A ÉTICA DA LIBERDADE COMO FUNDAMENTO DA TUTELA JURÍDICA DOS DIREITOS DA LIBERDADE

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Artigo publicado no livro Ética e direitos fundamentais: estudos em memória do Prof. Washington Luís Cardoso da Silva. Coordenação: José Maria Eiró Alves. Rio de Janeiro: Editora GZ, 2014, p. 85-119. (ISBN: 978-85-62027-57-4) A ÉTICA DA LIBERDADE COMO FUNDAMENTO DA TUTELA JURÍDICA DOS DIREITOS DA LIBERDADE Paulo Mauricio Sales Cardoso1 RESUMO: A ética é a ciência do comportamento humano direcionado ao bem; a liberdade o exercício responsável das próprias razões pelos seres humanos. A ética da liberdade representa o fundamento do eixo dos direitos fundamentais que se contrapõem ao arbítrio do Estado frente aos respectivos súditos, que garantem à plena realização do indivíduo enquanto sujeito de direitos inerentes à própria condição humana. Na atualidade, os chamados direitos da liberdade transcenderam a esfera pública e passaram a influenciar as relações tipicamente privadas. Seu exercício impõe a cada um a responsabilidade de respeitar a liberdade alheia.

PALAVRAS-CHAVE: Ética. Liberdade. Ética da liberdade. Direitos fundamentais. Princípio da legalidade. Liberdade de expressão. Liberdade de crença. Liberdade de locomoção. Liberdade de profissão. Liberdade de produção artística e científica. Liberdade de associação. Liberdade de reunião. Direito de resistência.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. A ÉTICA. 3. A LIBERDADE. 4. A ÉTICA DA LIBERDADE. 4.1. Os direitos da liberdade na doutrina estrangeira. 4.2. Os direitos da liberdade na doutrina brasileira. 5. A TUTELA JURÍDICA DOS DIREITOS DA LIBERDADE NO BRASIL. 6. OS DIREITOS DA LIBERDADE. 6.1. Princípio da legalidade. 6.2. Liberdade de expressão. 6.3. Liberdade de crença. 6.4. Liberdade de locomoção. 6.5. Liberdade de profissão. 6.6. Liberdade de produção artística e científica. 6.7. Liberdade de associação. 6.8. Liberdade de reunião. 6.9. Direito de resistência. 7. CONCLUSÃO. 8. BIBLIOGRAFIA.

1. INTRODUÇÃO A ética e a liberdade são institutos distintos, mas possuem elementos comuns em linha direta na medida em referem uma conduta positiva – voltada para o bem – e responsável – centrada na satisfação do ser humano e daqueles com quem convive. Nesse contexto, a ética da liberdade representa um valor que está na base de sustentação dos direitos da liberdade, um dos eixos temáticos dos direitos fundamentais – ao lado dos direitos da igualdade e da fraternidade – e um dos elementos fundantes do Estado Democrático e Social de Direito. Falar em direitos da liberdade implica em reconhecer a força da convicção das ideias, palavras e ações. Seu exercício responsável, entretanto, impõe o reconhecimento de limites; exige tolerância e respeito em relação à pessoa alheia.

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Possui graduação em Administração Postal pela Escola Superior de Administração Postal (1981), graduação em Direito pelo Centro de Estudos Superiores do Estado do Pará (1986) e mestrado em Direito pela Universidade Federal do Pará (2000). Atualmente é Analista Jurídico do Ministério Público do Estado do Pará e Professor Adjunto da Universidade da Amazônia.

O presente ensaio se propõe a “navegar pelas águas nem sempre tranquilas” da ética da liberdade enquanto fundamento dos direitos da liberdade, buscando no espaço e no tempo as bases para a contextualização do tema na sociedade brasileira dos dias atuais, pela visão e experiência de filósofos e juristas que se atreveram a buscar nela os fundamentos para a concretização do ideal de justiça. Por opção didática, estudar-se-á o tema sob a égide dos ordenamentos democráticos, não sendo consideradas, portanto, as Constituições de 1937, de 1967 nem a Emenda nº 1/69, consagradoras de regimes autoritários e que não respeitaram, em sua plenitude, as liberdades tradicionais de um Estado Democrático e Social de Direito. 2. A ÉTICA A ética compreende o estudo dos valores morais e princípios que conformam a conduta humana ideal, buscando pela via da razão encontrar modos de viver e conviver bem, seja no âmbito público, seja no privado. Embora esteja indissociavelmente interligada à moral, não se confunde com ela. É que a ética busca o fundamento de validade das ações morais exclusivamente no pensamento racional, enquanto a moral o faz considerando os costumes e hábitos transmitidos de geração à geração. Na doutrina de ARISTÓTELES (2001: p. 34), a ideia de ética foi construida a partir do agir humano virtuoso em busca da felicidade. Nesse sentido, a vida em sociedade seria fortalecida pela atuação virtuosa de seus cidadãos. E o Poder Público atento, criaria mecanismos de estímulo ao desenvolvimento das virtudes e da cidadania. Em suas reflexões, o célebre filósofo grego afirmou: “Por que, então, não dizemos que é feliz aquele que age conforme à vida perfeita e está suficientemente provido de bens exteriores, não durante um período de vida qualquer, mas por toda a vida? Ou deveríamos acrescentar: ‘E que está destinado a viver assim e a morrer de modo compatível com a vida que levou’? Com efeito, o futuro nos é impenetrável, enquanto a felicidade concebemos como um fim em si mesmo. Sendo assim, devemos qualificar de felizes aqueles dentre os seres humanos vivos em que as condições que mencionamos se realizem ou estejam destinadas a realizar-se – mas tudo isso obedecendo as limitações da natureza humana”. HUME (2003: p. 347-348) desenvolveu uma concepção de ética fundada na utilidade. A ação humana refletiria o bem na medida em que proporcionasse felicidade e satisfação social; e seria útil porquanto representaria uma tendência natural do ser humano à promoção da felicidade das pessoas de seu convívio. Nas palavras do citado autor: Pode com razão parecer surpreendente que alguém, nesta época tão tardia, julgue necessário provar por meio de elaborados raciocínios que o mérito pessoal consiste inteiramente

na posse de qualidades mentais úteis ou agradáveis para a própria pessoa ou para outros. Seria de esperar que esse princípio já tivesse ocorrido até mesmo aos primeiros rudes e despreparados investigadores da moral, e sido aceito por sua própria evidência, sem nenhum argumento ou disputa. Tudo o que tem alguma espécie de valor acomoda-se tão naturalmente à classificação de útil ou agradável – o utile ou o dulce – que não é fácil imaginar por que deveríamos levar a busca mais adiante, ou considerar a questão como tema de refinados estudos e investigações. E como tudo que é útil ou agradável deve possuir essas qualidades ou em relação à própria pessoa ou a outros, o completo delineamento ou descrição do mérito parece realizar-se tão naturalmente como a projeção de uma sombra pelo sol, ou o reflexo de uma imagem na água. Se o solo sobre o qual se lança a sombra não é irregular ou acidentado, nem a superfície na qual se reflete a imagem é trêmula ou agitada, uma figura correta apresenta-se imediatamente, sem nenhum artifício ou intervenção. E parece razoável supor que sistemas e hipóteses perverteram nossa faculdade natural de entendimento, ao vermos que uma teoria tão simples e óbvia conseguiu escapar por tanto tempo aos exames mais cuidadosos.

Diversas outras doutrinas sobre a ética se desenvolveram ao longo do tempo, buscando cimentar a conduta humana a partir de comportamentos bons e socialmente responsáveis, como consequência lógica e racional do conviver humano em sociedade. ABBAGNANO (2007: p. 442-451), sintetizou o tema em duas concepções fundamentais: a ética como fim da conduta humana e dos meios utilizados para alcançálos; e como repositório dos motivos, das causas, das forças que condicionam o agir das pessoas; ambas as concepções centradas no significado do bem. Nos seguintes termos: ÉTICA... Em geral, ciência da conduta. Existem duas concepções fundamentais dessa ciência: 1ª, a que a considera como ciência do fim para o qual a conduta do homem deve ser orientada e dos meios para atingir tal fim, deduzindo tanto o fim quanto os meios da natureza do homem; 2ª, a que a considera como a ciência do móvel da conduta humana e procura determinar tal móvel com vistas a dirigir ou disciplinar essa conduta. Essas duas concepções, que se entremesclaram de várias maneiras na Antigüidade e no mundo moderno, são profundamente diferentes e falam duas línguas diversas. A primeira fala a língua do ideal para qual o homem se dirige por sua natureza e, por conseguinte, da ‘natureza’, ‘essência’ ou ‘substância’ do homem. Já a segunda fala dos ‘motivos’ ou ‘causas’ da conduta humana, ou das ‘forças’ que a determinam, pretendendo ater-se ao conhecimento dos fatos. A confusão entre ambos os pontos de vista heterogêneos foi possibilitada pelo fato de que ambos constumam apresentar-se com definições aparentemente idênticas do bem... logo mostra a ambigüidade que ela oculta, visto que bem pode significar ou o que é (pelo fato de que é) ou o que é objeto de desejo, de aspiração, etc., e estes dois significados correspondem exatamente às duas concepções de E. acima distintas. De fato, é característica da concepção 1ª a noção do bem como realidade perfeita ou perfeição real, ao passo que na concepção 2ª encontra-se a noção de bem como objeto de apetite. Por isso, quando se afirma que ‘o bem é a felicidade’, a palabra ‘bem’ tem um significado completamente diferente daquele que se encontra na afirmação ‘o bem é o prazer’. A primeira asserção... significa: ‘a felicidade é o fim da conduta humana, dedutível da natureza racional do homem’, ao passo que a segunda asserção significa ‘o prazer é o móvel habitual e constante da conduta humana’.

No contexto da modernidade, diversos modelos teoréticos trataram do tema, quer revisitando os clássicos – neoaristotelismo de Arendt, Gadamer, Ritter, Bubner; poskantismo de Apel, Habermas; neocontratualismo de Rawls; neoutilitarismo de Hare, Harsany; posmodernismo de Vattimo, Rorty –, quer lançando-lhe novas luzes – a responsabilidade para com as gerações futuras de Jonas; o comunitarismo de Mac Intyre, Sandel, Tylor; entre outras. Em todas elas, um ponto em comum: o agir humano em sociedade é reflexivo, exige uma postura crítica quanto aos efeitos das decisões tomadas, pois a busca da felicidade e do prazer é uma ação interativa de natureza complexa, diretamente relacionada à satisfação de múltiplos interesses de pessoas diversas, portanto, de individualidades distintas, com visões díspares sobre os efeitos e as consequências de cada ato praticado. 3. A LIBERDADE A liberdade é um termo que está intimamente relacionado à ideia do ser humano integral, do sujeito de direitos inerentes à própria condição humana e que tem plena consciência disso. TEIXEIRA DE FREITAS (1983: p. 186-190) referenciou o dicionário de Pereira e Sousa para conceituar o termo: Liberdade, ou livre arbítrio, é uma indiferença ativa de contradição; ou o poder de escolher ou não escolher, querer ou não querer, amar ou não amar, fazer ou não fazer uma coisa, que exclui a necessidade, ou seja interior, ou seja exterior, ou de constrangimento. Diz-se – indiferença ativa – o poder de obrar, determinar-se, escolher; havendo três espécies de indiferença ativa: 1ª) de contradição, que consiste em querer, ou não querer, uma coisa; 2ª) de contrariedade, que é o poder de fazer o bem, ou o mal; 3ª) de disparidade, que é a faculdade de fazer uma coisa, ou outra diferente.

