A Europa do Outro. A imigração em Portugal no início do séc.XXI. Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa.

July 21, 2017 | Autor: F. Velez de Castro | Categoria: Geography, Human Geography, Mobility/Mobilities, Rural Development, Geography of Mobility and Migrations
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T E S E S

EDIÇÃO CO-FINANCIADA PELO FUNDO SOCIAL EUROPEU

A EUROPA DO OUTRO – A IMIGRAÇÃO EM PORTUGAL NO INÍCIO DO SÉCULO XXI Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa

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DEZEMBRO 2008

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A EUROPA DO OUTRO – A IMIGRAÇÃO EM PORTUGAL NO INÍCIO DO SÉCULO XXI Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa F ÁT I M A V E L E Z D E C A S T R O

PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS

A EUROPA DO OUTRO – A IMIGRAÇÃO EM PORTUGAL NO INÍCIO DO SÉCULO XXI Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa

Fátima Velez de Castro

A EUROPA DO OUTRO – A IMIGRAÇÃO EM PORTUGAL NO INÍCIO DO SÉCULO XXI – Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa

Biblioteca Nacional de Portugal – Catalogação na Publicação CASTRO, Fátima Velez de A Europa do outro – a imigração em Portugal no início do século XXI : estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa. – (Teses ; 16) ISBN 978-989-8000-50-7 CDU 314 CDU 316

PROMOTOR ALTO-COMISSARIADO PARA A IMIGRAÇÃO E DIÁLOGO INTERCULTURAL (ACIDI), I.P.) www.acidi.gov.pt AUTORA FÁTIMA VELEZ DE CASTRO [email protected] EDIÇÃO ALTO-COMISSARIADO PARA A IMIGRAÇÃO E DIÁLOGO INTERCULTURAL (ACIDI, I.P.) RUA ÁLVARO COUTINHO, 14, 1150-025 LISBOA TELEFONE: (00351) 21 810 61 00 FAX: (00351) 21 810 61 17 E-MAIL: [email protected] EXECUÇÃO GRÁFICA EDITORIAL DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO PRIMEIRA EDIÇÃO 250 EXEMPLARES ISBN 978-989-8000-50-7 DEPÓSITO LEGAL 277 560/08

LISBOA, DEZEMBRO 2008

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Dissertação de Mestrado em Estudos sobre a Europa – «A Europa: as Visões do Outro», especialidade de Estudos Europeus Autora: Fátima Velez de Castro Orientadora: Professora Doutora Fernanda Maria da Silva Dias Delgado Cravidão Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra

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«A tua casa pode substituir o mundo, mas o mundo nunca poderá substituir a tua casa.» Provérbio alemão

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ÍNDICE PREFÁCIO

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NOTA PRÉVIA

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RESUMO

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ABSTRACT

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INTRODUÇÃO

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1. MOTIVAÇÃO 2. OBJECTIVOS E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO 3. METODOLOGIA: DO ESTUDO AOS PROBLEMAS

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I – IMIGRAÇÃO: OS CONCEITOS, O QUADRO LEGISLATIVO E OS TERRITÓRIOS

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1. QUEM É O «OUTRO»? CLARIFICAÇÃO DE CONCEITOS 1.1. Em torno do conceito de «Migração» 1.2. A desmistificação do Outro: o Imigrante 1.3. O estabelecimento de uma tipologia nas migrações 1.4. As motivações inerentes ao processo de saída/entrada num território 1.5. O desenvolvimento de modelos no estudo da Imigração 2. O FUNCIONAMENTO LEGISLATIVO FACE AO IMIGRANTE 2.1. Entre direitos e deveres: o Estatuto do Imigrante em Portugal 2.2. A questão da nacionalização 2.3. Portugal e o Outro: os (in)desejados? 2.4. A União Europeia e a Imigração

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3. UM TERRITÓRIO, VÁRIAS GENTES… 3.1. A percepção do autóctone face ao «estrangeiro» 3.2. A questão étnica e identitária 3.3. Os dois lados de uma mesma moeda 3.3.1. A coabitação pluri-étnica 3.3.2. A recusa do Outro: Racismo, Xenofobia e outras causas 3.4. O espaço associativo como caminho para a integração 3.5. Falar no plural: a questão da Língua

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4. ENTRE O QUE SE PROCURA E O QUE SE ENCONTRA 4.1. O Trabalho 4.1.1. Alguns aspectos teóricos 4.1.2. Portugal e a Europa: perspectivas

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4.1.3. Política e integração no mercado de trabalho 4.1.4. Entre «falsos mitos» e «novas esperanças»… reflexões em torno do estatuto ambivalente do imigrante no mercado de trabalho 4.2. A Saúde 4.3. A Educação 4.4. A Habitação 4.4.1. A nova residência 4.4.2. As áreas residenciais e a segregação 5. UM GRUPO… VÁRIOS GRUPOS (?!) 5.1. Os Ilegais/Clandestinos 5.2. A «Segunda Geração» II – A EUROPA E PORTUGAL NO CONTEXTO MIGRATÓRIO

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1. A EVOLUÇÃO DO CENÁRIO IMIGRATÓRIO NA EUROPA 1.1. Situação geral da imigração 1.2. A mobilidade – a Europa «escolhida» ou a «escolha» da Europa? 1.3. Padrões de imigração na Europa 1.4. A Fronteira Sul

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2. A EVOLUÇÃO DO CENÁRIO IMIGRATÓRIO EM PORTUGAL 2.1. Reflexões sobre a evolução/situação do fenómeno imigratório 2.2. Quem são os estrangeiros imigrantes que estão em Portugal? Uma caracterização 2.3. Onde estão os estrangeiros imigrados em Portugal? Distribuição geográfica 2.4. Que futuro para Portugal imigrante/da imigração?

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III – ESTUDO DO CASO DOS IMIGRANTES DA EUROPA DE LESTE NO CONCELHO DE VILA VIÇOSA 1. A DINÂMICA DO CONCELHO EM ESTUDO 1.1. Breve olhar pelo concelho de Vila Viçosa 1.2. Situação comparativa: Portugal – Alentejo – Vila Viçosa 1.2.1. Reflexão sobre alguns indicadores 1.2.2. O cenário imigratório 2. O CASO DOS IMIGRANTES DA EUROPA DE LESTE EM VILA VIÇOSA 2.1. Quem são aqueles que aqui chegaram? Caracterização da amostra em estudo 2.2. Motivações e acompanhantes da migração Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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2.3. A vida dos imigrantes de Leste: entre as expectativas e a realidade 2.3.1. Direitos e Deveres 2.3.2. A integração na vida da comunidade 2.3.3. O Imigrante e o Mercado de Trabalho 2.3.4. Outros aspectos da vida comum: da Saúde à Educação 2.3.5. Outros aspectos da vida comum: da Habitação aos Rendimentos 3. IMIGRANTES DA EUROPA DE LESTE E AUTÓCTONES… NA BUSCA PELA INTEGRAÇÃO? 3.1. Quem são aqueles que vivem em Vila Viçosa? Caracterização da amostra em estudo 3.2. A aceitação do Outro como Cidadão 3.3. O imigrante da Europa de Leste no quotidiano da Comunidade 3.3.1. O processo de integração e seus impactes 3.3.2. As relações Imigrante/Autóctone IV – PERSPECTIVAS PARA O GRUPO DOS IMIGRANTES DA EUROPA DE LESTE EM VILA VIÇOSA 1. ENTRE O PRESENTE E O FUTURO

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CONCLUSÃO

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ALGUMAS REFLEXÕES

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BIBLIOGRAFIA

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PREFÁCIO Durante muitas dezenas de anos Portugal foi um país de partida: do Norte e do Sul, do Interior e do Litoral foram muitos os portugueses que se dirigiram para o Brasil, Venezuela, Estados Unidos, Canadá ou já dobrada a primeira metade do século XX, para França, Alemanha, Suiça, Luxemburgo, entre muitos outros destinos. Quase no final do século XX as alterações politicas nos designados países de leste e o processo de globalização económica, vêm modificar os fluxos migratórios não só à escala global como regional. Portugal não fica alheio a este fenómeno. Os anos noventa vieram consolidar uma realidade que não sendo nova, adquire novas dimensões, não só quantitativas como sobretudo novos cenários culturais, sociais e económicos. No âmbito do Mestrado em «Estudos sobre a Europa – A Europa: as Visões do Outro», que decorreu na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, a Licenciada Maria de Fátima Grilo Velez desenvolveu um trabalho de investigação com o título «A Europa do Outro: Imigração em Portugal no Inicio do Século XXI. Estudo do caso dos imigrantes na Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa». Tal como afirma a autora trata-se de um trabalho centrado «no cenário imigratório Portugal no virar do século XX / início do século XXI, com destaque para o fenómeno do crescente número de imigrantes de Leste …». Estudou de modo particular o caso da comunidade moldava no concelho de Vila Viçosa no sentido de conhecer o quotidiano dos imigrantes e a imagem que a população autóctone tem do Outro.» Ao longo das cerca de 300 páginas, Maria de Fátima Grilo Velez enquadra a imigração nos quadros legislativos e territoriais, percorre no tempo e no espaço os diferentes contextos nacionais, para a partir da terceira parte incidir de modo objectivo, rigoroso e critico no estudo de caso. O trabalho de campo que realiza no concelho de Vila Viçosa suporta e responde de modo consistente às questões que tinha colocado. Quem são os que chegam ao concelho de Vila Viçosa? O que os move? Como se integram no mercado de trabalho e na comunidade? Como são aceites pela população autóctone? Qual o futuro desta e de outras comunidades imigrantes? Por tudo isto trata-se de um trabalho rigoroso, reflectido, e que pode servir os que investigam temas onde a imigração seja relevante. Também por isso honra a Instituição onde se desenvolveu e aquela que o publica. Como afirma a autora «num país que até agora estava habituado a ver partir os seus residentes transformados em emigrantes, chegou altura de Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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assumir o papel de receptor de imigrantes por isso é urgente aprender a olhar o Outro… numa Europa em que somos Nós Mesmos e simultaneamente o Outro, não passamos de elementos de uma cadeia humana dinâmica, onde é urgente a promoção para o desenvolvimento. Pois bem, que o novo milénio seja sinónimo de que o Outro Imigrado tenha lugar efectivo nessa cadeia e que contribua para o seu fornecimento». Fernanda Delgado Cravidão (Professora Catedrática)

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NOTA PRÉVIA Esta dissertação foi desenvolvida no âmbito do mestrado em Estudos sobre a Europa – «A Europa: as Visões do Outro», realizado na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra no biénio 2002-2004, sendo que a defesa da tese ocorreu em Julho de 2005. Tratou-se de um estudo aliciante não só porque possibilitou conhecer uma realidade relativamente recente no Alentejo e no interior do país, como também porque proporcionou o contacto com uma comunidade estrangeira da qual pouco conhecia. Mas não se tratou de um percurso solitário. Desta forma, urge agradecer a todos aqueles que colaboraram neste trabalho e cuja ajuda se revelou deveras preciosa para a realização da dissertação. Em primeiro lugar, o meu sincero agradecimento à Professora Doutora Fernanda Delgado Cravidão, não só pelas longas horas dispensadas à orientação do trabalho, mas também pela disponibilidade e prontidão que sempre revelou ao longo de todo este tempo. A minha mais profunda gratidão por partilhar comigo o seu saber. À Professora Doutora Maria Manuela Tavares Ribeiro, pela presença e palavras de incentivo que deu ao longo de todo o curso de mestrado e que se revelaram essenciais como motivação para a prossecução do trabalho. Ao Professor Doutor António Sousa Ribeiro e à Professora Doutora Clara Keating Gomes, pela ajuda dada no tema da Língua. O meu agradecimento pela simpatia, pelo tempo dispensado e pelas sugestões dadas. À minha querida professora Dalma Macedo, que sempre revelou tempo e paciência para ouvir as minhas dúvidas. Obrigada pela lição de vida. À Dr.a Helena Pires e à Eng.ª Patrícia Macedo pela ajuda na estruturação e revisão do trabalho. À Mãe e ao Pai, de quem cada vez mais me orgulho. A minha gratidão por todas as horas dispendidas ao meu lado na pesquisa, na revisão e na montagem da Tese e na vida. Ao Jorge, por todo o estímulo, carinho e apoio dado ao longo do estudo. Por me mostrar que todos os momentos fazem sentido. Ao Luís, pelas intermináveis horas de debate de ideias e de sugestões. Pela paciência em saber ouvir e por todo o encorajamento dado ao longo do trabalho e da vida. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Ao Georghi Dragutan, ao Sergiu Iuri, ao Radu Spinache, à Cristina Tirsina e à Filomena Borges e respectivas famílias, a minha gratidão pela ajuda fundamental na execução dos inquéritos. A todos os imigrantes e autóctones de Vila Viçosa que se disponibilizaram a responder ao mesmo. Obrigada por tudo!

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RESUMO Portugal, um país marcadamente emigrante, não se pode furtar à nova realidade migratória. No início do século XXI assiste à entrada de um contingente significativo de imigrantes de várias nacionalidades, fenómeno esse que já se vinha a verificar desde as duas décadas precedentes. O padrão de localização destes grupos segue as tendências nacionais, ou seja, a escolha da residência e do local de trabalho tem preferencial incidência na faixa litoral entre Setúbal e Viana do Castelo, com especial destaque para a Área Metropolitana de Lisboa, bem como no litoral algarvio. No entanto há excepções que se têm vindo a repetir com mais frequência, visto que alguns destes estrangeiros começam a procurar novos territórios no próprio território, escolhendo de forma paradoxal o interior do país como local de chegada. Vila Viçosa, concelho alentejano do interior português, foi um caso invulgar de recepção, na medida em que viu chegar imigrantes de Leste, nomeadamente moldavos, num momento em que o envelhecimento da comunidade autóctone e o êxodo rural eram uma das marcas dominantes da região. Nesta tese explora-se sobretudo, num primeiro momento, aspectos teóricos relacionados com o processo migratório, e num segundo momento o estudo de caso dos imigrantes da Europa de Leste neste concelho, desde o seu perfil, ao seu quotidiano e aos planos que este grupo tem para o futuro. Palavras-chave: Portugal; imigração; Imigrantes Moldavos; Alentejo.

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ABSTRACT Portugal, a clearly emigrant country, can not escape the new migratory reality. In the beginning of the 21st century there is an entrance of a significant contingent of immigrants of several nationalities, phenomenon which could already be verified since the two previous decades. The localization pattern of these groups follows the national tendencies, i.e., the choice of residence and place to work has a preferential incidence in the coastal strip between Setúbal and Viana do Castelo, as well as in the Algarve coastal area. Lisbon Metropolitan Area is also a highlighted area. However, there are exceptions that have been repeating more frequently, given that a few of these foreigners are starting to seek new territories inside the own territory, choosing the inner country as the place of arrival. Vila Viçosa, a county of the inner Portugal, in the region of Alentejo (page 173), was an unusual case of reception, once that it has been getting Eastern Europe immigrants, namely Moldavians, in a time when the autochthon community and rural depopulation were one of the dominating trademarks of the region. In this thesis it is mainly exploit, in a first moment, the theoretical aspects related to the migratory process and, in a second moment, the case study of Eastern Europe immigrants in this council, from their profile to their daily lives and the plans this group has for the future. Keywords: Portugal; immigration; Moldavians Immigrants; Alentejo.

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INTRODUÇÃO Sumário: O objectivo deste capítulo é introduzir o leitor na dissertação, explicando, sucintamente, quais os motivos que estiveram na base da escolha do tema de trabalho, assim como os objectivos que se pretendem atingir com um estudo desta natureza. Reflecte-se ainda sobre a estrutura deste documento e acerca dos problemas metodológicos que estiveram presentes ao longo do trabalho e que foram sendo superados/contornados. 1. MOTIVAÇÃO O provérbio alemão apresentado no começo da tese, não poderia ser mais relevante para o início deste estudo sobre imigração, mais especificamente sobre os imigrantes da Europa de Leste num concelho como Vila Viçosa. Dir-se-ia conveniente, na medida em que a dinâmica migratória implica muitas vezes uma temporalidade limitada, visto que o imigrante acaba por retornar ao seu local de origem, depois de vários anos fora do mesmo. Este local acaba por ser o móbil, ou seja, acaba por estar sempre presente como sendo o objectivo último a atingir, a meta final, a motivação que sustenta a necessidade de estar num local diferente do de origem, e onde se procura, através do trabalho, obter uma certa condição económica, para que mais tarde se beneficie de uma melhor qualidade de vida e se goze convenientemente a dita “casa”. Isto será uma visão simplista da situação do imigrante que materializa este provérbio. Contudo, este poderá tornar-se inconveniente se ficar provado o contrário, quer dizer, se o imigrante encontra no local de chegada, diferente do seu local de origem, condições que superem as motivações que o fizeram migrar, é possível que ai se fixe, deixando que outro local do mundo possa substituir a sua «casa». A imigração, como facto actual e como tema de estudo, tende a complexificar-se cada vez mais no mundo globalizado. Não são apenas os autores que se debruçam sobre esta temática aqueles que têm esta percepção. Também o cidadão comum começa a ter a noção de que a mobilidade afecta o quotidiano das populações, seja porque há elementos da sua comunidade que partem, seja porque a cada dia chegam novos indivíduos exteriores à mesma. Tal situação é cada vez mais evidente no caso do nosso país, onde o cenário migratório se constrói a partir de dados do Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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passado (fluxos emigratórios), mas que ganha novos contornos com dados do presente que possivelmente ganharão dimensão no futuro (fluxos imigratórios). Portugal assumiu, sobretudo a partir da última década do século XX, um papel preponderante como país receptor de imigrantes. O processo de descolonização promoveu, de certa forma, este fenómeno, embora de uma maneira discreta e espacialmente definida. Assim, hoje voga a ideia de um Portugal que deixou de ser primordialmente «cais de partida», reevocando-se como «cais de chegada» de imigrantes cuja língua deixou de ser só e apenas o português dos PALOP ou do Brasil, para partilhar o «espaço» com um variado conjunto de idiomas eslavos. Perante esta nova (ou reiventada?) condição de «receptor» de novos grupos imigrantes, surgem em lugar cimeiro os do Leste Europeu, cujas características sócio-geográficas em muito se aproximam/afastam do perfil dos restantes grupos de imigrantes que há mais ou menos tempo se radicaram em território nacional. Espacialmente dispersos, integram cada vez mais o quotidiano do cidadão português, seja como empregados/colegas de trabalho/vizinhos/conhecidos… na partilha de direitos e deveres que se supõem comuns, excepto no caso de fluxos ilegais/clandestinos que se têm constituído como um problema social grave para os dois pólos da questão (País e Imigrante Ilegal/Clandestino). Dado este cenário estar patente no nosso país, pareceu pertinente a realização de um estudo desta temática, no sentido de melhor se poder compreender as motivações e a dinâmica do próprio processo migratório deste grupo da Europa de Leste, o qual procura cada vez mais Portugal como local de chegada. A escolha do caso em estudo não foi aleatória: a faixa litoral, com uma preponderância significativa a todos os níveis, se compararmos com o interior, é geograficamente aquela onde se fixou a grande parte dos imigrantes que entraram no nosso país. Todavia, começam a existir casos de imigrantes da Europa Oriental que se fixam em concelhos do interior, tal como aconteceu com um grupo de imigrantes de Leste que procurou Vila Viçosa, no Alentejo, como destino da sua migração. Sendo originária de uma região do Alentejo próximo, conhecendo os problemas e as potencialidades desta área, assegurou-se-me este tema como um móbil de estudo extremamente interessante, não só pela actualidade da questão, como também pela mais-valia que um grupo destes poderá imprimir a um espaço dito pobre e decadente.

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2. OBJECTIVOS E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO Esta dissertação centraliza-se no estudo do cenário imigratório de Portugal no virar do século XX / início do século XXI, com destaque para o fenómeno do crescente número de imigrantes dos países da Europa de Leste que cada vez mais se vêm instalar no nosso país. Procedeu-se ao estudo do caso da comunidade moldava que actualmente se encontra instalada em Vila Viçosa, bem como da própria comunidade do concelho, no sentido de conhecer o quotidiano dos imigrantes e a imagem que a população autóctone tem do Outro. Pode-se dizer que este estudo foi baseado num conjunto de objectivos gerais: – Inferir sobre a crescente complexificação conceptual da temática migratória; – Reflectir sobre a problemática da imigração a vários níveis no mundo actual (direitos e deveres do imigrante; integração social; inclusão mercado de trabalho; acesso a serviços de saúde, educação, à habitação, etc.); – Compreender a evolução do cenário migratório na Europa; – Conhecer a evolução da imigração em Portugal até aos nossos dias; – Analisar o perfil e a situação específica dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa; – Perceber a aceitação do Outro imigrante por parte da comunidade de Vila Viçosa; – Propor eventuais cenários futuros para a imigração da Europa de Leste em Portugal e em Vila Viçosa. Desta forma, e para melhor cumprir estes objectivos, o trabalho foi desenvolvido com base em três partes fundamentais: – Primeira parte – intitulada «A Imigração: os Conceitos, o Quadro Legislativo e os Territórios», apresenta-se como sendo o enquadramento teórico da tese, onde se reflecte sobre a problemática da definição de conceitos no campo de estudo das migrações, bem como sobre a situação do imigrante à luz dos direitos e deveres consignados na legislação. São também tratadas questões sociais, nomeadamente da integração e da Língua, como instrumento/barreira desse processo. Procura-se Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ainda discernir um pouco daquilo que o imigrante procura no território de chegada, nomeadamente no que concerne ao trabalho e a aspectos que interferem na qualidade de vida do quotidiano (acesso aos serviços de saúde, educação, à habitação). Por último, cogita-se sobre a situação de grupos em situação específica, nomeadamente os que se encontram em situação ilegal/clandestina e sobre os imigrantes da «segunda geração». – Segunda parte – intitulada «A Europa e Portugal no contexto Imigratório», pretende dar a conhecer a situação dos fluxos migratórios, da(s) sua(s) dinâmicas e evolução ao longo do tempo na Europa, bem como seu papel como continente receptor de imigrantes, por excelência. A uma outra escala de análise, reflectese sobre a situação de Portugal como país de imigração, tentando conhecer quem são e onde estão os imigrantes que escolheram o nosso país como destino deste processo. – Terceira parte – intitulada «Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa», constitui-se como a análise de um caso prático da imigração deste grupo em Portugal, nomeadamente da comunidade moldava. De implantação recente em Vila Viçosa, um concelho do Alentejo, este grupo apresenta características, aspirações uma dinâmica específica que ora se aproxima, ora se afasta, dos habitantes do concelho, daí que este estudo de caso tenha sido feito numa dupla perspectiva, ou seja, a do imigrante de Leste e a do autóctone calipolense. Num último momento intitulado «Nota final. Algumas reflexões», procede-se à sistematização de algumas ideias tratadas ao longo da dissertação. Também se pretende que este trabalho seja um espaço não só de respostas, mas sobretudo onde possam ser levantadas novas questões, as quais sirvam de base para novos e renovados debates sobre o fenómeno da imigração dos países da Europa de Leste em Portugal. 3. METODOLOGIA: DO ESTUDO AOS PROBLEMAS Este trabalho baseia-se essencialmente numa componente teórica e numa abordagem prática. Num primeiro momento procurou fazer-se um enquadramento das ideias e concepções veiculadas por diversos autores e organismos que se dediFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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cam ao estudo das migrações. Assim, foi consultado um leque diversificado de obras que tratavam os diversos assuntos em questão, sempre que possível confrontando com a realidade e com casos particulares. Pareceu por isso pertinente a recolha de alguma informação estatística, bem como de casos específicos retratos pelos media, de forma a que o enquadramento teórico tivesse uma expressão prática, adaptada ou não, ao que se passa realmente no quotidiano. Logo neste momento surgiram alguns problemas, nomeadamente: – A dificuldade no estabelecimento de uma definição concreta para certos conceitos; – A incoerência dos dados do SEF 1 e do INE 2, relativamente ao mesmo assunto; – A inexistência de dados a certas escalas de análise. No primeiro caso, a questão assegurou-se um pouco complicada, na medida em que certos conceitos implicam diferentes leituras por parte dos diversos autores, o que promoveu, nalguns momentos, a complexificação das leituras. No entanto, no capítulo seguinte, esta questão será tratada com mais pormenor. No segundo e terceiros casos, optou-se por trabalhar com os dados existentes: as diferenças de informação sobre o mesmo assunto, só provam que há uma nítida descoordenação entre os dois organismos. Logicamente, a primeira informação chega ao SEF, contudo tratar-se-á de dados correspondentes aos imigrantes que se encontram em situação legal, daí que em certas situações os números do INE possam exceder os deste organismo. Tal poderá acontecer se o INE conseguir extrair informação daqueles que se encontram em situação ilegal/clandestina. No entanto o mais provável é que estes imigrantes escapem a um primeiro «controlo estatístico» do SEF, mas que depois de legalizarem a sua situação se dêem a conhecer ao INE. No caso dos quantitativos do SEF excederem os do INE, este último organismo coloca a hipótese dos imigrantes não serem suficientemente sensibilizados para a importância do «controlo estatístico»: aquando da entrada do imigrante, e do controlo feito pelo SEF, os seus dados serão registados não só para este organismo, como também para o INE. Contudo, por vezes parece haver uma perda de informação quando os dados são transmitidos a este último organismo.

1. SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. 2. INE – Instituto Nacional de Estatística. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Por outro lado nem sempre se encontrou a informação pretendida quanto à especificação de certos assuntos, bem como a escalas de análise mais pormenorizadas3, optando-se algumas vezes por alterar a estratégia de abordagem ao tema, ou trabalhando com a informação existente e completando com outras fontes, nomeadamente escritas. Num segundo momento foi realizado o estudo do caso prático dos imigrantes da Europa de Leste em Vila Viçosa. Foi aplicado um inquérito a este grupo, estando dividido em dez partes: – Identificação Individual – procurou-se saber alguns dados pessoais do inquirido, bem como o nível de conhecimentos sobre a língua portuguesa e inglesa; – Agregado Familiar – inquiriu-se sobre os elementos que acompanharam (ou não) o indivíduo no processo migratório, ou que ainda poderão juntar-se a ele em Portugal/Vila Viçosa; – Motivações para saída/entrada nos respectivos países – indagou-se sobre os factores atractivos e repulsivos que promoveram a migração; – Direitos e Deveres – procurou saber-se posição do inquirido face aos direitos e deveres consignados na legislação portuguesa, bem como sobre o decurso do processo de regularização e da pretensão favorável ou desfavorável à obtenção da nacionalidade; – Integração – indagou-se o inquirido sobre a sua relação com a comunidade de acolhimento e sobre os motivos que o levaram a fixar-se em Vila Viçosa; – Trabalho – tentou conhecer-se o percurso do imigrante no mercado de trabalho português; – Saúde – inquiriu-se o imigrante acerca da imagem que tem do acesso aos serviços de saúde; – Educação – inquiriu-se o imigrante acerca da imagem que tem do acesso aos serviços de educação; – Habitação – tentou conhecer-se as condições de habitabilidade, bem como outros aspectos relativos à vida material (rendimentos); 3. Por exemplo, e no que diz respeitos aos Censos 2001, é muito difícil encontrar dados mais específicos de qualquer assunto, à escala da freguesia. Na questão de certo tipo de informação ao nível dos imigrantes de países da Europa de Leste, é difícil encontrar descriminadas as nacionalidades pretendidas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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– Perspectivas – nesta parte do inquérito tentou-se investigar a duração da migração, ou seja, se pretendem ficar a residir permanentemente em Portugal/Vila Viçosa. Estes inquéritos foram aplicados entre os dias 15/03/2004 e 30/5/2004, em Vila Viçosa, a imigrantes da Europa de Leste residentes no concelho. Foi difícil apurar o número exacto de indivíduos desta origem, contudo estima-se que excedam uma centena 4. O método de amostragem utilizado foi o aleatório, tendo sido inquiridos 50 imigrantes. Os inquéritos foram realizados com a colaboração de mais quatro inquiridores, filhos de imigrantes de Leste, com a ajuda das suas respectivas familiar: o seu contributo foi decisivo, uma vez que muitos dos inquiridos se recusaram a responder ao inquérito na minha presença, alegando que as informações poderiam servir de base para qualquer organismo, como por exemplo o SEF, o que poderia levantar «problemas». Ora certamente que a finalidade não era essa, como se poderá comprovar a partir deste trabalho, contudo foi dada uma pista para o conhecimento deste grupo de indivíduos, uma vez que esta atitude poderá revelar sinais de situações ilegais/clandestinas no concelho. Não se sabe ao certo, portanto, o número de indivíduos que possam estar em situação ilegal/clandestina no concelho. Sendo assim, o próprio número apontado pelos imigrantes, estima-se ser ainda mais elevado, contudo não parece que estes excedam quantitativamente os que se encontram com a sua situação regularizada. Mas o facto do inquérito ter sido realizado por imigrantes de Leste, pertencentes ao grupo de amizades e relacionamentos da maioria dos inquiridos, veio estabelecer um clima de confiança e de credibilidade do trabalho: o facto dos inquiridores dominar bem a língua portuguesa e a língua da maioria dos inquiridos, ou seja, o moldavo 5, facilitou as respostas, promovendo o seu aprofundamento e incentivando ao preenchimento completo do inquérito. Não quer dizer que toda a informação existente no inquérito corresponda literalmente à realidade, até porque a leitura dos dados deve ser feita tendo em conta sempre essa margem de «distorção». O receio de represálias no emprego parece ser o factor que mais condiciona as respostas, relativas à questão do mercado-de-trabalho. Foi também aplicado um inquérito à população autóctone, estando este dividido em cinco partes: 4. O número de indivíduos da Europa de Leste em Vila Viçosa, segundo informações dos próprios imigrantes, deverá andar à volta das 120 pessoas, sendo que praticamente todos estariam em situação legal. Esta questão será devidamente explorada, aquando do estudo de caso (3.ª parte). 5. Os inquiridores também conheciam outros idiomas eslavos. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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– Identificação Individual – procurou-se saber alguns dados pessoais do inquirido, bem como se já alguma vez residiram/trabalharam noutro ponto do país ou no estrangeiro; – Permanência – inquiriu-se da opinião sobre a permanência ou do imigrante no país; – Direitos e Deveres – procurou-se saber qual a opinião acerca da posição dos imigrantes face aos direitos e deveres consignados na legislação portuguesa, bem como do conhecimento desta, relacionada com esta temática, por parte do inquirido; – Integração – averiguou-se sobre as afinidades dos inquiridos relativamente a diferentes grupos de imigrantes, bem como de situações relacionais hipotéticas com estes indivíduos; – Quotidiano – indagou-se sobre o que o inquirido achava da presença de imigrantes no quotidiano do seu concelho. Estes inquéritos foram aplicados entre os dias 2/03/2004 e 20/5/2004, em Vila Viçosa, a indivíduos residentes no concelho de Vila Viçosa, Borba e Estremoz 6. O método de amostragem utilizado foi o aleatório, tendo sido inquiridos 63 indivíduos: tendo em conta que existiam 8871 à data dos Censos de 2001, não poderemos considerar um número altamente representativo do todo do concelho. Porém, convém salientar que se trata de um grupo com alguma significância, visto conhecerem de perto a vivência de alguns imigrantes do concelho, o que pareceu poder enriquecer a dissertação com informações adicionais ao anterior inquérito. Os inquéritos foram realizados com a colaboração de mais um inquiridor. O primeiro inquérito teve como objectivo fundamental conhecer mais profundamente a dinâmica do grupo de imigrantes da Europa de Leste estabelecidos em Vila Viçosa, ao nível das motivações que fizeram procurar o país/concelho para residir/trabalhar, o quotidiano e os planos futuros no sentido de poderem prolongar ou não o tempo da migração, alterando ou não o espaço da mesma. No caso dos inquéritos feitos aos autóctones de Vila Viçosa, pretendeu-se saber qual a imagem que têm dos imigrantes portugueses, mais especificamente com aqueles que com eles partilham o quotidiano do seu concelho. Com estes inquéritos foi possível quantificar uma multiplicidade de dados, permitindo a verificação de alguns pressupostos teóricos, bem como deram a conhecer novos factos sobre a temática em estudo. 6. Os indivíduos inquiridos, originários de Borba e Estremoz, trabalhavam, na altura do inquérito, no concelho de Vila Viçosa. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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I – IMIGRAÇÃO: OS CONCEITOS, O QUADRO LEGISLATIVO E OS TERRITÓRIOS Sumário: Neste capítulo faz-se uma abordagem dos conceitos que se encontram relacionados com a temática da imigração, no sentido não só de clarificar alguns termos, como também de chamar a atenção para a dificuldade de definição de algumas noções. Também se analisa a questão dos direitos e deveres do imigrante face à legislação nacional e extranacional, bem como a questão da aquisição da nacionalidade. Por último reflecte-se sobre a dinâmica imigratória no território, no que concerne à questão da integração, do trabalho e do quotidiano em geral. 1. QUEM É O «OUTRO»? CLARIFICAÇÃO DE CONCEITOS 1.1. Em torno do conceito de «Migração» Definir conceitos nesta temática torna-se uma tarefa relevante, contudo delicada, uma vez que a complexidade do fenómeno migratório, a sua multiplicidade de formas e a própria evolução, leva a que seja necessário ter em conta uma reflexão aprofundada e contínua. Contudo, e apesar destes termos serem amplamente analisados na maioria das obras sobre a temática, será pertinente retomar alguns deles no contexto desta tese. Em Portugal, o Instituto Nacional de Estatística7 apresenta uma taxonomia clara e precisa sobre o tema, embora com algumas reservas, melhor dizendo, os conceitos apresentados revelam uma certa rigidez, uma vez que não têm em conta que o fenómeno migratório evolui no tempo e no próprio espaço. Desta forma, o que ganham em cientificidade e precisão, perdem em termos de dinamismo. O Instituto Nacional de Estatística considera Migração como sendo a deslocação de uma pessoa através de um determinado limite espacial, com intenção de mudar de residência de forma temporária ou permanente, interna (no interior de um país) ou internacional (fora do seu país de origem). JACKSON (1986, p. 5) enquadra-se na mesma linha, afirmando que se trata do movimento de uma população, temporário ou permanente, de um local para o outro. No caso de se tratar de uma Migração Temporária, não implica que haja obrigatoriamente alteração do local de residência, 7. Todos os conceitos definidos pelo Instituto Nacional de Estatística, que constam deste primeiro capítulo e dos seus subcapítulos, estão apresentados na publicação Estatísticas Demográficas 2002, INE, edição 2003, Lisboa. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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no entanto se estivermos perante uma Migração Permanente, tal já terá de se verificar. PAILHÉ (2002, p. 74) comunga da mesma ideia, embora acrescente uma dimensão espacial mais marcada, ao defender que é necessário que se efectue uma deslocação significativa. Como podemos constatar, nestas concepções apenas se encontra contemplada a dimensão espacial, o que parece ser um pouco reducionista à partida, visto que este fenómeno implica também aspectos relacionados com motivações sociológicas e económicas. Nesta linha de ideias, HALFACREE e BOYLE (1993, p. 334) vêem referir que ao definirmos este conceito e todos os que lhe são adjacentes, deveremos ter sempre em conta que uma migração também se trata da resposta ao estímulo proporcionado por outro local, que não o de residência. Depreenderemos pois que este «estímulo» traduza todo um conjunto de motivações, das mais variadas índoles, que leve o indivíduo(s) a sair(em) para outro local. MALHEIROS (1996, p. 30), relativamente a este conceito, vai um pouco mais longe, circunscrevendo também a migração temporária a um limite temporal de um ano e à actividade económico/social que irá ser desenvolvida (trabalho ou estudo). No entanto, sobre a migração definitiva ou permanente, apenas tem em conta o carácter espacial, ou seja, a deslocação em si e o carácter temporal, que neste caso não apresenta o momento de regresso (retorno) para o local de origem. Ambas não devem ser vistas de forma isolada: muitas vezes o que acontece é que a migração temporária se transforma em migração permanente ou definitiva, até porque o migrante prolonga a sua permanência no local. Tal facto será fruto da fixação da residência, da estabilização do trabalho, e portanto, da obtenção/manutenção de uma certa qualidade de vida que o «atrai» e justifica a permanência no local de chegada. No entanto, será necessário uma reflexão no que concerne aos limites temporais… não parece de todo correcto chamar-se migração «definitiva ou permanente», uma vez que a carga etimológica de cada palavra não deve ser perdida num único sentido. Sendo assim, será lógica a proposta de uma revisão dos conceitos existentes, embora se deva ter em conta a efemeridade dos termos que irão ser sugeridos, os quais não se encontram tanto na linha da utilização/generalização, mas antes na génese da assolução da necessidade de reflectir sobre algumas questões. Assim, pode-se fazer apelo à designação temporária, quando se trata de uma migração com duração até um ano ou mais, desde que não haja obrigatoriamente mudança do local de residência, melhor dizendo, quando o migrante apenas tem como objectivo principal auferir de rendimentos Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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económicos de forma imediata, voltando para o seu local de origem assim que tais proventos sejam obtidos; permanente finita, quando se verificar uma presença contínua num território que não o de origem, com mudança do local de trabalho, desenvolvimento da vida familiar e social nesse local, embora no final da vida activa possa haver um retorno ao local de origem. A migração permanente definitiva 8 poderia ser considerada como tal quando se constata o estabelecimento efectivo num local que não o origem, com mudança do local de residência e desenvolvimento das relações familiares e sociais no local de chegada, sem que se verifique o retorno a esse primeiro local. Em qualquer caso poder-se-á ou não verificar o retorno temporário ao local de origem (férias), sem que tal signifique uma alteração na natureza das designações. O espaço e tempo parecem ser dois vectores significativos: tendo em atenção o caso deste último, PAILHÉ (2002, p. 77) afirma que, no fundo, todas as migrações são temporárias, na medida em que há sempre um tempo de chegada e outro de partida, a menos que se trate duma migração de carácter efectivamente definitivo, a que chama Migração Última. Neste caso, o tempo de regresso não existe. De qualquer forma apresenta, no sentido de colmatar algumas limitações que o conceito de Migração possa manifestar, a noção de Circulação Migratória. Sem querer preterir ou substituir a primeira noção à segunda, manifesta-a como um termo de complemento, tanto que a define como sendo os fluxos humanos, materiais e imateriais, que ocorrem num determinado Território Migratório. REDONDO (1990, p. 351) considera este último como um conceito extremamente rico, na medida em que engloba toda uma dinâmica evolutiva, tendo em conta não só a migração, tal como ela é tomada (dimensão espacial), como também o espaço físico específico, propriamente dito, em que se desenvolve (áreas de partida e áreas de chegada) e as próprias características e motivações do fluxo.

8. Refira-se que estas “novas designações” são apenas uma proposta de reflexão, apresentando até algumas vicissitudes. O termo proposto de permanente definitiva revela um carácter pleonástico, no entanto pareceu ser o mais adequado e pertinente ao contexto. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Figura 1 – O Território Migratório

Indivíduos – Características

Área de Partida

Fluxo Permanente/Temporário

Área de Chegada

Indivíduos – Motivações Adaptado de REDONDO (1990).

