato (orgs.). In: Os “novos” direitos no Brasil: natureza e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 242. 55 MORATO LEITE, José Rubens; AYALA, Patrick de Areújo; op. cit. p. 63. 56 WOLKMER, Antonio Carlos & MORATTO LEITE, José Rubens (orgs.). op. cit. p. 242.

38

constituinte. Uma dessas abordagens refere-se à nova concepção atribuída à função social da propriedade, adquirindo contornos de função sócio-ambiental da propriedade. 57 Nesse sentido a Constituição de 1988 é categórica ao definir, em seu artigo 186, que a função social58 é cumprida quando a propriedade rural atender simultaneamente, segundo critérios e graus de exigências estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: a) aproveitamento racional e adequado; b) utilização racional dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; c) observância das disposições que regulam as relações de trabalho; d) exploração que favoreça o bem-estar do proprietário e dos trabalhadores. No referido dispositivo constitucional estão explicitados os três elementos necessários para a efetivação da função social: o econômico, o social e o ambiental59. A conciliação da utilidade privada (atividade agrária ou da função produtiva) e dos interesses públicos ocorre quando a exploração econômica leva em consideração os aspectos social e ambiental. O legislador constituinte asseverou esse mesmo entendimento também nos princípios gerais da atividade econômica que determinam que a ordem econômica deve observar os princípios da propriedade privada, a função social da propriedade e a defesa do meio ambiente (art. 17060, incisos II, III e VI da CF, respectivamente). O exercício do direito de propriedade sobre a terra, portanto, passa a levar em consideração também a conservação do solo e a proteção da natureza. A compreensão restrita de que a propriedade cumpre a sua função social quando produz alimentos, sem colimar outros interesses, parece não ser suficiente para abranger as novas necessidades sociais e ambientais surgidas nesse novo contexto.61 Para BENATTI62, na atual configuração constitucional brasileira, a função social da propriedade agrária é composta por dois elementos: função produtiva e função ecológica, as quais por sua vez estão reconfigurando a propriedade privada, vinculando as 57

BENJAMIN, Antônio Herman V. Introdução ao direito ambiental brasileiro. In: Direito do Ambiente e Redacção normativa: teoria e prática nos paises lusófonos. UICN, pág. 39. Disponível em http://www.iucn.org/themes/law/pdfdocuments/EPLP42PT.pdf. Acesso em 20 de dezembro de 2004. 58 O Estatuto da Terra (Lei 4.504/1964), em seu art. 2º, § 1°, já prevê a função social da propriedade, afirmando que a propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente, a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias, b) mantém níveis satisfatórios de produtividade, c) assegura a conservação dos recursos naturais, d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivam. 59 BENATTI, José Heder. Op. Cit; Pág. 188. 60 CF/88 Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: II - propriedade privada; III - função social da propriedade; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação. 61 BENATTI, José Heder. Op. cit; pág. 188. 62

Idem, pág. 190.

39

atividades desenvolvidas no imóvel rural aos cuidados com o meio ambiente. Essas modificações introduzidas no conteúdo da propriedade, a função constitui limitações ad intra, vão influir diretamente na concepção de utilidade privada e de utilidade social. “A função ecológica vai exigir do proprietário um novo comportamento, já que não se trata de meras abstenções de atos, mas da necessidade de assumir uma postura positiva e ativa no exercício dos poderes do titular sobre a coisa, revelada na utilização responsável dos recursos naturais. Não se trata apenas de se abster de praticar certos atos para proteger o meio ambiente (postura positiva), mas de realizar uma exploração que assegure a utilização racional dos recursos naturais disponíveis (ação positiva)”.63 Além de mudar a atuação dos proprietários, a função ecológica propicia a terceiros (não-proprietários) uma gama de novas possibilidades jurídicas que podem ser aplicadas contra qualquer utilização lesiva ao meio ambiente ou aos bens ambientais.64 “A introdução do aspecto ambiental no direito de propriedade operou uma transformação no leque de interesses que a propriedade privada protegia. Protegem-se não somente os interesses do proprietário, mas também os dos não-proprietários. Portanto, a propriedade passa a ser assegurada como uma relação jurídica que se estabelece entre os homens e as coisas, e também entre os homens no que se refere ao uso das coisas”.65 Nesse contexto, BENATTI66 aduz que hoje o amparo jurídico do imóvel rural está no binômio: uso tradicional agrário (atividade agrária) e proteção ambiental, o que nos leva a classificar a propriedade rural como uma propriedade agroambiental. “Em conseqüência, a propriedade agroambiental não tem somente a função de produzir, mas tem também a função pública da gestão ambiental, ou seja, deve gerir da melhor forma o espaço dentro do imóvel rural, pois a dúvida entre ter que produzir ou ter que proteger o meio ambiente só existe para a propriedade liberal, que privilegia mais o uso tradicional da terra do que outras formas de utilização do solo e dos recursos naturais renováveis. Na nova ótica, a atividade agrária assume um papel de destaque na gestão do espaço rural196, buscando integrar o aproveitamento da terra e a proteção do meio ambiente”.67

63

BENATTI, José Heder, op. cit; pág. 190. Idem 65 Idem 66 Idem, pág. 191. 64

67

Idem

40

Portanto, de acordo com os preceitos constitucionais anteriormente descritos, para que o conteúdo da propriedade seja a expressão de uma exploração socialmente útil da terra e dos recursos naturais, precisa ser efetivado de tal forma que garanta a utilização ecologicamente equilibrada. 2.3.

O meio ambiente na ordem infra-constitucional

A legislação infraconstitucional brasileira é considerada uma das mais avançadas e completas do mundo. Impulso prodigioso nesse campo ocorreu a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, que, entre outros méritos, dedica capítulo especial à matéria ambiental. Outro fato determinante para o aprimoramento do arcabouço legal nessa área foi, sem dúvida, a ECO 92, Conferência Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento. Dentre as principais leis brasileiras que versam sobre o meio ambiente, pode-se citar: 2.3.1. Lei Federal - 6.938/81 Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins, mecanismos de formulação, aplicação e estrutura do SISNAMA. 2.3.2. Lei Federal - 8.159/91 Traça as linhas gerais sobre o direito à informação, ao instituir a Política Nacional de Arquivos Públicos e Privados, impondo ao Estado os deveres de gestão documental e de proteção especial de arquivos, considerados estes como instrumentos de apoio à administração, à cultura e ao desenvolvimento científico, além de elementos de prova e informação. 2.3.3. Lei Federal - 9.795/99 Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências.

41

2.3.4. Lei Federal - 9.985/00 Regulamenta o artigo 225 da CFB e institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC. 2.3.5. Decreto Federal - 99.274/90 Regulamenta as Leis Federais nºs 6.902/81 e 6.938/81, instituindo a estrutura do SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente, cria o CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente, estabelece a obrigatoriedade do licenciamento ambiental e apresentação de EIA/RIMA, quando necessário. Em sua 2ª parte, institui os procedimentos para implantação das Estações Ecológicas e das Áreas de Proteção Ambiental (APA’s). 2.3.6. Decreto Federal - 3.834/01 Regulamenta o artigo 55, da Lei nº 9.895/00, estipulando que as unidades de conservação e as áreas protegidas criadas em data anterior à Lei nº 9.985/00, e que não pertençam às categorias nela previstas, serão reavaliadas pelo IBAMA, visando ajustá-las à referida lei. 2.3.7. Lei Federal - 9.433/97 Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, que tem por escopo a utilização racional e integrada dos Recursos Hídricos, com vistas ao desenvolvimento sustentável. Cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos integrado pelos Comitês de Bacias Hidrográficas, dentre outros, responsáveis pelo estabelecimento dos mecanismos de cobrança pelo uso dos recursos hídricos. 2.3.8. Lei Federal - 9.605/98 Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. 2.4.

Os deveres do Poder Público na tutela do meio ambiente

42

Como visto em tópico antecedente, com o advento da Constituição Federal de 1988, a Administração Pública e os cidadãos tornaram-se responsáveis diretos pelo zelo ao meio ambiente. Em primeiro lugar, o que se nota é que existe, expressamente consignado, o dever imposto ao Poder Público de atuar na defesa do meio ambiente, seja no âmbito legislativo, seja no âmbito executivo e até no âmbito jurisdicional. Para tanto, a Constituição atribuiu ao Estado a incumbência de adotar uma série de ações e programas, que, no seu conjunto, constituem a política ambiental do país (artigo 225, § 1º), disciplinada em norma específica, a Lei n.6.938/81 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente), e influenciada por documentos internacionais na matéria, especialmente as Declarações das Nações Unidas de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano, de 1972, e do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992. Observe-se que, a defesa do meio ambiente é um dever do Estado, sendo, assim, a atividade dos órgãos estatais na sua promoção é compulsória. Com isso, torna-se viável, em relação ao Poder Público, a exigência do exercício das competências ambientais, com as regras e contornos constitucionalmente previstos. 2.4.1 A Administração Pública e o seu poder de policia É através do poder de polícia ambiental que a Administração Pública protege o meio ambiente fazendo uso da força do Estado, utilizando a coercibilidade materializada nas sanções administrativas dos agentes competentes68. Esse poder de polícia é parte integrante da Administração Pública que tem como objetivo limitar e disciplinar direito, interesse e liberdade, regulando condutas para evitar abusos. O poder de polícia ambiental administrativo é exercido pelos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, previsto pelo art. 6°, da Lei 6.938/81, compostos pelos Conselhos Ambientais ligados ao Ministério do Meio Ambiente, como: Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, Conselho Nacional da Amazônia Legal, Conselho Nacional dos Recursos Hídricos e o Comitê do Fundo Nacional do Meio Ambiente, que formam os órgãos consultivos e deliberativos; e o Conselho de Governo é o órgão superior, presidido pelo Presidente da República. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA - é o órgão executor; órgãos colegiados instituídos por alguns Estados, como o Conselho Estadual de Proteção ao Meio Ambiente -

43

CEPRAM, Comissão de Política Ambiental - COPAM, Comissão Estadual de Controle Estadual - CECA, entre outros, são órgãos seccionais. Os órgãos setoriais - órgãos ou entidades Federais da Administração direta ou indireta encarregados de proteger o meio ambiente; e os órgãos locais - órgãos ou entidades municipais ambientais concluem a relação de órgãos e entidades integrantes do SISNAMA. Existem também os órgãos ambientalistas divididos por regiões do País. Esses órgãos ou entidades colegiadas que fazem parte do SISNAMA abrem para o cidadão que está fora dos quadros oficiais, a condição de fazer valer suas propostas através dos mesmos. É importante salientar o poder de polícia que alguns desses órgãos possuem, dando legitimidade de coerção às infrações locais. Grande parte dos atos de polícia, embora discricionários em certos casos, são vinculados e auto-executórios, tratando-se sempre de aplicação de sanções. Todavia, deve ser oportunizado o exercício da ampla defesa (art. 5, inciso XXXIV da CF), uma vez que as sanções envolvem a multa, a interdição de atividade e de estabelecimento, demolições, embargos de obras, proibição de fabricação, comércio de produtos, etc. No entanto, a prática tem revelado inúmeras situações em que o Poder Público, notadamente a Administração, deixa de agir, se omite no cumprimento do seu dever de adotar as medidas necessárias à proteção ambiental, causando com isso diretamente danos ao meio ambiente

ou

permitindo

que

degradações

ambientais

se

concretizem.