Felix E. Oppenhein desenvolveu a verbete “liberdade” no Dicionário de Política de BOBBIO e outros (1998: p. 708-713), oportunidade em que deu destaque ao conceito de liberdade social enquanto agir limitado pelos interesses da vida em sociedade: A palavra Liberdade tem uma notável conotação laudatória. Por esta razão, tem sido usada para acobertar qualquer tipo de ação, política ou instituição considerada como portadora de algum valor, desde a obediência ao direito natural ou positivo até a prosperidade econômica. Os escritos políticos raramente oferecem definições explícitas de Liberdade em termos descritivos: todavia, em muitos casos, é possível inferir definições descritivas do contexto. O conceito de Liberdade se refere com maior freqüência à Liberdade social... Liberdade social não é o pólo oposto de não-Liberdade social. Oficialmente, eu deixo de ser não-livre para pagar os impostos; apesar disso, também não sou livre para pagá-los; na realidade eu sou não-livre para me recusar a pagar. Uma relação de Liberdade diz respeito a uma série de no mínimo duas ações, ou a tipos de ações alternativas. Eu sou não-livre para fazer algo;

eu sou livre para fazer isto ou aquilo. Um ator é livre para agir da forma que mais lhe agrada, contanto que não exista outro ator que o torne não-livre para levar a bom termo algumas destas ações. Assim, com relação a B, A é livre para fazer x ou z na medida em que B não torne impossível ou passível de pena para A fazer x ou z. ‘Liberdade de voto’ significa Liberdade para votar ou para se abster; porém ‘liberdade de difusão da verdade’ significa não-Liberdade para a difusão de opiniões ‘erradas’. Além disso, eu posso ser livre para agir desta ou daquela maneira com relação a determinada pessoa ou grupo, enquanto outro ator pode me tornar não-livre para me dedicar a esta ou àquela atividade. Oficialmente, os americanos têm Liberdade de escolher uma religião ou de não aderir a nenhuma; porém, muitos americanos são não-livres no seu agnosticismo com relação a determinados grupos não oficiais que submetem os ‘ateus’ a todo tipo de sanção informal.

ABBAGNANO (ob. cit.: p. 699-705), iniciou sua exposição sobre liberdade listando distintos significados fundamentais: autodeterminação ou autocausalidade, necessidade e possibilidade ou escolha. Nos seguintes termos: ...Esse termo tem três significados fundamentais, correspondentes a três concepções que se sobrepuseram ao longo de sua história e que podem ser caracterizados na seguinte maneira: 1ª L. como autodeterminação ou autocausalidade, segundo a qual a L. é ausência de condições e de limites; 2ª L. como necessidade, que se baseia no mesmo conceito da precedente, a autodeterminação, mas atribuindo-a à totalidade a que o homem pertence (Mundo, Substância, Estado); 3ª L. como possibilidade ou escolha, segundo a qual a L. é limitada e condicionada, isto é, finita.

A liberdade, assim, pode ser expressa de forma negativa ou positiva. Negativamente, é entendida como a ausência de submissão, de servidão e de determinação do ser humano. Positivamente, designa a autonomia e a espontaneidade de um ser racional. A liberdade não é um campo aberto a ser percorrido de qualquer forma, sem observância de quaisquer limites; limites são estabelecidos em lei. Mas não é só. O exercício da liberdade exige responsabilidade; a responsabilidade de não causar, ainda que de forma não intencional, danos a terceiros; é a dicção do velho adágio popular, oriundo da doutrina kantiana: “A liberdade de um termina quando começa a liberdade de outrem”. 4. A ÉTICA DA LIBERDADE Se a ética refere o comportamento racional do ser humano direcionado ao bem, individual e coletivo, e a liberdade o agir consciente e responsável do livre arbítrio, do fazer sem agredir os interesses alheios, a ética da liberdade é o valor que está na base de sustentação da tutela jurídica dos direitos da liberdade. Com efeito, falar em ética da liberdade implica no reconhecimento de que o agir do ser humano em sociedade está necessariamente vinculado a certas e determinadas regras de conduta que, de um lado, permitem a busca da felicidade e do prazer com um mínimo de intervenção externa e, de outro lado, impõem restrições

tendentes a impedir o uso arbitrária das próprias razões em prejuizo de outrem. Destarte, a ética da liberdade, como já referido, é o valor que está na base de sustentação da tutela jurídica dos direitos da liberdade, da chamada primeira geração ou dimensão de direitos fundamentais que fez surgir os direitos individuais e políticos. Tal tutela, encerra limites impostos à atuação do Estado, resguardando direitos considerados imprescindíveis a cada ser humano individualmente considerado. Representa uma prestação negativa, um não fazer do Estado em prol do cidadão. Origina os direitos da pessoa humana, como, por exemplo, a liberdade de locomoção, de crença, entre outros. Com o passar do tempo, os direitos à liberdade ganharam nova conotação, de caráter objetivo: passaram a configurar prerrogativa de fazer ou deixar de fazer alguma coisa, desde que não acarrete prejuízos os direitos de terceiros, exercíveis, inclusive, no âmbito das relações tipicamente privadas2; não deixaram de representar, porém, limites à atuação do Estado – frente aos particulares – que somente pode fazer o que a lei expressamente autoriza. Assim sendo, é válido asseverar que o regime jurídico das liberdades nos dias atuais se fundamenta na ética da liberdade, valor do qual derivam diversos princípios liberais (legalidade, livre iniciativa...) consagrados pela ordem democrática e que se encontram na base doutrinária de sustentação do Estado Democrático e Social de Direito. 4.1. Os direitos da liberdade na doutina estrangeira No plano internacional, os direitos de liberdade foram e continuam sendo objeto da criteriosa análise de filósofos e juristas. BOBBIO (2004: p. 88 e 111-112) discorreu sobre o tema a partir das regras constantes da Declaração de Direitos da Revolução Francesa, o exercício da liberdade limitado não só pelas leis, mas pelo respeito aos interesses alheios: ... a liberdade... é definida como o direito de ‘poder fazer tudo o que não prejudique os outros’, que é uma definição diversa da que se tornou corrente de Hobbes e Montesquieu, segundo a qual a liberdade consiste em fazer tudo o que as leis permitam, bem como a definição de Kant, segundo a qual a minha liberdade se estende até o ponto de compatibilidade com a liberdade dos outros... A Declaração foi repetidamente submetida a críticas formais e substanciais. Quanto às primeiras, não lhes foi difícil descobrir contradições e lacunas. Logo de início, podemos ver que, dos quatro direitos enunciados, somente o primeiro, o direito à liberdade, é definido, mas não só no art. 3º, como o ‘poder de fazer tudo o que não prejudique os outros’, de onde deriva a regra do artigo seguinte, segundo o qual ‘a lei tem o direito de proibir somente as ações nocivas à sociedade’. No art. 5º, ao contrário, a liberdade é definida implicitamente como o direito de fazer tudo o que não é nem proibido nem ordenado, definição bem mais clássica, na qual a liberdade é entendida negativa 2

Sobre a eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas, vale referir a doutrina de ALEXY (2008), SILVA (2008) e DÜRIG, NIPPERDEY e SCHWABE (2012).

como ‘silencium legis’, ou seja, como o espaço deixado livre pela ausência de leis imperativas, negativas ou positivas. Essa segunda definição, diferentemente da primeira, é implícita, já que o texto se limita a dizer, de modo tortuoso, que ‘tudo o que não é proibido pela lei não pode ser impedido e ninguém pode ser obrigado a fazer o que a lei não ordena’. As duas definições divergem: enquanto a primeira define a liberdade de um indivíduo em relação aos outros indivíduos, a segunda define a liberdade dos indivíduos em relação ao Estado. A primeira é limitada pelo direito dos outros a não serem prejudicados, refletindo o clássico ‘principium iuris’ do ‘nominem laedere’; a segunda tem em vista, exclusivamente, o possível excesso de poder por parte do Estado. Na realidade, a primeira – mais do que uma definição da liberdade – é uma definição da violação de direito; a segunda é uma definição de liberdade, mas somente da liberdade negativa. A liberdade positiva, a liberdade como autonomia, é definida implicitamente no art. 6º, onde se diz que, sendo a lei expressão da vontade geral, ‘todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através de seus representantes, para a formação da lei’.

CUNHA (2007: p. 83-85), discorreu sobre uma liberdade mítica, admirada e desejada enquanto valor, mas cuja vivência e concretização é dificultosa e por vezes assustadora. Assim é também a Liberdade. Há quem a ame, de profunda paixão, encaixilhada nos pergaminhos vetustos, há quem a enalteça bem guardada nos infólios das Leis, há quem a proclame do alto das tribunas, ou diuturnamente a afague pelas gazetas, e proteste dar o peito às baionetas para a defender... Quando a Liberdade amada falta absolutamente, numa situação política de clausura, de mordaça, ou totalitarismo, é duro, muito duro, defendê-la. Há que arrostar com a perseguição, a prisão, o degredo, a tortura... E aí, como o poeta, escrevemo-la no nosso caderno escolar com a letra redondinha de todas as utopias, qual suspiro saudoso pela amada ausente. Um dia, o ditador morre, cai, é deposto. Grande festa da Liberdade na Polis, toda congregada, toda esperançosa, plena de saudade de Futuro. E a Liberdade, embora esquiva como a fortuna de Maquiavel, vem visitar-nos, a nós que tanto invocamos o seu nome santo. E tudo, podendo aparentemente ter ficado mais simples, sem polícias, sem cárceres, sem censuras, sem barreiras para as avenidas grandes da Liberdade, todavia se torna muito mais complicado. Há que encarar a Liberdade, qual dragão que sai da mitologia e se faz gente como nós. Por isso, tantos defensores teóricos da Liberdade, perante os seus desafios práticos (que estão muito para além das vãs filosofias sonhadas por todos os Horácios), fogem dela com o timorato pintor de dragões. É bela a Liberdade dos livros. É belo o dragão das pinturas. O problema é conviver com uma e com outro.