De qualquer forma, MALHEIROS (1996, p. 27) refere que toda esta discussão em torno do termo Migração, levanta questões importantes, nomeadamente no que concerne aos limites temporais e espaciais envolvidos. Na verdade, nunca há um compromisso efectivo com a duração ou os limites espaciais implicados neste conceito, o que não deixa de ter a sua razão de ser, na medida em que a evolução da conjuntura nunca deixaria que se construísse um verdadeiro conceito sólido, que traduzisse numa só definição um conjunto de situações, que certamente se tornariam incompatíveis num mesmo espaço conceptual. Sob esta perspectiva, será importante ter em conta aquele que materializa a anterior noção, ou seja, o Migrante. As Nações Unidas consideram como migrantes os indivíduos que estejam deslocados durante mais de um ano na área de acolhimento. (Ob. Cit., p. 28) Contudo, esta periodização terá de ser vista com alguma reserva, na medida em que as diferentes realidades internacionais alteram por si só o facto. Por outro lado, carece de categorização o período temporal que vai desde o momento da partida até ao primeiro ano. Se considerarmos um período temporal um pouco inferior a um ano, mesmo que haja mudança de residência e de local de trabalho, o indivíduo não será considerado migrante? PAILHÉ (2002, p. 78) também coloca semelhante questão: refere que é migrante aquele que efectua uma migração ao longo de um dado período de tempo. A entrada de um indivíduo num território, não implica que este seja considerado como migrante ou que esteja sob o jugo de uma migração, mesmo que todas os indícios apontem para tal, e neste caso é tido Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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em conta a personalidade jurídica do indivíduo. Aquele a quem se chama Migrante Clandestino ou Ilegal (estrangeiro, num país que não é o seu, em situação irregular) 9, não é considerado por este autor como sendo um Migrante de Facto. Este só obterá este «estatuto» quando for declarada a sua residência num país estrangeiro. Mais uma vez se desenvolve uma lacuna conceptual, a que este autor dá resposta, ao distinguir «o que entra» 10 do «migrante» propriamente dito. No primeiro caso estão englobados os indivíduos que se encontram numa situação irregular ou que ainda não atingiram o primeiro ano de residência num país estrangeiro, no segundo caso já estarão contemplados os migrantes de facto, bem como os Migrantes Virtuais. São considerados nesta última acepção os filhos de migrantes, com idade entre os 0 e os 9 anos, que nasceram no país onde os pais residem, figurando por isso no crescimento natural desse país. Na realidade, a segunda geração encontra-se numa situação dúbia, na medida em que fazendo parte da realidade do contingente evolutivo natural do país, tem uma origem externa à própria população. Desta forma, contribuirá para a dita evolução de uma forma «falaciosa», se é que assim se pode chamar, na medida em que não faz parte da dinâmica natural da população de origem, apresentando-se como um elemento exterior que a qualquer momento poderá «cessar», se pensarmos no caso das migrações temporárias. Talvez daí o autor considere que estes termos são artefactos estatísticos descritivos, os quais limitam de forma perniciosa situações demasiado complexas e dinâmicas, para se encontrarem circunscritas a um mero conceito. PARNWELL (1993, p. 12) esbate as fronteiras conceptuais, preferindo referir-se ao termo Mobilidade como sendo a facilidade de deslocação de uma área para outra, sem que haja entraves a proibir tal acto. Neste caso, considera a migração como um conceito mais restritivo, que dirá respeito a uma deslocação efectiva de um grupo de indivíduos, do seu local de origem, para outro local diferente desse. No entanto, o anterior conceito parece estar incompleto, na medida em que apenas contempla as Migrações Voluntárias, onde há uma saída espontânea de população do seu local de origem, e não as Migrações Forçadas, onde há uma motivação exterior ao(s) próprio(s) individuo(s) para que tal aconteça, normalmente 9. Mais adiante os conceitos de Migrante Ilegal e Migrante Clandestino serão definidos em particular. Neste momento não parece ainda pertinente diferenciá-los, pelo que dado às circunstâncias em que aparecem inseridos, será mais “correcto”, ou melhor, pertinente, serem considerados num mesmo conjunto. 10. Do francês, Entrant. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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envolvendo a necessidade de protecção da vida e dos seus direitos (JACKSON, 1986, p. 7). Neste caso, o campo sociológico (motivações) aparece imbricado com o campo geográfico (deslocação entre espaços). Ainda relativamente à dimensão espacial, MALHEIROS (1996, p. 30) distingue Migração Interna como sendo a deslocação de população de uma região para outra, dentro do próprio país, para aí se fixar temporária ou definitivamente. Neste caso, o facto do autor ter sublinhado a questão «interregional» ligada a um certo «tempo», leva a que se evidencie a ausência do carácter imediatista que anteriormente tinha sido também verificada na questão temporal. Quer-se com isto dizer que, não se é considerado migrante ou migração logo o momento imediato a partir do início da acção, pelo que é necessário um desenvolvimento, uma certa sequência evolutiva, daí que o termo «o que entra» seja necessário e pertinente para traduzir um migrante que de certa forma ainda não o é. Para o caso da migração, não existe nenhum termo «percursor», por assim dizer, que designe a fase inicial desse mesmo conceito, o que não deixa de ser necessário. Poderemos utilizar a expressão «mobilidade», ainda que em sentido restrito, embora este conceito traduza uma situação mais generalista e englobante. 1.2. A desmistificação do Outro: o Imigrante Diz-nos o Instituto Nacional de Estatística que o Imigrante, seja ele um Imigrante Permanente ou um Imigrante Temporário, é a pessoa (nacional ou estrangeira) que, num dado período de referência, entrou num país com intenção de aí permanecer por um período igual/superior (no primeiro caso) ou inferior (no segundo caso) a um ano. Este parece apresentar-se como sendo um conceito demasiado lato, pelo menos tendo em conta o caso português, que segundo esta definição, implicaria a identificação de três grupo distintos de imigrantes. Em primeiro lugar apresentar-se-iam os estrangeiros que estão em Portugal e que cá se fixaram com o objectivo de residir e trabalhar, independentemente da duração da sua permanência (1.o grupo?). Ora, se o conceito nos impele a considerar como imigrantes os autóctones que se ausentaram para fora da residência num determinado espaço nacional, pelo menos durante um ano, também teríamos de considerar, no caso português, o grupo daqueles que efectuaram uma Migração de Retorno, ou seja, todos aqueles que após residirem e trabalharem no estrangeiro por um período superior a um ano, regressaram e se restabeleceram no seu local de origem (2.o grupo?). Por outro lado, e nesta lógica, também seriam considerados como imigrantes os Retornados (3.o grupo?)? Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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MALHEIROS (1996, p. 30) refere que este é um termo genérico para designar o conjunto de cidadãos de origem portuguesa residentes nas ex-colónias de África, que chegaram a Portugal (e aqui se fixaram) na sequência do processo de descolonização dos PALOP (1974-1976). Apesar desta relação parecer lógica, a mesma reveste-se de um carácter revogatório, na medida em que o espaço habitado por tal população era um espaço nacional pertencente ao território português. Deste ponto de vista, não se constatou o fenómeno imigratório propriamente dito, visto que o verificado foi uma movimentação no próprio território nacional. No entanto, será que os limites espaciais do próprio fluxo, por si só justificam esta designação de imigração, visto que se tratou de uma deslocação intercontinental? Por outro lado, constatou-se também a mudança de residência e de local de trabalho. A complexidade do fenómeno impele a que o termo «retornado» seja utilizado de uma forma específica para este grupo populacional, revelando por si só o seu carácter ambivalente. A designação de Imigrante reflecte também a realidade de cada país em questão, não sendo talvez incorrecto dizer que reproduz em si a maneira como o Outro é visto. BODY-GENDROT (1996, p. 238) alerta para esta mesma situação, ao estudar o caso dos imigrantes nos Estados-Unidos. O Urban Institute dos EUA toma com tal aqueles que entram legalmente no país com um visto de imigração. Durante 18 meses, o «imigrante» é inserido na categoria de Residente Permanente e a partir do quinto ano de residência/trabalho no país, poderá obter a nacionalidade norte-americana. Os Residentes Temporários, ou seja, todos aqueles que entram no país com um visto específico (trabalho temporário, estudo…) não serão considerados imigrantes, mesmo que o tempo de permanência possa exceder um pouco os 18 meses. A política de atribuição de vistos é bastante rígida, e tem em conta um conjunto de factores específicos (fim social – união de famílias; fim económico – que haja um contributo para o aumento dos níveis de produção nacional; fim cultural – que haja a promoção da diversidade…). Os Refugiados 11 não são considerados como imigrantes neste contexto, ao contrário do que acontece no Canadá. No caso deste último país, o imigrante é aquele que solicita o direito de se estabelecer no território atra-

11. Segundo MALHEIROS (1996, p. 30), a ACNUR (Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados) considera como tal as pessoas que se encontram fora do seu país devido a um receio bem fundamentado de perseguição, por motivos de raça, religião, nacionalidade, opinião política ou pertença a um grupo social particular. ADELL (1990, p. 103) refere ainda o facto de que a saída do país pode ser feita de forma voluntária (se o indivíduo tomar uma decisão individual) ou forçada (se for obrigado a tal). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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vés de um visto, sendo considerados Visitantes todos aqueles que não se encontram em tal situação CREPEAU (1986, p. 148). Nesta realidade nacional há uma categorização da temática, em função do direito e da economia, tanto que se estabeleceram três grandes grupos, ou seja, o grupo da Imigração Familiar (todos os imigrantes que se podem estabelecer com filhos solteiros ou parentes a seu cargo com menos de 18 anos, pais com mais de 60 anos), da Imigração Humanitária (todos aqueles que sejam considerados refugiados, exilados voluntários ou prisioneiros políticos) e o grupo da Imigração Económica (engloba os Imigrantes Independentes, ou seja, aqueles que pretendam desenvolver uma actividade económica, sejam eles empregados ou empregadores). Dentro deste contexto, HETTLAGE (1986, p. 166) chama a atenção para a designação de imigrante dada na Alemanha, o Gastarbeiter. Esta designação, que se poderá traduzir em Trabalhador-Convidado, surge nos anos 60 para designar a mão-de-obra imigrante contratada por alguns países da Europa, nomeadamente da parte central, para fazer face a determinadas carência de trabalhadores em diversas actividades que não exigiam qualificações demasiado elevadas. MALHEIROS (1996, p. 31). No caso germânico, este termo mantém-se até aos dias de hoje, cada vez mais enraizado, no entanto talvez um pouco descontextualizado da natureza inicial a que se propunha, uma vez que incutia um carácter temporário à migração. Hoje, usado de forma generalista, desadequa-se de uma realidade onde o tempo de permanência é cada vez mais alargado (chegando a ser definitivo). Por outro lado, o termo «convidado» pressupõe que haja um conjunto de estratégias de integração, de modo a preencher o nível de satisfação do indivíduo, tomado em consideração a etimologia da própria palavra. Porém tal não acontece, e no que concerne ao caso alemão, são imensas as dificuldades de integração dos imigrantes (HETTLAGE, 1986, p. 167). Inserida na temática das migrações, a Imigração revela um carácter bastante dinâmico, visto que a própria designação dos indivíduos que a materializam é tomada com algumas alterações, conforme as realidades nacionais. Ambas as noções estão bastante ligadas ao direito e JACKSON (1986, p. 5) mostra isso mesmo ao assumir a imigração como sendo o termo usado para descrever o processo de entrada num país onde a organização administrativa (neste caso, ligado à organização de cada Estado) seja diferente do país de origem. A fronteira ganha aqui contornos de limite efectivo, com um carácter divisório, fazendo com que o espaço ganhe outra dimensão. Se nos conceitos anteriores a dimensão das deslocações era um factor a ter em conta, neste caso esbate-se completamente, aniquilada pelo campo jurídico. Pensemos no caso das regiões da Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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raia portuguesas: é imigrante aquele que vai viver para a cidade espanhola mais próxima que dista umas dezenas de quilómetros da sua aldeia, igual aquele que sai dessa mesma aldeia para ir viver para a África do Sul?… Não é fácil o compromisso entre as diversas dimensões que cada termo acarreta. KREKELS e POULAIN (1996, p. 258) afirmam que, no que concerne a uma tentativa de homogeneização conceptual que já se tem tentado estabelecer no seio dos países membros da U.E., tal é considerado como um erro, na medida em que cada realidade apresenta as suas próprias especificidades. Talvez seja por isso que cada um dos membros continua a utilizar os seus próprios conceitos e definições, inerentes aos seus próprios contextos. Será pois necessária, para cada um dos conceitos até agora tratados, uma leitura baseada numa atitude de compromisso entre diversos campos a ter em conta na noção, bem como uma flexibilização ponderada dos seus limites e uma contextualização na sua própria realidade. Figura 2 – A posição do «Imigrante» no campo conceptológico «o que entra»

Território Migratório

Migrante

Mobilidade «mobilidade»

Temporária Permanente

Migração

Definitiva

Voluntária Forçada

Circulação Migratória

De Facto Virtual Clandestino ou Ilegal

Imigrante Emigrante

Elaboração própria (2003). Interna/Externa

1.3. O estabelecimento de uma tipologia nas migrações Após a definição de alguns conceitos ligados a esta temática, torna-se relevante o estudo que alguns autores fazem no sentido de categorizarem as migrações, em torno de «chaves dicotómicas», se é que assim podeFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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mos dizer, mais ou menos complexas. Se verificámos que definir um conceito é uma tarefa difícil e muitas vezes inacabada, tentar estabelecer uma tipologia em torno deste campo continua na mesma linha de desenvolvimento. ÁLVAREZ (1993, p. 10) concorda com esta acepção, ao referir que existem diversas dificuldades para estabelecer uma classificação geral amplamente aceite, sendo essa situação fruto de um conjunto de questões: – A interconexão entre as diferentes motivações que levam a que o indivíduo migre faz com que a realidade não se enquadre num tipo de migração definida; – A relação tempo-espaço não se pode (nem se deve!) estabelecer num modelo «causa-efeito» directo, o que só por si dificulta o estabelecimento de uma tipologia exacta; – Os movimentos migratórios apresentam muitas vezes um duplo sentido, ou seja, quer porque se desenvolve entre um ponto de origem e um ponto de destino, quer porque depois se verifica o retorno estabelecendo-se um «jogo de forças» que, segundo o autor, não será fácil de gerir quando se pretende enquadrar a migração numa tipologia. DE MARCO (1989, p. 198) insiste na classificação das migrações, sendo tal uma necessidade básica mediante a qual se impõe alguma ordem e coerência no enorme fluxo de informação, advindo do conjunto de situações gerais e específicas que se estabelecem. No entanto, há sempre que ter presente o facto de que o tipo de classificação está sempre influenciado pelos critérios que foram tidos em conta naquela situação. Desta forma, e tal como acontece no campo dos conceitos, cada realidade tende a gerar tipologias diferenciadas. O que aqui se tentará apresentar será uma tipologia de «compromisso», ou seja, que pretenda reunir numa só «chave» um conjunto de critérios que se apresentem universalmente aceites. Desta forma, parte-se dos vectores mais importantes e mais significativos, que normalmente atravessam transversalmente o campo conceptológico, ou seja, o tempo e o espaço. ÁLVAREZ (1993, p. 11) cita Noin ao apresentar uma primeira e simples classificação onde são enquadrados ambos os vectores, estabelecendo duas grandes categorias, nomeadamente a dos Movimentos Migratórios, quando se tratam de deslocações de média ou longa duração (e aqui enquadra-se a dinâmica definitiva), de carácter interno ou internacional.

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A outra categoria reporta-se aos Movimentos Habituais, ou seja, quando se verificam deslocações rítmicas e de curta duração, sem que para isso haja alteração do local de trabalho ou de residência. Esta classificação simplista, apesar de conseguir interligar o vector tempo-espaço, peca por se apresentar demasiado ténue no que concerne aos seus próprios limites, que se apresentam indefinidos. No entanto, um compromisso desse tipo poderia tornar-se deveras perigoso. Teorizando, e fazendo um ponto da situação sobre a dinâmica dos limites conceptuais/tipológicos, a situação parece reflectir-se da seguinte forma: Figura 3 – Dinâmica dos limites conceptuais/tipológicos

Situação A

Situação B

Zona de definição da situação A

Zona de definição da situação B

Zona cinzenta da situação A

Zona cinzenta de convergência

Zona cinzenta da situação B

Elaboração própria (2003).

Constata-se que há uma liberdade de definição até um ponto onde se identifica uma «zona cinzenta», na qual se depreende que ainda estando dentro do limite da situação em causa, já haverá uma força de atracção para uma outra. Desta forma, as regiões fronteiriças dos conceitos/tipologias apresentam um carácter dúbio e pouco claro, na medida em que se constata uma interpenetração situacional, por vezes pouco compatível. No entanto, a «zona cinzenta de convergência», local de encontro efectivo das situações, torna-se um local de extrema riqueza de conteúdos, de situações, de experiências, criando até novas necessidades conceptuais/tipológicas. Porém, incorre-se no perigo de se criarem situações de extrema complexidade, as quais poderão tornar-se em desígnios caóticos e inadaptáveis a qualquer realidade. Desta forma, é necessário ter sempre em conta que os limites de uma situação se afiguram como áreas ricas mas perigosas, embora seja importante senão a sua definição, pelo menos a identificação de um limite onde várias realidades se encontram. Tendo em atenção a questão espacial, DE MARCO (1989, p. 209) apresenta-nos uma tentativa de classificação das migrações, tendo em conta a distância entre os pólos da migração, o status político dos territórios de emigração/imigração e os hábitos de origem e destino. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Figura 4 – Classificação das Migrações Internacionais (Espaço) Entre Estados Intracontinentais

Migrações Internacionais

Entre Estados e territórios dependentes

Intercontinentais

Rural-Urbano Urbano-Rural Rural-Rural Urbano-Urbano

Entre territórios dependentes

1.a Etapa

2.a Etapa

3.a Etapa

Adaptado de DE MARCO (1993).

No que concerne à primeira etapa 12, as migrações internacionais envolvem um conjunto de espaços, que podem ir da escala local à escala mundial. ÁLVAREZ (1993, p. 14) acrescenta mesmo que neste nível ainda podemos distinguir as migrações que implicam Movimentos de curta distância (por exemplo, entre países vizinhos ou entre áreas relativamente próximas), relacionadas com as migrações intracontinentais, onde os movimentos de retorno estão facilitados. A Europa tem sido um espaço privilegiado para este tipo de movimentos. Já no que concerne às migrações intercontinentais, as distâncias impelem para que se verifiquem Movimentos de longas distâncias, a que o autor chama de Movimentos intercontinentais ou transoceânicos, mais comuns durante o séc. XIX, princípio do séc. XX, e que hoje perderam alguma preponderância. Na segunda etapa, observa-se uma situação de hierarquização dos lugares, segundo o seu grau de atracção e de influência na área envolvente. No primeiro e segundos casos há pelo menos um pólo dominador que atrai os fluxos (por exemplo, o caso dos países desenvolvidos que atraem população de outros países desenvolvidos menos «atractivos», ou então que atraem população de países em vias de desenvolvimento), embora no último exista uma homogeneização hierárquica, ou então uma destruturação da rede urbana, levando a que dois pólos dependam um do outro, por vezes de forma perniciosa (por exemplo, o caso de populações dos países em vias de desenvolvimento originárias das áreas rurais, que procuram as áreas urbanas desses mesmos países como local de chegada da migração).

12. Deve-se ter em consideração que a palavra «Etapa», utilizada neste contexto, não traduz em si uma fase da migração propriamente dita. É antes utilizada para traduzir as diferentes partes do esquema teórico. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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GONZÁLEZ e GARCÍA (2002, p. 749) referem-se à terceira etapa como dela fazendo parte um conjunto de trajectórias, que poderão ser aplicadas como tipificação das Migrações Internas: as migrações entre espaços Rurais-Urbanos, são observáveis nos países em vias de desenvolvimento ou em regiões pouco desenvolvidas, onde a conjuntura das áreas rurais proporciona um conjunto de factores repulsivos, em contraste com as áreas urbanas que, a priori, oferecem mais oportunidades. Para que tal situação se reverta (Urbano-Rural), terá de haver uma situação de congestão provocada pelas movimentações anteriores. Hoje tal acontece nos países desenvolvidos, onde a cidade não aufere de uma atracção ao nível da qualidade de vida que tinha há uns anos atrás, fruto de uma nova percepção e evolução desse mesmo conceito e da forma como é entendido. No caso das migrações Rurais-Rurais, esta tem lugar em regiões cuja base económica é fundamentalmente agrária, ligada à própria sazonalidade do sector. Neste caso, a natureza dita o ritmo do fluxo, mais até do que nos anteriores dois tipos de migrações. Parece pois que o Homem apenas tem o papel exclusivo nas migrações Urbanas-Urbanas, verificadas em países com elevadas taxas de urbanização e em que os factores atractivos/repulsivos são «fabricados» pelo próprio Ser Humano, à excepção dos grandes movimentos provocados por catástrofes naturais. No que concerne ao vector tempo, DE MARCO (1989, p. 227) aduz uma classificação de lógica similar à anterior: Figura 5 – Classificação das Migrações Internacionais (Tempo) Económicas

Migrações Internacionais

Permanentes Políticas e Ideológicas Temporárias

Regulares Irregulares

Naturais ou Fisiográficas

1.a Etapa

2.a Etapa

3.a Etapa

Adaptado de DE MARCO (1993).

Neste caso a autora acha pertinentes as motivações (2.a Etapa), como factor decisivo para que se estabeleça uma ordem temporal, ou melhor dizendo, para que o indivíduo tome uma decisão que o leve a prolongar ou encurtar a sua permanência no local de chegada. No entanto esta temporalidade, mais ou menos longa, pode conter no seu íntimo algumas fases Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ou ciclos, que irão conferir um carácter mais ou menos regular ao movimento migratório. Figura 6 – A regularidade/irregularidade temporal nos movimentos migratórios Movimentos de chegada/partida

Temporária

Fim efectivo da migração Continuidade da migração

Permanente Elaboração própria (2003).

No caso das migrações temporárias, o carácter de irregularidade poder-se-á acentuar ainda mais, visto que se tratam de migrações de curta duração, relacionadas muitas vezes com economias temporalmente complementares ao longo do ano através de ritmos estacionais marcados (ÁLVAREZ, 1993, p. 13). Embora estes dois vectores sejam considerados os principais na questão da classificação das migrações, existem outros que são tomados em consideração por estes autores, nomeadamente a forma como a migração é feita e a qualificação profissional dos migrantes. Se no primeiro caso estamos perante uma classificação mais de âmbito geral, no segundo entramos numa área mais específica e mais restringida a uma área que é transversal a todas as outras, embora qualquer uma destas áreas se possa correlacionar entre si. No que concerne à forma de migrar, DE MARCO (1989, p. 243) apresenta a seguinte classificação: Figura 7 – Classificação das Migrações Internacionais (Forma) Qualificadas Voluntárias

Migrações Internacionais

SemiQualificadas Forçadas

Individual/ /Familiar Colectiva Em Massa

Não Qualificadas

Adaptado de DE MARCO (1993).

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ÁLVAREZ (1993, p. 17), citando Peters, afirma que se pode considerar a Migração Voluntária como uma Migração Livre que normalmente é levada a cabo por uma decisão individual/familiar, actuando sem «impulsão» oficial, embora tal se possa generalizar a um maior conjunto de indivíduos. Normalmente este tipo de migrações têm na sua base motivações económicas, que podem oscilar entre a simples necessidade de sobreviver e o desejo de enriquecer (elevando o próprio estatuto sócio-económico do migrante). No caso da Migração Forçada já se verifica a «impulsão» feita por um elemento exterior à vontade do próprio indivíduo. Este autor ainda identifica dois níveis intermédios entre a migração voluntária ou livre e a migração forçada: poderá verificar-se uma Migração Impulsionada ou Induzida, no caso de haver um elemento exterior ao indivíduo que interfira na sua vontade, no entanto o que o lhe imprime um carácter peculiar é o facto de incluir um certo grau de liberdade de decisão por parte do indivíduo, ao contrário da migração forçada, onde o migrante praticamente não tem controlo sobre a situação. Já quando ocorre uma limitação das entradas/saídas de migrantes, revela-se a denominada Migração Restringida, embora se deva ter em atenção que nesta situação, o elemento exterior ao indivíduo condiciona a migração a jusante da decisão e não a montante. Quer-se com isto dizer que enquanto nos casos anteriores este elemento actuava directa ou indirectamente no processo de decisão, nesta última actua na situação em si, no próprio processo migratório. Transversalmente a esta tipologia, este último autor apresenta ainda uma outra tentativa de classificação das migrações, referente à qualificação profissional. Num primeiro grupo identifica as Migrações de Baixa Qualificação, constituídas por indivíduos sem nenhum ou com baixo nível de escolaridade, podendo tais fluxos serem identificados à escala local (nomeadamente nos movimentos Rurais-Urbanas) ou à escala mundial (fluxo Sul-Norte) 13. Nos anos 60, quadros técnicos e especialistas engrossam um fluxo migratório dos países desenvolvidos para os países em vias de desenvolvimento, associados ao trabalho desenvolvido pelas ONG. Embora estas Migrações de Média/Alta Qualificação actualmente pareçam seu um pouco mais reduzidas do que outrora, a verdade é que, temporariamente, materializam fluxos mais ou menos regulares para os países do Hemisfério Sul. No sentido contrário, os países desenvolvidos recebem destas regiões alguns profissionais altamente qualificados, que por não encontrarem condições para desenvolverem convenientemente a 13. Refiro-me, nesta designação Sul-Norte, aos movimentos migratórios gerais verificados dos países em vias de desenvolvimento do Hemisfério Sul, para os países desenvolvidos do Hemisfério Norte. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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sua actividade, partem em busca das mesmas. As Migrações de Alta Qualificação Profissional têm vindo a ganhar importância, principalmente a partir da sua origem, no início nos anos 50, quando o Reino Unido, a Holanda e a França receberam especialistas vindos da América Latina, África e Ásia. A este fenómeno peculiar, alguns autores denominam de Brain Drain, designação que assume no pleno sentido da palavra a «fuga de cérebros», quase sempre com carácter permanente. 1.4. As motivações inerentes ao processo de saída/entrada num território Ao considerarmos que uma população pode ser migrante tanto por «expulsão» do local de origem («push») como pela atracção exercida pelo local de destino («pull»), estamos de certa forma a admitir que as motivações que levam o indivíduo a migrar são de carácter externo a ele próprio, no entanto interferirão internamente na sua decisão individual (ÁLVAREZ, 1993, p. 11). No primeiro caso, tratar-se-á de um conjunto de factores negativos, os quais influenciarão a qualidade dos indicadores económico-sociais e de certa forma irão promover o desenvolvimento dos factores positivos, concretizados na atracção exercida pelo local de destino (MOON, 1995, p. 507). Estando mais a montante ou mais a jusante do processo, as motivações materializam-se no Território Migratório como situações em que o sujeito actua activa ou passivamente e que por isso mesmo interferem na sua vida quotidiana, criando uma situação de necessidade, ou melhor dizendo, uma busca dos elementos amenizadores das necessidades criadas por um contexto considerado menos favorável, ou até mesmo desfavorável. Tendencialmente, são situações sentidas não apenas por um indivíduo, mas que se generalizam paulatinamente a todo o grupo, criando precedentes quando os primeiros abandonam o local mater, no sentido de criar caminho para que os que ainda ficam, verem na conjuntura e no próprio território migratório uma motivação suficiente para eles próprios «engrossarem» o fluxo. Muitas vezes esta situação é incutida por uma dualidade de situações que se interligam, formando uma imagem conjuntural bem marcada territorialmente. Esta ideia é materializada pela concepção de dois grupos de elementos conjunturais (Ob. Cit., p. 507): • Situação de Repulsão: • – Declínio económico regional, recessão económica; Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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• – Diminuição do número de empregos; • – Fenómenos de opressão/descriminação racial, étnica, polí-

tica ou religiosa; • – Limitações estruturais ao desenvolvimento pessoal (carreira,

casamento, estatuto social…); • – Catástrofes naturais. • Situação de Atracção: • – Possibilidade de desenvolvimento pessoal/familiar ao nível da

carreira, educação, saúde…; • – Auferimento de melhores equipamentos e infraestruturas

(habitação, escolas…); • – Oportunidade de estabelecimento de relações/actividades

sociais/culturais. Os movimentos migratórios ocorrem em resposta às circunstâncias no local de origem, bem como aquelas que se desenvolvem e que são percebidas fora desse mesmo território (PARNWELL, 1993, p. 71). O facto de serem postos em consideração todos estes elementos, leva a que o indivíduo percepcione o seu território em jeito de comparação com o território Outro (de chegada), criando expectativas quanto ao seu próprio funcionamento. Parece ser assim criada uma imagem territorial, ou seja, uma representação do território «desejado», com base no território de origem, na sua situação, na imagem transmitida pelo Outro território e pelas expectativas criadas. Figura 8 – Construção da Imagem Territorial

Motivações Expectativas Situação Estrutural

Situação Estrutural Território de Origem

Território de Chegada

Informações

Percepção do Território

Território «desejado»

Elaboração própria (2003). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Essa imagem surge muitas vezes «desfocada», ou melhor dizendo, afastada da verdadeira realidade. Uma situação de repulsão evidente no território de origem leva a um condicionamento negativo do indivíduo, o qual pode ser exacerbado pela construção percepcional do território de chegada, a qual deriva não só das expectativas do próprio indivíduo, como também das informações recolhidas, principalmente através de testemunhos. Mas até que ponto os testemunhos são verdadeiramente reais? Veja-se o caso português, mais especificamente a emigração para França: a chegada a Portugal destes indivíduos emigrados em França a Portugal, na altura das férias de Verão, ou os contactos promovidos entre familiares/amigos durante o ano, geraram um canal de informações, resultado numa construção duma situação de atracção de França como território emigratório. Aliado à situação económica/social/política que o nosso país vivia na década de 60/70, fomentou-se a construção de uma imagem territorial falsa, que apenas culminava na desmistificação da mesma através do movimento emigratório e da chegada concretizada a uma realidade bem diferente da apresentada… a do bidonville e a da dinâmica inerente a tal espaço. A imagem territorial poderá ser também importante na determinação da intensidade e da direcção dos próprios fluxos migratórios, tanto no sentido de proporcionar equilíbrio ou de gerar desequilíbrio entre os territórios. FERNÁNDEZ, MIGUEL, ALONSO, D’OCON e LOU (1993, p. 20) pensam que poderão criar-se fluxos de compensação de desequilíbrios sociais, económicos e demográficos. O desequilíbrio poderá produzir um movimento contrário à sua própria direcção, no entanto sem que obrigatoriamente se restabeleça o equilíbrio original, ou seja, não é obrigatoriamente verificável que o fluxo se restabeleça para o seu local de origem, nem que as expectativas no local de chegada sejam superadas. Neste caso, o equilíbrio dificilmente será restabelecido, o que mais cedo ou mais tarde acabará por desembocar num desequilíbrio entre territórios. Analisar os motivos inerentes à decisão de migrar, leva a que nos deparemos com teorias ligadas às altercações em torno de processos económicos e sociais, no entanto há que ter em consideração um outro conjunto de componentes que interferem na decisão de migrar, nomeadamente o espaço. GONZÁLEZ e GARCÍA (2002, p. 736), ao citarem Da Vanzo, afirmam que a distância da deslocação pode funcionar como um incentivo ao movimento. Hoje, há que ter em conta que a distância já não é «medida» em termos quilométricos, mas antes em custo e tempo. Talvez seja mais lógico considerar que no caso das migrações se trata de uma motivação ligada à associação entre a «distância e o custo», já que o factor económico se apresenta como o argumento primeiro no incentivo à deslocação. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Muitos autores indicam que há uma relação íntima entre todo um conjunto de factores de várias índoles, sempre com uma certa subjugação à dimensão económica. No entanto, não parece existir nenhum tipo de migração que possa ser explicado única e exclusivamente por um único factor e mesmo quando tudo o indica, há que ter em conta que esse factor se desenvolve «verticalmente», ou seja, subdivide-se em certos graus de complexidade crescente, o que por si só o «desagregará», relacionando-o com outros factores adjacentes. A relação população-recursos será talvez o factor básico, segundo FERNÁNDEZ e DE MIGUEL (1995, p.667), que está na base de qualquer motivação. Mesmo que seja impensável estabelecer uma lógica de correlação numérica entre os quantitativos de população-recursos e o ponto de «ruptura» que iria dar lugar à mobilidade em si, não se deve perder de vista a evolução demográfica do respectivo grupo, bem como a sua respectiva posição no espaço geográfico: quanto mais o grupo crescer, mais espaço reclamará (e entenda-se aqui o espaço numa perspectiva de «espaço-recursos»), o que poderá provocar uma situação de ruptura, no caso das exigências superarem a capacidade de resposta desse mesmo espaço. As necessidades surgirão assim como resposta a algumas lacunas surgidas dessa incapacidade de resposta imediata. A partir deste estádio de base, outros factores necessariamente implicarão a construção de uma vontade individual. Estes poderão encontra-se a montante ou a jusante do estádio de base, constituindo a motivação que impele ao processo migratório. DE MARCO (1989, p. 219), a partir de um estudo de Dozo e Firbeda, sintetiza os factores que compelem a migração, identificando duas índoles: • Causas Fisiogeográficas ou Naturais:

– Factores relacionados com processos de desertificação; tectónicos; de erosão do solo; de inundação; de ordem biológica. • Causas Humanas:

– Factores económicos; políticos; bélicos; escravização; intolerância religiosa; intolerância racial; culturais; de saúde; sociais; militares; psicológicos colectivos; relacionados com alterações tecnológicas. 14

14. Entenda-se que as CAUSAS dizem respeito aos motivos propriamente ditos que levam à migração, enquanto que os FACTORES materializam os agentes que actuam a montante, sobre e a jusante dos motivos. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ÁLVAREZ (1993, p. 16) acentua que a dimensão económica é determinante nos movimentos da população e quando esta se apresenta como um imperativo, o factor de partida pode revestir-se de um duplo carácter, ou seja, de uma «capacidade de actuação» no espaço de partida e no espaço de chegada. Basta que para isso se considere o primeiro local como incapaz de prover os recursos indispensáveis ao preenchimento das necessidades e o local «último» com um crescimento económico que possa dar resposta a essas mesmas faltas. O grau de resposta exigido pelos indivíduos, condicionará naturalmente o tempo da migração, ou seja, a busca da satisfação económica imediata poderá originar uma deslocação de curto prazo, ao contrário de uma decisão individual que tenha em conta uma perspectiva de poupança-investimento, implicará uma deslocação pelo menos de longo prazo (senão definitiva!). Será essa dinâmica que está patente nos imigrantes que chegam ao nosso país? No caso dos vários grupos que se estabelecem em Portugal (Brasileiros, Europeus de Leste, Africanos, Chineses…) parecem ser impelidos por uma motivação económica, visto que possibilidade de emprego se constitui como um motivo de «atracção»… Nas causas humanas, os factores sociais e religiosos, segundo este autor, parecem ter um peso claramente inferior no cômputo das motivações, no entanto não deixam de ser pertinentes. Em certos casos/sociedade, a deslocação do local de residência da esposa para acompanhar o marido, ou o próprio desejo de obtenção de um status socioeconómico diferente do actual, dá origem a deslocações paulatinas significativas. As peregrinações são referidas como um factor que em certos casos origina grandes movimentos internacionais (por exemplo, a peregrinação a Meca), facto que deve ser visto com alguma reserva, uma vez que se tratam de deslocações com carácter particular e sem um fim que altere propriamente o local de residência e de trabalho, pelo menos a médio prazo. Será mais lógico, neste caso, falar em mobilidade do que propriamente em migração. As causas fisiogeográficas ou naturais, bem como as causas humanas relacionadas com a guerra, saúde, com a intolerância e cultura, encontram os seus limites melhor definidos e marcados, uma vez que se apresentam como factores que podem surgir de forma pontual e espontânea, sem que o indivíduo consiga construir um conjunto de opções de resolução do «problema». Neste caso, a escolha individual fica condicionada às circunstâncias externas, mais do que à decisão «interna», ou melhor, à decisão individual do próprio indivíduo. Parece pois viável aceitar que alguém saia do seu local de origem apenas porque foi expulso, porque uma situação bélica se agravou ou porque o indivíduo se sentiu impelido Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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a tal porque não era aceite racial/culturalmente no grupo e por isto não estava em segurança. Estes factores constituem por si só a base da saída, no entanto a razão económica também prevalece, nem que seja porque qualquer uma destas realidades implica que haja uma destruturação neste campo. No entanto a sua influência ganha uma posição secundária face ao conjunto de necessidades que aqui se encontra estabelecida, nomeadamente as de segurança e de saúde. A psicologia explica esta tendência a partir da «Teoria da Hierarquia das Necessidades», de Abraham Maslow, onde se defende que o indivíduo necessita de satisfazer um conjunto de necessidades, as quais se desenvolvem de forma hierarquizada. Num primeiro momento, o indivíduo necessita de dar resposta às suas necessidades básicas 15: para esta satisfação se concretizar, são necessários meios económicos, daí que esta teoria sustente cientificamente a validade do factor económico como aspecto primordial das motivações na base das migrações. No entanto, e num posterior estádio, são manifestadas a necessidade de segurança (entendendo aqui também a questão da saúde). Em certas circunstâncias, por uma questão de sobrevivência, poder-se-á mesmo verificar a sobreposição da segunda relativamente à primeira, porém num limite temporal-espacial demarcado, como é o caso de uma região em conflito. Ainda neste contexto, e superado o «problema» da segurança imediata, logo se colocam as necessidades básicas, com resposta no campo económico. Desta forma, cogitase que o factor económico se encontrará numa linha transversal à motivação migratória, uma vez que com mais ou menos preponderância, atravessa todos os factores e causas inerentes ao fenómeno como a resposta à superação das diferentes necessidades (MASLOW, 1970, pp. 35 a 57). Há ainda a destacar o caso dos factores psicológicos colectivos, como impulsores migratório. GONZÁLEZ e GARCÍA (2002, p. 736) afirmam que estes partem de uma base individual e que se relaciona essencialmente com a idade e com as aspirações e expectativas do indivíduo face à vida. No primeiro caso, assiste-se a uma tendência dualista, ou seja, se o avanço da idade se coloca como um «obstáculo» à constituição de uma nova vida fora do local de origem, por outro pode funcionar como uma espécie de «libertação» do quotidiano.

15. Entendidas como fisiológicas (alimentação, descanso, entre outras). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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MARTÍNEZ (1991, p. 230) incita esta visão quando refere que o número de jubilados 16 em Espanha tem vindo a crescer nos últimos tempos, motivado essencialmente por questões de saúde ligadas ao clima e também por questões económicas (relação compensatória das reformas-custo de vida). De um estádio de base simples, partir-se-á então para um conjunto de factores mais complexos, os quais constituirão a motivação que levará o indivíduo a sair do seu local de origem, fenómeno esse que se generalizará ao grupo. Se tivermos em consideração neste esquema os pólos do fluxo migratório, constatar-se-á que as motivações se aplicam tanto ao fenómeno de emigração, como ao de imigração, ou seja, tanto ao território autóctone e ao movimento de saída, como ao território alóctone e ao movimento de entrada nesse mesmo local (FERNÁNDEZ e MIGUEL, 1995, p. 668). Porém, a motivação emigratória, parece em certos casos, predominar sobre a imigratória, uma vez que normalmente são os desequilíbrios nas regiões emissoras que levam à saída de população. De qualquer forma, deveremos ter em conta não só os motivos que levaram o indivíduo a sair do local de origem, como também aqueles que o levaram a escolher determinado local para residir e trabalhar, o que impele a ter em consideração os factores/causas/motivações inerentes em cada um dos pólos, independentemente de um poder ter mais influência que outro. 1.5. O desenvolvimento de modelos no estudo da Imigração Relativamente a esta temática, alguns foram os autores que acharam pertinente a materialização de situações matriciais no sentido de, teoricamente, representar as tendências de alguns fluxos migratórios ligados ao próprio espaço. Nesta linha, cumpre-me apresentar três autores que manifestamente teorizaram as relações de mobilidade relativamente aos movimentos migratórios, embora as relações estabelecidas destaquem em diferentes graus cada um dos elementos que as constituem.