2.4.2. O papel do Ministério Público Declara a Constituição da República, em seu artigo 129, inciso III, ser função institucional do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do meio ambiente. Também o artigo 103, inciso VIII, da Lei Orgânica do Ministério Público a essa função se refere, mencionando não só a proteção, mas a prevenção e reparação do dano ao meio ambiente. O Ministério Público ocupa posição fundamental na defesa do meio ambiente, também, por ser o único autorizado a promover o inquérito civil (CF, art. 129, III, c/c o art. 8°, § 1º da Lei 7.347/85) e com poderes de notificação e requisição (CF, art.129, VI e VIII). Já o artigo 2°, § 3°, do Decreto 24.645 de 1934 atribui aos promotores de justiça a obrigação de assistir os animais em juízo, por serem seus substitutos legais. Apesar da impropriedade técnica dos termos utilizados, é incontroverso que a defesa dos animais em 68

MUKAI, Toshio. Op. cit. 55.

44

juízo incumbe ao Ministério Público, e não só às entidades protetivas, que não podem realizar as investigações necessárias, nem possuem legitimidade para firmar compromisso de ajustamento de conduta. Uma vez que compete privativamente ao Ministério Público promover a ação penal pública, na forma da lei, como assevera o artigo 129, inciso I, da Constituição da República, cabe aos seus representantes reprimir os procedimentos que incidem na norma punitiva do artigo 32 da Lei 9.605/98, como os atos de abuso, maus-tratos, e extermínio em massa de animais saudáveis, que não representam ofensa à saúde pública, praticados pela Administração Pública, por meio do Centro de Controle de Zoonoses, sem que desse proceder resulte qualquer valia para a controle epidemiológico ou da superpopulação de animais. Há de se ressaltar, ainda, que a Lei Federal nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), legitima o Ministério Publico para propor ação de improbidade contra autoridades que praticam atos atentatórios aos princípios da administração pública. Nesse passo, tendo em vista que a política pública de saúde adotada pelos centros de controle de zoonoses, como já foi exposto, afronta os princípios administrativos que denotam a boa administração da coisa pública, forçoso é concluir pelo cabimento da ação civil pública, outrossim, com fundamento em ato de improbidade administrativa, com o objetivo de ser atribuída as penas cabíveis as autoridades responsáveis. Outro instrumento em que há participação do Ministério Público, seja como fiscal da lei ou quando este assumir a titularidade ativa, em caso de abandono da ação pela parte legitimada, que visa a tutela da fauna, é a Ação Popular. A ação popular é disposta em lei especial (lei nº 4.717/65), sendo que seu conceito e objetos foram ampliados com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Na Constituição, tal instrumento foi inserido no artigo 5º. Dispõe o respectivo inciso LXXIII: Art. 5º- (...) omissis (...) omissis LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente, e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência. Importante destacar que a Ação Popular está inserida no artigo 5º da Constituição, que se refere aos direitos e garantias fundamentais, sendo este artigo considerado como cláusula pétrea, em razão do disposto no artigo 60, § 4º, IV da

45

Constituição Federal, que não permite que aquele seja abolido por emendas constitucionais. Diante disso, para alterar o disposto neste artigo, seria necessário a um Poder Constituinte Originário que elaborasse uma nova Carta Magna. Em seguida será abordada a organização da sociedade civil no Brasil. Fazendose, de início, uma rápida visão histórica no Brasil e, logo após, propõe-se a investigação das referências mais utilizadas para a consideração das organizações civis de proteção ao meio ambiente e, por fim, a análise da sua natureza jurídica.

46

CAPÍTULO III

A ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NO BRASIL: CONTEXTO E REALIDADE NORMATIVA

A noção de sociedade civil ressurgiu no cenário teórico e político nos anos 80. Tal renascimento deve-se principalmente a três fatores: a)

o esgotamento das formas de organização política baseadas na tradição marxista, com a conseqüente reavaliação da proposta marxista de fusão entre sociedade civil, Estado e mercado;

b)

o fortalecimento no ocidente da crítica ao estado de bem estar social pelo reconhecimento de que as formas estatais de implementação de políticas de bem estar não são neutras, e o surgimento dos chamados "novos movimentos sociais" que centram sua estratégia não na demanda de ação estatal, mas na proposição de que o Estado respeite a autonomia de determinados setores sociais;

c)

os processos de democratização da América Latina e Europa Oriental, onde os atores sociais e políticos identificaram sua ação como parte da reação da sociedade civil ao Estado.69

O conceito de sociedade civil se encontra no cerne dos processos que levaram à constituição da modernidade ocidental, que se revelou incapaz de produzir formas de solidariedade a partir de estruturas de coordenação impessoal de ação. Boa parte da filosofia política e da sociologia no século XIX esteve voltada para a questão de como produzir formas não particularistas de ação em sociedades onde as formas comunitárias de solidariedade não mais operam, e onde o mercado não é solução satisfatória para a geração de formas de

47

igualdade e solidariedade. Daí a ligação entre a necessidade de se produzir formas modernas de solidariedade e o conceito de sociedade civil Sociedade civil, enquanto conceito é amplo e certamente passível de análise sob muitos enfoques. Essa expressão, como lembra FERNANDES 70, representa o muito que pode ser feito para o social nas esferas não-governamentais. Ela começou a fazer parte do vocabulário dos ativistas sociais latino-americanos no final dos anos 70. Tanto ela como suas antecessoras dos anos 70 - “comunidade”, e “movimentos sociais” - ou dos anos 80 “cidadania”, e “sem fins lucrativos” - e outras expressões utilizadas nos dias atuais - como “organizações do terceiro setor” e “organizações não-governamentais” - expressam mais do que conceitos objetivos, o potencial articulador da sociedade. No contexto social SALAMON71 aponta uma virtual revolução associativa fazendo emergir um expressivo terceiro setor composto por organizações estruturadas, localizadas fora do aparato formal do Estado, que não distribuem lucros resultantes de suas atividades, entre seus diretores e acionistas, autogovernadas e com significativo esforço voluntário. É um movimento crescente, organizado e independente. Mobiliza a participação voluntária das pessoas da sociedade. Todavia, sua emergência é de tal relevância que, como bem registra Fernandes, implica em mudanças gerais no modo de agir e pensar. A participação e a importância desse emergente setor no Brasil e em outros países foram analisadas por SALAMON e ANHEIRS72. Nesse estudo os referidos autores encontraram que grande quantidade dessas organizações convivia com outras atuando nas áreas de ensino particular, saúde com grandes hospitais particulares e associações profissionais e outras defendendo o interesse de grupos específicos. Os referidos autores relatam a existência, no Brasil, em 1990, de cerca de 200.000 organizações conforme os registros do Imposto de Renda, sendo 11.076 fundações, e 179.010 associações. Uma em cada quatro delas localizava-se em São Paulo ou Rio de Janeiro. Encontraram que as áreas de atuação dessas organizações eram principalmente as seguintes:73 a) 29% trabalhando principalmente nas áreas de saúde e serviços sociais 69

AVRITZER, Leonardo. Além da Dicotomia Estado-Mercado. Novos Estudos, nº 36. São Paulo, 1993, 121. 70 FERNANDEZ, Rubem Cezar. “Privado, porém, público - o terceiro setor na América Latina”. Rio de Janeiro: Relume-Dumara, 1994, 34. 71 SALAMON, Lester M. e Helmut K. Anheir - “The emerging nonprofit sector - an overview” - Manchester, UK: Manchester University Press, 1996, p. 15. 72 73

Idem. SALAMON, Lester M. e Helmut K. Anheir - “The emerging nonprofit sector - an overview” - Manchester, UK: Manchester University Press, 1996, p. 15.

48

b) 23% representa grupos recreativos e esportivos c) 19% atua com serviços culturais e educacionais d) 9% é de associações profissionais e de empresários e) 20% apresenta múltiplas atividades Esses mesmos autores identificaram em outras fontes a existência de organizações que não visam lucro entre estabelecimentos de saúde (38.000), bibliotecas (20% delas), museus (33%), universidades (28) e uma imensa rede de escolas de primeiro e segundo grau. Registram ainda um enorme crescimento dessas organizações em anos seguintes. Relatam eles um estudo em que foi estimada a abertura de cerca de 9.000 organizações por ano.74 3.2. O Terceiro Setor: Conceito e controvérsias Para se referir à sociedade civil a literatura tem utilizado o termo “Terceiro Setor” que na realidade é um conceito, uma expressão de linguagem entre outras. Existe, portanto, no âmbito do discurso e na medida em que as pessoas reconheçam o seu sentido num texto ou numa conversação. É uma expressão ainda pouco utilizada no Brasil. Foi traduzido do inglês Third Sector e faz parte do vocabulário sociológico corrente nos Estados Unidos. No Brasil, começa a ser usada com naturalidade por alguns círculos ainda restritos. Segundo Rubem César Fernandes “além do Estado e do mercado, há um ‘terceiro setor’. ‘Não-governamental’ e ‘não-lucrativo’, é, no entanto, organizado, independente, e mobiliza particularmente a dimensão voluntária do comportamento das pessoas”75. Mais especificamente, o conceito de Terceiro Setor “denota um conjunto de organizações e iniciativas privadas que visam à produção de bens e serviços públicos”76. Segundo FERNANDEZ: “Este é o sentido positivo da expressão. ‘Bens e serviços públicos’, neste caso, implicam uma dupla qualificação: não geram lucros e respondem a necessidades coletivas. Eventuais benefícios auferidos pela circulação destes bens não podem ser apropriados enquanto tais pelos seus produtores e não podem, em conseqüência, gerar um patrimônio particular”.77

74

Idem FERNANDES, Rubem César; op. cit, p. 19,20. 76 Idem, p. 21. 77 FERNANDES, Rubem César; op. cit, 75

49

Assim, para essa corrente o primeiro setor é o governo, que é responsável pelas questões sociais. O segundo setor é o privado, responsável pelas questões individuais. Com a falência do Estado, o setor privado começou a ajudar nas questões sociais, através das inúmeras instituições que compõem o chamado terceiro setor. Ou seja, o terceiro setor é constituído por organizações sem fins lucrativos e não governamentais, que tem como objetivo gerar serviços de caráter público. A utilização do termo Terceiro Setor não é, porém, de todo pacífico na doutrina. Em seu livro “Terceiro Setor e Questão Social”, Carlos Montaño enfrenta teoricamente uma das principais artimanhas ideológicas do pensamento neoliberal: a tentativa de substituir o conceito gramsciano de “sociedade civil”, enquanto arena privilegiada da luta de classes e momento constitutivo do Estado ampliado, pela vaga noção de “terceiro setor”, concebido como algo pretensamente situado para além do Estado e do mercado. Ele não se limita a mostrar o equívoco teórico deste ambíguo conceito de “terceiro setor”, mas aponta também para as suas perigosas implicações políticas.78 Segundo MONTAÑO, o uso predominante do conceito de “terceiro setor” expressa uma noção claramente diferenciada do que entendemos que realmente esteja em questão. A perspectiva de análise hegemônica parte de traços superficiais, epidérmicos do fenômeno, o mistificaram e o tornaram ideológico. A perspectiva hegemônica, em clara inspiração pluralista, estruturalista ou neopositivista, isola os supostos “setores” um dos outros e concentra-se em estudar (de forma desarticulada da totalidade social) o que entende que constitui o “terceiro setor”: estudam-se as ONGs, as fundações, as associações comunitárias, os movimentos sociais, etc., porém desconsideram-se processos tais como a reestruturação produtiva, a reforma do Estado, enfim, descartam-se as transformações do capital promovidas segundo os postulados neoliberais.79 MONTAÑO aduz: “Assim, o termo pe construído a partir de um recorte do social em esferas: o Estado (“primeiro setor”), o mercado (“segundo setor”) e a “sociedade civil” (“terceiro setor”). Recorte este, como mencionamos, claramente neopositivista, estruturalista, funcionalista ou liberal, que isola e autonomiza a dinâmica de cada um deles, que, portanto, desistoriciza a realidade social. Como se o “político” pertencesse à esfera estatal, o “econômico” ao âmbito do mercado e o “social” remetesse apenas à sociedade civil, num conceito reducionista”.80