CANOTILHO (2008: p. 24-26) contrapôs a “liberdade dos antigos” e a “liberdade dos modernos” para

destacar o

significado histórico

da

liberdade,

“tendencialmente liberal”, e a sua realização a partir de interesses individuais preexistentes: O ideal da isonomia grega, crismado por Constant como , não se coadunava com o esquema de representação que, a partir das grandes revoluções – francesa e americana –, foi sempre o do liberalismo: os direitos-liberdade pressupõem, no plano político, uma sociedade tendencialmente liberal, que, pelo jogo dos interesses particulares, evoluirá para o

aprofundamento das declarações de direito. O direito natural, para adquirir positividade, não necessita de correcções voluntaristas estadualmente impostas; a realização dos direitos segue um processo de baixo para cima, a partir de interesses individuais que pré-existem a toda e qualquer iniciativa dos entes públicos.

ALEXY (2008: p. 218-235), reconheceu a volatilidade do termo, mas destacou a importância de determinar um conceito jurídico dele: a liberdade de fazer ou não fazer algo e suas consequências. Da seguinte forma: O conceito de liberdade é, ao mesmo tempo, um dos conceitos práticos mais fundamentais e menos claros. Seu âmbito de aplicação parece ser quase ilimitado. Quase tudo aquilo que, a partir de algum ponto de vista, é considerado como bom ou desejável é associado ao conceito de liberdade. Isso vale tanto para disputas filosóficas quanto para polêmicas políticas... Uma análise de tudo aquilo que esteve ou está associado ao termo ‘liberdade’ conduziria a uma extensa filosofia jurídica, social e moral. Aqui interessam apenas as posições jurídicas fundamentais. Nesse contexto, o primeiro plano é ocupado por um determinado conceito de liberdade: o conceito de liberdade jurídica... O que aqui interessa é a liberdade jurídica... Partindo-se disso, um enunciado sobre liberdade ou tem a seguinte forma: (1) x é livre (não-livre) de y para fazer z ou para não-fazer z, ou pode ser reduzido a um enunciado dessa forma. Aqui, x simboliza o obstáculo à liberdade e z simboliza a ação cuja realização ou não-realização é o objeto da liberdade.

DWORKIN (2006: p. 2) defendeu a concretização dos direitos da liberdade pela via da leitura moral da Constituição. Leitura moral a qual parte da premissa de que a “maioria das constituições contemporâneas expõe os direitos do indivíduo perante o governo numa linguagem extremamente ampla e abstrata”, cabendo a “todos nós – juízes, advogados e cidadãos –” a interpretação e a aplicação desses “dispositivos abstratos considerando que eles fazem referência a princípios morais de decência e justiça”; destarte, “toda vez que surge uma questão constitucional nova ou controversa... as pessoas encarregadas de formar uma opinião sobre o assunto devem decidir qual a melhor maneira de compreender aquele princípio moral abstrato”. Pois bem. Falar em direitos da liberdade implica no reconhecimento da força normativa da Carta Política dos Estados Democráticos e Sociais de Direito, o que, entretanto, por si só, não garante a eficácia nem a concretização desses direitos; a participação consciente e responsável de todos os cidadãos é condição necessária para que produzam os efeitos que deles se espera. 4.2. Os direitos da liberdade na doutrina brasileira Na visão clássica de PIMENTA BUENO (1857: p. 391-392), ao discorrer sobre a Constituição Imperial, a liberdade é um direito natural do ser humano e ao Estado cabe protegê-la:

A liberdade no estado ou consideração puramente natural do homem é o direito, a faculdade que elle tem de fazer ou não fazer tudo quanto queira sem outro limite que não seja a prohibição da lei natural, ou por outra, tudo quanto não viole seus deveres para com Deos, para com os outros homens, e para consigo mesmo. No estado social a liberdade é esse mesmo direito, salvas não só essas restricções da lei natural, mas também as restricções da lei social. A liberdade é o próprio homem, porque é a sua vida moral, é a sua propriedade pessoal a mais preciosa, o dominio de si proprio, a base de todo o seu desenvolvimento e perfeição, a condição essencial do gozo de sua inteligencia e vontade, o meio de perfazer seus destinos. É o primeiro dos direitos, e salva-guarda de todos os outros direitos, que constituem o ser, a igualdade, a propriedade, a segurança, e a dignidade humana. O Creador não fez o homem um ente puramente physico, sim intelligente e moral, deu-lhe faculdades correspondentes, e não só o direito, mas a necessidade de exercê-las, de cultivar as numerosas relações que dellas nascem, e que são indispensáveis para o seu bem-ser. Se não fôra o direito de gozar livremente de suas faculdades naturaes, de que servirão estas, o que valeria a existencia? O bem-ser do homem é tanto maior quanto maior é a sua liberdade, quanto menor é o sacrificio ou restricções della. O melhor governo é pois aquelle que conserva ao homem a maior somma de suas liberdades, a maior extensão dellas, a consciencia e convicção de que elle pertence a si mesmo, à sua intelligencia, a seus fins naturaes. As maiores ou menores restricções feitas a esta primeira, e essencial condição moral do homem, são quem assignalão e distinguem os bons e máos governos. Taes rescricções não devem exceder jámais do que fôr essencialmente necessario para respeitar os direitos alheios, por isso mesmo que elles são iguaes, e não póde haver direito contra direito. Em summa, a liberdade é um dom de Deos, e o fim da sociedade é de protegê-la, e não de proscrevê-la.”

Durante a Primeira República, VARELA (1902: p. 261-262) defendeu a tese de que a solidez do governo e a liberdade devem ser tratadas em conjunto, como sustentáculos da vida em sociedade: Solidez no governo e liberdade para o povo, são os polos que podem sustentar a sociedade. Mas, por que fatalidade é que os homens empenhados em fugir de um extremo não se querem deter senão no outro? Porque não concorremos em bom numero ao ponto medio da distancia que ha entre ambos... para que desde ahi... possamos convidar os homens dos dois lados a viverem, como nós outros, livres e tranquillos? Eu o sei e atrever-me-ei a dizel-o: é porque ninguem tinha explorado esse meio termo, e, procurando a felicidade social, sempre temos terminado nossa carreira caíndo nos extremos... Estabeleçamos uma ampla liberdade, abroquelada por uma administração respeitável, e teremos posto fim ás revoltas e tyrannias.

Nos anos trinta, sob a égide da Constituição de 1934, RODRIGO OCTAVIO (1935: p. 55-56) já alertava que a mera declaração das liberdades no texto constitucional de nada valeria se não acompanhada das garantias que lhe assegurassem a efetividade:

Para isso, desde logo na declaração de direitos, não só se enumeram propriamente os direitos individuaes, de que devem todos gozar, sob a proteção immediata da soberania nacional, como também se declaram as garantias constitucionaes para sancção e effectividade de taes direitos, reconhecidas e declaradas para a protecção e amparo do exercício delles. Para assegurar aos habitantes o gozo de certos direitos geraes de liberdade e garantia, não bastaria realmente a simples enunciação d’esses direitos assegurados; era ainda mister a enunciação das garantias que o Estado offerece para que se torne effectivo o gozo d’esses direitos.

Discorrendo sobre o constitucionalismo social que se desenvolveu após o final da 2ª Guerra Mundial, BARACHO (1986) expos a tendência da incorporação às Cartas Políticas de uma extensa lista de direitos fundamentais e liberdades públicas, juntamente com os direitos da cidadania e os princípios diretores da vida política, social e econômica. Nos dias atuais, MARTINS (2011: p. 54-55) defendeu a tese de que a plenitude da liberdade é alcançável com a consciência do respectivo exercício, a qual somente é possível com adequadas condições econômicas: E chego ao ponto crucial do exercício do poder, à luz da legalidade e legitimidade, qual seja o de permitir a liberdade, manter a autoridade sem que haja repressão, senão ao abuso da primeira faculdade. Em outras palavras, o problema de saber como reprimir, dentro de soluções jurídicas, sem impedir que a liberdade possa ser plena e a autoridade dela emanada correta. O problema, quando suscitado, normalmente leva, a uma tentativa de deslocar-se a sua estrutura concreta, transportando-a para uma outra formulação. Nesta transferência a equação poderia ser assim resumida. A liberdade só se adquire com consciência, a consciência somente pode ser obtida em condições de independência econômica, portanto com o mínimo de pressões e manipulações viáveis. As condições de independência apenas são viáveis a partir de um pleno desenvolvimento econômico. Ora, para se obtê-lo necessário é segurança suficiente, mesmo que ela implique restrições temporárias à liberdade. A autoridade, portanto, consiste em reprimir a liberdade, na dosagem certa e necessária, para que se possa obter o status suficiente ao seu exercício, com o que, em se chegando a este ponto, pode ser concedida a liberdade em plenitude, pois preparados os povos para exercê-la sem quebra do princípio da autoridade. Esta legitimada será, no futuro, pela aceitação tranqüila dos cidadãos livres, ao preço de um exercício educativo, embora repressivo no presente, do pleno exercício daquela.

Com efeito, os direitos da liberdade constituem um dos pilares centrais do Estado Democrático e Social de Direito. Sua concretização está vinculada não somente à listagem dos direitos que lhe são inerentes em uma Carta Política, mas ao pleno conhecimento deles e da capacidade de exigi-los se e quando necessário, por meio dos garantes previstos no ordenamento jurídico. 5. A TUTELA JURÍDICA DOS DIREITOS DA LIBERDADE NO BRASIL Muito bem. No Brasil, enquanto Estado soberano, a tutela jurídica das

liberdades remonta à Constituição Imperial de 1824 que, no art. 179 3, positivou uma “carta de direitos” invioláveis e garantidos pelo Estado. De seu texto vale referenciar os seguintes direitos da liberdade: legalidade (inc. I), liberdade de expressão (inc. IV), liberdade de crença (inc. V), liberdade de locomoção (inc. VI), liberdade de profissão (inc. XXIV), e liberdade de produção científica (XXVI). CAIO TÁCITO (2012: p. 21), em breve análise do desenvolvimento constitucional brasileiro, destacou: “A primeira Constituição brasileira, a do Império (1824), que se sucede à independência nacional, fiel ao modelo francês, consagra os direitos e liberdades individuais e os direitos políticos, segundo os princípios do Estado Liberal.”

A Constituição de 1891, no art. 724, de igual modo formalizou uma “declaração de direitos” invioláveis, da qual cabe destacar os direitos da liberdade: legalidade (§ 1º), liberdade de crença (§§ 3º e 28), liberdade de associação (§ 8º), liberdade de locomoção (§ 10), liberdade de expressão (§ 12), liberdade de profissão (§ 24) e liberdade de produção artística e científica (§§ 25 e 26). No art. 785 declarou o caráter aberto da Carta de Direitos nela constante. Na doutrina de BALEEIRO (2012: V. 2, p. 34): “O art. 72 trazia um longo e solene rol dos direitos e garantias assegurados aos brasileiros e estrangeiros residentes no País – não muito diversos dos que estavam inscritos na Carta de 1824, nem muito menores dos que figuraram nas Constituições de 1934, 1937, 1946, 1967 e na Emenda nº 1/69.”

