A EMERGÊNCIA DA CONCEPÇÃO DO PROSUMER NA ERA DA COMUNICAÇÃO DIGITAL

July 21, 2017 | Autor: Lilian Bacich | Categoria: Prosumers
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO

A EMERGÊNCIA DA CONCEPÇÃO DO PROSUMER NA ERA DA COMUNICAÇÃO DIGITAL

Alan Q. Costa Ana Alice Vercesi Gallo Candice Heimann Diego de S. Mendes Else Lemos Fabiana Grieco C. de M. Vetritti Fernando da S. Pardo Karina V. Santos Lilian C. Bacich Martins Luiz Carlos Paloschi Marcelo O. da Cruz Maurício B. da C. Felício Rafael V. Pereira Renato Almada Alonso Roxana L. Varela Sepúlveda Solange Ugo Luques

São Paulo 2013

A EMERGÊNCIA DA CONCEPÇÃO DO PROSUMER NA ERA DA COMUNICAÇÃO DIGITAL

Texto coletivo apresentado como parte dos requisitos para obtenção de créditos na disciplina “Novas Lógicas e Literacias Emergentes no Contexto da Educação em Rede: Práticas, Leituras e Reflexões” (PPGCOM-USP). Alunos participantes: Alan Q. Costa, Ana Alice Vercesi Gallo, Candice Heimann, Diego de S. Mendes, Else Lemos I. Pereira, Fabiana Grieco C. de M. Vetritti, Fernando da S. Pardo, Karina V. Santos, Lilian C. Bacich Martins, Luiz Carlos Paloschi, Marcelo O. da Cruz, Maurício B. da C. Felício, Rafael V. Pereira, Renato Almada Alonso, Roxana L. Varela Sepúlveda e Solange Ugo Luques. Orientadora: Profª. Drª. Brasilina Passarelli

São Paulo 2013

Às nossas famílias.

AGRADECIMENTOS Um grupo com tantos membros certamente tem muito a agradecer por ter atingido o objetivo de produzir um trabalho a trinta e duas mãos, e aqui fica apenas o registro de nossos agradecimentos recíprocos e individuais, dada a impossibilidade de enumerá-los em tão curto espaço. Não podemos, entretanto, deixar de agradecer à Professora Brasilina Passarelli, Mestre e Doutora em Ciências da Comunicação pela USP, Livre-Docente pela ECA/USP do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação (PPGCOM) da ECA/USP, na área Interfaces Sociais da Comunicação, que ministrou, neste primeiro semestre de 2013, a disciplina Novas Lógicas e Literacias Emergentes nos Coletivos Digitais: Práticas , Leituras e Reflexões, motivo do nosso encontro. Desde o primeiro momento, ficou claro para todos que seria um semestre de muito aprendizado e empenho, em que conheceríamos muitos autores e teorias relacionados ao mundo digital, mas que, antes de tudo, não seríamos meros espectadores: teríamos que realmente praticar, ler e refletir sobre essas emergências, mergulhando numa lógica nova. Ficamos muito gratos à Professora Brasilina Passarelli, que nos orientou nesse percurso, desafiando cada um de nós a entregarmos nosso melhor e a nos tornarmos, também, prosumers.

[…] a reboque da sociedade contemporânea em rede, emergem novas lógicas, novas semânticas, novas literacias, novos modelos de negócios e novas práticas que ultrapassam as dualidades emissor-receptor da comunicação de massa do século passado, relocando a atenção dos teóricos da comunicação, das instituições de ensino e pesquisa e das empresas da chamada “nova economia” para a reciprocidade das ações comunicacionais onde os usuários da modernidade agora, na contempora neidade, são denominados prosumers (produtor + consumidor) com a consequente redefinição dos papéis destes atores em rede. (PASSARELLI & JUNQUEIRA, 2012, p. 14)

RESUMO A convergência das “velhas” mídias com as “novas” mídias fez com que a fronteira entre emissor e receptor fosse gradualmente modificada, consolidando um cenário contemporâneo em que convivem tanto o consumidor/receptor de informações da mídia de massa, como um sujeito ativo e produtor de informações, que estabelece novas lógicas de interação e participação com os meios digitais de comunicação. Com o pressuposto de que a Internet, as redes sociais e a ampliação do acesso à tecnologia contribuíram de forma determinante para ampliar as possibilidades de participação efetiva das pessoas no desenvolvimento e circulação de conteúdos pelo mundo, este estudo de natureza bibliográfica tem como objetivo reunir, por meio de revisão da literatura, as principais conceituações que tratam da emergência de um personagem central da contemporaneidade: o prosumer, um sujeito atuante na produção e consumo de informações em rede. Esse novo tipo de engajamento comunicativo de nosso tempo, bem como das práticas e literacias emergentes desse cenário, são contextualizados no âmbito da comunicação em rede. O estudo proposto é uma produção coletiva para avaliação parcial na disciplina “Novas Lógicas e Literacias Emergentes no Contexto da Educação em Rede: Práticas, Leituras e Reflexões”, do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade de São Paulo, ministrada pela Profª. Drª. Brasilina Passarelli no 1º semestre de 2013. Palavras-chave: Informação; Comunicação; Prosumer; Literacias Digitais; Convergência.

ABSTRACT The convergence of "old" and “new” media gradually modified the border between sender and receiver, consolidating a contemporary setting in which live both the mass media information consumer and passive receiver, as well as an active subject who acts as an information producer, establishing new logics of interaction and participation in the digital media communications era. With the assumption that the Internet, the social networks and the expanding access to technology contributed decisively to expand the possibilities for effective participation of each person in the development and circulation of content in the world, this bibliographical study aims to bring together the main concepts around the emergence of a central character of contemporaneity: the prosumer, an acting subject in the production and consumption of information in the network. This new type of communicative engagement of our time, as well as the practices and literacies emerging from this scenario, are contextualized within the communication network. The proposed study is a collective production for partial evaluation in the discipline "New Literacies Emerging Logics and the Context of Network Education: Practices, Readings and Reflections", at the Graduate Program in Communication Sciences from the University of São Paulo, taught by Professor Dr. Brasilina Passarelli in the 1st half of 2013. Keywords: Information; Communication; Prosumer; Digital Literacies; Convergence.

SUMÁRIO

COMPREENDER O PROSUMER: UM EXERCÍCIO DE CRIAÇÃO COLETIVA .... 10

1 DA MODERNIDADE À PÓS-MODERNIDADE ........................................................... 16 1.1 A Modernidade ............................................................................................................. 17 1.1.1 Razão, ciência e saber na Modernidade.............................................................. 19 1.1.2 Modernidade e Comunicação ............................................................................. 22 1.1.3 A crise da Razão Moderna.................................................................................. 23 1.2 A Pós-Modernidade ...................................................................................................... 25 1.2.1 Contextos Emergentes da Pós-Modernidade ...................................................... 27 1.2.2 Pós-Modernidade e Comunicação ...................................................................... 29

2 NOVAS LITERACIAS E A EMERGÊNCIA DO PROSUMER .................................... 34 2.1 A teoria clássica da Comunicação de Massa ................................................................ 35 2.1.1 Modelo emissor - receptor .................................................................................. 41 2.1.2 Teoria do agendamento: agenda-setting............................................................. 44 2.2 A Era da Internet ........................................................................................................... 48 2.2.1 Interatividade e formação de redes ..................................................................... 52 2.2.2 Novas literacias e o contexto da autocomunicação de massa ............................. 55 2.3 Convergência das mídias e emergência de redes sociais: ruptura da barreira entre consumidores e produtores de conteúdo .............................................................................. 58

3 O CONCEITO EMERGENTE DO PROSUMER NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA ............................................................................................................ 63 3.1 Prosumer: conceituação ................................................................................................ 63 3.1.1 Outras nomenclaturas para o consumidor que também produz .......................... 76 3.2 Cultura participativa e inteligência coletiva: alterações provocadas pela presença do prosumer ......................................................................................................................... 77 3.2.1 Novas configurações corporativas e educacionais no contexto emergente do prosumer .................................................................................................................. 82

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 89

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 94

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COMPREENDER O PROSUMER: UM EXERCÍCIO DE CRIAÇÃO COLETIVA

Internet, Web e redes sociais contribuíram para ampliar as possibilidades de participação efetiva das pessoas no desenvolvimento e circulação de conteúdos pelo mundo. Além disso, o entremear das velhas mídias com as novas mídias fez com que a fronteira entre emissor e receptor fosse gradualmente modificada, consolidando um cenário contemporâneo em que convivem tanto o consumidor/receptor de informações da mídia de massa, bem como um sujeito ativo e produtor de informações, que estabelece novas lógicas de interação e participação com os meios digitais de comunicação. No que se refere especificamente a esse consumidor atuante e produtor, algumas nomenclaturas vêm sendo empreendidas na literatura no intuito de melhor designar esse novo agente presente no contexto da comunicação em rede. Um pioneiro nessa questão, embora não se referindo especificamente ao campo da comunicação, foi o economista Alvin Toffler (1980), que há mais de trinta anos cunhou o termo prossumidor ou prosumer – agrupando as palavras producer e consumer (em português, respectivamente, produtor e consumidor) - em uma perspectiva visionária para delimitar as características dos indivíduos atuantes em uma sociedade pós-industrial, de transmercado e interconectada globalmente, a qual denominou mais precisamente como “ a Terceira Onda”. O conceito de prosumer, no entanto, não ficou circunscrito às teorias econômicas e, após a consolidação da segunda fase da Internet, denominada como Web 2.01, passou a ser retomado nas discussões a respeito da comunicação em rede. No Brasil, o termo pode ser identificado em autores da comunicação como Brasilina Passarelli (2012, p. 14), que, constatando os novos rumos da comunicação em rede, afirma haver uma realocação da atenção dos teóricos da comunicação, das instituições de ensino e pesquisa para um novo contexto de “reciprocidade das ações comunicacionais onde os usuários da modernidade agora, na contemporaneidade, são

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Segundo Tim O’Reilly, “web 2.0 identifica sites de networking social, ferramentas de comunicação, wikis e etiquetagem eletrônica (tags), baseados na colaboração e que entendem que a natureza da rede é orgânica, social e emergente.” O’Reilly é fundador, editor e CEO da O’Reilly Media, empresa norte-americana editora de livros, material on-line e produtora de conferências. Seu fundador a define como uma companhia de transferência de tecnologia que busca mudar o mundo divulgando o conhecimento dos inovadores. Seu artigo “What Is Web 2.0: Design Patterns and Business Models for the Next Generation of Software” pode ser acessado em: .

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denominados prosumers (produtor+consumidor) com a consequente redefinição dos papéis destes atores em rede” (grifo nosso). Neste contexto, surge a necessidade contemporânea de compreender com maior profundidade o contexto em que a concepção do prosumer surge para designar esse novo sujeito atuante na produção e consumo de informações em rede, como foi cunhado e sua repercussão no campo da comunicação digital. Este é, portanto, o intuito deste trabalho, que busca lançar luz sobre o novo tipo de engajamento comunicativo de nosso tempo, bem como das práticas e literacias emergentes desse contexto, a partir de uma compreensão mais aprofundada do surgimento e utilização da concepção do prosumer no âmbito da comunicação em rede. Assim, o trabalho monográfico que aqui se apresenta – fruto do entrecruzamento das diferentes formações e habilidades dos participantes da disciplina “Novas Lógicas e Literacias Emergentes no Contexto da Educação em Rede: Práticas, Leituras e Reflexões”, do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade de São Paulo, ministrado pela Profª. Drª. Brasilina Passarelli entre os dias 12 de março e 25 de junho de 2013 – tem como objetivo geral compreender o surgimento do conceito prosumer, especialmente a partir da mudança do até então exclusivo modelo emissor-receptor para a possibilidade de interação e participação mais ativa do público na criação de conteúdos. É válido salientar que a definição do tema e os objetivos do trabalho têm relação intrínseca com as aulas ministradas na referida disciplina pela Profª. Drª. Brasilina Passarelli, no primeiro semestre letivo de 2013, além de inquietações referentes aos projetos de pesquisa desenvolvidos por alunos participantes da disciplina. Os objetivos específicos do trabalho foram: ● Realizar um levantamento do termo prosumer na produção acadêmica recente, para identificar suas origens e utilização atual; ● Contextualizar as mudanças sociais da Modernidade à Pós-Modernidade como pano de fundo para as transformações no campo da comunicação e emergência da comunicação em rede; ● Apresentar algumas transformações da passagem do modelo emissor-receptor, fundado na teoria de comunicação de massa, para o surgimento da concepção de prosumer, no contexto da comunicação em rede;

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● Identificar e problematizar outras nomenclaturas correlatas à ideia de prosumer presentes na literatura. Em termos metodológicos, trata-se de um trabalho de natureza qualitativa do tipo exploratório. Os estudos exploratórios, segundo Gil (1996) prestam especial contribuição a trabalhos monográficos de disciplinas acadêmicas, pois têm como objetivo principal desenvolver ideias com vista em fornecer hipóteses em condições de serem testadas em estudos posteriores e, portanto, implicam pesquisas mais concisas, por vezes de natureza mais conceitual e que podem ser realizadas com menos recursos financeiros e em menor tempo. Em termos de procedimentos, o estudo foi empreendido por meio de pesquisa bibliográfica, que, segundo Gil (1996), busca identificar as fontes adequadas ao desenvolvimento do tema, bem como a interpretação teórica presente na literatura, suas características e relação com o objeto investigado. Nossa pesquisa bibliográfica foi constituída de três momentos: a) Leitura prévia ou préleitura: nessa primeira leitura, fizemos uma seleção das obras que tratam da concepção do prosumer e que posteriormente foram examinadas mais detidamente; b) Leitura crítica/analítica: buscamos nessa etapa objetivar a intelecção do texto, a apreensão do seu conteúdo, que foi submetido à análise e à interpretação dos autores; c) Leitura interpretativa: procuramos estabelecer relações e confrontar ideias em relação a concepção de prosumer e outros termos correlatos na literatura de modo a lançar luzes sobre o tema. Além disso, por ser tratar de um texto produzido colaborativamente por todos os 16 estudantes da disciplina “Novas Lógicas e Literacias Emergentes no Contexto da Educação em Rede: Práticas, Leituras e Reflexões”, os principais instrumentos e processos utilizados para o desenvolvimento do texto final foram as ferramentais on-line, como o Google Docs, Facebook e Skype, que permitiram a extensão dos debates e criações iniciados presencialmente pelos autores em sala de aula. Em artigo sobre a experiência com estudantes da pós-graduação da ECA/USP na disciplina “Criando Comunidades Virtuais de Aprendizagem e de Prática” no que diz respeito à produção de texto coletivo, Brasilina Passarelli pontua: A construção do texto coletivo constitui grande desafio para os alunos, via de regra acostumados à produção individual do conhecimento e à espécie de “segredo” que se institui quando somente ele e o docente lerão o trabalho produzido. A prática da construção de um texto coletivo, onde todos devem

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experimentar a alternância de papéis e a relatoria semanal do blog institucional, gera uma dinâmica de coopetition: cooperation + competition, que desde a primeira aula presencial gera uma sensação de incômodo, que a meu ver é o atributo necessário para que eles sintam-se motivados a inovar. (PASSARELLI, 2009, p. 499)

Para abarcar tal desafio no que tange especificamente à redação do trabalho monográfico, decidiu-se elaborar coletivamente uma estrutura geral de três capítulos e, posteriormente, dividir os participantes em três grupos. Essa decisão teve como pressuposto básico potencializar as características e expertises de uma turma extremamente heterogênea, composta por 16 alunos de mestrado, doutorado e especiais (postulantes a vagas na Pós-Graduação Stricto Sensu da Universidade de São Paulo), variação de idade entre 25 e 55 anos, formações nos mais diversos campos do conhecimento (Biologia, Educação Física, Enfermagem, Filosofia, Jornalismo, Letras, Pedagogia, Rádio e TV e Relações Públicas) e diferentes níveis de experiência como professores e/ou no ambiente corporativo. Acredita-se que a divisão em grupos possibilitou, inclusive, otimizar os processos produtivos e, simultaneamente, com a disponibilização de conteúdo atualizado on-line pelo Google Docs, o conhecimento pleno das etapas do trabalho por integrantes de todos os grupos, permitindo interferências que contribuíssem para a fluidez e a ideia de continuidade pretendida no texto. Nessa perspectiva, para conhecimento público, o grupo 1 foi composto por: Alan Q. Costa, Diego de S. Mendes, Marcelo O. da Cruz e Maurício B. da C. Felício. O grupo 2 seguiu a seguinte configuração: Fabiana Grieco C. de M. Vetritti, Fernando da S. Pardo, Luiz Carlos Paloschi e Roxana L. Varela Supúlveda. Por fim, Ana Alice Vercesi Gallo, Candice Heimann, Else Lemos, Karina V. Santos, Lilian C. Bacich Martins, Rafael V. Pereira, Renato Almada Alonso e Solange Ugo Luques formaram o grupo 3. É possível perceber que os dois primeiros grupos foram constituídos por quatro componentes, enquanto o terceiro teve oito participantes. Essa disparidade na divisão, no entanto, justifica-se pelos seguintes motivos: o capítulo 3 trata do tema central do trabalho monográfico; a escolha de obras resenhadas para os seminários apresentados em aula enquadrara-se de maneira mais adequada na temática do terceiro capítulo; e a revisão final e redação da introdução, resumo, abstract, agradecimentos e considerações finais do texto coletivo, de maneira geral, ficaram sob responsabilidade de integrantes do grupo 3 (Else Lemos e Solange Ugo Luques).

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Coube a cada grupo o detalhamento da estrutura dos respectivos capítulos. Em seguida, foram apresentados os tópicos para discussão coletiva e alinhamento de ideias. Iniciou-se, então, o desenvolvimento de textos pelos grupos responsáveis e, em duas aulas, houve orientação específica da Profª. Drª. Brasilina Passarelli para ajustes no trabalho monográfico. Como exemplo, é possível citar o item “Convergência das mídias e emergência de redes sociais: ruptura da barreira entre consumidores e produtores de conteúdo”, que integrava o terceiro capítulo e passou a fazer parte do segundo capítulo, fornecendo um fio condutor para a discussão mais detalhada do termo prosumer na parte subsequente. Finalizada a exposição dos bastidores da construção coletiva, apresenta-se um resumo da estrutura final utilizada para o desenvolvimento do presente trabalho monográfico. O primeiro capítulo abordou as alterações no campo do saber e em características como individualidade, tempo e espaço provocadas pela transição da Modernidade (Modernidade Sólida) para a Pós-Modernidade (Modernidade Líquida). Com o propósito de articular as principais ideias sobre o assunto, foram utilizados como referenciais teóricos principalmente as obras de Zygmunt Bauman (2001) e Jean-François Lyotard (2008), entre outros. No segundo capítulo, foram usadas as teorias da comunicação de massa para demonstrar a evolução nas formas de tratamento do consumidor e como o receptor passou a ter papel mais ativo no novo mundo da comunicação – cada vez mais calcado nas inovações tecnológicas. Com base em obras de Manuel Castells (2003) e Mauro Wolf (2005), forneceu-se ao leitor um arcabouço teórico suficiente para introduzir o tema central do estudo: o surgimento da figura do prosumer a partir da quebra do paradigma emissor-receptor. Por fim, o terceiro capítulo apresentou o motivo da escolha pelo termo prosumer para caracterizar o consumidor que também produz conteúdo, sua origem, definição, características e outras nomenclaturas (produser, usuário-mídia e consumidor 2.0) que já foram – ou continuam sendo – utilizadas para definir essa mudança do até então passivo receptor para um produtor ativo de conteúdo. Essa discussão teve como suporte o novo ambiente tecnológico em que a sociedade está inserida, que se caracteriza pela realização de atividades norteadas pela tríade: convergência das mídias, cultura participativa e inteligência coletiva. Alvin Toffler (1980, 1990), Axel Bruns (2008a, 2008b), Brasilina Passarelli (1995, 2008, 2012), Clay Shirky (2011), Don Tapscott e Anthony Williams (2007), Henry Jenkins (2009), Inês Amaral (2012), José Manuel Corona

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Rodríguez (2012), Jose Octavio Islas-Carmona (2008), Carolina Terra (2011) e Marcelo Jacques Fonseca et. al. (2008) foram alguns dos referenciais teóricos balizadores no desenvolvimento dos temas supracitados.

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1 DA MODERNIDADE À PÓS-MODERNIDADE

Toda mudança em um contexto comunicacional mais amplo é, antes de tudo, e sobretudo, uma mudança da própria condição social e da racionalidade de uma época. Assim foram todas as grandes revoluções tecno-comunicativas, desde a introdução da escrita no séc. V a.C., o advento dos caracteres móveis e a invenção da prensa de Gutemberg, o que culminou na difusão da cultura dos livros e meios impressos, o surgimento dos meios eletrônicos de comunicação e a consolidação da cultura de massa, bem como o atual convívio com as formas sociais de comunicação em redes digitais. Partindo desse pressuposto, para compreender as mudanças sociocomunicacionais de nosso tempo, julgamos ser necessário primeiramente observar de perto a própria condição social contemporânea. É no contexto social que se dão os contornos do que se denomina hoje de Sociedade em Rede (CASTELLS, 2003) e sua repercussão nos sujeitos engajados nas tramas comunicacionais contemporâneas. Há apenas poucas décadas, em uma sociedade preenchida quase exclusivamente por veículos de comunicação de massa, ao indivíduo comum, situado do outro lado das telas televisivas, do rádio ou dos impressos, distante dos meios de produção e distribuição de bens simbólicos midiatizados, era vislumbrada a figura do "Receptor" (tema exclusivo de nosso próximo capítulo).

Atualmente, com a mudança no panorama

comunicacional, inaugurada pelo surgimento e popularização dos meios digitais, em especial a internet, a imagem do Receptor passa a ser repensada, visto sua incompatibilidade com o modelo comunicacional atual, mais interativo e descentralizado, em que as condições de produção, recepção e circulação de bens simbólicos se fazem disponíveis a todos aqueles conectados à rede mundial de computadores. Essa guinada comunicacional se inter-relaciona com a própria condição de nosso tempo, denominada por alguns pensadores como Pós-Modernidade (LYOTARD, 2008) ou Modernidade Líquida, como prefere o sociólogo polonês Zigmunt Bauman (2001). Sendo assim, compreender o panorama das mudanças sociais presentes em nosso tempo é fundamental para situarmos uma nova imagem do sujeito contemporâneo entrelaçado aos fios e nós da Rede. É nessa perspectiva que este capítulo se insere, traçando um voo panorâmico sobre a passagem da Modernidade à Pós-Modernidade ou Modernidade Líquida, no intuito de fornecer ao leitor uma imagem do

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terreno sob o qual se delineiam as bases ou pilares para a discussão da emergência de uma nova forma de atuar socialmente na comunicação, agora em rede.

1.1 A Modernidade

O desejo revolucionário de realizar o Reino de Deus ... é o início da história Moderna (Walter Benjamin)

A Modernidade ficou conhecida como o período de amplas transformações sociais, políticas, culturais que insurge após a idade média, tendo como eixo central a crença na racionalidade humana e no progresso social e tecnológico regido pela ciência. Apesar de encontrar suas raízes no séc. XVII, com a ascensão do pensamento de filósofos/cientistas como René Descartes e Francis Bacon, é no século XVIII, com as revoluções francesa e inglesa, bem como o início do movimento Iluminista, que essa visão de mundo ganha corpo e solidez social. No séc. XIX, a Modernidade vive seu apogeu, no seio de um mundo marcado pela racionalidade e o pleno desenvolvimento das ciências e tecnologia, surgindo em meados do séc. XX e início do XXI as tensões de seu esgotamento, ou, ao menos, uma ampla revisão crítica. O projeto Moderno demarca, antes de tudo, um rompimento de visão de mundo pela superação de um passado obsoleto (aos olhos modernos), sustentado na tradição, na mitologia e na ordem divina ou cosmológica como orientadoras da humanidade. Em outras palavras, baseada no conhecimento narrativo, como diria Lyotard (2008). Esse período representa, portanto, uma retomada da razão humana para a condução dos homens rumo à sua própria história, que não mais é designada por mandamentos divinos ou pelas forças (sobre)naturais do mundo. Desse modo, a Modernidade assume a imagem que Prometeu representava na mitologia grega. Segundo os ditos gregos, foi Prometeu quem roubou o fogo dos deuses e o entregou aos homens, assegurando a estes um poder racional que os diferenciaria de todas as espécies. O fogo dos deuses, assim, permitiu aos homens a capacidade de conhecer. É nessa direção que Benjamin (2002, p. 18) conceitua a Modernidade como “o desejo revolucionário de realizar o Reino de Deus”, contudo, não mais pelos desígnios divinos, mas pela força racional do homem de

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conhecer o mundo e a si mesmo, podendo assumir os rumos da história a partir do domínio da natureza. Em uma visão filosófica, Habermas (1990) postula que a modernidade funda um mundo novo que se distingue do antigo por sua abertura ao futuro, acompanhando ideais como revolução, progresso, emancipação, desenvolvimento etc. No campo sociológico, Anthony Giddens (1991) aponta que o principal fato a caracterizar a Modernidade é a suposição da reflexividade indiscriminada. Bauman (2001) também se filia a esta definição, pontuando que o eixo central da Modernidade é a compulsiva e obsessiva sede em nome do novo e aperfeiçoado futuro. No mesmo sentido, Lyotard (2008) indicará os traços da modernidade a partir da pretensão científica de se dizer sólida, exigindo para si a prerrogativa de todo o saber do mundo. O projeto Moderno tirou as crenças do caminho da humanidade e assumiu a razão como guia. Por esse motivo, Bauman (2001, p. 36-37) aponta que: [...] no limiar da era moderna fomos emancipados da crença no ato da criação, da revelação e da condenação eterna. Com essas crenças fora do caminho, nós, humanos, nos encontramos ‘por nossa própria conta’ - o que significa que, desde então, não conhecemos mais limites ao aperfeiçoamento além das limitações de nossos próprios dons herdados ou adquiridos, de nossos recursos, coragem , vontade e determinação [...] Ser moderno passou a significar, como significa hoje em dia, ser incapaz de parar e ainda menos capaz de ficar parado [...] Ser moderno significa estar à frente de si mesmo, num Estado de constante transgressão.