16. Os Jubilados são aqui considerados como os «imigrantes em idade de reforma», vindos essencialmente da Europa do Norte e que procuram nova morada na Europa Mediterrânica por esta apresentar um clima «atractivo», um custo de vida «moderado» relativamente ao do local de origem… Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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McDOWELL e SINGELL (1992, p. 352) apresentam um modelo onde o imigrante aparece em lugar de destaque, como elemento primordial e decisivo no processo migratório. Segundo estes autores, o período de pósguerra foi marcado por intensas migrações, embora a composição dos fluxos tenha mudado ao longo dos anos. O facto da Europa estar destruída pelas duas guerras, aliado ao vazio humano provocado pela natureza do fenómeno, incentivou a movimentos de saída de mão-de-obra para vários pontos afectados. No entanto, quando tal se verifica e os vazios humanos são preenchidos, os fluxos de trabalhadores passam a ser mais «localizados» em função de áreas definidas e com capacidade de absorção desses grupos. O aumento da dependência dos empregadores relativamente aos empregados também parece ter aumentado, o que desta forma centra o imigrante como peça fulcral num processo que, do ponto de vista destes autores, por ele é dominado. O desenvolvimento do Modelo Empírico centra na sua base o imigrante, visto aqui como capital humano passível de ser quantificado através da produção a ele inerente. Esta quantificação não pode nem deve só incluir os «custos de produção» ou «lucros» de cada um dos indivíduos, uma vez que incorreríamos numa análise parcial: os imigrantes ilegais e todos aqueles que estão envolvidos na «economia subterrânea» não seriam pois contabilizados neste modelo! Desta forma os autores citam Fein que, em 1965, propôs que se considerasse cada um dos indivíduos a partir do valor igual/superior de lucros que poderiam obter no futuro, tendo em conta o global da situação presente. Aplicado este modelo, concluiu-se que em termos monetários, os imigrantes originários de regiões industrializadas ganham mais do que os imigrantes vindos de regiões menos desenvolvidas, mesmo fazendo o mesmo trabalho. A idade também parece ser um factor a ter em conta, visto que se constatou que esta determina de certa forma os seus ganhos: a migração mais tardia implica que os lucros iniciais sejam maiores, embora o retorno monetário seja menor. Talvez tal facto se compreenda se tivermos em conta as motivações que estão na base da migração, ou seja, quem migra mais tarde, provavelmente com família constituída, fa-lo-á por razões mais concretas e imediatas do que propriamente alguém que migra numa idade jovem, sem família (portanto sem encargos directos) e no início da vida activa. Será diferente a situação de alguém que migra depois de ter exercido uma actividade profissional durante um considerável período da sua vida, o que pode condicionar a especialização nesse tipo de tarefa. Pelo contrário, alguém que esteja no início da vida activa poderá adaptar-se com mais facilidade a um conjunto de tarefas, visto nunca ter exercido Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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nenhuma (ou ter exercido poucas) e estar aberto a uma vasta gama de trabalhos. Porém esta teoria parece pecar por considerar só e apenas o aspecto humano. Neste sentido HUNT (1993, p. 341) insere mais dois vectores, estabelecendo nos modelos que apresenta os pólos «Imigrantes – Dimensão Económica – Espaço» e é da relação que estabelecem que se poderão verificar no fenómeno imigratório momentos de equilíbrio/desequilíbrio. A segunda situação foi materializada por este autor no Modelo de Desequilíbrio: neste paradigma considera-se que existem diferenças espaciais nas oportunidades económicas, o que significa que a tendência evolutiva é para que à medida que o mercado se desenvolve, se tal não for contrariado, acentuar-se-ão as iniquidades. Neste caso o factor humano poderia actuar como «amenizador», promovendo o desenvolvimento das áreas mais deprimidas, no entanto o que se verifica é que os fluxos imigratórios tendem a tomar a direcção dos centros económicos mais activos, o que por si só irá marcar ainda mais o desequilíbrio. Tal situação é reversível, no entanto a compensação feita pelos fluxos é muito lenta, provocando até alguns retrocessos na situação. A situação de avanço-recuo influencia assim a montante e a jusante a própria direcção dos fluxos, o que promove o desenvolvimento de um ciclo vicioso em que cada um dos pólos influencia e é influenciado pelos outros. Ao contrário, poder-se-ão verificar situações de equilíbrio, as quais se concretizam no Modelo de Equilíbrio. Neste caso o autor afirma que os pólos «Imigrantes – dimensão económica – espaço» são eficientes, ou seja, apresentam um dinamismo inerente capaz de compensar qualquer desequilíbrio que se possa estabelecer. Por outro lado, a direcção dos fluxos apresenta-se como causa/consequência dessa mesma situação, o que quer dizer que essas mesmas iniquidades são compensadas pelos mesmos. As diferenças espaciais são tidas como uma mais-valia, no sentido em que promovem uma concorrência entendida como motor de desenvolvimento. O tempo e a velocidade dos processos parecem estar na base da diferenciação destes dois modelos: no primeiro, a relação entre os três pólos é equilibrada e por isso mesmo a capacidade de recuperação/resposta é bastante rápida, ao contrário do segundo modelo, onde a adaptação se faz de uma forma muito mais lenta. Talvez por isso que as diferenças sejam tomadas como obstáculo, enquanto que no modelo de equilíbrio são consideradas como estímulo à inovação e ao consequente desenvolvimento. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Parece pois importante ter em consideração a base motivacional que promove o fluxo em cada uma das situações: no caso de equilíbrio, a migração faz-se quando há mudança nos padrões da oferta/procura de emprego, enquanto que no caso de desequilíbrio os fluxos são promovidos pela necessidade de compensação de lacunas verificadas ao nível económico. Desta forma, a imigração é vista como um elemento de dupla função, causando ou esbatendo as iniquidades, numa íntima relação com o espaço, tradutor das alterações e da dimensão económica, de influência transversal a todo o processo. No sentido de procurar aliar o espaço ao tempo, MALHEIROS (1996, p. 50) apresenta a Teoria da Transição da Mobilidade, de Zelinsky. Este modelo, com paralelo numa série de outros surgidos nas décadas de 50/60, considera a existência de cinco fases, ou melhor, de cinco estádios por onde cada sociedade passaria, no que concerne aos seus movimentos migratórios. Quadro 1 – Teoria da Transição da Mobilidade, de Zelinsky Fases 1.a Fase

Sociedade

Transição Vital

Sociedade Tradicional Pré-Moderna

Transição da Mobilidade

Natalidade e MortaliPouca mobilidade dade elevadas

2. Fase

Sociedade de Transição Inicial

Acréscimo de Fecundidade e Diminuição da Migrações Campo-Cidade Natalidade e Mortali- e Internacionais dade

3.a Fase

Sociedade de Transição Final

Incremento das MigraAbrandamento do cresções Campo-Cidade e Incimento Natural ternacionais

Sociedade Avançada

Redução da mobilidade, Crescimento demográ- excepto ao nível dos profissionais altamente qualifico reduzido ou nulo ficados

a

a

4. Fase

5.a Fase

Manutenção do cres- Migrações de locais pouco cimento demográfico desenvolvidos para locais reduzido desenvolvidos

*******

Adaptado de MALHEIROS (1996).

Neste sentido, a combinação de indicadores sócio-demográficos estariam ligados à própria suposição da mobilidade, ou seja, a Transição Vital (traduz a variabilidade da natalidade e mortalidade) acompanharia num sentido biunívoco a própria Transição da Mobilidade. O primeiro aspecto a ter em consideração, prende-se com a intensidade dos movimentos: se Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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numa primeira e segundas fases a mobilidade se apresenta restrita e mais ou menos limitada, na terceira fase atinge o seu auge. Note-se pois que à medida que se processa o incremento das marcas demográficas duma sociedade moderna (crescimento demográfico reduzido ou nulo), os fluxos reduzem-se significativamente, fruto da diminuição da população apta para migrar (jovens), como também se apresentam mais específicos, no que diz respeito ao tipo de migrantes (profissionais qualificados) e aos locais onde se processa a migração (dos «locais» pouco desenvolvidos para os desenvolvidos, o que acontece hoje nos fluxos Sul-Norte). Porém, há que ter em conta que nem todos os países passaram por todas as fases da mesma forma, se é que passaram as mesmas fases, visto que cada caso se encontra numa linha de desenvolvimento substancialmente diferente. No que concerne ao caso português, por exemplo, e partindo do princípio que apresentamos as características de uma «sociedade avançada» (Transição Vital), deveríamos apresentar uma mobilidade reduzida, o que na prática não se verifica, pelo menos ao nível dos fluxos de imigrantes que tende a ser quantitativamente cada vez maior! Portanto parece ser uma teoria que se deve ver com alguma reserva, na tentativa de aplicação à prática. As iniquidades cada vez mais marcadas entre países/regiões, faz com que estes sejam modelos de aplicação teórica/prática diferenciados e sugestivos, sustentados por uma base perceptiva que dificilmente se poderá aplicar da mesma forma a todos os casos. Porém tratam-se de bases de partida necessárias para o estudo das migrações. 2. O FUNCIONAMENTO LEGISLATIVO FACE AO IMIGRANTE 2.1. Entre direitos e deveres: o Estatuto do Imigrante em Portugal O Direito português consagra os direitos e deveres dos imigrantes no âmbito do Estatuto Legal e do Estatuto Constitucional dos estrangeiros. Cada um destes quadros tem sofrido inúmeras alterações ao longo dos tempos e no que concerne ao espaço nacional, a revolução de 1974 parece ter sido um marco decisivo para a revisão, reformulação ou até mesmo génese de alguma matéria jurídica neste campo. Uma evolução a dois tempos, que paulatinamente tem tendência a alterar para «três» neste virar de milénio, onde cada vez mais se verifica uma tendência para que haja um recuo nos direitos dos imigrantes (LEITÃO, 2003, p. 12). A explicação da mutação pode surgir baseada em duas perspectivas, ou seja, tratar-se-á de uma situação propiciada em grande parte pelas Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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directivas comunitárias em matéria de política de imigração, as quais exigem uma aplicação concreta. Por outro lado, o facto de estarmos a tomar cada vez mais o epíteto de «cais de chegada», poderá fazer com que se ache necessário tomar as devidas precauções, no sentido de evitar situações de ruptura económica e social. Mas o que significa de facto ser um «país de imigração»? É uma questão estatística? É uma questão de tradição imigratória? Quando FIJALKOWSKI (1989, p. 40) afirma que a Alemanha não é um país de imigração, a controvérsia e a dúvida instalam-se… Nesta lógica, penso que o autor transmite a ideia de que será pertinente analisar esta designação de um ponto de vista global, enquadrando não só os números evidenciados pelas estatísticas, como também todo o contexto que circunda a vida do imigrante, relacionado com a legislação de que beneficia, com o próprio estatuto legal e constitucional, inserção/aceitação social, entre outros. Numericamente, um país que recebe um número significativo de imigrantes, materializados em fluxos mais ou menos regulares (saldo migratório positivo), é considerado um país de imigração. O facto desta situação se apresentar como um fenómeno conjuntural, de longa duração, também é significativo… no entanto a expressão «país de imigração», poderá revelar-se incongruente e falaciosa, se tivermos em conta o facto de que, na realidade, se podem praticar políticas e auferir de legislação que em tudo «dificultam» a entrada e a permanência dos imigrantes! Em Portugal, o Estatuto Legal dos imigrantes surge como consequência da adesão de Portugal à Comunidade Europeia e mais tarde ao espaço de Schengen. A Lei n.º 37/81, de Outubro de 1981, substituída pela Lei n.o 59/93, de Março de 1993, é a que vai regular neste âmbito o processo de entrada, permanência e expulsão de estrangeiros 17, numa lógica de «uniformização», se é que assim se pode dizer, com algumas das directivas da União, nomeadamente em termos de providências legais e aspectos formais (tipologia dos vistos). BAGANHA e MARQUES (2001, p. 22) referem para que se processe a entrada de um imigrante no território português, é necessário que este se faça acompanhar de um documento de viagem válido, que prove dispor de meios suficientes de subsistência, que não esteja indicado como pessoa 17. Em toda a bibliografia legislativa sobre esta temática, é comum aparecer a designação estrangeiro mesmo quando o assunto discutido se refere em especial aos imigrantes. A primeira expressão parece designar um termos mais lato, englobando todos os indivíduos não nacionais que permanecem em território português, seja por que motivo for. A segunda designação diz respeito ao grupo dos indivíduos que entram em Portugal com uma intenção «imigratória», sejam estes legais ou não. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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não admissível no Sistema de Informação de Schengen ou nas listas nacionais e que apresente um visto válido e adequado, segundo a Lei n.o 244/98. Também deve ser tomado em consideração o objectivo que o faz permanecer no país (ligação de uma viagem-escala, visita, estudos, trabalho…). Esta mesma lei foi alterada pelo Decreto-Lei n.o 4/2001, de 10 de Janeiro de 2001, fruto da evolução do fenómeno migratório verificado nos últimos anos, segundo consta no preâmbulo da mesma. Verifica-se pois que há uma alteração, no sentido em que as entradas passam a estar subordinadas às necessidades do mercado de trabalho. No entanto, há progressos no que diz respeito à responsabilização dos elementos empregadores de mão-de-obra ilegal (pelo pagamento de salários, descontos…) e à criminalização do auxílio à imigração ilegal, aliciamento e angariação. (Ob.Cit., p. 27) 18 A expulsão é tida em conta na Lei nº 244/98, a qual apresenta para tal consumação, motivos relacionados com a violação do direito constitucional e criminal, bem como a entrada e a permanência ilegais dentro do território, o que parece ter acontecido neste caso. No entanto, antes que tal lei fosse promulgada, o governo português procedeu a dois grandes processos de regularização extraordinária dos imigrantes em situação irregular, um em 1992 e outro em 1996. Manifestamente direccionada para cidadãos de países lusófonos, acaba por se estender a cidadãos de outros países que tenham entrado em Portugal em situação idêntica. (Ob.Cit., p. 28) Esta atitude poderá ser encarada sob dois ângulos, quer dizer, como uma tentativa de restabelecer a ordem dos fluxos, accionando um mecanismo que permitisse enquadrar realisticamente todos aqueles que compunham o grupo de imigrantes presentes no espaço nacional e também no sentido de evitar abusos e ilegalidades sobre os mesmos. Por outro lado, e tendo em conta a situação actual, podemos ser levados a pensar que se trata de uma última oportunidade para o estabelecimento de população imigrante antes que as «portas» possam ser fechadas, ou pelo menos deixem passar menos indivíduos. No que concerne à questão do Estatuto Constitucional dos estrangeiros, preservam-se aqui os direitos básicos e universais do indivíduo ajustados, se é que assim se pode dizer, à realidade da Constituição portuguesa. 18. Portugal, tomando consciência de que é um país que cada vez mais recebe imigrantes, muitos deles estando no território de forma ilegal/clandestina, realizou uma rusga no dia 4 de Fevereiro em Lisboa, mais especificamente no Intendente, por se suspeitar da existência, nessa área, de imigrantes em situação irregular. Estando programada há vários meses, resultou na detenção de cerca de 200 indivíduos, entre Brasileiros, Africanos e Europeus de Leste. (SIC, «Jornal da Noite» [20:00] do dia 4 de Fevereiro de 2004). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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LEITÃO (2003, p. 1) cita J. J.Canotilho, afirmando que a Constituição portuguesa consigna a denominada «cidadania de todos», uma vez que os direitos são reconhecidos a nacionais e estrangeiros, salvo casos reservados.19 Teoricamente, esta questão apresenta-se como justa e equilibrada, uma vez que respeita os indivíduos no sentido da igualdade. Porém, na prática, tal pode levantar alguma agitação, na medida em que mexe com o sentido de posse, ou melhor, de pertença de uma posição adquirida pelo autóctone e que nem sempre deseja partilhar com o alóctone. Desta forma, talvez se possa explicar que são excepções a este princípio o direito de exercício de funções públicas com carácter técnico, as quais são reservadas pela lei exclusivamente para cidadãos portugueses. (Ob. Cit., p. 2) Parece pois haver uma contradição no designado princípio da igualdade, estabelecendo-se na verdade uma «igualdade condicionada». O princípio da universalidade passa assim a revestir-se de um carácter parcial e selectivo: se é certo que as funções públicas de carácter técnico possam exigir o conhecimento de uma realidade nacional e estar enquadradas num contexto desconhecido ao imigrante, não se chega sequer a procurar estabelecer um paralelismo no sentido de promover a equivalência de funções e a formação específica, provendo ao imigrante iguais oportunidades de acesso a este tipo de lugares… O Estatuto Constitucional dos estrangeiros consagra também outros princípios além da igualdade e equiparação, nomeadamente o da «não discriminação». O reconhecimento de direitos aos estrangeiros não está, em geral, sujeito à reciprocidade, o que significa que só alguns podem votar e ser eleitos. A Lei n.o 50/96, de 4 de Setembro, regulamentou que podem votar e ser eleitos os cidadãos estrangeiros de todos os Estados-Membros da UE, de Cabo Verde, Brasil, Peru e Uruguai, apenas podendo votar os cidadãos da Argentina, Chile, Venezuela, Israel, Noruega e Estónia. (Ob. Cit., p. 5) Mas até agora, apenas temos discutido direitos e deveres próprios de indivíduos que se encontram em situação regular. Garantir a dignidade humana parece ser um direito de base, mantendo-se como condição transversal a todos os textos jurídicos, bem como todos os outros que lhe estão inerentes (direito à vida, à integridade moral e física, à liberdade de 19. Este princípio da universalidade é completado com o princípio da equiparação em matéria de direitos e deveres, excepto no exercício de funções públicas e direitos políticos, no entanto este último princípio tem sido matéria de controvérsia no Direito. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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consciência, religião, à saúde…), mesmo que o indivíduo se encontre em situação irregular. Neste caso, estes direitos são mantidos enquanto este se encontre em território nacional, mesmo que estejam a ser-lhe aplicadas medidas de afastamento. Para tal situação contribuíram além do instituído na lei portuguesa, as directivas da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. A manutenção destes direitos é fundamental, pois a própria situação de «irregularidade» penaliza em muito o próprio desenvolvimento do indivíduo… este é sempre um Ser Humano privado de realização da vida e das esperanças que trás dentro de si. (Ob. Cit., p. 4) No entanto não podemos dizer que o Estatuto Constitucional dos estrangeiros, no que concerne ao reconhecimento dos direitos dos imigrantes, apresente uma evolução linear. Pelo contrário, muitas das directivas emandas revestem-se de um carácter contraditório quanto ao que já está definido, tocando os limites do pouco claro. Assumir-se que Portugal passa a ser um país também de imigração ainda não está bem «consumada» e talvez por isso se tenha instalado uma confusão no traçar de caminhos tanto que, até aos anos 80, o fenómeno imigratório era tratado numa perspectiva de controlo de fluxos. Foi só a partir de 1995 que os programas de governo passam a ter em conta a situação da imigração e de todos aqueles que deste movimento fazem parte, tendo sido criado para isso o Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, o Entreculturas, bem como a integração dos mesmos em certas políticas sociais (por exemplo, no Plano Especial de Realojamento). Até 2001, verificou-se um crescente debate nesta matéria, até porque na questão do Direito, foram tomadas providências no sentido de criar e garantir os direitos e deveres dos imigrantes. Como exemplo, poder-se-ão enunciar algumas medidas tomadas, como por exemplo a promulgação da Lei n.o 20/98, de 12 de Maio, ou seja, a lei do trabalho de estrangeiros, que vem proteger o trabalhador estrangeiro quanto a situações de discriminação; houve também uma evolução nas políticas sociais, na medida em que os imigrantes passam a estar inseridos nos projectos de Luta Contra a Pobreza, Rendimento Mínimo Garantido, Plano Nacional de Acção Para a Inclusão (2001-2003), acesso ao Serviço Nacional de Saúde… (Ob. Cit., p. 7) Num cenário que se apresenta mais ou menos linear e aberto, após 2002 inflecte-se, na medida em que se constata um maior cuidado no controlo de entradas e permanências, talvez porque nos tenhamos apercebido realmente que somos o espaço de chegada de importantes fluxos imigratórios intra e extra-europeus. Prova disso é a Lei n.o 22/2002, de 21 de Agosto, que clarifica o conceito de residente, considerando-o como Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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aquele que é titular de autorização de residência (excluindo o titular de visto de trabalho e de autorização de permanência), bem como prevê um regime de cancelamento de vistos e de autorizações de residência. Também a renovação da autorização de residência burocratizou-se significativamente e o reagrupamento familiar tornou-se num processo muito mais exigente. (Ob. Cit., p. 14) A burocratização do sistema, necessária por um lado (em termos de controlo, segurança…), mas pode tornar-se perniciosa por outro. Podemos ilustrar esta última imagem com o de um cidadão cabo-verdiano que esteve privado de ver a filha durante cinco anos, visto ter sido expulso do país por não se encontrar regularizado na altura. Porém, e após ter tratado da situação no seu país de origem, a máquina burocrática portuguesa empatou o processo visto os dados terem demorado a dar entrada no computador! 20 A protecção dos imigrantes e da população nacional será o cerne de toda esta questão. Contudo, o aperfeiçoamento do Direito e dos mecanismos que provêm a sua manutenção tendem a complexificar certos processos. 2.2. A questão da nacionalização A tardia descolonização veio provocar um momento de transição no quadro legal da nacionalidade: prevaleceu até então a perspectiva do jus soli, ou seja, o automático direito à nacionalidade a partir do momento em que se nascesse em território português.21 Mas tal facto culminou nos anos 80 com a publicação da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro, onde a figura é abolida em substituição da perspectiva do jus sanguini 22. BAGANHA e MARQUES (2001, p. 31) revelam que tal alteração não foi acompanhada devidamente por aqueles que queriam obter a nacionalidade portuguesa, tanto que num estudo feito em 1998 pelo primeiro autor, constatou-se que existiam um número de recém-nascidos em situação irregular, porque os pais tinham partido do princípio que uma criança nascida em Portugal era considerada automaticamente portuguesa! Para mitigar tal situação, o governo português acabou por abrir uma excepção, ao permitir a apresentação posterior de pedidos de autorização de permanência no país. 20. Foi uma notícia revelada pela SIC, no «Jornal da Noite» (20:00) do dia 11 de Fevereiro de 2004. 21. Ver Lei n.o 2098, de 29 de Junho de 1959 e Lei nº 308-A/75, de 24 de Junho. Em ambas as leis prevalece a questão do jus soli. 22. No jus soli o indivíduo obtém a nacionalidade porque, apesar de ser filho de pais estrangeiros, nasceu no país de chegada (donde quer ser nacional). No jus sanguini, apesar de ter nascido no país de chegada, obtém a nacionalidade do país de origem dos pais, porque prevalecem os laços sanguíneos. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Esta situação parece enquadrar-se de facto com a evolução verificada anteriormente, onde cada vez mais o processo de entrada/permanência se apresenta dificultado. A obtenção da cidadania portuguesa pode obter-se por: – Ascendência; – Aquisição da nacionalidade (através do casamento, adopção ou naturalização). Tal pode revelar-se numa tarefa árdua e morosa: no caso de crianças nascidas de pais estrangeiros em território português, só poderão ser consideradas portuguesas se os progenitores residirem legalmente em território nacional há pelo menos seis anos (no caso de serem originários de um país lusófono), ou dez anos (no caso de provirem de um outro país), caso seja essa a sua vontade. Pela via do casamento, a obtenção é feita três anos após a realização do mesmo. No caso da naturalização, são exigidos requisitos não só ao nível formal (maioridade, seis/dez anos de residência legal no país, conforme se trate de originários de países lusófonos ou não, respectivamente…), como também de índole social (conhecimento da língua portuguesa, existência de uma ligação efectiva à comunidade nacional…), entre outros. Nesta área, apenas a adopção proporciona a aquisição automática da nacionalidade portuguesa. (Ob. Cit. p. 30) Estaremos pois na continuidade de uma prática que há muito parece expandir-se na Europa? Já FIJALKOWSKI (1989, p. 40) adere ao pressuposto de que na Alemanha dos anos 80 (na antiga República Federal da Alemanha), a obtenção da nacionalidade era um processo moroso, votado a um conjunto de fases que se apresentavam antes como um conjunto de obstáculos. O mais curioso é que semelhanças com as directivas do caso português são notórias, quer seja em termos de prazos, quer seja em termos de exigências burocráticas e sociais. Já no caso francês, GUILLON (1988, p. 138) assume que muitos dos que hoje têm nacionalidade francesa a adquiriram graças ao nascimento em território nacional e ao facto de aí residirem sempre, antes da maioridade. A questão do jus sanguinis e do jus soli foi neste caso muito discutida, verificando-se ao longo dos tempos uma «disputa», se é que assim se pode dizer, da prevalência de uma em relação a outra. (MASSOT, 1985, p. 11) Tal como em Portugal, hoje prevalece a perspectiva do jus sanguinis sobre o caso da atribuição da nacionalidade a crianças filhas de uniões mistas/estrangeiras.

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De qualquer forma, em cada um destes casos, verifica-se a paulatina conversão a uma atitude legislativa onde prevalece a prudência e o cuidado de atribuição da nacionalidade a indivíduos estrangeiros. Esta situação não é omnipresente, melhor dizendo, ocorre em tempos diferentes sobre territórios diferentes, no entanto consegue-se observar uma matriz comum, que mais cedo ou mais tarde toma o panorama legislativo, levando a crer que são seguidos alguns exemplos de outras realidades nacionais, seja por «imposição», seja por uma questão de mera observância e precaução. 2.3. Portugal e o Outro: os (in)desejados? Como se pode constatar, Portugal apresenta uma legislação de base para todos os imigrantes, porém com alterações, caso se trate de indivíduos vindos de países lusófonos. Esta preposição está clara se tivermos em conta que o prazo para a obtenção da nacionalidade é mais curto para estes imigrantes, no entanto encontra-se uma certa contradição quando falamos na questão do direito de voto/eleição dos mesmos. Da panóplia de países já citados, apenas os imigrantes provenientes de Cabo Verde e Brasil, caso estejam em situação legal e cumpram os requisitos legais para tal, se encontram aptos para poder votar e ser eleitos. À partida, são excluídos todo um conjunto de outros imigrantes lusófonos, para não falar de todos os outros que não partilham da mesma língua. Perante uma situação de legalidade, a lei definirá aqui dois tipos de imigrantes? LEITÃO (1997, p. 29) considera que Portugal tem muito a ganhar, mantendo em aberto a «possibilidade de escolher» os imigrantes que está interessado em aceitar no seu espaço nacional. Caso fossemos obrigados a rejeitar ou a inibir a entrada de imigrantes vindos dos PALOP ou Brasil, promoveríamos uma tensão com os países lusófonos, que se poderia repercutir sobre a comunidade emigrante aí estabelecida. Além de tal facto poder cortar as importantes relações económicas e culturais consolidadas ao longo dos séculos, certamente contribuiria negativamente para a construção europeia, onde se pressupõe que haja uma relação harmoniosa inter e intra Estados-Membros, dentro e fora da Comunidade. Ultimamente, têm sido privilegiadas as relações entre o espaço nacional e o Brasil: só este ano foram assinados o «Acordo para a Prevenção e a Repressão do Tráfego Ilícito de Migrantes», o «Acordo sobre a Contratação Recíproca de Nacionais» e o «Acordo sobre a Facilitação de CirculaFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ção de Pessoas». 23 BAGANHA e MARQUES (2001, p. 88), perante esta situação, assumem que continua a ser politicamente incentivada a emigração de brasileiros para Portugal, «privilégio» esse que constitui um condicionalismo para o desenvolvimento de uma política migratória justa e equitativa. Há necessidade de uma política equilibrada e imparcial, não só em Portugal, como também no seio da União, daí que FIJALKOWSKI (1989, p. 43) afirme que, para a UE, seria importante a organização um modelo estandardizado para os Estados-Membros, tendo em conta os direitos e deveres do cidadão a vigorar no contexto do local de residência do imigrante. Tal ideia compreende-se no sentido de que é no local de residência que o indivíduo desenvolve a sua vida económica, social e cultural, sendo as repercussões dos seus actos aí mais vincados. Esse é pois o território, por excelência, de materialização das consequências, dos efeitos e das acções, sejam elas de índole positiva ou negativa. Parece, à primeira vista, ser justa a defesa desta ideia, no sentido de que, neste caso, o imigrante poderá tornar-se num elemento importante da economia regional e da própria vida social desse mesmo território, daí a justa oblação de um investimento realizado a vários níveis da vida individual/ /comunitária. Parece mais difícil o imperativo empreendimento de uma política comum em termos de imigração. Será pois importante o estabelecimento de processos de cooperação entre países, baseados em acordos bilaterais de controlo dos fluxos migratórios, a abolição de barreiras entre a questão do estrangeiro/cidadão, a promoção da liberdade de circulação entre países. (Ob. Cit., p. 44) De qualquer forma, este é um assunto que muito dificilmente se dará como encerrado e que deverá estar sempre em destaque na esfera da cooperação intergovernamental (LEITÃO, 1997, p. 126). No entanto, há que ter em consideração que a homogeneização será sempre relativa e inviável na sua totalidade, visto que há todo um conjunto de realidades diferenciadas que obrigam a que se tomem medidas pontuais para certos casos. Por exemplo, no que concerne à livre circulação… como tomar tal medida em sentido pleno, quando em certos países, até como Portugal, o problema da imigração ilegal/clandestina e das redes de tráfego aumenta a cada dia que passa? De qualquer forma, é um assunto que é relativamente constante nas discussões da União e surge com frequência concretizada em medidas várias, embora nem sempre de 23. Estas informações foram obtidas no site: http://www.acime.gov.pt/modules.php?name=Downloads&d_op=viewdownload&cid=11, (10/09/2004) Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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carácter específico sobre a imigração. Uma das últimas directivas foi a regulamentação relativa a Países Terceiros, Vistos e Isenções. 24 A política de imigração em Portugal surge pela primeira vez explicitamente no programa do XIV Governo Constitucional, sob a rubrica «Uma política de plena integração dos imigrantes e das minorias étnicas». A verdade é que as situações irregulares favoreciam a marginalidade e as situações de exploração dos imigrantes, por parte de patrões com menos escrúpulos e havia a necessidade de encarar a situação (SOUSA, 2002, p. 389). Por exemplo, no programa do XII Governo apenas há uma referência indirecta à temática quando se fala da «vigilância de fronteiras», mas mesmo nos Governos anteriores não há qualquer referência. Primeiramente, há no XII Governo uma preocupação em limitar e regular a entrada de imigrantes, principalmente aqueles que não eram originários de países lusófonos, bem como em prover àqueles que já cá se encontravam, condições de vida dignas a vários níveis (educação, saúde, trabalho…), tanto que foram inseridos na política de reinserção social como grupo em posição de vulnerabilidade social, tendo até acesso ao rendimento mínimo garantidos (FERREIRA e RATO, 2000, p. 49). No XIV Governo a orientação vira-se para uma lógica mais integradora e globalizante, acompanhando e reforçando as ideias anteriormente explicitadas. Há pois a necessidade de desenvolver uma política coerente e equilibrada, votada à combinação da política imigratória portuguesa com a desenvolvida por outros Estados-Membros da União (LEITÃO, 1997, p.123). Esta ideia da consolidação e de possível harmonização da legislação quanto a esta temática, parece estar bem patente na ideologia europeia e portuguesa (pelo menos, em termos de intenções) e neste sentido é promulgado o Decreto-Lei n.o 34/2003, de 25 de Fevereiro, o qual vem alterar o regime jurídico da entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros, contemplados na Lei n.o 22/2002, de 21 de Agosto. Interessante será analisar e comparar os preâmbulos de três casos de legislação que muito interferiram/interferem com a realidade actual, nomeadamente o Decreto-Lei n.o 4/2001, de 10 de Janeiro, a Lei n.o 22/2002, de 21 de Agosto e o Decreto-Lei n.o 34/2003, de 25 de Fevereiro. No primeiro,

24. Estas informações foram obtidas no site: http://www.acime.gov.pt/modules.php?name=Downloads&d_op=viewdownload&cid=5, (10/09/2004) Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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o curto preâmbulo apenas refere a necessidade de «acautelar, por um lado o interesse público (…) tendo em conta o fenómeno migratório verificado…» 25 O segundo caso segue a linha do primeiro 26, sempre numa perspectiva de defesa e cuidado do interesse nacional. Neste último Decreto-Lei assume-se uma atitude de âmbito mais analista, ou seja, o preâmbulo refere-se ao facto dos fluxos imigratórios que afectam Portugal, serem cada vez mais intensos, sobretudo a partir da entrada em vigor da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen (1995), e do crescente fluxo imigrantes vindos do Leste Europeu. Esse afluxo maciço apresenta as suas consequências, nomeadamente o aumento da imigração ilegal/clandestina e a emergência de redes e máfias associadas ao tráfico de pessoas. Assume-se claramente neste Decreto-Lei que tal fenómeno foi acentuado pela flexibilidade da legislação aplicada até então. É neste ponto que é notório o desejo e a necessidade da conjugação de esforços entre as diversas instâncias (nacionais e europeias), aos mais diversos níveis, de modo a que cada Estado-Membro possa adoptar medidas equiparadas que possam prover um justo equilíbrio entre países/imigrantes. O empenho é manifesto, uma vez que se exige uma política transparente, estruturada numa base legal e coerente, e assumindo que as anteriores leis/decretos se trataram de «medidas avulsas e transitórias». 27 Esta situação não será estranha, se considerarmos que Portugal fora até então um país de emigração. Assumindo-se que a legislação nunca deverá tomar proporções extremistas, balanceadas entre o laxismo ou a intolerância, cumpre porém a criação de mecanismos legais de gestão de fluxos, o qual deverá ser feito de forma «realista, através do controlo rigoroso de entrada e permanência de cidadãos estrangeiros nos países de acolhimento» 28 Apesar destas palavras transparecerem esta dura posição no preâmbulo, não se assume claramente a adopção desta realidade para o caso português: parece optar-se por deixar no ar esta ideia, não a adoptando literalmente para o caso nacional, mas onde pelo presente decreto se pretende instaurar uma política de imigração baseada «na promoção da imigração legal em conformidade com as possibilidades reais do País, [na] integração

25. Decreto-Lei n.º 4/2001, Diário da República, Número 8, Série I-A, 10 de Janeiro de 2001, p. 99. 26. É de ter em conta o facto de que se trata de uma lei que teve a duração de apenas 120 dias. 27. Decreto-Lei nº 34/2003, Diário da República, Número 47, Série I-A, 25 de Fevereiro de 2003, p. 339. 28. Ibidem. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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efectiva dos imigrantes e [no] combate efectivo à imigração ilegal». 29 São várias as áreas em que este Decreto-Lei intervém: – Área da Integração Formal – revogação do regime das autorizações de permanência, permitindo que as condições de estada em Portugal resultem apenas da concessão de vistos ou de autorizações de residência; criação de um novo tipo de visto para realização de uma actividade de investigação científica; consagração legal dos titulares de visto de estada temporária, em casos fundamentados, poderem exercer uma actividade profissional; redução do período mínimo de residência para legalização; possibilidade de reapreciação de situações de permanência (tendo em conta casos humanitários complexos); – Área Social – possibilidade de efectivo acesso aos cuidados de saúde, educação e protecção social; – Área Política – harmonização da legislação nacional com as orientações e directivas comunitárias; desburocratização dos procedimentos de actuação dos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras. Nota-se portanto a viragem de um sistema mais «fechado», para uma abertura ao exterior, ao Outro, no entanto sempre com as devidas cautelas. 2.4. A União Europeia e a Imigração Desde a formação da União Europeia, se nota que a livre circulação de cidadãos inter e intra países seus constituintes, foi uma discussão prioritária. Dois itens de análise se colocam nesta questão, nomeadamente saber de que países e de que fronteiras estamos a falar, bem como de quais os cidadãos que ficarão sujeitos a tal privilégio, se os nacionais de cada Estado constituinte, se também todos aqueles que vêm de fora das suas fronteiras. Já com o Benelux se previa esta questão, tendo sido reforçada com o Tratado de Roma. Era condição essencial para a construção de um mercado comum, a livre circulação de cidadãos de dentro e de fora das fronteiras da Comunidade. Podemos ser levados a pensar que o critério a ter em conta, no que concerne à circulação de indivíduos, poderia estar relacio29. Ibidem. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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nada com a origem ou o volume dos fluxos que se iriam gerar. Na verdade, esta liberdade de circulação não é restritiva desse ponto de vista, sendo antes limitada a trabalhadores e ao livre acesso ao emprego. Quer isto dizer que o livre-trânsito apenas é consentido ao homo aeconomicus e não ao cidadão europeu propriamente dito, donde se constata que este tratado não estabeleceu um direito autónomo de livre circulação e permanência dos cidadãos (fossem eles comunitários ou não), mas antes «fabrica» um direito derivado de necessidades e de condições específicas (OLIVEIRA E SILVA, 2000, p. 45). Foram necessários 30 anos para que o Acto Único (1987) viesse estabelecer a primeira grande revisão do Tratado de Roma (1957). A inovação presente centra-se na tentativa de materialização da expressão «livre circulação de pessoas», ao abolir as nteiras aduaneiras. Há a supressão das fronteiras internas da Comunidade, no entanto pautada por uma atitude paradoxal, visto que o Conselho, em 28 de Julho de 1990 adopta três directivas que visam fixar regras para a permanência de cidadãos. 30 Quer dizer que os indivíduos poderiam ficar no Estado de acolhimento, desde que não se tornassem um encargo para o mesmo. O Acordo de Schengen (1985), promulgado numa fase inicial entre a França e a Alemanha e estendendo-se posteriormente aos países do Benelux e ao sul da Europa (Itália, Espanha, Portugal e Grécia), apresenta como filosofia inicial a abolição das fronteiras internas da Comunidade, reforçando as externas. Para tal procedeu-se à harmonização da legislação e à adopção de medidas para manter a segurança interna e combater a imigração ilegal. Com este acordo visa-se desburocratizar o trânsito de pessoas, serviços, mercadorias e bens, desde que nada que possa perturbar a ordem interna se verifique. Nesta lógica, o texto da Convenção vai basear-se em dois princípios, nomeadamente o da livre circulação nas fronteiras internas e o da garantia da segurança nacional dos EstadosMembros (ao nível da Cooperação Judiciária e Policial, através da criação de um Sistema Comum de Informações…) (Ob. cit., 2000, pp. 55 e 56) No fundo, a directiva inicial parece tomar novos rumos, ao «servir» para criar um espaço hermeticamente fechado ao Outro, visto que há um reforço da fronteira externa a este espaço. A cidadania europeia é aqui 30. As directivas são as seguintes: • Directiva 90/364 – direito de permanência geral; • Directiva 90/365 – direito de permanência do trabalhador assalariado após cessão da actividade; • Directiva 90/366 – direito de permanência de estudantes. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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diferenciada da cidadania estrangeira, sendo considerado nesta última designação qualquer pessoa que não seja originária de um dos Estados-Membros das Comunidades Europeias (FERREIRA e RATO, 2000, p. 27). São ainda estabelecidos o modelo/tipo de visto a adoptar pelos países membros 31, bem como a lista de países sujeitos a este tipo de visto. 32 No entanto, o facto das políticas de imigração ainda não estarem muito «ligadas» a cada Estado e os protocolos de cooperação se sobreporem às directivas europeias, vai estabelecer-se um impasse na definição dessa mesma litania de países. No entanto, segundo OLIVEIRA E SILVA (2000, p. 64), a política comum de vistos irá permitir que os estrangeiros usufruam de condições mais favoráveis de acesso ao espaço Schengen do que anteriormente (não há que solicitar tantas permissões), porém com certas contrapartidas (expulsão, se os requisitos deixarem de ser preenchidos; estabelecimento de uma «relação» dos indivíduos «indesejáveis», através do Serviço de Informação de Schengen…). Mais tarde, com a assinatura do Tratado de Maastricht (1992), foram permitidas novas abordagens sobre as políticas de imigração e asilo, uma vez que passa a caber ao Conselho, sob proposta da Comissão e após consulta do Parlamento Europeu, definir os países terceiros cujos cidadãos devem ter um visto que lhes permita transpor as fronteiras externas da União, e estabelecer um modelo-tipo de visto (Ob. cit., 2000, p. 85). No fundo, apenas é revista, ou melhor, definida, a parte burocrática e formal da questão da transposição das fronteiras, deixando-se mais uma vez para segundo plano, a parte «humana» da questão. A nova etapa no processo de Schengen aparece com o Tratado de Amesterdão (1996), pois será o promotor da «comunitarização» das matérias de vistos, asilo, imigração e outras politicas ligadas à livre circulação de pessoas. Mantém-se no entanto a questão de se assegurar a livre circulação de pessoas no espaço comum, sem lesar a segurança e as liberdades do cidadão da União (FONTAINE, 1998, p. 44). Fazendo uma retrospectiva, o assunto que parece ser fulcral no dinamismo da política de imigração da União Europeia prende-se com a questão da individualidade/cooperação. Melhor dizendo, a verdade é que se torna extremamente complicado, num espaço abrangendo uma diversidade de países com uma diversidade de políticas imigratórias, fazer convergir todos para a mesma linha de interesses. A este respeito OLIVEIRA 31. Através do Regulamento Comunitário n.º 1683/95, de 29 de Maio. 32. Através do Regulamento Comunitário n.º 2317/95, de 25 de Setembro. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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E SILVA (2000, pp. 100 a 104) refere que entre os anos 50 e 80, a elaboração de uma política migratória implicava um certo supranacionalismo (o que limitava a soberania dos Estados), não abrangendo porém os países terceiros, como é óbvio. Entre 1986 e 1993, fala-se de um intergovernamentalismo informal, uma vez que o Acto único permitiu uma maior ligação entre as políticas migratórias intra e extra União, o que se veio a formalizar em Maastricht, através da incorporação da política de imigração e asilo no seio do pilar «Justiça e Assuntos Internos». Na prática, significou que a temática ficou inserida no enquadramento institucional da União Europeia. Até 1997, os Estados aderentes a Schengen aumentam para treze, o que confere uma certa significância a este processo, mais visível ainda com o Tratado de Amesterdão, tendo vindo este último lançar uma base sólida para o desenvolvimento progressivo das políticas comunitárias de imigração. Sabendo que certos Estados não participaram/participam destes acordos (o caso da Irlanda e do Reino Unido em Schengen; o caso dos dois anteriormente citados e da Dinamarca, que ficaram de fora das disposições do Título III do Tratado de Amesterdão), poderá constituir um problema? Em certa medida sim, uma vez que não participam no debate e na construção de uma política migratória equilibrada, podendo vir a causar barreiras aos cidadãos, precisamente por se encontrarem «de fora do processo». Por outro lado, não constituirão um entrave à interpretação e alargamento da política migratória em si… Este é pois um debate que se deveria estender a toda a opinião pública, já que todos fazemos parte da mesma família da União Europeia. Talvez por isso GUIRAUDON (2000, p. 244) defenda que os direitos dos estrangeiros estão ausentes dos debates políticos e da opinião pública. Se tal não acontecesse e se este assunto estivesse mais na ordem do dia, talvez houvesse uma maior abertura e tolerância relativamente ao Outro. 3. UM TERRITÓRIO, VÁRIAS GENTES… 3.1. A percepção do autóctone face ao «estrangeiro» Saber «olhar» o Outro, no sentido de encarar as suas semelhanças e as suas diferenças face a NÓS mesmos, pode converter-se numa experiência assaz enriquecedora, na medida em que se desmistificam ideias pré-concebidas sobre aquele que cada vez mais se aproxima, que cada vez mais vai integrando o quotidiano real da vivência de uma sociedade, que anteriormente se habituara a ver partir os seus elementos e não a receber. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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É o que acontece em Portugal, é o que acontece em Espanha. RODRIGUEZ (1993, p. 145), assumindo que este último se tornou num país receptor de imigrantes, alerta também para o facto de serem cada vez mais visíveis atitudes negativas por parte dos autóctones, face à entrada no país de centro-sul americanos e magrebinos. O Centro de Investigações sobre a Realidade Social realizou um estudo sobre a percepção dos espanhóis face ao Outro imigrado 33, donde se conclui que mais de metade dos inquiridos mostrava uma atitude de receio, uma vez que achavam que havia «demasiados» imigrantes no país. De qualquer forma, eram favoráveis à integração daqueles que já estavam instalados, principalmente dos centro-sul americanos (por uma questão de proximidade da Língua), embora permanecesse o cepticismo e o mal-estar quanto à ideia de permanência, em território espanhol, de imigrantes africanos. Ao serem inquiridos sobre as principais barreiras que se colocavam, no sentido da integração destes indivíduos, a questão da cultura parece ser um assunto transversal ao processo. No entanto, no caso dos africanos, a questão racial é um dos principais entraves à aceitação do grupo, enquanto que no caso dos centro-sul africanos se trata como barreira o facto de se apresentarem como uma «concorrência» no mercado de trabalho. Questões como a ideologia política ou os aspectos sociais, são tomados como últimas problemáticas para a integração. De qualquer forma, os inquiridos frisam a ideia de que a população imigrante existente no país deveria ser ajudada ao mais diversos níveis (desde a habitação à educação…), insistindo mais até na questão da saúde. Quase que podemos dizer que se observam atitudes moderadas de nãoaceitação, na medida em que se por um lado, a questão racial e concorrencial pesa como aspecto negativo para a integração dos imigrantes, por outro nota-se que há uma atitude positiva face aos que já estão no país há mais tempo, visto que lhes são reconhecidos direitos. Há sem dúvida uma «aceitação selectiva», se é que assim lhe poderemos chamar, uma vez que se notam vários níveis de aquiescência face ao Outro que é apresentado: os africanos são o grupo menos desejável, o que se deve à questão cultural e racial. A cor da pele e uma forma de estar diferente do quotidiano autóctone, leva a que a aceitação deste grupo se revista de sérios entraves, constituindo em certos casos motivo para o desenvolvimento de atitudes violentas contra os mesmos. O valor da Língua parece ser uma valia insubstituível, visto que une mais de perto espanhóis e centro-sul americanos. No entanto, o grupo que é melhor aceite, 33. Refira-se que este estudo foi realizado no início dos anos 90 e é apresentado pelo autor acima citado. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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segundo as respostas dos inquiridos, seriam os imigrantes procedentes da Europa Ocidental desenvolvida, de preferência os empresários e os investidores (Ob. Cit., p. 150). Trata-se-á de uma melhor aceitação dos europeus? Tal não parece corresponder totalmente à verdade, na medida em que os reformados da Europa Central e do Norte são preteridos. Neste caso, parece estar em questão uma visão materialista, relacionada com a aceitação de imigrantes que possam captar capital para o país. A questão económica anula, neste caso, qualquer barreira que anteriormente se tinha colocado nas outras situações. 34 Talvez tal esteja relacionado com o medo da fuga de capitais (com as remessas) patente nos outros grupos, cuja «sangria» poderia enfraquecer economicamente o país. Curioso notar que os inquiridos referem e sublinham a questão da aceitação de uma Europa «desenvolvida»… Está assim constatada a noção de diferença numa Europa que se pressupõe desenvolver à mesma velocidade, o que leva a pensar que a aceitação deste grupo de imigrantes também seria uma maneira deste país envidar uma relação com países de «ponta», na questão do desenvolvimento, deixando-se levar ou até mesmo beneficiando dos recursos humanos dessa realidade, o que o levaria para mais próximo dos níveis de desenvolvimento desejados. De qualquer forma, as atitudes face aos imigrados em Espanha melhoraram, principalmente da parte dos jovens e da população mais instruída. Nota-se porém que se estabelecem ainda confusões, pois a informação face ao Outro ainda é passada de uma forma muito distorcida, principalmente porque a comunicação social parece empolgar muito casos pontuais com magrebinos, que facilmente são generalizados à restante população imigrante (PÉREZ, 1998, p. 5) Se tentarmos estabelecer um paralelismo com o caso português, as semelhanças em certos aspectos são por demais evidentes. Interessante o facto de haver a preocupação de dar a conhecer aos mais novos a visão sobre o Outro imigrado, por parte de alguns programas escolares, nomeadamente o de Geografia. MOTA e ATANÁSIO (1998, p. 72) apresentam num manual de Geografia do 10.o ano, as conclusões de um estudo realizado sobre a imagem que os portugueses têm sobre os imigrantes que estão/entram no território nacional. Da amostra inquirida, concluiuse que mais de 75% das respostas indicavam que não deviam entrar mais imigrantes em Portugal, sendo o grupo menos «desejado» o dos africanos, o que no caso do nosso país, com toda uma história baseada na colo34. Os imigrantes da Europa Ocidental desenvolvida, como os inquiridos chamam, apresentam cultura e língua diferentes, facto esse que nem chega a ser referido como entrave à integração e que o era nos grupos anteriormente tratados. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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nização do continente africano e nas intensas relações com o seu povo, pode revelar-se um aspecto preocupante a ter em consideração. Os mais aceites são os imigrantes vindos da Europa de Leste, o que faz pensar que a cor da pele e o nível de instrução sejam factores determinantes para a aceitação, neste contexto. No entanto, 97% dos inquiridos defende que os imigrantes que já se encontram estabelecidos no país, deverão usufruir dos mesmos direitos dos nacionais, sendo que 80% são favoráveis à legalização dos mesmos. Parece haver um esforço, por parte dos autóctones, para integrar os imigrantes, embora a maioria (cerca de 61%) advogue que estes devam abandonar os seus usos e costumes, o que transforma o processo numa autêntica absorção e anulação da própria identidade do Outro 35, o que por si só se pode constituir como uma barreira, a partir do momento em que de desenvolve a manutenção identitária. No que concerne ao trabalho, 60% dos inquiridos refere que os imigrantes deverão abandonar o país se não tiverem trabalho, apesar de reconhecerem que estes ocupam os lugares que os autóctones deixam vazios e ainda que são mais mal pagos pelas mesmas tarefas desempenhadas por um nacional. Como países do sul da Europa, Portugal e Espanha apresentam similaritudes quanto à constância de certas opiniões. A cor da pele e o trabalho (aspecto económico) prevalecem como questões colocadas à frente de qualquer outra e que marcam a percepção do autóctone face ao «estrangeiro». O jornal Público 36 apresentou também um estudo do mesmo género, realizado no final de 2003, no âmbito do Inquérito Social Europeu (ISE), feito à escala europeia e nacional. Concluiu-se que cerca de 56% dos portugueses defendiam que Portugal devia receber poucos ou nenhuns imigrantes. Um alarmante número de inquiridos europeus (23,2%) defende o «grau 0» de imigrantes de etnias diferentes, chegando 17,6% de portugueses a referir que é contra a entrada de todo e qualquer imigrante, inclusive sendo da mesma raça ou etnia! Este estudo concluiu ainda que a abertura aos imigrantes aumenta à medida que se sobe no escalão de rendimentos e no nível de escolaridade dos inquiridos, embora esta dinâmica seja «anulada», caso se tratem de indivíduos com ideias políticas de «direita».

