A Estrutura Narrativa dos Quadrinhos de Ação

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UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA CURSO DE LETRAS LICENCIATURA EM LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURAS

NAOTTO ROCHA

A ESTRUTURA NARRATIVA DOS QUADRINHOS DE AÇÃO

RIO DE JANEIRO 2014

Naotto Rocha

A estrutura narrativa dos quadrinhos de ação

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Letras da Universidade Veiga de Almeida, como requisito obrigatório e necessário para a obtenção do título de Licenciatura em Letras Português/Literaturas, sob orientação do Professor Cimélio Senna.

RIO DE JANEIRO 2014

ROCHA, Naotto. A estrutura narrativa dos quadrinhos de ação. Rio de Janeiro: Universidade Veiga de Almeida, 2014. 69 páginas. Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Letras da Universidade Veiga de Almeida, como requisito obrigatório e necessário para a obtenção do título de Licenciatura em Letras Português/Literaturas, sob orientação do Professor Cimélio Senna.

Banca Examinadora:

________________________________________ Prof. Dr. Cimélio Senna – Orientador

________________________________________ Prof. Ozanir Roberti – UVA

________________________________________ Prof.ª Cristina Varandas – UVA

Apresentada em 06/06/2014 Conceito: ______________

Aos meus pais, que sempre me incentivaram a ler e contribuíram para que eu pudesse continuar lendo através de todos esses anos.

As velhas regras estão desmoronando e ninguém sabe quais são as novas. Então criem suas próprias regras. - Neil Gaiman

RESUMO Este trabalho tem como proposta analisar os elementos narrativos constitutivos das histórias em quadrinhos de ação, visando estabelecer algumas características do gênero enquanto uma ficção narrativa. Para isso, serão apresentadas e estudadas as características da arte sequencial, uma linguagem resultante da união entre artes plásticas e literatura, no que se refere a seus componentes narrativos e sua estruturação própria. Também será estabelecido um paralelo da disposição de suas células dramáticas com a disposição dessas células nas modalidades da narrativa situando os quadrinhos de ação entre a novela e o romance. Por fim, será proposto um paralelo estrutural com a jornada do herói estabelecida por Joseph Campbell tanto nos pequenos arcos narrativos quanto em toda a grande história pensada pelo autor previamente. Para esta análise, o material utilizado será a primeira fase de Brian Michael Bendis à frente da franquia Os Vingadores da Marvel Comics que foi publicada de 2004 a 2010 pela editora estadunidense. Palavras-chave: Narratologia; Histórias em quadrinhos; Os Vingadores.

ABSTRACT This research has the proposal of analyzing the narrative elements of action comic books story, establishing some characteristics of the genre as a narrative fiction. To do so, characteristics of sequential art, a language resulting from the union of art and literature, will be presented and studied regarding its components and its own narrative structure. It will also be made a parallel with its dramatic cells organization of these cells in terms of literature narrative establishing the action comics between the soap opera and the novel. Finally, it proposes a structural parallel with the Joseph Campbell’s hero's journey in the small narrative arcs and in all great story by the author previously planned. For this analysis, it will be used as corpus, the first phase of Brian Michael Bendis’s The Avengers, from Marvel Comics that was published from 2004 up to 2010. Palavras-chave: Narratology; Comic books; The Avengers.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 10 1

Quadrinhos enquanto produto cultural da contemporaneidade ................... 11

2

As histórias em quadrinhos enquanto gênero ............................................. 15

2.1

A questão do gênero .................................................................................... 15

2.2

A narrativa ................................................................................................... 16

2.2.1

Elementos da narrativa ................................................................................ 17

2.2.1.1 Personagens ............................................................................................... 17 2.2.1.2 Espaço ......................................................................................................... 18 2.2.1.3 Tempo ......................................................................................................... 18 2.3

Quadrinhos de ação: entre a novela e o romance ....................................... 19

2.3.1

Células dramáticas e as modalidades da narrativa ..................................... 19

2.3.1.1 O conto ........................................................................................................ 19 2.3.1.2 A novela ....................................................................................................... 19 2.3.1.3 O romance ................................................................................................... 20 2.3.2

A estruturação dos quadrinhos de ação ...................................................... 21

2.4

A linguagem das histórias em quadrinhos ................................................... 24

2.4.1

Arte sequencial e timing .............................................................................. 24

2.4.2

Artes plásticas ............................................................................................. 27

3

A tripartição da fábula e o monomito ........................................................... 29

3.1

A jornada do herói ....................................................................................... 30

3.2

O caminho do herói moderno ...................................................................... 33

4

A reestruturação da franquia Os Vingadores por Brian M. Bendis .............. 34

4.1

Objetivos da análise .................................................................................... 34

4.2

A queda e o triunfo: years in the making ..................................................... 34

4.2.1

O pior dia dos Vingadores ........................................................................... 34

4.2.2

Guerra secreta ............................................................................................. 37

4.2.3

Os Novos Vingadores .................................................................................. 39

4.2.3.1 A reunião ..................................................................................................... 39 4.2.3.2 Dinastia M .................................................................................................... 41 4.2.3.3 O Coletivo .................................................................................................... 42 4.2.4

Guerra civil .................................................................................................. 43

4.2.4.1 Clandestinos ................................................................................................ 45 4.2.4.2 Infiltrados ..................................................................................................... 46 4.2.5

Os Illuminatis ............................................................................................... 47

4.2.6

Invasão secreta ........................................................................................... 47

4.2.6.1 Detalhes da invasão .................................................................................... 49 4.2.6.2 A queda de Tony Stark ................................................................................ 50 4.2.6.3 O retorno de Nick Fury ................................................................................ 51 4.2.6.4 O triunfo de Norman Osborn ....................................................................... 53 4.2.7

Reinado sombrio .......................................................................................... 55

4.2.8

O cerco ........................................................................................................ 58

4.2.8.1 Acertos de contas ........................................................................................ 61 4.2.8.2 O triunfo ....................................................................................................... 63 4.2.9

Epílogo: a era heroica .................................................................................. 64

4.3

A jornada dos Vingadores ........................................................................... 64

5

CONCLUSÃO .............................................................................................. 66

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 67

INTRODUÇÃO

Cada vez mais as histórias em quadrinhos fazem parte do cotidiano contemporâneo. Seja conquistando crianças e adolescente e ajudando a formar novos leitores, seja através de seus icônicos personagens que já fazem parte de nosso imaginário popular ou até mesmo através dos inúmeros filmes derivados que saem todo ano, os quadrinhos já fazem parte da vida pós-moderna. Sendo assim, nada é mais natural e necessário do que estudar esse subgênero narrativo tão pouco citado nas cadeiras acadêmicas. O objetivo deste trabalho é analisar os elementos constitutivos das histórias em quadrinhos de ação, visando estabelecer algumas características a fim de inserilas no campo dos estudos da narrativa. Serão apresentados também vários conceitos da narratologia para que possamos tentar entender como os quadrinhos de ação se encaixam nos estudos literários. Primeiramente, será investigada a origem das histórias em quadrinhos e como elas se tornaram um produto cultural da contemporaneidade. Em seguida, apresentamos a questão do gênero e para que possamos entrar no campo dos estudos da narrativa. Utilizando os conceitos de D'Onófrio, Proença Filho e Soares, serão estabelecidos os elementos da narrativa e o conceito de célula dramática que caracterizam as diferentes modalidades narrativas. Assim, será possível analisar as células dramáticas das histórias em quadrinhos além de estudar sua estruturação enquanto narrativa ficcional. Também serão investigados alguns conceitos de Eisner sobre arte sequencial e a relação dos quadrinhos com as artes plásticas. Por último, serão apresentados a jornada do herói de Campbell e os conceitos de monomito. Durante a análise, será feito um grande resumo da trama construída por Brian Michael Bendis em sua primeira fase na franquia Os Vingadores para, logo em seguida, ser aplicado os conceitos de célula dramática, modalidades narrativas e da jornada do herói. Por fim, tentaremos entender como esse subgênero que existe há décadas e, além disso, é intrínseco a nosso cotidiano sobrevive no mercado editorial com suas constantes táticas para renovação e conquista de novos leitores.

10

1

QUADRINHOS

ENQUANTO

PRODUTO

CULTURAL

DA

CONTEMPORANEIDADE

Determinar exatamente a primeira manifestação de um estilo narrativo específico é sempre complicado e pouco preciso, principalmente se esse estilo vem se desenvolvendo desde os primórdios da humanidade. Sendo assim, considera-se que as histórias em quadrinhos tenham duas origens distintas. Delimitando o termo simplesmente como uma narrativa composta de artes sequenciais, suas origens datam da pré-história quando os hominídeos pintavam paredes de cavernas com cenas que ilustravam ações de seu cotidiano. Mas as histórias em quadrinhos modernas, tais como conhecemos hoje, começaram a surgir por toda a Europa durante o século XIX e ganharam força somente nos últimos anos do mesmo século nos Estados Unidos. [...] Nada, muito menos uma nova linguagem pode ter brotado, assim, de repente, como cogumelo, acabada, com todos os elementos da técnica e do código narrativo da história em quadrinhos perfeitamente estruturados. [...] Desde quando os homens deixaram a marca da palma de suas mãos nas paredes das cavernas e se puseram a traçar com o dedo figuras e entrelaçados, testemunho do seu poder criador, descobriram, deslumbrados, que podiam contar histórias com imagens. Os quadrinhos se fizeram devagar e desde sempre, dependendo dos instrumentos disponíveis em cada época. (CAGNIN, 1996, p. 31)

Assim, aceita-se, por convenção, que a primeira história em quadrinhos moderna seja Yellow Kid publicada em 1895. Segundo Cagnin (1996), a criação de Richard Outcault curiosamente não chegava a contar uma história única em vários episódios, sendo mais um tipo de anedota ou uma charge, e nem mesmo a ter quadros iconográficos em sequência. Enquanto o gênero ainda se desenvolvia, Outcault utilizava, inicialmente, a camisolona suja do personagem principal como suporte para as falas e textos da única imagem que compunha a obra. Yellow Kid nada mais era do que um cartum se metamorfoseando em uma história em quadrinho. Do exposto ainda, fica claro que o Moleque Amarelo não foi e nem pode ser o primeiro dos comic strips, muito menos a primeira história em quadrinhos do mundo, porque, em 1895, o Moleque Amarelo nem era história, mas uma simples grande cena; nem era quadrinhos, mas um grande cartum, nem era strip, nem tinha balões e nem mesmo era amarelo. (CAGNIN, 1996, p.30)

11

Figura 1 – Yellow Kid 1 Fonte: Grand Lodge of British Columbia and Yukon.

Não é possível precisar a primeira manifestação impressa do gênero, mas Yellow Kid destaca-se por ter sido a primeira história em quadrinho que alcançou o sucesso empresarial. Foi a partir de então que quadrinhos começaram a impulsionar as vendas dos jornais. Os periódicos se abarrotaram cada vez mais com o gênero que era publicado como tiras diárias ou dominicais, e, por fim, copilados nos comic books. Curiosamente, quase trinta antes, publicava-se no Brasil a primeira história em quadrinhos do país, considerada por alguns como uma das precursoras das graphic novels de que se tem notícia no mundo. Em 1869, Ângelo Agostini publicava As Aventuras de Nhô Quim na revista Vida Fluminense. Agostini foi um dos primeiros

a

contar uma

história

ilustrada

sequencial em

capítulos,

com

enquadramentos cinematográficos e utilizando cliffhangers, os ganchos narrativos, ao final de cada edição (AUGUSTO, 2008, p. 93). Desde então, uma infinidade de subgêneros foi surgindo e se consolidando cada qual em seu estilo. Hoje, as histórias em quadrinhos são utilizadas nas mais variadas formas e meios e para os mais diversos públicos. 1

Disponível em . Acessado em abr. 2014.

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Nos grandes jornais e revistas de variedades costuma-se publicar as tirinhas. Periódicas e de poucos quadros, elas têm um caráter humorístico e satírico que podem ou não transmitir uma mensagem de caráter opinativo (NICOLAU, 2013, p. 13). Esse gênero conta com narrativas infantis e adultas ou até mesmo uma síntese dessas duas. Como exemplo, podemos citar uma das tirinhas mais famosas do mundo que é Calvin e Haroldo, de Bill Watterson, que trata muitas vezes de problemas políticos e sociais, mas sob o olhar de uma criança de seis anos de idade. Uma nova tendência para esse gênero são as webtiras – tirinhas publicadas direta e exclusivamente em sites especializados ou em blogs pessoais. Podemos ver também uma manifestação do gênero em cartilhas instrutivas e em informes publicitários. Os próprios storyboards, tanto cinematográficos quanto de filmes publicitários, são feitos de imagens sequenciais para que se tenha uma visualização prévia da história a ser filmada. Adaptações de livros, filmes e contos para histórias em quadrinhos também estão em alta nos dias de hoje. A presença das imagens constitui uma técnica narrativa mais dinâmica ajudando a assimilação por parte dos jovens e aumentando o seu interesse. Em uma entrevista para a Folha de São Paulo (2012), uma jovem de 16 anos afirma preferir a versão em quadrinhos de Dom Casmurro do que a original de Machado de Assis. Segundo ela, a obra original "[Era] prolixo, várias páginas para dizer apenas uma coisa. Fica perfeito em quadrinhos, sem tantos detalhes que atrapalham a leitura”.2 Porém, o maior e mais famoso subgênero é o de histórias em quadrinhos de ação, os chamados gibis de super-heróis, que são o foco deste estudo. Os quadrinhos de ação têm suas características próprias, tanto no nível narrativo, quanto ao nível de planejamento do enredo. Enquanto produto cultural, eles dependem da crítica – tanto especializada quanto a de público – e dos números de venda de cada revista para avaliar a posição desses títulos no mercado e mudar ou estabelecer novos rumos para o enredo. Mas como é possível planejar roteiros integrados tão antecipadamente e quem são os autores dessas histórias? Os quadrinhos de heróis nunca foram uma narrativa completamente autoral. Dividem-se os méritos entre autores e artistas e ninguém nunca é completamente dono de uma história ou personagem – sempre há e sempre haverá uma 2

Disponível em: Acesso em abr. 2014.