Nessa direção, pode-se dizer que a razão não é exatamente um elemento novo na história da humanidade, mas a partir do séc. XVII esta assume uma centralidade jamais encontrada na história, posto que até a era Moderna sua função se restringia a compreender um mundo previamente ordenado e unificado, seja pela ordem divina, ou pelas tradições, como nos casos das monarquias. A Modernidade, para Bauman (2001), tratou de suprimir as lealdades tradicionais, ou hábitos costumeiros que impediam uma vida mais liberal (liberalismo econômico), por meio da destruição dos obstáculos que impediam a via racional do cálculo e da sedimentação de uma nova ordem social alicerçada na economia, denominada por ele de Modernidade sólida, que permitiu instalar o liberalismo e o capitalismo, mas tornou rígida qualquer perspectiva de mudança desse cenário. Encontra-se, então, entre Bauman e Lyotard o paralelo da intransitorialidade que se pretende a Modernidade, em busca de uma descoberta verdadeira, desveladora de toda a essência

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universal, cerceando com limites e contornos toda a experiência do cientista com base em um método reprodutível e verificável do mundo. A Modernidade modificou diferentes esferas do social, no campo político-econômico observou-se a ascensão da burguesia, que passa a legitimar sua ascensão não só por meio das artes, mas também do conhecimento que a ciência lhe trouxe, e da indústria moderna, que buscava da descrição e prescrição científica um caminho seguro ao progresso positivista, além de fazer ver um novo modo de produção material da vida, o capitalismo. A política também foi impactada sob a organização dos Estados Nacionais, em oposição aos burgos, feudos e outras delimitações espaciais fundadas na tradição monárquica, Estados estes que encontram também na solidez da ciência moderna a sua própria legitimação pelo discurso emancipatório do saber, caminho esperado para a evolução da sociedade. Nos termos de Lyotard (2008, p. 51), “O Estado pode despender muito para que a ciência possa figurar como uma epopeia: através dela ele ganha credibilidade, cria o assentimento publico de que seus próprios decisores têm necessidade”. Na arte, a Modernidade rompe com a autoridade sagrada e os temas teocêntricos, retomando valores estéticos da antiguidade clássica. No campo comunicacional, o surgimento de uma ordem racional e comercial que estrutura a difusão de informações passa a ser legitimado sob o símbolo do nascimento de uma imprensa gradativamente livre das amarras com a Igreja ou o Estado (THOMPSON, 2008).

1.1.1 Razão, ciência e saber na Modernidade

Se na Modernidade a razão representaria o pensamento autônomo, a capacidade de pensar sem a tutela das explicações mitológicas, é ela própria a condição de libertação da tradição e o conhecimento o eixo para a construção de um saber “seguro e indubitável”. Portanto, a libertação dos homens pela razão e o progresso social e tecnológico devem ser conduzidos pela razão humana, mas não qualquer razão, como aquela advinda da contemplação pura, na antiguidade. É preciso o desenvolvimento de um instrumento seguro, em que a racionalidade possa imperar sobre os sentidos e as paixões - elementos que desviam os homens do conhecimento. Nasce aí a relação entre a racionalidade, o método e a ciência.

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É somente o método que, para Descartes (1985), pode assegurar um ordenamento do mundo em objetos acessíveis à razão. Além de ordenado, os fatos da natureza devem também ser objetivados, dado que é na subjetividade humana que os erros persistem, daí a hegemonia da linguagem matemática na descrição científica. Assim, a razão científica, criada sob os auspícios da Modernidade, deve buscar ordenar os fenômenos do mundo para encontrar suas coerências internas, dissipadas pelas aparências. A conclusão derivada desse pensamento é de que um mundo ordenado pelo método científico e objetivado pela linguagem matemática pode ser dominado ou administrado pelas mãos humanas e estar, portanto, a seu serviço. Por esse motivo, “O discurso do Método”, de René Descartes, é considerado um dos textos fundantes da filosofia da consciência moderna e da ciência positivista. Para Descartes, o método tem a função de estabelecer a certeza como critério de verdade e garantia de conhecimento. Nessa lógica, “ser é ser representável, é ser objetivável numa representação e tudo aquilo que escape ou se furte a uma representação clara e distinta estaria assim destituído de estatuto ontológico ou, pelo menos, teria sua realidade posta em suspeição.” (FIGUEIREDO, 1995, p. 138). Assim, Lyotard (2008) soma-se ao coro, ao olhar para a Modernidade como a busca de uma grande lógica, uma recursividade metódica e diacrônica capaz de reduzir as forças sob a égide do pensamento asséptico e imparcial do cientista daqueles idos tempos. O racionalismo inaugurado na Modernidade, calcado na noção de objetivação do mundo, tem na máquina seu símbolo máximo, refletindo-se nas correntes deterministas da ciência. Para se compreender o mundo, deve-se proceder como no estudo de um maquinário, desmontando-se as partes, desunindo as peças e as analisando separadamente. A emergência do relógio passa a ser metáfora para o universo e o mundo social. O relógio é a primeira máquina automática aplicada a fins práticos, permitindo a regularidade do movimento, da produção e o automatismo social. Conquanto nesse cenário se fortalece a modernidade, Lyotard (2008) tratará do pensamento corrente à época, quando o determinismo seguia conquistando adeptos na academia e na sociedade em geral. Para o autor, O determinismo é a hipótese sobre a qual repousa a legitimação pelo desempenho: definindo-se este por uma relação input/output, deve-se supor que o sistema no qual faz entrar o input encontra-se num estado estável; ele obedece a uma ‘trajetória’ regular através da qual pode-se estabelecer a função contínua e

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derivável que permitirá antecipar convenientemente o output. (LYOTARD, 2008, p. 99)

É dessa visão de regularidade e ordenamento que o “industrialismo" pode ser constituído e posteriormente associado ao principal modo de interação dos seres humanos. A estabilidade ansiada pela ciência é, em tal medida, a mesma pela qual se pagam os industriais modernos. A regularidade, o compasso, a métrica perfeita para que não se arrisque mais o capital. Para Giddens (1991), nas culturas pré-modernas, a vida dos humanos estava vinculada aos movimentos e disposições da natureza, mas com a indústria moderna há uma ruptura em relação às formas de vida tradicionais, gerando o "ambiente criado" que, embora físico, não é mais apenas natural, mas regido por uma ordem social imposta, fundada no racionalismo. Esse modelo de inteligibilidade serviu à ascensão de uma sociedade burguesa e acreditava estar conduzindo os homens a um ordenamento social rumo à perfeição, dado que no mundomáquina se imaginava ser possível a previsão dos movimentos sociais, a partir do conhecimento de suas partes. Para Fensterseifer (2001, p. 65), o mecanismo se supõe imune à degradação, ao desgaste, à irreversibilidade, à complexidade ou ao aleatório, sugerindo um “universo científico neutro, poeticamente estável e eternamente sem perigos”. A tradição de uma ciência baseada no método experimental e dedutivo permitiu consolidar a ideia de que exatidão e precisão são sinônimos e valores modernizantes. É sob as bases desse mundo ordenado pelo cálculo e crença numa progressão linear rumo a um futuro tecnologicamente aperfeiçoado que Bauman (2001) acredita ter se solidificado um modo social estruturante, fundado na segurança, previsibilidade e harmonia. Com base nas leis dos homens e do cálculo se pôde fundar cidades racionalizadas, com vias urbanas planejadas e limites estanques “capazes” de manter as mazelas distantes dos centros e regiões comerciais. O corpo humano passa a ser conhecido em sua anatomia e fisiologia em maior profundidade, gerando premissas que permitem o controle de doenças, sua previsibilidade e cura, além de hábitos racionais para higienização do corpo individual e social, sua preparação para a guerra ou, ainda, sua domesticação para suportar as horas de trabalho fabril. O trabalho passa a ser regrado por ciclos temporais bem delimitados e controlados, bem como pela fragmentação das tarefas produtivas. Os espaços geográficos são delimitados pelos Estados Nacionais. Enfim, a lista de aspectos humanos afetados pela ciência moderna passa a ser

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ilimitada. A razão impera por meio do cálculo e da ciência, desembocando nos recantos mais profundos das formas de organização humana.

1.1.2 Modernidade e Comunicação

É nessa dimensão da racionalidade Moderna que o empenho em conhecer e organizar o mundo empírico dá origem à ideia de um sujeito cognoscente em contraposição ao mundo físico dos objetos, que, por sua vez, situa-se na base da teoria moderna da comunicação. Nesse âmbito, os objetos permitem uma apresentação do mundo empírico, ou seja, designam uma presença de algo do mundo, enquanto ao sujeito é possível captar o real por suas representações, entendendose representação como aquilo que designaria a consciência de algo que habita a mente, mas sem se confundir com o representado. Nas palavras de Santaella e Nöth (1998, p. 20), “a representação deve saber-se representação”. Logo, representar passa a ter um comprometimento com a proposta de redução do estranho ao familiar, do não codificado ao codificado e do complexo ao simples. É dessa lógica que uma teoria da comunicação moderna fará referência à distinção das figuras de um emissor e um receptor, que podem transmitir significados comuns. Uma mensagem, nesse modelo, estrutura-se como uma confirmação do já comunicado por meio de uma estrutura decodificante que obedece à lógicas previsíveis e objetivas. Segundo Sfez (apud PEREIRA, 2011, p. 33-34), A comunicação distingue um emissor e um receptor ligados por um canal: tripartição que reencontramos na teoria clássica da representação, que distingue o mundo objetivo a representar e o mundo efetivamente representado, ligados por um mediador. Em ambos os casos são concedidos poderes consideráveis à cadeia intermediária, mediadora. [...] É o modelo maquínico por excelência, cujos elementos se encontram expostos nos “Princípios” de Descartes [...] Este Modelo é estocástico, atomista, mecanista. Estocástico porque a comunicação se realiza por ações pontuais, em determinado momento e visando determinada finalidade. Atomista, pois a comunicação põe em presença dois sujeitos, átomos separados e insecáveis. Mecanicista devido à linearidade do esquema de transmissão que é uma máquina.

Isto posto, é possível perceber o imbricamento entre teoria da comunicação e racionalidade moderna. A teoria da comunicação de massas, advinda do legado do pensamento moderno, edificou-se sob a tentativa de controle racional da comunicação no modelo

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broadcasting, vislumbrando uma difusão sem “ruídos” de uma mensagem de um polo emissor para uma massa amorfa e controlável de receptores. Observa-se já aqui a lógica racionalizante da comunicação moderna, em que a premissa passa pela vontade/necessidade de controle das informações (condição industrial da comunicação de massa) e da audiência, da mensuração de resultados e processos comunicativos, da aposta no progresso técnico da expansão dos domínios da mensagem e da reprodutibilidade técnica de toda forma de informação. Não por acaso, as reflexões críticas acerca das sociedades midiatizadas ou da presunção destas (em romances como 1984, de George Orwell) se dedicavam ao domínio dos totalitarismos, do aniquilamento da noção de original ou da homogeneização cultural pelo controle técnico racional dos meios de comunicação de massa. Nesse bojo, a noção de emancipação humana também se mantinha fortemente presente, dado seu caráter indissociável à razão reificadora moderna. Contudo, a promessa da libertação do homem pela via racional foi evidenciando pouco a pouco encerrar em si própria novas formas de opressão, não mais operadas pelo acaso ou desígnios divinos, mas pelo próprio ímpeto de progresso voraz da razão.

1.1.3 A crise da Razão Moderna

No mundo ordenado pela razão, a ciência e a técnica fizeram emergir imensas conquistas e contribuições sociais, mas não garantiram o progresso linear o qual seu otimismo inicial propunha. Embora o desenvolvimento da ciência tenha, desde o século XIX, alçado voos cada vez mais altos, é certo também que grandes mazelas sociais continuam a existir e não dão sinais de desaparecer dos horizontes humanos. A racionalidade Moderna nos legou um discurso científico hermético e uma premissa de dominação em nome do progresso econômico, ao custo alto da exploração e segregação humanas, trazidas à luz em exemplos como a legitimação social da escravidão por critérios científicoracionais (embora tenha sido também em nome do progresso e da racionalidade que tenhamos refutado os regimes escravocratas no séc XIX e XX), ou as duas grandes guerras mundiais e o

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surgimento e o avanço de regimes totalitários de diferentes ordens no decorrer de praticamente todo o séc. XX. O modo de vida orientado à razão e ao progresso se revelou contraditório a si mesmo e tão mitologizante ou opressor quanto à tradição a qual tentou expurgar. O mito se inverte e se torna a crença irrefletida na ciência e na objetivação do mundo, tese amplamente difundida pelos teóricos da Escola de Frankfurt, em especial Horkheimer e Adorno. Assim, a crença na racionalidade humana foi sendo minada, ao passo que os grandes projetos de libertação humana também eram impactados por novas ditaduras. Bauman (2001) é categórico em afirmar que a perspectiva da libertação humana foi sendo gradativamente apresentada como uma bênção mista, na medida em que se representava uma nova possibilidade de aprisionamento em projetos futuros, ou mesmo redirecionada ao plano das liberdades individuais, de modo que o engajamento em prol de uma liberdade coletiva foi sendo deixado de lado pelos indivíduos contemporâneos. A descrença no poder libertador da razão deu lugar ao medo repressor do controle totalitário em nome da ordem e do progresso social. Outro golpe fatal sobre a racionalidade moderna se deu com o desenvolvimento da psicanálise. Ao apresentar ao mundo que havia forças ou impulsos humanos não controlados pelo consciente, Freud demonstrou as fragilidades da razão. Enquanto os anos modernos se passaram à luz da ciência, que jogava constantemente às sombras todo e qualquer saber que não se produzisse dentro dos círculos dos especialistas, conduziu-se a sociedade a um caminho metricamente reto e concreto, ainda haverá os que indicarão a crise dentro de sua arquitetura totalizante. Lyotard (2008) resgatará o pensamento fundador da ciência, em Platão, relembrando seu caráter narrativo, e como tal, excluído da própria ciência metodológica. De certa forma, o pensamento que pretende legitimar a ciência chamando-a à razão é o alter ego do cientista, que se voltará à narrativa para legitimar sua origem e seus passos mais eméritos. Desde seus primórdios, então, estaria a ciência atrelada ao saber narrativo. Seu ritual de legitimação recria a Ágora e pede aos comuns, aos especialistas, a validação do enunciado para que tenha, então, a partir da dialética e do discurso proponente, o valor e o rótulo de saber científico. No círculo humano encontra-se, há séculos, um dos filtros mais evidentes da irracionalidade dos limites modernos. O saber, frio e distanciado, que se pretendia isolar do

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mundo dos sentidos, está a se legitimar pelo consentimento do outro, pelo filtro humano, pelo grupo que pode estar regido por diversos outros vieses que não apenas a narrativa ou o descuido metodológico. Avaliando o desmantelamento da legitimidade científica, Lyotard (2008) constatará que não só o consenso se mostra ultrapassado, como tem seu contraponto na justiça, em reconhecimento dos jogos de linguagem e da legitimidade da heterogenia. Na dissolução dos contornos antes sólidos tanto do saber quanto dos objetos da ciência moderna e, com isso, também a redefinição do processo de legitimação, é que se vislumbrará a emergência da Pósmodernidade.

1.2 A Pós-Modernidade

No falecimento das grandes narrativas se verá o surgimento da Pós-modernidade Lyotardiana. Nem mais é a ciência a detentora do saber, nem o saber científico está mais pautado única e exclusivamente nos ideais de elevação do homem, da busca pela verdade ou em busca da performance e da eficiência. O aprofundamento científico de outrora, que tentava apreender uma realidade ao seu esgotamento, agora salta entre temas rasos, apilhado pela velocidade das transformações. Em crise, o determinismo angustia-se para tentar enfrentar a natureza, sua adversária secular, e começa a perder espaço para os pequenos relatos, para os limites liquefeitos, para as espumas de Sloterdijk, para o trânsito, para a fluidez. O referente cristalino que se buscara deixa de existir. A certeza não é mais a promessa da ciência, mas, sim, um assentimento local, sempre à berlinda da falseabilidade popperiana, minando o grande relato científico, sua credibilidade e, mais a fundo, seu modo de se legitimar, já que em novos tempos, “o consenso não é senão um estado das discussões e não o seu fim” (LYOTARD, 2008, p. 118). As verdades perpétuas já cedem lugar ao conhecimento localizado, temporário, transigente. A grande narrativa habermasiana cederá lugar ao pensamento agonístico de filósofos como Wittgenstein, olhando para o fim da narrativa sólida e o início de uma busca constante de significados nos jogos de linguagem. O processo de legitimação agora não se enclausurará mais em instâncias do alto comando das academias e será percebido inclusive dentro da transitoriedade dos lances que se produzem no campo do saber. Mais do que uma determinação sistemática, tanto

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pesquisa quanto transmissão de conhecimento se mostrarão transformadas. A dúvida volta ao centro da ciência, mas não para bloquear o homem, mas, sim, para tentar compreendê-lo em um processo ainda mais dinâmico, não estanque. Mas há ainda o contraponto em uma sociedade tão veloz e que apresenta superficialidades em muitos aspectos, também pelo desterramento da certeza e dos limites. Nesse cenário de relações fugazes e múltiplas, Lyotard (2008) acaba por temer o discurso monolítico da totalização pelo temor, ou em sua outra face conhecida, do controle. O autor dirá que Quanto à informatização das sociedades, vê-se enfim como ela afeta esta problemática. Ela pode tornar-se o instrumento ‘sonhado’ de controle e de regulamentação do sistema do mercado, abrangendo até o próprio saber, e exclusivamente regido pelo princípio de desempenho. (LYOTARD, 2008, p. 120)

Nota-se que, então, não mais o Estado se poria em ação para exercer esse controle, mas, sim, o mercado e sua lógica de penetração e domínio. Em contraponto a esse temor, adiante trataremos do pensamento do economista Don Tapscott (2007), que a despeito dos temores mais catastróficos, percebe as qualidades do novo sujeito em rede. Lyotard (2008) concluirá sua obra trazendo, ainda, uma visão sobre a desconstrução da totalização do mercado que haveria de destronar a ciência de outrora. Acreditando que a informatização da sociedade possa também trazer, de certa forma, maior visibilidade e acesso aos subsídios necessários para a tomada de decisão com “conhecimento de causa”, o autor indicará um caminho pelo qual o público deva ter acesso à informação completa, fazendo alusão à transparência pretendida pelos sistemas de troca de informação e comunicação da pós-modernidade. Os jogos de linguagem serão então jogos de informação completa no momento considerado. Mas eles serão também jogos de soma não nula e, nesse sentido, as discussões não correrão o risco de se fixar jamais sobre posições de equilíbrio mínimos, por esgotamento das disputas. Pois as disputas serão então constituídas por conhecimentos (ou informações) e a reserva de conhecimentos, que é a reserva da língua em enunciados possíveis, é inesgotável. (LYOTARD, 2008, p. 132)

O problema colocado por Lyotard (2008) é: onde encontrar legitimação para o que é verdadeiro e justo, se não mais podemos crer nos metarrelatos modernos? Para o autor, tais decisões estão cada vez menos centradas no escopo único dos Estados e dos detentores da

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racionalidade científica (experts) e mais focada em grupos particulares (dirigentes de empresas, ONGs, políticos individuais, comunidades populares organizadas, etc), “Cada qual entregue a si” (LYOTARD, 1988, p. 27). Na opinião de Santos (1987), a pós-modernidade invadiu o cotidiano com a tecnologia eletrônica de massa e individual, permitindo o acesso individual às informações, diversões e serviços, de modo que o poder centralizado na razão científica não está mais circunscrito apenas a círculos restritos, o que permite a existência dos jogos de linguagem citados por Lyotard (1988) e o estabelecimento de legitimação do que é verdadeiro e justo por grupos particulares locais, sem pretensões universalizantes. Na Era da Informática, segundo Santos (1987), lidamos mais com signos do que com coisas.

1.2.1 Contextos Emergentes da Pós-Modernidade

As discussões sobre Pós-Modernidade ganharam relevo não apenas no campo da crítica do saber, conforme citado anteriormente, mas também no âmbito da economia e da arte. No campo econômico, a pós-modernidade apresenta um rompimento com a sociedade industrial, tendo seu principal valor atribuído à informação e ao conhecimento. Para Bauman (2001), um dos corolários da pós-modernidade é a consolidação de uma sociedade de consumo ou de consumidores, em que o consumo personalizado constitui o frenezi da felicidade, o objetivo de vida, agora alicerçada em uma moral hedonista, calcada no prazer de usufruir de bens e serviços. Se a fábrica foi símbolo da Modernidade, o shopping, suas luzes e cores passam a ser o altar pósmoderno. Nas palavras do filósofo francês Gilles Lipovetsky (2007, p. 51), Consumimos sempre mais, mas nem por isso somos mais felizes. O mundo tecnicista proporciona a todos uma vida mais longa e, em termos materiais, mais cercada de confortos. É algo que devemos considerar. Porém, isso não equivale à felicidade em si, que tenazmente escapa do poder de apreensão humana. Se é certo que a dominação técnico-científica cresce indefinidamente, não é menos certo que a felicidade continua sendo o ente mais ignorável, mais imprevisível de todos.