78

Palavras do prefaciador Carlos Nelson Coutinho sobre a obra de Montaño. MONTAÑO, Carlos. Terceiro Setor e Questão Social – crítica ao padrão emergente de intervenção social: Cortez Editora. 2º edição. São Paulo: 2003, p. 51. 80 MONTAÑO, Carlos.; op. cit., p. 53 79

50

Segundo MONTAÑO: “[...]a primeira debilidade teórica do termo: “terceiro” ou “primeiro” setor? Supostamente, o “terceiro setor” teria vindo para “resolver” um problema de dicotomia entre público e privado. O público identificado sumariamente como o Estado e o privado considerado como o mercado – consideração claramente de inspiração liberal”. MONTAÑO ainda completa: “Se o Estado está em crise e o mercado tem uma lógica lucrativa, nem um nem outro poderiam dar resposta às demandas sociais. O terceiro setor seria a articulação/intersecção materializada entre ambos os setores: o “público porém privado”, a atividade pública desenvolvida pelo setor provado”.81 [...] “Já temos aqui a primeira grande debilidade conceitual. Quando os teóricos do “terceiro setor” entendem este conceito como superador da dicotomia público/privado, este é verdadeiramente o “terceiro” setor., após o Estado e o mercado, primeiro e segundo, respectivamente; o desenvolvimento de um “novo” setor que viria dar as respostas que supostamente o estado já não pode dar e que o mercado não procura dar. Porem, ao considerar o ‘terceiro setor” como a sociedade civil, historicamente ele deveria aparecer como o ‘primeiro”. Esta falta de rigor só é desimportante (sic) para quem não tiver a história como parâmetro da teoria”.82 Portanto, segundo a análise de MONTAÑO, o termo “terceiro setor” não reúne um mínimo consenso sobre sua origem nem sobre sua composição ou suas características. Tal dissenso é clara expressão de um conceito ideológico que não dimana da realidade social, mas tem como ponto de partida elementos formais e uma apreensão da realidade apenas no nível fenomênico. Sem a realidade como interlocutora, como referência, acaba-se por ter diversos conceitos diferentes.83 3.3. Definições terminológicas das organizações civis A existência de uma pluralidade de terminologias para se referir à sociedade civil organizada apresenta-se como um verdadeiro desafio na escolha do termo a ser empregado como nomeação a tais instituições, dentre as quais pode-se citar: ONG 81

Idem, p. 54 Idem, p. 55 83 Idem, p. 58, 59. 82

51

(Organização não-Governamental), OSCIP (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público), ou OS (Organizações Sociais). Algumas desses termos trazem no seu conteúdo, por vezes, qualidades políticas e poucas vezes são destacadas pela sua classificação conforme a personalidade jurídica constante no rol do Código Civil.84 Assim, convém nesse passo, analisá-los individualmente para ao final optar por aquele que configure a realidade das organizações de proteção ambiental. Afinal, a determinação das nomenclaturas, seguindo os critérios jurídicos, pode auxiliar, na melhor entendimento das personalidades jurídicas capacitadas para interagirem em prol do meio ambiente como um todo.85 3.3.1. As organizações não-governamentais (ONGs) ONG (Organização não-governamental) é o termo mais utilizado86 para se referir às Organizações Civis para a proteção do meio ambiente. Seja pelas próprias instituições quanto pela mídia em geral tal sigla tornou-se comum para mencionar a atuação da sociedade civil em causas ecológicas, na qual não existe a participação do Estado, mas que tem atitudes de realizar atos para a sociedade em substituição aos deveres do Poder Público, com caráter eminentemente paraestatal e não partidário.87 LANDIM88 assenta inicialmente que, organização não-governamental é expressão que traz a marca da polissemia, movendo-se num campo que se presta a várias apropriações ideológicas ou discursivas, possibilitando usos diversificados por diferentes atores – e, portanto, podendo constituir-se em objeto de polêmica e luta em torno desses usos. Assim ela leciona: “Suas conotações e definições sociais podem, portanto, também variar com o tempo. No entanto, apesar da polissemia, da mera definição literal por negação, no contexto brasileiro (e não só) durante as duas últimas décadas o nome tem sido predominantemente usado para designar um conjunto determinado de organizações cuja pré-história remonta ainda aos anos 1970 e cuja história foise compondo ao longo dos 1980. Nas transformações e deslocamentos entre fronteiras de conjuntos variados de organizações da sociedade civil dedicadas à 84

KRAVUTSCHKE, Angelita Czezacki: Oscip e as Organizações Ambientalistas. In teses do 8º Congresso Internacional do Meio Ambiente, pág. 145. 85 Idem, pág. 145. 86 Nesse trabalho de pesquisa, por exemplo, a maioria dos autores utilizam o termo ONGs de maneira generalizada, englobando qualquer tipo de instituição sem fins lucrativos e fora da esfera governamental. 87 Idem, pág. 146. 88 LANDIM, Leilah. Experiência Militante: histórias das assim chamadas ONGs. Disponível em : http://www.lusotopie.sciencespobordeaux.fr/resu2002-1-14.html. Acesso em 01/03/2005. Pág. 215.

52

ação social, neste final de década, torna-se razoável pensar que o destino do termo seja incerto”.89 Nesse mesmo sentido KRAVUTSCHKE argumenta que “[...] a sigla ONG é um símbolo que carrega em si variadas formas de reação emocional, pois, sempre esteve ligado a ideologias que geram cargas de paixão”. Mas antes de despertar sentimentalismo, o que inicialmente representa é a simplificação de sua abrangência delimitada em ações de interesse da coletividade. “Essa sigla tem sido usada, muitas vezes, em discursos para variados interlocutores, os quais, não percebendo a finalidade e característica dessa pessoa jurídica, criam situações de fato das mais variadas implicações. Em geral, quando se faz menção às Organizações Não-Governamentais (ONG), enfatiza-se o seu caráter “não-governamental”, em alguns momentos até “antigovernamental”90. Assim, em resumo, em mais uma tentativa de definição, ONG seria um grupo social organizado, sem fins lucrativos, constituído formal e autonomamente, caracterizado por ações de solidariedade no campo das políticas públicas e pelo legítimo exercício de pressões políticas em proveito de populações excluídas das condições da cidadania. 3.3.2. As organizações sociais (OS) Para explicitar o que é uma Organização Social necessário se faz recorrer à Lei Federal n.º 9.637 de 15 de maio de 1998. Esta lei dispõe sobre a qualificação de entidades como OS cria o Programa Nacional de Publicização. Podem qualificar-se como OS quaisquer pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, que desenvolvam atividades nas áreas de ensino, pesquisa cientifica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde, além de atenderem aos requisitos postos na lei. Como requisitos específicos para que uma pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, seja qualificada como OS, temo: a necessidade de comprovação de que seu ato constitutivo, esteja disposto: a) a natureza social dos objetivos da entidade relativos à respectiva área de atuação; b) a sua finalidade não lucrativa, com a obrigatoriedade de 89

LANDIM, Leilah. Experiência Militante: histórias das assim chamadas ONGs. Op. cit. pág. 215. MENDONÇA e GÓIS argumentam que “em sua gênese, as ONGs tiveram o papel de contestar as ações do Estado, colaborando para o debate e cobrança para e com a sociedade brasileira”. MENDONÇA, Joselaine; GÓIS, Zélia. Aonde vai a ONGs?. BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador, v. 12, n. 3, p. 211, dez. 2002 90

53

investimento em seus excedentes financeiros no desenvolvimento das próprias atividades; c) a previsão expressa de ter, como órgão de deliberação superior e de direção, um conselho de administração e uma diretoria definidos nos termos de seu estatuto; d) a previsão de participação, no órgão colegiado de deliberação superior, de representantes do Poder Público e de membros da comunidade; e) composição e atribuições da diretoria; f) obrigatoriedade de publicação anual, no Diário Oficial da União, dos relatórios financeiros e do relatório de execução do contrato de gestão; g) no caso de associação, a aceitação de novos associados; h) a proibição de distribuição de bens ou parcela do patrimônio liquido em qualquer hipótese; (9) a previsão de incorporação integral do patrimônio, dos legados e doações que lhe foram destinados, bem como dos excedentes financeiros decorrentes de suas atividades, em caso de extinção ou desqualificação, ao patrimônio de outra organização social qualificada no âmbito da União, da mesma área de atuação, ou ao patrimônio da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, na proporção dos recursos dos bens por estes alocados. Atendendo a esses requisitos, a qualificação da entidade dependerá de haver aprovação, quanto à sua conveniência e oportunidade, do Ministro ou titular do órgão superior ou regulador da área de atividade correspondente ao seu objeto social e do Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão. Para sacramentar a parceria entre o Estado e a OS, foi criada a figura do Contrato de Gestão. A Lei Federal 9.637/98 afirma que ele é instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como OS, com vistas à formação de parceria entre as partes para o fomento e execução de atividades relativas às áreas expostas anteriormente e que se encontram definidas no art. 1º. Ele deverá ser elaborado de comum acordo entre órgão ou entidade supervisora da OS e discriminará as atribuições, responsabilidades e obrigações do Estado e da Organização Social na consecução dos seus objetivos. A elaboração do Contrato de Gestão deve ser feita tendo por base os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da economicidade. Ele deverá apresentar especificação do programa de trabalho proposto pela OS, a estipulação de metas a serem atingidas e os respectivos prazos de execução, bem como previsão expressa dos critérios objetivos de avaliação de desempenho a serem utilizados, mediante indicadores de qualidade e produtividade, além da estipulação de limites e critérios para despesas como remuneração e vantagens de qualquer natureza a serem percebidas pelos dirigentes das OS´s. 3.3.3. As organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP)