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rotatividade entre editores e equipes criativas. Essa troca se deve por inúmeros motivos como mudanças do tom narrativo, divergências criativas, relançamentos de títulos para alavancar as vendas, revezamento de artistas para que a revista saia no prazo ou até mesmo o fim da história planejada pelo autor. Mas para que tudo ocorra em ordem e atenda as demandas do mercado, os editores são quem coordenam e orientam as histórias e a continuidade do enredo. São os editores que, juntamente com os escritores, decidem o rumo que a história vai tomar nos próximos meses ou anos e o que pode ou não ser feito com os personagens. De acordo com Howe: Em 2004, a Marvel estava empregando análise estatística para alimentar informações sobre performance de autores e personagens em algoritmos que pudesse determinar lançamento, cancelamentos e frequência de publicação. [...] As histórias eram concebidas em “cúpulas de escritores”, conferências periódicas no qual o núcleo central de roteiristas (incluindo veteranos de Hollywood [...]) reunia-se com os editores e martelavam os seus meses seguintes da estratégia editorial, uma versão dos quadrinhos para a sala de roteiro das séries de TV. O nível de profissionalismo era alto, 3 com atenção especial ao escalar de cada trama proposta .

Nos últimos anos, as adaptações cinematográficas também têm gerado mudanças sutis nas revistas para que o público dos filmes não sinta tanta a diferença da história da película para a dos quadrinhos (HOWE, 2013, p. 451). Os quadrinhos de super-heróis são literaturas de massa que se curvam à demanda e às necessidades do mercado. É impossível determinar quando o gênero vai renovar o estilo mantendo-se fiel às suas estruturas e preceitos anteriormente estabelecidos para se distanciarem de suas versões cinematográficas. De fato a linha que separa cinema e quadrinhos fica mais tênue a cada ano pedindo uma renovação. Grant Morrison, autor renomado que já passou por diversos títulos incluindo X-Men afirma: “[...] ‘Como os filmes já estavam reproduzindo tão bem os gibis, não havia mais por que fazer gibis como se fossem filmes. Vamos pirar mais... para que sejam os efeitos especiais que tenham de nos alcançar’4”. Podemos inferir então que os quadrinhos de ação, antes somente um escapismo e diversão para o seu público, hoje servem como laboratório para novos estilos narrativos fazendo com que textos e imagens, o verbal e o não verbal, se mesclem das mais variadas formas até que se transformem em uma só experiência, sendo ao mesmo tempo arte e produto.

3 4

HOWE, 2013, p.443. ______, 2013, p.441.

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2 AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS ENQUANTO GÊNERO

2.1 A QUESTÃO DO GÊNERO A problemática dos gêneros literários é a discussão mais antiga e frequente dentro do campo da teoria literária. Estudada primeiramente por Platão no livro III de A República, o autor propõe as seguintes diferenciações aos gêneros literários: o ditirambo, a poesia épica e a tragédia ou comédia. Essa divisão é conhecida atualmente como os gêneros lírico, épico e dramático. A questão foi abolida pelo próprio Platão no volume X de A República, mas seu discípulo Aristóteles continuou a estudar e a estabelecer diferenciações dos estilos em sua Poética. Souza destaca que “a classificação da literatura em gêneros, como toda classificação, é feita a partir de determinados critérios ou pontos de referência5”. Porém, para Proença Filho (2007, p.70) a problemática dessa classificação começa na delimitação da área semântica abrangida pelo termo gênero que ora se refere às três grandes divisões – lírica, épica e dramática – ora se refere a manifestações literárias como a tragédia, comédia, romance, conto entre outras. Ainda segundo Proença Filho, o poeta Horácio ao levar para Roma as teorias gregas propôs uma rigorosa separação dos gêneros que não permitia apresentar elementos de um gênero em outro. Essa teoria predominou na literatura ocidental durante os séculos XVI, XVII e XVIII e boa parte do século XIX. Tal posição só mudaria durante o século XIX onde se destacou a liberdade e o ecletismo. Proença Filho determina então que os estudos sobre a matéria se envolvem em duas teorias: A teoria clássica que considera os gêneros a partir de critérios rígidos, como entidades nitidamente caracterizadas em sua estrutura: estabelece normas (embora não tão autoritárias como à primeira vista se poderia supor), preconiza uma diferença entre os diversos gêneros em termos de natureza e hierarquia e determina sua separação. A teoria moderna que se vale de critério aberto, admitindo os gêneros como realidades dinâmicas que possibilitam mudanças, variações e imbricações. É descritiva e não narrativa. (PROENÇA FILHO, 2007, p. 73.)

Ainda hoje, teóricos da área discutem essa problemática, principalmente no que se refere às características literárias contemporâneas. Para nós, pós-modernos, tais características ainda são incertas e a única certeza que temos é que não há

5

SOUZA, 1999, p.15.

15

uma tendência predominante e que prezamos pela mescla de gêneros e estilos em uma só obra, como afirma Santos: Entendamos ainda que o pós-modernismo é um ecletismo, isto é, mistura várias tendências e estilos sob o mesmo nome. Ele não tem unidade; é aberto, plural e muda de aspecto se passamos da tecnociência para as artes plásticas, da sociedade para a filosofia. Inacabado, sem definição precisa, eis por que as melhores cabeças estão se batendo para saber se a “condição pós-moderna” – mescla de purpurina com circuito integrado – é decadência fatal ou renascimento hesitante, agonia ou êxtase. [...] Para dor dos corações dogmáticos, o pós-modernismo por enquanto flutua no indecidível. (SANTOS, 2012, p.19.)

2.2 A NARRATIVA A narrativa ficcional é uma manifestação literária em prosa que se caracteriza por histórias fictícias e simuladas, nascidas diretamente da imaginação do autor. D’Onófrio descreve a literatura como “uma criadora de seu próprio universo, semanticamente autônomo em relação ao mundo em que vive o autor6”, ou seja, um universo com suas próprias regras concedidas através da liberdade criativa de seu inventor. Na ficção, a verossimilhança externa, aquela que responde às regras do mundo real, pode ser quebrada a qualquer instante o que lhe permite a entrada no gênero fantástico, juntando uma explicação natural e uma explicação sobrenatural aos fatos narrados. O mais importante é que a obra literária mantenha uma verossimilhança interna atribuída pela coerência de seus elementos estruturais. Proença Filho considera a narrativa ficcional como “uma amálgama de ação e narração, que estabelece o enredo narrativo caracterizando uma sequência simples ou complexa de conflitos ou tensões que se resolvem ou não7”. A ação se situa no nível da trama e envolve o que ocorre com os personagens, o conjunto de seus atos ou reações. O desenvolvimento do enredo, caracterizado pela sucessão de fatos ou acontecimentos, leva ao desaparecimento das situações conflitantes ou à criação de novos conflitos. Existem três níveis de análise do texto no plano do enunciado: o nível fabular, que corresponde ao estudo da história ficcional na sua ordem cronológica e estética; o nível atorial que corresponde às personagens; e o nível descritivo que corresponde às categorias do tempo e do espaço8.

6

D’ONÓFRIO, 2007, p.22. PROENÇA FILHO, 2007, p. 56. 8 D’ONÓFRIO, 2007, p. 56. 7

16

Neste capítulo, serão analisados somente os níveis atorial e descritivo, deixando o nível fabular para a próxima unidade. 2.2.1 ELEMENTOS DA NARRATIVA 2.2.1.1 PERSONAGENS Não é possível desassociarmos os personagens do enredo ficcional, pois esse estilo narrativo se vale de uma série de acontecimentos e das personagens que

os

vivem.

Quando

pensamos

nos

episódios

da

trama,

pensamos

simultaneamente em toda a história da personagem que o levou àquele acontecimento e todo o desenvolvimento de caráter ficcional que nos ajudará a entender como ele irá lidar com a situação. Para D’Onófrio, “as personagens constituem os suportes vivos da ação e os veículos das ideias que povoam a narrativa9”. A personagem ficcional e, em especial, o herói da narrativa sempre tem um papel temático na trama, uma missão a executar. Seja salvar o mundo ou simplesmente patrulhar a cidade, toda personagem tem um objetivo definido naquela história. D’Onófrio divide então dois modelos de personagens: As personagens de costume são marcadas desde o início da narrativa com traços que as distinguem das demais – o herói, o vilão, o conselheiro, a mocinha –, características facilmente identificáveis para o leitor. Já as personagens esféricas recebem as qualificações necessárias no decorrer da trama de forma gradual e suas atribuições serão moldadas aos poucos durante a história. É o típico herói contemporâneo – indeciso e complexo. Especificamente no caso dos heróis, temos mais três modelos: O herói apolíneo que “é qualificado para uma nobre missão e investido de atributos eufóricos (beleza, valor, nobreza de sentimentos) [e] que tem a função de expressar o triunfo dos valores sociais e de restabelecer a ordem10”. Nos quadrinhos de ação, podemos citar como exemplo o deus nórdico Thor. Notoriamente belo e com sangue real, o deus do trovão luta em defensa da humanidade, da justiça e de seu próprio reino em Asgard.

9

D’ONÓFRIO, 2007, p.75. ______, 2007, p.79.

10

17

O herói dionisíaco é “caracterizado por semas disfóricos e que segue seus próprios valores individuais, seguindo o próprio instinto e tendo uma visão carnavalesca do mundo11”. Como exemplo, podemos citar o Wolverine. Baixinho e peludo, o mutante segue seu próprio código de conduta sem se importar com as leis ou a moral. Houve também uma tentativa de síntese do herói apolíneo e do herói dionisíaco que aconteceu durante a literatura barroca espanhola. Essa dicotomia pode ser vista no Justiceiro, um anti-herói que luta por uma vingança pessoal, mas também pela justiça e pelo bem dos cidadãos.

2.2.1.2 ESPAÇO “O espaço da ficção constitui o cenário da obra, onde os personagens vivem seus atos e sentimentos12”. O local onde a história se passa pode nos revelar características da personagem como, por exemplo, sua condição social. Mesmo que a maioria dos heróis Marvel viva em Nova York ou nas redondezas, são estabelecidas diferenças claras de acordo com o local que suas aventuras acontecem ou onde eles moram. Enquanto o bilionário Homem de Ferro mantém um enorme prédio bem no centro da cidade, o Homem-Aranha vive no Queens, um pacato bairro residencial para cidadãos de classe média e o Demolidor mora em Hell’s Kitchen, a periferia do estado. Mesmo que Matt Murdock, o alter-ego do Demolidor, não seja pobre, sua profissão de advogado e seu hobby como vigilante noturno requerem que ele esteja sempre próximo aos seus clientes ou rivais. Esses pequenos detalhes enriquecem ainda mais a trama, adicionando complexidade e motivações particulares para cada personagem. 2.2.1.3 TEMPO Para D’Onófrio: Sua função é dúplice e antiética: de um lado, dão-nos a impressão de naturalidade, pois as informações temporais e espaciais têm o papel de enraizar a ficção na realidade, tornando-a inteligível; mas, de outro lado, 13 instauram o mundo do imaginário suspendendo as leis do real .

11

D’ONÓFRIO, 2007, p.79. ______, 2007, p.83. 13 ______, 2007, p.82. 12

18

A passagem de tempo nas histórias em quadrinhos tem uma peculiaridade própria do gênero devido ao uso das imagens como recurso narrativo. Abordaremos esse tema com mais profundidade no item 2.4.1.

2.3 QUADRINHOS DE AÇÃO: ENTRE A NOVELA E O ROMANCE

2.3.1 CÉLULAS DRAMÁTICAS E AS MODALIDADES DA NARRATIVA Entender o conceito de célula dramática é importante para uma melhor compreensão da real diferença entre as principais modalidades da narrativa de ficção – o conto, a novela e o romance. Tavares (2002) afirma que uma modalidade não se difere da outra por sua extensão, como afirmam alguns autores, mas sim, por sua técnica de construção14. A diferença entre o conto, a novela e o romance seria na verdade a quantidade de células dramáticas – constituídas de um drama, um conflito, uma unidade dramática, uma história e uma ação15 – e como elas se interligam no enredo.

2.3.1.1 O CONTO Segundo Moisés (2004, p.89), o conto seria univalente: tendo somente uma célula dramática, a história flui para um único objetivo e um único efeito. O enredo se vale normamente de um pequeno recorte da vida da personagem, sendo apresentado quase como um flash16. O passado e o futuro dos fatos narrados ali não interessam para a construção daquela narrativa e, quando se fazem necessários, são apresentados rapidamente em poucas linhas, preferindo a concisão à prolixidade17. A gama de personagens também é reduzida para um melhor desenvolvimento de todos. 2.3.1.2 A NOVELA Já a novela ostenta pluralidade dramática. Constitui-se de uma série de unidades ou células dramáticas encadeadas e portadoras de começo, meio e fim que se assemelham a contos enlaçados em sequência. Essa sucessividade é a característica mais importante da novela. 14

TAVARES, 2002, p.122. MOISÉS, 2004, p.88. 16 SOARES, 2007, p. 55. 17 MOISÉS, 2004, p.89. 15

19

Com efeito, as células dramáticas se dispõem linearmente, uma após outra. Entretanto, não se trata de uma sucessividade rigorosa, visto que as células não formam compartimentos estanques: o novelista não esgota o conteúdo de uma unidade antes de passar à seguinte. Via de regra, deixa uma semente de drama, que virá a constituir os episódios subsequentes. [...] A novela vai-se formando, portanto, da agregação de unidades dramáticas 18 permanentemente abertas .