Diante do crescimento da informatização, da individualização e da consolidação de uma sociedade de consumo, Bauman atribui a liquefação e a fluidez como características sociais

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contemporâneas, visto que o caráter solidificador da razão moderna perde sua força, dando lugar a um cenário em que tudo está em constante mudança, seja nas instituições (família, religião, Estado, mídia etc.) ou na individualidade, exemplificada pela questão das identidades cambiáveis de hoje. Enfim, a síntese desse fenômeno reside no que Santos (1987) denominou de filosofia niilista, a partir das contribuições nietzschinianas. Para o autor, o pós-modernismo: [...] encarna hoje estilos de vida e de filosofia nos quais viceja uma ideia, tida como arqui-sinistra: o niilismo, o nada, o vazio, a ausência de valores e de sentido para a vida. Mortos Deus e os grandes ideais do passado, o homem moderno valorizou a Arte, a História, o Desenvolvimento, a Consciência Social para se salvar. Dando adeus a essas ilusões, o homem pós-moderno já sabe que não existe Céu nem sentido para a História, e assim se entrega ao presente e ao prazer, ao consumo e ao individualismo. (SANTOS, 1897, p. 10)

As mudanças no campo da arquitetura e da arte, no entanto, foram consideradas um dos principais indicadores da condição pós-moderna. No que se refere à arte, a oposição à modernidade se deu por via da “antiarte” ou arte Pop, que, abandonando os museus, as galerias, os teatros, deu lugar às linguagens da rua, da indústria, do design, atribuindo valor à banalidade cotidiana — anúncios, heróis de gibi e/ou do cinema, rótulos, fotos etc. O artista pop busca diluir a arte na vida, vendo uma ponte entre a arte culta e a arte de massa pela singularização do banal. É o caso das famosas pinturas de latas de sopas americanas do artista Andy Warholl, produzidas em 1962. Para Santos (1987), essa inclinação a figuras e objetos da cultura de massa, bem como ao ambiente acessível ao público, era a oposição à arte abstrata e difícil dos modernistas. Essa antiarte pós-moderna revivia, ao seu modo, o impulso dadaísta, tendência modernista que se dedicava a brincar com objetos no caos cotidiano, importando mais o gesto ou o processo inventivo que a obra, a participação sensorial do público à contemplação intelectual dos modernos. A antiarte pós-moderna não quer representar (realismo), nem interpretar (modernismo), mas apresentar a vida diretamente em seus objetos. Pedaço do real dentro do real (veja as garrafas reais penduradas num quadro), não um discurso à parte, a antiarte é a desestetização e a desdefinição da arte. Ela põe fim à “beleza”, à “forma”, ao valor “supremo e eterno” da arte (desestetização) e ataca a própria definição de arte ao abandonar o óleo, o bronze, o pedestal, a moldura, apelando para materiais não artísticos, do cotidiano, como plástico, latão, areia, cinza, papelão, fluorescente, banha, mel, cães e lebres, vivos ou mortos (desdefinição). [...] Pop, minimal, conceitual, hiper-realismo, processos,

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happenings, performances, transvanguarda, vídeo-arte — seja qual for o estilo, a antiarte pós-moderna se apóia nos objetos (não no homem), na matéria (não no espírito), no momento (não no eterno), no riso (não no sério). Ela é frívola, pouco crítica, não aponta nenhum valor ou futuro para o homem. Desestetizando-se, desdefinindo-se, tornando difícil saber-se o que é arte o que é realidade, ela tende ao niilismo, a zerar a própria arte. (SANTOS, 1987, p. 3738)

Desse modo, a arte com sua capacidade de sintetizar o presente antes mesmo da racionalidade científica já dava os sinais distintivos das mudanças qualitativas expressas na contemporaneidade. Não por acaso, é no campo da arte que o esgotamento da crença otimista na racionalidade se manifesta primeiramente, sobretudo, a partir de sua desdefinação, como diz Santos (1987), e sua aproximação ao campo do sensível. Contudo, das transformações contemporâneas mais relevantes, a comunicação ganha destaque, seja pelo fato de que os meios de comunicação digitais foram corresponsáveis pela transformação de uma sociedade industrial em uma sociedade da informação ou em rede, como prefere Castells (2003), ou, principalmente pelo fato de que as transformações pós-modernas, como diria Lyotard (2008), referem-se também às mudanças nos jogos narrativos, em que as grandes narrativas científico-filosóficas perdem centralidade, dando lugar à legitimação das narrativas fragmentadas do cotidiano.

1.2.2 Pós-Modernidade e Comunicação

Os limites distintivos das instituições, do saber, da ciência são colocados à prova com o que se chamaria de fim da modernidade e início da pós-modernidade, e o mesmo se faz com seus desdobramentos em diversas áreas. A comunicação, como mediação e troca simbólica, jamais estaria apartada dessas transformações. Assim, não só os aspectos práticos, mas também as teorias passam a ser revisitadas e os suportes se mantêm em uma plástica dinâmica e múltipla. Enquanto a certeza anterior se fundava em uma verdade escrita, literária, visual, Pireddu reflete sobre a profundidade da percepção de mundo que podemos ter a partir de pontos de vistas fixos, trazendo o aspecto literário da nossa cultura em xeque quando cita que “nenhum livro responde às perguntas de um leitor curioso porque se limita a repetir eternamente a mesma verdade” (PIREDDU, 2008, p. 182).

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Assim, o autor reflete sobre a mutabilidade dos objetos de estudo à qual o livro não tem capacidade de responder de modo holístico e pleno. Não que Pireddu defenda que qualquer outro meio ou suporte seja capaz de desempenhar tamanho intento, mas indica que a pretensão de reunir o conhecimento sob um único código, o grande index, se vê esvaziada, assim como o mundaneum - projeto de importância histórica para o controle bibliográfico e acesso à informação, a partir de sistemas científicos de indexação - citado por Passarelli (2008). Desta forma, as tecnologias digitais e a Internet desempenham função ímpar para a revisão e reconstituição da dinâmica comunicativa e dos seus meios. Da mesma forma que o consumo e utilização de mídias já não estão mais atrelados a um local isolado e à recepção massiva, a produção de conteúdo precisou se adequar a essa nova realidade e o sujeito já não está mais forçado a um consumo extremamente regionalizado da comunicação. O autor francês Lipovetsky, já citado anteriormente por sua obra intitulada “A Sociedade da Decepção”, propõe que “a descoberta da pílula e os recursos infindáveis da Internet acarretaram mais consequências para a nossa vida pessoal e mudaram mais intensamente a face da Terra do que os bordões trotskistas” (LIPOVETSKY, 2007, p. 50), ou seja, nos campos onde as grandes verdades libertárias foram postas, alguns suportes, técnicas e tecnologias puderam transformar a realidade humana pelo modo como são utilizadas e pelo impacto considerável que proporcionam na sociedade como um todo, partindo do indivíduo e reconfigurando o grupo social, por mais que não haja um contato direto por parte de alguns indivíduos, mas que recebem seus reflexos paralelos pela atuação transformada e reconfigurada daqueles que estão expostos e utilizam tais meios, técnicas e/ou tecnologias. Nessa seara, é profícuo refletir, inclusive, sobre o significado de interação e como este processo se dá, principalmente em momentos contemporâneos, quando os suportes da comunicação já se transformaram de tal maneira que a dinâmica entre os novos meios e os ditos antigos ou tradicionais proporciona uma reconfiguração do próprio sujeito, que envolvo e agente neste processo, transforma seu modo de comunicar e sua percepção de habilidades e capacidades. É nesta perspectiva que Di Felice (2008) pondera a respeito da teoria da comunicação na pós-modernidade, afirmando que: Se até então, a teoria da comunicação atribuiu ao conceito de interação um significado, sobretudo, antropomórfico, isto é, ligado à possibilidade do indivíduo de interpretar e ressignificar mensagens, perante as dinâmicas comunicativas “com” e “nas” redes, torna-se necessário atribuir a tal conceito um significado de um devir transorgânico, com o qual, ao invés de pôr ênfase na

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significação da mensagem, indica-se as práticas habitativas e conectivas de interações entre mente, sujeito, redes, circuitos, informações e inteligências. Desse modo, há nas redes digitais um devir interativo transorgânico do sujeito e, ao mesmo tempo, um processo de comunicação que se define na interação fluída e criativa entre informações, circuitos e inteligências. (DI FELICE, 2008, p. 46)

Assim, a comunicação na pós-modernidade precisa ser encarada como algo não apenas externo, mas como algo que está intrinsecamente atrelado ao interior do sujeito contemporâneo, suas percepções de mundo, sua mente projetada para fora do corpo, mas ainda como algo que não está alheio ao corpo e ao sujeito. Ao pensar na tecnologia, e principalmente no grau em que ela se apresenta nos dias atuais, caracterizada muitas vezes de tecnologias da inteligência, as palavras de Santaella se fazem necessárias para clarificar a visão de sua constituição e relações. Segundo a autora, Tecnologias da inteligência são sine qua non tecnologias interativas. Por isso mesmo elas nublam as fronteiras entre produtores e consumidores, emissores e receptores. Nas formas literárias, teatro, cinema, televisão e vídeo há sempre uma linha divisória relativamente clara entre produtores e receptores, o que já não ocorre nas novas formas de comunicação e de criação interativas, formas que nos games atingem níveis de clímax. Como meio bidirecional, dinâmico, que só pode ir se realizando em ato, por meio do agenciamento do usuário, o game implode radicalmente os tradicionais papéis de quem produz e de quem recebe. (SANTAELLA, 2009, p. 108)

Percebe-se, então, que inclusive as fronteiras imaginadas entre sujeito e tecnologia estão se dissipando com o avançar da sociedade em uma era pós-moderna. Tais limites já não são mais claros e, enquanto antes isso se mostrava apenas para um pequeno grupo de estudiosos e pensadores, hoje já se torna cada vez mais sensível inclusive para os usuários, que partem em busca de interação, imersão e conectividade, sem colocar em pauta neste momento se haveria qualidade ou não em suas ações e no que é resultado desse processo, ainda mais se considerarmos que aqui não se pretende, em princípio, discutir o caráter produtivo, econômico da atuação do sujeito, mas suas formas de manifestação e interação também com essa esfera. Desta forma, não só a esfera econômica sofre os impactos e é também parte da causa de tamanha transformação, mas também as estruturas já tradicionais de controle e poder. Sobre a ocupação do espaço em um tempo de ruptura com a certeza moderna, Di Felice (2008) levanta um ponto a ser considerado:

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Adverte-se, nesse novo contexto interativo, a necessidade de repensar o território e a ação política, uma vez que nesses novos metaespaços midiáticos o território deixa de ser uma realidade geográfica delimitada (praça pública, região, estado, nação) para redefinir-se como potência e estrutura informativa ilimitada. O significado da interação colaborativa, portanto, assume aqui dois níveis distintos: de um lado, a interação dinâmica e fluida dos circuitos informativos que se definem como um resultado de interações entre sujeito, interfaces e territórios; e de outro, a interação dos processos de decisão que, nesses novos contextos, surgem como prática colaborativa de soluções de problemáticas. De um ponto de vista político, assistimos, portanto, à passagem de uma prática de interação mediática e territorial para outra atópica, colaborativa e interativa”. (DI FELICE, 2008, p. 52)

Aqui, além do sujeito, o aparato de suporte segue trajetórias múltiplas e desfalece as paredes antes pensadas como sólidas. O espaço volta a ter sua definição com base no sujeito, como medida, como condição para sua caracterização. Assim, não apenas dado, o espaço é aquilo que se faz dele, a cada momento, a cada realização de toda sua potência, ou como Levy tenderia a chamar, a realização de toda sua virtualidade. Enquanto Lipovetsky (2007, p. 10) nos lembra que é indiscutível que “a ciência e a técnica davam alento à expectativa de um progresso irreversível e contínuo”, é na cibernética que encontramos não só a visão de progresso para os ainda modernos, quanto a sua ruptura, para os que percebem seu potencial e efetiva dissolução das estruturas rígidas. A informação, como algo disponível e que em algum momento pode se tornar ubíquo, ou seja, onipresente e acessível, se mostra fator ímpar para que o suporte não se restrinja a condições físicas. Assim, Barile (2008, p. 206) aponta que: A cibernética assinalou o ápice do movimento de potencialização tecnológica do sistema social que, em dado momento, pôde renegar a sua própria origem, suprimindo a linearidade do processo histórico e da sua representação. O fim da modernidade, visto por Lyotard como fim dos discursos que legitimavam a circulação do saber institucional, é marcada definitivamente pela informatização da sociedade.

Assim, Barile (2008) assinala a relevância da cibernética na contemporaneidade e no que Lyoutard denominou de Pós-Modernidade, mas adverte que em sua opinião o próprio limite entre moderno e pós-moderno está difuso, dado que: A cibernética deveria, portanto, marcar o fim da era moderna, mas o que ensina e realiza é a impossibilidade de um final. O fim é o lugar onde termina um processo e onde poderia iniciar-se um novo. Nisso se concentram e se mostram todos os aspectos salientes daquilo que se vai extinguindo. [...] No fim há, portanto, alguma coisa de essencial, ainda mais que na origem. Mais recentemente, Baudrillard usou com frequência o conceito de paroxismo como

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metáfora da modernidade. Isso designa o momento crítico da doença que manifesta com a máxima intensidade os próprios sintomas. É o caso da nossa época que faz aflorar novamente na superfície, com inusitada veemência, problemas e conflitos incubados e nunca resolvidos. (BARILE in DI FELICE, 2008, p. 208 - 209)

Por fim, o que se coloca em questão é o caráter central da informação na contemporaneidade e a potencialização tecnológica que ocorre no âmbito social e que se está refletido em todas as estruturas do conhecimento. É no contexto de uma cultura emergente advinda das novas formas de comunicação em rede em que se pode vislumbrar novas dinâmicas sociais a respeito da produção, difusão e consumo de informações, o que legitima ainda mais os saberes narrativos advogados por Lyotard (2008), a instabilidade e fluidez contínua da produção do mundo simbólico, segundo Bauman (2001) e permitem a reflexão sobre outras possibilidades de constituir-se e relacionar-se na esfera comunicativa. Estão lançadas as bases contemporâneas para reflexões mais amplas sobre a teoria da comunicação, agora coabitada pela lógica descentralizada, onipresente e móbil das redes, cabendo considerações mais amplas sobre os agentes dos processos comunicativos de nossos tempos (prosumers?), que outrora estavam condenados à posição estrita de receptores. Bem-vindos à contemporaneidade!

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2 NOVAS LITERACIAS E A EMERGÊNCIA DO PROSUMER

A compreensão acerca do processo que se estabelece durante a comunicação é alvo recorrente de estudiosos e pesquisadores de diversas áreas do conhecimento. Por essa razão, é comum a identificação de autores de diferentes correntes teóricas em trabalhos acadêmicos que circundam temas como mediação, recepção, meios de comunicação, entre outros. De maneira mais assertiva, é possível dizer que, no campo da comunicação, há uma biografia extensa no que diz respeito ao programa de leitura de pesquisadores que se dedicam ao trabalho de reconhecimento do fluxo de comunicação existente no âmbito dos meios de comunicação e da esfera pública. Embora para a elaboração do presente trabalho tenha sido usada uma série de referências bibliográficas relacionadas ao tema, mais especificamente sobre comunicação e internet, é importante destacar o caráter pontual de sua construção. Por uma questão de prioridade em termos de teorias e visões que dessem maior ênfase ao cerne da questão do ecossistema comunicativo, foram selecionadas para consulta as obras de maior proximidade com os temas abordados na disciplina Novas Lógicas e Literacias Emergentes no Contexto da Educação em Rede: Práticas, Leituras e Reflexões. Sendo assim, o presente capítulo, que tem como objetivo identificar de que maneira o processo de comunicação ocorre tendo como ponto de partida o modelo de comunicação preconizado pela teoria clássica da comunicação de massa e a emergência da figura do prosumer, por meio da promoção de um ambiente cognitivo marcado pela mudança ocorrida com a introdução da internet, é uma visão possível, uma visão do conjunto do processo comunicativo. Não cabendo a ele, portanto, uma avaliação que estabelece critérios rígidos de interpretação acerca dos conceitos teóricos apresentados, mas, sim, uma visão de um trabalho coletivo de conclusão de curso que se esmera em trazer subsídios para o debate sobre o modo como se relacionam os polos do processo de comunicação, emissor e receptor, e a emergência do prosumer. O trabalho pode ser interpretado como um documento produzido na busca de levar a uma reflexão sob a ótica da interface da comunicação e educação, não somente como áreas em contato, mas como campo de estudo que se constrói e fortalece, conforme o desenvolvimento de seus eixos.

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Com uma dedicação à questão do processo entre emissor e receptor, e voltando-se aos estudos da “educação para os meios”, o texto utiliza referências de Brasilina Passarelli (1995, 2007, 2009 e 2013), Edgar Morin (2009), Manuel Castells (2003, 2007), Mauro Wolf (2005) e McLuhan (1979).

2.1 A teoria clássica da Comunicação de Massa

O pensador francês Edgar Morin identifica que, em meados do século passado, ocorreu uma segunda industrialização no planeta. Não por intermédio da colonização da África ou da Ásia pelos europeus, mas pela tecnologia. Desta vez, a colonização não tinha os objetivos de vender mercadorias de bens de consumo. Mas tinha como alvo a alma humana. A industrialização do espírito se processa nas imagens e nos sonhos e penetra nela. A vida privada entra no circuito comercial e industrial. O movimento começa nos Estados Unidos e se instala confortavelmente na Europa.

Em meados do século XX um prodigioso sistema nervoso se constitui no grande corpo planetário: as palavras e imagens saíam aos borbotões dos teletipos, das rotativas, das películas, das fitas magnéticas, das antenas de rádio e de televisão; tudo que roda, navega, voa, transporta jornais e revistas; não há uma molécula de ar que não vibre com as mensagens que um aparelho ou um gesto tornam logo audíveis e visíveis. (MORIN, 2009, p. 13)

Esse novo movimento, que foi captado e analisado por Morin, começou a transformar o mundo. A cultura de massa desenvolve-se junto à cultura humanista, a cultura nacional, a cultura religiosa, e é verdadeira cultura do século XX. Possui seus próprios símbolos, mitos e imagens à vida prática e imaginária (MORIN, 2009, p. 15) que se integra à cultura nacional (pátria-mãe), religiosa (deus), do estado (pai) e humanista. Elas concorrem, tornando as sociedades policulturais. Num mesmo dia, o homem de determinada região do planeta tem atividades características de outro local. A cultura de massa se embebe da cultura local, que, por sua vez, se embebe da de massa. Essa cultura precisa ser entendida como a identidade de um grupo com características próprias e hábitos semelhantes que apoia a vida cotidiana por meio de pontos que alimentam o imaginário dentro de si, que, por sua

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vez, oferece subsídios à alma. Cosmopolita por vocação e planetária por extensão, a cultura de massa nos coloca os problemas da primeira cultura universal da história da humanidade (MORIN, 2009, p. 16). É por intermédio dos livros, do cinema, da música, da rádio e da TV que essa nova cultura é criada. Antes do século XX, o livro e o jornal existiam. Entretanto, música, palavras, filmes não haviam sido ao mesmo tempo fabricados industrialmente e vendidos comercialmente (MORIN, 2009, p. 13). Essa penetração dos meios de comunicação em grande escala modificou a vida do homem moderno. McLuhan diz que o meio é a mensagem. Estamos nos aproximando rapidamente da fase final das extensões do homem: a simulação tecnológica da consciência, pela qual o processo criativo do conhecimento se estenderá coletiva e corporativamente a toda a sociedade humana, tal como já fez com nossos sentidos e nossos nervos através dos diversos meios e veículos. (McLUHAN, 1979, p. 17)

Considerado por muitos um visionário, McLuhan lançou em 1964, o livro Understanding Media: The Extensions of Man (Os meios de Comunicação como Extensões do Homem). Como o próprio autor coloca no prefácio, ao ser publicado, o livro tinha 75% do seu conteúdo com assuntos novos. Esse livro trouxe conceitos e teorias novas. Hoje, quase 40 anos depois, ele continua sendo estudado para explicar mudanças dos meios, entre eles, a internet. A principal teoria de McLuhan em relação aos meios de comunicação é a célebre frase, título do primeiro capítulo do livro: ”O meio é a mensagem”. Para McLuhan (1979, p. 18), “qualquer extensão do homem, seja ele da pele, da mão, ou do pé - afeta todo o complexo psíquico e social.”. Com qualquer tecnologia – o alfabeto, a tipografia, a fotografia, o automóvel, o telégrafo, a máquina de escrever, o telefone, o fonógrafo, o cinema, o rádio, a televisão, a automação, a eletricidade, entre outras –, modifica-se o meio, pois não deixam de ser extensões do homem. É fato: para lidar com diferentes ambientes, o ser humano precisou ampliar as suas capacidades. Assim surgiram as ferramentas ou mobiliários. “Entendo que tecnologias são ampliações do poder humano, uma espécie de deificações do homem” (McLUHAN, 2009, p. 72). As tecnologias criam ambientes. Por exemplo, a tecnologia de Gutenberg mudou, em poucas décadas, mais de dois mil anos de um padrão de educação oral que vinha desde os tempos da sociedade greco-romana, junto com o alfabeto fonético e o manuscrito, trazidos da idade medieval. A imprensa fez desaparecer essa modalidade da educação oral. Ela é a matriz dos

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métodos de produção industrial do Ocidente e ensina o hábito de análise sequencial e a fragmentação de todo o movimento em unidades estáticas. O alfabeto fonético é uma tecnologia que possibilita a criação do “homem civilizado”. Os valores ocidentais são baseados na escrita e são ameaçados pelos meios elétricos, como o telefone, o rádio e a televisão. As culturas letradas dominaram as sequências lineares concatenadas como formas de organização psíquica e social, e o processo se intensificou com o advento da impressão de Gutenberg. Por isso, ele domina o homem e a natureza. McLuhan (1979, p. 22) diz que muitos se preocupam com as mensagens, os conteúdos, mas não é isso o que importa. São os meios. Pois o conteúdo de um meio é sempre de outro meio. O conteúdo da escrita é a fala. A palavra escrita é o conteúdo da imprensa. A palavra impressa é o conteúdo do telégrafo. Quem se preocupa com o conteúdo, e não com o meio, é como o médico que ignora a síndrome de estar doente. Como um meio não elimina o outro, McLuhan (1979, p. 72) diz que a energia híbrida é encontro de dois meios, híbridos, que se modificam. Exemplo: o rádio alterou a forma das estórias noticiosas na imprensa, como o cinema mudou com a entrada do som. Já a televisão modificou a programação e as radionovelas do rádio. As configurações eletrônicas têm o poder de mudar as configurações produtorconsumidor. Segundo McLuhan (2009, p. 31), com o aparecimento do telégrafo, o leitor teve que assumir um papel editorial. Antes do advento dessa tecnologia, a imprensa tinha tempo de mostrar perspectivas, antecedentes e inter-relações de notícias. Ou seja, a imprensa oferecia um produto para o leitor. Com o telégrafo, a notícia chega em alta velocidade, sendo impossível esse cuidado com as notícias. Assim, o próprio consumidor precisa montar seu conjunto. Morin (2009) diz que os conteúdos passam a ser criados com métodos industriais com o claro objetivo de atingir o grande público: crianças, jovens, adultos e anciãos. Poucos são os que escapam da nova cultura planetária. Os intelectuais tentam, mas logo são contratados pela indústria cultural e ficam à mercê do Estado ou da iniciativa privada, que têm fins semelhantes na indústria cultural. Um procura difundir seus interesses políticos e ideológicos e o outro visa ao lucro. Os dois têm o mesmo objetivo: angariar o maior número de pessoas. McLuhan (1979, p. 34) diz que os únicos que conseguiam captar o novo, por meio de seus ambientes, eram os artistas, pois eles se antecipam.

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Morin esclarece que o termo ‘cultura industrial’ abarca os caracteres comuns a todos os sistemas, privados ou de Estado, de Oeste e de Leste, e reserva ‘cultura de massa’ para a cultura industrial no Oeste. A cultura de massa é a primeira cultura universal da história da humanidade (MORIN, 2009, p. 24). A indústria cultural organiza num modelo burocrático-industrial a sua dinâmica. Uma redação de jornal, estação de rádio ou TV são organizadas burocraticamente, ou seja, a burocracia filtra a ideia criadora, submete-a a exame antes que ela chegue às mãos daquele que decide – o produtor, o redator-chefe. Há uma despersonalização da criação, a predominância da organização racional de produção (técnica, comercial, política) sobre a invenção, à desintegração do poder cultural. Mas o consumo cultural pede um produto original. Surge a indústria cultural com suas receitas padrões de happy-end, de intrigas amorosas, entre outros recursos. É o que vemos todos os dias nos filmes, nas novelas. Mas temos essa contradição da burocracia da criação e da obrigatoriedade do original que se salva pelo imaginário que se estrutura através dos arquétipos (modelos do espírito humano que ordena os sonhos racionalizados). Na indústria cultural, eles são transformados em estereótipos. As possibilidades se esgotam e, nesse momento, o criador tem um papel de inovação. A produção não consegue abafar completamente a criação. O criador do século XIX só conseguiu se firmar no século XX quando sua criação se tornou produção (MORIN, 2009, p. 29). Entretanto, o criador, ao ver sua obra padronizada, não se identifica mais com ela, se envergonha da sua criação, e a nega. Ele não se justifica por meio de sua obra, de fundar nela sua própria transcendência. Apenas 100 anos após o advento da imprensa, as pessoas foram tomadas por um engenho de “imortalidade”, e “todos se apressavam em imprimir seus feitos e paixões, para edificação dos pósteros” (McLUHAN, 1979, p. 200). Esse engenho da imortalidade morre aos poucos pelas mãos da indústria de massa. Entretanto, a relação padronização-invenção nunca é estável ou parada. O autor consegue fugir da indústria cultural ao participar numa zona marginal dela, ao se expressar longe das pressões. São os circuitos alternativos. Sem exigências de criações padronizadas, com o claro objetivo de uma alcançar o grande público. Os intelectuais criticam duramente o produto cultural, pois tudo se opõe à cultura dos cultos: qualidade à quantidade, criação à produção, espiritualidade ao materialismo, estética à

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mercadoria, elegância à grosseria, saber à ignorância (MORIN, 2009, p. 18). Tanto os humanistas de direita como os de esquerda desprezam a cultura da massa. Dizem que é o ópio do povo. Apesar de desprezarem-na, eles trabalham para ela. A cultura de massa procura o máximo de consumo. Ela procura um público diversificado ao mesmo tempo homogeinizado. A assimilação de vários conteúdos por um homem médio que dispõe de uma percepção e inteligência média. A indústria tenta estratificar ao máximo os públicos e cria públicos infantil, feminino e masculino. Há uma vulgarização da obra na cultura de massa. Ela é simplificada ao máximo para que o grande público a entenda com menos personagens, um destaque para a maniqueização (bem Vs. mal) com acentuação de traços simpáticos e antipáticos, e a atualização ou modernização da obra. Essa vulgarização está tanto na tela do proletariado quanto do burguês. Eles terminam por consumir o mesmo tipo de produto cultural. Nenhum momento escapa: até nos momentos de lazer, a cultura de massa continua agindo. É no lazer moderno que o homem é levado a esquecer problemas do trabalho, a ignorar a coesão familiar e a ficar alienado para problemas políticos e religiosos (MORIN, 2009, p. 69). É nos momentos de lazer que somos levados a uma vida consumidora. Até no turismo fazemos viagens-espetáculos ao interior de um universo de paisagens, monumentos e museus. Sempre com a máquina a tiracolo e não esquecendo dos souvenirs. Estamos mais preocupados em registrar do que usufruir e nos relacionarmos com o local. A indústria cultural cria heróis artificiais que vêm ao encontro do imaginário das pessoas. Os modelos são imitados, desde o penteado, a roupa, os romances. Já que como homem cosmopolita não posso mudar o meu destino, eu projeto o meu imaginário e me identifico com os mocinhos do filme ou mesmo com a vedete criada. O público acompanha a vida privada do artista na busca de uma felicidade ligada à eternização do happy-end. A religião do indivíduo moderno e a ideologia da cultura de massa. O dinheiro é um sinônimo de felicidade. Não podemos esquecer o amor na cultura de massa. Ele não está mais focado nas relações familiares, mas no casal. O beijo do cinema traz a ideia de um amor espiritual e carnal. O ser amado diviniza o par. O feminino e o masculino são complementares nessa cultura de massa. Há uma feminização dos conteúdos, e uma baixa de conteúdos viris.