54

Com o evidente crescimento da sociedade civil no Brasil, surgiu a necessidade de valorização das entidades que realmente buscavam fins públicos, e representam grandes segmentos da sociedade civil, e não somente pequenos grupos. Surgiu então, a partir de uma consulta do Conselho da Comunidade Solidária, um projeto de lei (n 4.690/98, de 28/07/98), que mais tarde deu origem à lei 9.790, de 23/03/99, que dispõe sobre a qualificação de entidades como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público. Esta lei, regulamentada em 30/06/99 (decreto nº 3.100), transforma tais entidades em parceiras dos órgãos governamentais, aptas a realizarem Termos de Parceria91, prestando contas com grande transparência e publicidade, mantendo a agilidade e efetividade características do Terceiro Setor. Diferente dos títulos de utilidade pública, a qualificação como OSCIP é um direito da pessoa jurídica, desde que a mesma cumpra os rigorosos requisitos do Ministério da Justiça, e esteja apta a dar publicidade à sua movimentação financeira. Não há obrigatoriedade no cadastramento em OSCIP e é também importante mencionar que em uma OSCIP, os benefícios não são os mesmos que para entidades filantrópicas, de utilidade pública e ONG 's (àquelas inscritas no CNEA). Se a entidade remunerar seus dirigentes poderá perder isenção de impostos e não ter mais direito a alguns benefícios como imunidade tributária e isenção do imposto de renda. A criação das OSCIPs é uma maneira de tornar a parceira entre Estado e sociedade civil organizada mais simples, de tal forma que o Estado possa acordar com estas entidades para que elas executem certas políticas públicas, aproveitando toda a experiência que já possuem atuando junto à sociedade, visando assim a efetividade na execução das políticas públicas. Optou-se por criar essa nova figura jurídica, ao invés de se reformular o emaranhado de leis, decretos e resoluções existentes, justamente pela complexidade de tal reformulação, ou seja, tomou-se o caminho mais curto para que o Estado pudesse pactuar com o Terceiro Setor92. Destarte, as Organizações Sociais e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público são pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, que ao atenderem aos requisitos de suas respectivas leis instituidoras, recebem a titulação almejada. São entidades que, conforme já mencionado, surgem para absorver atividades que não são

91

Termo de Parceira é um instrumento passível de ser firmado entre o Poder Público e as entidades qualificadas como OSCIP com o objetivo de se formar vínculo de cooperação entre as partes para o fomento e a execução de atividades de interesse público previstas no artigo 3º da lei 9790/99.

55

exclusivas do Estado. Elas guardam certas semelhanças entre si, mas surgem de processos diferentes, que marcam as peculiaridades de cada um. Conforme todo o exposto, pode-se constatar, de maneira articulada que: o termo Terceiro Setor é uma expressão que engloba todos os tipos de organizações da sociedade civil. ONGs (Organizações não governamentais) é a sigla mais utilizada que possui uma conotação mais ideológica, derivada dos movimentos sociais; OS (Organizações Sociais) e OSCIP (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) Estas, são, na realidade, qualificações e/ou titulação atribuídas por suas leis de regência, capazes de possibilitar a assinatura do Contrato de Gestão e o Termo de Parceria, que são instrumentos de formalização da cooperação entre o Poder Público e as organizações da sociedade civil. 3.4. Natureza jurídica das organizações da sociedade civil no Brasil No Brasil, existem apenas duas formas jurídicas para instituições não lucrativas: associação civil e fundação. Ambas são classificadas como pessoas jurídicas de direito privado; contudo, suas naturezas são bastante distintas. O Novo Código Civil (assim como o de 1916) dispõe acerca das principais características e critérios para a criação e funcionamento de cada uma. Associação Civil é uma pessoa jurídica de direito privado, criada a partir da união de pessoas em torno de uma finalidade não lucrativa. Embora este conceito não constasse do texto do Código Civil de 1916, é assim que a doutrina, a jurisprudência e outros diplomas legais definiam uma associação: por sua característica não lucrativa. O Novo Código Civil traz uma nova definição expressa, conforme veremos adiante. Lembramos que a Constituição Federal de 1988 consagra a liberdade de associação para fins lícitos, vedando a interferência estatal em seu funcionamento. Fundação privada, por sua vez, é uma pessoa jurídica constituída a partir de um patrimônio destinado por uma pessoa (física ou jurídica) para a realização de um fim social e determinado. Ou seja, é criada por iniciativa de seu instituidor, necessariamente por escritura pública ou testamento. A atuação e o patrimônio das fundações estão sujeitos à fiscalização do respectivo Ministério Público de cada Estado93, que tem a atribuição legal de zelar pelo 92

FERRAREZI, Elisabete. Novo Marco Legal do Terceiro Setor no Brasil. In: Encuentro de la Red Latinoamericana y Del Caribe de la Sociedad Internacional de Investigacio Del Tercer Sector – Perspectivas Latinoamericanas sobre el Terce Sector, III, 2001, Buenos Aires. Anais. 93 No caso do Distrito Federal e Territórios, o art. 66 do novo Código Civil prevê que o encargo caberá ao Ministério Público Federal; o Projeto de Lei nº 6960/2002 (referido no próximo trecho do artigo) propõe alterar esta disposição de modo que o Ministério Público do Distrito Federal fiscalize as fundações desta circunscrição.

56

interesse público nessas organizações, assegurando a efetiva utilização do patrimônio para o cumprimento de sua finalidade. Destarte, as organizações civis deverão se enquadrar ou como Associação ou como Fundação de natureza jurídica privada. Mister se faz trazer à baila as conclusões articuladas de ANGELITA CZEZACKI KRAVUTSCHKE94 ao analisar o tema: “7.4 OSC Organização da Sociedade Civil é uma determinação genérica usada internacionalmente e pouco reconhecida pelas próprias instituições pesquisadas, que pode ser utilizada para qualquer organização de pessoas podendo ser a terminologia genérica para as Instituições que trabalham com Meio Ambiente tanto na fiscalização como na parceira e implantação da política pública vigente. 7.5 OSCIP é a OSC com Interesse Público. Representa um título de qualificação destinado para Instituições que terão controle estatal mais direto e mais facilidade no manuseio de recursos públicos e destinação direta de parte dos tributos das empresas. Regulamentada pela lei 9790/99 é chamada de A Lei do Terceiro Setor ou estAtuto do Terceiro Setor. 7.6 Fundação, Sociedade Civil e Associação são tipos institucionais previstos no Código Civil para pessoa jurídica de direito privado e que não tem impedimento para serem tituladas OSCIP. 7.7 A Associação é uma das modalidades de pessoa jurídica prevista no Código civil, de fácil constituição, que pode ter titulação OSCIP e que para atuação preventivo frente o meio ambiente, tem nos Termos de Parceria, com governos municipal, estadual e federal, uma ferramenta útil. 7.8 A Associação OSCIP mantém sua qualidade ser formada por pessoas em um ideal comum de construção da qualidade ambiental e mantém sua atribuição fiscalizadora do primeiro e segundo setor se não atuarem conforma as leis ambientais e os princípios norteadores do direito ambiental. Para essa atividade ganhar credibilidade pública possível com o Título OSCIP, requer que a mesma esteja devidamente correta em sua constituição, contabilidade e atuação, pois de tempo em tempo, poderá ser fiscalizada para a manutenção da titulação OSCIP. [...] 7.10 Os novos grupos de pessoas que estejam interessadas em atuar em causas ambientalistas ou instituições de fato, não ordenadas em nenhum modelo de pessoa jurídica reconhecida pelo direito, devem seguir esse modelo institucional proposto. 7.11 Assim as ORGANIZAÇÕES AMBIENTALISTAS COM PERSONALIDADE JURÍDICA NO MODELO ASSOCIAÇÕES E TITULAÇÃO OSCIP representa o formato jurídico de maior poder de gerência e independência em prol do Meio ambiente saudável para atual e futuras gerações”.

94

KRAVUTSCHKE, Angelita Czezacki; op. cit., pág. 164, 165.

57

Conforme todo o exposto, a melhor expressão a ser empregada para se referir às organizações civis que militam na causa ambientalista é Organização Ambientalista, levando-se em consideração a sua natureza jurídica (Associação ou Fundação) e a sua titulação (OSC ou OSCIP).

58

CAPÍTULO IV

A EFETIVIDADE DA ATUAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES CIVIS NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE

4.1. O principio da participação e a atuação das organizações ambientalistas A crise ecológica relatada no capítulo primeiro dessa pesquisa bem como motivou e continua a motivar a participação da sociedade civil na preservação do meio ambiente. Em matéria ambiental, a participação popular na construção de uma sociedade justa e igualitária e na manutenção da qualidade ambiental, como pressuposto à melhoria da qualidade de vida humana, ganha especial importância, face à própria natureza difusa do objeto juridicamente tutelado. Com efeito, o desfrute e a proteção do meio em que estamos inseridos e do qual somos parte integrante e indissociável, constituem direito e dever de toda a coletividade, presente e futura, segundo o mandamento insculpido no artigo 225 da Constituição Federal. Porquanto constitua um dos princípios do Direito Ambiental, a participação tem as suas raízes na sociologia política e reflete, resumidamente, a idéia de atuação da sociedade civil, que adota comportamentos desejados pelo legislador, cumprindo-os espontaneamente e exigindo a atuação sobre as decisões políticas do Estado (democracia), de modo a fazer com que o Poder Público assuma uma postura ética, social e comprometida com as valores e as funções que deve respeitar e realizar. Isso representa dizer que cada cidadão deve fazer a sua parte em relação aos bens e valores ambientais, e mais do que isso, exigir que todos façam a sua parte. Esse último matriz é que dá o sentido do princípio da participação ambiental, na exata medida em que, vivendo-se em um Estado Democrático de Direito, sob os princípios e objetivos referidos anteriormente, espera-se da sociedade justamente uma tomada de posição, altiva, altruísta,

59

ética e participativa, mormente quando estamos diante de valores sagrados e essenciais à preservação da vida.”95 O exercício da cidadania, como reflexo da aplicação do princípio da participação popular, empresta legitimidade, transparência e segurança aos processos decisórios, e pode manifestar-se das seguintes formas: organização jurídica das comunidades (em associações de bairro, por exemplo); participação popular no processo legislativo, desde a fase de discussões até a aprovação final do projeto, e através dos mecanismos constitucionais de democracia direta (referendo, plebiscito e iniciativa popular)96; pressão e controle sobre as autoridades públicas e busca pela efetividade das orientações e decisões políticas emanadas dos órgãos ambientais; participação direta na gestão ambiental por meio de tais organismos, sejam de caráter consultivo ou deliberativo, federais, estaduais, distritais ou municipais; e, finalmente, utilização séria e em massa de instrumentos jurídico-processuais de tutela do ambiente. Por sua vez, o acesso à informação ambiental interliga Direito e Cidadania e prepara os caminhos que serão trilhados pela sociedade civil consciente de suas prerrogativas e obrigações. Isto porque a população passiva permite que o Direito seja utilizado como instrumento de dominação, quando deveria refletir as relações e os conflitos estabelecidos no seio da sociedade e as necessidades daqueles que são, ao mesmo tempo, criadores e destinatários do ordenamento jurídico. Afinal, como propugna a Carta de 1988, “todo o Poder emana do povo”. Neste contexto, o movimento por justiça ambiental e as entidades ambientalistas surgem como sujeitos coletivos de direitos, que atuam junto aos órgãos públicos ambientais, provocam o Poder Judiciário, exigem atuação ambiental e socialmente responsável por parte do setor empresarial e, afinal, lutam pela efetividade e pelo aperfeiçoamento das normas de tutela ambiental. Segundo LEME MACHADO, “[...] as

ONG’s

não têm por fim o

enfraquecimento da Democracia representativa (...) não são – e não devem ser concorrentes dos Poderes Executivo e Legislativo, mas intervêm de forma complementar, contribuindo para instaurar e manter o Estado Ecológico de Direito”.97

95

KLEIN Joann. O papel da cidadania na formulação de políticas ambientais. Em Conflitos jurídicos, econômicos e ambientais. Paulo Roberto Pereira de Souza e Jon Mills (coords.). Maringá-PR: Universidade Estadual de Maringá – UEM, 1995, p.101-119. 96 MILARÉ, Édis; op. cit., p. 97 MACHADO, Paulo Affonso Leme; op. cit., p. 82.