O processo de narração é sempre aditivo sendo possível acrescentar mais uma célula dramática mesmo depois de ter terminado a história com um novo capítulo ou aventura. Quanto aos personagens, o número de principais e coadjuvantes é maior do que o do conto ou do romance e grande parte deles não é profundamente desenvolvido na trama. Os coadjuvantes costumam ser planos e bidimensionais podendo ser substituído a qualquer momento sem comprometer o todo da obra19. Soares (2007) afirma que “o clímax e o desfecho coincidem na novela autenticamente estruturada. O predomínio da ação dá a essa modalidade uma feição dramática, ao contrário do conto, que se aproxima da poesia20”. Um cuidado adicional que devemos ter ao estudar esta modalidade é não confundi-la com o termo em inglês novel que representa o romance.

2.3.1.3 O ROMANCE A narrativa do romance é calcada no fluxo de consciência e nas análises psicológicas21 diferente do conto e da novela que optam por um maior destaque aos diálogos. O romance fechado, considerado como uma estrutura perfeita dessa narrativa, conta com um começo, meio e fim claramente delimitados, sendo este último composto pelo clímax e um epílogo informando o destino das personagens. Mas também existe o romance aberto que elimina esses limites e deixa a impressão de que caberiam novos episódios dentro daquela trama. Muitas vezes, a presença da personagem principal é o único elo entre os capítulos22.

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MOISÉS, 2004, p.321. ______, 2004, p.324. 20 SOARES, 2007, p. 56. 21 ______, 2007, p. 43. 22 ______, 2007, p. 45. 19

20

2.3.2 A ESTRUTURAÇÃO DOS QUADRINHOS DE AÇÃO A estrutura narrativa dos quadrinhos de ação transita entre a novela e o romance, tendo manifestações tanto de um gênero isolado quanto de uma amálgama de ambos. As publicações regulares da Marvel Comics costumam ter periodicidade mensal ou quinzenal e cada capítulo deixa um gancho para o próximo. Dentro desses capítulos, conflitos secundários se resolvem ou não, mas sementes da trama principal, secundárias ou até terciárias são sempre apresentadas. Do momento em que um conflito é estabelecido até sua conclusão, chamamos de “arco”. Um arco de histórias tem uma quantidade variável de partes, sendo as mais comuns de seis a sete capítulos. Quando um arco termina, outro logo se inicia com um novo conflito e que durante o processo pode ou não desenvolver outros apresentados anteriormente. Quando lançados em uma mesma revista e de forma contínua, esses pequenos arcos formam pequenas continuações uns dos outros, transformando-se em uma linha reta de tramas que se completam em um grande arco maior – seja de acordo com o planejamento do autor ou com a totalidade das histórias da personagem. Por exemplo, ao assumir a revista X, o autor Y planeja uma história a ser contada em 21 edições. Por imposições editoriais, todas essas edições têm que ser dividas em pequenos arcos com pequenos fins e começos entre cada um. Por isso, o autor opta por dividir seu enredo em três arcos que constituem o começo, meio e fim de sua grande trama. O primeiro arco tem sete partes e nele o grande conflito é instaurado juntamente com outros menores. Ao final desse primeiro arco, a intriga principal é resolvida, fechando a célula dramática, mas uma série de conflitos secundários e outros terciários continuam abertos para os próximos arcos.

21

Figura 2 – O primeiro arco Fonte: Elaborada pelo autor

A segunda parte, também em sete capítulos, é uma continuação direta da última edição do primeiro arco, mas que estabelece e resolve um novo conflito secundário, sem tirar a importância do primário. E, finalmente, no terceiro arco, tudo converge para a resolução da grande trama proposta na primeira parte podendo, ou não, resolver conflitos terciários que ficaram em aberto anteriormente. Os conflitos secundários de um arco podem se tornar os principais de outro e vice-versa. Todas as histórias são ligadas por sua predecessora e pelo início daquela fase ou do personagem.

Figura 3 – Visão geral dos arcos. Fonte: Elaborada pelo autor

A partir daí, quando um novo autor assumir a revista, ele pode resolver e fechar todas as pontas possivelmente deixadas pelo autor anterior ou ignorá-las e criar suas próprias e novas intrigas. De qualquer forma, esses pequenos três arcos se tornam um novo arco na história total do herói que é contabilizada desde sua criação. Sob a estrutura da novela, são constituídos os arcos em separado. Capítulos serializados que, unidos, formam uma história maior. E quando todas as edições

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escritas por um autor são reunidas, tem-se a impressão de estar lendo um romance aberto. Além desse formato mais tradicional também existem as minisséries e as graphic novels, que correspondem respectivamente a uma forma mais pura da novela e do romance. As minisséries geralmente são seriadas de quatro a doze edições que correspondem a uma história fechada, podendo ou não ter consequências na história principal do herói ou grupo. São lançadas como blockbusters de verão, testes de mercado para personagens coadjuvantes ou até como apresentação de autores e ilustradores novos na área. Um exemplo disso é Avengers: The Origins23, minissérie em cinco partes que se aprofunda um pouco mais nos primeiros dias da equipe Os Vingadores, mesmo sendo publicada quase cinquenta anos após a criação do grupo. As minisséries também são usadas para grandes eventos que abrangem mais de um grupo de heróis e que terão consequências para todos ou grande parte deles. Um exemplo é Invasão Secreta24, minissérie em oito partes que traz o desfecho de uma história que começou em Os Novos Vingadores e a expande para todo o Universo Marvel. As graphic novels estão em uma situação mais delicada. O termo é utilizado em duas ocasiões: quando um ou mais arcos da revista regular são copilados em um único volume – fechando ou não uma história maior – ou quando uma história fechada sai com mais páginas que o normal e em um acabamento diferenciado. Como a estrutura de arcos já foi debatida anteriormente, focaremos nas histórias fechadas lançadas diretamente no formato graphic novel. Utilizando a estrutura do romance aberto e apresentando uma história autocontida, não há grandes ligações com o título principal. O começo, meio e fim são claramente estabelecidos e dificilmente há um acréscimo posterior de células dramáticas àquela história. De acordo com Howe, a Marvel anunciou o projeto de graphic novels originais em 197825 e meses depois começaram a vender “álbuns de 64 páginas impressos

23

CASEY, Joe. Avengers: The Origin. USA: Marvel Comics, 2012. BENDIS, 2012b 25 HOWE, 2013, p.231. 24

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em papel de alta qualidade a serem vendidos a cinco ou seis dólares [exclusivamente] nas lojas de quadrinhos26”. Vingadores: Guerra Sem Fim27 é um dos mais recentes lançamentos neste formato que tenta resgatar essa abordagem de vendas abandonada há alguns anos pela editora.

2.4 A LINGUAGEM DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS Se a questão do gênero já é complicada, a combinação da narrativa com as artes plásticas também não é tão simples. Afinal, as histórias em quadrinhos não são compostas somente de narrações e falas de personagens. Uma de suas principais características é a mistura entre imagem e texto; artes plásticas e literatura. Sem um desses elementos, a história se torna meramente um quadro artístico ou uma narrativa comum.

2.4.1 ARTE SEQUENCIAL E TIMING Cunhado pela primeira vez por Eisner (1989) o termo arte sequencial se refere ao uso artístico do encadeamento de imagens sequenciadas para contar uma história ou transmitir uma informação. O maior exemplo para o termo são as histórias em quadrinhos, mas outras áreas também se aproveitam da técnica para produzir storyboards, infográficos, folhetos informativos, manuais de utilização entre outras coisas. A grande diferença entre os storyboards e os quadrinhos – além dos balões e das falas – está na construção e na composição dos quadros iconográficos. Se nos storyboards os quadros são padronizados em um só tamanho para reproduzir o aspecto final da película na tela onde o filme será reproduzido, nos quadrinhos os formatos e tamanhos são variáveis e a disposição desses mesmos quadros são o que compõem o ritmo da narrativa. Na prosa, o bom desenvolvimento do tempo e da tensão narrativa é crucial para a construção de uma boa ficção. O autor precisa envolver o leitor na trama de tal maneira que faça com que suas percepções sejam iguais às da personagem e, por consequência, vivencie emocionalmente a história. Para isso, é preciso simular narrativamente todos os sentidos humanos de modo a gerar uma imersão do leitor

26

______, 2013, P.248. ELLIS, Warren. Vingadores: guerra sem fim. Tradução de: Paulo França & Rodrigo Oliveira. São Paulo: Panini Books, 2013. 27

24

na trama. Entretanto, a percepção temporal – necessária para criar a tensão narrativa – é um dos recursos mais complicados de serem expressos literariamente. Eisner diz que “enquanto o som é medido auditivamente e o espaço visualmente, o tempo é ilusório – nós os medimos e percebemos através da lembrança da experiência28”. Sendo assim, cabe ao autor a habilidade de expressar esse tempo de forma que o leitor seja completamente imerso na narrativa. Nos quadrinhos modernos há a tendência de eliminar-se o narrador substituindo-o puramente pela imagem. E mesmo quando há um narrador, suas características não são as mesmas da narrativa em prosa. Nas histórias em quadrinhos, quem define o ritmo e o timing narrativo são os próprios quadrinhos. São eles que definem a visão do leitor e indicam a duração daquela cena. Na verdade, os quadrinhos em si, não expressam nenhuma medida exata de tempo – são os requadros que atuam como enunciadores temporais. Para Eisner (1998, p.28), o ato de colocar ação em quadrinhos separa as cenas e os atos como uma pontuação ou uma partilha musical. O timing e o ritmo se entrelaçam. Para que essa passagem temporal fique bem exposta, o tamanho e a quantidade de quadrinhos em uma página são variáveis. Quadrinhos menores, retangulares ou disformes exprimem a cinética da ação, a velocidade do movimento. Neles, o tempo se comprime de forma que cada quadro represente um ínfimo momento no tempo, mas importante o suficiente para merecer esse destaque. Já quadrados perfeitos transmitem uma regularidade de ação, uma passagem de tempo estável. Nesse sentido, as onomatopeias e os balões de fala também marcam o tempo podendo se alongar, ou não, por mais de um quadrinho. Cabe então ao autor – e ao ilustrador caso sejam pessoas distintas – a responsabilidade de representar a passagem temporal de modo que o leitor identifique pontos-chave que o localizem no tempo narrativo, chamado de lapso de tempo por Eiser.

28

EISNER, 1989, p. 25.

25

Figura 4 – Tempo e timing Fonte: EISNER, 1989, p. 25.

Figura 5 – Lapso do tempo Fonte: EISNER, 1989, p. 29.

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2.4.2 ARTES PLÁSTICAS Não só de sequência sobrevive o estilo. Além de um meio para contar histórias, alguns quadrinhos são elevados ao status de obras de arte. Durante as décadas de 1950 e 1960 os quadrinhos ganharam um grande peso na comunidade artística graças ao movimento pop art. Segundo Santos, “algumas décadas antes, ninguém imaginaria que os gibis acabariam nos museus, mas o humor pop de Lichtenstein [...] levou-os para lá29”.

Figura 6 – “Masterpiece” 30 Fonte: The Roy Lichtenstein Foundation

A proposta do movimento foi desassociar a arte do cenário elitista da sociedade e colocá-la numa perspectiva mais comum e cotidiana. A chamada antiarte pós-moderna faria com que a arte fosse entendível e alcançável para todos os públicos. Foi contra o subjetivismo e o hermetismo modernos que surgiu a arte Pop, primeira bomba pós-moderna. Convertida em antiarte, a arte abandona os museus, as galerias, os teatros. É lançada nas ruas com outra linguagem, assimilável pelo público: os signos e objetos de massa. Dando valor artístico

29 30

SANTOS, 2012, p. 48. Disponível em . Acessado em mai. 2014.

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à banalidade cotidiana – anúncios, heróis de gibi, rótulos, sabonetes, fotos, stars de cinema, hambúrgueres –, a pintura/escultura Pop buscou a fusão da arte com a vida, aterrando o fosso aberto pelos modernistas (SANTOS, 2012, p. 36).