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Há uma intensificação de conteúdos voltados aos jovens. Uma ação intensificadora da cultura de massa para esse público com ênfase na felicidade, no amor e na individualização. O velho está fora do jogo, há uma desvalorização do idoso na cultura de massa. Ou seja, uma desvalorização dos saberes que acumulou durante sua vida. Como se o idoso não tivesse mais valor para essa nova sociedade. McLuhan, nas suas abstrações da obra de 1964, analisa que o homem tribal que se alfabetiza e se torna civilizado, emocionalmente livre para separar-se da tribo. Está culturalmente pronto para desbravar o mundo, e esse mundo é da cultura de massa. O homem moderno se universaliza quando aspira a uma vida melhor, procura sua felicidade pessoal e afirma novos valores: o bem-estar e o consumo. Na era da eletricidade, todo mundo se vê envolvido com todo o mundo durante todo o tempo. Pela tecnologia mecânica e elétrica, foram prolongados todos os nossos sentidos e todas as partes do corpo. As pessoas “sentem a ânsia da necessidade de um consenso externo entre a tecnologia e a experiência que eleva a nossa vida comunal ao nível de um consenso mundial” (McLUHAN, 1979, p. 128). Na Era da Informação e Comunicação, os meios elétricos criam instantaneamente e constantemente um campo total de eventos que interagem, do qual todos os homens participam. Eles dão força às vozes dos fracos. A dimensão do lado humano” é simplesmente a do imediatismo da participação na experiência alheia e que ocorre com a informação imediata. As pessoas também se tornam instantâneas em suas respostas de compaixão ou furor, quando devem compartilhar com o todo da Humanidade a mesma extensão comum do sistema nervoso central. (McLUHAN, 1979, p. 284)

A dinâmica elétrica é uma participação coletiva na criatividade. O consumidor homogeneizado se queixa quando solicitado a participar da criação ou preenchimento de um poema ou quadro abstrato, ou de uma escultura qualquer. As pessoas lineares e letradas do mundo literário não conseguem ver. Elas preferem não participar do processo criativo. Acomodaram-se nas embalagens já prontas: na prosa, na Poesia e nas Artes Plásticas. A automação é a invasão do mundo mecânico pela instantaneidade da eletricidade. A automação não afeta somente a produção, mas também o consumo e o mercado; pois, no circuito da automação, o consumidor se transforma em produtor – assim como o leitor da imprensa

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telegráfica em mosaico produz as suas próprias notícias ou, simplesmente, ele é as suas próprias notícias.

2.1.1 Modelo emissor-receptor

O trabalho da Teoria Matemática da Comunicação (The Mathematical Theory of Communication), de Claude Eldwood Shannon, com as ferramentas teóricas utilizadas por Norbert Wiener, foi proposto em artigo em 1948 na Bell System Technical Journal. Shannon inspirou-se na biologia do sistema nervoso. Em contrapartida, a teoria matemática da comunicação ajudou os cientistas de biologia molecular a um quadro conceitual para dar conta de algumas especificidades biológicas (MATTELART, 1999, p. 54). Mas não foi só à biologia que seu estudo deu atenção. Shannon é considerado o pai da Teoria da Informação, após a publicação, em coautoria com o matemático Warren Weaver, do livro “Teoria Matemática da Comunicação”, com reimpressões do seu artigo científico de 1948, mas numa linguagem para não especialistas. Sua teoria trouxe contribuições para diversas áreas como: o rádio, a televisão, o radar, a psicologia, a semântica, a economia, a biologia e o marketing (REZA, 1973, p. 207). “A teoria da sociedade de massa e a correspondente bullet theory da comunicação representam eficazmente essa tendência, cuja expressão mais consistente é fornecida pela teoria da informação, ou melhor, pela teoria matemática da comunicação” (WOLF, 2005, p. 108). O modelo ajuda a explicar fenômenos heterogêneos dos estudos de comunicação, por isso sua ampla aplicabilidade. Antes de Shannon, outros pesquisadores deram suas contribuições para que essa teoria se desenvolvesse. O objetivo desses estudos até era “melhorar a velocidade de transmissão das mensagens, diminuir suas distorções e as perdas de informação, aumentar o rendimento total do processo de transmissão de informação” (WOLF, 2005, p. 108). Em 1924, Nysquist apresentou estudo sobre a velocidade de transmissão das mensagens telegráficas; em 1927, o americano, Ralph V.L. Hartley propôs a medida da quantidade de informação, associada à emissão de símbolos, o ancestral do bit (binary digit) e da linguagem da oposição binária. Armand e Michèle Mattelart (1995) citam a contribuição de outros autores para o desenvolvimento da teoria de

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Shannon como o trabalho de Alan Turing, que em 1936 concebeu o esquema de uma máquina capaz de tratar essa informação de Hartley. A teoria matemática da comunicação de Shannon-Weaver é basicamente sobre a transmissão ideal das mensagens. O esquema geral de Shannon é mostrado a seguir:

Figura 1: Esquema de Shannon-Weaver sobre transmissão ideal das mensagens

A transferência de informação efetua-se da fonte para o destinatário, enquanto a transferência da energia vetorial ocorre do transmissor ao receptor (WOLF, 2005, p. 109). Há muitas metáforas que poderíamos usar para que se entenda o modelo proposto por ShannonWeaner. Eco (1991, p. 95) cita exemplos: o de uma comunicação radiofônica: a fonte da informação é o remetente da mensagem que, identificado um dado conjunto de eventos a comunicar, os faz chegar ao transmissor (o microfone), que os transforma em sinais físicos, os quais viajam ao longo de um canal (ondas hertzianas) e são captados por uma transmissora que os reconverte em mensagem (sons articulados) que o destinatário receberá. Outro é quando falo com outra pessoa, meu cérebro é a fonte da informação, o do outro, o destinatário; meu sistema vocal é o transmissor e o ouvido do outro, o receptor.

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Com algumas diferenças e pequenas variações terminológicas, o esquema apresentado anteriormente é apresentado nos estudos da comunicação. Todo o processo comunicativo se desenrola: a) Entre duas máquinas; b) Entre dois seres humanos; c) Entre uma máquina e um ser humano. Um dos grandes feitos deste modelo desenvolvido por Shannon foi o fator ruído, que perturba a transmissão de informação. Esse é um ponto-chave da sua teoria, já que “a finalidade operativa principal da teoria de informação da comunicação era justamente a de passar pelo canal o máximo de informação com a mínima distorção e a máxima economia de tempo e energia” (WOLF, 2005, p. 111). Sua melhor contribuição é o teorema do canal ruidoso: baseia-se numa melhor utilização da codificação, os defeitos da cadeia energética são corrigidos por meio de melhorias no rendimento da cadeia informacional. Mas, para que o destinatário possa compreender o sinal corretamente, é necessário que seja emitido ao receptor, usando um mesmo código. Pereira (2001, p. 32) nos coloca que os processos comunicacionais deverão, todos, estar em um repertório, ou código comum a dois ou mais interlocutores. Essa não era a preocupação dos teóricos da informação. A verdadeira preocupação deles era em relação à forma mais econômica para transmitir seus próprios sinais sem gerar ambiguidade e neutralizando ruídos no canal ou erros de transmissão. Fazendo uma analogia, os teóricos da informação são como os empregados dos correios. Interessa-lhes que o telegrama emitido por um emissor chegue no destinatário. Somente eles têm interesse no significado da mensagem. Os funcionários estão interessados se eles pagam corretamente pela extensão do texto. Entretanto, a mensagem para esses seres humanos (emissorreceptor) têm um grande significado. Os processos comunicacionais deverão, todos, estar contidos em um repertório, ou código comum a dois ou mais interlocutores. É fazendo referencia a esse código comum que emissor e receptor - dentro deste modelo, figuras distintas e bem delineadas - poderão transmitir significados comuns, o ideal da comunicação. (PEREIRA, 2011, p. 32)

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Segundo Wolf (2005), há limitações na teoria da informação que vêm da communication research. A teoria de Shannon é um sistema organizador que não contempla o significado da mensagem. A mensagem para o destinatário humano é modificada pelo que a recebe, pois ele extrai do código o que entende e não da mensagem em si. Apesar de algumas questões pelas quais a communication research não pode se ater a esse modelo de Shannon, ele é raramente questionado, e continua sendo usado. Wolf (2005, p. 116) encontra três explicações para essas tendências: 1º) Permaneceu a forma total do esquema, por sua essencialidade e simplicidade, e tornou-se um esquema de comunicação geral. Quem dá os pontos de contato entre o método linguístico para o problema da informação semântica e a teoria da informação é R. Jakobson. “A atividade de comunicação é representada como transmissão de um conteúdo semântico fixo entre dois polos definidos e encarregados de codificar o conteúdo, segundo as restrições de um código também fixo”. (WOLF, 2005, p. 117); 2º) Explicação dos efeitos da communication research. A teoria psicológico-experimental sobre os fatores seletivos da audiência e sobre a estrutura mais eficiente das mensagens persuasivas também pode ser lida com homóloga à variável do “ruído” que “dificulta” o processo de transmissão (WOLF, 2005 p. 117). 3º) Orientação sociológica geral da communication research, além de parte da teoria crítica e pelas correntes derivadas, pois a primeira fez com que a problemática mais especificamente da comunicação passasse para segundo plano no que se refere essencialmente à relação mídia/sociedade; e na teoria crítica, um modelo de comunicação já se encontra totalmente inscrito na análise do funcionamento social numa época de capitalismo avançado (WOLF, 2005 p. 118).

2.1.2 Teoria do agendamento: agenda-setting

Partindo das considerações de Morin (2009) acerca da cultura de massa e tendo como base os apontamentos de McLuhan (1979) sobre a imbricamento entre mensagem e meio, é possível que se faça uma avaliação do cenário da comunicação com foco no fluxo das informações entre

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os polos emissor e receptor. As teorias clássicas de comunicação, tal como visto anteriormente, tendem a estabelecer uma dinâmica de emissão e recepção pautada na transferência de informação da fonte para o destinatário. Entretanto, é fundamental abrir espaço para o debate sobre a dinâmica dos relacionamentos e o modo como se organiza o conhecimento. Edgar Morin aborda a questão quando avalia a importância do conhecimento das informações e mensagens-chave relativas ao mundo como necessidade intelectual e vital: É o problema universal de todo cidadão do novo milênio: como ter acesso às informações sobre o mundo e como ter a possibilidade de articulá-las e organizálas? Como perceber e conceber o Contexto, o Global (a relação todo/partes), o Multidimensional, o Complexo? Para articular e organizar os conhecimentos e assim reconhecer e conhecer os problemas do mundo, é necessária a reforma do pensamento. Entretanto, esta reforma é paradigmática e, não, programática: é a questão fundamental da educação, já que se refere à nossa aptidão para organizar o conhecimento. (MORIN, 2006, p. 35)

Partindo desse prisma, é possível supor que, se o sujeito está no modelo de comunicação e se depara com o problema universal de acesso às informações, é necessário checar se ele está passivo no processo. Isso porque pode fazer parte de uma estrutura mais ampla que o engloba e o torna pertencente a um determinado grupo fonte ou de recepção. Seguindo essa linha de raciocínio, há autores que avaliam o processo de recepção que vai além da noção de sujeito emissor – receptor na comunidade. Por exemplo, segundo Clóvis de Barros Filho (1995), é inútil falar isoladamente quando centenas de milhares de pessoas participam de uma experiência que geralmente fornece motivos, ideias, argumentos e imagens para conversas posteriores nos círculos dos receptores. Os indivíduos, vistos como receptores de informação, não operam como seres meramente passivos, mas, de maneira muito próxima ao agenda setting 2 , elegem, recusam ou aceitam as mensagens e, ao adotar essa função seletiva e atuar como veículos do diálogo, continuam esse mesmo processo reconstrutor do meio social. (BARROS FILHO, 1995, p. 116)

Com base nessa perspectiva, é correto afirmar que a relação entre emissor e receptor se dá em uma instância mais complexa do que a máxima de que os receptores recebem as mensagens 2

Clóvis de Barros Filho (1995) apresenta o conceito em seu livro Ética na Comunicação: da informação ao receptor, ao dedicar um capítulo específico (quinto) para a hipótese do agenda setting. Nele apresenta o que sustenta tal hipótese, afirmando que se trata de uma das formas possíveis de incidência da mídia sobre o público, determinando os temas sobre os quais o público falará e discutirá.

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tal como foram passadas pelos emissores. O processo comunicacional que considera, em si mesmo, a resistência e o processo de seleção de conteúdos por parte do público amplia o contexto da recepção neutra ou passiva, já que seria inerente ao processo de recepção uma espécie de agendamento de temas pelos indivíduos. Ainda que pareça contraditório pontuar os modelos passivos e neutros, diante da teoria de seleção de conteúdos por parte do público, é fundamental abordar dois aspectos a esse respeito. Primeiro, as teorias de recepção passiva e neutra fazem parte de um contexto inicial dos estudos sobre mediação, datando de períodos como a Primeira e Segunda Guerras. Por essa razão, é aceitável que existam diferenças entre visões características do começo desses estudos e as posteriores, que acompanharam as mudanças de cenário ao longo do tempo. Segundo, a teoria do agenda setting3 é válida no contexto dos estudos que sistematizam os principais fatores que condicionam a construção das representações do mundo e nos ajuda a compreender, especificamente neste trabalho, o modo como o receptor lida com o conteúdo recebido. Em um recorte mais abrangente, a visão do agenda setting também contempla o trabalho do emissor ao definir, segundo critérios culturais, sociais, econômicos, entre outros, o que iria para os receptores. Assim, a teoria do agendamento considera o modo como a comunicação entre emissor e receptor é estabelecida. Dessa forma, o fenômeno de agenda setting não estaria somente vinculado ao processo de seleção na recepção, mas na definição de temas do receptor e na forma como os conteúdos são entregues na sequência. Essa interpretação faz com que o processo comunicacional seja concebido por um modelo cada vez mais avesso à troca e ao diálogo. Clóvis de Barros Filho (1995, p. 45) identifica que, na prática do jornalismo, “o poder de decisão na produção informativa ficava restrito à elaboração da pauta, ou seja, a um número restrito de profissionais dentro do grupo” e essa visão é recorrente quando se leva em consideração um cenário pautado em poucas fontes de comunicação, principalmente no caso dos veículos da mídia, e muitos receptores.

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O trabalho não aborda os tipos de agenda setting que poderiam ser identificados a partir dos estudos elaborados por Max McCombs, uma vez que aprofundaria em demasia a questão em detrimento da abordagem do tema proposto (BARROS FILHO, 1995).

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Essa corrente que avalia a seleção de conteúdos a serem apresentados por meio de um recorte para os receptores é um ponto de vista que contribui para estudo sobre a dinâmica entre os polos emissor e receptor. Entretanto, diante de um cenário cuja introdução das ferramentas de tecnologia não alterou somente o formato da mensagem, como também promoveu uma transformação na linguagem utilizada, parece arriscado interpretar os fenômenos recentes de comunicação sob a ótica do agendamento. O surgimento da internet, tal como será visto mais adiante neste capítulo, leva-nos à identificação de novas formas de relação entre os agentes participantes do processo comunicacional, uma vez que o fenômeno de agendamento de temas está associado ao modelo com hierarquia vertical. O foco no usuário nasce juntamente com o modelo conceitual da Internet, que preconiza a comunicação de todos com todos, instaurando uma rede de comunicação horizontal em oposição à hierarquia vertical que rege as relações humanas em ambientes outros que não a Internet. (PASSARELLI, 2008)

Assim, começa a ser delineado um cenário em que a comunicação é entendida como um campo de estudo que se dedica a interpretar as mensagens que fazem parte de um modelo de comunicação pautado no emissor e receptor, mas vai além. O que deve ser destacado é que a interpretação dos meios como um conjunto de aparatos, corpos e dispositivos, visando ao estabelecimento de uma comunicação eficaz, na qual cada sujeito é parte integrante e decisiva no ecossistema, perpassa pela questão do aprendizado, da educação e da organização do conhecimento adquirido. Nesse sentido, a organização do conhecimento perpassa pela questão das práticas estabelecidas em certa comunidade, permitindo a criação de laços e vínculos, independentemente de sua natureza. Seja familiar ou pelo apadrinhamento de alguém fora do âmbito da família, a ideia de vínculo ultrapassa o mero contato, pois nele é impressa uma característica que tem a ver com a dinâmica dos agentes envolvidos naquele processo comunicacional. A ‘comunidade’, cujos usos principais são confirmar, pelo poder do número, a propriedade da escolha e emprestar parte de sua gravidade à identidade a que confere ‘aprovação social’, deve possui os mesmo traços. Ele deve ser tão fácil de decompor como foi fácil de construir. Deve ser e permanecer flexível, nunca ultrapassando o nível ‘até nova ordem’ e ‘enquanto for satisfatório’. Sua criação e desmantelamento devem ser determinados pelas escolhas feitas pelos que as compõem – por suas decisões de firmar ou retirar seu compromisso. Em nenhum

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caso deve o compromisso, uma vez declarado, ser irrevogável: o vínculo constituído pelas escolhas jamais deve prejudicar e, muito menos impedir, escolhas adicionais e diferentes. (BAUMAN, 2003, p. 62)

A noção de pertencimento a uma determinada comunidade, e por consequência a um ou vários ecossistemas de comunicação, é o que garante a inserção do sujeito no processo de comunicação. Sendo assim, a comunhão com o grupo pode tornar a experiência do communis. Só que, para isso, mais do que a presença efetiva na comunidade, é necessário acessar os conhecimentos e organizá-los, de modo a permitir o contato com os meios e o uso das ferramentas comunicacionais para a construção de uma comunicação. Tais premissas podem ser reconhecidas com o advento da Internet.

2.2 A Era da Internet

É inegável que, com o avanço e a criação das inovações tecnológicas, deu-se início à “Era da Internet” e, essa por sua vez tornou-se o tecido das nossas vidas. A rede, afirma Castells (2003), é um conjunto de nós interconectados. Sendo uma das práticas mais antigas exercida pelo ser humano, a formação de redes ganha um novo contexto e uma nova vida na pós-modernidade, com a criação da Internet. Vemos uma transformação nos processos comunicativos, em que os modelos de redes até então, como conhecíamos, dão lugar às redes de informação. Há uma modificação nos paradigmas e na rotina dos indivíduos em uma “Sociedade em Rede”. As extraordinárias possibilidades, a concepção de ferramentas de organização, a flexibilidade, a adaptabilidade, geram novos modelos econômicos que multiplicam a formatação de novas redes na sociedade, e acabam por suplantar grandes corporações e burocracias centralizadas. Uma nova estrutura social se configura no final do século XX, três processos se alinham em um modelo predominantemente baseado em redes: a globalização do capital pautada em uma flexibilidade administrativa e econômica; os valores da liberdade individual e de uma comunicação aberta; e a revolução possibilitada pelas telecomunicações e os avanços da computação, produzidas pela revolução microeletrônica.

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A Internet e seu uso como sistema de comunicação e forma de organização expandiu-se rapidamente no final da década de 90. Pela primeira vez, um meio de comunicação proporciona que muitos se comuniquem com muitos, em escala global, num momento escolhido. Apesar de mais de 2 bilhões de pessoas terem acesso à internet, levando em conta o atraso tecnológico e as pessoas menos desfavorecidas economicamente, as redes baseadas na Internet, há a preocupação quanto à qualidade do seu uso. Várias atividades culturais, sociais, econômicas, e politicas estão sendo estruturas pela Internet e em torno dela. Qualquer indivíduo que estiver excluído dessas redes sofre uma das formas mais danosas de exclusão proporcionada por nossa cultura (socioeconômica). A partir desse ponto, termos uma contextualização da origem da Internet, sua visão da “cultura na rede”, refletido a questão, sendo a produção histórica de uma dada tecnologia, acaba por moldar seu contexto e seus usos de modos que subsistem além de sua origem. Temos, como origem, a Arpanet, do Unix, o envolvimento das forças armadas americanas, dos Hackers e das grandes corporações, onde a Internet nasce em sua estrutura básica do processo de interesses de alguns grupos específicos. A Big Science (representando o papel das Universidades e Centros de Estudos) da pesquisa militar (representada pela agência Arpa, vinculada ao Ministério da Defesa Americano) e da cultura Libertária (juventude universitária dos anos 60). Podemos ainda ressaltar que, nesse percurso da origem da Internet, do seu desenvolvimento e até como a conhecemos hoje, os centros universitários americanos incentivavam e lutavam por uma abertura do código-fonte para um maior o aperfeiçoamento dos softwares (Internet). Havendo uma promoção da cultura hacker (especialistas em programação e tecnologia), tornando visível a influência dos seus valores e hábitos numa cultura de inovação tecnológica, com a tradição acadêmica. Temos como “a cultura hacker”, um conjunto de valores e crenças que emergiu das redes de programadores de computador que interagiam on-line e, atuavam na modificação do software, aprimorando o sistema operacional da Internet. O fundamento da cultura hacker teve como base a promoção e desenvolvimento do desempenho tecnológico. A liberdade para criar, dominar o conhecimento e compartilhá-lo em rede, democratizando o seu acesso. O objetivo era que, por meio da formação de redes, houvesse

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a criação de um padrão de comportamento habitual na Internet, e que este fosse difundido em vários setores da sociedade. A cultura da Internet foi moldada numa crença tecnocrática pautada no avanço da humanidade, por meio do progresso das tecnologias, liderados por comunidades hackers, que promoveram uma criatividade tecnológica livre e aberta. Todo esse processo estimulou a formação de comunidades on-line que mais tarde conceberam as redes virtuais, onde os indivíduos expandiram a capacidade de interconexão de computadores ampliando o alcance e seus usos. Essa apropriação da comunicação on-line trouxe a reflexão e um novo horizonte de mudanças nos comportamentos sociais, sendo a tecnologia usada na vida social como o propósito de reinventar a sociedade. A promoção e difusão da Internet foram levadas à sociedade em geral pelos empresários na década de 90, tendo como foco seus usos comerciais. Esses usos que propiciaram a expansão e propagação em toda a sociedade à utilização da Internet. “Não seria fantasioso dizer que a Internet transformou as empresas do mesmo modo, se não mais, que as empresas transformaram a Internet.” (CASTELLS, 2003, p. 49). O comércio eletrônico, a formação e a estrutura organizacional de empresas em rede influenciou o aparecimento de uma nova economia surgida a partir da quarta camada da cultura da Internet. Desenhou-se o perfil de um novo empreendedor e novas maneiras empresariais surgidas na Internet, denominada “empresa em rede”. As relações econômicas entre o comércio eletrônico e as empresas on-line foram modificadas com o uso da rede. Há o aparecimento de um mercado global interdependente e transnacional integrado às redes de computadores e aos mercados financeiros, provocando, assim, alterações no mercado de trabalho, com aumento das exigências de uma maior qualificação profissional exigida pelas empresas. Surgem novas formas de interação social que advêm com a criação e uso da Internet. A “sociabilidade”, uma formação de identidade e representação dos papéis sociais daqueles que utilizam a rede. É visível em uma dada comparação que, com o nascimento das comunidades virtuais e o individualismo em rede, os indivíduos estão refazendo o padrão de interação social, aparados em novos recursos tecnológicos, dando voz ao aparecimento de uma nova sociedade, “a sociedade em rede”.