60

No sentido de fomentar a atuação das Organizações Civis, a Agenda 21 elaborou dispositivo exclusivo para o assunto, com o escopo de promover “a mais ampla participação pública e o envolvimento ativo das organizações não-governamentais e de outros grupos também devem ser estimulados”98. Ainda em seu capítulo 27 que tem como titulo “FORTALECIMENTO DO PAPEL DAS ORGANIZAÇÕES NÃO-GOVERNAMENTAIS: PARCEIROS PARA UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVE”, que tem como objetivo fomentar a atuação das organizações não-governamentais em prol da causa ambiental, conforme se vê no item 27.1 do referido documento:

“27.1. As organizações não-governamentais desempenham um papel fundamental na modelagem e implementação da democracia participativa. A credibilidade delas repousa sobre o papel responsável e construtivo que desempenham na sociedade. As organizações formais e informais, bem como os movimentos populares, devem ser reconhecidos como parceiros na implementação da Agenda 21. A natureza do papel independente desempenhado pelas organizações não-governamentais exige uma participação genuína; portanto, a independência é um atributo essencial dessas organizações e constitui condição prévia para a participação genuína”. Acertado tem sido o incentivo à participação da sociedade civil em prol da tutela ambiental. As ONGs exercem um influente papel no cenário ambiental internacional, face ao seu caráter ordenador dos debates. Os relatórios apresentados pelas ONGs nos fóruns internacionais de meio ambiente são de extremo relevo, na proporção que vêm a endossar as preocupações da opinião pública internacional, auxiliando, sobremaneira, no processo de flexibilização das soberanias estatais clássico-liberais.99 No âmbito internacional, as Instituições de maior relevo na esfera ambiental se apresentam como sendo o Instituit de Droit Internacional e a Internacional Law Association, ambas com importantes resoluções já expedidas sobre a temática ambiental, mas, o papel “da hora” que haverá de ser desempenhado pelas ONGs se destina a uniformizar a doutrina internacional como fonte de interpretação e solução dos conflitos internacionais, dotando o processo de autocomposição de conflitos internacionais, em especial, aqueles relativos a atuação das empresas internacionais e a transferência de tecnologia entre o norte e o sul do

98

Agenda 21. A Agenda 21 foi elaborada na Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro em 1992, tendo por base o conceito de desenvolvimento sustentável, tendo contribuído para a sua elaboração instituições governamentais e da sociedade civil de 179 países, os quais a aprovaram na citada conferência. Disponível em: http://www.aultimaarcadenoe.com/agenprin.htm. Acesso em 02/03/2005. 99 OLIVEIRA, Frederico Antonio Lima de. Regulação Social do Ambiente e o Novo Papel das Organizações Não-governamentais no Direito Ambiental Internacional. In: Teses do 8º Congresso Internacional de Direito

61

globo, atribuindo também uma maior legitimidade na obtenção de resultados mais desejados e, conseqüentemente, mais eqüânimes.100 4.2. Instrumentos e condições para a eficácia da atuação das Organizações Ambientalistas Discorre-se a seguir acerca da forma que as organizações ambientalistas executam suas atividades no seio da sociedade em prol da preservação do meio ambiente. 4.2.1. Informação Ambiental Uma

das

principais

atividades

desempenhadas

pelas

organizações

ambientalistas, diz respeito à sua atuação na publicidade da questão ambiental. A base da participação comunitária e da cooperação está na manutenção e crescente amplificação dos mecanismos de informação da coletividade. Com efeito, sem o acesso à informação, ficaria inviabilizada, por exemplo, a participação da comunidade nas audiências públicas referentes à discussão de estudos prévios de impacto ambiental, reduzindo a dimensão participativa a um aspecto meramente formal. Impossibilitado restaria, também, o manejo do instrumento da ação popular ambiental, através do qual o cidadão exercita o direito de buscar em juízo a prevenção/correção de um dano ao meio ambiente.101 Conforme ensina BESSA ANTUNES, “[...]o Direito Ambiental é um direito que tem uma das vertentes de sua origem nos movimentos reivindicatórios dos cidadãos e, como tal, é essencialmente democrático. O princípio democrático materializa-se através dos direitos à informação e à participação” e “é aquele que assegura aos cidadãos o direito pleno de participar na elaboração das políticas públicas ambientais”102. O direito à informação é, portanto, um dos instrumentos de efetivação do princípio da participação e, ao mesmo tempo, de controle social do Poder, permitindo a atuação consciente e eficaz da sociedade, no desenvolvimento e na implementação das políticas públicas direcionadas à área ambiental. Segundo MILARÉ, o direito à informação:

Ambiental: Fauna, políticas públicas e instrumentos legais. São Paulo 31 de maio a 03 de junho de 2004. Disponível em http://www.planetaverde.org/teses. Acesso em 29 de novembro de 2004.Pg. 370. 100 OLIVEIRA, Frederico Antonio Lima; op. cit., p. 370. 101 COSTA NETO, Nicolao Dino de Castro .op.cit. p.75, 76

62

“ (...) surge como significativa conquista da cidadania para a participação ativa na defesa de nosso rico patrimônio ambiental. Aliás, o direito à informação é um dos postulados básicos do regime democrático, essencial ao processo de participação da comunidade no debate e nas deliberações de assuntos de seu interesse direto. (...) De fato, o cidadão bem informado dispõe de valiosa ferramenta de controle social do Poder. Isto porque, ao se deparar com a informação e compreender o real significado da Questão Ambiental, o ser humano é resgatado de sua condição de alienação e passividade. E, assim, conquista sua cidadania, tornando-se apto para envolver-se ativamente na condução de processos decisórios que hão de decidir o futuro da humanidade sobre a Terra”.103 Sem o conhecimento dos assuntos relativos ao meio ambiente, incogitável será, de igual sorte, a realização das metas ligadas à educação ambiental e à conscientização publica para a preservação do meio ambiente, nos termos cogitados na Constituição Federal (art. 225, $ 1º, inciso VI). No plano global, foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Resolução 217-A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 10.12.1948, e assinada pelo Brasil na mesma data, o documento que, há anos atrás, lançou as bases para a consolidação do direito à informação. Conforme dispôs a Declaração, “toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras”.104 Por seu turno, a Declaração de Estocolmo, que resultou da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, de 1972, consignou a importância da educação e da divulgação de informações para fundamentar as bases de uma opinião pública consciente de suas responsabilidades sociais e ambientais, especialmente através dos meios de comunicação de massa; ressaltou, além disso, a necessidade de se fomentar a pesquisa e o desenvolvimento científicos, bem como o livre intercâmbio de experiências e de informação atualizada, especialmente para garantir o acesso dos países em desenvolvimento às chamadas tecnologias limpas.105 Em 1992, a Declaração do Rio, formalizada durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, tratou das obrigações recíprocas entre os Estados relativas à notificação em casos de desastres naturais ou outras emergências, cujos 102

ANTUNES, Paulo de Bessa. Op. cit., p. 31 e 32. MILARÉ, Edis; op. cit. p. 342, 343. 104 Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em http://www.direitoshumanos.usp.br/. Acesso em 01/04/2005. 105 Declaração de Estocolmo. Disponível em http://www.direitoshumanos.usp.br/ 103

63

efeitos possam ultrapassar suas fronteiras; e de informação sobre atividades potencial ou efetivamente causadoras de considerável impacto ambiental transfronteiriço negativo. Faz referência, ao direito à informação perante as autoridades públicas, inclusive quanto a materiais e atividades perigosas nas comunidades, e declara o dever dos Estados de disponibilizar informações para a coletividade, visando facilitar e estimular a conscientização pública e a participação democrática.106 A Agenda 21, que também surgiu no âmbito da Conferência conhecida como Rio-92, reconhece que cada pessoa é usuária e provedora de informação em sentido amplo (dados, informações, experiências e conhecimentos) e que a necessidade de informação surge em todos os níveis, desde o de tomada de decisões superiores, nos planos nacional e internacional, ao comunitário e individual. Neste sentido, em seu Capítulo 40, institui duas metas fundamentais: a redução das diferenças em matéria de dados e a melhoria da disponibilidade da informação. Destarte, uma das atuações marcantes das organizações ambientalistas é exatamente a efetivação da informação ambiental aos cidadãos. Exemplo recente foi o caso dos organismos geneticamente modificados, em que várias organizações civis protetoras da natureza, veicularam diversos anúncios que alertavam a população sobre os possíveis perigos dos transgênicos. 4.2.2. Educação Ambiental As organizações ambientalistas têm desempenhado uma importante função no campo da educação ambiental no Brasil, assim como em países da Europa. As organizações se dedicam aos aspectos ligados à inter-relação da espécie humana com seu ambiente natural, com a preocupação de conservar os recursos biológicos para estas e para as próximas gerações. Poderiam ainda ser subdivididas entre as ativistas e as técnicas, ambas importantes para o avanço das questões maiores. É necessário distinguir entidades que desempenham atividades concretas ligadas à conservação da biodiversidade e aquelas de cunho social ou desenvolvimentista que reconhecem em si mesmas uma missão conservacionista. Muitas das organizações iniciam suas atividades de educação ambiental com o objetivo de induzir um comportamento positivo com relação ao meio ambiente. Outras se envolvem neste campo, visando encorajar vítimas de problemas ambientais a tomar atitudes contra aqueles que causaram estes problemas. No entanto, pelo próprio processo da educação 106

Disponível em http://www.mma.gov.br

64

ambiental no Brasil, há uma tendência à execução de trabalhos isolados, sem interação e cooperação entre instituições (governamentais, empresas, universidades e ONGs), aumentando riscos de duplicação. Desta maneira, interessantes experiências de algumas instituições, que poderiam ser utilizadas por outras, são freqüentemente ignoradas.107 Iniciativas de educação ambiental para a proteção de espécies de primatas e aves ameaçadas de extinção no Brasil, por exemplo, são idéias geradas no seio de ONGs conservacionistas de cunho técnico. A evolução da educação ambiental no Brasil é ainda tímida. A maioria das iniciativas positivas na área de meio ambiente num contexto isolado. Entretanto, projetos para a proteção de espécies ameaçadas, por exemplo, tem demonstrado ser uma grande oportunidade para estimular a mudança de atitude, não somente com relação a preservação de uma única espécie, mas do ecossistema como um todo. A contribuição para comunidade local é significante, especialmente em locais de baixa renda onde se identifica a carência na área de alimentação, educação, saúde, etc. por outro lado, projetos urbanos que lidam com os principais problemas ambientais das cidades, se constituem no ponto de partida para uma discussão mais ampla sobre esta realidade visível e gritante. 4.2.3. Participação em órgãos de proteção ambiental Outro importante setor em que a legislação prevê o envolvimento ativo das ORGANIZAÇÕES CIVIS

é a participação em órgãos de controle ambiental, tal como o CONAMA –

Conselho Nacional de Meio Ambiente, que integra o

SISNAMA

Ambiente, e de recursos naturais renováveis, a exemplo do Recursos Hídricos, que compõem o

SINGREH

– Sistema Nacional de Meio

CNRH

– Conselho Nacional de

– Sistema Nacional de Gerenciamento de

Recursos Hídricos. Ilustrativamente, vejamos a composição desses Conselhos. O

CONAMA

foi

criado pela Lei 6.938/81 e suas atividades regulamentadas pelo Decreto 99.274, de 06.06.1990, que, em seu artigo 5º, estabeleceu: Art. 5o. Integram o Plenário do CONAMA: I – o Ministro de Estado do Meio Ambiente, que o presidirá; II – o Secretário-Executivo do Ministério do Meio Ambiente (...); III – um representante do IBAMA; 107

CARVALHO, Cristina Alves de: As ONGs e a educação ambiental no Brasil. Disponível em: http://www.arvore.com.br/artigos/htm/ar1811_2.htm. Acesso em 01/03/05.