A Carta Política de 1934 consagrou uma “declaração de direitos” no Título III (arts. 106 a 114). Listou os direitos da liberdade no art. 1136: legalidade (nº 2), liberdade de expressão (nº 4 e 9), liberdade de crença (nº 5), liberdade de reunião (nº 11), liberdade de associação (nº 12), liberdade de profissão (nº 13), liberdade de locomoção (nº 14) e liberdade de produção artística e científica (nº 18 e 20). No art. 1147 manteve o sentido “aberto” da Carta de Direitos consagrados. E CAIO TÁCITO (ob. cit.: p. 21) destacou o início de uma nova era no constitucionalismo brasileiro: A partir de 1934, um novo estádio instaura-se. As sucessivas Constituições, a partir de então, refletem, como um sismógrafo, a progressiva passagem do Estado Liberal para o Estado

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Constituição de 1824, art. 179: “A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte...”. 4 Constituição de 1891, art. 72: “A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade nos seguintes termos...” 5 Constituição de 1891, art. 78: “A especificação das garantias e direitos expressos na Constituição não exclue outras garantias e direitos, não enumerados, mas resultantes da fórma de governo que Ella estabelece e dos princípios que consigna”. 6 Constituição de 1934, art. 113: “A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á subsistência, á segurança individual e á propriedade, nos seguintes termos...”. 7 Constituição de 1934, art. 114: “A especificação dos direitos e garantias expressos nesta Constituição não exclue outros, resultantes do regime e dos princípios que ella adopta”.

Social. Aos direitos políticos e individuais, da era clássica, são acrescidas as modernas garantias de direitos sociais e a regulação da ordem econômica e social. As novas tendências do direito público e a política de intervenção do Estado na economia imprimem seu sinete nas Constituições de 1934, 1937, 1946 e 1967, com variações próprias de tratamento.

O Texto Magno de 1946 reservou o Título IV para sua extensa “declaração de direitos”. No que tange aos direito da liberdade, constam do art. 1418: legalidade (§ 2º), liberdade de expressão (§ 5º), liberdade de crença (§§ 7º e 8º), liberdade de reunião (§ 11), liberdade de associação (§ 12), liberdade de profissão (§ 14), liberdade de produção artística e científica (§§ 17 e 19). A liberdade de locomoção mereceu tratamento especial, sendo-lhe reservado o art. 142. No art. 1449 manteve o caráter “aberto” dos direitos e garantias constitucionais. BALEEIRO (2012: V. 5, p. 13-14), ao analisa-la, destacou o que denominou “política do homem”: “Os constituintes de 1946 partiam do princípio filosófico kantiano de que o Estado não é fim em si mesmo, mas meio para o fim. Este fim seria o homem. O Estado deveria fazer convergir seus esforços precipuamente para elevar material, física, moral e intelectualmente o homem. Melhorando-o do ponto de vista da saúde, da educação, do bem-estar econômico, viria, como consequência, o desenvolvimento total da Nação.”

Com a Constituição de 1988, um novo salto de qualidade foi vislumbrado no Brasil, pela a retomada da via democrática e a consequente expansão dos direitos e garantias fundamentais. O regime jurídico das liberdades implantado, seguindo uma lógica neoconstitucionalista, manteve a tradicional disciplina das liberdades, porém, de forma ampla e aberta que lhes garantiu como garante maior efetividade. É o que se verá a seguir. 6. OS DIREITOS DA LIBERDADE Tomando por base o texto das “cartas de direitos” brasileiras, é válido destacar os principais direitos da liberdade que tradicionalmente se incorporaram ao ordenamento jurídico e que foram validados pela Constituição de 1988: legalidade, liberdade de expressão, liberdade de crença, liberdade de locomoção, liberdade de profissão, liberdade científica, liberdade de associação e liberdade de reunião. E, por fim, ainda que de forma implícita, o direito de resistência. 6.1. Princípio da legalidade O princípio da legalidade foi consagrado nas Constituições democráticas

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Constituição de 1946, art. 141: “A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos à vida, à liberdade, à segurança pessoal e à propriedade, nos seguintes termos:” 9 Constituição de 1946, art. 144: “A especificação dos direitos e garantias expressos nesta Constituição não exclui outros direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios que ela adota”.

brasileiras: de 1824 (art. 179, inc. I10), 1891 (art. 72, § 1º11), 1934 (art. 113, nº 212), 1946 (art. 141, § 2º13) e 1988 (art. 5º, inc. II). Em todas elas restou reconhecida a supremacia da lei, fonte por excelência do exercício das liberdades de forma pacífica, respeitosa e ordeira. CAIO TÁCITO (ob. cit.: p. 11) destacou a mantença dessa secular tradicional nacional: “A Constituição brasileira de 1988, fiel às tradições nacionais, reafirma, como fundamento da ordem jurídica, o princípio da legalidade, fonte de direitos e deveres e limite ao poder do Estado e à autonomia da vontade.”

SILVA (2007: p. 81-86) apresentou a legalidade como uma garantia individual e expressão da liberdade de ação: O art. 5º, II, em análise, revela duas dimensões. Uma conceitual, clara e explícita, que consubstancia o princípio da legalidade que, por ser uma garantia individual, merecerá considerações aprofundadas nestes comentários. Outra, subtendida, nem sempre considerada pela doutrina, que é essa regra de direito fundamental que exprime a liberdade de ação. Por isso, esse dispositivo é um dos mais importantes do direito constitucional brasileiro, porque, além de conter a previsão da liberdade de ação (liberdade-base das demais), confere fundamento jurídico às liberdades individuais e correlaciona liberdade e legalidade. Dele se extrai a idéia de que a liberdade, em qualquer de suas formas, só pode sofrer restrições por normas jurídicas preceptivas (que impõem uma conduta positiva) ou proibitivas (que impõem uma abstenção), proveniente do Poder Legislativo e elaboradas segundo o procedimento estabelecido na Constituição. Quer dizer: a liberdade só pode ser condicionada por um sistema de legalidade legítimo.

Ao longo dos anos, a Suprema Corte brasileira vem criando uma sólida jurisprudência tendente a reafirmar a essência do princípio da legalidade: vinculação às definições da lei e às dela decorrentes14. No enunciado do preceito – ‘ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei’ – há visível distinção entre as seguintes situações: (i) vinculação às definições da lei e (ii) vinculação às definições ‘decorrentes’ – isto é, fixadas em virtude dela – de lei. No primeiro caso estamos diante da ‘reserva da lei’; no segundo, em face da ‘reserva da norma’ (norma que pode ser tanto legal quanto regulamentar ou regimental). Na segunda situação, ainda quando as definições em pauta se operem em atos normativos não da espécie legislativa – mas decorrentes de previsão implícita ou explícita em lei – o princípio estará sendo devidamente acatado. No caso

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Constituição de 1824, art. 179, inc. I: “Nenhum Cidadão póde ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude de lei.” 11 Constituição de 1891, art. 72, § 1º: “Ninguem póde ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma coisa, sinão em virtude de lei.” 12 Constituição de 1934, art. 113, nº 2: “Ninguem será obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei.” 13 Constituição de 1946, art. 141, § 2º: “Ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.” 14 HC 85.060, Rel. Min. Eros Grau, julg. 23/9/2008, Primeira Turma, DJE de 13/2/2009. No mesmo sentido: HC 93.554, Rel. Min. Celso de Mello, julg. 14/4/2009, Segunda Turma, DJE de 29/5/2009; e HC 94.726, Rel. Min. Ayres Britto, julg. 3/3/2009, Primeira Turma, DJE de 27/3/2009.

concreto, o princípio da legalidade expressa ‘reserva de lei em termos relativos’ (= ‘reserva da norma’) não impede a atribuição, explícita ou implícita, ao Executivo e ao Judiciário, para, no exercício da função normativa, definir obrigação de fazer ou não fazer que se imponha aos particulares – e os vincule. Se há matérias que não podem ser reguladas senão pela lei (...) das excluídas a essa exigência podem tratar, sobre elas dispondo, o Poder Executivo e o Judiciário, em regulamentos e regimentos. Quanto à definição do que está incluído nas matérias de reserva de lei, há de ser colhida no texto constitucional; quanto a essas matérias não cabem regulamentos e regimentos. Inconcebível a admissão de que o texto constitucional contivesse disposição despiciente – verba cum effectu sunt accipienda.

De fato, o princípio da legalidade é da essência dos direitos da liberdade. Sua configuração constitucional é um garante para o exercício dos direitos consagrados na Carta brasileira. Um limite expresso ao arbítrio de tantos quantos tencionem distorcer a lógica do Estado Democrático e Social de Direito para impor a sociedade comportamentos que contrariem a máxima da liberdade. 6.2. Liberdade de expressão Do mesmo modo, a liberdade de expressão constou da Constituição de 1824 (art. 179, inc. IV15), 1891 (art. 72, § 1216), 1934 (art. 113, nº 4 e 917), 1946 (art. 141, § 5º18) e 1988 (art. 5º, incs. IV, V e IX). É da tradição do direito constitucional brasileiro – pelo menos na versão democrática – a liberdade de expressão em sentido amplo, abrangendo tanto a liberdade de imprensa, o direito de resposta e a atividade intelectual, artística e científica; como a vedação ao anonimato e à censura por parte do Poder Público. A Constituição de 1988 foi ainda mais longe e agasalhou sobre o manto protetor desse feixe de liberdades a manifestação do pensamento; a indenização por dano

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Constituição de 1824, art. 179, inc. IV: “Todos podem communicar os seus pensamentos, por palavras, escriptos, e publical-os pela Imprensa, sem dependencia de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que commetterem no exercicio deste Direito, nos casos, e pela fórma, que a Lei determinar.” 16 Constituição de 1891, art. 72, § 12: “Em qualquer assumpto é livre a manifestação de pensamento pela imprensa, ou pela tribuna, sem dependencia de censura, respondendo cada um pelos abusos que commetter, nos casos e pela fórma que a lei determinar. Não é permitido o anonymato.” 17 Constituição de 1934, art. 113, nº 4 e 9: “4) Por motivo de convicções philosophicas, politicas e religiosas, ninguem será privado de qualquer de seus direitos, salvo o caso do art. 111, letra b (Perdem-se os direitos politicos... pela isenção do onus ou serviço que a lei imponha aos brasileiros, quando obtida por motivo de convicção religiosa, philosophica ou politica)... 9) Em qualquer assunto é livre a manifestação do pensamento, sem dependencia de censura, salvo quanto a espectatulos e diversões publicas, respondendo cada um pelos abusos que commetter, nos casos e pela fórma que a lei determinar. Não é permitido anonymato. E’ segurado o direito de resposta. A publicação de livros e periodicos independe de licença do poder publico. Não será, porém, tolerada propaganda de guerra ou de processos violentos para subverter a ordem politica ou social.” 18 Constituição de 1946, art. 141, § 5º: “E’ livre a manifestação do pensamento, sem que dependa de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um, nos casos e na forma que a lei preceituar, pelos abusos que cometer. Não é permitido o anonimato. E’ assegurado o direito de resposta. A publicação de livros e periódicos não dependerá de licença do poder público. Não será, porém, tolerada propaganda de guerra, de processos violentos para subverter a ordem pública e social, ou de preconceito de raça ou de classe.”