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A transformação dessa sociedade em geral também trouxe uma modificação nas relações entre a sociedade civil e o Estado, em sua política para Internet com uso da rede de computadores, ou seja, a Internet vem se consolidando com um meio essencial de comunicação e organização em todas as esferas. Qual a importância dos códigos comunicacionais surgidos a partir das convergências entre a sociedade e a rede? Esse questionamento nos a ajuda a refletir e compreender o papel fundamental com que a arte e as possibilidades multimídia de difusão das manifestações culturais surgidas a partir do aparecimento da Internet contribuem em aproximar as expressões diversas, enraizadas numa cultura caracterizada pela fragmentação e multiplicidade de manifestações, podendo, assim, incentivar o compartilhamento de suas produções. A arte, cada vez mais, passa a ser uma expressão hibrida de materiais virtuais e físicos, e pode ser uma ponte cultural fundamental entre a Net e o eu (CASTELLS, 2003, p. 168). A partir da convergência das mídias, da cultura participativa e da inteligência coletiva, temos o surgimento da figura de indivíduos frutos da sociedade em rede: “Prosumers”. Esses indivíduos têm como características evidentes o uso e a influência nas redes, a produção e o compartilhamento dos seus conteúdos adaptados para Internet, sendo os principais responsáveis pela inovação e produção cultural colaborativa depositada no ambiente do ciberespaço. Considerando o prosumer como objeto deste trabalho, fundamental destacar que todo o processo de desenvolvimento da internet ocorreu de modo a caracterizá-la como um ambiente propício ao exercício da liberdade caracterizada por uma estrutura em quatros camadas correlacionadas: (1) cultura tecnomeritocrática se assemelha à (2) cultura hacker ao incorporar normas a redes de cooperação voltadas para projetos tecnológicos; a (3) cultura comunitária virtual torna a Internet um meio de interação social seletiva e de integração simbólica; e a (4) cultura empresarial trabalha, ao lado da cultura hacker e da cultura comunitária, para difundir práticas da Internet em todos os domínios da sociedade como meio de ganhar dinheiro. A transformação da comunicação, caracterizada pela inserção de um suporte tecnológico e adição de interação on-line às relações sociais existentes, leva-nos a considerar o fato de a internet ter sido apropriada pela prática social ligada a trabalho, família e vida cotidiana e ao surgimento de redes como evolução do padrão de sociabilidade.

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2.2.1 Interatividade e formação de redes

As literacias (no plural) têm influenciado o modo como pensamos a questão da interatividade e suas implicações nas práticas sociais, visto que o indivíduo isolado e dissociado do mundo material aos poucos extingue-se para dar lugar ao indivíduo interligado a uma estrutura maior e coletiva em que não apenas um. Assim, vários tipos diferentes de literacias são acionadas para que se possa compreender o caráter integrado, simultâneo e multimidiático dos textos. Trata-se de literacias que unem pessoas, práticas sociais e mídias para a construção do significado e que nos ajudam a compreender melhor a relação entre o eu e a sociedade, bem como a maneira como moldamos e somos moldados por sistemas e redes integradas (LEMKE, 2010). Tais redes, corrobora Latour (2005) em sua teoria dos atores em rede, precisam levar em conta uma ecologia das práticas de literacias, considerando-se atores humanos e não humanos. Nesse processo, as práticas sociais e culturais devem ser consideradas conjuntamente para que se possa, por intermédio dessa rede de interações, fazer com que textos multimidiáticos tornem-se significativos. De acordo com Lemke, as novas formas de literacias incluem habilidades em que é necessário saber manipular diferentes tipos de ferramentas e lidar com questões diversas e de formas variadas ao mesmo tempo. A relação entre literacias e interatividade culmina no fato de que os indivíduos precisariam atuar em uma série de atividades novas coletiva e individualmente. Além disso, para que se possa compreender esse conceito de literacias, é necessário interpretá-las como parte dessa rede de sistemas mais amplos, os quais dão “coesão à sociedade, que fazem dela uma unidade de organização própria e dinâmica muito mais ampla do que o indivíduo” (LEMKE, 2010, p. 459). Ainda acerca de tal rede o autor afirma que: Nesse sistema, devemos seguir as ligações e as redes de interdependência: que práticas, onde e quando são interdependentes com que outras práticas em que lugar e quando. Crítico nestes processos (até o ponto em que as ações humanas importam para a dinâmica do sistema) são as práticas de construção de significado pelas quais nós, humanos, interpretamos, avaliamos, planejamos e cooperamos, incluindo nossas várias práticas de letramento (LEMKE, 2010, p. 459).

Dessa forma, a coparticipação em um texto multimidiático na rede, por exemplo, requer muito mais do que o acesso a novas formas de tecnologia de informação, uma vez que as

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transformações que permitem nos relacionarmos facilmente com diferentes culturas em localizações geográficas inimagináveis anteriormente também levantam questões atreladas à dinâmica interdependente inseridas nesse sistema complexo. A possibilidade de experimentação e de construção de diferentes e múltiplas identidades que o ciberespaço proporciona faz surgir o eu fragmentado em que a identidade não é mais fixa, mas, sim, deslocada ou descentrada do sujeito (HALL, 1998). Assim, o conceito de interatividade na sociedade em rede faz com que a identidade se forme na relação entre o eu e a sociedade. Hall afirma que “o sujeito ainda tem um núcleo ou essência interior que é o ‘eu real’, mas este é formado e modificado num diálogo contínuo com os mundos culturais ‘exteriores’ e as identidades que esses mundos oferecem” (HALL, 1998, p. 11). Diante disso, emergem os conflitos entre o mundo pessoal e o mundo público nos quais o sujeito necessita lançar mão de inúmeras literacias para que possa sobreviver às constantes mudanças culturais e institucionais nas práticas sociais da sociedade atual. Lemke ainda discorre a respeito das interações na nova ordem cultural mundial e afirma que: Moveremo-nos para além da era das culturas nacionais e étnicas, para a era dos hibridismos culturais diversos, cada qual com sua comunidade global de membros e aficcionados. A nova ordem cultural mundial não será menos diversa e complexa do que a atual, mas sua base se expandirá através da geografia e da herança familiar para incorporar interesses compartilhados e a participação em comunidades centradas em atividades. (LEMKE, 2010, p. 468)

Tal pensamento, assim como as ideias de Hall (1998), vão ao encontro dos processos de aceleração global pelos quais as características geradas pela interatividade estabelecem diferentes representações da realidade, as quais geram conflitos de identidade, colocando em pauta questões como a homogeneização cultural e o surgimento dos coletivos híbridos. As formas de se relacionar com as mídias digitais também contribuem para a diversificação da participação ativa do sujeito no processo de construção do conhecimento, pois o resultado dos processos em que o indivíduo está conectado depende de suas interações, ou seja, das escolhas que faz e dos caminhos que deseja seguir, desde simplesmente optar por um determinado link ou até mesmo por meio da influência da escolha de redes das quais ele faz parte. Portanto, a participação do sujeito nas práticas sociais, por meio das interações com as diferenças do outro, seria fundamental para a construção de sentidos culturais mais amplos, assim

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como para a compreensão de sua(s) própria(s) identidade(s) e de como sua realidade estaria representada em contextos globais mais complexos. O mundo está em processo de transformação estrutural, emancipando assim uma sociedade em rede, onde vemos a emersão de um novo paradigma tecnológico, baseado nas tecnologias de comunicação e informação, “Nós sabemos que a tecnologia não determina a sociedade: é a sociedade. A sociedade é que dá forma à tecnologia de acordo com as necessidades, valores e interesses das pessoas que utilizam as tecnologias” (CASTELLS, 2005, p. 17). A propagação de atividades em que a base das redes de comunicação digital é necessária, porém, não suficiente para a emergência de uma nova forma de organização social baseada em redes. O surgimento de um novo sistema tecnológico, arraigado na microelectrônica, nos computadores e na comunicação digital, demonstra que a geração de conhecimento está amplamente dependente da capacidade de se organizar na sociedade. Castells, ainda afirma que: As redes de tecnologias digitais permitem a existência de redes que ultrapassem os seus limites históricos. E podem, ao mesmo tempo, ser flexíveis e adaptáveis graças à sua capacidade de descentralizar a sua performance ao longo de uma rede de componentes autónomos, enquanto se mantêm capazes de coordenar toda esta actividade descentralizada com a possibilidade de partilhar a tomada de decisões. (CASTELLS, 2005, p. 18)

As redes de comunicação digital são uma espinha dorsal em uma sociedade em rede, manifestando-se de diversas formas, levando em conta a sua história, cultura, e instituições de poder. Essa comunicação em rede ultrapassa as fronteiras, havendo uma comunicação em escala global baseada em redes globais. A difusão ocorre por meio dessas redes, influenciando bens, serviços, comunicação, informação, ciência e tecnologia. A compreensão dessa transformação e o surgimento de uma nova maneira em que a sociedade interage como um modelo específico de estrutura social devendo, assim, propiciar a reflexão e lançar luz para um julgamento, em que se valorize o significado da sociedade em rede para o bem-estar da humanidade.

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2.2.2 Novas literacias e o contexto da autocomunicação de massa

O homem tem vivenciado uma sucessão de eras, e cada uma delas tem características que determinam o seu futuro. Assim, Alvin Toffler propagou a ideia de que as transformações e rupturas vividas na contemporaneidade desde a instauração da sociedade em rede, no final da década dos anos 90, trouxeram mudanças de estruturas que se manifestaram por meio de novas lógicas; da narrativa não linear do hipertexto; das literacias emergentes nas redes sociais; da transição do conceito de autor individual para os coletivos digitais. Nesse novo panorama, no que diz respeito a um universo colaborativo, podemos ressaltar o aparecimento de indivíduos que podem construir em determinadas possibilidades, sua própria aprendizagem, com o uso de novas lógicas, semânticas e literacias da sociedade em rede. A

interatividade,

compartilhamento,

colaboração,

mobilidade,

convertibilidade,

interconectividade, globalização e velocidade, são qualidades que ilustram bem as características da sociedade contemporânea em rede. São significativas as alterações que os meios/ tecnologias de comunicação introduziram na sociedade contemporânea e, principalmente, no que tange à criação de novas maneiras de "apreender" e "aprender" o mundo (novas literacias): Conceitos, valores, linguagens, tecnologias e processos que tecem as teias da complexidade que permeiam a vida dos humanos nos dia de hoje. Na sociedade digital, onde o conhecimento atingiu o patamar de commodity, convivem num verdadeiro embate de paradigmas, valores, saberes e competências da sociedade moderna e da sociedade pós-moderna. (PASSARELLI, 2007, p. 21)

Portanto, o surgimento de novos paradigmas necessita que os indivíduos inseridos numa sociedade em rede estejam preparados para conviver numa sociedade em constantes mudanças, sendo os criadores do seu conhecimento num processo que os leve a serem sujeitos ativos e em que a "intuição" e a "descoberta" são elementos de suma importância para essa criação. Devido a vários aspectos das redes de comunicação e ao caráter multimídia dos textos e hipertextos na sociedade em rede, os quais influenciam as formas de se relacionar em todos os campos da vida social, e em que a comunicação se torna global e local, genérica, customizada e em constante transformação, as organizações nas quais as relações de poder são institucionalizadas têm sido desafiadas a todo momento por esse novo formato de sociedade e todas as implicações que decorrem dos novos modos de produção, reprodução e distribuição da

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informação. Assim, cada vez mais redes de comunicação verticais são substituídas por redes horizontais interativas pela disseminação da comunicação wireless (CASTELLS, 2007). Partindo desse pressuposto, é importante analisar a constante transformação no papel das literacias que emergem no contexto da sociedade atual, bem como é necessário considerar algumas mudanças no paradigma da comunicação na sociedade em rede. Um dos principais argumentos de Castells (2007) é que o surgimento da autocomunicação de massa (mass selfcommunication), que, por meio da internet, celulares, das mídias digitais e de uma série de outras ferramentas, promoveu o desenvolvimento de redes horizontais de comunicação interativa, as quais conectam o local e global, proporcionando a comunicação de muitos para muitos de forma sincrônica e assincrônica, em oposição à sociedade industrial, centrada na mídia de massa e caracterizada pela comunicação e distribuição de mensagens de mão única, de um para muitos, como é o caso da televisão, por exemplo. Sendo assim, uma das principais características da autocomunicação de massa seria o poder de “autogerar conteúdos, sua emissão autodirecionada, e a autosseleção em sua recepção em uma rede de muitos para muitos” (CASTELLS, 2007, p. 246, nossa tradução), o que possibilitaria uma interação global e uma diversidade ilimitada, as quais constroem e reconstroem a produção de sentidos local e globalmente na mente do público. Assim, o foco dessa modalidade de comunicação estaria na agência do indivíduo, o qual deixa de ser um mero sujeito passivo para exercer sua autonomia e participação ativa nas redes de comunicações. Lankshear & Knobel (2005) afirmam que as novas formas de literacias estão focadas na diversidade linguística e cultural e seu impacto crescente nas novas formas de comunicação tecnológica tem modificado as demandas em relação às habilidades dos indivíduos nas dimensões linguística e cultural, assim como nas práticas sociais. Já em relação ao mercado de trabalho, Cope & Kalantzis (2000) afirmam que a era Pós-Fordismo substituiu a velha estrutura hierárquica desenvolvida por Henry Ford com o modelo de técnicas de produção em massa, caracterizado pelo trabalho repetitivo e o uso de mão de obra não qualificada na linha de produção. Desta maneira, na era Pós-Fordismo, o que se observa cada vez mais nas relações de trabalho é o modelo de hierarquia horizontal, caracterizado pelo trabalho em equipe, no qual trabalhadores polivalentes ou “multitarefas” se identificam com a visão, missão e valores corporativos, assim como são responsáveis e comprometidos com a política da empresa.

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Além disso, Castells (2007) alega que a autocomunicação de massa torna-se uma ferramenta pela qual movimentos sociais constroem sua autonomia e confrontam o poder institucionalizado por meio de suas iniciativas e projetos. Nesta visão, os movimentos não se originam na tecnologia, porém usam a tecnologia como meio ou como forma de construção social e para o desenvolvimento da autonomia. Um exemplo acerca das novas formas de interação na sociedade em rede é o conceito de espaços de afinidade (affinity spaces), os quais seriam espaços onde o diálogo e a interação de culturas ocorrem por meio de práticas sociais (GEE, 2004). Para Gee, esses espaços de afinidade são locais onde as pessoas interagem umas com as outras e dividem experiências e práticas ou um assunto em comum, isto é, elas se reúnem para compartilhar uma afinidade ou interesse para a realização de um objetivo, não importando sua raça, gênero, idade ou classe social. Além disso, tais espaços podem ser reais ou virtuais, como, por exemplo, em um ambiente da internet, por meio de uma rede social ou um blog, ou ainda uma mistura dos dois tipos de ambientes, real e virtual. Castells argumenta que os blogs constituem sistemas de autocomunicação de massa, nos quais as redes de compartilhamento de informações tornam possíveis a circulação e a reformatação de qualquer conteúdo digital. Segundo o autor, apesar de muitos blogs serem de conteúdo pessoal (cerca de 52%), isto é, somente para satisfazer uma vontade do criador, e apenas alguns deles serem direcionados para outros receptores (cerca de 32%), qualquer informação postada na rede torna-se “uma garrafa boiando no oceano da comunicação global” (CASTELLS, 2007, p. 247, tradução nossa), a qual pode ser recebida e reprocessada de diversas e inesperadas maneiras. Nesse panorama, novas formas de literacias se fazem necessárias para que haja a interação entre pessoas com diferentes repertórios e culturas, mas muitas vezes com um objetivo em comum. Gee (2004) também defende o conceito de design de redes pelo qual as pessoas devem estar conectadas a outras redes de pessoas variadas e desconhecidas, pois nesses tempos de mudanças rápidas e constantes, se o indivíduo está conectado apenas com pessoas ou organizações iguais a ele mesmo, ou seja, todos nessa rede têm os mesmos conhecimentos em comum, não há nada para ser aprendido. Por outro lado, estar conectado com pessoas ou organizações de outras áreas é fundamental, pois tudo o que é diferente reflete novas maneiras de se pensar a realidade das coisas, assim como sugere novas práticas as quais podem nos ajudar a constituir novas organizações de pensamento ou mindsets (LANKSHEAR & KNOBEL, 2005).

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Tais organizações de pensamento surgem na interface entre literacias, tecnologias e práticas sociais. Gardner (1993), em sua teoria das inteligências múltiplas, corrobora essa pluralidade do intelecto e defende a importância do reconhecimento da variedade de inteligências humanas para que possamos, pela percepção das várias combinações de inteligências, aprender a lidar melhor com os problemas com que nos deparamos mundo afora.

2.3 Convergência das mídias e emergência de redes sociais: ruptura da barreira entre consumidores e produtores de conteúdo

É frequente a utilização do termo “convergência” sempre que se fala de tecnologia. Mas qual seria a melhor definição para esse processo? O professor de jornalismo Rich Gordon (2003) recorre a diversos momentos históricos para demonstrar as múltiplas maneiras de aplicação da nomenclatura, a seguir explicitados. Com origem no mundo das ciências ditas “duras”, o termo foi usado pela primeira vez no fim do século XVII e início do século XVIII pelo cientista inglês William Derham, ao mencionar a convergência e divergência dos raios, medindo-se o intervalo entre a velocidade do flash e do som do fenômeno. No século XX, iniciou-se a aplicação do termo na economia, para descrever a convergência das economias nacionais inseridas na economia global e na política, em que se introduzia a convergência entre os sistemas norte-americano e soviético. Foi a partir da década de 1960, no entanto, que se começou a priorizar o uso do termo relacionado às tecnologias de informação e comunicação (TICs), principalmente devido ao desenvolvimento mais intenso de máquinas computacionais e redes. No final da década de 1970, o cientista Nicholas Negroponte já falava em um entrecruzamento entre as indústrias de computação, cinema e impressão que alteraria diversas estruturas da sociedade. Porém, foi no início da década de 1980 que o Doutor em Artes Ithiel de Sola Pool, ao tratar das tecnologias da liberdade, popularizou o termo “convergência” e profetizou que as inovações tecnológicas contribuiriam para diversas mudanças sociais, principalmente no que tange ao compartilhamento de textos, conversas e notícias de maneira digital (GORDON, 2003).

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Em meados da década de 1990, o termo já era utilizado até em notícias de jornais e as empresas foram forçadas a entender que a mídia corporativa entraria em rota de colisão com a mídia alternativa e transformaria a produção, distribuição e consumo de informações. Inicialmente, a propagada “convergência” se dava apenas na troca de conteúdos entre emissoras de televisão e redações de jornais impressos que pertenciam ao mesmo conglomerado. Com o tempo, todavia, a expressão foi utilizada em sentidos tão diversos, para operações tão diferentes, que acabou se banalizando (GORDON, 2003). Henry Jenkins (2009), na tentativa de retomar valor ao termo, assume no livro “Cultura da Convergência” que a nomenclatura é antiga, mas extremamente útil, devendo ganhar novos significados no cenário atual. Nessa perspectiva, explora uma das facetas mais importantes da expressão, o fluxo de conteúdos por diversas plataformas de maneira simultânea, em decorrência do entrelaçamento das velhas mídias com as novas mídias. O autor ressalta como entende o termo: Por convergência refiro-me ao fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas de mídia, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca das experiências de entretenimento que desejam. Convergência é uma palavra que consegue definir transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais, dependendo de quem está falando e do que imaginam estar falando. (JENKINS, 2009, p. 29)

Não se trata apenas de uma convergência de equipamentos, como um celular que oferece acesso a canais de TV, emissoras de rádio, Internet, entre outras funções, mas da troca de informações e conteúdos em diversos canais, com múltiplos modos de acesso e interação. Por assim dizer, “A convergência envolve uma transformação tanto na forma de produzir quanto na forma de consumir os meios de comunicação” (JENKINS, 2009, p. 44). Qualquer pessoa com acesso à Internet, portanto, se torna um participante da cultura da convergência, obviamente com diferentes graus de influência. Produtores das grandes emissoras de televisão e veículos de comunicação mais tradicionais acreditavam que o telespectador apenas queria receber o conteúdo confortavelmente sentado no sofá de sua sala. Porém, o que se percebeu é que a participação efetiva dos “consumidores” só não ocorria devido à falta de canais disponíveis para que interagissem com a programação. Com o advento da Web, a interação cresceu vertiginosamente, muitas vezes dando

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origem a novas criações coletivas e revitalizando filmes, textos e obras artísticas até então esquecidas (JENKINS, 2009). As redes sociais, nessa seara, também se tornaram importantes aliadas para a geração de uma ruptura da antes bem delimitada relação entre consumidores e produtores de conteúdo. Elas se originam do que Recuero (2004, p. 7) denomina de softwares sociais: “sistemas que visam proporcionar conexões entre as pessoas, gerando novos grupos e simulando uma organização social”. Esses softwares são popularmente conhecidos como sites de relacionamentos ou redes sociais on-line. A autora ainda aponta dois elementos básicos formadores de uma rede social: os atoresindivíduos, instituições ou grupos – e suas conexões (RECUERO, 2009b, p. 23). Uma rede, afirma Recuero, é “uma metáfora para observar os padrões de conexão de um grupo social, a partir das conexões estabelecidas entre os diversos atores.” (RECUERO, 2009b, p. 24). Caracterizadas por possuírem ambientes sem barreiras ou censuras, acabam por possibilitar o engajamento cívico e oferecer instrumentos para o compartilhamento de conteúdos entre pessoas. O número de comunidades virtuais, redes sociais e de usuários está em constante expansão e, com esse aumento, tornaram-se objeto de estudo de diversos pesquisadores (RIDINGS, GEFEN, 2004; SCARABOTO, 2006; ALMEIDA et. al., 2011) interessados em conhecer desejos, atitudes e simbologias que são revelados e discutidos dentro desse ambiente, bem como a grande influência que ocorre na tomada de decisão de um consumidor particular ou de um grupo, refletindo e estimulando mercados. As comunidades virtuais e suas redes sociais apresentam, nesse sentido, ampla gama de efeitos culturais, incluindo a influência no comportamento do consumidor (KOZINETS, 2002). Isso ocorre principalmente porque as redes sociais têm como característica primordial a presença de pessoas para a sua constituição. Sem elas, toda a estrutura tecnológica que dá suporte para o seu funcionamento torna-se inútil. Uma rede social, por mais aplicativos e funções que tenha, não sobrevive sem participantes reais para abastecê-las com conteúdo, interação e troca social, porque se pressupõe que cada um dos nós, presentes em sua configuração, “representam cada indivíduo e suas conexões, os laços sociais que compõem os grupos. Esses laços são ampliados, complexificados e modificados a cada nova pessoa que conhecemos e interagimos” (RECUERO, 2009a, p. 25).