65

IV – um representante da Agência Nacional de Águas – ANA; V – um representante de cada um dos Ministérios, das Secretarias da Presidência da República e dos Comandos Militares do Ministério da Defesa (...); VI – um representante de cada um dos Governos Estaduais e do Distrito Federal (...); VII – oito representantes dos Governos Municipais (...), sendo: a) um representante de cada região geográfica do País; b) um representante da Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente – ANAMMA; c) dois representantes de entidades municipalistas de âmbito nacional; VIII – vinte e um representantes de entidades de trabalhadores e da sociedade civil, sendo: a) dois representantes de entidades ambientalistas de cada uma das Regiões Geográficas do País; b) um representante de entidade ambientalista de âmbito nacional; c) três representantes de associações legalmente constituídas para a defesa dos recursos naturais e do combate à poluição, de livre escolha do Presidente da República;d) um representante de entidades profissionais, de âmbito nacional, com atuação na área ambiental e de saneamento, (...); e) um representante de trabalhadores (...); f) um representante de trabalhadores da área rural (...); g) um representante de populações tradicionais (...); h) um representante da comunidade indígena (...); i) um representante da comunidade científica (...); j) um representante do Conselho Nacional de Comandantes Gerais das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares – CNCG; l) um representante da Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza – FBCN; IX – oito representantes de entidades empresariais; e X – um membro honorário indicado pelo Plenário. Por sua vez, o

CNRH

foi instituído pela Lei 9.433, de 08.01.1997,

regulamentada pelo Decreto 4.613, de 11.03.2003, que, em seu artigo 2º, estabeleceu a sua composição: Art. 2º. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos será presidido pelo Ministro de Estado do Meio Ambiente e terá a seguinte composição: I – um representante de cada um dos seguintes Ministérios: a) da Fazenda; b) do Planejamento, Orçamento e Gestão; c) das Relações Exteriores; d) dos Transportes; e) da Educação; f) da Justiça; g) da Saúde; h) da Cultura; i) do Desenvolvimento Agrário; j) do Turismo; e l) das Cidades. II – dois representantes de cada um dos seguintes Ministérios: a) da Integração Nacional; b) da Defesa; c) do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; d) da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; e e) da Ciência e Tecnologia; III – três representantes de cada um dos seguintes Ministérios: a) do Meio Ambiente; e b) de Minas e Energia; IV – um representante de cada uma das seguintes Secretarias Especiais da Presidência da República: a) de Aqüicultura e Pesca; e b) de Políticas para as Mulheres; V – dez representantes dos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; VI – doze representantes de usuários de recursos hídricos; e VII – seis representantes de organizações civis de recursos hídricos.

66

Fácil, portanto, em ambos os casos, perceber a desproporcionalidade na composição desses Conselhos, onde salta aos olhos a maioria esmagadora da representação do Governo, nos níveis federal, estadual, distrital e municipal. Em seguida, vem o setor empresarial (usuários), reservando-se ao “terceiro setor” uma representatividade mínima, se confrontada com a sua importância. Daí a pertinência análise de LEME MACHADO: “[...] em alguns órgãos colegiados, a participação do público é numericamente ínfima, não dando às associações a menor chance de influir no processo decisório. Nesse caso as associações passam a ter o papel mais de fiscal do processo decisório do que de participantes da tomada de decisão, evitando, pelo menos, que esse processo fique fechado pelo segredo”.108 4.2.4. Participação no âmbito administrativo A Lei 9.784, de 29.01.199, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, ao estabelecer os legitimados como interessados para intervir nesses processos, contemplou os entes intermediários: “Art. 9º. São legitimados como interessados no processo administrativo: I – pessoas físicas ou jurídicas que o iniciem como titulares de direitos ou interesses individuais ou no exercício do direito de representação; II – aqueles que, sem terem iniciado o processo, têm direitos ou interesses que possam ser afetados pela decisão a ser adotada; III – as organizações e associações representativas, no tocante a direitos e interesses coletivos; IV – as pessoas ou as associações legalmente constituídas quanto a direitos ou interesses difusos.” Isso significa que as associações ambientalistas têm legitimidade para interpor recursos administrativos perante o IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, por exemplo, de decisões concessivas de licenças ambientais. Tal fato, aliado à possibilidade de ajuizamento de ação civil pública, fecha o cerco ao redor de maus empreendedores e de decisões mal-informadas. De forma mais específica, a Lei 7.802, de 11.07.1989, que dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a

67

exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, determina o seguinte: “Art. 5º. Possuem legitimidade para requerer o cancelamento ou a impugnação, em nome próprio, doregistro de agrotóxicos e afins, argüindo prejuízos ao meio ambiente, à saúde humana e dos animais: I – entidades de classe, representativas de profissões ligadas ao setor; II – partidos políticos, com representação no Congresso Nacional; III – entidades legalmente constituídas para defesa dos interesses difusos relacionados à proteção do consumidor, do meio ambiente e dos recursos naturais. (...)” Em mais essa oportunidade, a legislação pátria municia a sociedade civil para que, uma vez organizada, exerça perante a Administração Pública a defesa tempestiva e eficaz dos interesses difusos e coletivos em jogo. 4.2.5. Monitoramento e fiscalização De forma complementar à atividade dos órgãos de controle integrantes do SISNAMA,

mas, é claro, sem a possibilidade de imposição de sanções e obrigações, por faltar-

lhes as prerrogativas inerentes ao Poder de Polícia administrativa, de que é titular exclusiva a Administração Pública; o comparecimento de entidades ambientalistas a audiências públicas convocadas em licenciamentos ambientais, por exemplo, não deixa de ser uma forma de controle social (e não administrativo) de atividades potencialmente poluidoras. Ou ainda o acompanhamento do cumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta. 4.2.6. Envolvimento em projetos e pesquisas Para averiguação do estado do Planeta e da eficiência das técnicas de gestão ambiental e das tecnologias de controle da poluição, através da utilização de recursos próprios ou do estabelecimento de parcerias com pesquisadores e universidades. 4.2.7. Denunciação

108

MACHADO, Paulo Affonso Leme. op cit, p. 83.

68

Denúncia de fatos e problemas, aliadas à cobrança junto ao Poder Público, às polícia ambiental e aos órgãos ministeriais para a adoção das medidas cabíveis, com o apoio de cientistas e outros estudiosos. 4.2.8. Assessoramento Assessoria, disseminação, multiplicação e intercâmbio de idéias e práticas: através da atuação em redes e coalizões e da realização de encontros e eventos, por exemplo; além disso, muitas

ONG’s

vêm atuando em parceria com Prefeituras, órgãos públicos e

empresas, além de assessorar em diversos níveis organismos internacionais que compõem a estrutura das Nações Unidas. 4.2.9. Influência nas Políticas Públicas Através da “pressão” junto aos Poderes Executivo e Legislativo ou ainda, as organizações civis ambientais exercem influente atuação no direcionamento das políticas publicas, com vistas à preservação ambiental. 4.2.10. Atuação na esfera judicial A Carta Constitucional de 1988 visando a atender às necessidades de uma moderna sociedade de massa, contemplou diversos instrumentos jurídico-processuais capazes de garantir a proteção de interesses transindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos), dentro da assertiva de que a todo direito corresponde um dever jurídico e uma ferramenta processual eficaz destinada a implementá-lo. Nesse sentido, a natureza difusa do meio ambiente, enquanto direito de todos, demanda a criação de uma tutela processual adequada, ágil e eficiente; que garanta ao indivíduo o acesso ao Poder Judiciário, no exercício da cidadania, bem como aos grupos sociais intermediários legitimados para tanto, na forma da lei. Assim sendo, o artigo 5º, LXXIII, da Constituição Federal dispõe que qualquer cidadão, na posição de fiscal do bem comum, “é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus de sucumbência”.

69

Mas para que a cidadania perante o Poder Judiciário também pudesse ser exercida pela sociedade civil organizada, o Constituinte previu, no inciso LXX do mesmo artigo 5º, o mandado de segurança coletivo, que pode ser impetrado: a) por partido político com representação no Congresso Nacional; b) e por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados. Cumpre notar que esse instituto não serve apenas à tutela dos interesses coletivos; destina-se também a proteger aquela categoria de interesses ligados à qualidade de vida, a que se dá o nome de difusos, dentre os quais o ambiente é um dos exemplos mais expressivos. Finalmente, o artigo 129, III, da Constituição, ao dispor sobre as funções institucionais do Ministério Público, inseriu entre elas a promoção do inquérito civil e da ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Entretanto, conforme ressalvado no § 1º do mesmo artigo, a legitimação do órgão ministerial para essas ações é concorrente e disjuntiva, isto é, não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, na forma da lei, que podem agir em conjunto ou isoladamente, sem que seja necessária a anuência dos demais. Estes dois instrumentos processuais, ao serem atribuídos a pessoas jurídicas para a tutela de interesses de terceiros, de natureza coletiva e difusa, rompem com um tradicional princípio jurídico, segundo o qual a ação seria definida como um direito subjetivo de agir em juízo em defesa de interesses próprios. De fato, na ação civil pública e no mandado de segurança coletivo a lei autoriza alguém a litigar em nome próprio, sobre direito alheio, excetuando a regra geral insculpida no artigo 6º do Código de Processo Civil. Não há, portanto, coincidência entre o titular do bem lesado (= coletividade), integrante da relação jurídico-material controvertida, e o sujeito do processo. Especificamente a ação civil pública está disciplinada na Lei 7.347, de 24.07.1985, e, nesse campo, o envolvimento das organizações não-governamentais ganha especial importância, uma vez que se tornou impraticável ao Estado assumir, de forma solitária, esse pesado e relevantíssmo encargo, na dura missão de assegurar, eficaz e tempestivamente, o controle judicial das atividades de risco e, quando necessária, a integral reparação de danos causados ao meio e a seus componentes naturais, culturais ou artificiais. Por tudo isso, a Lei 7.347/85 significou uma revolução na ordem jurídica brasileira, já que o processo judicial deixou de ser visto como mero instrumento de defesa de interesses individuais, para servir de efetivo mecanismo de participação da sociedade na busca de solução daqueles conflitos que envolvam interesses meta-individuais.