material, moral ou à imagem; a atividade de comunicação; o ensino e a aprendizagem; a manifestação cultural; a vedação também à licença pelo Poder Público; e mais, positivou no inc. XIV do art. 5º a liberdade de informação, a qual garante tanto a liberdade de divulgação dela quanto a liberdade de acesso a ela. SILVA (ob. cit.: p. 98), ao comentar a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (inc. IX do art. 5º da Constituição de 1988), destacou essa evolução: Não se pode olvidar na compreensão do dispositivo em exame que ele se liga ao texto do inciso IV (liberdade de manifestação do pensamento); ao art. 206, II (‘liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber’); ao art. 215 (liberdade de expressão cultural); ao art. 220 (‘a manifestação, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição’); ao § 1º desse art. 220, que veda qualquer ‘embaraço à plena liberdade de informação jornalística’ (forma de manifestação do pensamento); ao § 2º do art. 220, vedando ‘toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística’; ao § 3º do dispositivo, que permite alguma restrição a uma forma de expressão artística (diversões e espetáculos públicos); e ao seu § 6º, que garante a publicação de veículo impresso de comunicação, sem licença de autoridade.

TAVARES (2012: p. 627-631) falou das distintas dimensões da liberdade de expressão: substantiva e instrumental; e individual e coletiva. A ideia de uma dimensão substantiva, etimologicamente falando, por si só, é capaz de exteriorizar a sua importância, já que ventila o ideário da essencialidade de algo... Pode-se verificar, portanto, que a presente dimensão diz respeito à autodeterminação do indivíduo, sensivelmente conectada com a dignidade da pessoa humana... Assim, a liberdade de expressão alcança a possibilidade de adquirir ou de ter acesso aos jornais, periódicos, livros, ao noticiário da imprensa, seja pelo rádio, seja pela televisão, e à educação em geral. Quanto à dimensão estrutural da liberdade de expressão... é a possibilidade de eleger o meio mais adequado para veicular, transmitir as opiniões e ideias emitidas pelo indivíduo, com a finalidade de que se atinja certo número de receptores, o que, aliás, está ínsito à própria ideia de expressão... Além da dupla dimensão analisada anteriormente, outra surge, enfocada no aspecto subjetivo da liberdade de expressão. Conforme já verificado, por ocasião da análise da dimensão substantiva, a liberdade de expressão surge para garantir ao indivíduo a possibilidade de se formar, de ser sem ter de se adequar a um modelo previamente determinado. Nesse exato sentido tem-se a dimensão individual da liberdade de expressão. Porém, não se pode esquecer da sua consequente dimensão coletiva, em vista de a liberdade de expressão abarcar, também, terceiros... Cumpre ressaltar que essa dimensão coletiva da liberdade de expressão... atrela-se àquela outra liberdade, qual seja a de comunicação.

A jurisprudência da Suprema Corte brasileira tem se inclinado pelo contexto aberto e amplo da liberdade de expressão19, porém, não como um direito incondicionado, estando, destarte, sujeito aos limites traçados pela própria Constituição da República 20. 6.3. Liberdade de crença A liberdade de crença foi expressa na Constituição de 1824 (art. 179, inc. V21) e mantida nas posteriores: 1891 (art. 72, §§ 3º e 2822), 1934 (art. 113, nº 523), 1946 (art. 141, §§ 7º e 8º24) e 1988 (art. 5º, incs. VI e VIII). É, assim, da lógica do ordenamento

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“Não cabe ao Estado, por qualquer dos seus órgãos, definir previamente o que pode ou o que não pode ser dito por indivíduos e jornalistas. Dever de omissão que inclui a própria atividade legislativa, pois é vedado à lei dispor sobre o núcleo duro das atividades jornalísticas, assim entendidas as coordenadas de tempo e de conteúdo da manifestação do pensamento, da informação e da criação lato sensu. Vale dizer: não há liberdade de imprensa pela metade ou sob as tenazes da censura prévia, pouco importando o poder estatal de que ela provenha. Isso porque a liberdade de imprensa não é uma bolha normativa ou uma fórmula prescritiva oca. Tem conteúdo, e esse conteúdo é formado pelo rol de liberdades que se lê a partir da cabeça do art. 220 da CF: liberdade de ‘manifestação do pensamento’, liberdade de ‘criação’, liberdade de ‘expressão’, liberdade de ‘informação’. Liberdades constitutivas de verdadeiros bens de personalidade, porquanto correspondentes aos seguintes direitos que o art. 5º da nossa Constituição intitula de ‘Fundamentais’: ‘livre manifestação do pensamento’ (inciso IV); ‘livre (...) expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação’ (inciso IX); ‘acesso a informação’ (inciso XIV). (...) A crítica jornalística, em geral, pela sua relação de inerência com o interesse público, não é aprioristicamente suscetível de censura. Isso porque é da essência das atividades de imprensa operar como formadora de opinião pública, lócus do pensamento crítico e necessário contraponto à versão oficial das coisas, conforme decisão majoritária do STF na ADPF 130. Decisão a que se pode agregar a ideia de que a locução ‘humor jornalístico’ enlaça pensamento crítico, informação e criação artística. (...) Suspensão de eficácia do inciso II do art. 45 da Lei 9.504/1997 e, por arrastamento, dos § 4º e § 5º do mesmo artigo, incluídos pela Lei 12.034/2009. Os dispositivos legais não se voltam, propriamente, para aquilo que o TSE vê como imperativo de imparcialidade das emissoras de rádio e televisão. Visa a coibir um estilo peculiar de fazer imprensa: aquele que se utiliza da trucagem, da montagem ou de outros recursos de áudio e vídeo como técnicas de expressão da crítica jornalística, em especial os programas humorísticos. Suspensão de eficácia da expressão ‘ou difundir opinião favorável ou contrária a candidato, partido, coligação, a seus órgãos ou representantes’, contida no inciso III do art. 45 da Lei 9.504/1997. Apenas se estará diante de uma conduta vedada quando a crítica ou a matéria jornalísticas venham a descambar para a propaganda política, passando nitidamente a favorecer uma das partes na disputa eleitoral. Hipótese a ser avaliada em cada caso concreto.” (ADI 4.451-MC-REF, Rel. Min. Ayres Britto, julg. 2/9/2010, Plenário, DJE de 24/8/2012) 20 "As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria CF (CF, art. 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o 'direito à incitação ao racismo', dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica." (HC 82.424, Rel. Ac. Min. Presidente Maurício Corrêa, julg. 17/9/2003, Plenário, DJ de 19/3/2004.) 21 Constituição de 1824, art. 179, inc. V: “Ninguem póde ser perseguido por motivo de Religião, uma vez que respeite a do Estado, e não ofenda a Moral Pública.” 22 Constituição de 1891, art. 72, §§ 3º e 28: “§ 3º Todos os individuos e confissões religiosas podem exercer publica e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito commum... § 28. Por motivo de crença ou de funcção religiosa, nenhum cidadão brasileiro poderá ser privado de seus direitos civis e politicos nem eximir-se do cumprimento de qualquer dever civico.” 23 Constituição de 1934, art. 113, nº 5: “E’ inviolável a liberdade de consciencia e de crença, e garantido o livre exercicio dos cultos religiosos, desde que não contravenham á ordem publica e aos bons costumes. As associações religiosas adquirem personalidade juridica nos termos da lei civil.” 24 Constituição de 1946, art. 141, §§ 7º e 8º: “§ 7º E´inviolável a liberdade de consciência e de crença e assegurado o livre exercício de cultos religiosos, salvo o dos que contrariem a ordem pública ou os bons costumes. As associações religiosas adquirirão personalidade jurídica na forma da lei civil. § 8º Por motivo de convicção religiosa, filosófica ou política, ninguém será privado de nenhum dos seus direitos, salvo se a invocar para se eximir de obrigação, encargo ou serviço impostos pela lei aos brasileiros em geral, ao recusar os que ela estabelecer em substituição daqueles deveres, a fim de atender escusa de consciência”

constitucional brasileiro a liberdade de crença e a tolerância com as distintas manifestações de religiosidade, ainda que de forma condicionada. SILVA (ob. cit.: p. 93-94 e 96-98), discorreu sobre a tríplice expressão da liberdade religiosa – liberdade de crença, de culto e de manifestação religiosa – e a essência e amplitude da liberdade de crença: Ela [liberdade religiosa] se inclui entre as liberdades espirituais. Sua exteriorização é forma de manifestação do pensamento. Mas, sem dúvida, é de conteúdo mais complexo, pelas implicações que suscita. A liberdade religiosa compreende três formas de expressão (três liberdades): (a) a liberdade de crença; (b) a liberdade de culto; (c) a liberdade de organização religiosa. Todas estão garantidas na Constituição... Fez bem o constituinte em destacar a liberdade de crença da de consciência. Ambas são inconfundíveis... Na liberdade de crença entra a liberdade de escolha da religião, a liberdade de aderir a qualquer seita religiosa, a liberdade (ou o direito) de mudar de religião, mas também compreende a liberdade de não aderir a religião alguma, assim como a liberdade de descrença, a liberdade de ser ateu e de exprimir o agnosticismo. Mas não compreende a liberdade de embaraçar o livre exercício de qualquer religião, de qualquer crença, pois aqui também a liberdade de alguém vai até onde não prejudique a liberdade dos outros.

MORAES (2013: p. 46-47), após afirmar a liberdade religiosa como “verdadeira consagração da maturidade de um povo”, destacou sua abrangência e o sentido da evocação a Deus no preâmbulo da Constituição da República: A abrangência do preceito constitucional é ampla, pois sendo a religião o complexo de princípios que dirigem os pensamentos, ações e adoração do homem para com Deus, acaba por compreender a crença, o dogma, a moral, a liturgia e o culto. O constrangimento à pessoa humana de forma a renunciar sua fé representa o desrespeito à diversidade democrática de ideias, filosofias e a própria diversidade espiritual. A evocação à ‘proteção de Deus’ no preâmbulo da Constituição Federal reforça a laicidade do Estado, afastando qualquer ingerência estatal arbitrária ou abusiva nas diversas religiões e garantindo tanto a ampla liberdade de crença e cultos religiosos, como também ampla proteção jurídica aos agnósticos e ateus, que não poderão sofrer quaisquer discriminações pelo fato de não professarem uma fé.