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É válido ressaltar, no entanto, que as redes sociais mais populares disponíveis na Web geralmente precisam ter características mínimas de funcionamento para cumprir sua função, são elas: registro de perfil público no sistema; visualização de informações de amigos na rede; e compartilhamento livre de informações entre usuários pertencentes à lista de conexões (BOYD; ELLISON, 2007; RECUERO, 2009a). As redes sociais formadas no ambiente digital começaram a se popularizar em 1997, com a criação da SixDegrees.com, que permitia a criação de perfis, comunidades e mensageiros instantâneos, além de entrar em contato com amigos e interagir com suas postagens de conteúdo. Desde então, até o ano de 2002, surgiram a AsianAvenue e Ryze.com, sendo a última a única a ter um pouco mais de importância, por ter contribuído para a criação do LinkedIn, em 2003. No mesmo ano, MySpace e Hi5 foram fortemente disseminadas e iniciaram o sucesso de adesão por parte do público que se concretizou em 2004, principalmente pelo Orkut, no Brasil, e Facebook, no mundo. Youtube, em 2005, e Twitter, em 2006, fecharam o ciclo de sucesso até o momento (BOYD; ELLISON, 2007). Segundo Saad Corrêa, a evolução desses meios digitais, em que a apropriação se torna cada vez mais fácil e intuitiva, fez com que a livre informação dê mais poder à pessoa que participa desse novo ambiente: Ao longo da evolução dos meios digitais como mídia informativa, assistimos a uma espécie de revalorização do valor da informação na sociedade contemporânea, principalmente por parte do leitor ou do usuário, que passam a ter voz e opinião na cadeia informativa. Cada vez mais, o usuário tem, em seus dispositivos eletrônicos, ferramentas que potencializam suas opções de escolha de conteúdos para compor sua cesta informativa e, assim, ampliar sua condição intelectual e de conhecimento sobre o ambiente. (SAAD CORRÊA, 2003, p. 145)

Nesse contexto, o consumidor de informação não deixa de produzir também, conforme aponta Lévy (1996, p. 63): "O consumidor não apenas se torna coprodutor da informação que consome, mas é também produtor cooperativo dos ‘mundos virtuais’ nos quais evolui”. Dentro da perspectiva de uma cultura de convergência, conforme apontado por Jenkins (2009), diversas experiências culturais mostram as potencialidades desse novo processo de comunicação e produção de sentidos. Entre os exemplos apontados pelo autor, está a análise da narrativa transmidiática trazida pelos produtos relacionados à trilogia Matrix, classificados como

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entretenimento para a era da convergência, pois integram múltiplas formas de texto, que vão desde exibições cinematográficas, passando por histórias em quadrinhos divulgadas via Internet, games para computador e um jogo on-line para múltiplos jogadores em massa (JENKINS, 2008, p. 134). Esse tipo de narrativa, segundo o autor, surge como reação à própria convergência; é uma estética que exige dos seus consumidores uma participação ativa. É diante dessa perspectiva que se inicia a discussão sobre a figura do prosumer, preliminarmente definido aqui como a junção entre uma pessoa que consome, mas que também produz conteúdo. A origem e aplicação do termo serão discutidas mais detalhadamente no próximo item deste texto coletivo.

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3

O

CONCEITO

EMERGENTE

DO

PROSUMER

NA

SOCIEDADE

CONTEMPORÂNEA

O terceiro capítulo deste trabalho monográfico debate mais fortemente a figura do prosumer, um consumidor que também adquiriu o direito de produzir conteúdo e que tem mudado a relação entre empresas e públicos. Suas principais características e as motivações que fazem com que armazene, crie e compartilhe informações, principalmente com auxílio da Internet, também serão assuntos abordados neste capítulo. Para isso, criou-se uma estrutura com duas partes, tendo itens com temas mais específicos. Na primeira delas, são apresentados os principais conceitos sobre esse consumidor e produtor, simultaneamente, e dedica-se exclusivamente a oferecer o histórico e definir o termo prosumer frente a diversas outras opções e abordagens que são explicitadas nesse item. Para apresentar esses temas, foram utilizados os seguintes referenciais teóricos: Alvin Toffler (1980, 1990), Don Tapscott e Anthony Williams (2007), entre outros textos e artigos que abordam o termo. A terceira e última parte trata da cultura participativa e da inteligência coletiva como características imprescindíveis para o surgimento do prosumer, figura que provocou diversas mudanças na forma de relacionamento com empresas, construção de conhecimento e revitalização e produtos midiáticos. A articulação desses temas teve como base as obras de: Saad Corrêa (2003), Clay Shirky (2011) e Henry Jenkins (2009).

3.1 Prosumer: conceituação

O termo prosumer foi cunhado por Alvin Tofler, escritor americano especialista em apontar tendências para o futuro, em 1980, quando publicou o livro A Terceira Onda. No entanto, a primeira discussão sobre o assunto aconteceu quando Marshall McLuhan e Barrington Nevitt sugeriram, em uma obra de 1972, Take Today, que, com a tecnologia elétrica, o consumidor se tornaria um produtor. Essa ideia avançou para o que Toffler chamou prosumer e foi retomada em 1996, por Tapscott, em sua obra Economia Digital (2010, p. 251 e 408).

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O conceito de prosumer é interpretado, nas obras consultadas, de forma semelhante, mas apresenta desdobramentos de acordo com as considerações feitas por cada autor. Quando McLuhan e Nevitt abordaram esse tema em 1972, não chegaram a propor um termo específico para o fenômeno que então vislumbraram, o que Toffler fez deliberadamente ao falar em um prosumer. O termo prosumer mostrou-se de difícil tradução, pelo fato de ser uma aglutinação. Assim, nas obras que traduzem o termo para o português, destacam-se as seguintes ocorrências: 1) prosumidor (Islas-Carmona, Rodriguez); 2) prossumidor (A Terceira Onda, de Alvin Toffler). Há também obras que, embora traduzidas para o português, conservam o termo em inglês, como é o caso de Tapscott (2010), que cunhou o substantivo prosumption para definir o fenômeno por meio do qual os prosumers produzem e consomem. Esse termo foi traduzido para “prossumo”, entre aspas. Para os propósitos deste trabalho, adotaremos os termos prosumer e prosumption, mantendo os demais usos nas transcrições dos originais consultados. Xie, Bagozzi e Troye (2008) definem prosumption como as atividades de criação de valor realizadas pelo consumidor que resultam na produção de produtos que eles eventualmente consomem e que constituem suas experiências de consumo. Certos fatores podem incrementar a propensão de prosumption; entre eles, avanços tecnológicos, aumento de acesso à Internet etc. Porém, outros fatores podem reduzir essa inclinação de prosumption. Dessa forma, a complexidade da tecnologia (componentes eletrônicos em carros e em outros produtos) pode dificultar às pessoas leigas a realização de certos trabalhos pessoais, desencorajando comportamentos de prosumption (TROYE e XIE, 2007). João Távora, tradutor da oitava edição de A Terceira Onda (1980), de Alvin Toffler, usada aqui como referência, adotou o termo "prossumidor" como tradução de prosumer, do original, The third wave. Nessa obra, Alvin Toffler se utiliza da metáfora das ondas em mudança que colidem para prever profundas transformações em aspectos comunicacionais, tecnológicos, econômicos e socias de uma nova civilização. O autor caracteriza, analisa e faz previsões sobre as transformações sob o impacto do que ele chama de a “Terceira Onda” na maré da história altamente tecnológica, mas anti-industrial -, considerando Primeira Onda aquela lançada pela revolução agrícola, e a Segunda Onda, pela revolução industrial.

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No capítulo intitulado “O Advento do Prossumidor”, Toffler chama a atenção para a figura do “prossumidor”, termo que funde “produtor” e “consumidor”, comentando que essa figura já existia na sociedade agrícola, baseada em produção para uso, pois as pessoas consumiam o que elas próprias produziam. Em oposição, na sociedade industrial, baseada em produção para troca, houve a criação do mercado, uma economia que separou o produtor do consumidor. Toffler propõe uma maneira de pensar a economia com dois setores: o Setor A, aquele do trabalho não pago, invisível, fantasma, em que as pessoas fazem para si mesmas, suas famílias, sua comunidade – o setor de prossumo. O Setor B, por sua vez, é aquele em que a produção de serviços é para venda ou troca no “mercado”, o setor visível da economia, que separa produtor de consumidor. Durante a Primeira Onda agrícola, o Setor A é enorme, e o Setor B é mínimo. Na Segunda Onda, industrial, há o contrário: o Setor A é pequeno (prossumidor invisível) e o Setor B é imenso, o que fez com que muitos economistas esquecessem da existência do Setor A. No final da Segunda Onda, entretanto, há o desaparecimento progressivo da fronteira entre produtor e consumidor e, na Terceira Onda, a crescente significação do prossumidor, tranformando o mercado e a vida das pessoas, que fazem por si mesmas o que antes outros profissionais faziam. Toffler afirma: Muitos dos mesmos dispositivos eletrônicos que usaremos em casa para fazer trabalho remunerado também tornarão possível produzir mercadorias ou serviços para nosso próprio uso. Neste sistema o prossumidor, que dominou as sociedades da Primeira Onda, será trazido de volta ao centro da ação econômica – mas numa Terceira Onda, em base de tecnologia. (TOFFLER, 1980, p. 275)

Considerando o ano em que foi escrita, 1980, anterior ao desenvolvimento, em 1989, do modelo aberto da Internet pelo cientista britânico Tim Berners-Lee, “como uma ferramenta acadêmica que permitiria aos cientistas compartilhar informações” (PASSARELLI, 2008), parte das previsões de Alvin Toffler sobre o prosumer em base tecnológica se confirmaram e inspiraram diversos estudos posteriores sobre essa figura que funde “produtor” e “consumidor”. O autor ainda retoma o termo prosumer em obra posterior, Powershift, de 1990, em que desenvolve seu conceito, prevendo que, algum dia, os clientes poderiam também pressionar botões que ativariam processos de produção remotos.

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Com essas novas transformações tecnológicas experimentadas nas últimas décadas, temse um cenário ideal para a emergência de uma geração ultraconectada, criativa e que tem o compartilhamento com base essencial para as formas de interagir e compartilhar. Isso se dá, entre outros fatores, porque há mais ferramentas disponíveis e de uso cada vez mais profissional, acessíveis a um número crescente de indivíduos (TAPSCOTT, 2010, p. 252). O simples fato de que os consumidores estão ativamente envolvidos na criação de valor e benefícios para seu próprio consumo está alinhada com a visão pós-modernista de que o consumidor é um participante da personalização de seu próprio mundo, agindo e determinando os significados e as funções dos objetos, baseado no seu sistema simbólico (FIRAT, DHOLAKIA, 2006). Dessa forma, os consumidores, em lugar de meramente destruir valores, produzem outros, comprometidos em diversas ações sociais, interpretativas e produtivas que resultam em produtos, símbolos, sinais e benefícios psicossociais. Para compreender de forma mais aprofundada o contexto em que os prosumers ganham força, Tapscott, em “A hora da geração digital: como os jovens que cresceram usando a Internet estão mudando tudo, das empresas aos governos”, publicado em 2010, apresenta parte das conclusões do projeto de pesquisa “The Net Generation: a Strategic Investigation”, realizado pela New Paradigm/nGenera entre 2006 e 2008. No estudo, cerca de 10 mil representantes de diferentes idades, de todo o mundo, participaram de entrevistas, presencialmente e pela Internet. Nesta obra, o autor retoma as discussões sobre o que define como prosumption, o que já fora objeto de discussão em outro livro de sua autoria, The Digital Economy (1996). Segundo ele, vivemos um momento que oportuniza o compartilhamento e a ascensão das redes de influência, e compreender esse contexto é determinante para a definição do prosumer. Tapscott apresenta dados demográficos fundamentais para o entendimento contextual que oportuniza a emergência dos prosumers, situando e caracterizando as gerações da seguinte forma: - Geração Baby Boom (1946-1964): forte economia pós-guerra, famílias confiantes, muitos filhos. Esperança, otimismo, paz e prosperidade. Ascensão da televisão, onipresença da “telinha”. (TAPSCOTT, 2010, p. 23-25). - Geração X (Baby Bust ou Geração de Retração da Natalidade) (1965-1976): queda da natalidade. Bem-instruídos, enfrentaram alta taxa de desemprego. Comunicadores agressivos, centrados na mídia. Quanto ao uso do computador, seus integrantes mais

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jovens têm hábitos parecidos com os da Geração Internet. Segundo o autor, “... a Geração X considera o rádio, a tevê, o cinema e a Internet como mídias não especializadas, disponíveis para que todos acumulem informações e apresentem seu ponto de vista.” (TAPSCOTT, 2010, p. 26). - Geração Internet / Geração Y / Geração do Milênio (jan. de 1977 a jan. de 1997): ascensão do computador, da Internet e de outras tecnologias digitais. Transição do HTML para o XML, para a colaboração, criação de conteúdo, comunidades virtuais: “Enquanto as crianças da Geração Internet assimilaram a tecnologia porque cresceram com ela, nós, como adultos, tivemos de nos adaptar a ela – um tipo diferente e muito mais difícil de processo de aprendizado.” (TAPSCOTT, 2010, p. 29). - Geração Z / Geração Next (jan. de 1998 até o presente): nativos digitais, nasceram imersos no contexto tecnológico de múltiplas telas e redes interativas. A Geração Internet vê menos tevê e a vê de forma diferente, seletiva; também é investigativa, buscando checar informações em tempo real. É criadora e remixadora de conteúdos, e está ultraconectada ao celular. O e-mail é considerado por essa geração um conceito ultrapassado, sendo visto como algo formal e apenas de uso profissional. O dia a dia é compartilhado por meio das redes sociais on-line. Trata-se de uma geração que interage com múltiplas telas. A questão da mudança nas formas de percepção e interação com a tela da televisão é um ponto de atenção para o autor: o controle está agora nas mãos de todos. Tapscott fala sobre a emergência de um novo cérebro, de uma mente mais flexível, adaptável e hábil em várias mídias. Trata-se não mais de um espectador que recebe informações passivamente, mas que coleta informações, questiona-as e sintetiza-as para criar algo novo. (2010, p. 122). Tem-se uma imersão tecnológica: TVs, computadores e smartphones convivem e são o meio pelo qual a Geração Internet busca informações, conversa com amigos e se conecta com o mundo. Toda a reflexão proposta por Don Tapscott está baseada no que ele chama de “oito normas da Geração Internet”, atitudes que diferenciam a Geração Internet das demais gerações. São elas: 1. Liberdade para experimentar coisas novas, escolher o que consumir, onde trabalhar, como trabalhar. “Os jovens insistem na liberdade de escolha.” (2010, p. 95).

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2. Customização dos produtos e das experiências de compra, customização da mídia e do próprio emprego/descrição de cargo. 3. Escrutínio, sempre buscando checar informações. “Deve-se oferecer à Geração Internet informações amplas e facilmente acessíveis sobre os produtos.” (2010, p. 100). Neste tópico, o autor alerta para o escrutínio inverso, ou seja, para o fato de esta geração não atentar que as informações privadas oferecidas por ela livremente na rede podem se tornar prejudiciais, expondo-a a riscos e danos de imagem (TAPSCOTT, 2010, p. 101). 4. Integridade como sinônimo de lealdade e transparência. Segundo Tapscott (2010, p. 105), os jovens da Geração Internet esperam trabalhar para e consumir de empresas que ajam honestamente. Num tempo em que há abundância de informação, qualquer vacilo é amplamente criticado por meio das redes sociais on-line. Esta norma é particularmente controversa se considerarmos que recentes episódios de denúncia a grandes marcas de moda por práticas trabalhistas análogas a escravidão não afetaram o crescimento dessas empresas, tampouco a percepção de seus consumidores, que embora incomodados com os fatos, não chegam a romper os vínculos ou deixar de consumir. Nesse sentido, a expectativa de integridade não chegaria a abalar propriamente o consumo, mas talvez a confiança. 5. Colaboração, principalmente por meio de tecnologias digitais, formando-se novas comunidades que podem produzir. “Os jovens da Geração Internet são colaboradores naturais.” (TAPSCOTT, 2010, p. 110). Segundo o autor, os consumidores da Geração Internet estão cada vez mais criando produtos e serviços em parceria com as empresas. Em 1996, ao falar sobre esse assunto no livro The Digital Economy, Tapscott cunhou o termo prosumption (“prossumo”); no entanto, o momento oportuno para que essa integração acontecesse é agora, pois a Internet oferece, hoje, a possibilidade de que indivíduos possam criar, compartilhar, formar comunidades, colaborar e inovar. Em 1995, os ambientes virtuais estavam ainda se consolidando e, do ponto de vista tecnológico, havia muitas lacunas. “Portanto, o ‘prossumo’ era uma ideia prestes a acontecer, esperando uma geração que tivesse um instinto natural de colaboração e coinovação.” (TAPSCOTT, 2010, p. 111-112). 6. Entretenimento é associado a quase todas as experiências da vida, a começar pelo trabalho, “porque a Geração Internet acredita que deve gostar do que faz para viver.” (TAPSCOTT, 2010, p. 113).

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7. Velocidade é uma expectativa natural para quem está acostumado a respostas instantâneas. A Geração Internet está acostumada à velocidade: uma mensagem deve ser respondida rapidamente, um produto deve ser entregue rapidamente, enfim, é um ambiente instantâneo que gera ansiedade. No âmbito profissional, “Muitos integrantes da Geração Internet gostariam que suas carreiras progredissem com a mesma velocidade do resto de suas vidas.” (TAPSCOTT, 2010, p. 116). 8. Inovação é um modo contínuo para a Geração Internet, que “foi criada em uma cultura de invenção. A inovação acontece em tempo real.” (TAPSCOTT, 2010, p. 117). Tapscott traz uma reflexão sobre como a Geração Internet impacta também a educação: há um grande abismo que existe entre o ambiente digital em que os estudantes estão submersos e o sistema educacional projetado para a Era Industrial (2010, p. 150); os modelos padronizados e unidirecionais de ensino não mais atendem aos desafios contemporâneos; estão em ascensão problemas como o aumento da evasão escolar, a queda da qualidade no ensino e os desafios para atrair estudantes. Segundo o autor, a economia global e a era digital requerem novas capacidades, e o aprendizado se dá ao longo da vida. Para ele, a capacidade de aprender é mais importante do que nunca (2010, p. 155-156). Essa geração requer mudanças das instituições tradicionais – escola, mercado de trabalho, política. Para o autor, por causa dessa geração, “as organizações precisam repensar muitos aspectos de como recrutam, remuneram, desenvolvem, supervisionam e colaboram com eles.” (2010, p. 51). Um dos aspectos relevantes da obra de Tapscott diz respeito aos impactos dessa geração sobre o mercado e o consumo; segundo o autor (2010, p. 51), a Geração Internet não apenas tem poder de compra e influência: ela espera que as empresas criem experiências e canais de interação. Como as formas pelas quais essa geração exerce influência mútua são novas, “a mídia tradicional é ineficaz para atingi-los. [...] Em vez de consumidores, eles querem ser ‘prosumers’ – coinovando produtos e serviços com os fabricantes.”. O autor complementa essa ideia mais adiante, ao criticar os consagrados 4 pês de marketing, preço, praça, produto e promoção, pois essa geração quer comprar em qualquer lugar, momento ou oportunidade que for mais conveniente. Sobre o conceito de Marketing 2.0, ele pode ser caracterizado pelo ABCDE, que corresponde aos termos Ubiquidade, Marca, Comunicação, Descoberta e Experiência. Sobre ubiquidade, Tapscott reforça a ideia de que a mobilidade

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permite que se compartilhe informação em qualquer lugar, a qualquer momento. A questão da marca também é debatida por ele: ela passa a ser mais que palavra ou imagem, e se converte em uma arquitetura baseada em integridade, honestidade, confiabilidade, consideração e transparência. A comunicação sai do modelo de promoção, mídia unidirecional e padronizada, para um modelo multidirecional, dialogal. O preço perde o status de inalterável e passa a ser negociável - "Quando compradores e vendedores trocam mais informações, o preço se torna fluido." (TAPSCOTT, 2010, p. 257). Por fim, a experiência com produtos, serviços e eventos gera colaboração e engajamento: ..."os prosumers da Geração Internet querem estar envolvidos na coinovação dos produtos e, se você deixar, estarão preparando o terreno para que as experiências ricas e duradouras ocorram." (TAPSCOTT, 2010, p. 256). Em Wikinomics: how mass collaboration changes everything, Don Tapscott e Anthony D. Williams (2007, p. 124-150) trataram da questão dos prosumers partindo da premissa de que os consumidores hoje são também os produtores, ou seja, prosumers, retomando a introdução do termo na obra de Tapscott (The Digital Economy, 1996), ao falar sobre "prosumption" para descrever como a distância entre produtores e consumidores estaria evaporando. A primeira crítica trazida pelos autores em Wikinomics é sobre a confusão entre o entendimento do conceito de prosumer e a centralidade do cliente, esta sendo a oferta de produtos básicos que os clientes/consumidores podem modificar parcialmente, como customizar um carro, por exemplo. No modelo de prosumption, os consumidores/clientes participam da criação de produtos de forma ativa e contínua. Um dos exemplos ilustrativos é o Second Life, em que o consumidor inova e coproduz os produtos que também consome. Em outras palavras, os clientes fazem mais do que customizar ou personalizar seus produtos; eles podem se auto-organizar para criar o seu próprio. Os usuários mais avançados, na verdade, não mais esperaram por um convite para transformar um produto em uma plataforma para as suas próprias inovações. Eles simplesmente formam suas próprias comunidades de prosumers online, onde compartilham informações relacionadas ao produto, colaboram em projetos customizados, envolvem-se no comércio e trocam dicas, ferramentas e partes de produtos. (TAPSCOTT & WILLIAMS, 2007, p. 126) (Tradução nossa)

Ao falar sobre o Second Life, os autores mencionam que, embora ele seja uma plataforma infinita para inovação, e não um produto, essa nova geração de prosumers trata o mundo como um lugar para criação, não consumo. (TAPSCOTT & WILLIAMS, 2007, p. 127).