35. Este assunto será discutido mais adiante. 36. Este estudo veio publicado no jornal PÚBLICO, Portugal é o país onde mais pessoas defendem zero imigrantes, Secção de Sociedade, domingo, 7 de Dezembro de 2003. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Equaciona-se que a aceitação da imigração no nosso país pode estar a degradar-se, uma vez que o European Values Study efectuou um estudo entre 1999/2000, onde constatou que Portugal era um dos países mais favoráveis à imigração. As qualificações profissionais são, de longe, segundo o estudo do ISE, o aspecto mais valorizado e apreciado pelo autóctone no imigrante, sendo uma importante ponte para a integração. A Holanda, a Noruega e a Dinamarca são os Estados europeus mais abertos à imigração: só 11,6% dos noruegueses e 15% dos Suecos acham que a chegada de imigrantes faz baixar os salários nos seus respectivos países, valores estes contrapostos aos 81% de gregos e 56,7% de portugueses que acham o contrário. Nota-se portanto uma visão diferente da imigração do norte para o sul da Europa, fruto quiçá do facto dos fluxos migratórios terem afectado inicialmente os primeiros países e só agora estarem a afectar países mediterrânicos onde apenas prevalecia a tradição emigratória. 3.2. A questão étnica e identitária O contacto entre o autóctone e o alóctone num mesmo território, entendido como pertença do primeiro, causa normalmente alguns choques. Como foi analisado anteriormente, refere-se o facto de alguns portugueses acharem que os imigrantes deveriam abandonar os seus usos e costumes, enfim, anular um pouco da sua cultura no sentido de melhor integrarem a sociedade portuguesa. É certo que este fenómeno acontece em certa medida, tal como defende SAINT-MAURICE (1997, p. 12) ao citar Merton, referindo que a pouco e pouco se desenvolve um processo de progressiva aculturação e assimilação por parte do imigrante, uma vez que este se adaptará paulatinamente aos valores e aos padrões do grupo de referência. Mas o papel deste sai da passividade para a actividade, uma vez que as próprias perspectivas económicas vêm dar origem às abordagens que privilegiam o migrante como actor, portador e gerador de cultura, daí que as sociedades envolvidas nos processos migratórios não permanecem imunes aos contributos culturais que, nos dois sentidos, acabam por actuar. (Ob. Cit., p.9). Será pois pertinente, enquadrado nesta problemática, começar por abordar a questão da identidade, visto que é esta que define o próprio modo de ser e o modo de estar do indivíduo. Do ponto de vista singular, o indivíduo apresenta uma identidade pessoal, ou seja, uma imagem de si, estruturada com base em sentimentos, representações, projectos e experiências Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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vivenciadas por si próprio. No entanto, as relações que estabelece com o grupo e com a própria sociedade, faz com que crie uma identidade psicossocial, fruto dessas mesmas interconexões e do contributo dado pela sua própria identidade. (Ob.Cit., p.19) No fundo, no primeiro caso teremos a estruturação do EU, construindo-se, interagindo e «edificando» a própria noção do NÓS. O facto de ocorrer a migração, poderá implicar que haja a construção de uma nova identidade, empreendida não só pelo próprio migrante como também pelos estímulos do quotidiano individual e pelas interacções sociais. (Ob. Cit., 26) Assim sendo, constata-se que se verificam alterações significativas no Outro, as quais parecem ser realizadas de forma natural e quase espontânea, fruto do contacto com o grupo dominante. Este grupo dominante, neste contexto, alvitra-se como sendo aquele que está no território, ou seja, aquele que por ter nascido e vivido sempre nesse espaço, desenvolveu laços e sentimentos de pertença em relação ao mesmo. Talvez seja por isso que imponha as suas normas, regras, valores… tenta por isso «controlar», se é que assim se pode dizer, aquele que vem do «exterior», no sentido de manter e salvaguardar essa mesma relação que estabeleceu com o espaço e que de certa forma integra grande parte da construção da própria identidade pessoal/colectiva. O modelo analítico tenta sintetizar e dar resposta à problemática da identidade (Ob. Cit., p. 33). As migrações pressupõem transferências de fluxos humanos com determinadas características e motivações (que por vezes extravasa a questão puramente económica). Compõem-se assim num espaço, diferentes grupos com diferentes características, nomeadamente culturais, o que faz com que a cultura de origem do próprio território se vá adaptando e reformulando. Ora se o espaço é alvo de mudança, também o próprio migrante o será, uma vez que ao entrar num novo espaço, ao contactar com o(s) seus(s) grupo(s) e ao desenvolver as suas actividades (sociais, profissionais…), irá acumular múltiplos estatutos, o que obviamente irá interferir na sua identidade. Será pois essa mesma identidade construída/em construção que irá incluir o indivíduo num destino colectivo, englobando-o numa determinada etnicidade. (ORIOL, 1985, p.178) MACHADO (2002, p. 29) define etnicidade como sendo a relevância que em certas condições assume em vários planos (social, cultural, político…) a pertença de populações diferentes (cultura, raça…). Essa pertença é traduzida e veiculada por traços como a língua, a religião, a origem nacional, a composição social, os padrões de sociabilidade, as especificidades económicas e outras características que se sobrepõem a cada grupo particular. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Desta forma e a cada grupo com uma relativa homogeneidade de características deste tipo, chamaremos grupo étnico: será das relações estabelecidas entre os vários grupos que resultará uma pluralidade de culturas justapostas. (Ob. Cit., p. 28) No fundo, trata-se do encontro do NÓS e do OUTRO, que pouco a pouco tende a materializar o NÓS, não o inicial mas um diferente, resultante do conhecimento de ambas as partes. Mas quando há um conjunto de indivíduos «diferentes» nas bases já referidas, mas que respeitam as nossas leis e regras, que se encontram legalmente no país, integrados profissional e socialmente, até que ponto deverão ser chamados assim em toda a sua plenitude? Não será demasiado redutor chamar de «grupo étnico» a quem já partilha não só do mesmo espaço, mas que também aceita e integra essa mesma sociedade? Neste sentido, HOROWITZ (1989, p. 47) propõe que apenas se chame grupo de imigrantes. A designação em si marca a diferença (de origem, pelo menos), no entanto não afasta tão cabalmente a possibilidade do processo de integração. De qualquer forma, quer se queira quer não, a interacção será sempre atingida, mais ou menos intensamente, o que afectará de certa forma o capital simbólico de que nos fala SAD SOUD (1985, p. 126). Este conjunto de símbolos interiorizados por cada família, por vezes resultante de várias gerações e que tende a manter a identidade e as características étnicas, esbate-se na medida em que se operam novos contactos que vão alterar a própria interpretação desse mesmo capital. Normalmente, o conceito de grupo étnico aparece muitas vezes associado ao de minoria: etimologicamente, designa um grupo que está em menor número ou que culturalmente está inadaptado à cultura existente (ciganos…), que por sua vez também se encontra em menor número em relação ao grupo dominante. Tal não deve ser tomado como uma situação contínua e permanente… por exemplo, na sociedade norte-americana, muitas vezes se fala dos negros e dos hispânicos como sendo uma minoria, apesar destes formarem 25% da população! Este conceito por si só é normalmente mal utilizado, o que lhe acentua o carácter negativo que tende a evidenciar (MACHADO, 2002, p. 30). Um grupo étnico pode realmente ser uma minoria e muitas vezes é porque se apresenta em menor número e com dificuldades de adaptação. LOPES (1999, p. 113) afirma que cada vez mais as minorias se tendem a evidenciar na própria Europa, resultado da mobilidade populacional. E quanto à integração? Haverá capacidade para reconhecer o Outro, aceitando-o e integrando-o? Portugal, hoje visto como um país de imigração, está assim a tornar-se pluri-étnico, onde o Outro cada vez mais coabita Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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com o autóctone. Esta relação, vista como um processo que ainda agora se inicia (se tivermos em conta que o nosso passado nos impele para uma longa tradição emigratória), resulta de um «jogo de dupla face», se é que assim lhe poderemos chamar, fruto de uma situação de contraste ou de continuidade. Esta ideia é expressa por MACHADO (2002, p. 36) e leva a pensar que a aceitação do Outro depende de todo um conjunto de características apresentadas por este e por Nós, da sua conjugação, da capacidade que cada um dos lados tem para «absorver e integrar» a diferença, das relações estabelecidas com o espaço aos mais diversos níveis (afectivo, económico, social, cultural…). No quadro seguinte, são apresentadas as situações em que se estabelece a continuidade, ou seja, a aceitação e integração do imigrante, bem como as situações de contraste, onde este é visto como «diferente» no sentido de não «reunir» características para ser integrado, se é que assim se pode dizer. Quadro 2 – Contrastes e Continuidades – dimensões social e cultural Dimensões

Social

{ {

Cultural

Contraste

Continuidade

Composição de classes

Percentagem elevada de operários. Classes médias reduzidas. Pobreza. Subclasse

Peso maioritário de classes médias. Mobilidade social.

Localização residencial

Concentração espacial. Bairros étnicos.

Dispersão residencial.

Estrutura etária e sexual

Percentagem elevada de Estrutura etária idêntica crianças, jovens e adultos à da população jovens. Altas taxas envolvente. de masculinidade.

Sociabilidade e padrões matrimoniais

Intra-étnica e interétnica Predominantemente (interacções fortes com intra-étnica (interacções a população envolvente). fracas com a população Exogamia envolvente). Endogamia. e miscigenação.

Língua

Língua diferente.

Mesma língua.

Religião

Religião diferente.

Mesma religião.

Adaptado de MACHADO (1996).

As similaritudes culturais, sociais e demográficas parecem decisivas para o desenvolvimento do processo de integração. Refira-se que a sociabilidade e os padrões matrimoniais, que são aqui considerados a montante, também se desenvolvem no sentido indicado no quadro, a jusante do Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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processo, dependendo do próprio decurso da situação. O espaço é também gerador de continuidades/contrastes: a dispersão espacial dos imigrantes ajuda a que a comunidade melhor possa proceder ao processo de integração. Com uma menor quantidade de indivíduos imigrados, o grupo autóctone dominante não corre o risco de se ver ameaçada pela contraposição de uma identidade que possa abafar a sua. Assim, a própria comunidade «absorve» e integra mais facilmente os seus imigrantes e estes propriamente ditos, não se fecham sobre si num mesmo espaço, permitindo a osmose de informações entre estes e os autóctones. LOPES (1999, pp. 125 a 135) identifica em Portugal alguns grupos étnicos de referência: – O grupo africano inicia a sua vinda para Portugal nos anos 60 (1.º grupo – os luso-africanos), preenchendo os lugares da emigração intra-europeia; – Mais tarde, nos anos 70, verifica-se um novo fluxo de imigrantes vindos das ex-colónias africanas (2.º grupo) que tendo nacionalidade portuguesa, fogem ao contexto de instabilidade do 25 de Abril, com estatuto de «imigrante-refugiado»; – Nas décadas de 80 e 90 a imigração verificada é de índole económica (3.º grupo), constituída maioritariamente por indivíduos que trabalham na construção de infraestruturas. Este autor também coloca em destaque o grupo maubere, como sendo uma comunidade de expatriação forçada, que vêem Portugal como um lugar de acolhimento sem restrições, embora tenham de sofrer um processo de desterritorialização. A comunidade cigana, visto noutro prisma, presente no território desde o séc. XV, apresentam uma estrutura cultural e social peculiar, conotada muitas vezes com um carácter negativo. Este autor considera estes grupos como minorias, no sentido pleno da palavra, onde é visível um contraste. A dimensão social parece imperar, no sentido de promover a inadaptação, visto que se tratam de grupos carentes, pobres, que normalmente tendem a concentrar-se no mesmo espaço e que apesar de falarem a mesma língua, não estão até hoje totalmente integrados na sociedade portuguesa. Já com os brasileiros parece haver uma maior proximidade (pela língua, pela visão social veiculada pelas transmissões televisivas de entretenimento), bem como pelos europeus de leste (pela similaritude da estrutura demográfica, pelo nível de instrução…). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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No fundo, e perante as constatações que aqui foram realizadas, o contacto do Nós com o Outro, resultará numa reformulação da identidade, ou melhor dizendo, contribuirá para a construção de uma nova Identidade Colectiva (também no sentido psicossocial). Figura 9 – A construção da Identidade Colectiva Estádio 4 Identificação

Nova Identidade Colectiva

Assimilação/Aculturação/Acomodação/Integração Estádio 3 Contacto/ /Adaptação

Inter-relação Alóctone Espaço Identidade

Grupo(s) Étnico(s)

Identidade

Grupo(s) Étnico(s)

ENCONTRO

Identidade Colectiva original

Cultura «---» Capital Simbólico

Cultura «---» Capital Simbólico

Autóctone

Estádio 2 Encontro

Estádio 1 Não-relação

Elaboração própria (2003).

Parte-se do pressuposto que o(s) migrante(s), num primeiro estádio conserva a sua identidade colectiva original, no entanto, ao contactar com outro grupo diferente do seu, constatará que cada um destes apresenta diferenças/similaritudes na própria cultura, capital simbólico, identidade (pessoal e psicossocial). Esse encontro estabelece-se num mesmo espaço, o qual é «partilhado» por ambos (estádio 2) e no qual se vai desenvolver uma inter-relação, contacto que resultará numa assimilação /aculturação/ acomodação/ integração (estádio 3) 37, resultante da consciencialização de que o Outro existe e que pode ser semelhante/diferente. 37. Estes processos irão ser tratados mais adiante. No entanto, refira-se desde já que o imigrante pode integrar apenas um deles, ou durante a sua vivência no local de chegada, pode passar por vários processos (que se constituem assim como fases). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Quando se fala nestes processos, há que ter em conta que estes se podem desenvolver de forma mais ou menos «pacífica», conforme o tipo de contacto que se estabeleceu, no entanto não deixa de haver a necessidade de adaptação, pelo menos para evitar «choques» e prover uma vivência com algum bem-estar relacional. A partir desse momento, verifica-se a integração numa nova identidade colectiva (estádio 4), ou melhor, a descoberta e a assunção do seu papel/posição num novo grupo, constituído por toda uma comunidade mais ou menos heterogénea. Há portanto uma identificação em relação a essa nova realidade, no sentido em que o indivíduo se dá conta que o Outro paulatinamente se transformou num Nós, seja ele mais ou menos heterogéneo… 3.3. Os dois lados de uma mesma moeda 3.3.1. A coabitação pluri-étnica É principalmente desde os anos 60 que a questão do encontro com o Outro tem sido tratada com mais relevância, pelas ciências sociais. Tratase pois de uma tentativa para solucionar problemas gerados por esse mesmo «encontro», algumas vezes transformado em «choque», o que por si mesmo trará problemas à integração. ORIOL (1988, p. 168) acredita que os principais obstáculos a esse processo são os de carácter económico (crises estruturais ou conjunturais…) e cultural propriamente dito: cada grupo tende a desenvolver, ou melhor, a superar esses obstáculos de maneira diferente, revelando por isso a distância cultural em relação ao(s) outro(s) grupo(s). Devemos pois ter em consideração que cultura não é sinónimo de desenvolvimento, pois muitas vezes é o estádio de desenvolvimento da sociedade em que o grupo se encontra inserido, que prepara e dá os instrumentos capazes de proporcionar ou não a «integração». A distância cultural parece, neste contexto, referir-se à própria identidade colectiva, algo muito mais enraizado e estabilizado do que o próprio desenvolvimento, que se revela mais dinâmico, mais mutável. Enquanto que a distância cultural se apresenta como a base estrutural do grupo, o nível de desenvolvimento em que este se insere pode considerar-se como a base conjuntural, se é que assim se pode dizer. Será pois da conexão entre ambas as partes que dependerá o maior ou menor sucesso no processo de adaptação, ou até mesmo na assimilação. Definindo os conceitos, entenda-se que a adaptação se pauta pela integração do grupo migrante na sociedade de chegada, havendo por parte Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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destes espaço para uma aceitação das suas características. Já no caso da assimilação não há espaço para essa aceitação, daí que estas acabem por se dissolver, esbatendo-se e anulando-se em prol das do grupo dominante, uma vez que vão sendo adoptados atitudes, modos de vida e valores do grupo dominante (MALHEIROS, 1996, p. 46). Então, a solução para a coabitação pluri-étnica passará pela adaptação ou pela assimilação? ORIOL (1988, pp. 171 e 172) apresenta dois casos que podem elucidar sobre a natureza e os efeitos de cada caso. Tendo como referência os emigrantes portugueses dos anos 70 que emigraram para França, baseia o seu estudo num grupo da região de Pau (sul de França, sensivelmente a Este de Bayonne) e outro da região de Paris. No primeiro caso, a administração local adopta, face a este grupo de imigrantes, uma atitude pluralista, ou seja, incute-lhes as normas locais, no entanto promove a divulgação da língua portuguesa, apoia a realização de eventos culturais, da dinamização de associações de portugueses… A adaptação foi evidente e bem sucedida, na medida em que este grupo parece integrar-se e participar activamente da vida económica, social e cultural da região. No segundo caso, não se verificou qualquer política de acolhimento, pelo que subsiste a ideia de que são os imigrantes que se devem submeter ao modo de vida que aí encontram. A tentativa de assimilação não foi conseguida na primeira geração (muitos destes emigrantes portugueses viviam nos bidonvilles) e na segunda geração constata-se uma alienação quanto à construção da própria identidade individual/colectiva. A verdade é que a ideia que muitos imigrantes portugueses em França deixam passar, é que foram alvo de uma assimilação mais ou menos intensa (conforme os casos), fruto não só da ausência do modelo cultural de matriz portuguesa, como também da própria prevalência da vivência francesa e do fenómeno da globalização. Esse processo é visível através da materialização do seu modo de vida (hábitos e costumes). A assimilação pode tornar-se até num processo pernicioso e incompleto, na medida em que gera um afastamento entre grupos e até mesmo uma confusão étnico-identitária (ideia de grupo e ideia individual, respectivamente), provocada por um «desenraizamento voluntário» do local de origem, mas que não cria novas raízes no local de chegada, tal como seria desejável. Até porque o processo de assimilação nunca ocorre completamente, nem mesmo nos casos que parecem mais flagrantes. ARCHDEACON (1990, p. 23) fala no caso dos Estados Unidos da América, onde através da ideia de «melting-pot» 38 tenta demonstrar que existe, no sentido 38. Segundo MALHEIROS (1996, p. 47), o «melting-pot» trata-se da criação de um novo sistema cultural, resultante da fusão de duas ou mais culturas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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literal da palavra, uma fusão de culturas. É certo que domina uma matriz cultural anglo-americana (questão da língua), no entanto apesar de se partilhar uma base cultural comum, o que se verifica é a existência de um conjunto de grupos, com as suas fronteiras mais ou menos esbatidas, mas que em muitos dos casos mantém as suas particularidades. Essa diferenciação cultural pode encarar-se também sob duas perspectivas: por um lado, a noção de «ser posto de parte» desaparece, uma vez que todos os grupos, mais ou menos intensamente, se encontram na mesma situação, por outro mantém-se a própria cultura sem haver uma dependência do sistema dos Estados Unidos, com todas as consequências que daí poderiam advir. No entanto, a segunda perspectiva, de âmbito negativo, leva-nos a reflectir sobre o facto de poderem eventualmente ocorrer «choques». Então, a coabitação deve ocorrer num molde homogéneo ou heterogéneo? MALHEIROS (1996, p. 47) acha que o processo de Acomodação será o mais propício, na medida em que implica a cooperação entre os grupos, em que se verifica um «ajuste», para que posteriormente possa desenvolver-se uma verdadeira Integração, que implica a participação na estrutura social vigente. Não posso deixar de citar FEHÉR e HELLER (1994, p. 139), quando afirmam que o trauma de partilhar uma cultura monolítica e global com indivíduos que pensam que isso se pode fazer de forma legal (assimilação forçada), é uma tarefa tão homérica, em que o multiculturalismo sairá vitorioso se um dos da cultura dominante vir que há uma cultura alternativa à sua e a aceitar! Estes autores vão mais longe, e na linha dos anteriores conceitos apresentados, propõem a Culturalização como sendo um processo ainda mais complexo e completo, ou seja, uma estratégia para criar coesão, através da tolerância e aceitação do Outro, onde coexistam vários grupos sem que necessariamente se excluam uns aos outros (Ob. Cit., p. 137). Trata-se pois de uma variante mais dinâmica e complexa da forma de acomodação, mas onde há a troca de experiências e a própria experimentação da cultura do Outro numa versão de transigência. Fazer da assimilação, adaptação ou da culturalização processos espontâneos, pode ser difícil, tal como BAUER e BÜRKNER (1998, p. 439) explicitam para o caso alemão, onde qualquer um destes processos é praticamente inexistente, visto tratar-se de uma sociedade muito fechada ao imigrante. Apesar de até agora constatarmos que a assimilação se apresenta como o processo mais «perigoso», no sentido de aniquilar a identidade do alóctone, a verdade é que o caso da indiferença também se pode revelar verdadeiramente preocupante. Se no primeiro caso há a tentativa de aceitação, seja ela por que método for e com a finalidade corresponFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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dente, no segundo parece estar patente a recusa do Outro, sintoma de atitudes negativas e de recusa face ao imigrante (racismo, xenofobia…). Na Europa, e segundo OKÓLSKI (1999, p. 173), existe sem dúvida uma forte diversificação étnico-cultural, em todas as suas formas. Poderá verificar-se uma homogeneização se os fluxos da Europa de Leste se mantiverem, na medida em que este grupo apresenta alguma facilidade de se integrar, seja por que processo for. Por outro lado, o facto dos fluxos se orientarem em novos sentidos (para os novos países receptores), pode exigir que a própria população autóctone tenha de apresentar uma estrutura capaz de promover qualquer um dos processos anteriormente tratados. É claro que a entrada num país exige sempre o cumprimento de todo um conjunto de regras administrativas, legislativas, económicas, fiscais… que todos, independente de serem imigrantes ou não, terão de cumprir. Esse denominador comum pode ser a base para que estes novos países iniciem a integração, através de qualquer um dos processos. Certo é que nos encontramos numa Europa pluri-étnica, plena de contradições quanto ao fenómeno da integração do Outro. A própria palavra «integração» exprime o sentido de incorporação, de inclusão, que não pressupõe necessariamente a anulação do Outro, mas sim a coabitação. Num sentido mais ou menos lato é isso que se tende a fazer, numa Europa una mas de sentido plural. 3.3.2. A recusa do Outro: Racismo, Xenofobia e outras causas A subida de Heider ao governo da Áustria, levou a União Europeia a denunciar publicamente as implicações negativas do racismo e da xenofobia no processo de construção do projecto europeu, cujo próprio sucesso implica o respeito dos princípios democráticos num clima de convivência multicultural. O teor xenófobo da campanha e a subsequente posição crítica da União, colocaram em relevo a importância da problemática da imigração na política europeia. (FERREIRA e RATO, 2000, p. 1) E o caso de Le Pen na França? Será que a Europa está paulatinamente a virar à direita? Entre outras possíveis explicações, tratar-se-á de uma resposta aos fluxos migratórios verificados, num contexto económico menos favorável? E que consequências terá esse facto no contexto imigratório? SCHOR (1988, p. 152) refere que os imigrantes, no caso francês, têm sido desde sempre acusados de provocarem problemas de ordem social (ligados à delinquência, criminalidade…) e económica (ocupação «indevida» de postos de trabalho…). MILES (1987, p. 234) ao comparar com o caso inglês, Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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afirma que o racismo e a exclusão criam por si só reacções dualistas, dependendo dos interesses em jogo. Esses comportamentos podem ser de certa forma «induzidos», conforme as necessidades do mercado de trabalho quanto à mão-de-obra imigrante. Existe, no sentido de representar os imigrantes no sentido jurídico e as próprias minorias étnicas, a «Comission for Racial Equality», a qual desempenha um papel bastante activo nesta temática (Crowley, 1990, p. 57). Em Portugal o ACIME 39, parece ser o «equivalente» de certa forma, na medida em que o seu âmbito de acção envolve toda esta problemática. Segundo LOPES (1999, p. 117), o neo-nacionalismo xenófobo em Portugal não passa de um epifenómeno, no entanto há que ter em conta que alguns grupos estão formalizados: o Círculo Europeu dos Amigos da Europa (nos anos 80, no Porto); o Movimento de Acção Nacional (inspirado no Antigo Regime); a Mocidade Patriótica (da Amadora); os Círculos Nacionalistas, a Ordem Nova e a União Nacional (em Lisboa e no Porto). Ao todo, contabilizam-se no país cerca de 34 organizações com tendências racistas e xenófobas, segundo este autor. Veja-se o caso Alcino Monteiro 40, que trouxe à ribalta a discussão sobre a problemática do racismo e da xenofobia sobre os grupos étnicos e os imigrantes. Opinião contraditória é dada por BAGANHA, MARQUES e FONSECA (2000, pp. 56 a 57), referindo que Portugal se pode constituir como um exemplo de uma sociedade formalmente anti-racista (com poucos grupos militantes realmente racistas), embora admitam que informalmente sejam visíveis formas de racismo. Trata-se pois de uma atitude dualista: se por um lado encontramos aqueles que assumem as suas ideias racistas de forma aberta e visível, por outro constatamos a presença daqueles que parecem aceitar o Outro, de forma socialmente correcta em público, mas que subtilmente assumem e corporalizam atitudes racistas. No fundo, e seja qual for a posição mais ou menos positiva/negativa, a verdade é que qualquer autor que trate deste tema acaba por assumir que se verifica a actuação individual/em grupo contra imigrantes, com certa frequência, o que pode ser preocupante, visto que Portugal tende cada vez mais identificar-se como «país de imigração». 39. ACIME – Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas. 40. Em 1995, o Caso Bairro Alto ou o Caso Alcino Monteiro será o primeiro de racismo mediatizado. Um jovem português de origem cabo-verdiana é barbaramente assassinado no Bairro Alto na madrugada do dia 10 de Junho por um bando de Skinheads. Os contornos do crime nunca ficaram publicamente claros e no julgamento os agressores clamaram estarem a ser julgados como caso exemplar. CUNHA, Isabel Ferin, Imigração e Racismo: dez anos nos média, http://bocc.ubi.pt/pag/_texto.php3?html2=cunha-isabel-ferin-sos-racismo.html (20/10/2004) Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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A capacidade de tolerância dos portugueses é uma construção do passado, resultante do imaginário do Outro «diferente». O racismo e a xenofobia são fenómenos proteiformes, polissémicos e fragmentados, cuja matriz sócio-antropológica se situa na conjunção de uma segurança «arcaica» que visa mudar/anular o Outro, resultando num sentimento de insegurança com estereotipização negativa. (Ob. Cit., p. 137) Como portugueses, com uma história plena de contacto com novos povos, apresentase incongruente este sentimento, porém é de ter em conta que a recepção do alóctone parece que até agora tem sido feita de forma pacífica (salvo as excepções acima referidas) e comparando com outros casos na Europa (Alemanha; Magrebinos em França e na Espanha…), não podemos afirmar que somos um país com graves casos de racismo e xenofobia, pelo menos «flagrante». Este autor reivindica ainda o desenvolvimento de uma política voluntarista contra a exclusão social, bem como a implantação de um verdadeiro «civismo» na consciência colectiva, de modo a que se exorcize a cultura do medo e se controle o imaginário da insegurança. (Ob. Cit., p. 138) É certo que existem alguns grupos de imigrantes ligados a acções violentas. Normalmente tratam-se de indivíduos em situação de desvantagem económica e social, o que nos leva a pensar que é o contexto, ou melhor o meio envolvente, que os leva a tomar atitudes de «compensação», se é que assim se pode dizer, materializadas em delitos (roubos, tráfico de droga…) que possam prover de certa forma o seu «sustento». TONRY (1997, pp. 1 e 2) acrescenta que nem sempre tal pode ser estabelecido de forma directa, ou seja, a posição sócio-económica do indivíduo nem sempre «justifica» eventuais actos criminosos que este possa praticar. Refere pois o exemplo da Grã-Bretanha: embora se encontrem no mesmo patamar de desvantagem sócio-económica, os imigrantes Afro-Caribenses estão muito mais ligados ao crime do que o grupo do Bangladesh! Neste caso o autor acredita que a tal se sobrepõe o jogo das disparidades raciais, étnicas e nacionais, relativamente aos autóctones, o que por si poderá induzir a certo tipo de atitudes de ambas as partes. Problemático é quando há a tendência para estender a culpa dos problemas económicos e sociais aos imigrantes, alongando tal sentimento de culpa até às segundas gerações. (Ob. Cit., p. 19) Por outro lado há erros interpretativos que se cometem e que podem estereotipar os imigrantes de forma negativa… é diferente um delito ligado à permanência indevida no território (que implique expulsão), do que uma burla ou um acto de violência (TOURNIER e ROBERT, 1989, p. 6). No primeiro caso, a própria comunidade local até por vezes mostra atitudes de solidariedade e de protecção a favor do imigrante. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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A prostituição é um flagelo que atinge a Europa e que muitas vezes é associado ao fenómeno da imigração. 41 A pobreza, o baixo nível de instrução e o elevado desemprego na classe feminina, leva a que muitas mulheres vindas de África e América Latina/Sul (especialmente nas classes etárias até aos 25 anos) e da própria Europa central e oriental (mais velhas e mais instruídas, às vezes casadas e com filhos), enveredem por este modo de vida. O problema reside no facto de muitas vezes o fenómeno ser generalizado à população imigrante feminina, sendo esta conotada com tal epíteto, o que leva a situações de desconfiança e não-aceitação por parte da comunidade autóctone. Apostar na prevenção, assistência e reabilitação deste grupo em risco não basta, ou seja, é necessário que se desenvolva uma acção mais profunda e profícua ao nível da inserção social, para que se evitem situações de «choque». Por outro lado, há a necessidade de estudar o fenómeno de forma concreta, de maneira a que a população possa estar correctamente informada do que realmente de passa, a fim de se promover uma educação para a tolerância e abertura, mitigando-se as situações de injusta exclusão. Em Portugal, segundo BAGANHA, MARQUES e FONSECA (2000, pp. 52 à 55) as causas dos comportamentos desviantes dos imigrantes estão essencialmente ligadas a situações de pobreza e desemprego, relacionadas com o tráfico de droga. No entanto se compararmos com outros países da Europa, verificamos que não se regista o caso de termos um grupo de imigrantes dados como potenciais delinquentes ou grandes traficantes. De qualquer forma o número de imigrantes detidos é significativo, se tivermos em conta o total da população prisional em causa (em 1998, representavam 11% dessa população, sendo que desse total, 60% eram oriundos dos PALOP).

41. Informações recolhidas na Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre o tráfico de mulheres para fins de exploração sexual, da Comissão das Comunidades Europeias, 1996, Bruxelas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Quadro 3 – Processos-crime na fase de julgamentos findos, arguidos e condenados, segundo a nacionalidade, no anos de 2001 e 2002 Ano

2001

2002

Total de processos crime findos

196 690

91 352

Total de arquidos Com nacionalidade portuguesa Com nacionalidade estrangeira

103 503 199 956 193 547

97 459 93 219 94 240

Total de condenados Com nacionalidade portuguesa Com nacionalidade estrangeira

160 480 157 981 192 499

61 758 58 544 93 214

Variável

Adaptado do Ministério da Justiça (2003).

Já entre 2001 e 2002 42 houve uma diminuição geral do número de processos-crime findos (na ordem dos 6%), tendo o número geral de arguidos diminuído (cerca de 6%) e o número de condenados aumentado (cerca de 2%). Apesar dos casos apresentados serem em menor número relativamente aos dos nacionais (até porque também o estão relativamente ao quantitativo populacional português!), a verdade é que o número de arguidos e de condenados com nacionalidades que não a portuguesa aumentou substancialmente entre estes dois anos: enquanto que no primeiro caso, o número de nacionais diminuiu 7%, nos estrangeiros houve um aumento de cerca de 20%. Já no que concerne aos condenados, enquanto se registou um ligeiro aumento do número de casos daqueles que têm nacionalidade portuguesa (1%), nos estrangeiros a incremento foi de cerca de 29%! Os imigrantes parecem assim mostrar uma maior probabilidade de ser acusados e condenados a penas de prisão, do que os próprios portugueses. Talvez este facto esteja relacionado com o tipo de crimes cometidos, normalmente ligados ao tráfico e consumo de droga 43. O facto de grande parte das rusgas ocorrerem em bairros ligados à presença de imigrantes, especialmente em locais onde se aglomeram muitos indivíduos oriundos dos PALOP, pode também explicar esta «sobrerepresentação» prisional.