O movimento coincidiu com a chamada Era de Prata das histórias em quadrinhos onde os principais heróis que vemos hoje na mídia foram criados ou resgatados do limbo editorial. O Quarteto Fantástico marcaria o começo da era Marvel, sucedido pelo Homem-Aranha, Homem de Ferro, o ressurgimento do Capitão América e a primeira formação dos Vingadores – todos criados por Stan Lee. As vendas de quadrinhos que estavam em declínio desde o fim da Segunda Guerra Mundial havia aumentado mais uma vez junto com sua popularidade. Durante essa época, as ilustrações que compunham as histórias tinham um estilo muito próximo. Havia particularidades entre cada ilustrador, mas as liberdades criativas eram restritas e proibitivas. Atualmente, temos uma enorme quantidade de estilos no mercado, indo desde os mais cartunescos até os mais realistas. Existem ilustradores que desenham diretamente no computador e os mais conservadores que preferem desenhar e esboçar no papel para somente depois digitalizar as obras. Alguns também fazem questão de pintar suas próprias obras enquanto outros deixam o trabalho para os coloristas da editora. Também é uma prática comum da atualidade o revezamento de artistas em um mesmo título para que todas as revistas saiam dentro do prazo estipulado. Para lidar com um segundo declínio de vendas durante a década de 1990, as editoras resolveram apostar no colecionismo dos leitores que há muito já haviam deixado de consumir o produto somente como uma espécie de entretenimento e passaram a consumi-lo como produto cultural. Foram criados alguns artifícios gráficos para o aumento das vendas de certas edições que continuam até hoje. Capas com ilustrações variantes, holográficas, limitadas, páginas quádruplas ou até mesmo páginas óctuplas são estratégias de marketing constantes para promover certas edições, sejam comemorativas, especiais ou apenas para que o leitor tenha a possibilidade de escolha. Hoje os quadrinhos são vendidos em diversos formatos, acabamentos e edições especiais que elevam ainda mais o seu status de arte plástica, fazendo com que ela não fique somente nas ilustrações internas, mas transforme o produto em um diferencial nas prateleiras. 28

3 A TRIPARTIÇÃO DA FÁBULA E O MONOMITO Antes de iniciar o capítulo, cabe aqui uma desambiguação do termo. Fábula, na língua portuguesa, pode significar tanto o gênero literário quanto a estrutura do enredo que é o foco deste estudo. Tomachevski classificou fábula como "o conjunto de acontecimentos ligados entre si que nos são comunicados no decorrer da obra31”. O formalista russo V. Propp publicou em 1928, Morfologia do conto32, uma proposta de modelo estruturalista da narrativa a partir da análise de um corpus constituído de cem fábulas33. Ele foi um pioneiro a focar na abordagem interna e estrutural do texto literário em vez da abordagem externa, que prezava somente o estudo das características do autor, como a escola literária a que pertencia e o meio cultural em que era inserido. Porém, mesmo sendo um dos primeiros a estudar o texto pelo texto, Propp não foi o primeiro a analisar a estrutura do enredo. Aristóteles já estabelecia a divisão de três partes inerentes à narrativa: princípio, meio e fim. Segundo o poeta, toda narrativa deve começar de um ponto, percorrer um caminho e terminar em outro ponto. Ser um todo é ter princípio, meio e fim. Principio é aquilo que, em si mesmo, não sucede necessariamente a outra coisa, mas depois do qual aparece naturalmente algo que existe ou virá a existir. Pelo contrário, fim é aquilo que apare depois de alguma coisa, necessariamente ou na maior parte dos casos, e a que não se segue nada. Meio é aquilo que é antecedido por um e seguido por outro. Portanto, é necessário que os enredos bem estruturados não comecem nem acabem ao acaso, mas sim apliquem os princípios anteriormente expostos. (ARISTÓTELES, 2004)

O primeiro momento é de total equilibro situacional na vida da personagem principal; no segundo há um desequilíbrio no status quo e no terceiro momento, retoma-se ao equilíbrio – podendo ser igual ao do primeiro momento ou não. Essa tripartição é a unidade nuclear do monomito, termo cunhado pela primeira vez por Joyce34 (1939 apud CAMPBELL, 2000, p.17) e que representa também o percurso padrão de uma aventura mitológica – separação, iniciação e retorno.

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VÁRIOS. Teoria da literatura: formalistas russos. Porto Alegre: Globo, 1971. PROPP, V. Ya. Morphologie du conte. Paris: Gallimard, 1970. 33 D’ONOFRIO, 2007, p.39. 34 JOYCE, James. Finnegans wake. New York: Viking Press, Inc., 1939, p.581. 32

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Figura 7 – A estrutura do monomito. Fonte: CAMPBELL, 2000, p.18.

Propp estabeleceu que a narrativa era como um organismo vivo, repleta de especificidades e composta de elementos essenciais. Ao analisar o corpus e individualizar alguns desses elementos, comuns e invariáveis a todos, o autor percebeu 31 sintagmas narrativos constantes nessas obras. Propp definia cada sintagma como uma função, ligadas entre si e que constituíam a estrutura da fábula de uma narrativa. Toda função é uma ação, mas nem toda ação é uma função. Segundo D’Onófrio, “para ser considerada uma função, a ação da personagem deve estabelecer relações de causa ou de efeito com outras ações distribuídas no eixo sintagmático da narrativa35”, ou seja, função é toda ação que estabelece uma relação com outra, cria, desenvolve ou finaliza uma intriga do enredo. Todas essas trinta e uma funções sugeridas por Propp foram reduzidas por Campbell (2000) a doze passos narrativos básicos que constituem a jornada do herói. A ideia é a mesma de Propp: todas as histórias contêm elementos estruturais comuns e essenciais, mudando somente a forma em que são aplicados à história e seus personagens.

3.1 A JORNADA DO HERÓI Segundo Vogler: O modelo da Jornada do Herói é universal, ocorrendo em todas as culturas, em todas as épocas. Suas variantes são infinitas, como os membros da própria espécie humana, mas sua forma básica permanece constante. [...] Seus detalhes são diferentes em cada cultura, mas são fundamentalmente 36

sempre iguais .

35 36

D’ONÓFRIO, 2007, p.57 VOGLER, 2006, p. 33.

30

Tal jornada não precisa ser necessariamente uma aventura épica, podendo se manifestar também em uma comédia romântica ou até mesmo em uma jornada interior, de mente ou espírito37 pois essas características não representam somente um gênero, mas todo crescimento – mental, emocional ou físico – que uma personagem principal precisa atingir para alcançar o seu objetivo. Afinal, a jornada do herói é um paralelo aos arquétipos mitológicos e ao inconsciente coletivo que foram estabelecidos pela psicologia moderna e que correspondem a características intrínsecas ao ser humano – ambas são infinitamente flexíveis e capazes de variações infinitas sem sacrificar sua essência. A estrutura é somente um esqueleto e não deve ser seguida rigidamente, podendo variar, inclusive, em sua ordenação já que os símbolos expressos na história são importantes do que o arcabouço fabular38. O primeiro estágio dessa jornada, denominado como mundo comum, é a situação inicial da trama. É o estado de total equilíbrio na vida do herói que “em geral [...] indica um estado de felicidade, que serve como fundo contrastivo à infelicidade que vai seguir39”. Vogler a compara ainda como a conhecida ideia de peixe fora d´água (2006, p. 37). Mas logo a seguir vem o chamado para a aventura, que cria o conflito e tira o herói de sua zona de conforto. O chamado estabelece o direcionamento da trama e deixa claro qual é o novo objetivo do herói. Em seguida vem a recusa do chamado, onde o herói hesita o chamado graças ao medo do desconhecido. Tal terror, só pode ser desfeito por outra influência ou através do encorajamento de um mentor40. O encontro com o mentor é um dos recursos mais utilizados na mitologia e serve para reforçar o elo entre mestre e discípulo. Nesse ponto, o mentor prepara o herói para o desconhecido, podendo lhe dar conselhos ou o equipamento necessário. Depois de seu encontro com o mentor, o herói finalmente decide realizar a travessia do primeiro limiar. Este ponto representa a resposta do herói ao chamado para a aventura e o fim do mundo comum como o herói conhece. Se dividirmos o

37

VOGLER, 2006, p.35. ______, 2006, p. 47. 39 D’ONÓFRIO, 2007, p.65. 40 VOGLER, 2006, p.38-39. 38

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enredo em três partes, a travessia do primeiro limiar marca a passagem do primeiro para o segundo ato41. Ao entrar nesse mundo especial, o herói enfrenta novos testes, além de conhecer aliados e inimigos. Esse é o sexto estágio da jornada do herói onde a personagem naturalmente aprende as regras desse lugar desconhecido através de novos desafios, aliados e inimigos. Durante a aproximação da caverna oculta, “finalmente, o herói chega à fronteira de um lugar perigoso, às vezes subterrâneo e profundo, onde está escondido o objeto de sua busca42”. Essa é a travessia do segundo limiar. No oitavo estágio, o herói é levado a um confronto com seu maior medo e enfrenta a possibilidade da morte durante a provação. É o momento crítico de qualquer história. Se o herói morre ou é levado próximo a isso, esse também é o momento de ressurreição que causa ao leitor entusiasmo e euforia. A recompensa vem logo em seguida. Depois de sobreviver à morte, o herói consegue aquilo que buscava desde o início da jornada. Com seu objetivo concluído, o herói retorna. Mas o caminho de volta pode não ser tão tranquilo quanto aparenta. Ele marca o começo do terceiro ato e mostra as consequências da vitória anterior no caminho para seu mundo comum, como a perseguição do vilão em busca de vingança ou a fuga ardilosa para fora do espaço inimigo. A ressurreição é onde o herói prova definitivamente o seu valor em um último esforço desesperado, antes das forças malignas serem finalmente derrotadas. É o teste final do herói que põe à prova todo o conhecimento adquirido na provação. O último estágio, retorno com o elixir, representa a volta ao equilíbrio. Quando a vida do herói se reestabelece e seu objetivo é alcançado, o conflito se encerra. O elixir representa o objeto – físico ou não – que o herói buscou durante toda a jornada. Pode ser uma poção, um grande tesouro, um novo conhecimento ou até mesmo o amor, a liberdade ou sabedoria43. Encerrada a aventura, o herói enfim retorna a situação de equilíbrio, estando pronto para uma nova aventura.

41

VOGLER, 2006, p.40. ______, 2006, p.41. 43 ______, 2006, p.46. 42

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3.2 O CAMINHO DO HERÓI MODERNO Diferente da aventura épica clássica, o herói moderno não ruma a horizontes desconhecidos, convicto de suas crenças. A modernidade inverte esse papel e transforma essa busca pela verdade do mundo em uma busca pela humanidade do herói. A teia onírica do mito ruiu; a mente se abriu à plena consciência desperta; e o homem moderno emergiu da ignorância antiga, tal como uma borboleta do seu casulo, ou tal como o sol, de madrugada, do útero da mãe noite. [...] O problema da humanidade hoje, portanto, é precisamente o oposto daquele que tiveram os homens dos períodos comparativamente estáveis das grandes mitologias coordenantes, hoje conhecidas como inverdades. Naqueles períodos, todo o sentido residia no grupo, nas grandes formas anônimas, e não havia nenhum sentido no indivíduo com a capacidade de se expressar; hoje não há nenhum sentido no grupo — nenhum sentido no mundo: tudo está no indivíduo. Mas, hoje, o sentido é totalmente inconsciente. Não se sabe o alvo para o qual se caminha. Não se sabe o que move as pessoas. Todas as linhas de comunicação entre as zonas consciente e inconsciente da psique humana foram cortadas e fomos divididos em dois. A tarefa do herói, a ser empreendida hoje, não é a mesma do século de Galileu. Onde então havia trevas, hoje há luz; mas é igualmente verdadeiro que, onde havia luz, hoje há trevas. A moderna tarefa do herói deve configurar-se como uma busca destinada a trazer outra vez à 44 luz a Atlântida perdida da alma coordenada

Mesmo com essa mudança completa de paradigma, a jornada do herói mantém as mesmas características de outrora e ainda sobreviverá após muitas mais mudanças sociais.

44

CAMPBELL, 2000, P.194.

33

4 A REESTRUTURAÇÃO DA FRANQUIA OS VINGADORES POR BRIAN M. BENDIS

4.1 OBJETIVOS DA ANÁLISE Brian Michael Bendis assumiu a franquia dos Vingadores após seu estrondoso sucesso em Ultimate Homem-Aranha e Alias. Assim, foi lhe dada a árdua tarefa de reestruturar umas das maiores superequipes da editora do jeito que quisesse e seu primeiro ato foi acabar com tudo que já estava estabelecido anteriormente. Seu papel frente à franquia durou um pouco mais de oito anos desde Avengers #500 em Setembro de 2004, até New Avengers (vol. 2) #34 e Avengers (vol. 4) #34 de Janeiro de 2013. Nosso estudo terá como foco a continuidade narrativa, a disposição das células dramáticas e a aplicação da jornada do herói durante a primeira fase de seu trabalho que vai até New Avengers Finale de Junho de 2010.