E assim o é. A liberdade de crença, enquanto direito fundamental, é um vetor de extrema importância para a paz social, na medida em que a tolerância em matéria de fé, seja do Estado em relação aos seus súditos, seja dos indivíduos entre si, enleva o espírito, apazigua os ânimos e garante a livre manifestação da religiosidade de cada um. 6.4. Liberdade de locomoção A liberdade de locomoção, consagrada tanto na Constituição de 1824 (art.

179, inc. VI25), como na de 1891 (art. 72, § 1026), 1934 (art. 113, nº 1427), 1946 (art. 14228) e 1988 (art. 5º, inc. XV). Trata-se de figura constante do rol das liberdades históricas do constitucionalismo democrático brasileiro e que se apresenta como um não fazer do Estado em relação às migrações internas e externas das pessoas e seu patrimônio. SILVA (ob. cit.: p. 110-113) revelou a liberdade de locomoção e de circulação, sendo a segunda projeção especial da primeira e, ambas, formas de expressão da liberdade da pessoa física, a qual tem um garante constitucional específico, o “habeas corpus”: A liberdade da pessoa física (também impropriamente chamada ‘liberdade individual’ – já que todas o são) constitui a primeira forma de liberdade que o homem teve que conquistar. Ela se opõe ao estado de escravidão e de prisão... Assim, podemos oferecer a seguinte noção de ‘liberdade da pessoa física’ (excluindo-se as hipóteses de doenças, causas naturais que não interessam ao presente estudo): é a possibilidade jurídica que se reconhece a todas as pessoas de serem senhoras de sua própria vontade e de se locomoverem desembaraçadamente dentro do território nacional. Inclui-se, outrossim, no conceito a possibilidade de sair e entrar no território nacional... Para nós as formas de expressão da liberdade da pessoa física se revelam apenas na liberdade de locomoção e na liberdade de circulação – não sendo esta, aliás, mais do que manifestação especial daquela... Mencionaremos igualmente o problema da segurança, não como forma de liberdade da pessoa física em si, mas como forma de garantir a efetividade dela... A liberdade de locomoção no território nacional em tempo de paz contém o direito de ir e vir (viajar e migrar) e de ficar e permanecer, sem necessidade de autorização... O direito à circulação é manifestação característica da liberdade de locomoção: direito de ir, vir, ficar, parar, estacionar. O direito de circular (ou liberdade de circulação) consiste na faculdade de deslocar-se de um ponto ao outro através de uma via pública ou afetada ao uso público... Foi a essa liberdade que, desde o século XVII, se deu uma garantia específica: o habeas corpus.

TAVARES (ob. cit.: p. 651-660) a demonstrou levando em conta seus aspectos fundamentais: direito de ingresso e de permanência no território nacional; e de deslocamento intra e interterritorial. A liberdade de locomoção engloba a possibilidade de ir, vir e ficar no território nacional, ou deste sair e entrar. Isso significa a liberdade de deslocamento interno, no âmbito geográfico nacional, a possibilidade de fixar residência e, ainda, de se deslocar livremente através das

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Constituição de 1824, art. 179, inc. VI: “Qualquer póde conservar-se, ou sahir do Imperio, como lhe convenha, levando comsigo os seus bens, guardados os Regulamentos policiaes, e salvo o prejuízo de terceiro.” 26 Constituição de 1891, art. 72, § 10: “Em tempo de paz, qualquer póde entrar no territorio nacional ou delle sahir, com a sua fortuna e bens, quando e como lhe convier independentemente de passaporte.” 27 Constituição de 1934, art. 113, nº 14: “Em tempo de paz, salvas as exigencias de passaportes quanto á entrada de estrangeiros, e as restrições da lei, qualquer pessoa pode entrar no territorio nacional, nelle fixar residencia ou delle sahir.” 28 Constituição de 1946, art. 142: “Em tempo de paz qualquer pessoa poderá com os seus bens entrar no território nacional, nêle permanecer ou dêle sair, respeitados os preceitos da lei.”

fronteiras nacionais. Em síntese, a liberdade ampla de locomoção engloba quatro aspectos fundamentais: 1) direito de ingresso no território nacional; 2) direito de permanência no território nacional; 3) direito de deslocamento intraterritorial (entre pontos dentro do território); 4) direito de deslocamento interterritorial (entre o território nacional e outros Estados).

O Supremo Tribunal Federal tem uma extensa jurisprudência sobre a liberdade de locomoção, entendendo-a de forma ampla e admitindo a restrição dela somente a partir de elementos concretos que a justifiquem.29 6.5. Liberdade de profissão A liberdade de profissão, presente na Constituição de 1824 (art. 179, inc. XXIV30), 1891 (art. 72, § 2431), 1934 (art. 113, nº 1332), 1946 (art. 141, § 1433) e 1988 (art. 5º, inc. XIII), revela o livre exercício da atividade profissional, produtiva ou laborativa, enquadrando-se na lógica da livre iniciativa e do livre mercado. SILVA (ob. cit.: p. 108-9) a descreveu como mero direito individual, não social, resguardando apenas a liberdade de escolha de trabalho, ofício ou profissão. O que denominamos de ‘liberdade de ação profissional’ não se encaixa em qualquer dos grupos anteriores das liberdades. Alguns chamam-na de ‘liberdade de trabalho’. Não é, porém, como a entendemos, porque essa terminologia não exprime bem sua essência e porque não constitui direito social do trabalho... Será a ‘liberdade de escolha do trabalho’ um dos seus aspectos. É mais que isso, porque também é liberdade de exercício de ofício e de profissão... O dispositivo confere liberdade de escolha de trabalho, de ofício e de profissão, de acordo com as propensões de cada pessoa e na medida em que a sorte e o esforço próprio possam romper as barreiras que se antepõem à maioria do povo. Confere, igualmente, a liberdade de exercer o que fora escolhido, no sentido apenas de que o Poder Público não pode constranger a escolher e a exercer outro. Quanto a saber se há ou não condições de aquisição de ofício ou de profissão escolhida, não é tema que preocupe o enunciado formal da norma. Como todo direito de liberdade individual, a regra limita-se a conferi-lo, sem se importar com as condições materiais de sua efetividade.

TAVARES (ob. cit.: p. 645) tratou dela como norma de eficácia contida que confere ao Poder Público a competência de regulamentar profissões e que tem ligação direta com o livre exercício de qualquer atividade econômica e a livre iniciativa. 29

HC 84.662/BA, Rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJ de 22/10/2004; HC 86.175/SP, Rel. Min. Eros Grau, Segunda Turma, DJ de 10/11/2006; HC 87.041/PA, Rel. Min. Cezar Peluso, Primeira Turma, DJ de 24/11/2006; e HC 88.129/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJ de 17/8/2007. 30 Constituição de 1824, art. 179, inc. XXIV: “Nenhum genero de trabalho, de cultura, industria, ou commercio póde ser prohibido, uma vez que não se apponha aos costumes publicos, á segurança, e saude dos Cidadãos.” 31 Constituição de 1891, art. 72, § 24: “E’ garantido o livre exercicio de qualquer profissão moral, intellectual e industrial.” 32 Constituição de 1934, art. 113, nº 13: “E’ livre o exercicio de qualquer profissão, observadas as condições de capacidade technica e outras que a lei estabelecer, dictadas pelo interesse publico.” 33 Constituição de 1946, art. 141, § 14: “E’ livre o exercício de qualquer profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer.”

O art. 5º, XIII, declara que ‘é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer’. Trata-se de norma constitucional de eficácia contida, pois prevê a possibilidade de lei regulamentadora restritiva, vale dizer, que estabelecerá as qualificações e requisitos necessários para exercer determinadas profissões. Mas essa legislação apenas poderá prever condições que apresentem nexo lógico com as funções a serem desempenhadas. Não se tolera condição discriminatória, injustificada, o que, além de violar a liberdade de profissão, fere igualmente o princípio da igualdade. Também no parágrafo único do art. 170 assegura-se ‘a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei’. Aliás, está-se diante de um dos fundamentos do Estado brasileiro, nos termos do art. 1º, IV, que fala expressamente da ‘livre iniciativa’.

O Supremo Tribunal Federal, em relação ao tema, vem mantendo posicionamento firme quanto à restrição das liberdades apenas quando efetivamente justificada.34 6.6. Liberdade de produção artística e científica A liberdade de produção científica é a última das liberdades unânimes, eis que prevista na Constituição de 1824 (art. 179, inc. XXVI35) e nas que a sucederam; a partir da 1ª Carta republicana, foi ampliada e passou a configurar uma liberdade de produção artística e científica (art. 72, §§ 25 e 2636), o que se manteve na Lei Maior de 1934 (art. 113, nº 18 e 2037), 1946 (art. 141, §§ 17 e 1938) e 1988 (art. 5º, incs. XXVII, XXVIII e XXIX). Também inserta no rol das liberdades diretamente relacionadas à livre iniciativa, releva o caráter patrimonial da criação artística e da produção de inventos industriais.

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“Nem todos os ofícios ou profissões podem ser condicionadas ao cumprimento de condições legais para o seu exercício. A regra é a liberdade. Apenas quando houver potencial lesivo na atividade é que pode ser exigida inscrição em conselho de fiscalização profissional. A atividade de músico prescinde de controle. Constitui, ademais, manifestação artística protegida pela garantia da liberdade de expressão.” (RE 414.426, Rel. Min. Ellen Gracie, julg. 1/8/2011, DJE de 10/10/2011.) No mesmo sentido: RE 635.023-ED, Rel. Min. Celso de Mello, julg. 13/12/2011, Segunda Turma, DJE de 13/2/2012; RE 509.409, Rel. Min. Celso de Mello, julg. 31/8/2011, DJE de 8/9/2011. 35 Constituição de 1824, art. 179, inc. XXVI: “Os inventores terão a propriedade das suas descobertas, ou das suas produções. A Lei lhes assegurará um privilegio exclusivo temporario, ou lhes remunerará em ressarcimento da perda, que hajam de soffrer pela vulgarisação.” 36 Constituição de 1891, art. 72, §§ 25 e 26: “§ 25. Os inventos industriaes pertencerão aos seus autores, aos quaes ficará garantido por lei um privilegio temporário, ou será concedido pelo Congresso um premio razoavel quando haja conveniencia de vulgarisar o invento. § 26. Aos autores de obras literarias é garantido o direito exclusivo de reproduzilas pela imprensa ou por qualquer outro processo mecanico. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei determinar.” 37 Constituição de 1934, art. 113, nº 18 e 20: “18) Os inventos industriaes pertencerão aos seus autores, aos quaes a lei garantirá privilegio temporario, ou concedera justo premio, quando a sua vulgarização convenha á collectividade... 20) Aos autores de obras litterarias, artísticas e scientificas é assegurado o direito exclusivo de reproduzil-as. Esse direito transmitir-se-á aos seus herdeiros pelo tempo que a lei determinar.” 38 Constituição de 1946, art. 141, §§ 17 e 19: “§ 17. Os inventos industriais pertencem aos seus autores, aos quais a lei garantirá privilégio temporário ou, se a vulgarização convier à coletividade, concederá justo prêmio... § 19. Aos autores de obras literárias, artísticas ou científicas, pertence o direito exclusivo de reproduzi-las. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei fixar.”