42. É de ter em conta que os dados de 2002 são provisórios. 43. Refira-se que a população imigrante está essencialmente ligada do tráfico, enquanto que a população nacional se encontra mais associada ao tráfico-consumo ou apenas ao consumo de droga. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Neste clima, é posto em causa a segurança em torno das migrações (agora ainda mais, com os actos terroristas), debate este que mal conduzido, ou até «propositadamente» conduzido, poderá exacerbar de forma desequilibrada os comportamentos xenófobos de toda uma população (COLLINSON, 2000, p. 317). Mesmo assim, os motivos que possam validar uma posição de não-aceitação, sejam eles de que natureza forem, ligados a uma postura racista/xenófoba, nunca serão de certo suficientes para justificar as atitudes de recusa do Outro. 3.4. O espaço associativo como caminho para a integração Integrar um imigrante na sociedade de chegada, pode processar-se de uma forma «familiar», ou seja, a partir do contacto com outros imigrantes que tenham já uma vivência no país de acolhimento e cuja experiência lhes permita encaminhar os conterrâneos. É certo, como diz TRIPIER (1989, p. 85), que a posterior manutenção dos direitos/deveres e a própria integração, são o produto duma complexa acção das instâncias administrativas e da própria sociedade civil. Não entanto, penso que não devemos descurar o papel do próprio imigrante, também ele bastante pertinente na medida em que ele próprio é o agente que actuará a montante (como actor) e a jusante (como aquele que «beneficia» das consequências) de todo o processo. As associações de imigrantes parecem ser assim um ponto fulcral e coadjuvante na dinâmica de inserção. É nestes espaços que muitos deles encontram o apoio e lugar para esclarecer as suas dúvidas, colocar os seus problemas, sem que entraves de vária ordem se coloquem (a língua, por exemplo…). Porém, a vida associativa encerra um duplo sentido… é certo que por um lado favorece a própria expressão do indivíduo, permite a manutenção da sua identidade, coloca-o em contacto com indivíduos do seu grupo de origem, mas por outro pode promover o favorecimento da individualidade e a manutenção da discriminação, através do afastamento do imigrante da «nova comunidade», o que por si só não assegura a integração nem uma verdadeira cidadania! Nos anos 80 é particularmente visível um pouco por todo o lado, o desenvolvimento de associações de carácter económico, religioso, de jovens… no sentido de tratar questões sociais quotidianas (educação, habitação, saúde…), bem como de sindicatos ligados às questões dos imigrantes (não só para questões profissionais ligadas à defesa de direitos, mas também no sentido de promover a sociabilização e a integração destes no local de trabalho). (Ob. Cit., pp. 87 a 91) Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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LECLERQ (1985, p. 167) acha que estas associações são importantes, especialmente no que concerne aos jovens. A ideia deste autor é pertinente, uma vez que essa geração é a que melhor pode fazer a «integração», mas por outro lado é a que pode também sofrer sérios riscos de «desenraizamento». O ensino é uma área onde essa questão é particularmente visível: do ponto de vista geral, a integração dos alunos filhos de imigrantes é feita com sucesso, na medida em que a sociabilização com os colegas da comunidade de acolhimento é relativamente rápida e bem sucedida. No entanto, quanto mais novo é o aluno, mais fácil se torna a aprendizagem da língua (escrita e falada), barreira essa que é abolida muito mais depressa. Isto significa que o rendimento escolar vai ser melhor, que a própria relação com os colegas vai ser mais próxima, na medida em que há um entendimento verbal. Esse fenómeno aproxima o imigrante da comunidade, inserindo-o no seu seio de forma mais profunda e sólida. Daí que seja importante dar meios para que os jovens, filhos de imigrantes, tenham oportunidade de se associar, no sentido de promover a troca de experiências e de fomentar os momentos de contacto com outros que já estejam mais «à frente» no processo de integração. É certo que não devemos descurar o facto do papel e a acção destas associações alterar conforme o espaço/tempo em que estão inseridas. Exemplo disso é o testemunho que BASTENIER e DASSETO (1985, p. 19) nos dão ao estudar o caso belga, onde referem que esse tipo de organizações, ligadas à comunidade islâmica/muçulmana, ocuparam (pelo menos nos anos 80) um lugar muito importante na integração e estabilização da população imigrada, visto que funcionavam como uma «rede» (no bom sentido!), que colocava em contacto não só a comunidade autóctone, como também a comunidade alóctone. Mais tarde DASSETO (1990, p. 119) assume que estas organizações, pelo menos por parte da comunidade islâmica, estavam a ter um peso «excessivo» nos próprios imigrantes, uma vez que as ideias e normas que defendiam para o seu grupo, não favoreciam em nada a integração, pelo contrário, promoviam o isolamento relativamente à sociedade de acolhimento, vindo por isso impulsionar o debate sobre a laicização no país. Há quem defenda ainda que a política, como espaço associativo (se é que assim se pode considerar, de uma forma lata), se pode revestir de uma forma de integração peculiar e eficaz. RATH (1988, p. 33) afirma que na Holanda, a associação política e o posterior direito de voto nas eleições municipais, permitiu que um elevado número de imigrantes se interessasse mais não só pela vida política em si, mas também pelo seu papel na sociedade. É uma forma de promover a integração que se pode revelar «explosiva», segundo BODY-GENDROT (1988, p. 19), no entanto reconhece Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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como sendo uma oportunidade de inserção, sinónimo de dinamização e de criação de um verdadeiro espaço plural. Em Portugal o ACIDI tem desenvolvido alguns trabalhos em prol dos imigrantes, desenvolvendo parcerias com associações de imigrantes, com o intuito de defender os direitos e deveres dos mesmos. Em 1996 participa num processo de sensibilização para a questão da regularização dos imigrantes ilegais, bem como em discussões para a «produção e actualização» de legislação para este grupo. A exposição «Anne Frank-Uma história para hoje», organizada em 1997, viajou pelo país com sentido de sensibilizar a população para os perigos do racismo e para a necessidade de integrar os imigrantes. Entre esse ano e 1999 tem desenvolvido vários protocolos com alguns Estados (nomeadamente Portugal, Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe), bem como com a OIM (Organização Internacional para as Migrações) no sentido de intensificar e ampliar a cooperação entre as diferentes partes do Território Migratório, em conformidade com os objectivos e prioridades da política migratória de cada país envolvido. Além disso, é criado em 1999 o COCAI (Conselho Consultivo para Assuntos da Imigração), com o objectivo de estudar e tratar a questão da imigração mais de perto 44. As associações em Portugal ainda têm um papel muito ténue e apagado, fruto da inexistência tanto de um movimento associativo intenso, como do facto de só há poucas décadas sermos considerados como «país de imigração». De qualquer forma, o facto de tal fenómeno se processar desta forma, poderá também indicar que o processo de integração dos imigrantes se está a realizar de forma profícua e positiva… ou que estes apresentam uma incapacidade (relacionado com o baixo nível de instrução, por exemplo) de por si só se associarem? Uma visão ambivalente, mas onde ambos os casos parecem coexistir, porém com prevalência do primeiro. 3.5. Falar no plural: a questão da Língua Neste ponto, acresce realizar algumas breves reflexões sobre a questão da Língua, como elemento marcante de um grupo. Entrar num novo país, falando um idioma diferente daquele que é falado pela população autóctone, pode constituir-se como uma barreira. Assim o diz DUJARDIN (2001, p. 308), ao invocar que a escolha do país de destino também se pode pautar por este item. 44. Estas informações partiram da publicação A integração dos imigrantes e das minorias étnicas. Linhas de actuação do ACIME 1996/1999, do ACIME, 1999, Lisboa. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Claro que não podemos tomar a língua como a causa principal de se migrar para certo destino, senão, nessa lógia, os imigrantes da Europa de Leste dificilmente escolheriam Portugal como destino da sua migração! Contudo DURANTI (1997, pp. 49, 332 e 334) reforça a ideia de que a linguagem é um instrumento de interacção do indivíduo com o mundo, sendo a fala a actividade mediadora dessa mesma relação. Ter uma cultura significa, segundo este autor, usufruir de um meio de comunicação, pelo qual é necessário usar uma língua. Esta é a expressão da própria comunidade, da sua dinâmica, dos seus usos e costumes, das suas regras, daí que a não partilhar essa língua ou falá-la de forma limitada, condicionará certamente o acesso a uma plena integração. Nesta linha de ideias, poderemos reflectir sobre o caso dos imigrantes da Europa de Leste no nosso país. O português é uma língua românica de base latina 45, enquanto que a grande maioria das línguas da Europa de Leste são línguas eslavas de base urálica. Isto significa que, em termos linguísticos, apresentam estruturas gramaticais, léxico, morfologia e acentuação diferentes, embora se verifiquem algumas interacções fonéticas, uma vez que existem palavras similares em ambas as bases 46. Estabelece-se então um ponto comum entre o português e as línguas eslavas, capaz de prover a compreensão da mensagem falada (ainda que com muitas limitações), bem como o ponto de partida para a aprendizagem da nova língua. Desta forma, o imigrante passará a vivenciar uma situação de bilinguismo, através da utilização da língua de origem, aquela que é uma marca da sua identidade, e a nova língua (BILLIEZ, 1985, pp. 96 e 105; FASSOLD, 1984, p. 4). Este será um elemento a ter em conta na reapreciação da identidade individual, bem como na própria construção da identidade colectiva, como elemento promotor da integração do imigrante na nova realidade. Mas, e a geração dos mais novos, a segunda geração, aquela que muitas vezes só tem contacto com a língua original através dos pais, em casa: o que significa a língua para eles? Singular a declaração que um jovem árabe, a viver em França, faz a este autor, ao afirmar que a sua língua é o árabe, apesar de não a falar. (BILLIEZ, 1985, p.102) Este facto estará associado à significância e simbolismo que a língua adquire no meio familiar. (GAL, 1997, p. 337) Nota-se que se constitui como parte saliente e indis45. O Romeno também apresenta a mesma base. 46. Deve ter-se em consideração que as línguas europeias partem de uma base comum, a língua indo-europeia. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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pensável do capital simbólico e que esta é marcante na própria construção da identidade. Falar uma língua em casa e outra no mundo exterior (escola, amigos…) é uma realidade para os jovens filhos de imigrantes. O domínio de ambas permite que haja uma maior interacção entre os contextos, porém poderá estar na base do desenraizamento e da confusão de identidade que muitas vezes assola esta «segunda geração». Talvez este fenómeno possa ser colmatado com o avanço do futuro, ou seja, há que ter em consideração que até há algum tempo atrás, falar diversas línguas era privilégio de uma elite. Hoje em dia, com o fenómeno da globalização, as fronteiras linguísticas parecem, nalguns casos, estar em processo de desaparecimento (NEWMAN e PAASI, 1998, p. 198). Isto significa que, actualmente, o inglês se apresenta como «língua universal», mas que em breve as migrações poderão promover o uso e generalização de outras línguas em diversas regiões. 47 Tendo em conta o caso português, verificamos que a maioria dos nossos imigrantes apresentava o português como língua-mãe (veja-se o caso dos grupos vindos dos PALOP e do Brasil). A crescente entrada de imigrantes dos países da Europa de Leste faz com que novas línguas sejam faladas no nosso país. Portugal é um Estado monolingue e a explicação desta situação poderá estar na história. A manutenção da identidade nacional exacerbada pelo isolamento face ao exterior promovido pelo regime ditatorial, e a imposição do português como língua oficial das colónias, parecem ter sido decisivos no fenómeno do monolinguísmo. Por outro lado, os grupos de imigrantes que antecederam os do leste Europeu têm como língua o português! 48 Hoje o cenário tende a alterar-se, não que o português deixe de ter o seu valor, mas porque aparecem aos olhos do cidadão nacional, marcas de que o Outro está no mesmo território. Por exemplo, vejamos o caso das diferentes marcas dos produtos vendidos nas superfícies comerciais, que apresentam as informações em várias línguas, além do português. 49 Além disso, assiste-se ao incremento da imprensa escrita em russo, bem como à abertura, em certas universidades, da disciplina desta língua. 47. Assim, criar-se-ia uma situação não de bilinguismo ou multilinguísmo, mas sim de «diglossia», ou seja, podem coexistir uma ou duas línguas num território, com um estatuto sociopolítico ou cultural inferior à(s) dominante(s). 48. Brasileiros e indivíduos dos PALOP. 49. Trata-se já de uma norma comunitária. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Contudo, não há uma harmonia linguística nos imigrantes da Europa de Leste. Com a diversificação das nacionalidades destes grupos, tendem a acentuar-se as diferenças regionais, pois cada um tende a preservar a sua identidade. Há então uma forte divisão no seio dos imigrantes de Leste. No ensino universitário e nos média prevalece a língua russa, uma vez que esta se apresenta como culturalmente dominante, contudo cada grupo específico faz da sua língua um instrumento para mostrar/manter essa mesma divisão. O domínio da Rússia sobre os países eslavos vizinhos ainda hoje prevalece na língua: muitos imigrantes destas nações sabem falar russo, afirmando que tal foi imposto não só por uma questão formal (do Estado), mas também no sentido de «controlar» e conhecer o Outro. Deste ponto de vista confirma-se a ideia de que a língua se trata de uma questão de poder, também sendo um registo de valores que confere um estatuto social, e que serve de instrumento com os mais variados fins, desde à integração como à submissão do Outro. Em Portugal, e no grupo dos imigrantes da Europa de Leste, o valor da língua parece ser incontornável, não só para a manutenção das raízes (língua de origem), como para facilitar o processo de integração (conhecimento da língua do país de chegada). Foi realizado um pequeno estudo com alguns membros da comunidade moldava residente em Vila Viçosa, sobre a utilização da língua portuguesa/moldava no quotidiano 50. Constatou-se que são os mais novos aqueles que dominam e utilizam mais facilmente o português, seja em forma de pensamento ou de fala. Nota-se que à medida que a faixa etária aumenta, o moldavo parece dominar, sendo o português utilizado apenas com os autóctones ou em instituições públicas. Dentro da própria comunidade o moldavo é a língua utilizada, por excelência, tendo o português um carácter pura e simplesmente utilitarista no dia-a-dia com os nacionais. No entanto, não deixam de referir que é indispensável a aprendizagem da língua portuguesa. Esta é para eles um instrumento necessário para a sua vivência no território português, pois se por um lado funciona como uma arma de defesa (por exemplo, no mercado de trabalho, contra os contratos enganosos), por outro apresenta-se como um modo de integrar e perceber mais facilmente o quotidiano da comunidade do local de chegada e de conhecer o Outro. 50. Este estudo foi realizado em Maio de 2004, no concelho de Vila Viçosa. Foram inquiridos 9 imigrantes moldavos entre os 5 e os 40 anos, sobre a utilização da Língua portuguesa/moldava em acções abstractas (relacionadas com o pensamento) ou concretas (relacionadas com a fala). Note-se que se trata de uma pequena amostra, sem carácter vinculativo à restante população imigrante. No entanto pareceu um estudo interessante de ser feito e com pertinência para o capítulo abordado. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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4. ENTRE O QUE SE PROCURA E O QUE SE ENCONTRA 4.1. O Trabalho 4.1.1. Alguns aspectos teóricos A decisão de sair de um determinado lugar, implica sempre um complexo processo de escolhas, pautadas por motivações de variadas índoles. Porém, e como verificámos num dos capítulos anteriores, o campo económico está praticamente sempre presente no decurso da decisão e quando não se coloca como motivação principal, subjaz transversalmente ao processo. Se quisermos ir um pouco mais além e precisarmos com algum rigor as linhas de acção que dão corpo à razão económica, constatamos que existem duas que sustentam, de certa forma, a preponderância deste factor, nomeadamente a «procura de emprego» e a «melhoria das condições de vida» (entendidas aqui em termos materiais). A primeira, de índole mais específica, encontra-se a montante da dinâmica, ou seja, é a primícia geradora da segunda, de índole mais geral, que a jusante da dinâmica se constitui como que uma «consequência» do tipo de emprego que se irá/gostaria de exercer. JACKSON (1986, pp. 17 e 18), neste sentido, faz uma análise dos modelos que explicam a motivação das migrações, concluindo que de uma forma geral estão sempre intimamente relacionados com teorias ligadas ao mercado de trabalho. Num primeiro momento, as migrações são vistas como fluxos de equilíbrio entre os locais com excesso de mão-de-obra (local de partida) e com falta desta (locais de chegada). Contudo, há que ter em conta o facto de que esta ligação não é assim tão rígida e linear, daí que outras variáveis devem ser tomadas em consideração (infraestruturas do local de chegada, distância a outros centros de população, imagem cultural e social…), nomeadamente do foro económico (variedade de empregos, informação…). Significa pois que o mercado de trabalho e todos os factores internos/externos que a ele possam estar ligados, influenciam certamente a decisão do imigrante, bem como o próprio mercado. Trata-se pois de uma relação biunívoca, já que ambos os campos do sistema (indivíduo-mercado de trabalho) se influenciam mutuamente. PARNWELL (1993, pp. 101 e 102) refere que há que ter em conta que a migração, tenha ela a duração que tiver, interfere não só na economia/mercado de trabalho tanto do local de partida como do local de chegada. TASSINOPOULOS (1998, p. 11) reconhece a partir das motivações migratórias relacionadas com o factor trabalho, três modelos que explicam, de Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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forma simplista, a dinâmica deste fenómeno. O primeiro, que diz respeito ao capital humano, refere que a decisão é baseada no equilíbrio entre os custos/vantagens, subjacentes ao trabalho que se ocupa/poderá ocupar. Apesar de ser considerado um modelo incompleto, por se apresentar «demasiado» linear, penso que se enquadra, ou melhor, está na base e complementa a teoria da procura, onde se considera a migração como sinónimo de «procura de emprego». Significa que, mesmo que a motivação de base se encontre assente na involuntariedade (por exemplo, a fuga a uma guerra, a uma catástrofe natural…), haverá sempre necessidade de procurar emprego ou um qualquer trabalho, de modo a prover a subsistência. Então o emprego pode ser procurado in loco (e aí estaremos em presença de uma migração especulativa) ou já se migra com alguma referência, até mesmo contrato (migração contractual). O modelo da gravidade já insere factores de atracção/repulsão na decisão de migrar, com especial destaque para o mercado de trabalho. Digamos que são modelos que, vistos de uma perspectiva geral e integracionista, se completam, no entanto, numa visão individual, o segundo parece ser o que está mais próximo da realidade, segundo o autor, embora se deva ter em conta que o último modelo apresentado também revela uma dinâmica similar à realidade, na medida em que os aspectos económicos nem sempre são os únicos e últimos factores que condicionam a decisão de migrar. OLMEDO (2002, pp. 106 e 107), ao analisar as motivações que estão na base das decisões dos migrantes, também assume que estas rondam quase sempre a economia, normalmente no que concerne ao aspecto do trabalho: as pessoas que abandonam o seu país para procurar emprego noutro, fazem-no quase sempre para melhorar as suas «oportunidades económicas». De reflectir sobre a questão das condições de trabalho… Muitas vezes, estes indivíduos submetem-se a trabalhos onde as condições de higiene, segurança, direitos sociais… são de carácter duvidoso, ou até mesmo inexistente, apenas com o intuito de, com o salário auferido, atingirem essas oportunidades económicas no sentido de melhorar as condições de vida. Valerá para isso a pena o sacrifício de um trabalho sem segurança, sem higiéne, sem direitos, sem regalias, em prol de um tipo de vida que nem sempre se adquire? Porque afinal, nos parâmetros das «condições de vida» almejadas pelos imigrantes, também deveriam constar as condições de trabalho. Outras das motivações assinaladas são a possibilidade de encontrar emprego no estrangeiro (relacionada com a anterior). Motivos como a distância, o idioma, as afinidades culturais, a existência de parentes no local de chegada («redes») e a política dos países de acolhimento, são Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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apontados como aspectos também importantes, mas de carácter mais secundário. Relevante será também ter em consideração os efeitos que causarão as migrações no campo económico, nomeadamente no emprego. (Ob. Cit., pp. 200 a 203) No país de partida, haverá uma despressurização, uma vez que os níveis de desemprego irão baixar, assim como eventuais postos de trabalho poderão ser libertados para os que ficam 51. Por outro lado, as «remessas» enviadas terão efeitos tanto na esfera familiar, como na esfera nacional, uma vez que funcionam em muitos dos casos como «injecções de capital» na própria economia. O autor afirma que se a migração for permanente 52, poderá assistir-se a um corte com o país e neste caso tal situação de entrega de remessas não se verifica. No entanto, no caso de ser temporária 53, o contacto com o país será mais próximo e por isso mais intensa será o envio de remessas. Estas podem tornar-se essenciais para a economia de um país, já que em certos casos contribuem mesmo para o aumento do capital em circulação, do investimento, podendo até mesmo contribuir para o equilíbrio da balança de pagamentos. Refira-se o espantoso caso das Filipinas, em que as remessas são a segunda fonte de divisas, logo a seguir aos lucros envidados pela tecnologia! É certo que nem tudo se apresenta como vantagem, pois os custos sociais serão elevados: a separação familiar é uma das consequências mais notórias. O brain-drain também se afigura como uma questão problemática, pois se existem casos em que este grupo volta, até trazendo novas experiências e ideias a serem implantadas, mas outros há é certo que nunca regressarão, o que significa que é um investimento do Estado (custo da formação do indivíduo) que se perderá em benefício de outro. No país de destino os efeitos também serão notórios, por exemplo no que concerne à procura de bens e serviços por parte dos imigrantes. Este por vezes cria «necessidades», tanto no local onde se encontra imigrado, relacionado com antigos bens e serviços de que auferia na terra-natal, como no local de origem, relacionado com bens e serviços de que se habituou a dispor no local de imigração. Esta situação tanto pode resultar no desenvolvimento do comércio local, como na incapacidade de resposta a 51. Referindo-se ao que anteriormente se chamou de “migração permanente definitiva”. 52. Neste caso, entenda-se tanto a temporária como a que se chamou de “migração permanente finita”. 53. São factores que acabam por fomentar a propensão para o lucro. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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esse tipo de procura, que eventualmente resultará numa saída dessa população para outros locais onde esse tipo de necessidades possa ser satisfeito. FERREIRA e RATO (2000, pp. 8 e 9) apontam que a imigração evita estrangulamentos nos factores de produção, podendo ainda induzir as empresas a criar novos postos de trabalho que beneficiem os autóctones. A taxa de actividade entre os imigrantes revela-se muito elevada, tendo em conta a faixa etária predominante (essencialmente jovens e jovens adultos), mas no geral recebem salários mais baixos do que a média, sendo uma mão-de-obra pouco exigente 54. Também há que ter em consideração que se trata de um grupo onde o capital auferido é poupado ou então enviado para a família que se encontra no exterior, sob a forma de remessas, o que se materializa num canal de «fuga» de capitais, que deveria entrar novamente no circuito económico nacional. Outra situação prende-se com a qualificação profissional, visto que os trabalhadores adquirem experiência e qualificação profissional. Contudo, o retorno leva a que esta experiência seja aproveitada não onde se fez a qualificação, mas no local de origem! Porém devemos ter em conta que a qualificação profissional adquirida reporta-se muitas vezes apenas ao ambiente prático, o que se afigura como insuficiente para a sustentação da criação de projectos, com os resultados pretendidos. Antes de se concluir esta parte, há que ter em consideração uma ideia passada por OLMEDO (2002, pp. 202 e 203), em torno ainda das vantagens da imigração. O mito de que será a população imigrante aquela que poderá rejuvenescer a população do local de chegada, prevalece ainda em muitas discussões. Esta realidade (se o fosse!) seria uma mais-valia a longo prazo, na medida em que favoreceria o aumento e o rejuvenescimento da própria população activa, a qual certamente iria interferir com a economia do país. Quer dizer então que as reservas de capital humano aumentariam, deixando esse mesmo país de «necessitar» da mão-de-obra estrangeira, com todas as vantagens/desvantagens que daí adviriam para cada uma das partes. No entanto, o que se verifica, e falamos do caso europeu, é que a imigração pode limitar o impacto negativo do envelhecimento, sobre o nível de vida e das finanças (ao nível do pagamento dos impostos). A população imigrante apenas «traz novos habitantes», não promovendo por si só a «natalidade». Significa que a estrutura 54. São factores que acabam por fomentar a propensão para o lucro. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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etária de uma população, com este novo grupo, pode mudar temporariamente, ou melhor dizendo, conjunturalmente, mas nunca de uma forma profunda e estrutural. A mão-de-obra imigrante é assim vista segundo a perspectiva do «efeito amortecedor», ou seja, como que um capital a que se recorre quando há necessidade, a qual beneficia e faz beneficiar as partes em questão. Este repto lançado pelos autores anteriormente citados, leva ao debate sobre o papel do imigrante, ou melhor, à visão do Outro, sobre o ponto de vista da economia. Este é assim tomado como a solução para os desequilíbrios económicos, nomeadamente ao nível do trabalho. 4.1.2. Portugal e a Europa: perspectivas O trabalho imigrante em Portugal tem vindo a ganhar cada vez mais significado ao longo das últimas décadas. Na Europa, a tradição do trabalho estrangeiro tem raízes mais profundas, no entanto não se trata de um processo contínuo, ou melhor dizendo, trata-se de um fenómeno dinâmico que evoluiu ao longo do tempo. No caso de Portugal, o fenómeno imigratório pode acusar dois aspectos: se por um lado pode ser revelador do facto de termos atingido um certo limiar de desenvolvimento (manifestado num certo crescimento económico, no prolongamento da escolaridade…), por outro traduz-se na necessidade de compensar a «hemorragia» provocada pelos anteriores fluxos emigratórios, que caracterizaram durante muito tempo a dinâmica migratória do país. (FERREIRA E RATO, 2000, p. 7) Desde a década de 60, as mudanças têm sido evidentes e constantes. Durante a década referida, quase toda a população imigrante que estava presente em Portugal era oriunda da Europa e da América (resultado da contra-corrente da primeira fase da emigração portuguesa), ou fruto de movimentos transfronteiriços com Espanha. Pontualmente poderíamos encontrar englobados neste grupo indivíduos de outras nacionalidades que não as anteriormente citadas, que se encontravam no país por motivos profissionais (diplomacia, ligados a empresas…). Já nos anos 80 (ou até antes!) o cenário muda, com crescimento acentuado do número de imigrantes provenientes dos PALOP, os quais ocuparam lugares na construção civil e nos serviços domésticos. Os imigrantes europeus continuam a ocupar os mesmos sectores de actividade e a agricultura, como sector que anteriormente acolhia um número significativo Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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de imigrantes, começa a ser preterida em relação a outras áreas de actividade. Salienta-se ainda a presença de alguns asiáticos, trabalhando essencialmente no comércio e serviços (lavandarias, cinemas…), muitos deles tendo adquirido experiência em Moçambique, onde se haviam primeiramente estabelecido. Com o processo de descolonização acabam por acompanhar os movimentos de saída do continente africano para o continente europeu. Durante esta década verifica-se também um crescimento acelerado da imigração dos profissionais qualificados, consequência da abertura de Portugal à União, no entanto continua a manutenção da tendência para os imigrantes ocuparem lugares na indústria e principalmente na construção civil. No caso do primeiro grupo, a situação atenua-se uma vez que já na década de 90 se assiste à estabilização do número de profissionais (o ritmo de instalação de empresas estrangeiras diminuiu). Por outro lado, cresce o número de trabalhadores não qualificados, o que não foi mais do que o resultado do processo de regularização extraordinária de 1992/93, com efeitos mais evidentes neste grupo. (MALHEIROS, 1996, pp. 83 a 90) Este autor refere ainda que o panorama nacional no final do séc. XX era diferente dos meados do mesmo século. As evidentes alterações enquadram-se não só na composição dos diversos grupos (origem), como também nas actividades laborais desempenhadas. Os europeus e os norte-americanos continuam a ocupar os lugares que exigem profissionais qualificados, embora já se considere um número significativo de «reformados» oriundos da Europa central e do norte 55. Os profissionais não qualificados encontram-se essencialmente entre os imigrantes originários dos PALOP, os quais ocupam lugares na indústria e serviços. Os asiáticos, também eles com baixas qualificações profissionais, ocupam o ramo do comércio. Os imigrantes sul-americanos (brasileiros) ocupam uma posição transversal, ou seja, encontramos tanto profissionais altamente qualificados, como não qualificados, traduzindo o próprio fenómeno as clivagens da sociedade brasileira. Realmente verifica-se que a importância dos imigrantes no mercado de trabalho português tem vindo a aumentar, visto este representar novas oportunidades para estes indivíduos. Além dos grupos já referidos, cumpre ainda mencionar outro que marca os anos 90, nomeadamente o dos imigrantes da Europa de Leste (especialmente os Ucranianos, Moldavos, Romenos e Russos). É uma população essencialmente jovem (dominam 55. Estes podem participar indirectamente na economia e no mercado de trabalho, a partir de investimentos que efectuam em diversas actividades, promovendo dessa forma a abertura de novos postos de trabalho. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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os indivíduos dos 15 aos 35 anos), predominando o sexo masculino. Num primeiro momento, no casal, é o homem que imigra, preparando a chegada da mulher e eventualmente dos filhos. Normalmente exercem trabalhos muito abaixo das suas qualificações profissionais, que na maioria dos casos são elevadas. O que é mais interessante neste grupo é que para além da construção civil e dos serviços domésticos, funções que normalmente este e o dos PALOP desempenham, vão ocupar lugares na agricultura e na indústria (principalmente na manufactureira). São sectores peculiares, o primeiro porque foi «recusado» pela população jovem, o segundo porque o trabalho por turnos «afasta» muitos nacionais. O sector dos serviços, onde se exigem mais qualificações, não ocupa muitos destes indivíduos, uma vez que a língua se coloca como uma barreira. (FONSECA, MALHEIROS, ESTEVES e CALDEIRA, 2002, pp. 82 e 86) O mercado de trabalho nos últimos tempos, segundo BAGANHA (1999, p. 48), está a sofrer algumas alterações. Com uma posição económica desfavorável face aos outros Estados-Membros da U.E., Portugal padece com a perda de mão-de-obra através do processo emigratório que sofreu ao longo de várias décadas do séc. XX, no entanto assiste ao crescente aumento da imigração na última década do século. Esta autora crê que, por um lado se estão a criar oportunidades para o desenvolvimento de postos de trabalho para profissionais altamente qualificados (principalmente para serem ocupados por Europeus e Brasileiros), mas por outro também se tende a desenvolver a economia informal (dominada pelos imigrantes dos PALOP) 56. A verdade é que os imigrantes ocupam as «franjas» do mercado de trabalho português, no sentido positivo (vejam-se os que ocupam profissões técnicas e liberais, como os Europeus e os Brasileiros) e no sentido negativo (no caso das profissões que praticamente não exigem qualificações profissionais, ligadas a trabalhos manuais, executados pelos imigrantes dos PALOP). Neste último grupo, há uma propensão para o desenvolvimento de actividades ligadas à economia informal, a qual se pauta pela ilegalidade e irregularidade das actividades que desenvolve. É mais comum o desenvolvimento deste tipo de economia nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, ligado à actividade industrial (principalmente no norte), construção civil, serviços (hotelaria, turismo, limpeza…) 57.