4.2 A QUEDA E O TRIUNFO: YEARS IN THE MAKING

4.2.1 O PIOR DIA DOS VINGADORES O primeiro arco que Brian assume como roteirista é também o último da clássica revista Avengers. Começando na edição #500, a primeira parte do arco A Queda (BENDIS, 2008a) mostra o pior dia da história dos Vingadores. Enquanto parte do grupo estava tomando café da manhã na mansão do time, o alerta de intruso toca e ao olharem o monitor, veem Valete de Copas, um exVingador falecido. Quando Scott Lang, o Homem-Formiga, tenta falar com o amigo zumbi, uma súbita explosão mata os dois. Enquanto isso, Tony Stark, o Homem de Ferro, discursa no gabinete das Nações Unidas sobre o papel do Vingador uniformizado na sociedade. De repente, Tony se sente tonto, quase como embriagado – uma de suas maiores fraquezas – e, num repentino ataque de fúria, ofende e ameaça o embaixador da Latvéria de morte. Imediatamente ele deixa o palanque e recebe o aviso de que a mansão havia sido atacada. Enquanto os bombeiros apagavam o fogo e os Vingadores se recuperavam do choque, uma nave em alta velocidade pilotada pelo androide Visão se choca 34

novamente no terreno causando outra explosão. Ao sair ileso da nave, Visão afirma que o tempo dos Vingadores acabou e expele cinco Ultrons – um dos maiores e mais imbatíveis vilões do grupo. Depois que um pequeno grupo que já estava no local combateu os robôs, a Mulher-Hulk, num acesso de fúria, rasga ao meio e mata seu companheiro Visão. Quando o grupo tenta acalmá-la, ela atira um caminhão em cima do Capitão América. O escudo o protege e o Homem de Ferro chega a nocauteando. Por enquanto, as ameaças estavam contidas, mas os danos já eram irreparáveis. Depois de levarem os feridos ao hospital e se reunirem para tentar entender o que havia acontecido, os Vingadores restantes voltaram à mansão. Todos os heróis que ainda eram ou um dia foram Vingadores estavam lá, tentando ajudar de alguma forma. Foi quando Nick Fury, o diretor da SHIELD, recebeu um comunicado do governo: os Vingadores não eram mais aliados da ONU. Mas não houve tempo para a revolta. Uma nave Kree sobrevoava – e atacava – os Vingadores. Clint Barton, o Gavião Arqueiro se sacrificou durante a batalha para deter o ataque. Depois da terceira baixa, Stephen Strange, o Doutor Estranho, aparece e revela que os ataques são de natureza mágica; eles foram causados por uma Vingadora. Alguns meses antes, Wanda Maximoff, a Feiticeira Escarlate, deu a luz a duas crianças, fruto de seu relacionamento com o Visão, mas as crianças não eram reais. Elas eram frutos de seu poder, apenas tendo sido conjuradas por ela. Quando sua mentora descobriu, ela os “apagou” da existência e Wanda havia enlouquecido por causa disso. Depois da batalha, Stephen Strange mostrou a verdade para Wanda e ela ficou inconsciente. Sem saber o que fazer com ela, a entregaram nas mãos de Magneto, seu pai, que a levou para um lugar misterioso. Em Avengers Finale, última parte do arco, meses depois dos ataques, todos os Vingadores restantes se reúnem nas ruínas da mansão e Tony Stark faz um anúncio: ele não financiaria mais o grupo e já havia vendido a mansão ao estado de Nova York como patrimônio histórico. Pietro, irmão de Wanda, anuncia que a irmã está fazendo um tratamento psíquico com Charles Xavier fora do país e pede desculpas por sua família. O time questiona onde Thor esteve todo esse tempo e por que ele não os ajudou sem saber que Thor havia perecido no Ragnarök, o apocalipse nórdico, em sua própria revista. 35

Jennifer Walters, a Mulher-Hulk, desiste de ser uma heroína por conta de sua instabilidade depois de transformada. Janet e Hank Pym decidem sair do país para fins acadêmicos. Sam Wilson, o Falcão, também desiste da vida heroica e a Capitã Bretanha volta para a Europa. Os Vingadores haviam acabado. Após um último brinde a todos os amigos falecidos durante todos esses anos, os integrantes se reúnem com os moradores de Nova York para velar o fim do supergrupo. Em entrevista ao site Avengers Forever (2008a), Bendis afirmou que “o título não está sendo encerrado. [...] Está sendo restabelecido. Revislumbrado. Não estamos destruindo, estamos criando”.

Figura 8 – O fim dos Vingadores Fonte: BENDIS, 2008, p. 163. Arte de George Perez.

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4.2.2 GUERRA SECRETA Em Guerra Secreta (BENDIS, 2013a), Bendis usa Nick Fury como personagem principal e cria uma trama que começaria a reaproximar o Universo Marvel da realidade. Segundo Howe (2013, p.444): O Universo Marvel aproximava-se da vida real ou pelo menos do que se pode imaginar como adaptação em CGI. E, numa espécie de retorno às tramas de Stan Lee no início dos anos 1970 sobre piquetes em universidades e LSD, muitas das grandes sagas faziam aceno às manchetes sem se dar ao trabalho de assumir posicionamento.

Na história, seis super-heróis sem grandes ligações são atacados repentinamente por vilões que exigem vingança. Logo em seguida, toda a ilha de Manhattan é atacada em retaliação a uma guerra do qual ninguém se lembra. No final da história, Fury revelava que atacou secretamente um ano antes a nação soberana da Latvéria e, depois do fim da guerra, apagou a memória de todos os heróis envolvidos. A trama questiona a questão da diplomacia nos tempos modernos: ao saber que a primeira-ministra latveriana Lúcia Von Bardas estava financiando tecnologia à supervilões que estavam atacando os EUA, Fury alertou a Casa Branca sobre a situação. Porém, mesmo tendo informações e provas, o presidente americano afirmou que não faria nenhuma espécie de retaliação devido às boas relações diplomáticas atuais entre os países. Será que valia a pena acabar com a diplomacia entre dois países para salvar a humanidade? Após sua guerra secreta vir à tona, Fury sentiu que havia cumprido o seu papel mais uma vez e sumiu do radar deixando Daisy Johnson, uma agente novata de dezoito anos, com o nível de segurança mais elevado dentro da SHIELD. Nick Fury apareceria de novo mais tarde, mas o papel do personagem dentro do Universo Marvel nunca mais seria o mesmo.

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Figura 9 – O adeus de Nick Fury Fonte: BENDIS, 2013a. Arte de Gabrielle Dell’Otto.

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4.2.3 OS NOVOS VINGADORES

4.2.3.1 A REUNIÃO Apesar de ter sido lançada no mesmo mês de Avengers Finale, Os Novos Vingadores #1 (In: BENDIS, 2011a) se passava seis meses depois do fim do grupo. A história começa com um sujeito misterioso abordando Electro, um clássico vilão do Homem-Aranha, e pedindo para que ele criasse uma distração que deixasse as autoridades ocupadas. Electro então incita um Motim na Balsa, a prisão de segurança máxima da ilha Ryker, liberando os piores e mais poderosos supervilões que o mundo já teve com apenas um punhado de heróis presentes. Quando a batalha parece perdida, o advogado Matt Murdock, alter-ego do Demolidor, pede ajuda ao homem que ele veio defender judicialmente: Bob Reynolds, o Sentinela. Considerado por Reed Richards como um dos homens mais poderosos do mundo, Bob estava preso por supostamente assassinar sua própria esposa anos atrás. E agora ele estava solto para bater nos vilões. Ao final do dia, quarenta e cinco vilões estavam presos novamente, mas quarenta e dois estava à solta no mundo. E um novo time de Vingadores, dessa vez não financiados e sem responder a governo algum, estava formado. Homem de Ferro, Capitão América, Homem-Aranha, Luke Cage e MulherAranha eram Os Novos Vingadores. O Demolidor foi o único que recusou o convite. Luke Cage só aceitou para ser bem visto por sua filha que logo iria nascer. Antes de se juntar ao time na Torre Stark, Jessica Drew, a Mulher-Aranha, conversa com uma pessoa misteriosa e promete repassar informações sigilosas do grupo a ela. Depois de prender Electro e usando os arquivos da SHIELD fornecidos por Drew, Tony Stark descobre que o mandante de Electro é o superser conhecido como Sauron que vive na Terra Selvagem. Chegando lá, eles acham Wolverine também na cola de Sauron, por ter recebido pistas na noite anterior. Depois de deterem Sauron, são atacados por uma unidade da SHIELD liderada pela Viúva Negra II, Yelena Belova. Sauron acorda e revida, acertando um jato de lava direto em Yelena e ambos fogem. Os Vingadores descobrem uma facção clandestina da SHIELD roubando vibranium da Terra Selvagem, mas antes que possa fazer qualquer coisa, Maria Hill chega em seu 39

aeroporta-aviões e destrói o lugar. No final, o Capitão América convida Wolverine a fazer parte do time. Durante o segundo arco de histórias, que começa em Os Novos Vingadores #7 (In: BENDIS, 2011a), vemos o Capitão América e o Homem de Ferro tentando entender quem era o Sentinela e por que ninguém se lembra dele enquanto o restante dos Vingadores vão deter o Destruidor. Em flashbacks interlúdicos, vemos Tony Stark conversando com um pequeno grupo secreto de heróis – os Illuminatis – sobre o Sentinela e tomando a decisão de tentar trazê-lo ao time para mantê-lo por perto caso se descontrolasse de novo. Com uma ajuda da X-Man Emma Frost, Sentinela recupera sua memória, seus poderes e sua base que agora fica acima da torre Stark. Agora os Novos Vingadores tinham mais um poderoso – e perigoso – membro. Enquanto buscava o Samurai de Prata, um dos vilões foragidos da Balsa, Steve Rogers chegou ao Tentáculo, um antigo grupo inimigo do Demolidor, que agora estava sob domínio da HIDRA. Matt Murdock mais uma vez se negou a ajudar, mas enviou Maya Lopez, a Eco (que operava secretamente como Ronin), para investigar o paradeiro do Samurai no Japão. No Japão, descobrimos que o contato misterioso da Mulher-Aranha era a Madame Hidra que pediu que ela espionasse a SHIELD e os Vingadores para seu próprio benefício. Depois da fuga da Madame Hidra ser causada por circunstâncias estranhas, o Capitão América interroga e pressiona Drew. Jessica revela que a HIDRA a deu a oportunidade de recuperar seus poderes caso trabalhasse como agente dupla na SHIELD. Nick Fury deu a autorização para o procedimento e ela se tornou uma gente tripla. O problema é que graças a Guerra Secreta, Drew agora era somente uma traidora sob o entendimento da SHIELD. Com a retomada do poder do Tentáculo pelo Samurai de Prata e o incidente no Japão, os Novos Vingadores se veem obrigados a se revelar para a imprensa.

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Figura 10 – Os Novos Vingadores Fonte: BENDIS, 2011, p. 350-351. Arte de Frank Cho.

4.2.3.2 DINASTIA M Dinastia M (BENDIS, 2009a) começa mostrando a Feiticeira Escarlate, ainda mentalmente estável, sendo tratada infrutiferamente por Charles Xavier. Sem saber o que fazer, Xavier se reúne com todos os Vingadores que estavam presentes durante A Queda para decidir o destino de Wanda. Enquanto isso, Pietro Maximoff também discute sobre o destino da irmã com seu pai. Magneto não sabe mais o que fazer e é condescendente com o assassinato da filha. Vingadores e X-Men vão juntos para a ilha Genosha, lar da família Maximoff, para decidirem o destino da Feiticeira, mas ao chegarem lá, antes mesmo de qualquer contato com Wanda, a realidade se distorce e a Terra vira um mundo dominado por mutantes. Nesse mundo, os humanos sofrem preconceito por não terem poderes. O Capitão América é um velho aposentado e todos os outros super-heróis que não são mutantes, estão em posições secundárias na sociedade. Magneto e sua família são reverenciados como reis, príncipes e princesas. Ninguém se lembra de como o mundo era antes. Ninguém, exceto Wolverine.

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Enquanto procurava ajuda de Luke Cage, Wolverine encontra o Gavião Arqueiro vivo mais uma vez. De algum modo, enquanto moldava a nova realidade mutante, Wanda conseguiu ressuscitar o amigo Vingador. Depois de reunir e libertar a mente de um pequeno grupo, Wolverine e seu time atacam o império de Magneto e sua família. Magneto, ao descobrir a verdade, mata o seu próprio filho, Pietro, o verdadeiro causador dessa distorção de realidade. Chocada com a morte do irmão e com a agressividade do próprio pai, Wanda pronuncia três palavras que mudariam para sempre a história dos mutantes. Três palavras que deixaria o homo superior à beira da extinção: “Chega de mutantes”. E de um dia para o outro, tudo havia voltado ao normal, exceto pelo fato de que a população mutante sofreu uma drástica diminuição. De cerca de um milhão de espécimes, a raça mutante agora só contava com menos de duas centenas de exemplares. Eles não haviam morrido, mas perderam seus poderes e Wanda Maximoff havia sumido do mapa. O Doutor Estranho havia falhado mais uma vez enquanto Mago Supremo. Enquanto isso, nos escombros da antiga mansão dos Vingadores, um uniforme roxo apareceu preso em uma parede com flechas. O Gavião Arqueiro estava de volta em algum lugar do mundo.