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Um dos casos apresentados por Tapscott e Williams (2007, p. 129) é o do designer de calçados John Fluevog, que criou o calçado "opensource": consumidores submetem desenhos para avaliação por parte de Fluevog, e os melhores são produzidos. Ele não oferece contrapartidas em royalties ou remuneração financeira, ou mesmo em direitos de uso comunitários, mas se compromete simplesmente a adornar o sapato escolhido com o nome de seu criador. Alguns dos aspectos reforçados pelos autores para caracterizar o comportamento dos prosumers são: inovação e coinovação, capacidade sofisticada de criar e lidar com aplicativos, fortalecimento da cultura do remix (que não é nova, porém hoje acontece em escala muito maior), criatividade para produzir música, arte e invenções sem depender de grandes grupos econômicos, cultura open source, e a ideia de que "nós somos a mídia" (TAPSCOTT & WILLIAMS, 2007, p. 143). Os principais pontos destacados por Tapscott & Williams (2007) são: 1) Prosumption é mais que customizar; 2) A perda de controle sobre produtos, plataformas e formas de interação é um fato; 3) - Os prosumers buscam produtos e plataformas que possam modelar, reconfigurar, editar; 4) O negócio real para prosumers não é criar produtos acabados, mas ecossistemas de inovação; 5) Os prosumers desejam compartilhar os frutos de sua criação. Outros autores apresentam o termo em seus artigos e buscam caracterizar os prosumers, imersos nesta configuração social apresentada por Tapscott. Islas-Carmona (2008) apresenta o prosumer inserido na “sociedade da ubiquidade”, aquela em que a comunicação é para todos, em qualquer momento e em qualquer lugar. Nesse aspecto, as figuras do emissor e do receptor exibem, nos dias atuais, segundo o autor, diferentes limitações em suas capacidades explicativas. A ecologia dos meios se distingue por conceber ênfase ao estudo das tecnologias e dos ambientes comunicativos que podem ser considerados, afirma o autor ao citar McLuhan, extensões do homem, prolongações humanas à medida que estabelecem contato com o meio em que este homem está inserido. O autor enfatiza essa questão ao afirmar que, com o desenvolvimento dos meios de comunicação, “é possível perceber como progressivamente o meio é transformado com o propósito, nem sempre consciente ou deliberado, de fazê-lo mais parecido ao homem” (ISLASCARMONA, 2008, p. 30). Dessa forma, pode-se compreender as mudanças ocorridas nas

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sociedades, decorrentes da adaptação das pessoas às novas dinâmicas dos processos comunicativos que se estabelecem nas sociedades contemporâneas. A “sociedade da ubiquidade” envolve um uso expressivo das comunicações digitais móveis para garantir o acesso de qualquer pessoa, em qualquer momento e em qualquer lugar a uma ampla gama de informações. A educação também sofre essas consequências, configurandose em uma “educação móvel” (ISLAS-CARMONA, 2008, p. 30), em que toda pessoa pode acessar os recursos de aprendizagem e que promove, dessa forma, mudanças profundas, não só na educação, mas também nas instituições educativas. Essas mudanças na aprendizagem ocasionam a alfabetização digital que, de acordo com o autor (ISLAS-CARMONA, 2008, p. 30), resultam na “transformação de ordinários cibernautas em prosumidores”. Segundo o Islas-Carmona, o prosumer assume comportamento distinto do que se observa nos simples usuários da Internet, destacando-se a forma com que ele se relaciona com o conhecimento e como ele colabora em rede. A capacidade de buscar respostas, manifesta pelos prosumers, representa uma evidência da forma independente em que ele se relaciona com as informações, pois está claro que ele deixa de ser um usuário passivo, como observado nos simples usuários. A colaboração, da mesma forma, resulta em um comportamento fundamental, pois ele passa a ser um consumidor crítico que, além de posicionar-se diante de irregularidades percebidas, denuncia e evidencia as questões éticas envolvidas em práticas inescrupulosas, por exemplo. Amaral (2012) afirma que a nova criatividade colaborativa promove a ação coletiva e, em particular, a ação dos prosumers, uma vez que diferentes plataformas permitem que não especialistas publiquem conteúdos para uma grande audiência, potencialmente global, pois não há fronteiras territoriais que impossibilitem o alcance dessas plataformas. Assim, as ferramentas de mídia social que apresentam modelo de publicação, partilha e comunicação orientada para uma estrutura coletiva têm “transformado a maneira como as pessoas comunicam e interagem online” (AMARAL, 2012, p. 133). Além disso, a autora cita Shirky e afirma que as novas ferramentas sociais também promovem novas configurações de agregação de indivíduos e de formação de grupos e, enfatiza ainda, a colaboração exigiria mais participação do utilizador do que a partilha de objetos sociais, o que implica uma agregação de participantes, enquanto a colaboração passa a criar uma identidade de grupo. Após citar outras teorias sobre o tema,

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Amaral (2012, p. 135) aponta que a ideia comum entre elas está no fato de que “a inteligência humana está diretamente relacionada com a vida social e que a interconexão de indivíduos, proporcionada pela técnica, potencializa a maximização do conhecimento em uma escala coletiva”, transformando a maneira como as pessoas se comunicam e interagem com os outros on-line. E, nessa concepção, prosumer torna-se o conceito-chave que descreve essa mudança de paradigma. Rodriguez (2012) afirma que a grande diferença entre os receptores do passado e os usuários atuais que se estabelecem nos sistemas e redes sociais trata-se do rompimento das barreiras entre consumo e produção. O autor identifica o conceito prosumer a partir das hipermediações e do hipertexto. A teoria das hipermediações, apresenta o autor citando Orozco, se concentra em pensar nas mudanças que acontecem nos meios de comunicações e como essas mudanças influenciam a forma com que entendemos as interações nos espaços midiáticos. Essa teoria, segundo Rodriguez (2012, p. 68), centra-se nas experiências comunicativas dos atores sociais e nos processos de produção, consumo e significado das tecnologias da informação e sua formulação decorre da teoria do hipertexto e seus postulados sobre o funcionamento da Internet. A hipertextualidade permite, segundo o autor (RODRIGUEZ, 2012, p. 69), “que cada usuário estabeleça de forma personalizada, seu andar y estar”. Cada usuário constrói seu caminho possibilitando novas formas de organização da informação e, assim, torna-se evidente a participação ativa dos prosumers nesse ecossistema informacional atual. Segundo Xie, Bagozzi e Troye (2008), os prosumers são pessoas bem informadas, em constante procura de conhecimentos e desenvolvimento de competências em todos os aspectos de interesse do seu dia a dia. Estão ativamente envolvidos na criação de valor e benefícios para seu próprio consumo. Conforme Piller e outros (2005), os prosumers atuam como co-designers ou parceiros na criação de valor, uma vez que eles se apropriam de atividades e processos que costumavam ser de domínio exclusivo de empresas. Valendo-se das novas tecnologias, eles interagem e influenciam quem os rodeia, antecipando tendências. As principais características encontradas nos prosumers são descritas a seguir (EURO RSCG WORLDWIDE, 2004; PILLER, SCHUBERT e KOCH, 2005; XIE, BAGOZZI e TROYE, 2008; LANGER, 2007):

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1. Criam seu próprio estilo de vida: gostam de se sentir no controle da suas vidas e são proativos. Procuram dicas e palpites de todas as fontes e montam seus estilos de vida em função de suas necessidades. São autodeterminados e dominam a tecnologia. Conforme Xie, Bagozzi e Troye (2008), eles criam suas próprias experiências subjetivas, as quais, por sua vez, geram os benefícios pessoais e os valores sociais para os prosumers. 2. Não se deixam prender por estereótipos: não se autolimitam a rótulo ou lugar. As suas escolhas não seguem padrões ou pressões sociais. Eles procuram criar padrões de comportamento e autoimagens ideais segundo o seu ponto de vista (XIE, BAGOZZI e TROYE, 2008). 3. Fazem escolhas inteligentes: estando bem informados, sabem o que está disponível e o que oferece maior valor para eles. Utilizam a tecnologia para comunicar-se com sua rede de contatos e procurar o que há de melhor em relação a seus interesses. Nesse sentido, Troye e Xie (2007) acrescentam que as suas atitudes no processo de escolha vão além do conhecimento das diversas marcas e dos atributos dos produtos, avaliando as possíveis consequências e os reais benefícios de sua escolha. 4. Abraçam a mudança e a inovação: não somente aceitam as inovações, mas também eles as acolhem, entusiasmam-se em explorá-las e procuram ver oportunidades nelas. São os primeiros em adotar as novas tecnologias, mas não as aceitam de forma incondicional; eles querem ser os primeiros a aderir às novidades que acrescentam valor (EURO RSCG WORLDWIDE, 2004; LANGER, 2007). 5. Vivem aqui e agora: prosumers sabem lidar com os conflitos gerados pelas pressões e os prazeres do dia-a-dia, tentando encontrar os meios para desfrutar o presente melhor do que nunca. Eles se sentem mais capazes de viver o agora, sabendo que eles possuem aquilo de que necessitam para lidar com o quê vier, quando vier (LANGER, 2007). 6. Estão conectados e interagem: têm o poder da conectividade e da interatividade (FIRAT e DHOLAKIA, 2006). São capazes de acessar a informação sem limitações de espaço e de tempo. Enviam sugestões, reclamações e trocam informações e opiniões, e têm enorme capacidade de influenciar quem os rodeia. 7. Prosumers se valorizam: possuem alta autoestima e se permitem momentos de autoindulgência (FIRAT e DHOLAKIA, 2006).

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8. Escolhem o design: quer seja um objeto de designer nomeado, o visual de sua casa, a seleção de ingredientes para uma refeição, o equipamento que usam. Prosumers tentam colocar seu pensamento, senso de estilo e assinatura em tudo o que eles fazem e escolhem. 9. Preocupam-se com a saúde: especialmente quando se trata da própria saúde ou a de uma pessoa próxima. Questionam médicos e pedem segundas opiniões e, para isso, procuram estar bem informados e a par do conhecimento (EURO RSCG WORLDWIDE, 2004). 10. Valorizam o que funciona: interessam-se pelos resultados mais do que pelo esforço necessário para alcançá-los (EURO RSCG WORLDWIDE, 2004). 11. São árbitros das marcas: eles estão à procura de valor nas marcas. Percebem sua presença ou ausência e alertam os outros disso. São criteriosos e julgam os produtos em função do valor que proporcionam sem se prender a marcas (TROYE e XIE, 2007). 12. Querem saber como fazer: procuram saber como fazer as coisas em lugar de confiar em outros para fazer isso. São afiados em aprender, afiados em compartilhar seu conhecimento com outros (XIE, BAGOZZI e TROYE, 2008). A partir dessas características dos prosumers, percebe-se que o reconhecimento desse tipo de consumidor dentro do processo de produção/consumo é de grande importância para os gerentes de marketing, pois representam canais de comunicação importantes para criar atitudes e demandas. Eles refletem e estimulam mercados, através de sua participação e poder de comunicação (NUNES, RODRIGUES, 2005). Além disso, o entendimento do comportamento dos prosumers pode gerar insights úteis para o entendimento das novas tendências no comportamento do consumidor e práticas de marketing (TROYE e XIE, 2007). Segundo Langer (2007), são os prosumers os principais responsáveis pela inovação de produtos, num sentido mais restrito, e pela produção de cultura de consumo, num sentido mais amplo. De acordo com o exposto, o conceito prosumer pode ser considerado a nova denominação do papel assumido pelos sujeitos que interagem com as mídias sociais e trata-se de um termo que precisa ser estudado para favorecer a compreensão dos papéis sociais desses autores conectados em rede.

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3.1.1 Outras nomenclaturas para o consumidor que também produz

Com o advento da Web e o consequente rompimento da barreira entre produtores e consumidores, a disseminação de ideias acontece de maneira colaborativa e participativa. Nesse sentido, além do termo prosumer, já discutido anteriormente, outras nomenclaturas podem ser utilizadas para caracterizar todos os participantes que são, simultaneamente, usuários e produtores de informação. Axel Bruns (2008b), por exemplo, define como produser a figura responsável por dialogar com outras pessoas, além de fazer comentários, avaliações e recomendações, participante do processo de produsage (produção) e dependente de comunidades livres para exercer sua função em criações coletivas. De acordo com Saad Corrêa (2003, p. 209): As características da produsage são diferentes da produção industrial: baseada no envolvimento colaborativo; fluidez nos papéis do processo informativo; uso de artefatos simplificados e de uso disponível na rede; e resultados de propriedade coletiva, mas com mérito individual reconhecido pelo grupo.

Na visão de Axel Bruns (2008a), a principal diferença entre o prosumer, de Alvin Toffler (1980, 1990), para a sua ideia de produser é que o primeiro termo se relacionaria com consumidores que produzem de acordo com interesses corporativos, enquanto o segundo teria como foco as criações coletivas de interesse público, tais como a Wikipedia, que o autor considera um processo híbrido que, conduzido por usuários que são também produtores, poderia ser chamado de produsage (BRUNS, 2008a, p. 3). Montardo (2010) comenta essa referência que Bruns faz ao prosumer de Toffler, acrescentando que ele nada mais é do que um “‘consumidor profissional’ cujo feedback de suas necessidades, gostos e impressões às organizações, colabora para a criação de novos produtos e serviços. Para essa autora, a atuação dos prosumers não incidiria em uma alteração no modo de produção tradicional, pois eles estariam a serviço dos interesses corporativos (MONTARDO, 2010, p. 166). Outro termo utilizado para descrever essa figura é “usuário-mídia”, basicamente descrito como um heavy user da Internet e, mais especificamente, das mídias sociais. Inserido na era da

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midiatização, cada indivíduo torna-se um canal da mídia, responsável por criar, remixar, compor, expor, apresentar e/ou difundir seu próprio conteúdo. Relata-se que existem diferentes níveis de usuário-mídia, desde o que somente consome ou replica conteúdo, até os que produzem mensagens ativamente. Basicamente, no entanto, pode ser caracterizado como uma pessoa que “[...] produz, compartilha, dissemina conteúdos próprios e de seus pares, bem como os endossa perante suas audiências em blogs, microblogs, fóruns de discussão on-line, comunidades em sites de relacionamentos, chats, entre outros meios” (TERRA, 2011, p. 68). “Consumidor 2.0” é outro termo muito utilizado para denominar a mudança no consumo social e na distribuição de informações. Essa figura surge das novas possibilidades de interação, mobilidade, participação e personalização geradas por ferramentas e plataformas da Web 2.0. Basicamente, de acordo com Inês Amaral (2012, p. 145), nesse “novo modelo de comunicação, o conceito de utilizador foi transformado em ‘consumidor 2.0’ e criou a possibilidade do receptor ser produtor para uma audiência global”. No entanto, optou-se por não utilizar esta nomenclatura como a mais indicada para o trabalho, principalmente pela manutenção da palavra consumidor no termo, o que poderia dar a ideia de que as características de uso passivo seriam muito mais fortes que as de produção, mas, também, porque a expressão é recente e pouco recorrente na literatura científica. Nesse sentido, há de se fazer uma ressalva no uso do termo prosumer no presente trabalho monográfico. A partir da leitura de Axel Bruns (2008a, 2008), realizada pelos autores deste texto coletivo, chegou-se à conclusão de que a distinção entre o uso dos termos prosumer e produser não se baseia totalmente entre uma figura que produz de acordo com uma relação profissional e interesses corporativos, e outra que tem como foco o interesse coletivo. Por este motivo, devido ao uso mais consolidado e recorrente do termo prosumer na literatura, optou-se, como destacado anteriormente, pelo emprego dessa nomenclatura no trabalho.

3.2 Cultura participativa e inteligência coletiva: impactos provocados pela presença do prosumer

O movimento de crescente evolução tecnológica acessível trouxe um novo perfil de consumidor, cada vez mais atraído para dentro do processo de produção e desempenhando uma

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nova significação na relação de consumo. A incorporação dos hábitos do usuário na convergência das mídias como um influenciador e protagonista do processo comunicacional trouxe um novo cenário em uma renegociação e uma reconfiguração de poder entre produtores e consumidores. Nesse sentido, o prosumer interage em um conjunto de regras subjetivo, coletivo e em comunidades que se formam, dissolvem e são novamente construídas de forma exponencial. Para Clay Shirky (2011), os esforços divididos sem controle gerencial produzem crenças arraigadas de que trabalho sério é feito por pessoas adequadas, remuneradas, com gerentes que dirigem o trabalho. No entanto, indivíduos agindo como um grupo, mesmo que não coordenados é uma forma de autogerenciamento que cria um valor real. O valor pessoal é o valor que recebemos por estar ativos em vez de passivos, por ser criativos em vez de consumistas. O atual cenário traz a relação em círculos colaborativos, considerando não só o componente de consumo, mas os efeitos da emoção humana como parte deste inventivo à transação. A interação do consumidor com o produto e o desenvolvimento cognitivo estudado na economia comportamental revela que o interesse não está somente no ter, mas também no compartilhar. No entanto, segundo Shirky (2011), essa emoção intrínseca que agrupa por diversas razões pessoas motivadas não somente pela recompensa financeira, mas por fazerem parte de algo em seu excedente cognitivo, baseia-se em um sentimento de conexão e de ter sua voz ouvida. Esse novo formato nas relações de consumo traz novos desafios para quem deseja oferecer seu produto, já que o prosumer dita as regras e tem um novo parâmetro referencial de pesquisa e divulgação. Os antigos usuários tornaram-se participativos e fornecem a matéria para o excedente cognitivo, onde não somos mais o alvo, mas parte legítima individual ou coletivamente. A nova geração procura o mouse na televisão. A mídia inclui possibilidades de consumir, produzir e compartilhar lado a lado e essas possibilidades estão aberta a todos. Presencia-se atualmente uma cultura de participação tão intensa que as pessoas já conseguem se antecipar aos avanços tecnológicos, por exemplo, reformulando e aprimorando softwares que acabam de ser lançados. O consumo, que se fazia presente de maneira individualizada, agora é interligado em rede. Se, usando apenas a televisão, o homem se isolava do mundo, agora, com auxílio do computador, enquanto assiste à programação, a pessoa se insere em uma comunidade, interagindo com outros indivíduos (JENKINS, 2009).

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Isso porque o ciberespaço permite, por meio da oferta de instrumentos de construção cooperativa, um contexto comum para grupos numerosos de pessoas geograficamente dispersos, conforme coloca Lévy (1996). Não se trata apenas de um mero transporte de mensagens, mas de uma situação comunicacional em que cada um é capaz de contribuir [...] para modificar ou estabilizar, de uma negociação sobre significações, de um processo de reconhecimento mútuo dos indivíduos e dos grupos via atividade de comunicação O ponto capital aqui é a objetivação parcial do mundo virtual de significações entregue à partilha e à reinterpretação dos participantes nos dispositivos de comunicação todos-todos. Essa objetivação dinâmica de um contexto coletivo é um operador de inteligência coletiva, uma espécie de ligação viva que funciona como uma memória, ou consciência comum (LÉVY, 1996, p. 113-114).

A Wikipédia (enciclopédia on-line) é um exemplo claro da participação que pode gerar benefícios. Por seguir um modelo em que qualquer pessoa, independentemente da formação, pode editar o conteúdo disponibilizado, pressupõe-se que o sistema não é 100% confiável, como de fato não o é. Todavia, diferentemente do que se pode pensar, a diferença de erros em comparação com uma obra impressa e tradicional como a Enciclopédia Britânica, principalmente no que tange a verbetes científicos, é muito pequena, como aponta estudo realizado pela Revista Nature, em 2005. Não se pode levar a comparação como uma verdade absoluta nos dias de hoje, uma vez que as amostras não são generalizáveis e já se passaram quase dez anos da coleta de dados, mas ao menos se indica um caminho para possíveis produções coletivas benéficas para a população, desde que se siga um conjunto de normas de compartilhamento de conhecimento, como o seguido pela enciclopédia on-line (GILES, 2005; JENKINS, 2009). Para analisar tal fenômeno, Jenkins retoma as chamadas comunidades de conhecimento, já escaneadas por Pierre Lévy (1998, p. 54), em que os indivíduos colocam seu conhecimento a serviço de um objetivo comum, um fim coletivo, do qual emerge uma inteligência alavancada, que combina a expertise dos membros de uma determinada comunidade. São afiliações que se dão voluntariamente, dissociadas de localidade e temporalidade; são temporárias e estratégicas para determinadas finalidades (como o caso dos fãs do reality show “Survivor”, explicitado na obra). Um verdadeiro exercício, segundo Jenkins, de epistemologia popular. Peter Walsh (2003, p. 87) também é trazido para o debate por Jenkins pela proposta de quebra do paradigma do expert, que pressupõe um corpo de conhecimento, dominado por um

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indivíduo – o expert -, integrado a um clube de pessoas que possuem algum conhecimento versus as que não o possuem. Esse conhecimento é adquirido por meio de regras: provas, notas, graduações, e foi aceito em um determinado ritual. A inteligência coletiva, como coloca Jenkins, pressupõe que todos têm algo a contribuir; cada participante ou comunidade estabelece suas próprias regras para dominar ou disseminar determinado conhecimento; não possui credencial determinada e muito menos uma graduação estabelecida (JENKINS, 2008, p. 85-86). É nesse sentido que a cultura participativa se relaciona diretamente com a postura mais ativa que o prosumer exerce. De acordo com Henry Jenkins (2009, p. 30): “Em vez de falar sobre produtores e consumidores de mídias como ocupantes de papéis separados, podemos agora considerá-los como participantes interagindo de acordo com um novo conjunto de regras, que nenhum de nós entende por completo”. A partir dessa cultura participativa surge a “inteligência coletiva”, expressão utilizada por Pierre Lévy (1998) para caracterizar a forma como todas as pessoas podem colaborar com uma habilidade ou recurso específico que possua, contribuindo para o consumo, disseminação ou desenvolvimento de algo novo, fazendo frente ao poder midiático tradicional, pelas próprias palavras do autor, “uma utopia realizável”. Nessa perspectiva, até mesmo um telespectador que simplesmente descreve o que vê na televisão para outros participantes de uma comunidade de fãs pode dar início a um processo de renovação de um produto ou processo comunicacional, incentivando a participação de outras pessoas. O consumo, comenta Amaral (2012) ao citar Jenkins, se tornou um processo coletivo e, nesse novo paradigma, a mudança passa pela convergência, cultura participativa e inteligência coletiva. A convergência dos meios altera os modelos de consumo e produção e, nessa configuração, encontramos os novos produtores/consumidores, ou seja, os prosumers. A Web social permite o aumento das comunidades de prosumers organizados e que desafiam esse papéis tradicionais de produtores e consumidores; o “conteúdo criado pelo utilizador orienta-se para uma espécie de jornalismo coletivo à medida que novas ferramentas promovem redes baseadas em metadados e práticas sustentadas por objetos sociais” (AMARAL, 2012, p. 137). Torna-se tênue, segundo Amaral, a fronteira entre o privado e o público. Jenkins ressalva, no entanto, que estaríamos ainda em uma fase de aprendizado dentro dessa cultura em que comunidades do conhecimento e a comunicação todos-todos permite essa

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partilha e todos esses exercícios de epistemologia. O desenvolvimento de uma cultura com capacidades democráticas ampliadas e uma vasta compreensão global depende, conforme pontua o autor da capacidade de aprender e da diversidade por compartilhamento de ideias, fatores que podem ser reduzidos de forma acentuada quando se permanece em um círculo de interações que divide as mesmas convicções (JENKINS, 2009, p. 305). Outro ponto importante apontado pelo autor é que, no momento atual, caracterizado principalmente pelas mudanças das antigas regras impostas pelo poder midiático, empresas precisam repensar sua relação com os consumidores. Ao citar as comunidades de spoilers do reality show Survivor ou a revitalização de Star Wars realizada por fãs, práticas que à mobilização política, ao trabalho ou à educação, Jenkins (2009) retrata que as empresas não devem tentar censurar a criatividade dos públicos, alegando propriedade intelectual e tratando-os como uma ameaça econômica, mas aproveitar a oportunidade para valorizar ainda mais o seu produtos pelos fãs e se tornar admirada e defendida por essas pessoas (lovemarks), tema que será discutido no próximo subitem deste trabalho monográfico. A utilização de novos meios e a mudança no comportamento é descrita por Morin (2000) como o princípio sistêmico ou organizacional, que liga o conhecimento das partes ao conhecimento do todo, resultando em novas qualidades ou propriedades em um sistema de comunicação aberto. Outro princípio do autor aplicado ao prosumer é o hologramático, pelo qual a parte está no todo e o todo se insere na parte. Assim, uma mensagem contém as marcas do autor, do meio, do receptor e do contexto. Essa marca é a relação intrínseca que identifica o produto considerado pelo prosumer como sua possibilidade criativa, informativa e estrutural. O futuro desse cenário, todavia, ainda é incerto. Seus aspectos positivos e negativos surgem com a mesma velocidade desta evolução. Um monitoramento a fim de prever uma reação é praticamente impossível, uma vez que parte do controle desta nova expressão do usuário prosumer não está nas mãos de nenhuma classe ou membro, mas no próprio fluir. Nosso principal desafio não é decidir para onde queremos ir, mas permanecermos firmes enquanto vamos para lá. A invenção de ferramentas que facilitam a formação de grupos é menos uma formação tecnológica que um evento, algo que já aconteceu. Em consequência, o importante não é saber se essas ferramentas vão espalhar ou remodelar a sociedade, e sim como o farão. (SHIRKY, 2008, p. 260)

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Esse movimento, no entanto, não pode ser considerado novo. Santaella (2003) nos traz o caráter precursor da diversidade e complexidade dos fenômenos comunicacionais nos saltando aos olhos como fronteiras há muito tempo sendo preparadas para a sua reestruturação. Um novo comportamento se desenvolveu com o aparecimento das novas tecnologias segmentadoras, desde a fotocópia, que selecionava partes de um texo, o walkman, que permitia seleções pessoais de música, as subespecializações dos programas de rádio, o videocassete, a multiplicação dos canais de TV e sua segmentação. O crescimento da multiplicidade dessas mídias trouxe receptores mais receptivos e individualizados, precedendo o conceito prosumer de produtor, consumidor e principalmente tendo meios menos hegemônicos de divulgação.

3.2.1 Novas configurações corporativas e educacionais no contexto emergente do prosumer A relação entre organizações e seus públicos, brevemente introduzida no item anterior, foi alterada a partir do momento em que o consumidor deixou de ser passivo e passou a interferir nas ações e resultados das empresas. As informações disseminadas pela mídia comercial ainda exercem forte influência na sociedade, mas, desde que apropriadas por prosumers, são modificadas e tornam-se outros produtos e processos comunicacionais (JENKINS, 2009). E, se essa estética não é proposta ativamente pelas marcas, franquias e produtoras culturais, as próprias comunidades de conhecimento se encarregam dessa produção, conforme o autor explicita em suas análises em relação aos fãs da saga Stars Wars, que se preocuparam em reinventar narrativas para a série enquanto são ativamente estimulados ou desestimulados (por meio de restrições) pelos criadores e produtores da narrativa em suas mais diversas mídias; e pelas comunidades on-line que recriam, editam e gerenciam produções literárias relacionadas à história do bruxo “Harry Potter”. O caminho inverso, todavia, também passa a acontecer. Informações discutidas em comunidades organizadas por fãs, por exemplo, são incorporadas pela cultura predominante. Esse fluxo de baixo para cima é extremamente útil para a mídia de radiodifusão, por exemplo, uma vez que, com seu poder de amplificação, utilizam-se da diversificação de ideias presentes na cultura participativa e aumentam as chances de lucrarem com públicos até então inexplorados pelas organizações.