56. A economia informal também é designada de economia subterrânea. 57. Situações de informalidade também ocorrem no caso das franjas ocupadas por profissionais liberais, onde podem ser desempenhadas actividades paralelas à principal. As funções desempenhadas paralelamente são da área da contabilidade, direito, ensino e saúde. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Esta situação gera uma imagem negativa que pode afectar os imigrantes que se estabelecem por conta-própria. Assim referem MARQUES, OLIVEIRA e DIAS (2002, p. 142), reconhecendo no entanto que muitas vezes tal facto é mesmo verídico. A informalidade surge quase sempre ligada ao desemprego e às parcas oportunidades oferecidas pelo mercado de trabalho. Constitui-se como uma alternativa, ou melhor dizendo, uma forma de contornar o desemprego que deve ser tomada em consideração, já que movimenta uma quantidade significativa de capital e de trabalhadores. A verdade é que a economia portuguesa parece estar a gerar oportunidades para a integração dos seus imigrantes. Por um lado vaticina-se o crescimento das oportunidades de emprego nos segmentos mais elevados do mercado, por outro o desenvolvimento da própria economia informal, também graças à escassa actuação do governo, em matéria de fiscalização (BAGANHA, 1999, pp. 69 e 70). No caso da Europa, há 25 anos atrás, constatavam-se movimentos migratórios no seio da Comunidade, mas também advindos dos «países do 3.o Mundo» (com baixas qualificações profissionais), contudo o futuro já é visto por alguns autores como um momento em que a mão-de-obra estrangeira extra-europeia não mais seja necessária à Europa. Analisando a actualidade próxima, o mais marcante na imigração europeia terá sido o fluxo de imigrantes da Europa de Leste, que «invade» a parte ocidental do continente (TASSINOPOULOS, 1998, p. 49). Na Europa são procurados os trabalhadores qualificados e também os não qualificados, apresentando este grupo uma evolução numérica cada vez mais significativa. Talvez por isso seja necessário a construção de um verdadeiro «mercado comum de emprego», que na prática já existe, no sentido de analisar e regularizar o equilíbrio entre a oferta e a procura. (Ob. Cit., p. 50). Países como a Itália, Grécia, Espanha e Portugal, conhecidos como países de emigração, vêem chegar até si um número considerável de imigrantes. Segundo LEBON (1986, p. 182), estes não chegam a ocupar o lugar dos nacionais. Seria significativo a construção de um «mercado comum», no sentido de «controlar», se é que assim se pode dizer, uma nova dinâmica que se impõe no contexto europeu. TASSINOPOULOS (1998, p. 51) refere que um dos grupos que tende a movimentar-se cada vez mais não União é o dos trabalhadores altamente qualificados, o qual não se apresenta de todo homogéneo. Esta tendência é sinal de uma procura por parte da U. E., consequência da mundialização e da internacionalização das empresas. No caso dos fluxos se intensificarem, pode gerar-se uma certa concorrência, o que aliado ao Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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próprio envelhecimento da mão-de-obra europeia e às exigências do mercado, pode levar os mercados a perder a sua base nacional («nascimento» da classe dos «Euro-Executivos»). Alguns problemas que se colocam aos imigrantes, tais como o domínio da língua do país de chegada, a equivalência de diplomas, a adaptação às condições sócio-culturais e a situação familiar, podem ser entraves ao desenvolvimento desta realidade. Contudo, pelo menos nas regiões fronteiriças, pensa-se que tais problemas possam ser esbatidos, e a dinâmica imigratória desenvolver-se naturalmente. (Ob. Cit., pp. 52 e 54). Num cenário de mudança, quer em Portugal, quer na Europa, vários panoramas se anunciam. Porém o mais marcante parece ser o fosso que se aprofunda no mercado de trabalho entre dois grupos de imigrantes, os qualificados e os não qualificados. A construção de um «mercado comum de trabalho», com uma base formal, parece ser uma solução bastante plausível e necessária, na medida em que poderá promover a correcta inserção do imigrante nesta área, um passo importante e decisivo para a integração efectiva na comunidade de chegada. 4.1.3. Política e integração no mercado de trabalho Em matéria de legislação esta tem sido produzida, quer ao nível nacional, quer ao nível internacional, de forma a promover os direitos/deveres do trabalhador imigrante. Pode dizer-se que é a partir dos anos 50 que se começa a ter em atenção esta problemática: a aprovação da «Declaração Fundamental dos Direitos Humanos», apenas com valor «recomendatório», foi um ponto de partida à abertura de portas, apesar de na altura ter tido pouco impacto. Nos anos 60 começa a consagração, em pactos internacionais de um conjunto de direitos (sectoriais ou parcelares), entre os quais se revelam alguns sobre a temática do trabalho e a partir daí a produção de legislação e a ratificação de tratados, tem sido crescente. No caso de Portugal, LEITÃO (2002, p. 93) afirma que os imigrantes, pela lei nacional, gozam dos mesmos direitos dos restantes trabalhadores (sejam ou não titulares de uma autorização de residência, autorização de permanência ou visto de trabalho), bem como dos mesmos deveres (nomeadamente ao nível do fisco e da segurança social). Em termos de direitos, salienta o direito à retribuição do trabalho (princípio do «trabalho igual, salário igual»), organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, o acesso e manutenção das condições de higiéne, saúde e segurança, o direito a momentos de repouso, lazer e férias, assistência Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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material quando o trabalhador se encontra involuntariamente no desemprego e reparação dos danos a vítimas acidentadas no trabalho. Além disso, o Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, segundo este autor, foi um passo importante para promover a integração do imigrante no mercado de trabalho, reconhecendo muito dos direitos que, tal como os anteriormente citados, até aí tinham sido apenas virtuais 58. Mas na verdade, cada vez mais chegam ao conhecimento público, casos de imigrantes que em nada beneficiam destes direitos, trabalhando muitas vezes em condições sub-humanas, sem qualquer direito ou dever. Pode ser sinal que realmente a economia subterrânea vinga, cada vez com mais força e menos controlo, por parte das autoridades competentes. Também no sentido de acabar com tais situações, tem havido desde há umas décadas a articulação com a esfera internacional. Em 1978, foi ratificada a «Convenção n.º 143 da OIT, relativa às migrações em condições abusivas e à promoção de igualdade de oportunidades e de tratamento dos trabalhadores migrantes». A OIT 59 é uma associação de Estados, cujas delegações são representadas de forma tripartida (Estados, Sindicatos e Empregadores), mostrando-se com uma grande capacidade de fiscalização e exigência. O nome indica o próprio conteúdo da convenção, a qual se constituiu como um passo importante ao nível internacional para a tomada de consciência e materialização dos direitos/deveres dos trabalhadores imigrantes 60. Ainda no mesmo ano é ratificada a «Convenção Europeia Relativa ao Estatuto Jurídico do Trabalhador Migrante» 61, onde se considera que se torna necessário regulamentar a situação jurídica dos trabalhadores originários dos Estados-Membros do Conselho da Europa, com vista a proporcionar um igual tratamento dos trabalhadores imigrados e dos seus familiares, relativamente aos trabalhadores e familiares do país de chegada 62. Mais tarde, em 1990, a «Convenção Internacional sobre a protecção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e das suas famílias», revela a preocupação das Nações Unidas em afirmar e acentuar os direitos e 58. Foi importante nesta formalização o papel do ACIDI, SEF e IGT. 59. OIT – Organização Internacional do Trabalho. 60. Lei n.º 52/78 – Convenção n.º 143 da OIT, relativa às migrações em condições abusivas e à promoção de igualdade de oportunidades e de tratamento dos trabalhadores migrantes, Organização Internacional do Trabalho, 1978. 61. Lei n.º 162/78 – Convenção Europeia Relativa ao Estatuto Jurídico do Trabalhador Migrante, Conselho da Europa, 1978. 62. O Presidente da República que ratificou ambas as convenções foi António Ramalho Eanes. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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deveres advindos da «Declaração Universal dos Direitos Humanos»63. Esta acabou por ser ratificada por poucos países, nomeadamente pelos de tradição emigratória. Levou alguns anos a ser assumida por pouco mais de 20 países, donde se conclui que a sobreposição do direito nacional ainda se constitui como um travão ao desenvolvimento de parcerias internacionais. Contudo parece haver uma necessidade de se estabelecerem acordos deste tipo, uma vez que os fluxos migratórios envolvem movimentos extranacionais, que implicam por isso mais do que o país visado. Em 1 de Julho de 2003, entrou em vigor a «Convenção da ONU sobre Direitos dos Trabalhadores Migrantes» 64, já com um carácter mais específico, visando proteger o trabalhador imigrante e a sua família da exploração e violação dos seus direitos. Portugal não foi um dos países que ratificou, contudo foi alertado pela «Associação de Reencontro dos Emigrantes» para tal. Significa que as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo demonstram o seu nível de informação sobre o assunto, bem como a preocupação em defender a sua posição. Não se observou qualquer movimento relevante por parte das comunidades imigradas, talvez fruto do ainda incipiente peso das associações de imigrantes, levando ainda a pensar que muitos destes ainda se encontram numa situação «irregular», que não lhes permite defender formal e publicamente os seus direitos. É sem dúvida necessário o empreendimento de políticas ligadas à protecção dos imigrantes no trabalho, ou melhor dizendo, de definição de direitos e deveres, bem como de um sistema de fiscalização eficiente, de modo a que se desmantelem as «redes» que operam neste sector. PEIXOTO (2002, p. 60) refere que há que ter em consideração a teoria do mercado, uma vez que pode dar pistas sobre a situação acima reflectida. Segundo esta teoria, podemos encontrar, um mercado primário, caracterizado pela estabilidade das condições de emprego, das relações laborais, pelo auferimento de bons salários, perspectivas de carreira e protecção social garantida. No entanto, a maioria dos imigrantes, principalmente os oriundos dos PALOP e da Europa de Leste 65, insere-se no mercado secundário, onde se agrupam os empregos que exigem baixa qualificação profissional, se auferem baixos salários, onde as oportunidades de pro63. Lei n.º 45/158 – Convención Internacional sobre la protección de los derechos de todos los trabajadores migratórios y de sus familiares, Conselho da Europa, 1990. 64. Centro de Informação das Nações Unidas em Portugal (2003) – Convenção da ONU sobre os direitos dos Trabalhadores Migrantes, www.onuportugal.pt (30/6/2003). 65. O autor refere que com estes imigrantes se dá o fenómeno do Brain Waste (que se pode traduzir por desperdício de «cérebros»), devido à discrepância entre as qualificações profissionais que apresentam e o tipo de trabalhos que realizam. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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moção são escassas, onde domina a insegurança laboral e não há praticamente assistência social. Segundo este autor, a atenção política tem estado centrado sobre os sectores mais carenciados, nomeadamente o mercado secundário, no entanto as iniciativas deveriam abranger outros campos, nomeadamente a captação de profissionais qualificados, ao nível da facilitação de mecanismos de reconhecimento de competências (ao nível individual e organizacional). Deste modo criar-se-iam condições para a atracção deste grupo e consequentemente de investimentos. (Ob. Cit., p. 67) A integração do imigrante na sociedade de acolhimento, pode constituir-se como uma mais-valia para a progressão no mercado de trabalho. OLMEDO (2002, pp. 202 e 203) afirma que à medida que aprendem a língua, se familiarizam com os mecanismos do mercado de trabalho, melhoram as suas competências e a taxa de desemprego entre o grupo imigrante diminui substancialmente. No entanto a tendência é para que os imigrantes, de uma maneira geral, tenham menos oportunidades de receber ajuda dos poderes públicos, do que as pessoas naturais do país de chegada. Aliás, quando recebem, os montantes baixos, inversamente ao valor dos impostos pagos por si e pelos seus descendentes, que tendem a ser superiores aos gastos públicos que causam (seja na saúde, educação, segurança social…). Há um paradoxo que tende a imperar cada vez mais nos países da Europa: se por um lado há necessidade de imigrantes em certos sectores, por outro lado parece haver um crescimento das barreiras legais à imigração. A integração da mão-de-obra estrangeira no mercado de trabalho, pode constituir-se como uma mais-valia para ambas as partes: se por um lado são os imigrantes que, ao beneficiarem de boas condições de trabalho, vão aumentar em quantidade e em qualidade a sua produtividade, por outro, são os próprios nacionais que irão beneficiar pelo aumento do lucro obtido. RITA (2002, p. 46) constatou que em muitos casos a imigração parece não estar a originar efeitos nefastos nos mercados de trabalho dos países de chegada, podendo mesmo até constituir uma fonte de flexibilidade e melhoria das qualificações. Em Portugal, tal não acontece porque o modelo de desenvolvimento aposta na «exploração» intensiva desta mão-de-obra. Acrescenta ainda que os recursos humanos estrangeiros podem vir a revelar-se essenciais, daí que se seja de todo benéfico o aproveitamento das qualificações e a inserção no mercado de trabalho. (Ob. Cit., p. 53) Este aproveitamento de recursos humanos poderia servir para colmatar as lacunas deixadas por um sistema de ensino desadequado, onde a formação profissional é descurada e o ensino básico se constitui como um Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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período de aprendizagens baseadas no facilitismo nefasto. Talvez por isso, Portugal apresente ainda, relativamente a outros países europeus e da União, taxa de analfabetismo elevada, baixa qualificação profissional e outros problemas relacionados. O que aconteceria se, por exemplo, aos imigrantes dos países da Europa de Leste que normalmente apresentam elevadas qualificações profissionais, fosse reconhecida equivalência dos seus diplomas? Certamente gerar-se-ia uma concorrência avassaladora, com tendência para ser ganha não pelos nacionais, o que levaria ao surgimento de conflitos sociais, baseados de um espírito de «repulsão» do Outro, mais bem preparado, mais competitivo. Lembremo-nos que a livre circulação de pessoas e bens, também pressupõe trabalhadores. O grande projecto europeu pressupõe que haja igualdade de oportunidades no espaço que abrange. Será por isso necessário não só prover os nacionais de preparação, como gerar condições para que os imigrantes se integrem de forma justa no mercado de trabalho, de maneira a conseguir um equilíbrio entre todas as partes em questão, constituindo uma mais-valia para todos. 4.1.4. Entre «falsos mitos» e «novas esperanças»… reflexões em torno do estatuto ambivalente do imigrante no mercado de trabalho Como temos vindo a verificar ao longo dos capítulos, o estatuto do imigrante é quase sempre visto sob o ponto de vista dualista: se por um lado se assume a ideia de que se trata de um grupo que pode trazer benefícios ao nível do mercado de trabalho, por outros constatam-se receios sobre o papel social e económico (essencialmente ao nível da concorrência) que possam desempenhar. OLMEDO (2002, p. 197) tenta desmistificar um pouco esta ideia, defendendo que os imigrantes que têm altos níveis de produtividade e se adaptam rapidamente às condições do mercado de trabalho do país de acolhimento, podem contribuir de forma significativa para o crescimento económico. Para isso será necessário promover a integração plena do indivíduo… porém tal ideia nem sempre é bem recebida, na medida em que o imigrante é visto como uma espécie de «intruso» que vem «roubar» postos de trabalho e que concorre com os trabalhadores nacionais. O Diário de Notícias 66 apresentou um estudo sobre o «Impacto da imigração em Portugal nas contas do Estado» (2001), donde se concluiu que, em 66. Este estudo veio publicado no jornal DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Estado “lucra” 28 milhões, Secção dn.tema, quinta-feira, 22 de Janeiro de 2004. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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média, cada imigrante (legalizado ou em vias de ser legalizado) deixa ficar, por ano, nos cofres do Estado, cerca 1395 euros 67. Além disso, como já entram em Portugal com a formação escolar terminada, não representam encargos nesta área. Na agricultura têm desempenhado um papel importante, combatendo um pouco do despovoamento do interior, havendo até situações de recrutamento de mão-de-obra estrangeira. Na restauração, os brasileiros são preferidos relativamente aos europeus de leste e ao grupo dos PALOP devido ao handicap da língua (no caso dos primeiros) e da capacidade de sociabilização («maior» nos imigrantes brasileiros).68 No geral, todos os imigrantes dão contributos muito diversificados, bem como se constituem como um mercado de consumidores principalmente na área dos transportes aéreos (viagens para o país de origem), banca (envio de remessas) e telecomunicações (contacto com os parentes/amigos do país de origem). Neste estudo são destacados os imigrantes do leste europeu, como sendo um capital humano com elevadas habilitações e muita experiência, que mostram um grande sentido de disciplina e que têm contribuído não só para o aumento da produtividade e da internacionalização do tecido produtivo. FERREIRA e RATO (2000, pp. 7 e 10), referindo-se ao caso europeu em geral, explicam que a imigração e o emprego dos trabalhadores estrangeiros foi adquirindo um carácter estrutural, criando realmente um acerta dualidade no mercado, ou seja, a mão-de-obra nacional tende a ocupar os melhores empregos e a estrangeira os restantes, não se gerando por si só uma situação concorrencial. Gera-se então a tese de que os imigrantes travam a subida geral dos salários, o que na prática não se verifica dessa forma, criando-se preconceitos contra os trabalhadores estrangeiros. A questão é que a tendência verificada por muitos autores é a de que as migrações de profissionais altamente qualificados irá aumentar substancialmente. Mas uma vez a dualidade de opiniões se aplica, quer dizer, promoverão o desenvolvimento da estrutura sócio-económica ou criarão um ambiente de tensão, gerado pela situação de concorrência? GOULD (1988, p. 382) acha que muitas destas migrações se estabelecem não no sentido de um favorecimento totalmente deliberado, mas pelo contrário, a uma fuga de uma situação desfavorável. Este autor afirma que, relativamente às migrações de profissionais altamente qualificados, que se estabelecem entre os países em vias de desenvolvimento e os países 67. Em 2001, os imigrantes deixaram nos cofres do Estado à volta de 128 milhões de euros. 68. Este sector já criou o primeiro centro de legalização e apoio à imigração. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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desenvolvidos (e entre os próprios países desenvolvidos), se trata de um brain-drain, ou seja, uma «fuga de cérebros» de locais onde não há condições de aplicarem os seus conhecimentos e desenvolverem convenientemente os seus trabalhos. Desta forma, são escolhidos como destino países desenvolvidos que possam satisfazer esta busca. Quando se trata de migrações entre países em vias de desenvolvimento, normalmente a transferência pauta-se por uma fuga relacionada com a segurança, ou melhor, com a insegurança, daí que muitos profissionais qualificados sejam até considerados «refugiados». Quando se trata da saída destes profissionais de países desenvolvidos para países em vias de desenvolvimento, muitas vezes não é mais do que um «retorno» ao país de origem, depois de vários anos de estudo no estrangeiro. De uma forma geral, as qualificações da mão-de-obra estrangeira tendem a ficar a par dos nacionais (às vezes um pouco acima, como é o caso dos imigrantes da Europa de Leste em Portugal), no entanto é muito comum ocuparem lugares mais desfavoráveis. E a experiência dos contextos internacionais leva a concluir que muitas vezes, esta mão-de-obra imigrante é «usada» conforme as necessidades do mercado. (VIPREY, 1996, p. 418) Aliás, os empregos «locais» (tratando-se não das grandes cidades, mas de regiões mais «ruralizadas»), tendem a ser em primeiro lugar destinados aos autóctones e posteriormente, na recusa/falta dos primeiros, aos imigrantes! (BARTIK, 1992, p. 309) No sector privado, a regulamentação legislativa e política são dispositivos essenciais e necessários para facilitar a integração dos trabalhadores estrangeiros. Só assim poderão evitar que muitas vezes as empresas que não estão abrangidas por convenções ou por legislação específica, tenham tendência para desvalorizar as funções desempenhadas pelos imigrantes (ITO, 1990, p. 22; MERKLING, 1987, p. 91). O desemprego entre os imigrantes também é utilizado como argumento contra a sua presença. Mas o que acontece, pelo menos no caso português, o nível da taxa de desemprego neste grupo é relativamente baixa (7,2% em 1995 e 4% em 2000). Contudo existem grupos onde os valores são um pouco mais significativos, nomeadamente com os imigrantes originários dos PALOP (Angola, Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe) (FONSECA, MALHEIROS, ESTEVES e CALDEIRA, 2002, p. 86). Não parece pois, haver razões válidas para admitir que os imigrantes possam afectar negativamente o mercado de trabalhos dos locais de chegada, sejam eles por ocupação de lugares aos nacionais, por especulação salarial ou por questões sociais. Em Portugal, talvez tenhamos a «obrigaFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ção» de fazer uma outra leitura do caso. Talvez o facto de, de forma relativamente rápida, nos termos tornado um destino preferencial de certos grupos de imigrantes, de não ter havido uma geração «intermédia» que começasse a assimilar os factos, de manifestarmos um nível de escolarização/informação baixo, promova esta falta de abertura. É pois necessário a tomada de consciência de que esta mão-de-obra existe e que pode ser um potencial de desenvolvimento da própria economia do país, mas que padece de problemas, nomeadamente ao nível da exploração que muitas vezes sofrem no mercado de trabalho. 4.2. A Saúde Quando nos referimos ao campo da saúde no caso português, o acesso aos seus serviços provêm de um equilíbrio de direitos/deveres consignados pelo próprio Estado. Um imigrante que esteja em situação legal, supostamente terá todos os direitos de acesso ao serviço nacional de saúde, ao contrário do ilegal que não aufere do mesmo. Uma situação complicada, que por vezes gera situações de risco humanitário, na medida em que o indivíduo deixa de poder usufruir gratuitamente dos cuidados básicos de saúde, a menos que possa pagar os mesmos no privado, o que na maioria das vezes não acontece. Ilustrando esta situação, foi noticiado, no dia 7 de Janeiro de 2004 69, o caso de uma imigrante dos PALOP que se encontrava em situação irregular no nosso país e à qual tinha sido diagnosticada um cancro no útero há, sensivelmente, seis meses. A mesma encontrava-se numa situação de grande pobreza, visto ter deixado de trabalhar por motivos de saúde, não tendo qualquer direito de acesso ao serviço nacional de saúde nacional. Por isso, encontrava-se há meio ano com os sintomas da doença, mendigando medicamentos nas urgências e sobrevivendo com a ajuda dos vizinhos. Como este, existirão muitos mais casos, onde a prevalência da lei se sobrepõe à valorização dos direitos humanos. Também o facto de muitos dos imigrantes que entram na Europa provirem de outros continentes, com outras características biogeográficas, faz com que apresentem outro tipo de patologias relacionadas com o seu meio. Mesmo assim, MECHALI (1990, p. 99) refere que por vezes é difícil delimitar as fronteiras epidemiológicas… No caso de se desenvolverem doenças «específicas» de certas regiões do mundo, poderemos atribuir a sua proliferação aos imigrantes. Porém, no caso das patologias ditas 69. Foi uma notícia revelada pela TVI, no “Jornal Nacional” (20:00) do dia 7 de Janeiro de 2004. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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«comuns», estas tanto se podem difundir através deste grupo, mas também por acção dos autóctones. Não se deve estabelecer um «catálogo de patologias» e aplicá-las a autóctones/alóctones, como por vezes se faz, sob risco de conotar injustamente determinados grupos. Pode acontecer é que os imigrantes se constituam como um «grupo de risco», na medida em que nem sempre auferem de uma situação estável ao nível material (parco salário, falta de segurança no trabalho, habitação insalubre…) e do Direito (pode encontrar-se em situação irregular, o que lhe exclui, à partida, direitos como o do acesso ao serviço nacional de saúde), o que por si só os coloca numa posição fragilizada face ao combate à doença. A própria população imigrada pode padecer de dois géneros de patologias, ou seja, as ditas «importadas» ou as «adquiridas». No primeiro caso estamos em presença de doenças típicas dos países de origem dos imigrantes, que são praticamente inexistentes nos locais de chegada (ex. lepra, malária, tifo…), referindo-nos a este como sendo a Europa. Tais situações resultam em dificuldades de tratamento, já que os próprios médicos não estão tão familiarizados com estas patologias. A segunda situação refere-se a doenças adquiridas através do contacto com os autóctones. (Ob. Cit., pp. 100 e 101) Se muitas vezes se estabelece a ideia de que os imigrantes «importam» certo tipo de enfermidades dos seus locais de origem, tal não é correcto, visto que o contrário também acontece. Em França, no sentido de promover a manutenção da saúde pública, há o «controlo» destas patologias na população imigrante: no caso de alguns destes indivíduos padecerem de algum tipo de doença «endémica», a procura dos medicamentos para a combater deve ser espontânea, e se tal assim não for, esta mesma procura é «imposta» pelo próprio governo. (Ob. Cit., p.124) Esta medida assenta numa base de protecção da saúde pública, quer dos nacionais, quer dos estrangeiros, porém poderá gerarse uma situação de exclusão do grupo dito doente. Tal dependerá em muito da leitura que a opinião pública fizer da situação. Em Portugal não há obrigatoriedade de tratamento contudo, a partir de 2001, a lei previu que os imigrantes portadores de doenças crónicas e que não tivessem possibilidade de ser devidamente tratados no país de origem, pudessem requerer a legalização. Ainda não é muito comum este argumento, contudo cresce a cada dia o número daqueles que tentam legalizar-se, com base num problema de saúde. Segundo a classe médica, muitos destes imigrantes já sabem que estão doentes antes de chegarem a Portugal. Por exemplo, o número de doentes com o HIV oriundos de países africanos está a crescer. O problema não se coloca Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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tanto ao nível das capacidades técnicas para tratar estes imigrantes, mas antes da capacidade logística e económica para o tratamento desta e de outros tipos de patologias, se o número de casos de imigrantes com problemas de saúde crónicos tender a aumentar. 70 REMY (2002, p. 254) centra-se sobre o estudo da distribuição geográfica do vírus HIV e constata que a mobilidade das populações é um factor importante que pode explicar a disseminação, assumindo que realmente há populações imigrantes de risco que devem ser tidas em conta. Destaca desta forma os ilegais, especificamente as mulheres ligadas à prostituição, bem como os imigrantes da África Ocidental, como grupos problemáticos, na medida em que se apresentam como sendo um elo de possível contágio da população autóctone. As doenças hereditárias, segundo ROCHETTE e CHARBIT (1990, pp. 145 e 150), também alastram nos locais de chegada, devido às relações de exogamia. Estes autores destacam as chamadas «doenças de sangue», que até há pouco tempo estavam confinadas a certas regiões de Ásia, África e Europa do Sul e que cada vez mais se tendem a disseminar por toda a Europa. Se até há algum tempo apenas alguns países com tradição imigratória se encontravam em risco (o caso da França, Bélgica, Alemanha…), hoje em dia esse mesmo risco já se tende a difundir aos países que começam agora a receber fluxos migratórios significativos (o caso de Portugal). Os acidentes de trabalho também se apresentam como um fenómeno significativo na área da saúde, na medida em que os imigrantes são aqueles que estão mais expostos a este tipo de problemas. BENNEGADI e BOURDILLON (1990, p. 129) explicam esta tendência pelo facto de ocuparem postos de trabalho menos qualificados, mas também porque muitas vezes o contrato é feito com a omissão de alguns direitos. O facto de se tratar muitas vezes de «empregos temporários», faz com que não haja uma preocupação em criar e definir condições de segurança, uma vez que estas implicam custos ao trabalhador e principalmente ao patrão. Este tipo de precariedade laboral leva a que depois de acontecido o acidente, não sejam colocados em prática os mecanismos inerentes aos direitos do trabalhador, com o argumento de que os deveres não foram cumpridos. Estes autores (Ob. Cit., pp. 132 a 138) referem que o trabalhador nem sempre é readmitido, bem como não lhe é pago o que é devido pelo acidente (reajustamento salarial). A reinserção profissional torna-se mais complicada, na medida em que as dificuldades com a língua e o des70. Expresso, Imigrantes com Sida têm legalização imediata, Secção País, semana n.o 1639, 27 de Março de 2004. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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conhecimento dos direitos estão, na maioria das vezes, patentes nestes indivíduos. Por outro lado, a parca oferta de emprego a deficientes é um forte obstáculo à reinserção, restando quase sempre apenas o regresso ao local de origem. Para colmatar estas questões, os autores defendem que é necessário melhorar os conhecimentos sobre os riscos de saúde no trabalho, não só por parte dos imigrantes (no que diz respeito aos direitos e deveres), como também das entidades empregadoras. O desenvolvimento da medicina do trabalho também é certamente uma forma de fomentar o conhecimento sobre a saúde destes grupos, bem como de diminuir a vulnerabilidade da população activa migrante face a este problema. Seria vantajoso a constituição de uma «rede» a nível europeu, no sentido de generalizar o mais possível a medicina do trabalho a todos os países e a todas as populações, mais concretamente às imigrantes. 4.3. A Educação A educação cada vez mais faz parte do universo do imigrante. Independentemente da migração ser individual/familiar, a verdade é que a qualidade de vida é um aspecto a ter em consideração nas motivações. No caso da migração familiar, é natural que os pais procurem dar aos filhos a possibilidade de ingressar no sistema de ensino do país de chegada, não só por uma questão de integração propriamente dita, mas também para proporcionar a oportunidade de desenvolverem as capacidades intelectuais e profissionais, adaptadas às condições oferecidas pelo mercado de trabalho. ZEROULOU (1985, p. 107) afirma que a partir dos anos 70, começa a crescer o número de filhos de imigrados que frequentam a escola do país de chegada. Perante o fenómeno, constata-se que há necessidade de se proceder a uma diversificação pedagógica, de modo a combater as dificuldades apresentadas por estes alunos. A França foi um dos países pioneiros a ter em conta tal situação, pois em alguns alunos estrangeiros, nomeadamente nos argelinos, verificavam-se atrasos de aprendizagem, obstáculos ao nível linguístico e portanto da própria integração. Após estudos para melhor compreender a situação, concluiu-se que quando estes alunos tinham sucesso escolar, na maior parte dos casos, estes tinham-se afastado dos locais e comunidade imigrante de origem. Por outro lado, a própria escola tinha investido na escolarização e na integração dos alunos através da sua colaboração em diversos projectos. (Ob. Cit., pp. 114 e 115) Mas o afastamento da comunidade de origem não será um preço demasiado elevado a pagar? Estaremos perante um processo de assimilação? Pelo menos a situação mostra-nos que existem dois pólos que podem decidir a validade do processo de educação, nomeadamente o aluno-pais Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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e o docente-comunidade de acolhimento. Da sua interacção/abertura ao Outro, empreende-se toda a dinâmica educativa, que poderá ou não resultar em sucesso. DUCHENE (1988, p.153) refere que o CERI 71 da OCDE 72, lançou em 1982 o projecto «Educação e pluralismo cultural e linguístico», o qual visou a construção de uma base de dados referentes a alunos filhos de imigrantes.73 Concluiu-se que, em meados dos anos 80, estes alunos representavam 8% a 9% do público escolar dos países estudados, frequentando principalmente o ensino secundário. Em termos gerais, entre essa década e a anterior, verificou-se um crescimento de cerca de 42% de filhos de imigrantes a frequentar a escola do país de chegada e é interessante verificar que, enquanto nestes alunos se constatou um aumento da frequência, em muitos casos, nos alunos nacionais, foi notória uma diminuição. Este resultado, segundo o autor, pode ser fruto da taxa de fecundidade associada aos imigrantes, que mesmo sendo baixa, é superior à dos autóctones. (Ob. Cit. p. 160) No entanto parece mais plausível que a justificação esteja relacionada com a reunificação familiar, visto que o grande crescimento se verificou no ensino secundário, ou seja, em alunos com médias de idades entre os 15 e os 18 anos, que não nasceram, portanto, no país de chegada. Contudo, o sistema educativo na Europa parece não dar resposta eficaz aos problemas revelados pela diversidade da população escolar. GOKALP (1989, pp.63 a 65) além disto, defende que a escola deverá criar igualdade de oportunidades, bem como promover a interculturalidade. O estudo da língua de origem na escola poderá ser uma peculiar forma de integração, pois se por um lado cria um elo de ligação do aluno imigrado à comunidade de origem, por outro promove a partilha de conhecimentos com a de chegada (DE HEREDIA-DEPREZ, 1989, p. 85). Para que tal se possa concretizar e generalizar, seria essencial a interacção entre a comunidade autóctone, as suas políticas e a comunidade alóctone. A abertura da Europa nunca se poderá processar plenamente se não forem atribuídos certos direitos aos estrangeiros, nomeadamente ao nível da educação! (CHARBIT, 1988, p. 151). Embora na teoria estas ideias sejam bastante congruentes, na prática por vezes é muito difícil a sua implantação. Nos Estados Unidos, o governo adoptou como estratégia de integração dos alunos estrangeiros o Busing, ou seja, o desenvolvimento de uma rede de transportes escolares, que 71. CERI – Centre pour la Recherche et l’Innovation dans l’Enseignement. 72. OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico. 73. Os países em estudo foram a Alemanha, Bélgica, França, Luxemburgo, Holanda e Suíça. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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levam os alunos desde os locais de residência até à escola, com o objectivo de fomentar a convivência dos autóctones com os filhos dos imigrantes. No entanto, a estratégia parece não resultar, visto a «divisão» e os conflitos se continuarem a manter com frequência. (GLAZER, 1989, p. 84) ESTEVES (1991, p. 59) defende que o capital escolar constitui um recurso básico no processo de integração na sociedade receptora. No que diz respeito à geração dos pais 74, a suas habilitações literárias poderão não corresponder ao emprego que exercem, no entanto influenciam sem dúvida a forma como são vistos e recebidos pela sociedade receptora.75 No caso dos filhos, o facto de frequentarem a escola do país de chegada, ajudará não só na sua própria integração, como também na dos próprios pais (consciencialização das vivências na nova realidade, aprendizagem da língua…). Em Portugal, já existe um número 76 considerável de alunos imigrantes a frequentar a escola. Destacamos os alunos originários da União Europeia e os que têm outra nacionalidade…77

Percentagem de Estudantes

Gráfico 1 – Alunos estrangeiros matriculados em escolas públicas portuguesas, no ano lectivo de 1999/2000

100% 80% 60% 40% 20% 0%

1.o Ciclo

2.o Ciclo

3.o Ciclo

Nível de Ensino

Secundário Outras Nacionalidades UE

Adaptado do Ministério da Educação (2003). 74. Ou seja, aqueles que efectivaram a migração. 75. Relembre-se, pois, o caso do estudo publicado no jornal PÚBLICO, Portugal é o país onde mais pessoas defendem zero imigrantes, Secção de Sociedade, domingo, 7 de Dezembro de 2003, onde se constatou que o nível de instrução era dos factores mais considerados pela população autóctone, relativamente à imagem que tinham do imigrante. 76. Não é possível referir o número exacto, visto que o Ministério da Educação não fornece dados congruentes sobre esta temática. 77. Os dados da UE dizem respeito aos alunos originários dos Estados-Membros da Europa dos 15, sendo que os dados sobre as «outras nacionalidades» referem-se a alunos com nacionalidades que não dos PALOP, Índia, Macau e Paquistão. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Como se pode constatar pela análise do gráfico verifica-se que até ao 3.o ciclo, a maioria dos alunos apresenta nacionalidades que não a dos países da Europa dos 15, ao contrário do ensino secundário, onde estes últimos estão em claro domínio. Visto que a frequência da escolaridade obrigatória se estende até ao 9.o ano (final do 3.o Ciclo), é natural que o peso numérico dos grupos imigratórios dominantes se destaque (neste alunos de países que não os da Europa dos 15). No Secundário, já só permanecem aqueles que têm «possibilidade» e intenção de prosseguir estudos, seja no âmbito da formação profissional, seja para prosseguir no ensino superior, pelo que se observa uma inversão da tendência, ou seja, os alunos de nacionalidades dos países da Europa dos 15 apresentam-se em maioria, o que leva a crer que estes estejam numa situação mais favorável (equilíbrio dos pais ao nível da integração no mercado de trabalho, das finanças, da habitação, da saúde…) para prosseguir estudos. O relatório do Parlamento Europeu sobre a situação do ensino na comunidade imigrante da União Europeia 78, de 1997, dá conta de que a maioria dos imigrantes pretenderá fixar-se nos respectivos países europeus de chegada, daí que, obviamente, seja essencial promover a sua integração. Para isso foram desenvolvidos os programas SÓCRATES e COMENIUS, que consistem no intercâmbio de alunos de diferentes países, com o objectivo de impulsionar a interculturalidade e a troca de experiências entre estudantes de várias nacionalidades, para que contactem com outras realidades, sentindo-se eles próprios «estrangeiros», ou melhor dizendo, no papel do Outro. Os principais problemas observados nas escolas europeias, segundo este relatório, prendem-se com a ausência de regras e estruturas adequadas para estimular a interculturalidade. A verdade é que se verificaram algumas acções e projectos, com resultados positivos, mas com carácter disperso e pontual. Outras dificuldades relacionaram-se com a própria organização escolar (indisponibilidade nos horários, falta de professores especializados…), desinteresse dos pais, ausência de uma base institucional que introduza regras, e dificuldade na introdução de novos conteúdos nos programas escolares. A solução apontada para resolver tais questões é de índole muito geral e refere-se à necessidade de desenvolver na escola e na comunidade a noção de educação cultural, no sentido de permitir a abertura ao Outro, 78. BEKEMANS, Léonce; URBINA, Yera Ortiz de (1997), Document de Travail. Étude sur l`éducation: l`enseignement des immigrés dans l`union européenne, Parlamento Europeu, s/e, Luxemburgo . Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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através da aprendizagem de novas matérias e da realização de projectos comuns ao país de emissão/acolhimento de imigrantes. Nos dias actuais, o ensino deveria ter em conta o contexto de interculturalidade e de mobilidade, tendência cada vez mais imposta pela diversificação da comunidade escolar. 4.4. A Habitação 4.4.1. A nova residência A entrada num novo país pressupõe a procura de residência. Esse espaço que o imigrante irá ocupar é revelador, por excelência, das características inerentes à migração (motivações, expectativas, quotidiano do indivíduo ao nível do trabalho, integração…). Quantos não são os imigrantes que, por precárias condições de emprego e porque enviam fartas remessas para o país de origem, aceitam viver em habitações insalubres, localizadas em autênticos guetos no tecido urbano? São complexas as relações que o imigrante estabelece com o espaço. LAVIGNE (1990, p. 123) revela que numa fase inicial, a sociologia urbana (sobretudo a americana) considerava a mobilidade e a localização como um fenómeno estático e unitário. No entanto, na prática, o que se verificou e verifica, é que se tratam de fenómenos constantes e ascendentes, ou seja, onde domina uma evolução ao longo do tempo/espaço. Porém, é importante ter em conta que esta mobilidade coloca em interacção a componente geográfica (ligada à ocupação do espaço) e a componente social (ligada ao Homem), donde nem sempre resulta uma relação linear e estável, pelo contrário, muitas vezes culminando em situações de segregação e discriminação, de que mais se abordará. Tentando perceber quem são os imigrantes que ocupam este espaço, GASPAR (2002, p. 68) afirma que normalmente se tratam de indivíduos também eles vindos do espaço urbano. Quer isto dizer que, segundo este autor, os imigrantes tendem a vir cada vez mais de áreas urbanas (de países menos desenvolvidos do que o de chegada), para áreas urbanas também, o que irá acelerar o processo de urbanização. É claro que se trata de uma observação de âmbito geral, até porque quando se fala na escolha da residência, seja ela à escala do país, da região ou até da localidade, existem múltiplos factores que determinam a escolha. (Ob. Cit., p. 69) Na malha urbana, os contrastes são visíveis, marcando muitas vezes negativamente o espaço e o indivíduo. WARD (1971, p. 4) pensa que o Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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aumento da taxa de urbanização e da própria concentração populacional, leva a que se acentue o crescimento selectivo e a diferenciação interna na cidade, não só ao nível das funções, mas sobretudo da população. Para que tal fosse evitado, alguns observadores defendem que, na Europa, se deveria proceder a reformas e à definição de medidas políticas que regulamentassem a questão da habitação e dos imigrantes, de modo a «eliminar» alguns problemas sociais daí advindos. (Ob. Cit., p. 106) Mas existirá algum modelo teórico que sustente na prática tal situação? As medidas desenvolvidas teriam de ser empreendidas não só no «sentido vertical» (localização das habitações no tecido urbano), mas também no «sentido transversal» (condições de habitabilidade). Se no segundo caso estamos em presença de um aspecto que é e deve ser comum e generalizado, no primeiro caso parece menos «legítimo» a tentativa de manipulação da própria localização habitacional, até porque tal acto pode gerar efeitos perniciosos. Deve ser privilegiada a concentração ou a dispersão da habitação dos imigrantes na malha urbana? GASPAR (2002, p. 70) refere que cada forma apresenta vantagens/desvantagens. No caso de se verificar a concentração dos imigrantes num determinado local do espaço urbano, tal pode ser proveitoso, na medida em que permitirá aos indivíduos a facilidade de aquisição de bens e serviços específicos a eles destinados, que aí se poderão instalar, bem como facilita a manutenção das práticas culturais e da identidade. No entanto, tal situação pode gerar um isolamento face à comunidade autóctone, bem como a práticas que levem à marginalização e até à formação de guetos. Por outro lado, a dispersão podia afirmar-se como uma resposta a estes problemas, visto que favorece o diálogo com a comunidade de recepção. Contudo, a separação do núcleo de origem interfere na identidade individual, podendo mesmo levar ao extremo da assimilação, com todas as consequências que anteriormente analisámos. As políticas de alojamento são, neste contexto, importantes porque contribuem para a integração do indivíduo, no entanto também podem gerar conflitos e tensões, daí que não possam só e apenas se restringir à «residência» propriamente dita, mas igualmente a outros aspectos como a inserção social e o acesso pleno à cidadania. (Ob. Cit., p. 71) Em Portugal, o cenário apresenta-se mais ligado à situação da concentração, defende LOPES (1999, p.125), relacionado com a procura de proximidade dos locais de trabalho e com a situação de clandestinidade que muitos enfrentam. Assim sendo, um quantitativo elevado de população imigrante encontra-se fixada em áreas periféricas da grande Lisboa, linha de Cascais e de Sintra e na margem sul do Tejo. Desta forma, Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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têm-se desenvolvido autênticas «aldeias africanas». A concentração e a segregação espacial, associadas às desfavoráveis condições de vida (nomeadamente ao nível do emprego), criaram no nosso país, condições não só para a emergência de minorias étnicas bem localizadas espacialmente, tal como para a formação de guetos. 79 A partir do momento em que esse espaço é conotado com determinada dinâmica negativa, muitas vezes advinda da imagem criada pela presença de um grupo (que pode ser ou não uma imagem real), desenvolve-se toda uma estigmatização que inclui não só as pessoas que integram esse mesmo espaço, como também todas aquelas que dele se apropriam. (Ob. Cit., pp. 131 e 132) Devemos ter em consideração que esta situação se refere especialmente ao grupo de imigrantes oriundos dos PALOP, que espacialmente se encontram concentrados em áreas específicas, facto esse que poderá estar relacionado com os próprios padrões de distribuição no local de origem. GASPAR (2002, p. 70) diz ainda que o grupo dos imigrantes Indianos e Chineses se encontram na mesma situação de concentração, embora neste caso tal se justifique pela particularidade da sua cultura e pela língua. Em ambos os casos, parece haver a necessidade da manutenção da própria identidade, a partir das práticas colectivas do grupo, daí que seja promovida a concentração. Porém, no caso do grupo dos PALOP, a língua podia afirmar-se como uma vantagem face à integração habitacional, ao contrário dos Indianos/Chineses, cujos padrões culturais em muito se afastam dos das sociedades da Europa Ocidental, nomeadamente dos portugueses, para não falar da língua. No entanto, os grupos de imigrantes que parecem estar mais regulamente distribuídos no espaço (à escala nacional) são os dos Brasileiros e dos Europeus de Leste. No primeiro caso a língua, as afinidades culturais e os laços familiares, estarão na base da facilidade de integração. Esta situação poderá interferir na liberdade de escolha do indivíduo face ao seu local de residência, gerando consequentemente um padrão disperso de ocupação do espaço, o que não acontece nos anteriores grupos referidos. No caso dos Europeus de Leste, a barreira linguística parece ser superada pelo «comportamento cultural» e pelas características fisionómicas, daí que espacialmente, este grupo se possa comportar como o grupo Brasileiro. (GASPAR, 2002, p. 70) O elevado grau de escolarização que estes imigrantes apresentam, parece ser também um factor importante, na medida em que por um lado são mais respeitados por uma população que normalmente se apresenta em desvantagem nesse aspecto, por 79. O autor chama a atenção para os casos dos eixos Lisboa-Cascais, Lisboa-Sintra e para a área suburbana de Setúbal. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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outro permite-lhes que tenham uma maior abertura e amplitude para compreender o «funcionamento» da comunidade de chegada. Contudo, é o imigrante que muitas vezes promove o gueto, quando renuncia a determinada localização da habitação, em prol de outra que não lhes eleve as despesas (se preferir investir numa boa residência no local de origem). Neste caso, estarão incluídos praticamente todos os imigrantes que pretendem permanecer temporariamente no local de chegada. Mas, independentemente das intenções de permanência, é extremamente importante a consolidação do indivíduo no espaço, já que este é definidor da própria imagem que inerentemente se associará ao indivíduo. As políticas de alojamento poderão gerar as soluções mais convenientes para este processo, mas a verdade é que mais são as vezes que originam choques com a população autóctone. (LOPES, 1999, p. 125; GASPAR, 2002, p. 72) Esta situação poderá advir do facto destas políticas actuarem tarde demais, ou seja, normalmente é só a partir do estabelecimento dos grupos e da sua interacção com o meio que os problemas são detectados e tentados solucionar. Claro que se compreende que tentar resolver muito antes, seria mais difícil, porém na impossibilidade de prever este tipo de problemática, seria importante pelo menos o desenvolvimento de uma estratégia de acção a curto prazo, no sentido de envidar esforços e dispositivos de actuação imediatos. O facto de Portugal ser também um país de imigração, certamente contribuirá para que ainda não haja uma visão mais abrangente desta questão. Por exemplo, na Suécia, o processo de imigração e de regularização, inclui a própria integração espacial, materializada na aquisição residencial. No nosso país tal parece estar ainda um pouco longe ser real, no entanto se a tendência de entrada de população estrangeira se mantiver, será necessário e urgente a reflexão sobre a questão da habitação e da sua localização no espaço. 4.4.2. As áreas residenciais e a segregação A localização da residência pode ser considerada como uma das marcas do grau de integração do imigrante na sociedade. Por exemplo, a ilegalidade/clandestinidade da migração certamente será traduzida pela escolha da residência. Este grupo, muitas vezes explorado, acaba por ocupar lugares desfavoráveis, nomeadamente espaços de guetos. Na região de Lisboa, este fenómeno é bem visível, já que cada vez mais se acentuam as iniquidades entre grupos sociais, ligados a problemas de exclusão social (droga, desemprego, envelhecimento…). Como consequência, os padrões económicos e residenciais, nesta área, tendem a ser cada vez mais Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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fragmentados e caracterizados por rígidas divisões espaciais. (FONSECA, MALHEIROS, ESTEVES e CALDEIRA, 2002, pp. 34 e 40) Essa escolha nem sempre é forçada por motivos económicos, como à primeira vista se pode pensar. O imigrante poder preferir processar a sua integração através de membros do mesmo grupo que já estejam a viver no país de acolhimento há mais tempo e para isso será importante que se mantenha perto da sua própria comunidade, inclusive em termos espaciais. No entanto esse é um caminho quiçá traiçoeiro para a integração, uma vez que o indivíduo pode acabar por se acomodar às circunstâncias, ou seja, à comunidade do país de origem que está à sua volta, esquecendo a necessidade e pertinência de tentar estabelecer contactos com a comunidade autóctone. É por isso comum que estes indivíduos/grupos se fechem sobre si mesmos já que, internamente, conseguem suprir as suas necessidades. Problemático é quando há a tentativa de rompimento e de saída desse limite e se verifica que, se este se tornou numa barreira quase que intransponível, fruto da resposta da comunidade de acolhimento a essa atitude de isolamento. MALHEIROS (1996, p. 191) invoca Mcevoy, afirmando que existem áreas espaciais predominantemente étnicas, tornando-se evidentes os processos de segregação espacial destas mesmas comunidades, já que verifica um «limite» marcado entre estas e a comunidade autóctone. Diz o autor que, se em termos directos estes processos de segregação resultam das opções residenciais dos membros da comunidade imigrante, em termos indirectos eles são condicionados por factores exógenos, como a capacidade diferencial de acesso ao solo, ou até pelo domínio exercido pelos naturais sobre o mercado residencial. Contudo, um estudo realizado, por este autor, na comunidade Indiana em Lisboa, veio mostrar que os membros mais abastados do grupo desvalorizavam a aquisição da residência em áreas predominantemente étnicas, onde a maioria dos indivíduos tinha um estatuto social mais desfavorável. Em contrapartida, privilegiavam a qualidade habitacional, deslocando-se para zonas residenciais dominadas pela comunidade autóctone. Neste caso, já outros factores se sobrepõem ao meramente cultural, ou seja, o caso do factor económico. AMERSFOORT (1987, p. 113), ao referir o caso holandês, afirma que o valor da cultura como motivação para a escolha de residência é passada para segundo plano, sendo ultrapassada por factores como a educação dos filhos, ou até a própria religião. Claro que o caso holandês se reveste de imensas particularidades, no entanto há que ter em conta que o grau de segregação sócio-espacial Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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também está condicionado por questões económicas, nomeadamente as ofertas do mercado de trabalho e o preço/pagamento das próprias habitações. A escolha do local de residência tem vindo a alterar-se progressivamente. Nas décadas de 60/70, em grandes cidades da Europa do Norte (como Bruxelas, Birmingham, Londres, Frankfurt, Roterdão…), determinados grupos procuravam habitações nas áreas «abandonadas» do interior das cidades, fruto da saída das populações do centro histórico para a periferia. Quando mais tarde, na década de 80, o fenómeno imigratório se generaliza aos países da Europa do Sul, as principais cidades (como Lisboa, Madrid, Roma, Milão…), onde o «abandono» do centro histórico não foi tão intenso, faz com que os imigrantes se fixem no anel suburbano e periférico das cidades. De qualquer forma, em ambos os casos, constatamos que este grupo ocupa praticamente sempre as áreas mais desfavorecidas da cidade, o que em si fomenta a segregação. (ARBACI, 2002, p. 84) A presença de população estrangeira numa cidade, segundo TABOADA-LEONETTI (1989, p. 54), marca a sua vivência, incluindo o tecido urbano e o próprio espaço colectivo. É claro que essa mesma dinâmica depende em muito das «divisões» ou não que são estabelecidas entre os próprios grupos residenciais. A escola de Chicago defendia, segundo o autor, a existência de bairros étnicos ou até mesmo de quarteirões étnicos como favorecedores da solidariedade entre os membros da comunidade, e da própria preservação da cultura e da identidade. No entanto, tal relação não pode ser estabelecida tão directamente, uma vez que para além de factores já referenciados, as características sócio-económicas da população (imigrantes e autóctones), a natureza e história do tecido urbano e a própria origem dos residentes, interagem de forma a definir as relações de coabitação local. (Ob. Cit., pp. 56, 57 e 67) A questão da segregação espacial torna-se uma questão bastante complexa, dependendo de uma imensurável série de factores, sendo os de ordem económica e cultural os que parecem ser mais decisivos. A sua conjugação, relacionada com o contexto espacial e com a comunidade de acolhimento, define o nível de segregação. No entanto, quanto à comunidade imigrante, não deve ser vitimizada como à primeira vista somos tentados a considerar, refere POIRET (1996, p. 346). Este autor defende que a segregação social e espacial dos imigrantes ocorre tanto a montante como a jusante do processo de integração. Quer isto dizer que, no primeiro caso, tal acontece quando os próprios imigrantes se fecham na sua própria comunidade e no segundo caso quando a comunidade do local de chegada não os acolhe. Portanto, significa que uma análise completa Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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desta questão, além de tudo o que já foi referenciado e analisado, incluirá obrigatoriamente a tomada de consideração sobre o grupo imigrante em toda a sua dimensão cultural e socio-económica, não só no local de chegada, mas também no local de origem. É muitas vezes a partir daí que obtemos pistas que nos ajudam a compreender a dinâmica da organização espacial, visto que se baseiam num mero sistema de «cópia» da organização do quotidiano do país de origem, tal como já verificámos que acontecia no grupo dos PALOP. A importação desses «modelos», desadequados da comunidade de acolhimento, certamente fomentarão o choque e o afastamento, e o consequente desenvolvimento de barreiras intergrupais, levando a uma conjuntura de segregação. 5. UM GRUPO… VÁRIOS GRUPOS (?!) 5.1. Os Ilegais/Clandestinos Movidos muitas vezes por uma matriz comum, os imigrantes integram etimologicamente um todo que se compõe através da integração das diferentes partes. É essa dita «heterogeneidade» dos indivíduos que leva a que percepcionemos a existência de alguns grupos específicos, os quais valerão a pena serem considerados com algum pormenor. Afinal são eles que muitas vezes imprimem a peculiaridade à dinâmica migratória, estereotipando de uma forma mais ou menos «justa» o próprio fluxo e os indivíduos que a constituem. É pois o caso do grupo 80 dos imigrantes ilegais/clandestinos: não se sabe ao certo quantos são, nem às vezes onde se encontram ao certo, apenas se presume que representem um quantitativo bastante elevado no total de indivíduos imigrados. É comum encontrarmos na diversa bibliografia dedicada ao tema, a indissociação entre os dois conceitos. Na verdade, o Direito distingue o Ilegal como sendo o imigrante que se encontra em situação irregular, no entanto cuja existência é conhecida, ao contrário do Clandestino, que apesar de se encontrar numa situação igualmente irregular, não tem uma existência conhecida. Já no sentido penal, um imigrante ilegal, se eventualmente for condenado por estar no país em situação irregular, é-lhe aplicada uma pena de extradição, ao contrário do 80. Refira-se que neste contexto a palavra «grupo» não deve ser entendida como um conjunto de indivíduos que se encontram devidamente confinados a um espaço ou até modo de vida. É pois um conceito dinâmico, cujas fronteiras se esbatem em prol de toda a conjuntura envolvente. Neste caso é utilizada no sentido de tentar integrar numa mesma análise, indivíduos que partilham das mesmas características fenomenológicas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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clandestino que poderá ter de cumprir pena de prisão no país de origem. O conhecimento da existência dos ilegais, deriva do facto destes entrarem no país de chegada com um visto temporário (por exemplo, de turismo) e prolongarem a sua permanência por tempo indevido, ao contrário do clandestino, que normalmente não apresenta qualquer documento. BOUTANG, GARSON e SILBERMAN (1996, pp. 34 e 35) conseguem reconhecer um padrão repetitivo nas características do perfil de um imigrante em situação irregular. Normalmente tratam-se de indivíduos bastante jovens, relativamente a outros que compõem certo tipo de fluxos migratórios (como por exemplo os que compõe o brain-drain, os refugiados, os migrantes económicos…) e que se apresentam celibatários (sem encargos familiares). Ao longo dos tempos têm apresentado níveis de escolarização cada vez mais elevados, fruto da alteração das origens destes imigrantes, pois se inicialmente a Europa era invadida por fluxos de sul (África) e da América Latina, hoje e tal como acontece também em Portugal, domina a vaga migratória da Europa de Leste, constituída por indivíduos altamente qualificados. Não é um grupo tendencialmente masculinizado, muito pelo contrário, o número de mulheres é significativo, ocupando ambos os sexos lugares em praticamente todos os ramos dos diversos sectores económicos de actividade (especialmente no que concerne à economia informal/subterrânea). Não se trata de uma migração solitária, uma vez que é quase sempre realizada em pequenos grupos, coadjuvada por familiares e amigos que se encontram no país de origem/país de chegada. As motivações deste grupo são sempre equacionadas conjuntamente com todos os riscos que este tipo de migração implica (de expulsão, de nem sequer se conseguirem chegar ao destino…), contudo sendo normalmente a imagem territorial construída com base em grandes expectativas.(Ob. Cit., p. 55) Estes autores apresentam ainda algumas teses que permitem interpretar e explicar esta migração. A tese da inércia dos factores de atracção e da oferta da mão-de-obra internacional explica o fenómeno, nos casos em que a população nacional não é capaz de dar resposta às necessidades do mercado, havendo necessidade de recorrer a mão-de-obra estrangeira. Normalmente esta acaba por ser captada em países económica e militarmente instáveis, o que quer dizer que será um «duplo aproveitamento», pois se por um lado o país de chegada consegue suprir as suas necessidades de mão-de-obra (muito provavelmente a um custo mais baixo, do que se tivesse de pagar a nacionais), por outro essa mesma mão-de-obra vê aí uma oportunidade de sair da situação desfavorável onde estava inserida. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Na Europa Ocidental foi durante muito tempo defendida a tese do «fim de processo», que achava que os imigrantes ilegais/clandestinos faziam parte dos ditos «fluxos» residuais, resultantes dos fluxos imigratórios europeus dos anos 60. No entanto, quem defende esta teoria tem vindo a reconhecer que se trata de um número considerável de indivíduos, admitindo a inoperância do sentido «residual», tratando-se na maioria dos casos, de situações de reunificação familiar. No entanto há quem defenda que não se devem ter só e apenas em conta os indivíduos que participam directa ou indirectamente no processo migratório, mas também a influência das políticas migratórias dos países de origem/chegada dos imigrantes, e dos próprios mecanismos de regulação migratória. Esta tese da assimetria encontra-se intimamente relacionada com a tese do modo de regulação, onde se explica o fenómeno da imigração ilegal/clandestina através da relação entre a «oferta», a «procura» e as políticas migratórias. (Ob. Cit., pp. 61 à 66) A intensidade destes tipos de fluxos varia no tempo e no espaço. DINAND (1985, pp. 137 e 138), ao estudar o caso dos Estados Unidos, dá-nos uma panorâmica interessante sobre como se processa a evolução deste fenómeno migratório. No caso americano, verificou-se que num primeiro período de imigração 81 não houve praticamente nenhumas restrições à entrada de imigrantes no país. Porém, o período compreendido entre 1875 e 1965 já foi marcado pela elaboração de regulamentação rigorosa e complexa, no sentido de controlar a entrada destes indivíduos. É pois a partir daí que despoleta o número de imigrantes ilegais/clandestinos, tanto que para evitar constrangimentos e algumas situações mais delicadas no sentido diplomático, tenham sido levantadas restrições, subtilmente passadas para o controlo da esfera da própria comunidade de recepção. O que parece que aqui se passou é que a responsabilidade de regulação é transferida do Estado, para a própria comunidade americana, mais especificamente na figura dos empregadores. Este dispositivo de controlo de entradas, baseado na auto-regulação inclui não só sanções para o imigrante em situação irregular, como também ao empregador e a outros adjuvantes que coadunem com o processo e assim fomentam a situação de ilegalidade/clandestinidade. No caso Europeu, ou até no português, será que um dia se verificará a mesma evolução? Na maior parte das situações, os mecanismos de regulação parecem apostar mais no controlo e fiscalização das entradas,