4.2.3.3 O COLETIVO Em Os Novos Vingadores #16 (In: BENDIS, 2012a) temos a sequência direta do arco anterior e podemos ver para onde todo o poder mutante banido da Terra foi. O poder de todos os que perderam o gene mutante se apossou de um único hospedeiro – o Coletivo. Sem saber da mais nova ameaça, os Novos Vingadores faziam patrulhas nas ruas de Detroit, para tentar diminuir a criminalidade – ideia de Luke Cage. Depois que o Coletivo começou um ataque em massa pelo planeta, os Novos Vingadores tentaram a todo custo detê-lo, mas até mesmo o poderoso Sentinela não tinha forças para tal. A SHIELD se aproveitou da situação para raptar o Homem-Aranha e extrair informações sobre o Dia M, já que nenhum Vingador queria tocar no assunto. Quando o coletivo pousou em Genosha e devolveu os poderes de Magneto, ele também reviveu grande parte dos mutantes mortos no local. O Sentinela conseguiu matar todos de novo e destruiu o poder acumulado dos mutantes jogando-o no sol. 42

4.2.4 GUERRA CIVIL Sem tempo para recuperar o fôlego, explode a Guerra Civil (Millar, 2010). Depois do descontrole da Feiticeira Escarlate, das constantes destruições sofridas pela cidade causada por brigas entre superseres, da desconfiança da SHIELD em cima dos heróis, um acontecimento se torna a gota d’água. Durante as gravações de um reality show, os Novos Guerreiros tentam prender um grupo de supervilões foragidos quando Nitro, um dos vilões do bando, provoca uma explosão que destrói quatro quarteirões de uma cidade e mata mais de 600 moradores – incluindo 60 crianças que estavam em uma escola na área atingida. O caso gera um grande debate na opinião pública e o governo aprova então a Lei de Registro de Super-humanos, que limita o uso de superpoderes em território americano e registra todos os superseres, obrigando-os a revelar sua identidade. O drama toma proporções ainda maiores quando os Novos Vingadores se dividem em duas facções: a pró-registro, que conta com o Homem de Ferro capitaneando o time, Homem-Aranha, Reed Richards entre outros; e a contrarregistro, que é liderada pelo Capitão América e conta com Luke Cage, Demolidor entre outros. Jessica Jones, temendo pela vida da filha recém-nascida, se muda para o Canadá deixando Luke Cage sozinho na América. Então começa uma corrida de gato e rato entre as duas facções. A briga fica ainda pior quando o Homem-Aranha revela publicamente sua identidade e vê sua família sendo caçada por todos os vilões que ele já enfrentou. Derrotado, Peter se arrepende de sua decisão e volta para o time do Capitão. Mas já é tarde demais. Os heróis não estão lutando mais por ideias, estão só lutando um contra o outro e a cidade é quem está pagando o preço. O Capitão América se entrega e Tony Stark é nomeado o novo diretor da SHIELD.

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Figura 11 – Fim da guerra Fonte: MILLAR, 2010. Arte de Steve McNiven.

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4.2.4.1 CLANDESTINOS Como se trabalhar na clandestinidade já não fosse ruim o suficiente, os Novos Vingadores agora lidavam com a morte de seu líder. Na revista solo do Capitão América, Steve Rogers é assassinado em frente de câmeras do mundo todo enquanto vai a julgamento. Luke Cage começa a desconfiar que alguém está manipulando todos esses fatos recentes para derrubar os heróis. Em Os Novos Vingadores #16 (In: BENDIS, 2013b), temos um interlúdio préguerra mostrando Clint Barton de volta após a Dinastia M. Depois de uma conversa com o Doutor Estranho, Clint vai para a montanha Wundagore procurar pela Feiticeira Escarlate que estava desaparecida. Lá, ele encontra uma Wanda Maximoff desmemoriada e decide voltar para casa. Quando Maya Lopez encontra problemas com o Tentáculo, Clint Barton assume o manto de Ronin e os Novos Vingadores vão ao Japão ajudá-la. Mas já era tarde demais. Maya estava sob o controle mental do Tentáculo, lutando ao lado dos vilões. Depois de uma briga colossal, o Doutor Estranho consegue libertar a mente de Maya que mata Elektra, a líder do grupo. Depois de morta, Elektra reverte a uma forma alienígena – a dos skrulls.

Figura 12 – A descoberta Fonte: BENDIS, 2013b, p. 144-145. Arte de Leinil Yu.

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4.2.4.2 INFILTRADOS Na volta para casa, o clima de paranoia assombra o grupo. Se Elektra, a líder do maior grupo de assassinos do mundo era uma alienígena infiltrada, qualquer um poderia ser. Ninguém poderia mais confiar em ninguém, ainda mais depois de todas as mudanças que a maior parte do grupo sofrera ao longo dos anos. Sem saber o que fazer, Jessica Drew dá a ideia de levar o cadáver skrull para Tony Stark, mas ninguém aprova. Em meio a uma turbulência, o avião dos Novos Vingadores cai e Jessica Drew rouba o corpo do Skrull para levar ao Homem de Ferro e se alia aos Poderosos Vingadores, o grupo sancionado pelo governo americano. Luke Cage já não confia mais na esposa que acabou de voltar do Canadá. Depois de revelar a Jessica Jones tudo que aconteceu, o Doutor Estranho faz uma varredura mágica nas intenções de todos os Vingadores e todos são quem afirmam ser. Mas a paranoia não se desfaz. Enquanto isso, em Os Novos Vingadores #35 (In: BENDIS, 2013b) vemos a ascensão de um dos maiores vilões do grupo durante a fase – o Capuz. Aproveitando o racha e a perseguição interna entre os dois grupos de Vingadores e o seu manto mágico recém-adquirido, Parker Robbins aproveita para unir todos os vilões de segundo escalão para atacar a cidade. Mas Wolverine já o observava há algum tempo e o leva a uma emboscada. Durante a batalha, Doutor Estranho percebe que a origem mística do manto do Capuz não vem deste mundo e que ela é mais poderosa do que Robbins acredita. Depois de os Vingadores prenderem alguns poucos vilões na Balsa, o Capuz os liberta novamente e clama por vingança. Em Os Novos Vingadores Anual #2 (In: BENDIS, 2013b), Capuz e sua gangue atacam de surpresa a casa do Estranho que é obrigado a conjurar magia das trevas para ganhar a batalha. Envergonhado por sua arrogância, Stephen Strange se retira do plano material e os Novos Vingadores perdem um de seus mais poderosos membros. Ao final da edição, cansada de constantes fugas e da paranoia entre seus amigos, Jessica Jones decide se entregar e assinar seu registro como uma super-humana e se muda para a torre dos Poderosos Vingadores.

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4.2.5 OS ILLUMINATIS Concomitante a paranoia Skrull, Bendis inicia uma nova minissérie. Intitulada Os Novos Vingadores: Illuminati (2008b), a história conta como os mais importantes super-humanos da Terra se uniram ao fim da Guerra Kree-Skrull45. Reunidos, o grupo foi rumo ao Planeta Imperial Skrull dar um aviso de que a Terra não toleraria novas intrusões de seu povo. O plano de fuga da equipe não deu certo e eles acabaram sendo feitos prisioneiros e cobaias científicas dos alienígenas. Talvez tenha sido nesse ponto que o monarca inumano Raio Negro fora substituído. De acordo com a narração de Tony Stark em Invasão Secreta: Saga (THOMAS, 2009b), o que estava em jogo durante a Guerra Kree-Skrull era importante demais para os heróis enfrentarem novamente sem preparo. Juntos, eles moldariam secretamente o mundo para que fosse um lugar seguro para todos. Com representantes de cada núcleo de poder do universo Marvel, o grupo continuou interferindo nos bastidores sem que ninguém soubesse. Namor representava os atlantes; Raio Negro, os Inumanos; Charles Xavier, os mutantes; Stephen Strange, as forças místicas; Reed Richards, a ciência; e finalmente, o Homem de Ferro representava os Vingadores. Anos depois, Tarnax IV, o planeta império Skrull foi destruído pelas mãos de Galactus e dezenas de outros mundos skrulls foram consumidos pelo Aniquilador. Toda uma raça estava fragmentada, enfraquecida e desabrigada e, para eles, a Terra parecia um verdadeiro oásis de tranquilidade. Então eles começaram a se infiltrar.

4.2.6 INVASÃO SECRETA Com a revelação de que a Elektra era na verdade um skrull, toda a comunidade super-heroica se desesperou. Os Illuminatis buscavam uma solução para identificar outros infiltrados, quando Raio Negro mostrou ser um deles. O skrull revelou que eles queriam tomar a Terra como seu novo lar e que isso era uma promessa bíblica. Foi preciso um incidente nuclear em pequena escala para derrubar ele e mais dois super-skrulls que apareceram de reforço. Com esse ataque ao grupo mais secreto do mundo, toda a confiança que existia entre os superseres havia acabado. Com a suspeita tomando conta dos

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Publicada em Avengers #97 de 1972.

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heróis, todo o planeta estava condenado. E foi então que uma nave Skrull caiu na Terra Selvagem. Em entrevista a John Thomas (2009b) da Marvel Spotlight, Bendis afirma o exato momento que pensou nos skrulls como inimigos perfeitos e de onde veio sua inspiração: Estamos num mundo pós-Guerra Fria, mas agora, depois do 11 de Setembro, existe um tipo diferente de medo no mundo. A gente entra num avião e não sabe quem é quem. Sabe como é, não dá pra evitar. Aí achei que isso dava jogo.

Ao chegarem à Terra Selvagem, os Novos Vingadores se encontram com os Poderosos Vingadores e se preparam para o confronto. Quando, na Torre Stark, Jarvis, o mordomo dos Poderosos Vingadores, infecta a rede da Starktec com um vírus que atinge tanto o Homem de Ferro, quanto as instalações e prisões da SHIELD. Enquanto Tony Stark convulsionava, a nave Skrull abria as portas revelando versões antigas dos heróis mais poderosos da Terra. Nos laboratórios Stark, Reed Richards e Hank Pym estudavam o corpo da falsa Elektra quando de repente Pym atirou em Reed e revelou sua forma skrull original. Os dois times de Vingadores estavam ocupados lutando contra suas cópias na Terra Selvagem ao mesmo tempo em que a ilha de Manhattan era invadida.

Figura 13 – Vingadores contra Skrulls Fonte: BENDIS, 2012b. Arte de Leinil Yu.

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Enquanto a história principal se desenvolvia na minissérie, Bendis a revista dos Vingadores para mostrar alguns episódios anteriores do ponto de vista dos invasores e mostrar como ocorreu a troca de alguns heróis por suas cópias skrulls.

4.2.6.1 DETALHES DA INVASÃO Em Os Novos Vingadores #42 (In: BENDIS, 2009b) temos a história de como a Rainha Verankee tomou o lugar de Jessica Drew antes da formação dos Novos Vingadores e como os mutantes eram um problema para a invasão. Também descobrimos que a facção corrupta da SHIELD que apareceu no começo da série também eram skrulls disseminando a desconfiança entre os agentes. Em Os Poderosos Vingadores #16 (In: BENDIS, 2010a) descobrimos quem estava por trás do ataque à Balsa que uniu os Novos Vingadores. Era um skrull disfarçado como Elektra que contratou Max Dillon para criar uma distração. Aqui, fecha-se o mistério mais antigo dessa fase. Na mesma edição, vemos como a Elektra original percebeu a invasão antes de todo mundo, mas foi substituída antes de conseguir contar aos Vingadores. Descobrimos em Os Poderosos Vingadores #14 (In: BENDIS, 2010a) que o Sentinela era o motivo pelo qual o ataque ainda não tinha acontecido após a Dinastia M. Bob Reynolds era poderoso demais para ser duplicado ou mesmo raptado. Os skrulls decidiram esperar ele se autodestruir, graças a sua instabilidade mental, e o problema se resolver por si só. Aliás, grande parte do plano estava se resolvendo sozinho. A Guerra Civil havia divido a comunidade super-heroica, Thor havia morrido e a Feiticeira Escarlate estava desaparecida. Tudo que eles deveriam fazer para deter o Sentinela era se transformarem no Vácuo, sua contraparte maligna, e incapacitá-lo psicologicamente, assim como foi feito em Invasão Secreta #2 (In: BENDIS, 2012b).

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Figura 14 – O Sentinela é retirado da batalha Fonte: BENDIS, 2012b. Arte de Leinil Yu.

4.2.6.2 A QUEDA DE TONY STARK Tony Stark, o vingador conhecido como Homem de Ferro e também o atual diretor da SHIELD, havia feito tantas modificações em sua armadura e tecnologia que, na época, era praticamente uma máquina viva. Com melhoramentos em níveis biológicos, sua armadura era como uma extensão de seu próprio corpo. Sua tecnologia era como seu organismo; e agora ela estava infectada. Refugiado nas ruínas de uma cidadela, Stark pediu a Carol Danvers, a Miss Marvel, para comandar os super-heróis restantes e retardar a invasão enquanto ele reconstruía uma versão mais simples de sua armadura.

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Enquanto isso, a Mulher-Aranha encontra com Maya Lopez e a ataca. Finalmente chegando ao local onde se encontra Stark, ela se revela a rainha Skrull e diz que Tony também é um. Além de sua biologia, a sanidade do Homem de Ferro agora também estava comprometida. Natasha Romanov, a Viúva Negra, consegue chegar a tempo de impedir um dano maior a mente de Stark. A Mulher-Aranha foge e Natasha dá uma injeção de adrenalina que estabiliza a condição de Tony. Mas ainda não é o suficiente. Eles precisam de Reed Richards. Em Nova York, o Capuz e seu bando não ficam nada satisfeitos com a invasão e decidem ajudar a impedi-la. Thor ressurge no cenário e um novo Capitão América – na verdade o antigo companheiro de Steve Rogers que havia voltado do mundo dos mortos – também aparece para ajudar. Na montanha dos Thunderbolts, Norman Osborn, o Duende Verde, reúne seu time de vilões regenerados para entrar em guerra também. Depois de se recuperar do ataque do falso Hank Pym, Reed constrói uma arma de identificação skrull e chega a Terra Selvagem. Finalmente os infiltrados seriam revelados e a batalha pode começar de verdade.

