A Espanha ingovernável?

June 14, 2017 | Autor: João Pedro Dias | Categoria: Eleições, Espanha, Eleiçoes Legislativas
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A Espanha ingovernável? João Pedro Simões Dias - 2015.12.22

As eleições legislativas que decorreram no passado domingo em Espanha confirmaram os piores receios e as piores expectativas de quem segue atentamente a evolução política no país vizinho. Quem ganhou, ganhou por menos do que estava à espera; quem perdeu, perdeu por mais do que contava. E nem será desajustado constatar que quem ganhou, quem teve mais votos, até foi quem mais votos perdeu. Algo que, para nós portugueses, não é completamente estranho e desconhecido. Isso e as consequências disso... Em Espanha, todavia, o Partido Popular (122 deputados) de Mariano Rajoy logrou ser o partido mais votado apesar de conseguir resultados só comparáveis aos obtidos na década de oitenta; o PSOE, de Pedro Sanchez, ficou em segundo lugar mas obteve o seu pior resultado eleitoral de sempre (91); o Podemos (69), de Pablo Iglesias, firmou-se no terceiro lugar e, verdadeiramente, foi a única força política que pôde cantar vitória; finalmente, o Cidadãos (40), de Alberto Rivera, dado como candidato a governar, ficou muito aquém das expectativas não indo além do quarto lugar. Em termos simples, o bipartidarismo terminou e o multipluralismo começa a instalar-se – com todos os seus desafios, todas as suas complexidades, todas as suas exigências. Esta profunda alteração do quadro partidário reconduz Espanha para uma situação de quase ingovernabilidade. O Partido Popular, se aspirar a governar em maioria, apenas o pode fazer no quadro de uma grande coligação com o PSOE (213 deputados) – solução que ambos já rejeitaram. A aliança natural com o Ci-

dadãos é insuscetível de gerar uma maioria parlamentar (162 deputados em 176 necessários). O PSOE, se pretender formar governo, apenas o pode fazer com o apoio do Podemos (160 deputados) e de, pelo menos, mais dois ou três partidos, incluindo a Esquerda Comunista e a Esquerda Republicana da Catalunha. A coligação do PSOE com o Podemos e o Cidadãos, garantindo uma maioria absoluta de deputados nas Cortes de Madrid (200 deputados) parece excluída pelas sucessivas declarações de Alberto Rivera, incluindo as proferidas na própria noite eleitoral. Conforme se constata destas pequenas simulações, as soluções possíveis não são de fácil negociação, sobretudo num país habituado a um sistema bipartidário em que, por regra, quem vencia as eleições alcançava uma maioria absoluta ou ficava dela tão perto que a conseguia alcançar com acordos com pequenos partidos nacionalistas ou regionalistas. Desta feita, esse quadro político-parlamentar alterouse por completo, exigindo o aprofundamento à última essência de uma cultura de “pactos” que os espanhóis tanto têm cultivado, ainda que não para a construção de soluções governativas mas para aprovação de legislação especial, nomeadamente antiterrorista. Sob pena de termos (mais um) dos grandes países da União Europeia mergulhado numa profunda crise de governabilidade – ou de ingovernabilidade – donde dificilmente se vislumbra como poderá sair. Curiosamente, e como já aqui deixámos nota na passada semana, à semelhança do ocorrido durante os últimos dias da campanha eleitoral, nunca a “solução portuguesa” foi tão invocada como nos debates televisivos que iam acompanhando o surgimento dos resultados definitivos e se ia ganhando a consciência da dificuldade que existirá em construir uma solução governativa sólida e estável. Arriscamo-nos, todavia, a antecipar que será muito mais difícil em Madrid do que foi 2

em Lisboa construir uma “solução Costa”. Basta atentar na repartição dos mandatos, no número de partidos necessários à formação de uma maioria parlamentar, às suas diferenças ideológicas mas, também e sobretudo, à visão que têm sobre esse problema maior com que Espanha se debate e defronta que é o da sua unidade e o das aspirações nacionalistas e secessionistas que, sobretudo na Catalunha, estão fortemente presentes e mobilizadas. Encerrado, do ponto de vista político, este ano eleitoral de 2015, constata-se que na Grécia, em Portugal e em Espanha – em três países resgatados financeiramente – os respetivos centro-direita foram reduzidos a resultados que constituem os seus mínimos históricos. Paralelamente, as respetivas esquerdas radicais foram projetadas para os seus máximos históricos. Curiosamente, os respetivos centroesquerda foram, praticamente, erradicados do mapa da relevância política e parlamentar – e os governos de centro-direita não deram lugar a governos de centro-esquerda, como se poderia esperar, mas a verdadeiros governos de esquerda, dependentes de partidos radicais, fenómenos novos emergentes de movimentos populares e de rua. Post-scriptum: para os nossos leitores, que semanalmente nos acompanham nestas crónicas de análise e reflexão sobre a situação política internacional em geral e europeia em particular, votos de um Santo e Feliz Natal e de um Ano Novo de 2016 cheio de sucessos pessoais e profissionais. Num mundo de paz, de compreensão e de fraternidade. Voltaremos no próximo ano, se Deus quiser.

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