81. O autor aponta para o período temporal que vai até 1875. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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assumindo aqui o Estado o papel primordial na superintendência. Significa pois que, relativamente à Europa, e de uma maneira geral, parece pois que nos encontramos ainda na fase marcada pela elaboração de regulamentação para impedir a entrada destes fluxos. O continente americano foi dos primeiros espaços a ser alvo de fortes correntes imigratórias. Pelo contrário, o continente europeu foi inicialmente emissor de imigrantes e só mais tarde é que se começa a constituir como receptor, daí que só agora possa estar a passar por situações que já se processaram, por exemplo no caso dos Estados Unidos, com uma forte tradição imigratória. A União Europeia está alertada para este fenómeno, tanto que a Comissão das Comunidades Europeias, reunidas em Bruxelas durante 2001, reconhece que o Tratado de Amesterdão já estabeleceu para o efeito, uma competência comunitária nos domínios da migração e do asilo. Também o Conselho Europeu de Tampere 82 solicitou a elaboração de uma política comum da União que incluísse uma parceria com os países de origem dos imigrantes, um sistema comum europeu de asilo, um tratamento equitativo dos nacionais de países terceiros e um controlo e gestão mais eficaz dos fluxos migratórios. No caso da imigração legal, propõem o estudo dos casos de reagrupamento familiar, bem como das propostas de admissão dos nacionais de países terceiros que pretendem entrar/permanecer em Portugal para efeitos de estudos, formação profissional ou prática de actividades económicas. Também está contemplada nesta esfera a criação de um quadro jurídico, destinado a garantir a equatitatividade no tratamento de nacionais de países terceiros (combate ao racismo e à xenofobia). No que concerne à questão da imigração ilegal/clandestina, o Conselho apontou caminhos, no sentido de promover o reconhecimento mútuo das decisões de expulsão de nacionais de países terceiros, da harmonização das sanções pecuniárias impostas aos transportadores que encaminhem estes imigrantes sem documentação necessária, para território dos Estados-Membros, bem como da coordenação da política de regresso entre o país de chegada/partida.83 Uma outra medida que se pretende tomar, reside no reforço do quadro penal para repressão do auxílio à entrada e permanência de imigrantes em situação irregular. Perante este pressuposto, poderíamos ser levados a pensar que a União Europeia estaria a enveredar pelos caminhos Norte82. Reunido nessa cidade em Outubro de 1999. 83. COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (2001), Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativa a um mecanismo de coordenação aberto da política comunitária em matéria de imigração, Comissão das Comunidades Europeias, s/e, Bruxelas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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-Americanos, tratando de transferir a responsabilidade de regulação da imigração ilegal para a própria sociedade civil, neste caso específico através do reforço das medidas repressivas aos coadjuvantes do processo. No entanto, em 2002, a Comunidade Europeia redigiu um documento sobre esta matéria, onde deixa mais clara as orientações da política europeia sobre este assunto. Pretende-se, a fim de «corrigir» as tendências migratórias actuais caracterizadas pelo recurso a canais de entrada irregulares, agir no sentido oposto, ou seja, no de procurar abrir canais regulares de imigração, bem como continuar e reforçar a luta contra a imigração clandestina. Reconhece-se que este tipo de imigração está ligado frequentemente à criminalidade (nomeadamente ao crime organizado e à prostituição), o que implica por si só discriminação, segregação e por isso sérias dificuldades no processo de integração social 84. A luta contra esta situação não passa apenas pelo sentido punitivo, mas também por evitar situações de exploração, daí que se pretenda apostar na formação de funcionários especializados 85 e na atribuição de renovadas funções à EUROPOL, com o objectivo de combater as redes de tráfico humano e de emprego ilegal. (Ob. Cit., p. 34) No caso concreto de Portugal, SILVA (2002, p. 69) refere que o país parece apresentar soluções, na medida em que há uma tendência para que se realize a integração pelo trabalho, através da gestão dos fluxos de imigração económica baseados na análise das necessidades de mão-de-obra por ano/sector de actividade/empresas. Afinal, e tal como afirmam BOUTANG, GARSON e SILBERMAN (1996, pp.72 e 82), o emprego e regularização desta mão-de-obra pode ser altamente vantajoso, na medida em que muitas vezes esta apresenta uma «disponibilidade temporal», sem custos adicionais e encargos de maior a longo prazo (segurança social, por exemplo), que pode ser por isso dispensada a qualquer hora. Mas se hou84. COMMUNAUTÉS EUROPÉENNES (2002), Immigration, asile et intégration sociale, Office des Publications officielles des Communautés européennes, s/e, Luxembourg. 85. O director do SEF defende que, em Portugal, se deve proceder à clarificação das competências deste serviço, bem como ainda a criação duma Central de Informação que organize os dados referentes aos imigrantes. Este serviço poderia também contribuir para um melhor conhecimento estatístico da realidade. Esta definição de funções poderia ocorrer também em conjunto com as instituições judiciárias, de forma a evitar casos, como o de «Pierre Falcone» (Maio de 2004) que sendo alvo de um mandado de captura internacional, foi detido pelo SEF no aeroporto da Portela, mas acabou por ser libertado, sem ter sido conduzido ao tribunal da relação de Lisboa. http://noticias.clix.pt/Sociedade/70309.html (10/7/2004) http://www.jornaldigital.com/noticias.php/3/21/0/21382/ (8/5/2004) Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ver regularização por esta via, corre-se o risco do tempo de permanência se prolongar indefinidamente, o que destitui o carácter flexível desta mão-de-obra. Perante o debate até agora efectuado, podem-se colocar duas questões: os fluxos irregulares são necessários? Poderá gerar-se uma concorrência entre imigrantes legais e ilegais/clandestinos, ao nível do mercado de trabalho? Não será fácil dar uma resposta definitiva. Porém não se poderá deixar de lançar a reflexão. Pode, em certas circunstâncias, verificar-se a necessidade de mão-de-obra barata para que o lucro seja o máximo possível. Mas a que preço? Um imigrante legal, em princípio acarretará mais custos (ao nível da segurança social, saúde…) mas supostamente menos problemas (ao nível social, exploração no trabalho…). O imigrante ilegal/clandestino, à primeira vista implicará menos custos ao Estado e ao empregador, visto que para todos os efeitos não se encontra «declarado» e por isso não beneficia dos direitos inerentes a um imigrante regularizado. No entanto incrementa os problemas ligados ao campo social (criminalidade…) e económico (exploração no trabalho…), visto que se tratam de indivíduos sem protecção a quase todos os níveis, e portanto vulneráveis às teias de angariação/exploração, como todas as consequências negativas que daí possam advir. SILVA (2002, p. 68) acrescenta ainda que o trabalhador imigrante em situação irregular é um factor de instabilidade no mercado, pelo que reproduz uma situação de dumping social (pela própria e associada precariedade do trabalho, da habitação…). Esta situação também é impulsionada pelas constantes violações das garantias mínimas do direito do trabalho. Outro facto curioso é que muitas vezes estes mesmos indivíduos se tornam eles próprios angariadores de mão-de-obra ilegal/clandestina, fruto da sua experiência como agentes do acto, mas também pelos contactos e conhecimento que adquirem na sua movimentação no espaço da economia informal/subterrânea. Trata-se pois de um grupo com características e dinâmica muito específica e que parece estar cada vez mais sob observação das entidades nacionais e europeias. A evolução dos fluxos de imigração ilegal/clandestina certamente dependerá das necessidades/exigências dos mercados dos países de chegada, bem como das políticas empreendidas no sentido de controlar estes fluxos. Resta saber se prevalecerá a vontade individual de cada Estado-Membro em matéria de legislação, ou se por outro lado, haverá uma delegação supranacional de poderes que outorgue à União um carácter orientador geral em matéria de política de imigração para o caso dos fluxos ilegais/clandestinos. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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5.2. A «Segunda Geração» Um outro grupo que merece particular atenção trata-se da segunda geração de imigrantes, ou seja, dos filhos daqueles que um dia escolheram um país estrangeiro para residir/trabalhar. Esta designação poderá suscitar alguma crítica, passível de ser discutida até porque em certos casos, esta «segunda geração de imigrantes» já nasce no território que não o dos pais. Pelo princípio do jus soli, eles seriam considerados cidadãos nacionais daquele país. Desta forma, como poderão ser considerados como a «segunda geração de imigrantes», se pela lei eles já o não são? No entanto, e visto que hoje prevalece o principio jus sanguini, essa questão já não se coloca na medida em que os filhos de imigrantes são registados automaticamente com a nacionalidade dos pais. COSTA-LASCOUX (1985, pp. 21 a 25) afirma que as dificuldades desta geração vão mais além, nomeadamente no que concerne ao seu reconhecimento social e estatutário, o que depende essencialmente das políticas empreendidas com os pais. Por outro lado, os handicaps sócio-culturais e linguísticos que muitas vezes os legisladores do país de chegada não têm em conta, leva a que considerem estes jovens também eles como «imigrantes», mesmo que nasçam e posteriormente adquiram a nacionalidade do país de chegada. No entanto, coloca-se a urgente necessidade de serem abrangidos por uma política específica, visto que esta é praticamente inexistente na Europa: é que na verdade, estes jovens chegam a viver (e reviver, de certa forma) as dificuldades dos seus pais. E mesmo que adquiram a nacionalidade do país de residência, este autor defende que continuam a viver um estatuto intermediário, o que de certa forma exacerba os conflitos de identidade que quase sempre prevalece nesta geração. O antagonismo entre cultura, religião, modos de vida… de dois lugares/realidades diferentes, tanto tem de enriquecedor como de confuso. Se por um lado se busca a identificação com o país de origem, do qual se tem a sensação de não pertencer totalmente, por outro tenta-se a descoberta no país de origem dos pais, que muitas vezes nada mais diz além de uma sensação vago conhecimento. Alguns autores debruçam-se em estudos específicos sobre este grupo. É o caso de CHARBIT e BERTRAND (1985, p. 85) os quais realizaram uma investigação sobre a segunda geração de imigrantes, nascida sobre o território de chegada, concluindo que em termos de saúde este grupo tende a ter mais problemas do que os autóctones, devido ao duplo handicap, ou seja, o económico e o social. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Atendendo ao caso francês 86, e agora na perspectiva da educação, há uma tendência ambivalente. Isto quer dizer que os resultados neste campo são diferentes, conforme os grupos migratórios de que estejamos a falar. No caso da segunda geração de Portugueses em França, no que concerne aos resultados no ensino, verifica-se um aproveitamento muito positivo, fruto de uma densa rede de apoio extra-escolar promovida pela comunidade lusa, bem como pelo apoio dos pais no processo de ensino-aprendizagem. Os marroquinos que convivem igualmente neste espaço, apresentam muito mais dificuldades, não só pela questão da língua, costumes… mas também porque muitas vezes os pais são analfabetos, o que dificulta o próprio acompanhamento escolar. (Ob. Cit., p. 89) Este autor argumenta ainda que a língua não é o entrave principal à integração em si, mas antes os problemas socio-psicológicos de que essa geração apresenta, revelados por atitudes de insegurança, ansiedade, problemas de identidade e sentimento de culpa pela forma intensiva com que normalmente os pais trabalham. Esses serão pois os entraves que condicionarão verdadeiramente muitos aspectos da forma de vida deste grupo. (Ob. Cit., p. 92) CATANI e PALIDDA (1989, pp. 89, 95 e 96), num estudo feito a filhos de pais italianos, espanhóis e portugueses, a residir em França, concluíram que a muitos deles foi dada a oportunidade de obterem a nacionalidade francesa, que recusaram. Pode-se dizer que muitas das respostas dadas pelos indivíduos, acerca das motivações dessa sua decisão, coincidiram com a dinâmica sócio-psicológica ambivalente já referida, manifestada na realidade francófona e que de certa forma instabilizava o firme desenrolar do quotidiano. A dificuldade de integração e a forte presença da imagem da cultura original (língua, práticas culturais…) também são aspectos que condicionaram a recusa da nacionalidade francesa, bem como a intenção de voltar ao país de origem dos pais, que muitos manifestavam. A «fuga» ao serviço militar, também se constitui como uma motivação para a recusa. De quem estamos a falar então? De nacionais desenraizados? De imigrantes? De estrangeiros? Podemos considerar este grupo, do ponto de vista sociológico, como população estrangeira/imigrada. No entanto, o campo jurídico reflecte a necessidade de distinção. Consideraremos a segunda geração como população imigrada, quando o indivíduo nasce no país de acolhimento dos pais e ganha a nacionalidade desse mesmo país.

86. Foi o caso específico estudado por estes autores. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Caso contrário, ou seja, se nascer no país de origem dos pais ou até no de acolhimento, mas se tiver a nacionalidade do país de origem dos progenitores, inclui-se também na categoria de população estrangeira. (COSTA-LASCOUX, 1985, p. 26) Será ainda, quanto a esta questão, importante referir o facto de que muitos consideram este grupo como o Outro, ou seja, mesmo que considerem que partilham da mesma realidade que os autóctones, são considerados como a «nova população», pelo menos. São apresentados sempre como uma geração intermédia, um grupo híbrido que não se identifica nem se completa com nenhum dos territórios a que pertence: o de partida e o de chegada dos pais. BOLZMAN, FIBBI e GARCIA (1987, pp. 55 e 67) procuram averiguar qual a natureza da segunda geração, quer dizer, se estes se tratam de uma mera categoria social (grupo de indivíduos que partilha de um mesmo conjunto de características comuns, porém passivos e inactivos face ao meio que os rodeia), de um grupo social (grupo que já têm noção dos seus atributos e potencialidades), ou se vão mais além, constituindo-se como um actor social (não só conhecem, como também usam os seus atributos e potencialidades, tendo um forte papel interventivo). No caso da França e da Suíça, a segunda geração é entendida como uma categoria, nem tanto pela inactividade a que se propõem, mas mais por parte das próprias instituições, que não permitem a participação dos «não-nacionais» (o que inclui a maior parte dos elementos deste grupo) 87. Trata-se pois de um conjunto com características muito específicas, cuja dinâmica nos coloca perante problemas complexos e aos quais urge dar solução. NETO (1985, pp. 157 à 159) afirma que a segunda geração não só nos coloca perante a importância do fenómeno das migrações, como também de todas as «perdas» que isso implica. Os indivíduos pertencentes a este grupo específico são portadores da chamada dialéctica do desenraizamento, o que significa que tanto beneficiam do seu poder criador (capacidade de construção da identidade), como do seu poder nefasto (destruturação da identidade). Tanto podem agir com revolta como com submissão e também autonomia: neste caso, a integração estará concentrada na interacção/criação a partir da gama de comportamentos oferecidos por ambas as culturas, postas em contacto pela migração. A cada um dos países, a cada uma das suas estruturas e instituições, cabe a responsabilidade de integração deste grupo, sendo desejável a atribuição de meios que permitam a cada um definir-se perante si mesmo e perante os outros.

87. Claro que tal também dependerá da imagem e do peso de cada nacionalidade. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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II – A EUROPA E PORTUGAL NO CONTEXTO MIGRATÓRIO

Sumário: Nesta parte da Tese realiza-se uma breve análise sobre como se tem processado a evolução dos fluxos imigratórios na Europa e mais especificamente em Portugal. No caso nacional, tenta-se traçar o perfil dos imigrantes que actualmente residem no território. 1. A EVOLUÇÃO DO CENÁRIO IMIGRATÓRIO NA EUROPA 88 1.1. Situação geral da imigração Se um dia já o tiveram, actualmente parece que os Europeus não detêm o monopólio da emigração, embora tal já tivesse acontecido, pelo menos durante a «idade do vapor» 89. Os fluxos migratórios dizem agora respeito a todos os Estados, revelando os desequilíbrios do mundo nas suas desigualdades, clivagens e áreas de influência. No início do século XXI, o quantitativo de população migrante em todo o mundo andaria à volta dos 130 milhões de pessoas, sendo que 115 milhões de migrantes estariam legalizados e 15 milhões ilegalizados (BONIFACE, 2000, p. 48). Certamente que os valores apresentados, no que concerne à questão das migrações ilegais/clandestinas, ficarão muito aquém dos valores reais. Há que ter em conta o facto de se tratarem de «números» que escapam aos controlos, serviços e instituições que lidam com esta questão, daí que não seja de estranhar que os números deverão superar os 15 milhões estimados. No início do século XXI pressupunha-se que vivessem cerca de 18 a 19 milhões de imigrantes nos países da União Europeia (isto sem ter em conta todos aqueles que se encontram ilegais/clandestinos) para uma população de 375 milhões de habitantes «autóctones» 90. NUGENT (1996, p.70) afirma que de emissora a Europa passou progressivamente a receptora de fluxos originários de África, América Central/Sul e da Ásia, enfim, de praticamente todo o mundo, como se pode observar no mapa seguinte. Diga-se ainda que daqueles que emitiu, o continente europeu voltou 88. É de referir que este estudo foi feito com base em dados da Europa dos 15 Estados-Membros. 89. NUGET (1996, p.70) situa esta época sensivelmente entre 1870 e 1914. 90. In MARTIN, Susan; LARKIN, Mary Ann (ed.) (2000), World Migration Report, International Organization for Migration/United Nations, s/e, s/l. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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a receber 40% dos seus imigrantes… mas que imigrantes? Terão as migrações para a Europa, um carácter definitivo? Independentemente de o serem, a verdade é que estes fluxos condicionam, a vários níveis, a dinâmica inerente à Europa. Figura 10 – Migrações económicas na década de 90

Fonte: GRESH et al. (2003).

Do ponto de vista demográfico, este autor (Ob. Cit., pp. 82 e 83) verificou que os valores da taxa de natalidade e da taxa de mortalidade apresentados pela população imigrante, faziam crer que este grupo já tinha realizado a sua própria Transição Demográfica, no entanto o paradigma da «transição» propriamente dito, não se verificou de forma exactamente igual ao estipulado na teoria. O factor «mobilidade» assegura-se aqui como a peça que muda a engrenagem do mecanismo. Deve-se ter em conta que há necessidade de analisar esta questão à luz da «Transição Vital» e da «Transição da Mobilidade» 91. As migrações europeias são caracterizadas pela existência de fluxos internacionais (até mesmo à escala do «campo-cidade»), o que faria prever que na Europa, segundo a Teoria da Transição da Mobilidade, 91. Ver na 1.a parte da Tese a «Teoria da Transição da Mobilidade». Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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se vivesse hoje numa «Sociedade de Transição Inicial/Final», conforme os casos específicos 92. Porém, não será de todo correcto fazer uma leitura linear do comportamento das variáveis demográficas correspondentes a estas fases: embora os valores de fecundidade da população imigrante se apresentem um pouco superiores à média europeia (trata-se de uma população bastante jovem), a mortalidade não diminui tal como o modelo estipula, sendo até um pouco elevada (relacionada, muitas vezes, com acidentes de trabalho). E se muitas vezes estes fluxos são vistos como um problema, é aqui que a imigração europeia passa a ser vista como uma solução! É certo que as migrações são, normalmente, um elemento que altera os demossistemas (perturbam o equilíbrio biológico natural da natalidade e da mortalidade), contudo sendo a Europa um colectivo envelhecido, poderá conhecer uma nova vitalidade, um novo rejuvenescimento populacional a partir dos movimentos migratórios. (BENDITO, 1993, pp. 105 e 106) No entanto a ideia deste autor suscita algumas reservas: não se tratará tanto de um rejuvenescimento de base, ou seja, intrinsecamente da própria estrutura demográfica, mas poderá antes ser da própria população activa em si, visto que na base da imigração europeia estão, entre outras, as motivações económicas (ligadas ao emprego, salários…), o que implica falarmos de um contingente de imigrantes com idades «limitadas» essencialmente à faixa etária definida para a população activa. Por outro lado, nem sempre se verifica a migração familiar, ou seja, muitos dos indivíduos imigram sem a família, o que por si só não alterará a taxa de natalidade/fecundidade do local de chegada. E quando se verifica a migração familiar ou uma posterior reunificação, acontece que muitas das vezes se repetem os padrões demográficos vigentes no território de chegada europeu, ou seja, uma baixa taxa de natalidade e uma média de um a dois filhos por casal! 93 Desta forma, VERHAEREN (1998, pp. 229 e 230) traduz um pouco a ideia de que já que a população activa europeia tenderá a diminuir devido ao envelhecimento populacional, as necessidades de mão-de-obra poderão ser supridas pelas migrações económicas. Pela sua dinâmica, poderão até ser dinamizados certos sectores que já se encontravam em declínio (como por exemplo, a agricultura), daí que possa haver a tendência para que a permanência do imigrante se alargue.

92. Corresponde à 2.ª/3.ª fase da teoria, respectivamente. 93. Estes padrões são comuns no caso dos emigrantes da Europa de Leste. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Normalmente, segundo DE SANS (1993, p. 98), estes indivíduos planeiam quase sempre a sua possibilidade de retorno, no entanto na maioria das vezes não o realizam, porque não cessaram as condições/motivações da imigração (portanto o projecto de retorno não suplanta os motivos da permanência). Este facto é bem visível, se tivermos em conta a crescente procura da aquisição da nacionalidade do país de chegada na Europa, como se pode constar no seguinte gráfico 94, à excepção dos casos da França, da Holanda e da Bélgica 95, onde apesar no final da década de 90 do século XX se ter observado uma estabilização da aquisição da nacionalidade, nos anos antecedentes verificou-se uma queda, talvez não tanto relacionada com a diminuição do número de pedidos, mas antes com as «recusas» de atribuição da nacionalidade. Gráfico 2 – Evolução do número de estrangeiros que adquiriram a nacionalidade do país de residência, entre 1980 e 1998 Bélgica

120 000

Dinamarca Alemanha

Número de estrangeiros

100 000

Espanha França Irlanda

80 000

Itália Luxemburgo

60 000

Holanda Áustria 40 000

Portugal Finlândia Suécia

20 000

Reino Unido Noruega

0 1980

1985

1990

1995

1996

1997

1998

Suíça

Anos

Adaptado da EUROSTAT (2000).

No entanto WHITE e KESTELLOOT (1990, p. 187) parecem não apresentar a mesma opinião dos autores acima citados, na medida em que acham 94. É de ter em conta que o eixo das abcissas não é contínuo, ou seja, primeiramente o intervalo temporal é de 5 anos e após 1995 o intervalo passa a ser anual. Esta «forma» de apresentação prende-se, não só com a disponibilidade de dados, mas também porque se considerou ser esta a forma de análise mais pragmática. 95. Refira-se que no caso deste país, a curva evolutiva se apresenta interrompida, uma vez que não foram disponibilizados os dados de todos os anos em análise. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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que as necessidades de mão-de-obra na Europa cessarão com o retorno de alguns emigrantes. Mas visto que os emigrantes europeus saíram dos seus locais de origem, como poderão voltar a trabalhar nas mesmas condições, em sectores que eles próprios recusaram? Afinal, foi toda esta dinâmica o cerne das suas motivações migratórias. A solução do regresso só se pautaria se as condições fossem alteradas no local de partida e de chegada, nomeadamente as do campo sócio-económico. É certo que muitos emigrantes europeus acabaram por voltar ao seu local de origem, mas numa idade onde já não desempenhavam qualquer papel na população activa. Portanto, pelo menos a curto prazo, o cenário das lacunas de mão-de-obra na Europa parece estar mais viradas para o aproveitamento do potencial de trabalho dos imigrantes. VAN DER GAAG e VAN WISSEN (1999, pp. 93 a 95), identificam na Europa regiões onde o fenómeno migratório se processou de forma diferenciada. Na Europa do Norte, desde os anos 80 do século XX, verificaram-se fluxos de refugiados e asilados oriundos da região do Báltico (sobretudo da ex-Jugoslávia), mas também da Rússia e dos próprios países escandinavos (no caso destes últimos, referentes a fluxos de trabalhadores altamente qualificados). Recentemente a tendência é para que esta região da Europa receba bastantes trabalhadores islandeses. Na Europa Ocidental há uma relação notória entre os fluxos migratórios e o desenvolvimento económico. A origem dos imigrantes é muito diversificada, procedendo de outros países europeus (principalmente da Europa Oriental e do Sul), de África (Argelinos em França; Turcos e Marroquinos um pouco mais dispersos), da Ásia (Indianos e Paquistaneses no Reino Unido) e asilados das mais diversas proveniências. De 1985 a 1992, o número de imigrantes aumentou nesta região da Europa, porém até 1996 a tendência alterou-se. Podemos dizer que 1993 marca um ponto de viragem em quase todos os países europeus, já que é nessa data que se começaram a desenvolver políticas migratórias mais restritas. (OKÓLSKI, 1999, p. 149) Nos últimos anos, a Alemanha, o Luxemburgo, a Suíça e a Áustria registaram um declínio significativo nos seus fluxos migratórios devido à crise económica dos anos 90 do século XX, no entanto o Saldo Migratório continua positivo. Há a destacar o caso da Irlanda, cujo Saldo Migratório negativo está naturalmente a regredir, devido ao regresso de muitos irlandeses. Na Europa do Sul, os padrões migratórios têm vindo a alterar-se nas últimas décadas: de região emissora, passa a região receptora de imigrantes de origens diversas como África (Magrebinos, população dos PALOP…), Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Ásia (Chineses e Indianos…), América do Sul (Brasileiros, Colombianos, Argentinos…) e até da Europa (Albaneses na Itália; população da Europa Oriental na Espanha e em Portugal…). Muitos são aqueles que entram e permanecem ilegal/clandestinamente nos locais de chegada, principalmente em países de imigração recente, como é o caso de Itália, Espanha, Grécia e Portugal. A celeridade do fenómeno não deixou tempo para a reformulação das estruturas administrativas, as quais têm dificuldade em dar uma resposta eficaz a tal situação. (VAN DER GAAG e VAN WISSEN, 1999, p.96). Outra região que conhece agora um novo dinamismo migratório trata-se da Europa Central e Oriental, pois antes do colapso do comunismo praticamente não se verificavam fluxos migratórios, excepto na Rússia, onde antes da Perestróika, os judeus quebravam as barreiras existentes e entravam nesse Estado como imigrantes. Nos dias actuais verificam-se não só movimentos externos de saída para outros países europeus, como também movimentos migratórios internos, materializados por fluxos étnicos de retorno de algumas populações, que se viram forçados a abandonar o local de origem durante o regime comunista (por exemplo, grupos da região do Báltico que voltaram para a Rússia…). (Ob. Cit., 1999, pp. 97 e 98). Ainda referente à questão dos ilegais/clandestinos, OKÓLSKI (1999, p. 151) refere que os fluxos europeus também são caracterizados pela existência de um número significativo destes imigrantes e de asilados. Em 1993 estimava-se que tivessem entrado na Europa cerca de 350 000 imigrantes de forma irregular, embora se presuma que desde aí tenha ocorrido um ligeiro declínio. O relatório da Comissão Europeia sobre a situação social da União Europeia (2002) 96 indica que a imigração está na base do crescimento populacional dos países que compõem a União Europeia.97 O Saldo Migratório é positivo em muitos dos Estados-Membros da Europa dos 15, o que faz com que a média da União Europeia seja também ela positiva. Tal situação deve-se também à entrada de imigrantes de países terceiros, numa situação irregular, mas que posteriormente acabaram por se regularizar.98 96. COMISSÃO EUROPEIA (2002), La situacion sociale dans l`Union Européenne. 2002, Direcção-Geral do Emprego e dos Assuntos Sociais, Eurostat, s/e, Bélgica. 97. Presume-se, pois, um crescimento quantitativo em classes etárias específicas como já foi anteriormente referido (população activa), ou melhor dizendo, nos adultos, e não tanto ao nível das crianças (nascimentos). 98. Em 1999, o Luxemburgo foi o Estado europeu que conheceu a maior taxa de imigração (3%) e taxa de emigração (2%). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

128

1985 1990

1995

1997

1998

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

129

036,2

512,1

020,1

***

582,2

586,6

579,4

510,5

533,1

232,1

221,9

298,9

***

Dinamarca

Alemanha

Espanha

Irlanda

Itália

Luxemburgo

Holanda

Finlândia

Suécia

Reino Unido

Noruega

Suíça

Portugal

***

154,2

125,5

174,2

452,2

457,7

455,2

485,8

482,2

***

***

428,7

026,7

054,1

Adaptado da EUROSTAT (2000).

047,1

***

0114,7

0225,7

0267,6

0160,6

0113,6

0117,4

0010,3

1166,8

0033,3

0034,7

1651,6

0040,7

0062,7

***

291,7

0232,2

0231,2

0025,2

06,5

057,3

006,3

0056,3

056,3

***

610,6

032,4

032,5

***

00296,7

00236,7

00245,9

00045,9

00012,2

00096,1

00010,3

00096,7

00031,2

00036,1

1096

00063,2

00063,1

188,1

185,6

115,6

192,3

034,3

069,3

063,3

045,7

043,3

033,1

***

698,1

034,6

036,1

***

297,6

223,8

285,8

144,8

113,6

109,9

010,4

***

044,9

057,9

840,6

050,1

058,8

299,6

299,5

219,3

225,5

038,5

069,9

062,2

056,6

* * *4

029,9

***

747,4

038,4

039,3

***

498,5

421,3

401,5

149,4

114,2

122,4

110,4

165,7

044,9

081,3

802,5

051,4

061,5

297,9

294,8

222,9

223,7

038,5

010,8

060,4

757,6

756,7

021,2

***

755,4

040,3

048,8

Imigração Emigração Imigração Emigração Imigração Emigração Imigração Emigração Imigração Emigração

Bélgica

Países

Quadro 4 – Imigração e Emigração (número de imigrantes/emigrantes por cada 1000 habitantes) A EUROPA DO OUTRO – A IMIGRAÇÃO EM PORTUGAL NO INÍCIO DO SÉCULO XXI – Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa

A EUROPA DO OUTRO – A IMIGRAÇÃO EM PORTUGAL NO INÍCIO DO SÉCULO XXI – Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa

Actualmente os 18 a 19 milhões de não-nacionais que vivem nos 15 Estados-Membros, representam 5,1% da população total deste conjunto de países, valor que pode aumentar. Esta tendência é contrária à da emigração, visto que cada vez menos indivíduos da Europa dos 15 vivem fora deste espaço, tal como podemos verificar no quadro 99. As motivações económicas e a reunificação familiar são as causas mais apontadas para a escolha da Europa como destino migratório. No entanto a maioria dos imigrantes tende a concentrar-se nos segmentos inferiores do mercado de trabalho, apesar de alguns grupos de imigrantes apresentar níveis de instrução elevados (por exemplo, os Europeus de Leste…). A taxa de emprego dos imigrantes na União é de cerca de 61%, valor este que na maioria dos casos é superior à taxa de emprego dos países de origem. O relatório da Comissão Europeia sobre a situação social da União Europeia revela ainda que a Língua e as diferenças culturais e sociais são obstáculos à integração, os quais diminuem à medida que se verifica o aumento do grau de instrução. Trata-se de um handicap de dupla perspectiva, pois se por um lado os imigrantes apresentam dificuldades no conhecimento do idioma do país de chegada, por outro, e no caso europeu, 47% dos indivíduos afirmam só conhecer a língua do seu país! Verifica-se ainda que a vontade de suprimir a barreira linguística é maior em indivíduos do sexo masculino, e que a capacidade de apreensão da nova língua parece diminuir com o avanço da idade. Mas se estes problemas revelam uma dinâmica demasiado complexa para a sua resolução imediata, outros poderão ser solucionados a curtoprazo. A reunificação familiar é a forma mais comum de contornar o problema da legalização, ou seja, a família do imigrante consegue entrar no país de forma regular e permanecer ao abrigo dum primeiro elemento que aí se fixou. É claro que a obtenção da nacionalidade, para aqueles que pretendem fixar-se no país de forma definitiva, varia conforme o contexto. O país da União Europeia com a taxa de naturalização mais elevada é a Holanda, ao contrário de Portugal, que apresenta os valores mais baixos (este caso pode ser fruto da incapacidade de resposta dos mecanismos legais ao fenómeno).

99. Não existem disponíveis dados da emigração para Espanha, em 1985, 1990, 1995, 1997 e 1998; da emigração e imigração para a Irlanda, em 1985; da emigração e imigração para a Itália, em 1997; da emigração em 1985, 1990 e da imigração em 1985, 1990,1995, 1997, 1998 para Portugal. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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O relatório da Comissão Europeia sobre a situação social da União Europeia de 2003 100 refere que a taxa de migração anual líquida de 2002 foi de 3,1‰, representando cerca de 74% do crescimento demográfico total da União. Este relatório já têm em consideração a importância crescente da mão-de-obra imigrante, principalmente quando as reservas autóctones estiverem esgotadas, no entanto isso também vai depender da capacidade de integração dos imigrantes dos Estados-Membros na actividade económica e no próprio tecido social europeu. Que futuro para a Europa das migrações? VAN DER GAAG e VAN WISSEN (1999, pp. 97 e 98, 103 e 104) afirmam que o desenvolvimento intra-europeu determinará a distribuição dos fluxos migratórios, mais até do que o próprio desenvolvimento verificado na Europa e em geral nos países de origem dos imigrantes. O sul da Europa poderá beneficiar, segundo os autores, já que os imigrantes promovem os investimentos. Resta pois saber se esses mesmos investimentos serão feitos a montante (ou seja, antes da presença do imigrante, e portanto não terá a ver directamente com a presença deste na região, já que quando foi realizado ainda ele não estava presente) ou a jusante (ou seja, depois da presença do imigrante na região, e neste caso o investimento poderá ter sido feito no sentido de aproveitar as potencialidades dessa mesma mão-de-obra estrangeira) do processo imigratório. Ainda referem que o fluxo de imigrantes da Europa de Leste permanecerá durante mais algum tempo, pelo menos até estar concluído o processo de transição/reestruturação económica dos países de origem. Será pois necessário o aumento das discussões sobre as migrações visto, que num futuro próximo, a imigração poderá vir a contribuir para o rejuvenescimento da população activa em certos países. No entanto OKÓLSKI (1999, pp. 156 e 186) vaticina que estes fluxos de mão-de-obra serão dominados, de uma maneira geral, pelos trabalhadores não-qualificados, não acreditando que se verifique um aumento significativo dos trabalhadores qualificados ou dos grandes quadros das empresas. Será que as telecomunicações (Internet, Videoconferência…) poderão estar na base desta diminuição, ou pelo contrário, a formação profissional dos autóctones suprirá as necessidades de cada realidade nacional? Esta é uma questão que levanta muita polémica entre os autores e para a qual é necessário ter em conta a realidade económica/educacional de cada país europeu. 100. COMISSÃO EUROPEIA (2003), A situação social na União Europeia. 2003. Síntese, Direcção-Geral do Emprego e dos Assuntos Sociais, Eurostat, s/e, Bélgica. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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OLIVEIRA e ABELLÁN (1995, p. 172) referem que há um número significativo de estrangeiros a viver em países europeus (6,7 milhões na Alemanha; 3,6 milhões na França; 2 milhões no Reino Unido). VAN DER GAAG e VAN WISSEN (1999, pp. 97 e 98, 103 e 104) prenunciam a Europa como a arena das migrações internacionais, por excelência. Mapa 1 – Percentagem de estrangeiros em situação legal, na população residente total dos países da UE, em 1998

Fonte: FONSECA (2002).

Perante um cenário deste tipo, será imperativo o estudo deste espaço, no sentido de se assumirem as diversas realidades imigratórias, e procurar conhecer os problemas (tensões sociais, dificuldades de integração, exploração de mão-de-obra estrangeira…). Por outro lado também se torna necessário conhecer as potencialidades (rejuvenescimento da população activa, «bagagem» científica…) que a própria imigração poderá revelar, por muito difícil que essa tarefa se apresente.