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Saad Corrêa (2003) ressalta que as empresas midiáticas, por terem sido por tantos anos dominantes como fontes de informação e acreditarem no desequilíbrio entre produtores e consumidores, ainda não conseguiram adaptar totalmente sua visão no relacionamento com os seus públicos. Além da instantaneidade, o tempo real e o acréscimo de um novo meio de distribuição (Web), as organizações terão de lidar com as seguintes características do ambiente: ■ ■ ■ ■ ■

Ruptura do predomínio do polo de emissão. Criação de canais de informação e conversação independentes das fontes formais. Alto grau de envolvimento e personalização por parte dos usuários. Alto grau de articulação coletiva. Facilidade de comunicação e expressão pela concentração, no mesmo ambiente digital, de ferramentas de produção de conteúdo e de preparação e diálogo. (SAAD CORRÊA, 2003, p. 250).

Adaptar-se a essas mudanças não é algo simples, pois passa por uma redefinição estratégico-estrutural-organizativa da empresa, tendo contato direto com alterações da cultura da organização. Precisa-se entender rapidamente que o domínio da informação não será retomado pela empresa e que, por consequência, produtos e serviços também sofrerão mudanças (SAAD CORRÊA, 2003; JENKINS, 2009). Nesse contexto, Walter Bender, diretor-executivo do MIT Media Lab, destaca a importância que a tecnologia teve para facilitar o acesso à informação e provocar mudanças na forma de conduzir e produzir, além de ressaltar que a maneira como cada organização irá se relacionar com esses novos públicos poderá definir o futuro de seus negócios: O papel dos consumidores já não é mais somente consumir. Suas expectativas mudaram. São eles agora parte do diálogo – estão engajados no tipo de discurso que antes ocorria muito além de sua esfera de ação. A mídia digital está longe de engendrar um mundo fragmentado, povoado por interesses próprios e míopes. Em vez disso está libertando em cada um de nós nosso desejo básico de compartilhar, que às vezes se traduz em compartilhamento de informação, de ideias políticas e sociais, ou de bens e serviços. O processo iniciou-se e de fato é uma mudança de paradigma: o consumidor está se tornando criador. Como os negócios reagem a esse novo nível de engajamento e dele se apropria é o desafio para a próxima década. (BENDER, 2003, p. 13)

Segundo Xie, Bagozzi e Troye (2008), os prosumers são pessoas bem informadas, em constante procura de conhecimentos e desenvolvimento de competências em todos os aspectos de interesse do seu dia a dia. Estão ativamente envolvidos na criação de valor e benefícios para seu próprio consumo. Conforme Piller et. al. (2005), os prosumers atuam como co-designers ou parceiros na criação de valor, uma vez que eles se apropriam de atividades e processos que

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costumavam ser de domínio exclusivo de empresas. Valendo-se das novas tecnologias, eles interagem e influenciam quem os rodeia, antecipando tendências (PILLER e outros 2005; XIE, BAGOZZI e TROYE, 2008). É válido ressaltar, portanto, que as exigências de interação dos prosumers precisam ser respeitadas, uma vez que é mais fácil que esses públicos procurem concorrentes que permitam sua participação do que se mantenham fiéis ao modelo antigo de centralização corporativa do conteúdo (SAAD, 2003; JENKINS, 2009). Para Henry Jenkins, esse entendimento do novo ambiente tecnológico em que está inserida é condição sine qua non para a sobrevivência da empresa: O público, que ganhou poder com as novas tecnologias e vem ocupando espaço na intersecção entre os velhos e os novos meios de comunicação, está exigindo o direito de participar intimamente da cultura. Produtores que não conseguirem fazer as pazes com a nova cultura participativa enfrentarão uma clientela declinante e a diminuição dos lucros. As contendas e as conciliações resultantes irão redefinir a cultura pública do futuro. (JENKINS, 2009, p. 53)

As empresas, apenas diante dessas condições, poderão se tornar lovemarks, organizações que adquirem “amor” e admiração de seus públicos, sendo defendidas arduamente nos momentos mais difíceis e recebendo sugestões de aperfeiçoamento quando estão em boa situação. Além de se adaptarem à cultura participativa, essas organizações também precisam buscar públicos mais passionais e propensos à mensagem corporativa. O uso da emoção para se aproximar das pessoas é frequente, uma vez que quase todo ser humano procura constantemente novas ideias, inspirações e experiências para fazer parte do coletivo. Quando se atinge o objetivo, as ameaças da participação do público são reduzidas e as empresas ganham fortes aliadas, até mesmo com ideias criativas para novos produtos e serviços, fortalecendo suas marcas e praticamente garantindo a sobrevivência (JENKINS, 2009). Porém, mesmo quando inserido em um contexto favorável, com criações coletivas e defensores da marca, adaptações são necessárias para o fortalecimento organizacional. Isso porque a Modernidade Líquida, já debatida no primeiro capítulo deste trabalho monográfico, faz com que a sociedade esteja inserida em um ambiente em contínua transição. O mundo corporativo, neste contexto, enfrenta um paradoxo: procura profissionais multifacetados, que se adaptem à diversidade de plataformas digitais, mas encontra “a falta de sintonia entre escolas, jovens e empresas” (SAAD CORRÊA, 2003).

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A formação dos profissionais torna-se, portanto, uma questão significativa a ser debatida. Dentre as hipóteses mais importantes para essa separação entre universidades e organizações estão: o engessamento causado pelo currículo mínimo definido pelo MEC para o desenvolvimento de cursos; as grades curriculares das Instituições de Ensino Superior (IES), que muitas vezes se baseiam apenas nos aspectos culturais internos da universidade, dificultando inovações; e a preocupação fundamental de IES em apenas atrair e manter estudantes até que concluam os cursos, sem se importarem com sua inserção no mercado. Isso provoca um distanciamento ainda maior entre universidades e empresas, que muitas vezes descrentes de soluções imediatas “[...] optam por criar seus próprios cursos de formação para suprir as ditas falhas do ensino formal” (SAAD CORRÊA, 2003, p. 202). Para melhorar o cenário supracitado, é válido retomar um estudo que alia a Teoria das Inteligências Múltiplas à Multimídia na Educação, em que Brasilina Passarelli (1995) retoma a ideia de Toffler (1980) sobre a sucessão de eras vivenciadas pelo homem, cujas características determinam seu futuro. Durante anos, na era (ou onda) agrícola, a vida e seus valores se davam em função da organização do alimento. Depois vieram a era industrial, seguida pela era da informação. Relacionando a educação às eras industrial e de informação, Passarelli (1995, p. 151) afirma: Enquanto na era industrial a ênfase está no produto, com a educação centrada no ensino do fato, na era da informação a ênfase se deslocou para a prestação de serviços, com a educação voltada para a formação de alunos capazes de construir sua própria aprendizagem.

A autora ainda enumera os atributos desse mundo das novas tecnologias de comunicação: interatividade, mobilidade, convertibilidade, interconectividade, globalização e velocidade, e afirma que a “escola” não pode se dar ao luxo de ignorar as profundas transformações que os meios e tecnologias de comunicação introduziram em nossa sociedade, criando novas maneiras de “apreender” e “aprender” o mundo. Segundo a pesquisadora, se a escola quiser sobreviver como “instituição geradora, mantenedora e delegadora do saber humano”, precisa digerir e incorporar a multiplicidade de pontos de vista e a riqueza de leituras que os novos meios e tecnologias trazem. Passarelli propõe que os novos paradigmas para a educação devem contemplar a preparação de alunos que possam conviver numa sociedade em constantes mudanças e se

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tornarem construtores do próprio conhecimento, “portanto, serem sujeitos ativos deste processo onde a "intuição" e a "descoberta" são elementos privilegiados desta construção.” (PASSARELLI, 1995, p. 153). Para tanto, o aluno deve ser visto como ser possuidor de diversas inteligências, não apenas a linguística e a lógico-matemática, mas também a espacial, a corporal, a musical, a interpessoal e a intrapessoal, que devem ser igualmente desenvolvidas, para que ele possa interagir com os novos meios e tecnologias e “aprender” o mundo por meio de múltiplos pontos de vista. Para citar dois cientistas da educação que tratam do tema, utilizou-se um artigo publicado no The Internacional Journal of Learning, em 2007, cujo objetivo é discutir o que são as novas mídias e quais são as mudanças sociais que as geraram na contemporaneidade. Os autores são Kalantzis e Cope, da universidade de Illinois. O trabalho deles, desde 1993, trata dos temas: multimodalidade ou multimídia, literacia, literacias e novas literacias. No artigo citado, os autores fazem um estudo comparativo com as mídias tradicionais ou antigas (old media), levando em consideração

quatro

dimensões:

agenciamento

ou

organização

(agency),

divergência

(divergence), multimodalidade ou multimídia (multimodality) e conceituação (conceptualisation). Após definir o que são as novas mídias, os autores buscam discutir quais seriam as aplicações das chamadas novas aprendizagens, novos modos de aprender, relacionando as quatro dimensões citadas anteriormente, em conjunto com as seguintes: designers, diferenças entre aprendizes (learner diferences), sinestesia (synaesthesia) e pedagogia (pedagogy). A pergunta básica que norteia o desenvolvimento do artigo é ‘O que é novo quando falamos em novas mídias e como elas podem fundar as novas aprendizagens?’. A princípio, os autores apresentam um argumento contrário as uso associado de novas mídias e educação. O argumento seria de que tal inclusão digital geraria exclusão social daquela parcela da população que não pudesse pagar por isso. Em seguida, contrapõem o argumento ao citar projetos como o One Laptop Per Child (laptop.org) e, além disso, argumentam que o telefone, quando surgiu como tecnologia, era também custoso e foi se democratizando com o tempo. Em seguida, apresentam a discussão comparativa entre mídias tradicionais e novas mídias. A primeira dimensão que as diferencia é o agenciamento ou a agência (tradução livre). Enquanto tradicionalmente a estrutura dos meios de massa como a televisão eram, por exemplo, novelas em que os espectadores acompanhavam a trajetória dos personagens em suas narrativas, hoje o que

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temos são os videogames em que os jogadores são os personagens centrais e eles têm o poder de influenciar o curso da história. Os autores chamam este fenômeno de Mudança no Equilíbrio do Agenciamento (Changing Balance of Agency) (KALANTZIS; COPE, 2006). Na era das mídias tradicionais, chefes chefiavam, líderes políticos lideravam, vida pessoal e vida em família poderiam ser julgadas de acordo com a normalidade. Com as novas mídias e com a mudança de um paradigma político (do capitalismo Vs. comunismo para o neoliberalismo), a responsabilidade passa a ser do indivíduo e do grupo ao qual ele pertence, não se pode mais contar com o Estado. Além disso, a diversidade ganhou espaço. Outro aspecto do agenciamento é a maneira de gerar significado ou de criar sentido (meaning making). Nas mídias tradicionais temos os auditórios, os leitores, os ouvintes, os espectadores. Temos de um lado os criadores de cultura e conhecimento e de outro os consumidores. Hoje temos usuários, temos co-designers das mídias; os consumidores são criadores e vice-versa. Temos, enfim, os prosumidores, ou prosumers em inglês. Ao tratar da segunda dimensão, os autores apontam a divergência. Tradicionalmente temos a homogeneidade (meios de massa, autores best-sellers, produção em larga escala). Contemporaneamente com as novas mídias, temos divergências (os comentários acerca de um vídeo no youtube podem ser os mais divergentes, o custo de produção de e-books é o mesmo para 1 e para 1 milhão). A terceira dimensão é a multimodalidade ou multimídia. Nas mídias antigas temos língua escrita, que se difere de som, que se difere de imagem. Nas novas mídias sabemos que os três são feitos da mesma substância: linguagem, já que todos comunicam. Podemos ler uma música, uma foto e um livro. Conceituação é a última dimensão comparativa. Antigamente, o usuário não precisava saber muito sobre a máquina (mecânica, informática e socioculturalmente). Hoje temos o usuário dominando as novas arquiteturas sociais e técnicas. A questão que introduz a discussão sobre o paralelo entre as novas aprendizagens e novas mídias é: As gerações do Nintendo, da web, dos vídeo games vão achar as salas de aula tradicionais estimulantes?

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A primeira dimensão trata de designers. No aprender antigo, temos um conhecimento definitivo: provas aplicadas em que se esperam respostas certas ou erradas. No novo aprender, temos as escolas como instituições produtoras de conhecimento em que aprendizes são tais produtores. Segunda dimensão: diferenças entre aprendizes. Na sala de aula tradicional temos o professor como centro das atenções, na frente da sala; uma prova no final do módulo; todos viram a página ao mesmo tempo. Em outras palavras, há homogeneização, separatismo e assimilação. Na nova aprendizagem, as diferenças são materiais, corporais e simbólicas. A realidade social globalizada é o pluralismo. Criar, produzir conhecimento torna-se reapropriação (revoicing) e não replicação. O terceiro ponto é a sinestesia, que se relaciona com a multimodalidade. Na escola tradicional, o conhecimento é dividido e compartimentado em diferentes disciplinas. Na nova escola, é proporcionada uma maior aproximação com a realidade de videogames, Internet e televisão (KRESS, 2000). Finalmente, a última dimensão das novas maneiras de aprender é a pedagogia. Enquanto tradicionalmente tínhamos uma aprendizagem experiencial que apresentava etapas como fazer, demonstrar, experimento e imersão; o que temos hoje é uma conceituação e um processo metacognitivo, mais poderoso porque os aprendizes são coconstrutores de conceitos, são definidores, são teóricos, críticos, analistas. A seguir expõem-se as dimensões das novas mídias e das novas aprendizagens relacionadas: Paralelos entre Novas Mídias e Novas Aprendizagens; Agenciamento ou Agência (Agency)

a

Designers;

Divergência

(Divergence)

a

Diferenças

entre

Aprendizes;

Multimodalidade à Sinestesia; e Conceitualização à Pedagogia. Acredita-se que, a partir dessas reflexões acerca da educação hoje e consequentes adaptações, seja possível atingir um processo de sinergia entre novas mídias, empresas, instituições de ensino superior, profissionais contratados e públicos que participam ativamente dessa relação (prosumers), o que poderia fortalecer o mundo corporativo e, simultaneamante, favorecer a formação de estudantes que serão inseridos no mercado.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Comunicação, instituições sociais e organizações são colocados à prova no processo de transição da modernidade para a pós-modernidade. A comunicação, os processos de mediação e de troca simbólica enfrentam profundas transformações na contemporaneidade. A sociedade em rede está dada (CASTELLS, 2003; CASTELLS, 2007), e as inquietudes e incertezas marcam o que Bauman (2001, 2003) chamada de modernidade líquida. Esse debate empreendido no capítulo 1 justifica o pano de fundo em que se constroem novas relações entre os atores em rede, e que possibilita uma revisão da clássica separação entre produtores e receptores de informação construída no contexto das rígidas instituições modernas. Além disso, é no contexto das mudanças contemporâneas em que novas identidades, comunidades e processos comunicacionais são gerados e permeados de fluidez é possível conceber emergência de um novo ator social de grande relevância para se compreender os fenômenos de uso e produção em rede: o prosumer. O capítulo 2 explicitou uma abordagem teórica em busca da reflexão sobre o entendimento acerca do processo de comunicação, partindo das teorias clássicas da Comunicação de Massa e o paradigma do modelo emissor-receptor. Na sequência, passa pelas transformações que emergem com o advento da Internet, o contexto do Ciberespaço e as Inovações Tecnológicas, ilustrando, assim, as mudanças da sociedade pós-moderna na ambiência informacional e as novas literacias que surgem em meio à interatividade e formação de redes. Ilustra-se assim, a convergência entre os novos consumidores e produtores. Para tanto, o capítulo recorre a autores como Marshall McLuhan (1979, 2009), Bruno Latour (2005), Manuel Castells (2003, 2007), Mauro Wolf (2005), Edgar Morin (2009), entre outros. Destaca-se a importância da leitura de obras da Profª. Drª. Brasilina Passarelli (1995, 2007, 2009 e 2013), bem como suas considerações em sala de aula sobre temas que tanto contribuíram para a elaboração deste capítulo. Sob esse aspecto, cada autor citado no presente trabalho foi objeto de leituras e pesquisas, bem como de discussões do grupo de pesquisa, e deram embasamento teórico ao texto. Edgar Morin (2000), pensador francês, avaliou a colonização “da alma humana”, debatendo o modo como a vida privada entra no circuito comercial e industrial. Que a cultura de massa desenvolvese junto à cultura humanista, a cultura nacional, a cultura religiosa, e é verdadeira cultura do século XX, e inseriria os problemas da primeira cultura universal da história da humanidade. O

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visionário McLuhan (1979) apontou os meios de Comunicação como Extensões do Homem e desenvolve a máxima “O meio é a mensagem”. Seu legado foi deixado na publicação de várias obras, as quais revelaram teorias e conceitos muitas vezes pioneiros. Além disso, Barros Filho (1995) trata do conceito de agenda setting, afirmando que se trata de uma das formas possíveis de incidência da mídia sobre o público. Sob a influência e inspiração da biologia do sistema nervoso, o matemático Claude Eldwood Shannon, em um artigo publicado em 1948, e com posterior publicação em livro, propôs a Teoria Matemática da Comunicação, sendo considerado o pai da Teoria da Informação. Suas contribuições auxiliaram diversas áreas da comunicação. A teoria matemática da comunicação de Shannon-Weaver é basicamente sobre a transmissão ideal das mensagens. A transferência de informação efetua-se da fonte para o destinatário, enquanto a transferência da energia vetorial ocorre do transmissor ao receptor. A consideração a respeito desses autores teve a ver com as leituras realizadas ao longo das aulas e a busca pelas obras que mais respondessem ao objetivo principal de realizar um levantamento do termo prosumer na produção acadêmica recente, para identificar suas origens e utilização atual. Seguindo essa linha de raciocínio, ao longo do capítulo procuramos delinear o avanço inegável que a criação das inovações tecnológicas trouxe à vida do homem atual e identificar a transformação nos processos comunicativos; tal como visto por meio da leitura de obras de autores como Castells (2003, 2007), a Internet representou o primeiro meio de comunicação da história da sociedade contemporânea desenvolvido em múltiplas camadas, descentralizado e em escala global, o que permitiu que muitos se comunicassem com muitos, modificando a rotina e os paradigmas até então estabelecidos. A exposição das novas formas de interação social que se constroem com a criação e uso da Internet revela a transformação da sociedade, principalmente sob o ponto de vista das relações entre a sociedade civil e o Estado, levando-nos a repensar a política para uso da rede de computadores. Ainda, podemos observar que a partir da convergência das mídias e da cultura participativa, temos o nascimento de indivíduos frutos da sociedade em rede. Esses indivíduos se destacam pelo uso e a influência nas redes, tendo como papel principal a produção e o consumo dos conteúdos adaptados para Internet.

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Por fim, é possível considerar o quão significativas são as alterações que as tecnologias de comunicação trouxeram à sociedade contemporânea. Um exemplo dessas transformações encontra-se na última parte do segundo capítulo, que aprofunda a convergência das mídias e o surgimento das redes sociais - fator que acaba por proporcionar diversas potencialidades e experiências diferenciadas em um processo de comunicação em constante reconfiguração. E mesmo com toda sua audácia visionária, dificilmente pode-se creditar que McLuhan seria capaz de prever em sua totalidade a revolução sem nome que a tecnologia elétrica traria para o paradigma de emissão e recepção. Toffler (1980), já na década de 80, também se arriscou ao cunhar o termo que o presente trabalho se esforça em entender em seus mais diversos desdobramentos e sob o qual o terceiro capítulo se debruça: o prosumer. Esse autor dá ao termo a força das propriedades produtivas de fato, que datam desde a sociedade agrícola, e que seriam ciclicamente retomadas, agora, na revolução da informação, com o consumidor novamente, porém em outros âmbitos, retomando sua capacidade de produção. Entretanto, mais do que isso – e na dimensão focada no presente trabalho –, Toffler traz à tona o fato de que os consumidores estão ativamente envolvidos na criação de valor e benefícios para seu próprio consumo. Tal visão alinha-se, conforme citado, com a perspectiva pós-modernista de que o consumidor é um participante da personalização de seu próprio mundo, agindo e determinando os significados e as funções dos objetos, baseado no seu sistema simbólico (FIRAT; DHOLAKIA, 2006). A definição de prosumption como as atividades de criação de valor realizadas pelo consumidor que resultam na elaboração de produtos que eles eventualmente consomem e que constituem suas experiências de consumo encontra eco em outros autores, como Xie, Bagozzi e Troye (2008). Alinhado a esse conceito emergente, atrela-se a análise de que uma literacia é necessária para que o prosumption se concretize nesse novo contexto. Tapscott fala sobre a emergência de um novo cérebro (2010, p. 122) que seja capaz de buscar, produzir, remixar e atualizar as informações nessa imersão tecnológica. Entre as suas “normas para a geração internet”, destacam-se aqui as que ele chama de “escrutínio” - a checagem de informações - e “integridade” - lealdade e transparência - normas necessárias para as novas e novíssimas gerações, mas que compreendem uma literacia que vai além da pura imersão e do entretenimento – outra norma destacada pelo autor.

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Nesse aspecto, Islas-Carmona (2008) apresenta o prosumer inserido na “sociedade da ubiquidade”, aquela em que a comunicação é para todos, em qualquer momento e em qualquer lugar, conforme citado. A “sociedade da ubiquidade” envolve um uso expressivo das comunicações digitais móveis para garantir o acesso de qualquer pessoa, em qualquer momento e em qualquer lugar a uma ampla gama de informações. Dessa forma, pressupõe-se que, para tornar-se prosumer, é preciso que os indivíduos estejam aportados dessas novas literacias: uma emergência não se concretiza, portanto, sem a outra. Em obra recente sobre mass colaboration, Don Tapscott e Anthony D. Williams adicionam mais uma característica relevante para o conceito emergente de prosumer, ressaltando que, no modelo de prosumption, os consumidores/clientes participam da criação de produtos de forma ativa e contínua. Esse novo player dos processos em rede não se contenta com a customização, mas pode estar apto e desejoso de criar seus próprios produtos (TAPSCOTT & WILLIAMS, 2007, p. 126). Dos outros termos pesquisados para o fenômeno emergente de transformação do modelo emissor-receptor, a análise feita por Axel Bruns (2008b) chamou a atenção do grupo de autores do presente trabalho. O autor prefere diferenciar o prosumer, que ele define como um consumidor profissional, do que conceitua como produser: a figura responsável por dialogar com outras pessoas, além de fazer comentários, avaliações e recomendações; participante do processo de produsage (produção) e dependente de comunidades livres para exercer sua função em criações coletivas. O foco desse player, conforme citado, seriam os interesses coletivos em detrimento do interesse corporativo de consumo (BRUNS, 2008a, p. 3). Apesar de julgar importante a diferenciação feita pelo autor, o grupo responsável pela presente monografia optou pela escolha de seguir com o termo prosumer devido à sua maior incidência e investigação por parte de um grande aporte de autores, que ampliam, cada vez mais, o debate em torno do conceito. Chegou-se à conclusão, também, de que a distinção entre o uso dos termos prosumer e produser não se baseia totalmente entre uma figura que produz de acordo com uma relação profissional e interesses corporativos, e outra que tem como foco o interesse coletivo. Ainda levando em consideração que a sociedade da Modernidade Líquida está inserida em um ambiente de contínua transição e que, segundo Tapscott (2010, p. 155-156), a capacidade

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de aprender é mais importante do que nunca, é importante apontar que o mundo corporativo e a escola muitas vezes têm experimentado um descompasso, pois o primeiro procura profissionais multifacetados e adaptados à diversidade do mundo digital, e a segunda não garante a formação de tais profissionais. Recordando Brasilina Passarelli (1955, p. 151), a escola não pode ignorar as transformações, a multiplicidade de pontos de vista e leituras que as tecnologias digitais introduziram em nossa sociedade, especialmente na maneira como aprendemos e construímos conhecimento. Se os novos paradigmas para a educação não contemplarem propostas que possibilitem aos estudantes conviver com mudanças constantes e construir seu próprio conhecimento, a escola corre o risco de não sobreviver como “instituição geradora, mantenedora e delegadora do saber humano” (PASSARELLI, 1995, p. 152). Algumas reflexões a respeito da educação na atualidade e as possíveis adaptações pelas quais ela deveria passar estão presentes em Kalantzis e Cope (2006), segundo os quais o novo aprender, na realidade social globalizada do pluralismo e da divergência, conta com escolas em que os aprendizes (ou designers) produzem o conhecimento, reapropriando-se dele e não replicando-o, numa coconstrução teórica, crítica e analítica de conceitos. Na nova escola, conforme a visão desses estudiosos, haveria sinestesia, uma aproximação com a ‘realidade’ da televisão, do vídeo, dos games e da internet. É bastante provável que essa escola como comunidade plural de produção do conhecimento contribuísse significativamente para que se atingisse um processo de sinergia entre novas mídias, instituições de ensino, mundo corporativo e públicos que participam ativamente dessa relação, os prosumers.

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