SILVA (ob. cit.: p. 118-125) a inclui na listagem das “propriedades especiais”, sujeitas à observância da função social que transforma “o regime de propriedade” e o subordinada a limitações legalmente instituídas. A jurisprudência do Tribunal Constitucional brasileiro tem reconhecido e afirmado o caráter patrimonial da liberdade de produção artística e científica39. Também merece destaque, o “decisum” que – mediante ponderação (liberdade científica x direito à vida) – validou dispositivo de lei permissivo à utilização de células-tronco obtidos de embriões humanos vivos em pesquisas científicas40. 6.7. Liberdade de associação A liberdade de associação foi incorporada à carta de direitos da Constituição de 1891 (art. 72, § 8º41) e mantida nas Constituições de 1934 (art. 113, nº 1242), 1946 (art. 141, § 1243) e 1988 (art. 5º, inc. XVII a XXI). Trata-se da consagração do direito de associar-se para fins lícitos e não-paramilitares como manifestação da autonomia da vontade do indivíduo, vedada a interferência estatal no funcionamento das associações e permitida a dissolução compulsória delas somente pela via judicial. SILVA (ob. cit.: p. 114-116) a apresentou como manifestação de direitos distintos: de criar associações, de aderir ou desligar-se delas, e de dissolvê-las espontaneamente. 39

Súmula 386: Pela execução de obra musical por artistas remunerados é devido direito autoral, não exigível quando a orquestra for de amadores. No mesmo sentido: RE 114.601, Rel. Min. Célio Borja, julg. 14/2/1989, Segunda Turma, DJ de 12/5/1989; AI 137.422-AgR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julg. 21/5/1991, Primeira Turma, DJ de 21-6-1991. 40 “Em conclusão, o Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral da República contra o art. 5º da Lei federal 11.105/2005 (Lei da Biossegurança), que permite, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não usados no respectivo procedimento, e estabelece condições para essa utilização. Prevaleceu o voto do Min. Carlos Britto, relator. Nos termos do seu voto, salientou, inicialmente, que o artigo impugnado seria um bem concatenado bloco normativo que, sob condições de incidência explícitas, cumulativas e razoáveis, contribuiria para o desenvolvimento de linhas de pesquisa científica das supostas propriedades terapêuticas de células extraídas de embrião humano in vitro. Esclareceu que as células-tronco embrionárias, pluripotentes, ou seja, capazes de originar todos os tecidos de um indivíduo adulto, constituiriam, por isso, tipologia celular que ofereceria melhores possibilidades de recuperação da saúde de pessoas físicas ou naturais em situações de anomalias ou graves incômodos genéticos. Asseverou que as pessoas físicas ou naturais seriam apenas as que sobrevivem ao parto, dotadas do atributo a que o art. 2º do Código Civil denomina personalidade civil, assentando que a Constituição Federal, quando se refere à “dignidade da pessoa humana” (art. 1º, III), aos “direitos da pessoa humana” (art. 34, VII, b), ao “livre exercício dos direitos... individuais” (art. 85, III) e aos “direitos e garantias individuais” (art. 60, § 4º, IV), estaria falando de direitos e garantias do indivíduo-pessoa. Assim, numa primeira síntese, a Carta Magna não faria de todo e qualquer estágio da vida humana um autonomizado bem jurídico, mas da vida que já é própria de uma concreta pessoa, porque nativiva, e que a inviolabilidade de que trata seu art. 5º diria respeito exclusivamente a um indivíduo já personalizado.” (ADI 3.510, Rel. Min. Carlos Britto, julg. 28 e 29/5/2008, Informativo nº 508) 41 Constituição de 1891, art. 72, § 8º: “A todos é licito associarem-se e reunirem-se livremente e sem armas; não podendo intervir a policia, sinão para manter a ordem publica.” 42 Constituição de 1934, art. 113, nº 12: “E’ garantida a liberdade de associação para fins licitos. Nenhuma associação será compulsoriamente dissolvida senão por sentença judiciaria.” 43 Constituição de 1946, art. 141, § 12: “E’ garantida a liberdade de associação para fins lícitos. Nenhuma associação poderá ser compulsòriamente dissolvida senão em virtude de sentença judiciária.”

“A liberdade de associação, de acordo com os dispositivos constitucionais em exame, contém quatro direitos: (a) o de criar associações (e cooperativa), que não depende de autorização; (b) o de aderir a qualquer associação, pois ninguém poderá ser obrigado a associar-se; (c) o de desligar-se da associação, porque ninguém poderá ser compelido a permanecer associado; e (d) o de dissolver espontaneamente a associação, já que não se pode compelir a associação a existir.”

TAVARES (ob. cit.: p. 647-648) destacou o respectivo caráter de direito individual de expressão coletiva, pois “não obstante ser atribuída individualmente a cada cidadão, só poderá ser exercida coletivamente, porque é da essência da associação a existência de duas ou mais pessoas”; e a “legitimidade ativa ad causam para as associações defenderem em juízo o direito de seus associados”, funcionando, destarte, como substituto processual eis que lhe é facultado ir a juízo representar em nome próprio direito alheio. O Tribunal Constitucional brasileiro já se manifestou sobre a essência da liberdade de associação: a dimensão positiva de associar-se e de criar associações, e a dimensão negativa de não se associar ou desfiliar-se44. A primeira Constituição política do Brasil a dispor sobre a liberdade de associação foi, precisamente, a Constituição republicana de 1891, e, desde então, essa prerrogativa essencial tem sido contemplada nos sucessivos documentos constitucionais brasileiros, com a ressalva de que, somente a partir da Constituição de 1934, a liberdade de associação ganhou contornos próprios, dissociando-se do direito fundamental de reunião, consoante se depreende do art. 113, § 12, daquela Carta Política. Com efeito, a liberdade de associação não se confunde com o direito de reunião, possuindo, em relação a este, plena autonomia jurídica (...). Diria, até, que, sob a égide da vigente Carta Política, intensificou-se o grau de proteção jurídica em torno da liberdade de associação, na medida em que, ao contrário do que dispunha a Carta anterior, nem mesmo durante a vigência do estado de sítio se torna lícito suspender o exercício concreto dessa prerrogativa. (...) Revela-se importante assinalar, neste ponto, que a liberdade de associação tem uma dimensão positiva, pois assegura a qualquer pessoa (física ou jurídica) o direito de associar-se e de formar associações. Também possui uma dimensão negativa, pois garante a qualquer pessoa o direito de não se associar, nem de ser compelida a filiar-se ou a desfiliar-se de determinada entidade. Essa importante prerrogativa constitucional também possui função inibitória, projetando-se sobre o próprio Estado, na medida em que se veda, claramente, ao Poder Público, a possibilidade de interferir na intimidade das associações e, até mesmo, de dissolvê-las, compulsoriamente, a não ser mediante regular processo judicial.

Nesse contexto, a liberdade de associação é um relevante direito deferido à cidadania brasileira, expressão da autonomia da vontade de forma coletiva, centro por excelência da discussão de questões políticas e sociais e essencial para a formação cultural de uma sociedade politicamente organizada.

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ADI 3.045, Rel. Min. Celso de Mello, julg. 10/8/2005, Plenário, DJ de 1/6/2007.

6.8. Liberdade de reunião A liberdade de reunião compôs a lista de direitos da Constituição de 1891 juntamente com a de associação (art. 72, § 8º); figurou em dispositivo específico na Constituição de 1934 (art. 113, nº 1145), o que foi preservado nas Constituições de 1946 (art. 141, § 1146) e 1988 (art. 5º, inc. XVI). É a sagração do direito de reunir-se pacificamente, aberto a todos quantos queiram participar e sem interferência do Poder Público. SILVA (ob. cit.: p. 113-114) louvou a eficácia do texto constitucional de 1988, que elevou à plenitude a liberdade de reunião: Aí a liberdade de reunião está plena e eficazmente assegurada, não mais se exigem lei que determine os casos em que será necessária a comunicação prévia à autoridade bem como a designação, por esta, do local da reunião. Nem se faculta mais à autoridade intervir para manter a ordem, o que era utilizado para dificultar o exercício da liberdade de reunião e até para o exercício do arbítrio de autoridade. Agora cabe apenas um aviso, mero aviso, à autoridade, que terá o dever, de ofício, de garantir a realização da reunião. Não tem a autoridade que designar local, nem sequer aconselhar outro local, salvo se comprovadamente já estiver ciente, por aviso insofismável, de que outra reunião já fora convocada para o mesmo lugar. A manutenção da ordem, contudo, é requerida genericamente, pois assim o diz o art. 144, § 5º, quando atribui à Polícia Militar o exercício da polícia ostensiva e a preservação da ordem pública.

TAVARES (ob. cit.: p. 648-651) ressaltou o significado, a natureza jurídica e as exceções ao exercício da liberdade de reunião: A liberdade de reunião significa o direito de 1º) convocar, 2º) organizar ou liderar a reunião, e 3º) efetivamente participar desta, agrupando-se com outras pessoas... É a manifestação coletiva da liberdade de expressão, já que enseja a livre discussão de ideias e sua publicidade. É, pois, direito coletivo, ao mesmo tempo que não deixa de ser um direito individual de cada um que se pretenda apresentar para participar de alguma reunião... É preciso observar que durante o estado de defesa e o estado de sítio poderá o direito de reunião ser restringido ou suspenso (art. 136, § 1º, I, a, e art. 139, IV, respectivamente).