4.2.6.3 O RETORNO DE NICK FURY Os Poderosos Vingadores #12 (In: BENDIS, 2010a) nos revela por onde Nick Fury andou após o fim de sua guerra secreta. Um mês depois da revelação de sua guerra secreta, Fury, foragido no México, descobre que sua amante, a Condessa Valentina Defontaine, é uma agente infiltrada. Após um interrogatório infrutífero, ele a mata e descobre que ela é uma skrull. Duas semanas depois, preocupado com o destino do planeta, ele avisa a Comandante Maria Hill que tem algo errado e a deixa sob alerta. Dois meses depois, contata Jéssica Drew e a avisa da invasão alienígena. A partir daquele ponto, ele dá inicio ao Programa Lagarta. Em Os Poderosos Vingadores #13 (In: BENDIS, 2010a) ele pede para sua fiel escudeira, Daisy Johnson, entrar em contato com as outras “lagartas” e montar um time de heróis que ninguém conheça para que a confiança entre os membros seja completa. Com o time reunido, ele dá início ao treinamento. E eis que em Invasão Secreta #3 (In: BENDIS, 2012b), ele faz seu triunfal retorno em meio à grande batalha que está acontecendo na ilha de Manhattan. 51

Figura 15 – Nick Fury e suas “lagartas” Fonte: BENDIS, 2012b, p. 103. Arte de Leinil Yu.

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Sobre

o retorno de Fury, Bendis afirma: Nós o deixamos de lado desde Guerra Secreta até agora por algumas boas razões. Quando o tiramos, ele estava metido num plano depois do outro, e a coisa já estava ficando um pouco demais. Então, foi uma boa ideia deixá-lo pra lá, mas sempre com o intuito de trazê-lo de volta. Mas, quando ele voltar, tem que ser com um objetivo legítimo. (THOMAS, 2009b)

Mesmo fora da SHIELD, Nick Fury estava de volta ao cenário e era agora um importante aliado na guerra pela humanidade. Encerra-se aqui a participação dele na agência e fecha-se o arco sobre o seu desaparecimento. Depois disso, o personagem ainda continuou com seus Guerreiros Secretos por um tempo, mas depois de derrubar a HIDRA, que estava secretamente infiltrada na SHIELD, se aposentou do mundo heroico.

4.2.6.4 O TRIUNFO DE NORMAN OSBORN Assim que volta à Nova York, Thor invoca todos para o Central Park para a derradeira batalha. Heróis, anti-heróis e vilões estavam unidos a favor da Terra. A invasão terminava ali. Sem saber que Jarvis, o mordomo dos Vingadores também era um alienígena infiltrado, Jessica Jones deixa sua filha em seus cuidados e vai para a batalha. Em desvantagem na guerra, os Skrull usam seu último recurso – Janet Pym, a Vespa. Infectada com um agente biológico dado por seu marido que havia sido substituído, Janet agora era uma bomba-relógio. Thor foi o único capaz de detê-la, sendo obrigado a matar uma vingadora-fundadora. Agora, toda a humanidade estava mais enfurecida do que nunca. Quando Wolverine partiu para atacar mortalmente a rainha Skrull, um tiro finalizou a alienígena antes que ele chegasse lá. Norman Osborn, o arqui-inimigo do Homem-Aranha havia acabado com a invasão e salvado a Terra. O Homem de Ferro só chegou minutos depois para ajudar a derrubar as naves reminiscentes. Em uma delas, estavam todos os heróis que foram substituídos. Rejeitado por seus amigos devidos às suas ações durante a Guerra Civil e pela mídia devido a seu fracasso enquanto diretor da SHIELD, Tony Stark estava condenado e agora era o homem mais procurado do mundo. Norman Osborn é o novo herói nacional e é promovido a diretor da SHIELD, dos Vingadores e de todos os super-heróis da América. Assim que assume o poder, 53

em sua primeira reunião extraoficial, Osborn reúne uma cabala de supervilões – como uma espécie de Illuminatis do mal – para ditar as regras dessa nova era.

Figura 16 – Batalha no Central Park Fonte: BENDIS, 2012b, p. 103. Arte de Leinil Yu.

Figura 17 – A cabala de Norman Osborn Fonte: BENDIS, 2012b. Arte de Leinil Yu.

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4.2.7 REINADO SOMBRIO Com Osborn no poder e o Homem de Ferro fora do jogo, todos os maiores heróis se rebelaram contra o governo e se tornaram foragidos. Em Os Novos Vingadores #48 e #49 (In: BENDIS, 2009c), um novo time de Novos Vingadores clandestinos se forma. Composto por Wolverine, Homem-Aranha, o novo Capitão América, Punho de Ferro, Ronin, Luke Cage, Jessica Jones, Miss Marvel e as recém-chegadas Harpia e Mulher-Aranha – que estavam em cativeiro na nave Skrull – a primeira ação do time é revirar o submundo do crime até achar a bebê desaparecida do casal Cage-Jones. Depois de uma noite infrutífera de buscas, Luke toma uma decisão desesperada e pede ajuda a Norman Osborn. Com os recursos certos, Norman acha a bebê, mas é traído por Cage que foge sem cumprir seu acordo de cooperação. O primeiro ato de Norman Osborn (In: BENDIS, 2013c) no poder é derrubar SHIELD e a reformular como o MARTELO. Ele também se apropria das armaduras abandonadas de Tony Stark e constrói para si o traje de Patriota de Ferro. Norman promove seus Thunderbolts e cria seus próprios Vingadores Sombrios, versões deturpadas dos heróis de outrora encarnadas por vilões e anti-heróis. Dos poderosos Vingadores, somente Ares, o deus da guerra, permanece. O novo time é formado pelo Mercenário, arqui-inimigo do Demolidor, que vira um novo Gavião Arqueiro; Rocha Lunar como Miss Marvel; Venom como Homem-Aranha; Daken, o filho do Wolverine, assume o manto do pai; Noh-Varr é coagido a ser o novo Capitão Marvel; e o Sentinela migra de time graças à promessa de Osborn de manter o Vácuo sobre controle; além, é claro, do próprio Norman como o Patriota de Ferro, uma amálgama do Homem de Ferro com o Capitão América. Com o anúncio dos Vingadores Sombrios na televisão, os Novos Vingadores declaram guerra. Derrubar Norman Osborn não poderia ser feito de outra forma senão através de trapaça. Em Novos Vingadores #50 (In: BENDIS, 2009c) O grupo manda a Mulher-Aranha procurar os Vingadores Sombrios para uma falsa cooperação em troca de proteção. Depois que Drew os leva a uma embosca e os Novos Vingadores se preparam para uma batalha, quem chega para combatê-los é um time de vilões enfurecidos comandados pelo Capuz. Norman havia usado sua cabala como vantagem e deixou os heróis condenados enquanto assistia a batalha. 55

Depois de uma longa luta, Clint Barton vai à rede nacional e declara que os Vingadores do governo não passam de assassinos e psicopatas e que parece que a América se esqueceu disso. Também revela que Norman tem todo o submundo de Nova York em suas mãos e que o governo está patrocinando os bandidos em vez dos heróis. Convocando o repúdio de todos os cidadãos, Clint declara que haverá retaliação por parte de seus Vingadores. Na primeira missão oficial dos Vingadores Sombrios (In: BENDIS, 2013c) eles lutam contra Morgana Le Fey, a antiga mestra do Doutor Destino em um ato de boa vontade a favor da cabala de Osborn. Bob Reynolds, o Sentinela é explodido durante a batalha e morre. Depois de derrotarem Morgana, os Vingadores Sombrios voltam à Torre Stark e lá está o Sentinela, como se nada tivesse acontecido. Norman descobre que foi o Vácuo que trouxe o Sentinela de volta, mas o acalma e tudo fica bem. Sabendo da afronta de Barton em rede nacional, Osborn dá uma entrevista onde rebate todos os argumentos do Ronin alegando que ele também era um criminoso no passado e que se regenerou com o tempo. Usando de uma retórica forte, Norman passa a imagem de um homem completamente regenerado e mudado, colocando todos os heróis como invejosos que se sentiram mal por um novo homem entrar no poder. Somente durante a entrevista, Noh-Varr descobre que seus companheiros são criminosos e decide abandonar o grupo. Depois de um ataque inesperado de uma facção Atlante a Los Angeles, a aliança da cabala sombria de Norman fica abalada e o Duende Verde começa a conversar novamente com Osborn. O segundo arco dos Novos Vingadores nessa fase começa na edição #51 (In: BENDIS, 2009d) e mostra Stephen Strange pagando por sua arrogância e perdendo o posto de mago supremo após sucessivos ataques místicos do Capuz. Ao final da saga, o Irmão Vodu se torna o novo mago supremo do Universo Marvel. No terceiro arco (In: BENDIS, 2010b), uma guerra entre a gangue do Capuz e Norman Osborn põe os Vingadores no meio da batalha e Luke Cage quase é morto no confronto. Com saída de dois membros importantes da cabala, Osborn pretende acabar de vez com as ameaças a seu governo fazendo uma lista de alvos, incluindo os poucos mutantes remanescentes o que, futuramente, afetaria sua relação com Emma Frost e Namor, que faziam parte de sua cabala. Um crossover relacionado 56

chamado Utopia X (In: FRACTION, 2010), mostra o conflito entre os vingadores sombrios, mutantes e atlantes e a derrota do time de Norman. Cansado da situação caótica que o mundo se encontra, Clint Barton decide assassinar Norman Osborn (In: BENDIS, 2011b). Sem o apoio dos amigos, Clint foge no meio da noite, munido de armamento pesado, e derruba os vingadores sombrios um a um até chegar a Osborn. Prestes a concluir seu plano, Clint é atacado por Ares e Norman declara voz de prisão ao Ronin.

Figura 18 – Clint Barton é preso Fonte: BENDIS, 2011b. Arte de Marko Djurdjevic.

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Pela manhã, Harpia se dá conta do sumiço do ex-marido e organiza uma missão de resgate. Barton está sendo torturado psicologicamente por Mentallo, a mando de Osborn, que tenta a todo custo descobrir a identidade secreta dos novos Vingadores. No final, depois de resgatar o companheiro, o time recebe a visita inesperada do recém-ressurgido Steve Rogers, o Capitão América original que os convoca para a derradeira batalha contra Norman e seu reinado sombrio. No penúltimo arco dos Vingadores sombrios (In: BENDIS, 2013c), depois de uma batalha contra o Homem Molecular, o Sentinela toma ciência de todo o seu poder e se torna invencível. Também descobrimos aqui que a loucura de Osborn (e por consequência, o ressurgimento do Duende Verde) era influência direta de um membro de sua própria cabala: Loki.

4.2.8 O CERCO Em O Cerco: Prólogo (In: BENDIS, 2010c), com sua cabala cada vez mais deficiente Osborn faz a primeira substituição do grupo. Graças ao evento ocorrido em Utopia X, saem Namor e Emma Frost e entra o Treinador em seu lugar. Inconformado com a presença de alguém inferior e com os ataques de Norman ao povo atlante, Dr. Destino ordena que o Patriota de Ferro cesse os ataques ao rei Namor. O clima da conversa esquenta e Doom é atacado por um vulto misterioso que mais tarde se revela como o Vácuo. Por sorte, não é o verdadeiro Doom que estava na reunião e sim um de seus Destinobôs, algo semelhante aos modelos de vida artificial de Nick Fury. Como últimas palavras Doom avisa que se Osborn atacar a Latvéria, ele não hesitaria em retaliar. Em Vingadores Sombrios #13 (In: BENDIS, 2011c) descobrimos que assim que chamou Bob para seu time, Osborn também ofereceu para ele uma reprodução da fórmula que o transformou no Sentinela. Sua esposa Lindy, ao observar o aumento exponencial de poder do marido, se desespera e tenta matá-lo com a arma do Capitão Marvel. Caído no chão, Bob Reynolds se transforma em algo mais poderoso que o Vácuo e ameaça Lindy. Mas a consciência do herói fala mais alto e, retomando o controle de seu corpo, ele segue rumo ao sol para um suicídio definitivo. Na órbita da Terra, o Vácuo reassume o controle do corpo em e pede para que ele fique no controle agora. Fraco, Bob aceita.

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O Vácuo ameaça toda a cidade de Nova York em Vingadores Sombrios #14 (In: BENDIS, 2011c), mas é contido pelo amor de Bob Reynolds pela esposa. Osborn intervém ao ataque e diz que se o Vácuo perder o controle dessa forma alguém terá que matá-lo e que é isso que Bob quer. O Vácuo aceita recuar e desvia rapidamente o olhar para Lindy e Norman percebe isso. Ao final da edição, o líder dos Vingadores sombrios dá uma ordem para o Mercenário: matar a mulher do Sentinela. Na edição seguinte, o Mercenário mata Lindy e, por isso, quase é morto pelo Sentinela. Depois de controlar a situação mais uma vez, Osborn manda sua secretária Victoria Hand informar à imprensa que o time sofreu um ataque Latveriano para encobrir os atos do Sentinela. Atormentado por todos os acontecimentos recentes e pela voz imperativa do Duende Verde em sua mente, Norman propõe ao presidente americano um ataque a Asgard, a morada dos deuses que paira sobre o estado de Oklahoma. O presidente nega e veta qualquer tipo de ataque aos deuses nórdicos. Em uma conversa particular com Loki, o deus da trapaça relembra que para algo maior acontecer só basta um estopim, assim como ocorreu na guerra civil. Norman pede, então, ajuda ao Capuz e entrega-lhe as pedras das Nornes que conseguiu de Loki – itens de grande força mágica capazes de amplificar os poderes de quem as detêm. O Capuz manda seus subordinados atraírem Volstagg, um dos três guerreiros asgardianos, ao estádio Soldier Field para um ataque intensivo. Encurralado e sem pensar nas consequências, Volstagg revida o ataque e faz com que a energia liberada destrua o estádio e mate todos os ali presentes. Osborn agora tinha um motivo para retaliar. O Patriota de Ferro pede para sua secretária avisar ao presidente do ataque enquanto traça um plano de invasão a Asgard com Ares. Desconfiado, Ares promete matar Norman caso descubra que está sendo enganado mais uma vez. Com todo o time desacreditado de suas intenções, Osborn promete anistia e liberdade a todos após a invasão e ataca a cidade flutuante. Nem mesmo Thor consegue deter o Sentinela e é nocauteado. Steve Rogers vê tudo pela TV e promete não deixar o ataque ao deus do trovão sem troco. Steve chega ao local e reúne os novos vingadores, os guerreiros secretos de Nick Fury e os jovens vingadores para um ataque massivo. As diferenças entre os 59

grupos não importam e os heróis tinham que se unir agora antes que um desastre maior acontecesse. No meio da batalha, Ares encontra Heimdall, o observador de Asgard que o conta a verdade sobre o ataque. Furioso, Ares parte para cima de Norman Osborn, mas antes de conseguir tocá-lo, o Sentinela se coloca na frente do líder. Possesso, Bob não quer conversa e na primeira oportunidade rasga Ares ao meio como se fosse um simples pedaço de papel. Chocados com a situação, os heróis ficam imóveis. Bucky entrega o escudo do Capitão América para Steve Rogers que precisa liderar naquele momento. Jarvis entrega uma maleta a Steve afirmando que pode ser útil a um amigo e Thor, recobrando a consciência, ataca Daken. Norman manda o Sentinela atrás de Thor, e antes que possa perceber, Steve Rogers o ataca frontalmente.