70

Assim é que, por força do artigo 5º desta Lei, é parte legítima para propor ação civil pública, além do Ministério Público e demais co-legitimados, a associação que: “I – esteja constituída há pelo menos um ano, nos termos da lei civil; II – inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico ou paisagístico”. Portanto, as associações civis já com um ano regular de existência, que tenham entre suas finalidades estatutárias a defesa do patrimônio ambiental, poderão agir em juízo por meio da espécie de ação coletiva em estudo. Note-se que a intenção do legislador, no citado inciso I, foi assegurar a legitimação somente àquelas organizações com um mínimo de representatividade, de modo a evitar manobras políticas, destituídas de qualquer motivação ambientalista. De qualquer modo, o juiz terá certa margem de discricionariedade na apreciação deste requisito, de modo a evitar o perecimento do direito, com amparo no § 4º do artigo 5º da Lei em comento. De fato, tal condição poderá ser dispensada quando, no caso concreto, transparecer manifesto interesse social, em face da dimensão e das características do dano ou do empreendimento ou em função da relevância ambiental do bem jurídico tutelado. Sob o mesmo argumento, alguns autores sustentam a possibilidade de legitimação de grupos de fato, não-personificados, face à relevância do interesse tutelado, que se difunde pela sociedade.109 Ademais, para os fins da Lei da Ação Civil Pública, não há necessidade de previsão estatutária explícita quanto ao objeto social voltado à tutela do ambiente, bastando que tal finalidade possa ser inferida dos valores expressos no ato constitutivo da entidade. Nesse sentido já entendeu Superior Tribunal de Justiça, verbis: “A ação civil pública pode ser ajuizada tanto pelas associações exclusivamente constituídas para a defesa do meio ambiente, quanto por aquelas que, formadas por moradores de bairro, visam ao bem-estar coletivo, incluída evidentemente nessa cláusula a qualidade de vida, só preservada enquanto favorecida pelo meio ambiente”.110 É exatamente a partir desses instrumentos que as organizações civis ambientais têm atuando na esfera judicial, porém, é claro, de maneira muito tímida, como será a seguir analisado.

109

CONCEIÇÃO, Maria Collares F. O papel das Ongs na defesa do meio ambiente: o exercício da cidadania. In: Direito ambiental em evolução. Vladimir Passos de Freitas (coord.). Curitiba: Juruá, 2002, n2., p.239. 110 RESp 31.150/SP, 2º Turma, j. 20.05.1996, Rel. Min. Ari Pargendler

71

4.4. Ministério Público x Organizações Civis: Quem efetivamente atua na esfera judicial? Diante do vasto arcabouço jurídico ambiental e das considerações feitas acima, cumpre-nos questionar a não muito expressiva atuação jurídica das associações ambientalistas no que diz respeito à proposição de ação civil pública. O Parquet é, sem dúvida, o maior proponente de ACPs, situação que acaba por atenuar as críticas feitas à sua atuação. O papel de somente exigir pode se revelar muito cômodo vez que não se encontra embaraço legal a uma atuação própria. Em caso, veja-se o exemplo do Estado do Rio de Janeiro. FUKS tece alguns comentários a esse respeito, baseado nos números de ações propostas (Figura 1), acerca da atuação do Ministério público e da sociedade civil no âmbito judicial.

“(...) a participação da sociedade civil na proteção judicial do meio ambiente caracteriza-se pela passividade, restringindo-se ao encaminhamento de denúncias e outros procedimentos secundários. Há uma espécie de "renúncia", por parte da sociedade civil, de fazer uso dos "novos direitos", o que nos força a repensar a associação que vem sendo feita entre a questão ambiental e o conceito de cidadania. O discurso jurídico, campo por excelência da definição de direitos e deveres, endossa essa associação, promovendo o mundo natural à condição de "Patrimônio Público", de "bem de uso comum", e criando instrumentos judiciais capazes de colocar a proteção do meio ambiente ao alcance de diversos setores da sociedade. No entanto, se levarmos em conta que a sociedade civil litigou, em defesa do meio ambiente, em apenas oito conflitos judiciais no estado do Rio de Janeiro e em duas ações no município, fica claro o hiato entre "novos direitos" e a mobilização da sociedade em sua defesa. Estariam os instrumentos jurídicos disponíveis "a frente" da sociedade que os produziu, esperando por um ator que os legitime na prática? Parece que, no que concerne o caso brasileiro, os instrumentos processuais relativos à proteção ambiental antecedem a sua virtual demanda social. Nesse contexto, ocorre o contrário do que se poderia supor: valores sociais emergentes, portanto, com "baixo poder de pressão social" (Bastos 1992 : 165) — como aqueles relativos à incorporação jurídica de interesses e direitos associados ao meio ambiente — tornam-se normas”.111 Eis o quadro da pesquisa:

111

FUKS, Mario (1996), Do discurso ao recurso: uma análise da proteção judicial ao meio ambiente do Rio de Janeiro. In: Leila da Costa Ferreira e Eduardo Viola (orgs.), Incertezas de sustentabilidade na globalização. São Paulo: Unicamp. Disponível em http://www.humanas.ufpr.br/departamentos/deciso/pessoal/mario/english.htm. Acesso em 07/04/2005.

72

Figura 1112

Apesar de a legislação brasileira minimizar os custos das despesas processuais das associações, o fato é que a ação judicial em defesa do meio ambiente pressupõe não apenas a participação de um profissional do campo jurídico (advogado), mas também, freqüentemente, a de profissionais dotados de conhecimento técnico-científico na área ambiental. Ocorre que, no movimento ambientalista brasileiro, apesar da crescente consciência da necessidade de profissionalização, ainda prevalecem estruturas nãoprofissionais. Certamente, a descrença quanto à eficácia dos procedimentos judiciais é um fator que contribui para o distanciamento da sociedade civil organizada desse campo de atuação. Além disso, como já foi observado, o longo percurso do ritual que vai da abertura do inquérito até a sentença final, somado à morosidade característica do judiciário brasileiro, inibe até mesmo os espíritos mais arrojados. No entanto, esses constrangimentos do sistema judiciário não retiram a força da primeira conclusão de nossa análise: o discurso que supõe ser a própria coletividade, enquanto protadora do "interesse público primário", o sujeito interessado na proteção do meio ambiente torna-se vulnerável quando confrontado com a observação empírica. O que os dados revelam é que, nos casos em que ela ocorre, a participação da "coletividade" nos litígios ambientais tem se restringido ao papel menor de encaminhar denúncias ao Ministério Público (ver figura 2). Difícil não associar esse ritual à tradição assistencialista da relação entre Estado e sociedade no Brasil. O que pode estar ocorrendo aqui é a utilização de instâncias públicas, como o Ministério Público, como compensação para a 112

Fonte: Arquivo da Equipe de Proteção ao Meio Ambiente e ao Patrimônio Comunitário da Procuradoria da Justiça do Rio de Janeiro.

73

ausência de recursos humanos especializados e atuantes na área ambiental no âmbito da sociedade civil organizada. Nesse caso, o Estado assistencialista aparece sob a forma de um Ministério Público hiperativo, ao qual são encaminhados solicitações de solução de problemas.

Figura 2113

No entanto, há outro aspecto a ser observado. Inúmeras ONGs ainda não dispõem de estrutura para a realização de mais essa atividade, que é dispendiosa. Diante do conhecimento de uma ameaça ou um dano efetivo ao meio ambiente, se limitam a enviar ao Ministério Público as denúncias que lhe são feitas exigindo uma atuação do órgão, que também enfrenta grandes limitações pelos poucos recursos de que dispõe e, em decorrência disso, tem sérias dificuldades de averiguação dos fatos comprometendo o Inquérito Civil e, conseqüentemente, a Ação Civil Pública a ser proposta. A verificação de ameaças de danos é muito difícil. As dimensões de nosso país somadas ao desinteresse da administração e a forte pressão política exercida grupos que visam resguardar interesses milionários são uma forte barreira perante estes instrumentos de tutela. A análise da realidade da fauna revela situação ainda mais preocupante, visto a possibilidade maior de omissão dos danos por ela sofridos com ações degradantes. Somente tomamos conhecimentos de degradações quando estas atingem o ápice do que se tem por alarmante, ou seja, quando o dano já está efetivado. Estudos sobre como os organismos animais estão reagindo ao contato diário com agentes tóxicos e seus efeitos nas teias

113

Fonte: arquivo da Equipe de Proteção ao Meio Ambiente e ao Patrimônio Comunitário da Procuradoria da Justiça do Rio de Janeiro.

74

alimentares são pouquíssimos divulgados pela mídia, os efeitos da pesca predatória não são conhecidos empiricamente, além de há um parco incentivo à pesquisa pelo Poder Público. Desta feita, faz-se imprescindível a atuação das ONGs também no que diz respeito à invocação da defesa do direito perante o Estado-juiz com vista a buscar a efetividade de leis ambientais que, não raro, foram inseridas no ordenamento jurídico pela luta destas mesmas instituições. Assim sendo, entendemos que seriam necessários ajustes na legislação vigente para que fosse juridicamente possível estender seus efeitos a pessoas jurídicas, em especial a organizações da sociedade sem fins lucrativos que dele necessitassem para comparecer em juízo, em defesa da qualidade do meio ambiente.

75

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ocorrência da crise ambiental, percebida por meio do grande número de catástrofes ambientais serviu para demonstrar a importância do meio ambiente para a humanidade. Ciente dessa devastação ecológica, a sociedade começa, então, a entronizar a “questão ambiental” - o conjunto de temáticas relativas não só à proteção da vida no planeta, mas também à melhoria do meio ambiente e da qualidade de vida das comunidades. Nesse contexto, surge o assim chamado “Estado de Direito Ambiental”, a forma de Estado que se propõe a aplicar o princípio da solidariedade econômica e social para alcançar um desenvolvimento sustentável, orientado a buscar a igualdade substancial entre os cidadãos, mediante o controle jurídico do uso racional do patrimônio natural. Dentro desse novo conceito de Estado de Direito, a atuação participativa da sociedade nas questões ecológicas impulsionam sobremaneira uma nova mentalidade, voltada para o desenvolvimento sustentável e para o uso racional dos recursos. Essa participação impõe, sem dúvida alguma, uma redefinição no conceito de cidadania, que adquire contornos de uma “cidadania ambiental”, baseada na atuação participativa e colaborativa, onde a cooperação e a solidariedade despontam como os melhores paradigmas para a solução dos problemas ambientais. A participação da sociedade civil, porém, demonstra-se ineficaz quando efetuada individualmente pelos cidadãos. A amplitude do problema ecológico requer a ação conjunta da sociedade, a união para a materialização da cidadania ambiental. Destarte, a sociedade civil organizada surge como um grande agente em prol da defesa do meio ambiente, na medida em que abriga vários indivíduos que comungam suas idéias e forças para atuarem na preservação ecológica. Assim, a sociedade civil coloca-se hoje como a consciência política do mundo. Na medida em que se verifica a inaptidão e incapacidade dos Estados nacionais para lidar com diversas temáticas sociais relevantes, a sociedade civil, geralmente em sua forma organizada, passa a ocupar espaços políticos cada vez mais importantes.