Em recente e memorável decisão, a Casa Maior do Judiciário brasileiro deu uma amplitude máxima ao direito de reunião e à livre manifestação do pensamento, ao afastar a criminalização da defesa da legalização das drogas em manifestações e eventos públicos47: Por entender que o exercício dos direitos fundamentais de reunião e de livre manifestação do

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Constituição de 1934, art. 113, nº 11: “A todos é licito se reunirem sem armas, não podendo intervir a autoridade senão para assegurar ou restabelecer a ordem publica. Com este fim, poderá designar o local onde a reunião se deve realizar, comtanto que isso não a impossibilite ou frustre.” 46 Constituição de 1946, art. 141, § 11: “Todos podem reunir-se, sem armas, não intervindo a polícia senão para assegurar a ordem pública. Com esse intuito, poderá a polícia designar o local para a reunião, contanto que, assim procedendo, não a frustre ou impossibilite.” 47 ADPF 187, Rel. Min. Celso de Mello, julg. 15/6/2011, Plenário, Informativo 631.

pensamento devem ser garantidos a todas as pessoas, o Plenário julgou procedente pedido formulado em ação de descumprimento de preceito fundamental para dar, ao art. 287 do CP, com efeito vinculante, interpretação conforme a Constituição, de forma a excluir qualquer exegese que possa ensejar a criminalização da defesa da legalização das drogas, ou de qualquer substância entorpecente específica, inclusive através de manifestações e eventos públicos. (...) Destacou-se estar em jogo a proteção às liberdades individuais de reunião e de manifestação do pensamento. Em passo seguinte, assinalou-se que a liberdade de reunião, enquanto direito-meio, seria instrumento viabilizador da liberdade de expressão e qualificar-se-ia como elemento apto a propiciar a ativa participação da sociedade civil na vida política do Estado. A praça pública, desse modo, desde que respeitado o direto de reunião, passaria a ser o espaço, por excelência, para o debate. E, nesse sentido, salientou-se que esta Corte, há muito, firmara compromisso com a preservação da integridade das liberdades fundamentais contra o arbítrio do Estado. Realçou-se que a reunião, para merecer a proteção constitucional, deveria ser pacífica, ou seja, sem armas, violência ou incitação ao ódio ou à discriminação. Ademais, essa liberdade seria constituída por cinco elementos: pessoal, temporal, intencional, espacial e formal. Ponderou-se que, embora esse direito possa ser restringido em períodos de crise institucional, ao Estado não seria permitido, em período de normalidade, inibir essa garantia, frustrar-lhe os objetivos ou inviabilizá-la com medidas restritivas. Apontou-se, ademais, que as minorias também titularizariam o direito de reunião. Observou-se que isso evidenciaria a função contramajoritária do STF no Estado Democrático de Direito. Frisou-se, nessa contextura, que os grupos majoritários não poderiam submeter à hegemonia de sua vontade a eficácia de direitos fundamentais, especialmente tendo em conta uma concepção material de democracia constitucional. (...) Concluiu-se que a defesa, em espaços públicos, da legalização das drogas ou de proposta abolicionista a outro tipo penal não significaria ilícito penal, mas, ao contrário, representaria o exercício legítimo do direito à livre manifestação do pensamento, propiciada pelo exercício do direito de reunião.

De forma similar à liberdade de associação, a de reunião também configura a autonomia da vontade como expressão coletiva, fonte e fundamento para a formação da vontade política no sentido de uma democracia crítica atuante no seio de uma sociedade inclusiva e pluralista. 6.9. Direito de resistência O direito de resistência é aquele outorgado aos cidadãos para se opor à ordem jurídica que afronta suas prerrogativas essenciais. BOBBIO (ob. cit.: p. 113) discorreu sobre o direito de resistência ao tratar da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, oportunidade em que defendeu a impossibilidade da positivação deste e os riscos inerentes ao seu efetivo exercício, nos seguintes termos: Cabe ainda dizer algo sobre o direito de resistência, que havia sido apresentado, em muitos dos projetos de declaração, como uma coisa óbvia. Mas era tão pouco óbvia, de resto, que o art. 7º afirma que todo cidadão ‘appelé ou saisi’ com base na lei deve obedecer imediatamente ou se torna culpado de ‘resistência’. Na realidade, o direito de resistência é um direito – se é que ainda

se pode corretamente chamá-lo de direito – diferente dos demais: é um direito não primário, mas secundário, cujo exercício ocorre apenas quando os direitos primários (ou seja, os direitos de liberdade, de propriedade e de segurança) forem violados. O indivíduo recorre ao direito de resistência como extrema ratio, em última instância, para se proteger contra a falta de proteção dos direitos primários; portanto, ele não pode, por sua vez, ser tutelado, mas deve ser exercido com riscos e perigos para quem o reivindica. Falando rigorosamente, nenhum governo pode garantir o exercício de um direito que se manifesta precisamente no momento em que a autoridade do governo desaparece, e se instaura, entre Estado e cidadão, não mais uma relação de direito, e sim uma relação de fato, na qual vigora o direito do mais forte.

Nos primórdios do constitucionalismo brasileiro, PIMENTA BUENO (ob. cit.: p. 419-421) posicionou-se no sentido de que o direito de defesa ou resistência é mais que um direito, é “uma necessidade, e por ventura um dever sagrado”, mas, tal qual Bobbio, destacou as consequências devastadoras que seu exercício irresponsável pode gerar: Este direito, cujo abuso é sem duvida muito perigoso não obstante isso existe, e de tal sorte, que em casos graves póde ser não só um direito, mas uma necessidade, e por ventura um dever sagrado... Como seria possivel proscrever esse direito em circumstancias extremas de um povo; e quando vemos que o systema constitucional na maior parte dos Estados não teria prevalecido se não fôra apoiado delle? Dever-se-hia por ventura consagrar a legitimidade da oppressão illegitima? Não; que o direito existe não soffre duvida, o que cumpre é não exagera-lo, não substitui-lo pelo abuso, que produz as mais funestas consequencias para os individuos e para a sociedade. Em relação aos partidos ou forças collectivas é muito difficil ver em um Estado livre casos que possão legitimar a resistencia. A pretenção de impôr sua vontade sobre a vontade nacional, de fazer prevalecer sua crenças por via da força, quando a grande maioria nacional não adopta essas crenças, não é por certo um direito de defesa, é sim um crime. Em um paiz livre, que tem os recursos da imprensa, o direito de petição, a faculdade eleitoral, o poder da tribuna, é mais que difficil conceber perigos ou oppressão tal que estabeleção uma collisão extrema. Se a pretenção é justa, se houve alguma grave arbitrariedade, aquella triumphará e esta será reprimida mediante os tramites legaes, e sem abalo e desastres sociaes; não é necessaria a vehemencia das paixões, nem o jogo sangrento das forças e seus incertos e perigosos resultados, cujo desfecho, quando mesmo victorioso, é ás vezes de uma escravidão não vista e menos esperada.”

Ponderando os ensinamentos retro transcritos, é mister reconhecer que, no contexto do Estado Democrático e Social de Direito, o direito de resistência é deduzido a partir de dois posicionamentos distintos: de natureza jurídica e política. O direito de resistência sob a ótica jurídica representa a prerrogativa legalmente admitida aos cidadãos de se recusarem ao cumprimento de determinada obrigação a todos imposta por razões de foro íntimo, como, por exemplo, a escusa de prestar o serviço militar obrigatório admitida no ordenamento constitucional brasileiro. Sob a ótica política, o direito de resistência se apresenta sob a forma de enfrentamento ante o ordenamento jurídico-político vigente, por injustiças praticadas pelos

respectivos agentes, podendo evoluir para a desobediência civil. O Supremo Tribunal Federal, na retro citada decisão que afastou a criminalização da defesa da legalização das drogas em manifestações e eventos públicos (ADPF 187), ofereceu à cidadania brasileira um instrumento para uso democrático do direito de resistência da mais absoluta relevância. 7. CONCLUSÃO Discorrer acerca da ética e da liberdade é relevar a essência do ser humano enquanto autor, roteirista e protagonista de sua história; senhor do próprio destino; responsável, portanto, pelas decisões que toma, pelas ações que pratica e, não menos importante, pelas consequências que delas resultam. Ao longo do tempo, a tutela jurídica da liberdade, inicialmente voltada para a proteção das pessoas em face dos abusos do Estado e de seus representantes – tutela subjetiva –, evoluiu para um complexo de normas cujos efeitos concretos transcenderam a esfera pública e passaram a influenciar as relações tipicamente privadas – tutela objetiva – , impondo, assim, limites que devem ser por todos observados. O regime das liberdades, portanto, no contexto atual, vai buscar sua sustentação na ética da liberdade, valor fundante de diversos dos princípios liberais inerentes ao Estado Democrático e Social de Direito, mas se concretiza pela força normativa das Constituições e, especialmente, pelos garantes nelas previstos. No Brasil, a partir da Carta Imperial de 1824, foram consagrados históricos direitos da liberdade (princípio da legalidade, liberdade de expressão, liberdade de crença, liberdade de locomoção, liberdade de profissão, liberdade de produção científica e direito de resistência) que, posteriormente, foram sendo repisados e ampliados nas Constituições democráticas que a sucederam (liberdade de produção artística, direito de associação e direito de reunião). No ordenamento implantado pela Constituição de 1988: I - o princípio da legalidade é entendido como limites à atuação estatal – que somente pode agir nos termos expressos da lei – e também dos particulares – que devem observar as restrições impostas pela lei; II - a liberdade de expressão sob uma perspectiva aberta, em relação aos particulares, que alcança toda e qualquer forma de manifestação intelectual, artística e científica; e restritiva para o Estado, ao qual é defeso interferir no seu livre exercício, salvo exceções que tenham como fundamento valores e normas de cunho constitucional; III -

a liberdade de crença, a partir da tolerância com as diferentes

revelações da fé, condição necessária à vida em sociedade;

IV - a liberdade de locomoção, sob a premissa da não interferência estatal no direito de ir, vir e ficar das pessoas e de seus bens; V - a liberdade de profissão e de produção artística e científica, como consequência lógica de um sistema que privilegia “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”; VI - a liberdade de associação e de reunião, a partir da ideia da autonomia da vontade manifesta coletivamente, primordial para o desenvolvimento de uma cultura ativa, crítica e reflexiva sobre a vida em sociedade; e VII - o direito de resistência como expressão maior da tolerância e do respeito aos direitos e interesses de tantos quantos se oponham aos ditames impostos pela lógica da majoritareidade inerente ao modelo democrático representativo adotado no Brasil. O Supremo Tribunal Federal, enquanto “guardião da Constituição”, teve e tem um destaque especial na consolidação do regime jurídico das liberdades. A extensa jurisprudência por ele produzida, revela tais direitos em sentido aberto, amplo e somente validou limitações pautadas em valores e normas de igual categoria. Destarte, é mister reconhecer que os direitos da liberdade configuram um terreno fértil de onde se extrai o melhor para uma vida digna em sociedade, mas que não devem e não podem ser utilizados de forma leviana e incondicionada; a observância dos valores e normas que os limitam e a responsabilidade pelo respectivo uso são da sua própria essência. 8. BIBLIOGRAFIA ABBAGNANO, Nicola. Trad. Alfredo Bosi. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Trad. de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2001. BALEEIRO, Aliomar. Constituições Brasileiras: 1891. Vol. II. 3ª ed. Brasília: Senado Federal, 2012. __________ e SOBRINHO, Barbosa Lima. Constituições Brasileiras: 1946. Vol. V. 3ª ed. Brasília: Senado Federal, 2012. BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria Geral do Constitucionalismo “in” Revista de Informações Legislativas. Brasília: Senado Federal, ano 23, nº 91, jul./set. 1986. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. __________, MATTEUCCI, Nicola, e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política I. 11ª

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