Figura 19 – O retorno do Capitão Fonte: BENDIS, 2010c. Arte de Olivier Coipel.

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4.2.8.1 ACERTOS DE CONTAS Célere leva a maleta a um recém-recuperado Tony Stark que está nas imediações da cidade. Durante a luta entre Thor e Sentinela, o deus asgardiano percebe que Bob Reynolds não está mais no controle e que o Vácuo é que tem coordenado as ultimas ações do Sentinela. Desesperado, Osborn declara voz de prisão a Steve Rogers, mas vê sua armadura desativada pelo Homem de Ferro, que agora usa uma versão mais antiga do traje. Norman ordena que o Sentinela ponha Asgard abaixo e isso é feito. Ensandecido e sem o traje, Osborn cai e todos os heróis veem seu rosto pintado de verde demonstrando cada vez mais sua loucura e insanidade. Ele declara que todos ali vão morrer, porque o Vácuo já está completamente fora de controle. O Cerco #4 (In: BENDIS, 2010c) começa com uma narração de Loki, irmão de Thor, lamentando o que aconteceu à cidade dourada de Asgard. Pedindo perdão a seu falecido pai Odin, Loki retoma as Nornes e as redistribui para os heróis que estão lutando contra Norman. Em desvantagem, Capuz e seu bando abandonam o local. Enquanto Loki pede perdão a seu irmão Thor, o Vácuo sente que o aumento de poder dos inimigos é fruto de trapaça e ataca mortalmente o deus da trapaça, eliminando também as pedras das Nornes. Ainda abalados pela perda, Thor e Homem de Ferro planejam uma ação coordenada: Thor repele o Vácuo até o meio do deserto e, longe da população, Tony Stark derruba o aeroporta-aviões do MARTELO em cima do inimigo. Aproveitando a confusão, Norman Osborn tenta fugir, mas é impedido por Volstagg. Em meio à destruição, os heróis encontram um fragilizado Bob Reynolds que alega não se lembrar de nada do ocorrido. Bob implora para que tirem sua vida enquanto ele ainda está fraco, mas Thor nega o pedido alegando que ele tem que pagar por tudo que fez. Mas logo o Vácuo começa a tomar de volta o controle sob o corpo do Sentinela e Thor se vê obrigado a sacrificá-lo com seus raios. O deus do trovão então leva o corpo sem vida de Bob Reynolds a órbita do sol e encerra de uma vez por todas o sofrimento do herói antes conhecido como Sentinela. Com a humilhação de Norman Osborn e o fim da batalha, todos os Vingadores Sombrios ali presentes são presos, incluindo o seu líder.

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Vendo através da televisão as consequências do cerco à Asgard (In: BENDIS, 2011b) o Capuz entra em desespero. Sem poderes e sem a ajuda de Norman, ele era só mais um bandido comum, alvo fácil para os Vingadores. Alguns dias depois, o presidente americano convoca Steve Rogers e lhe oferece o cargo de diretor da SHIELD. O antigo Capitão América aceita com algumas condições impostas incluindo a revogação da lei de registro dos superhumanos. Como os heróis da Terra não pouparam esforços para proteger Asgard, Thor reassume o seu lugar no time e deixa para trás todas as desavenças antigas com a equipe. Os Vingadores estavam unidos mais uma vez e finalmente chegava ao fim o reinado sombrio de Osborn.

Figura 20 – Vingadores reunidos Fonte: BENDIS, 2010c. Arte de Olivier Coipel.

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Em Vingadores Sombrios #16 (In: BENDIS, 2011c), a última edição da revista, vemos o prólogo da batalha por Asgard. Norman é preso e levado à Balsa, o local que reuniu os novos Vingadores pela primeira vez. Karla, a Miss Marvel sombria, e o Mercenário são detidos nos escombros da cidade nórdica. Daken, o Wolverine sombrio consegue fugir. Steve Rogers absolve Victoria Hand, a secretária pessoal de Osborn e a chama para trabalhar em uma nova equipe de Vingadores. No fim, vemos Osborn sozinho lamentando em sua cela dizendo que “ele”, o Duende Verde, o havia atrapalhado mais uma vez em seu plano perfeito. Quase todos os principais vilões estavam presos. Só faltava o Capuz.

4.2.8.2 TRIUNFO Em New Avengers Finale (In: BENDIS, 2011b) vemos os Vingadores prendendo todos os envolvidos no cerco a Asgard, incluindo os capangas do Capuz que dão facilmente todas as informações do ex-chefe como vingança pelas promessas que Parker Robbins fez e não cumpriu. Madame Máscara juntamente com Robbins, foi atrás de seu pai pedindo ajuda, mas os três foram encurralados pelos Vingadores e presos. Naquele momento, com a ascensão de Steve Rogers ao poder, a revogação da lei de registro dos super-humanos e a prisão do último vilão da equipe, os Vingadores estavam livres e haviam encerrado em sua história.

Figura 21 – Vingadores livres Fonte: BENDIS, 2011b. Arte de Olivier Coipel.

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4.2.9 EPÍLOGO: A ERA HEROICA E com o fim da primeira fase Brian Michael Bendis à frente do grupo, uma nova fase se iniciou: a Era Heroica. Como esta não é foco desse estudo, farei um breve resumo das questões que ainda estavam pendentes da primeira fase e que o autor resolveu na segunda. A amizade de Tony Stark, Steve Rogers e Thor foi reestabelecida em Avengers Prime46, minissérie em cinco partes que mostrou os três vingadores primordiais em uma aventura juntos, acertando todas as diferenças que tiveram nos últimos anos. Depois tivemos a morte do Irmão Vodu em New Avengers vol. 2 #647 e a volta de Stephen Strange como o mago supremo do universo. A Feiticeira Escarlate também teve uma redenção na megassaga Vingadores VS X-Men48 e, juntamente com Esperança Summers, quebrou a magia que impedia novos mutantes de nascerem. Finalmente, no último arco da revista descobriu-se que a Vespa não havia de fato morrido durante Invasão Secreta, mas sim, havia sido enviada para um mundo subatômico e desde então se perdera por lá. No fim, a vingadora foi resgatada e voltou ao cenário principal da equipe.

4.3 A JORNADA DOS VINGADORES Como pudemos ver, a narrativa de Bendis, assim como da maioria dos autores de quadrinhos de ação, se vale de pequenos arcos que, em conjunto, formam uma grande história. Se lermos cada pequeno capítulo por si só, veremos características fortes das novelas, mas ao pegar o todo também é possível ver atributos dos romances abertos. Os quadrinhos de ação são histórias em constante construção, sempre sendo revisitadas e reorganizadas. É um subgênero que nunca cansa de inserir novos elementos, revisitar o passado e planejar cada vez mais o futuro. Além disso, em cada arco é possível notar alguns passos da jornada do herói e todos os passos se analisarmos a fase como uma única história.

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BENDIS, Brian Michael. Avengers: Prime. USA: Marvel Comics, 2011a. ______. New Avengers, Vol. 1. USA: Marvel Comics, 2011b. 48 ______ et al. Avengers VS X-Men. USA: Marvel Comics, 2013. 47

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A queda, por exemplo, seria a apresentação do mundo comum e o chamado à aventura. A Guerra secreta é a recusa do chamado, com todos os Vingadores separados e evitando ao máximo uma grande batalha. A reunião é o encontro com o mentor – no papel de Capitão América que propõe a reunião do grupo –, a travessia do primeiro limiar e os testes, aliados e inimigos. Toda a trama da facção clandestina da SHIELD e do Sauron são os testes; a junção de personagens como o Wolverine e a Eco no grupo representam os aliados; e todos os vilões fugitivos da Balsa são o inimigo. Dinastia M retoma o perigo da Feiticeira Escarlate e nos aproxima da caverna oculta. A Guerra civil é a provação que testa os princípios morais e éticos de todos os super-heróis com a sua lei de registro. A fase dos vingadores clandestinos é o caminho de volta da guerra civil tentando fazer o bem mesmo enquanto são perseguidos. O cerco representa a ressurreição, o último recurso do bem contra o mal e a vitória de uma investida desesperada. E, por último, a era heroica é o retorno com o elixir. Elixir que, neste caso, representa a união do grupo de forma oficial contando mais uma vez com o apoio do governo, além da restauração e da reafirmação da heroicidade de todos os integrantes. E agora, de volta a um novo mundo comum, os Vingadores estão prontos para novas aventuras.

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CONCLUSÃO

A estruturação dos quadrinhos de ação é eficaz no que se propõe enquanto literatura de massa. Sua narrativa híbrida das artes plásticas com a literatura confere a história um ritmo mais dinâmico que atrai os jovens leitores, sua estrutura e a disposição cíclica de suas células dramáticas renovam constantemente a história sem precisar de mudanças drásticas que persistam a longo prazo, e sua inspiração na jornada do herói confere um ar épico às tramas que aproxima ainda mais os que preferem os moldes clássicos fabulares. Os diversos inícios e fins durante os arcos de histórias representam para os leitores constantes portas de entrada ou saída para aquela trama. Assim, é possível conquistar novos leitores, manter outros e oferecer uma pausa aos mais antigos a todo instante, sem obrigá-los a acompanhar a história até o seu efetivo final. E, quando quiserem acompanhar novamente seus títulos favoritos, os heróis estarão mais ou menos da mesma forma como eles se lembram. Ao mesmo tempo em que muita coisa terá mudado, nada terá mudado de forma tão drástica que seja impossível de acompanhar. Talvez a tentativa de encaixar os quadrinhos em gêneros e estilos préexistentes seja improdutiva. A arte sequencial já encontrou o seu estilo próprio há alguns anos, tão pós-moderno quanto ela mesma. Mutável, inconstante e eclética, cabe agora somente acompanharmos suas características em constante evolução pelos próximos anos.

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_______. Guerra secreta. Tradução de: Jotapê Martins & Fernando Lopes. São Paulo: Salvat, 2013a. _______. Os novos vingadores: revolução. Tradução de: Marcelo Soares & Fernando Lopes. São Paulo: Panini Books, 2013b. _______. Vingadores sombrios. Tradução de: Fernando Lopes & Paulo França. São Paulo: Panini Books, 2013c. CAGNIN, Antônio Luís. Yellow Kid, o moleque que não era amarelo. In: Comunicação & educação Vol.3, Nº7. São Paulo: USP, 1996. Disponível em: . Acesso em 18/04/2014. CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. Tradução de: Adail Ubirajara Sobral. São Paulo: Cultrix/Pensamento, 2000. D’ONOFRIO, Salvatore. Forma e sentido do texto literário. São Paulo: Ática, 2007. EISNER, Will. Quadrinhos e arte sequencial: princípios e práticas do lendário cartunista. São Paulo: Martins Fontes, 1989. FOLHA DE SÃO PAULO. Adaptações para hqs aproximam jovens de clássicos da literatura. 2012. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/folhateen/1147300-adaptacoes-para-hqs-aproximamjovens-de-classicos-da-literatura.shtml >. Acesso em 16/04/2014. FRACTION, Matt. Dark avengers/uncanny x-men: utopia. USA: Marvel Comics, 2010. HOWE, Sean. Marvel Comics: a história secreta. Tradução de: Érico Assis. São Paulo: LeYa, 2013. MILLAR, Mark. Guerra civil. Tradução de: Jotapê Martins. São Paulo: Panini Books, 2010. MOISÉS, Massaud. Dicionário de termos literários. São Paulo: Cultrix, 2004. NICOLAU, Vitor. Tirinhas & mídia digital: a transformação deste gênero pelos blogs. João Pessoa: Marca de Fantasia, 2013. Disponível em: < www.insite.pro.br/elivre/Vitor_Nicolau_PC.pdf >. Acesso em 16/04/2014. PLATÃO. A república. São Paulo: Martin Claret, 2002. PROENÇA FILHO, Domício. A linguagem literária. 8ª ed. São Paulo: Ática, 2007. PROPP apud D’ONOFRIO, Salvatore. Forma e sentido do texto literário. São Paulo: Ática, 2007. SANTOS, Jair Ferreira dos. O que é pós-moderno. São Paulo: Brasiliense, 2012. SOARES, Angélica. Gêneros literários. 7ª ed. São Paulo: Ática, 2007. 68

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