76

No Brasil, o constituinte de 1988, ciente da necessidade da união de forças em prol da defesa do meio ambiente, faz constar o principio da divisão de responsabilidade entre o Poder Público e a sociedade na tutela do meio ambiente. Nesse diapasão, ao Poder Público compete, por meio da Administração, o trabalho do poder de polícia, que consiste no uso da força do Estado, utilizando a coercibilidade materializada nas sanções administrativas dos agentes competentes, cujo objetivo é limitar e disciplinar direito, interesse e liberdade, regulando condutas para evitar abusos. E ainda o Ministério Público, instituição que posição fundamental na defesa do meio ambiente, por ser o único autorizado a promover o inquérito civil (CF, art. 129, III, c/c o art. 8°, § 1º da Lei 7.347/85) e com poderes de notificação e requisição (CF, art.129, VI e VIII); bem como competência para promover a Ação Penal Pública e Ação Civil pública para a Proteção do meio ambiente. Assim sendo, resta às organizações civis o trabalho de concorrência à atuação do Poder Público na tutela do meio ambiente, na medida em que agem tanto nas esferas administrativas quanto judiciais; A atuação das organizações civis ambientais torna efetivos alguns dos princípios do Direito Ambiental, especificamente os Princípios da Participação Pública, Informação e Educação Ambiental; Sua atuação estende-se ainda a fiscalização, envolvimento em projetos e pesquisas, denúncia de degradações ambientais e influência nas políticas públicas; Na esfera judicial, as Organizações Civis também sãos partes legítimas para proporem a Ação Civil Pública e o Mandado de Segurança Coletivo para a tutela jurídica do meio ambiente. Na prática, porém, a atuação da sociedade civil nesse ramo demonstra-se inexpressiva devido à necessidade de um aparato jurídico que demanda a necessidade de recursos financeiros, algo que poucas organizações ambientalistas brasileiras dispõem. Realidade essa que tornam necessários ajustes na legislação vigente para que fosse juridicamente possível estender seus efeitos a pessoas jurídicas, em especial a organizações da sociedade sem fins lucrativos que dele necessitassem para comparecer em juízo, em defesa da qualidade do meio ambiente. Em síntese, pode-se concluir, que as organizações civis Ambientalistas possuem fundamental importância na proteção do meio ambiente, através da união de cidadãos em prol da defesa do meio ambiente, cuja atuação engloba tanto a prevenção quanto a repressão.

77

Tais organizações exercem um papel inovador na medida em que, através de sua capacidade de exercer pressão política, amplificar a escala de denúncias, captar recursos, mobilizar e sensibilizar setores da mídia internacional, e acima de tudo da sua capacidade de produzir e disseminar informações convertem-se em atores relevantes que potencializam a capacidade de influenciar e pressionar comportamentos de governos nacionais, organismos internacionais e demais agências bilaterais e multilaterais. A sua atuação é pautada pela sua legitimidade e transparência. O ativismo que transcende fronteiras assume um papel estratégico na medida em que mobilizam informação para criar novos temas e categorias para persuadir, pressionar e ganhar relevância face a organizações poderosas e governos

espaço

78

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS

AGUIAR, Roberto Armando Ramos de. Direito do Meio Ambiente e participação popular. Brasília: Edições Ibama, 1998. ALPHANDÉRY, Pierre; BITOUN, Pierre e DUPONT, Yves. O equívoco ecológico – Riscos Políticos: São Paulo. Brasiliense, 1993. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6º edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris,2002. AVRITZER, Leonardo. Além da Dicotomia Estado-Mercado. Novos Estudos, nº 36. São Paulo, 1993. BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 1996. BENJAMIN, Antônio Herman V. Responsabilidade Civil pelo dano ambiental. In: Revista do Direito Ambiental. Ed. RT, v.9, ano 3, jan/mar. 1998. BENJAMIN, Antônio Herman V. A Proteção do meio ambiente nos países menos desenvolvidos: O caso da América Latina. In: Revista de Direito Ambiental. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, abr/jun 1999. BENJAMIN, Antônio Herman V. Introdução ao direito ambiental brasileiro. In: Direito do Ambiente e Redacção normativa: teoria e prática nos paises lusófonos. UICN. Disponível em http://www.iucn.org/themes/law/pdfdocuments/EPLP42PT.pdf. Acesso em 20 de dezembro de 2004. BITTENCOURT, Darlan Rodrigues e MARCONDES, Ricardo Kochinski. Lineamentos da responsabilidade civil ambiental. Revista dos Tribunais. Ed. RT, v. 740, 86º ano, jun, 1997. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1992. BRANCO, Samuel Murgel. O meio ambiente em debate. São Paulo: Moderna. 2002. CAVEDON, Fernanda de Sales. Considerações ético-jurídicas acerca do estatuto jurídico do animal: novos sujeitos de direitos?. In: Teses do 8º Congresso Internacional de Direito Ambiental: Fauna, políticas públicas e instrumentos legais. São Paulo 31 de maio a 03 de junho de 2004. Disponível em http://www.planetaverde.org/teses. Acesso em 29 de novembro de 2004.

79

CONCEIÇÃO, Maria Collares F. O papel das Ongs na defesa do meio ambiente: o exercício da cidadania. In: Direito ambiental em evolução. Vladimir Passos de Freitas (coord.). Curitiba: Juruá, 2002, n2. CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. 3. ed. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2001. COSTA NETO, Nicolao Dino de Castro e. Proteção Jurídica do Meio Ambiente: I Florestas. Ed. Del Rey. Belo Horizonte, 2003. CARVALHO, Cristina Alves de: As ONGs e a educação ambiental no Brasil. Disponível em: http://www.arvore.com.br/artigos/htm/ar1811_2.htm. Acesso em 01/03/2005. DIAS, José Eduardo Figueiredo. Direito constitucional e administrativo do ambiente. Cadernos do Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente. Coimbra: Almedina, 2002. FENSTERSEIFER, Tiago: “Cidadania ambiental cosmopolita: um novo conceito em construção”. In: Teses do 8º Congresso Internacional de Direito Ambiental: Fauna, políticas públicas e instrumentos legais. São Paulo 31 de maio a 03 de junho de 2004. Disponível em http://www.planetaverde.org/teses. Acesso em 29 de novembro de 2004. FERRAREZI, Elisabete. Novo Marco Legal do Terceiro Setor no Brasil. In: Encuentro de la Red Latinoamericana y Del Caribe de la Sociedad Internacional de Investigacio Del Tercer Sector –Perspectivas Latinoamericanas sobre el Terce Sector, III, 2001, Buenos Aires. Anais, FERNANDEZ, Rubem Cezar. “Privado, porém, público - o terceiro setor na América Latina”. Rio de Janeiro: Relume-Dumara, 1994. FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. FUKS, Mario. Do discurso ao recurso: uma análise da proteção judicial ao meio ambiente do Rio de Janeiro. In: Leila da Costa Ferreira e Eduardo Viola (orgs.), Incertezas de sustentabilidade na globalização. São Paulo: Unicamp. Disponível em http://www.humanas.ufpr.br/departamentos/deciso/pessoal/mario/english.htm. Acesso em 07/04/2005. GÓMEZ, José Maria. Política e democracia em tempos de globalização. Petrópolis/RJ: Vozes; Buenos Aires: CLACSO; Rio de Janeiro: LPP - Laboratório de Políticas Públicas, 2000. KLEIN, Joann. O papel da cidadania na formulação de políticas ambientais. Em Conflitos jurídicos, econômicos e ambientais. Paulo Roberto Pereira de Souza e Jon Mills (coords.). Maringá-PR: Universidade Estadual de Maringá – UEM, 1995. KRAVUTSCHKE, Angelita Czezacki: Oscip e as Organizações Ambientalistas. In: Teses do 8º Congresso Internacional de Direito Ambiental: Fauna, políticas públicas e instrumentos

80

legais. São Paulo 31 de maio a 03 de junho de 2004. http://www.planetaverde.org/teses. Acesso em 29 de novembro de 2004.

Disponível

em

LANDIM, Leilah. Experiência Militante: histórias das assim chamadas ONGs. Disponível em : http://www.lusotopie.sciencespobordeaux.fr/resu2002-1-14.html. Acesso em 01/03/2005. LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patrick de Araújo. Direito Ambiental na Sociedade de Risco: Forense Universitária. 2º ed. Rio de Janeiro; 2004. LIZT, Vieira: Cidadania global e estado nacional. Disponível http://www.dhnet.org.br/direitos/direitosglobais/cidadaniaglobal/cidadania_global.html. Acesso em 02 de abril de 2005.

em:

LUCKESI, Cipriano (et al). Fazer Universidade: Uma proposta metodológica. 10 ed. Cortez: São Paulo, 1998. LOUREIRO, Carlos Frederico B. Cidadania e globalização: contribuições para a educação ambiental. Disponível em: http://www.arvore.com.br/artigos/htm/ar2610_2.htm. Acesso em 05 de dezembro de 2004. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 11ª edição. São Paulo: Malheiros, 2003. MEDEIROS, Flávia de Paiva Medeiros & GUIMARÃES, Flávio Romero: Direito, meio ambiente e cidadania: Uma abordagem interdisciplinar. Madras. São Paulo, 2004. MENDONÇA, Joselaine; GÓIS, Zélia. Aonde vai a ONGs?. BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador, v. 12, n. 3, dez. 2002 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. MONTAÑO, Carlos. Terceiro Setor e Questão Social – crítica ao padrão emergente de intervenção social: Cortez Editora. 2º edição. São Paulo: 2003. MORATO LEITE, José Rubens; CAVALCANTI FERREIRA, Maria Leonor Paes: Estado de Direito Ambiental: O antropocentrismo alargado e o direito da fauna. Disponível em: http://www.dbjv.de/dbjv-high/mitteilungen/04-02/DBJV_Mitteilungen_02-2004.pdf. Acesso em: 05 de dezembro de 2004. MUKAI, Toshio. Direito Ambiental Sistematizado. 3º ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 1998. Nosso futuro comum. O Relatório Brundtland. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1990. OLIVEIRA, Frederico Antonio Lima de. Regulação Social do Ambiente e o Novo Papel das Organizações Não-governamentais no Direito Ambiental Internacional. In: Teses do 8º Congresso Internacional de Direito Ambiental: Fauna, políticas públicas e instrumentos legais. São Paulo 31 de maio a 03 de junho de 2004. Disponível em http://www.planetaverde.org/teses. Acesso em 29 de novembro de 2004.

81

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. São Paulo: Forense, 1997. v. 1.. RAMONET, Ignácio. Geopolítica do caos. Tradução de Guilherme João de Freitas Teixeira. 4 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. SACHS, Inacys. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. 2ªed. Rio de Janeiro: Garamond. 2002. SALAMON, Lester M. e Helmut K. Anheir - The emerging nonprofit sector - an overview” - Manchester, UK: Manchester University Press, 1996. SAMPAIO, José Adércio Leite; WOLD, Chris; NARDY, Afrânio. Princípios de direito ambiental: na dimensão internacional e comparada. Belo Horizonte : Del Rey, 2003. SOARES, Guido Fernando Silva. As ONGs e o Direito Internacional do Meio ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 17, 2000. STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Discricionariedade administrativa e dever de proteção do meio ambiente. In: Revista IDAF – Informativo de Direito Administrativo e Responsabilidade Fiscal. Ano III, n.º 26, set/2003. WOLKMER, Antonio Carlos & LEITE, José Rubens Morato (orgs.). In: Os “novos” direitos no Brasil: natureza e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2003. Sapo – Portugal On line. Disponível em www.acessojustica.no.sapo.pt/. Acesso em 11/01/2004

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.