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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1.2. A mobilidade – a Europa «escolhida» ou a «escolha» da Europa? Escolher a Europa como destino da migração tem na sua base motivações não só de ordem estrutural, como também conjuntural. A localização geográfica do continente e as relações históricas estabelecidas com o resto do mundo (principalmente com as «colónias»), segundo OKÓLSKI (1999, p. 154), fazem com que esta seja uma das regiões mundiais mais expostas (senão mesmo a mais exposta) aos movimentos migratórios. Gráfico 3 – Evolução do número de estrangeiros residentes na Europa, de 1950 a 1992 Percentagem de população estrangeira (relativamente à população total)

Alemanha França

45

Reino Unido

40

Suíça Bélgica

35 Itália Holanda

30

Áustria Espanha

25

Suécia

20

Dinamarca Noruega

15

Luxemburgo Portugal

10

Irlanda

5

Grécia Finlândia

0 1950

1971-72

1982

1989

1990

1991-92

Liechtenstein Total da Europa Ocidental

Anos

Adaptado de FASSMANN e MÜNZ (1994).

O gráfico 101 revela esse mesmo cenário, havendo países onde o número de imigrantes é bastante significativo, relativamente à população total. 101. Tal como já foi referido para o anterior gráfico, é de ter em conta que o eixo das abcissas não é contínua. Esta «forma» de apresentação prende-se, não só com a disponibilidade de dados, mas também porque se considerou ser esta a forma de análise mais pragmática. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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É o caso do Liechtenstein, do Luxemburgo e da Suécia, ao contrário da Irlanda e da Finlândia, que registaram um decréscimo (mantêm elevados os valores da emigração). Talvez por isso mesmo, as medidas restritivas à imigração estejam a aumentar. OLIVEIRA e ABELLÁN (1995, p.172) afirmam que nos últimos anos têm aumentado as medidas restritivas sobre as migrações, facto esse mais visível a partir de 1993, quando diminuiu o quantitativo dos fluxos e os pedidos de asilo em países tradicionalmente de imigração (Alemanha, França, Suíça, Bélgica…). Neste caso, a Europa parece «escolher» os seus imigrantes… A denominação de «medidas restritivas» poderá ser uma expressão demasiado lata. É certo que em muitas realidades, tal facto acontece literalmente como é enunciado na expressão, porém, e pensando nos casos dos países onde a imigração é recente, como é o caso de Portugal, poderão ser feitas diligências no sentido de promover a organização de um conjunto de medidas que regularizem a situação dos imigrantes, exigindo por isso um conjunto de requisitos daqueles que entram no país. Nesse caso não será tanto uma questão de «restrição» mas antes de «controlo» da regularização da situação dos migrantes, de forma a combater a ilegalidade/clandestinidade dos indivíduos, com todas as implicações negativas que poderão advir para o país e para os próprios imigrantes. É claro que, de certa forma, a implantação dessas medidas poderá levar à quebra quantitativa dos fluxos, já que nem todos os imigrantes conseguem ter a sua situação regularizada para entrar/permanecer no país. A discussão em torno deste tema levanta a problemática da supranacionalidade das políticas migratórias. GEDDES (1999, p.188) refere que na União Europeia há a dualidade entre o supranacionalismo e o intergovernamentalismo. A imigração e o asilo político tendem, cada vez mais, a serem dominados por decisões intergovernamentais, o que significa que os Estados e o diálogo entre si passam a ser peças fundamentais, não só para a política migratória, como também para o processo de integração. Porém, o facto de serem «obrigados» a partilhar o «poder» com instituições supranacionais levanta algumas tensões, na medida em que nesta matéria ainda não há uma tradição marcadamente participativa ao nível internacional que permita aos Estados compreenderem as vantagens e a necessidade de adoptar esta forma de trabalho. Por outro lado, parece haver o medo do «compromisso», da «obrigação» e talvez por isso mesmo este autor afirme que há tendência para que surjam lobbies que tentam contornar essa situação. E neste jogo de poder, o imigrante fica sempre de fora, juntamente com o país de origem, quando a participação de ambos se apresenta de todo como uma necesFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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sidade, uma vez que se tratam do agente/emissor, respectivamente, da migração. Já no início do processo migratório, o imigrante parece ser excluído, o que o coloca à partida numa posição de «segundo plano». LEVEAU (1989, p. 113), a propósito deste assunto, diz que estes, no país de acolhimento, raramente são considerados como actores sociais no seu máximo, primeiro porque não beneficiam do estatuto de cidadão (no sentido de escolha, de decisão…), depois porque se encontram muitas vezes em situação de irregularidade (no caso dos ilegais/clandestinos). Desta forma, quase que podemos reconhecer, como diz FAVELL (1999, pp. 222 e 223), «uma Europa por detrás da Europa», onde o imigrante que a «escolheu» como destino se encontra no limite entre o nacional e o transnacional, com experiência em cruzar fronteiras e culturas. Muitos em situação precária, não só material e socialmente, como também identitáriamente. Encontram-se entre duas ou mais culturas, entre o sentimento de pertença e de não pertença, capazes de escolher/recusar normas e usá-las da forma mais conveniente, segundo o autor. Mas será possível a escolha? A situação de irregularidade parece só por si retirar essa capacidade, bem como o próprio estatuto de imigrante, a menos que, no segundo caso, o sentimento de pertença transnacional outorgue o indivíduo de poder/capacidade para tal. BLOM (1999, p. 206), ao falar do caso Rushdie 102, destaca o papel da comunidade no sentido de construção deste sentimento no imigrante, no estrangeiro. A comunidade internacional «virtualizou» o sentimento de pertença, gerando um sentimento de solidariedade, que embora fosse parcial, interveio e promoveu a resolução da situação. Será então que podemos considerar a Europa como um forte de portas abertas, ou entreabertas, que deixa passar apenas quem quer? OKÓLSKI (1999, p. 159) que formulou a questão, é ele mesmo que dá a resposta, referindo que a Europa-fortaleza é mais um postulado do que um facto consumado, uma vez que se constitui como um pólo de atracção para o qual as pessoas migram, mesmo com todos os obstáculos impostos. Procuram-se maneiras de iludir e circundar esses obstáculos, fazendo os imigrantes que as portas se encontrem sempre semi-cerradas, daí que o autor alerte para que a Europa possa não poder resistir à pressão,

102. Refere-se ao escritor Salman Rushdie e ao caso que se gerou em torno da sua pessoa após a publicação do livro “Os Versículos Satânicos”. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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confrontada com a diversidade e com os quantitativos de migrantes.103 Talvez pressagiando tal facto, esta região do globo tenha começado a tomar as suas precauções desde há algum tempo, como nos fala COSTALASCOUX (1986, p. 179) quando refere que a Europa se tornou mais exigente na questão do reagrupamento familiar, dos «falsos refugiados» e em outras situações («falsos casamentos», «falsos documentos»…). Analisando alguns documentos da Comissão Europeia sobre esta matéria, verifica-se que nos últimos tempos cresceu a preocupação pela necessidade de reflectir sobre a questão da imigração na Europa. A Comissão das Comunidades Europeias, em 2000 104 deu a conhecer a necessidade da elaboração de uma política comum de asilo e imigração, bem como da admissão controlada de migrantes económicos na União. Esta deveria ter em conta a evolução (declínio) demográfico dos próximos 25 anos, bem como as perspectivas económicas e os deficits crescentes de qualificação no mercado de trabalho. Propôs-se por isso a coordenação e uma avaliação das situações específicas migratórias por parte de cada Estado-Membro, bem como o estabelecimento de parcerias e de avaliações materializados em relatórios periódicos. Destaque-se o facto de que as linhas orientadoras propostas vão no sentido da promoção de uma «forte» liderança política, bem como no empenho claro na promoção de sociedades pluralistas, na condenação do racismo e da xenofobia. A necessidade de reflexão e debate sobre os benefícios da imigração e da diversidade cultural também são pontos em que se aconselha divulgação a toda a comunidade. Propõe-se então, nesta altura, o desenvolvimento de um quadro jurídico comum, baseado numa política migratória transparente e em coordena103. Por exemplo, em Portugal, para contornar a situação de entrada e permanência no território, os “casamentos brancos” começam a ser comuns. Foi noticiado em Abril de 2004 casos de portuguesas socialmente desfavorecidas, que casavam com paquistaneses a troco de dinheiro, no sentido destes últimos obterem visto e passaporte através de direitos adquiridos por terem «esposa portuguesa». Este fenómeno era previsto a partir de uma «»lacuna» no Decreto-Lei 34/2003, de 25 de Fevereiro de 2003. (RTP 1, «Jornal da Tarde» (13:00), 10 de Abril de 2004) Tal fenómeno matrimonial também começou a ser comum em Inglaterra, entre Brasileiras e Portugueses. Outra forma de contornar a situação irregular, trata-se da aquisição de documentos falsos, nomeadamente de Bilhetes de Identidade. Esta situação é frequente entre brasileiros, que muitas vezes o adquirem através de redes em território britânico. (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Milhares de BI portugueses falsos postos à venda por 75 euros e Casamentos «»ilegais» dispararam em 2003, Secção dn.tema, quarta-feira, 9 de Junho de 2004) 104. COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (2001), Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu, relativa a uma política da Comunidade em matéria de Imigração Clandestina, s/e, Bruxelas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ção/cooperação com os países terceiros, de forma a salvaguardar os interesses dos próprios imigrantes (combate às redes) e o reforço dos controlos fronteiriços. Esta última ideia é acentuada em 1993, quando a Comissão das Comunidades Europeias 105 volta a defender o controlo das mesmas, justificando esta directiva com base na luta contra o combate de redes criminosas e na diminuição dos riscos terroristas 106. Exacerba ainda a necessidade de criar uma confiança recíproca entre os EstadosMembros que abandonaram os seus controlos nas fronteiras internas… Schengen parece sofrer, de certa forma, uma regressão, e o espaço que na teoria se supunha livre, passa a ser lido de outra forma, face ao contexto internacional. No Conselho Europeu de Sevilha, em 2002 107 as directivas em matéria de política migratória mantêm-se, ressaltando mais uma vez a necessidade do desenvolvimento de uma política comum, envolvendo os Estados terceiros, bem como o reforço das fronteiras externas da União. De escolhida, a tendência parece ser para escolher os seus imigrantes, o que é visível não só pelo reforço do controlo fronteiriço e político, como também pela questão económica das necessidades de mão-de-obra e de rejuvenescimento da população activa. Teremos pois, no futuro, uma Europa que funcionará com base numa engrenagem previamente seleccionada? Há a consciência da necessidade da importância do imigrante na Europa daí que seja urgente a intensificação do papel e da acção deste na vida europeia, bem como a sua integração na vida da Comunidade. 1.3. Padrões de imigração na Europa Nos anos 70 do século XX a Alemanha deu as boas-vindas ao seu imigrante «um milhão». Foi o português Armando Rodriguez e o evento que marcou a ocasião encheu-se de pompa e circunstância ao ser entregue ao mesmo uma motorizada, facto amplamente coberto pelo prestigiado jornal Der Spiegel. (FASSMANN e MÜNZ, 1994, p. 3). Hoje, já não se fala tanto em «migrante» neste sentido, nem sequer no Gastarbeiter, o trabalhador «convidado» para suprir as necessidades de mão-de-obra e reconstruir o país arruinado pela guerra. 105. COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (2001), Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu, relativa a uma política da Comunidade em matéria de Imigração Clandestina, s/e, Bruxelas. 106. Refira-se que este documento foi redigido em 15 de Novembro de 2001, pouco tempo depois do atentado de 11 de Setembro, em Nova Iorque. 107. COMISSÃO EUROPEIA (2001), Conclusões da presidência do Conselho Europeu de Sevilha. 21 e 22 de Junho de 2002, s/e, Bruxelas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Gráfico 4 – Imigração na última década (em unidades de milhar)

Número de imigrantes (em unidades de milhar)

10 000

Bélgica Dinamarca Alemanha Espanha

1000

França Irlanda Itália Luxemburgo

100

Holanda Áustria Portugal Finlândia Suécia

10

Reino Unido Noruega Suíça

1 1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

Anos

Adaptado da EUROSTAT (2002).

Aliás, ao longo da última década, como se pode comprovar no gráfico 108, o número de imigrantes tem vindo a diminuir na Alemanha (um país tradicionalmente imigratório), ao contrário do que se passa noutros países igualmente representados, como é o caso da Holanda, Portugal e Espanha, onde o aumento do número de imigrantes é mais amplamente visível (o primeiro com tradição imigratória, o segundo e terceiro lidando com o fenómeno). Actualmente, domina a designação de «estrangeiro», com sentido do Outro, mas de um Outro onde muitas vezes se reconhece apenas a diferença como algo pejorativo e negativo. Os imigrantes na Europa já não são originários da Irlanda, Portugal, Espanha ou Itália, mas sim da Turquia, da ex-Jugoslávia, da Índia, entre outras origens. Estes autores (Ob. Cit., p .4) conseguem distinguir algumas fases na dinâmica imigratória da Europa. Até 1945 encontramos uma Europa predominantemente emigratória, ou seja, entendida como região emissora de fluxos (lembremo-nos pois das colónias e dos domínios que muitos países europeus possuíam noutros continentes), cenário esse que se iria alterar com o «boom» económico pós 2.ª Guerra Mundial, onde se verificou 108. O gráfico apresenta uma escala vertical logarítmica. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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o retorno das tropas e das populações das colónias, conjuntamente com o início da recepção de imigrantes que cada vez em maior número chegavam a países como a França, a Bélgica, o Reino Unido ou a Holanda. Estes autores destacam ainda a guerra da independência da Argélia (1954-62) pelo considerável número de retornados franceses desse país e também de outras colónias desse Estado, como um marco, ou seja, é a partir dessa altura que se começa a constatar o retorno de populações das colónias para os respectivos países europeus, visto que se entra no processo de descolonização. Este era uma dinâmica migratória facilitada, na medida em que os próprios colonos eram legalmente nacionais dos países colonizadores. Hoje as migrações tornam-se mais complexas e os fluxos migratórios são cada vez mais diversificados, contudo com uma ligeira queda nos países de tradição imigratória. Podemos até individualizar alguns tipos de migrações na Europa: as migrações de trabalho, comuns a partir da década de 50 do século XX, são típicas do sul da Europa e mais tarde do norte de África (Marrocos, Argélia, Turquia, Tunísia), fluxos esses que se orientavam para países como a Alemanha, França, Suíça, Bélgica, Suécia, Áustria, Reino Unido, entre outros. Com o choque do petróleo de 1973, reduziu-se a capacidade de absorção dessa mão-de-obra, daí a imposição de restrições aos migrantes, também baseadas em conflitos e tensões verificadas nalguns países (no Reino Unido surgem conflitos raciais; na Suíça desenvolvem-se movimentos anti-estrangeiros…). Em certos casos, aplicam-se restrições temporárias ou então chega-se a recompensar o retorno (no caso da Alemanha ou da Áustria). Mas, tal como já foi discutido anteriormente, não são as barreiras legais impostas que provocam a cessação dos fluxos. Estes continuam, recorrendo aos mais variados estratagemas e artifícios (vistos de turismo, migrações temporárias…) para poderem atingir o território pretendido, daí que o número de ilegais/clandestinos em território europeu venha a subir de forma excepcional. Nos anos 80 do século XX, surgem como novos países de imigração Portugal, Espanha, Itália e Grécia. (Ob. Cit., pp. 5 à 9) São essas regiões que passam a receber imigrantes do continente africano, asiático e americano, bem como da Europa de Leste. MOROKVASIC e TINGUY (1993, pp. 245 e 257) destacam o facto de que vista da Europa Ocidental, a Europa Oriental é tida como uma área única e exclusivamente emissora de migrantes, o que, segundo os autores, não é de todo verídico, visto esta região da Europa também ser uma área Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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de passagem e de chegada de imigrantes. A Polónia, a Hungria, a República Checa e a Eslováquia vêm-se ladeados por um dualismo migratório, ou seja, se por um lado assistem à partida de cidadãos, por outro participam da chegada de romenos e de populações de outras regiões fronteiriças onde domina a instabilidade política/social. Tal facto levanta problemas similares, de certa forma, aos novos países da imigração da Europa do sul, visto haver a necessidade de criar uma legislação coerente e adequada à nova realidade migratória. Refira-se que este conjunto de países da Europa de Leste são aqueles com perspectivas de crescimento e desenvolvimento mais promissoras e que já deram provas à União de manifestarem uma boa capacidade de liderança e renovação, daí o facto de mais tarde poderem ser alvos do destino e da diversificação dos fluxos migratórios (VELEZ, 2003, p. 8) Na tipologia das migrações europeias, FASSMANN e MÜNZ (1994, pp. 9 à 11) distinguem ainda as migrações de refugiados, importantes na estrutura dos fluxos migratórios europeus.109 Foi essencialmente nos anos 50 do século XX que estes fluxos se desenvolvem, relacionados com crises políticas, e que se mantêm até aos nossos dias (crises de: 1956-57 na Hungria; 1968 na ex-Checoslováquia; 1980-81 na Polónia; 1991-93 na Bósnia e na Croácia). Nota-se que ao longo dos tempos, diminui a propensão para receber os refugiados, tendo-se verificado dois acontecimentos importantes que marcaram esta tendência. O primeiro ocorre em 1992-93, quando a Áustria, a Alemanha e a Suécia se assumem como países seguros e deixam de aceitar estes indivíduos. O segundo acontece quando o mesmo passo é dado pela Polónia, República Checa, Eslovénia, Eslováquia, Hungria e Croácia se tornaram também países seguros. Isto significa que podem recusar pedidos de asilo, com base no argumento da manutenção da segurança no espaço interior às suas fronteiras. Portanto, na prática, os indivíduos que ultrapassam as fronteiras terrestres destes países, não têm quase nenhuma possibilidade de serem considerados refugiados. As migrações de elites (estudantes, empresários, artistas, quadros das multinacionais…) são também outro tipo de migração distinguida pelos autores, porém sem grande pertinência, na medida em que ainda não são tão restringidos como nos anteriores casos. Geograficamente, também podemos distinguir, segundo os autores (Ob. Cit., pp. 12 e 17) alguns padrões migratórios na Europa, nomeadamente

109. Os autores incluem neste grupo os refugiados, deslocados e asilados. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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as migrações Sul-Norte, materializadas pelos fluxos originários do continente africano e as migrações Este-Oeste. Estas últimas foram bastante reduzidas durante cerca de 40 anos devido ao regime político que vigorava na Europa Oriental, bem como pelas próprias divisões políticas do continente. Quando se verificavam, eram fluxos «canalizados» por acordos bilaterais (por exemplo, como se verificava entre a Alemanha Ocidental, a Polónia e a Roménia…). Também se destacam as migrações por afinidade, quer dizer, aquelas que ocorrem entre cidadãos das antigas colónias e antigos países colonizadores, onde os traços linguísticos e culturais são comuns (um dos exemplos mais ilustrativos será o caso dos imigrantes dos PALOP com Portugal). Em muitos casos é a proximidade geográfica que alimenta estes padrões migratórios, bem como a própria proximidade linguística (veja-se o caso dos Finlandeses e Dinamarqueses na Suécia; dos Irlandeses no Reino Unido; dos Franceses na Bélgica; dos Austríacos e Polacos na Alemanha…). As disparidades económicas entre os países de origem e os países de chegada também influenciam, bem como a própria construção de uma imagem territorial, que nem sempre corresponde à realidade, como já tivemos oportunidade de ver anteriormente. Que futuro para a tipologia/padronização das migrações europeias? PORTES (1999, p.58) acha que as migrações de trabalho continuarão, podendo até vir a desenvolver-se alguns casos de economia de enclave imigrante. No caso de se manterem os fluxos migratórios e com a abertura da União ao PECO 110, pode verificar-se a presença em certas regiões de um número significativo de imigrantes com experiência empresarial. Desde que haja disponibilidade de capital e de mão-de-obra, poder-se-á promover o desenvolvimento económico regional. É certo que a experiência empresarial e o capital são os factores de produção mais difíceis de obter, ainda mais se não forem dados apoios. No entanto vejam-se os casos mais flagrantes de sucesso deste tipo de economia, com os Cubanos em Miami e os Coreanos em Los Angeles. Na Europa, os Chineses e os Indianos, tão vocacionados e imbricados no ramo comercial, certamente poderão fomentar este tipo de economia. FASSMANN e MÜNZ (1994, p. 30) acreditam que as migrações internacionais irão continuar a afectar a Europa Ocidental. A reestruturação política e económica na Europa Oriental (destacando-se o caso dos países outrora dominados por um regime comunista, onde ainda prevalece uma depres-

110. PECO – Países da Europa Centro-Oriental. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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são económica, instabilidade política, violência étnica…), Norte de África e na Rússia, causará ainda novas pressões imigratórias na Europa Ocidental, reforçando-se os fluxos Sul-Norte e Este-Oeste. O relatório mundial das migrações de 2000 111, refere que apesar dos esforços dos governos europeus para restringir e reduzir os números da imigração na Europa Ocidental, esta região continuará a ser o mais importante e dinâmico centro das migrações internacionais. Assiste-se cada vez mais a uma «privatização» das migrações: se por um lado parece crescer uma atitude tendencialmente restritiva dos governos aliado a uma conjuntura económica menos favorável (o que se poderá reflectir numa perda de significado face às necessidades de mão-de-obra das empresas e grupos privados nos mais variados sectores), por outro crescem as empresas de recrutamento de mão-de-obra estrangeira. Em Portugal, existe um número considerável de empresas de trabalho temporário no ramo da construção civil, as quais angariam mão-de-obra no estrangeiro, dando-lhe todo o apoio burocrático necessário para o estabelecimento num país terceiro. Estas poderão vir a ser uma forma de contornar e fugir ao problema das redes de angariação ilegal, ou pelo contrário, até delas poderão derivar novas formas de exploração e novas redes, se tratarem de recrutar mão-de-obra vulnerável do ponto de vista económico e social, e por isso mais barata. Urge o desenvolvimento de políticas migratórias também em concordância com os países terceiros e com todos os intervenientes no processo migratório. Evitar falar da imigração ou negar a existência de fluxos ilegais/clandestinos, pode resultar num erro grave, não só porque estão em causa os direitos e a qualidade de vida de pessoas, mas também porque se desperdiçam as potencialidades trazidas por esses indivíduos, aos mais variados níveis (nomeadamente no trabalho…). 1.4. A Fronteira Sul Nesta perspectiva, parece pertinente destacar o papel da fronteira sul do Mediterrâneo, hoje não só como local de passagem, mas também como área de fixação de imigrantes. KING (2001, p. 2) refere que durante as décadas de 50 a 70 do século XX, a bacia mediterrânica foi um reservatório de migrantes. Era uma região pobre, de forte densidade populacional, onde a emigração se assegurava como uma solução possível para as 111. In MARTIN, Susan; LARKIN, Mary Ann (ed.) (2000), World Migration Report, International Organization for Migration/United Nations, s/e, s/l. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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vicissitudes sócio-económicas. Podem-se sistematizar os fluxos desta época da seguinte forma: Figura 11 – Grupos migrantes e respectivos locais de chegada

Populações Migrantes

Destinos

Portugueses e Espanhóis --------------------------------» França Ex-Jugoslavos, Gregos e Turcos ----------------------» Alemanha Italianos --------» França, Bélgica, Alemanha, Suíça, EUA, Austrália Malteses e Cipriotas -------------» Reino Unido, Austrália, Canadá Argelinos e Tunisinos -------------------------------------» França Marroquinos ---------------------------» França, Bélgica, Holanda Adaptado de KING (2001).

No entanto, a partir dos anos 80, assiste-se a uma nova configuração nas migrações do Mediterrâneo, devido a todo um conjunto de factores de índole económica, política e cultural. As políticas migratórias, ao se tornarem mais severas nos países europeus tradicionalmente de imigração, fazem com que haja uma redirecionação dos fluxos migratórios. A Itália foi por isso pioneira, nos anos 80 do século XX, na absorção de imigrantes. RIBAS-MATEOS (2001, pp. 25 e 36) acha, tal como outros autores, que esta região ainda não está suficientemente preparada para receber grandes fluxos de imigrantes, no sentido em que poder-se-ão verificar graves problemas de exclusão se não forem empreendidas um conjunto de políticas que contrariem tal tendência. O Mediterrâneo é uma das mais proeminentes áreas de fricção/tensão de populações com grandes iniquidades económicas entre si. Países como a França, a Espanha e a Itália, com um IDH 112 relativamente elevado, convivem com populações vindas de Marrocos, da Tunísia, da Argélia ou do Egipto, com valores do IDH muito baixos. No entanto, há que ter em conta que esta é uma questão de fundo, pois afinal o cerne da migração está sempre intrincado com a dimensão económica, não numa perspectiva igualitária, mas baseada na motivação pela diferença, ou seja, a repulsão do país de origem pelo fraco desenvolvimento económico, e atracção do local de chegada por boas perspectivas neste campo. 112. IDH – Índice de Desenvolvimento Humano. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Gráfico 5 – Principais nacionalidades da população estrangeira legal, presente em Itália, em 1997

Reino Unido 4% Sri Lanka 4%

Egipto 4%

Peru 3% Marrocos 17%

França 4% Polónia 4%

Albânia 11%

Senegal 5% China 5%

Filipinas 8%

Roménia 5% Alemanha 5%

ExJugoslávia 6%

Tunísia 7%

EUA 8%

Adaptado de King (2001).

Por outro lado, KING (2001, pp. 4 e 5) aponta as fronteiras naturais (insularidade, limites montanhosos…) como adjuvantes do próprio processo imigratório clandestino, já que se torna mais difícil o controlo terrestre (por exemplo, a entrada de Albaneses na Grécia) 113. A Península Ibérica também apresenta situações idênticas. Por exemplo Espanha, pela sua localização/posição oferece uma costa privilegiada para a atracção de imigrantes oriundos do Norte de África. (PÉREZ, 1996, p. 17) À excepção de Portugal, de feição mais Atlântica, Espanha, Grécia e Itália fazem parte do denominado mundo mediterrânico. A sua posição geográfica confere-lhe um papel de transição entre a Europa e o mundo Muçulmano-árabe, intermediário também de contactos entre ambos os hemisférios, com um crescente papel político e geoestratégico nas questões do Médio-Oriente. (SIMON, 1986, p. 9) Também há que ter em conta a forte tradição marítima e comercial, que sempre promoveu o encontro 113. Tal facto deve-se à existência da cordilheira de Pindo, originária do prolongamento do sistema Dinárico, que está bem marcada na região fronteiriça. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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de populações das colónias com os colonizadores, relações que ainda hoje se mantêm muitas vezes vivas (como é o caso de Portugal com os PALOP). Gráfico 6 – Principais nacionalidades da população estrangeira legal, presente em Espanha, em 1997

Holanda 4% EUA 4%

Filipinas 3% China 3% Marrocos 19%

República Dominic. 5% Peru 5% Argentina 5% Reino Unido 17%

Itália 5% França 8% Portugal 10%

Alemanha 12%

Adaptado de King (2001).

A queda dos regimes comunistas levou a que o Mediterrâneo fosse invadido por um número considerável de refugiados (Kososvares, Albaneses) e imigrantes, que também se sentem atraídos por estes países não só pelas (ainda) facilidades de entrada, mas também por fazerem parte da União Europeia, com todas os benefícios globais que lhe estão inerentes (KING, 2001, p. 6). Um novo pólo de imigração parece estar a formar-se, num Sul da Europa onde paulatinamente se passa de local de passagem para uma situação de fixação definitiva, quer de jovens em início de vida activa, quer de reformados que também procuram esta região para habitar. (RIBAS-MATEOS, 2001, p. 36)

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A diversificação dos fluxos, quanto às suas origens, motivações e constituição pode assegurar-se como problemática, no sentido em que se torna difícil o controlo de um dinamismo que pode resultar em problemas sociais. Por outro lado, concluiremos que está à disposição todo um manancial de mão-de-obra, que poderá contribuir para contornar o problema do envelhecimento da população activa (com todas as repercussões que isso terá em termos demográficos, económicos e sociais). 2. A EVOLUÇÃO DO CENÁRIO IMIGRATÓRIO EM PORTUGAL 2.1. Reflexões sobre a evolução/situação do fenómeno imigratório Pensarmos em Portugal como país de imigração, é uma ideia recente e que carece de alguma discussão, justificada não só pela dinâmica do fenómeno como também pela novidade que oferece a um panorama nacional caracterizado e habituado à saída de população. ROCHA-TRINDADE (2001, p. 170) opina que a história nos dá algumas pistas sobre a busca deste país por alguns «imigrantes», se é que assim se podem designar, em tempos mais remotos. Já desde o séc.XVIII que os ingleses se estabeleceram na região da invicta, por causa do negócio do vinho do Porto. Mas Portugal conhece também alguns russos que aqui se instalaram depois da Revolução de Outubro, refugiados judeus fugidos à guerra e às perseguições nazis e famílias inglesas que se radicaram no país após o fim do império britânico. Muito longe de se tornarem casos numericamente relevantes ou de serem considerados «imigrantes», no sentido que hoje é considerado, são marcos pontuais, testemunhos da busca de Portugal, independentemente das motivações, para estabelecer residência e desenvolver um trabalho. Há uma certa dificuldade no estabelecimento do início efectivo dos fluxos imigratórios, talvez porque a paulatina vinda de imigrantes, apesar de sempre se ter verificado, só nos últimos tempos ganhou uma dimensão mais significativa.

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Gráfico 7 – Evolução do número de estrangeiros com residência legalizada, em Portugal, entre 1975-2002

Número de estrangeiros

300 000 250 000 200 000 150 000 100 000 50 000

19 87 19 89 19 91 19 93 19 95 19 97 19 99 20 01

19 83 19 85

19 75 19 77 19 79 19 81

0

Anos

Adaptado do INE (2003) – Site da Web.

Os anos 60 são a inicial referência para praticamente todos os autores. PIRES (2003, pp. 119 e 121) afirma que até esta década, a população estrangeira residente em Portugal se manteve praticamente estável (à volta de 21000 indivíduos), sendo muitos deles refugiados espanhóis ou imigrantes com uma longa história de integração e dinamização de sectores específicos da economia portuguesa (por exemplo, ligados ao vinho do Porto). Gráfico 8 – Evolução da população estrangeira com residência legalizada, em Portugal continental e nas ilhas, entre 1975-2002

Número de estrangeiros

1 000 000

100 000

10 000

1000

19 75 19 77 19 79 19 81 19 83 19 85 19 87 19 89 19 91 19 93 19 95 19 99 19 97 20 01

100

Anos

Adaptado do INE (2003) – Site da Web. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Portugal Continental Açores Madeira

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No X Recenseamento Geral da População (1960) residiam em Portugal 29428 estrangeiros (o correspondente a 0,3% da população residente total da altura), sendo que cerca de 67% eram de origem europeia (espanhóis e ingleses, franceses e alemães ligados à indústria, que se fixaram essencialmente nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto) e 22% de origem brasileira (uma espécie de «contra-corrente migratória do Brasil», fixando-se essencialmente no norte do país e no litoral). BAGANHA e GÓIS (1999, p.257) acrescentam ainda que nos anos 60, cerca de 40% dos estrangeiros residentes em Portugal tinham nacionalidade espanhola e 22% nacionalidade brasileira. É a partir daí que o número de «não-nacionais» cresce, bem como se diversificam as nacionalidades e os perfis sócio-demográficos desses indivíduos, indicando uma complexificação progressiva da composição da população imigrante no nosso país, quer no continente, quer nas ilhas, contudo na parte insular do território o crescimento tenha sido muito menos significativo, já que se assiste a uma menor fixação de população estrangeira, comparando com o continente.114 Até aos anos 70, quem imigrava para Portugal eram essencialmente indivíduos luso-africanos, os quais mantinham ligações familiares, sociais, identitárias… entre os dois territórios. Durante a segunda metade da década de 60 e os primeiros anos da década de 70, houve um ligeiro aumento da imigração, com a vinda de ingleses e alemães, agora não só ligados à indústria, como também ao turismo. Refira-se que até aqui, a imigração com base no trabalho, é feita num quadro legislativo muito restrito 115, onde só excepcionalmente se autorizava o estabelecimento em Portugal por tal motivo. Era necessário o parecer o ministro da área de trabalho em questão, pelo que só eram considerados indivíduos elegíveis quando se tratavam de mão-de-obra qualificada. Nessa década, os fluxos das colónias africanas já se asseguravam como significativos, no entanto a contabilização dessa altura carece de maior precisão, visto que estas migrações eram consideradas como inter-regionais.116 Com a revolução do 25 de Abril de 1974, houve primeiramente a retracção dos fluxos migratórios «tradicionais» (Europa e Brasil), no entanto, nos cinco anos subsequentes, a população estrangeira com autorização de residência aumentou cerca de 82%. (PIRES, 2003, p. 123) Portanto, antes dos anos 80, pode-se dizer que o grande fluxo de indivíduos que Portugal recebeu foi o dos retornados, que segundo ROCHA114. O gráfico apresenta uma escala logarítmica no eixo das ordenadas. 115. Com base na Lei de 1933. 116. Ou seja, como se fosse realizado só no continente Europeu (já que as colónias eram uma possessão de um país deste continente), e não entre a Europa e África. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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-TRINDADE (2001, p.170) andou à volta dos 500 mil a 800 mil indivíduos. Não foram atingidas maiores proporções porque o então Ministro da Coordenação Interterritorial, António de Almeida Santos, gizou a Lei n.º 308-A/75 de 24 de Junho, onde foi introduzida uma definição mais rigorosa do direito de acesso à nacionalidade portuguesa e das condições de acesso ao direito de regresso, que travou, ou melhor dizendo, definiu mais claramente as condições de retorno destes indivíduos. FERREIRA e RATO (2000, p. 4) referindo-se já à década de 80, afirma que se assistiu à degradação generalizada das condições de vida nos países em vias de desenvolvimento (crise do endividamento externo, políticas deflacionistas do FMI 117…), o que veio favorecer e incrementar a imigração ilegal e ao desenvolvimento das redes clandestinas orientadas para o tráfico de Seres Humanos. Citando Blangiardo, estes autores afirmam que o desencadeamento dos movimentos migratórios clandestinos esteve também associado à aceleração do crescimento económico (primeiro de Itália e Espanha, depois de Portugal e Grécia), fazendo até emergir novas áreas de atracção para uma mão-de-obra pouco exigente. Um cenário deste género favoreceu a imagem territorial destes países, daí que a partir desta década se verificou não só uma consolidação da imigração africana, como também a efectiva diversificação das origens da população estrangeira. Foi também nesta década que a Europa do Sul se tornou um pólo de atracção para imigrantes, principalmente de África e já do Leste da Europa. (PIRES, 2002, p. 152) Cresce então o problema da imigração ilegal/clandestina. Dos 3 milhões de imigrantes que por essa altura se instalaram em Itália, Grécia, Portugal e Espanha, cerca de metade encontrava-se em situação ilegal/clandestina! Este crescimento nestes países, além de ser proporcionado por um aumento das ofertas no mercado de trabalho, também se relacionou com as restrições à imigração impostas por outros países europeus, deixando o espaço da Europa do Sul como a «alternativa fácil» para entrada, estabelecimento e desenvolvimento da vida do imigrante. (BAGANHA e GÓIS, 1999, p. 254) A partir daqui e já na década de 90, continua em Portugal a manutenção dos movimentos imigratórios dos países africanos lusófonos (principalmente de Cabo Verde) e o aumento substancial do número de brasileiros,

117. FMI – Fundo Monetário Internacional. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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invertendo assim o fluxo histórico da emigração portuguesa 118. Por outro lado também se verifica o aumento do número de cidadãos comunitários, fluxo esse que decorre da proximidade geográfica e das condições de vida que Portugal oferece, seja para gozar a reforma (Algarve) 119 ou para o exercício de uma actividade profissional. Os movimentos do Centro e Leste da Europa começam a surgir, ligados à facilidade de deslocação provida pelo desmoronamento das democracias populares, bem como por factores de repulsão ligados à conjuntura económica, nomeadamente o desemprego e as dificuldades económicas. (ROCHA-TRINDADE, 2001, p. 170) Gráfico 9 – População estrangeira com autorização de permanência em Portugal, por principais nacionalidades, em 30/11/2001

China 3%

Paquistão Índia 3% 3%

Brasil 21%

Ucrânia 39%

Guiné-Bissau 3%

Angola 4% Cabo Verde 5%

Rússia 4%

Roménia 7%

Moldávia 8%

Adaptado de PIRES (2002).

A imigração em Portugal deixava então de ser uma componente menor do movimento da população. PIRES (2003, pp. 136 e 137) aponta para que, no final destas décadas, a população estrangeira com autorização de residência se tivesse aproximado dos 200 000 indivíduos, consubstan118. Neste caso e mesmo anteriormente, quando falámos que esta migração poderia ser vista como uma espécie de “contra-corrente migratória”, é de ter em consideração que tal não se reverte na mesma proporção de portugueses que emigraram para o Brasil no início do século XX. 119. FONSECA (2002, p. 354) designa-os por Sun-Seekers, traduzindo assim o grupo daqueles cuja migração se encontra relacionada com aquilo que o local de chegada tem para oferecer, nomeadamente com o clima e com tudo aquilo que está à sua volta (cultura, economia…). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ciando 2% da população residente total, isto sem incluir os imigrantes ilegais/clandestinos. Em 1991, só a Irlanda e Portugal apresentaram ainda uma taxa de crescimento migratório mais baixa, segundo NAZARETH (1991, pp. 14 e 15), quando nos restantes países da União Europeia a tendência foi de aumento. Refira-se que na Irlanda, o crescimento negativo já é uma constante, enquanto que em Portugal começa a receber imigrantes em números mais significativos a partir da década de 70. É natural que haja uma dificuldade em estimar o número real de imigrantes, não só porque há algumas lacunas de dados entre os períodos intercensitários, como também porque como é óbvio, não se consegue de todo estimar o número real de imigrantes em situação ilegal/clandestina. PIRES (2002, p. 151) revela que, no início do séc. XXI, o novo regime legal das autorizações de permanência que entrou em vigor em 2001, veio dar visibilidade estatística a um conjunto de mudanças no fenómeno imigratório, entre as quais se destaca o rápido desenvolvimento de um novo fluxo da Europa de Leste e a aceleração dos imigrantes oriundos do Brasil. Em 31 de Dezembro de 2001, estima-se que viveriam em Portugal, sob situação regular, cerca de 335 000 estrangeiros (190 mil registados em 1999), maioritariamente do continente Africano (47,6%) e do continente Europeu (30,2%), o que representaria cerca de 3,3% da população total do país e destes, cerca de 260 000 teriam autorização de residência, beneficiando os restantes do novo estatuto de autorização de permanência 120. Até à recente emergência dos movimentos migratórios com origem na Europa de Leste e no Brasil, a imigração em Portugal era caracterizada pela existência de fluxos laborais e profissionais com origens distintas, nomeadamente trabalhadores qualificados da Europa e trabalhadores não qualificados das antigas colónias portuguesas. Hoje, segundo este autor (Ob. Cit., p. 162), observa-se uma diversificação dos sectores de trabalho da mão-de-obra, devido a factores do plano externo (destacada pressão emigratória nos países de origem dos migrantes, ou seja, factores repulsivos ao nível político e económico, bem como dinâmicas induzidas pela integração europeia, e neste caso tratarse-á de um elemento atractivo) e do plano interno (um tendencial envelhecimento e possível futuro esgotamento da mão-de-obra autóctone). Parece pois que Portugal tende à construção de uma imagem territorial positiva e atractiva, fruto da oferta de emprego em certas áreas e da rela120. Os dados apresentam sempre discrepâncias, dependendo pois da fonte que os fornece. O autor acima citado baseou-se em números fornecidos pelo SEF. Já o INE, afirma que em 2001 foram recenseados 226 715 indivíduos com nacionalidade estrangeira a residir em Portugal, representando 2,2% da população residente. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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tiva facilidade de entrada/permanência. O nosso país começa a despertar para a necessidade de acolher os imigrantes. No dia 16 de Março de 2004 121 foi criado o Centro de Apoio ao Imigrante (CAI), situado em Lisboa, na antiga Escola dos Anjos. A sua localização não foi em vão, quer na própria cidade/edifício, visto que partilha o edifício com o ACIME, quer no próprio país, na medida em que se localiza numa das regiões do território nacional onde estão fixados mais imigrantes. Também em 23 de Março de 2004 122 se procedeu à abertura da «Loja do Cidadão para o Imigrante», também em colaboração com o ACIME, projecto-piloto este que pretende apoiar o imigrante no sentido burocrático. Há pois uma crescente consciência para a necessidade de assumir a presença do imigrante. A conjuntura económica (no emprego) e política (no regime de autorizações de permanência/residência) serão áreas importantes, cuja evolução certamente contribuirá para a evolução dos fluxos e para o próprio processo de integração do imigrante. 2.2. Quem são os estrangeiros imigrantes que estão em Portugal? Uma caracterização A tentativa de caracterizar, ou melhor dizendo, de tentar traçar o perfil do estrangeiro imigrante que está em Portugal, ganha um estatuto ambivalente pensando que por um lado é necessário este estudo, de modo a melhor podermos avaliar a dinâmica, os problemas e potencialidades desta população. Por outro lado torna-se uma tarefa bastante difícil, na medida em que a crescente complexificação do fenómeno imigratório no nosso país dificulta o estabelecimento de uma matriz contínua. BAGANHA e GÓIS (1999, p.258) traçam um quadro geral médio que qualifica os imigrantes dos anos 90 em Portugal. De uma maneira geral, trata-se de mão-de-obra pouco qualificada, que por isso mesmo ocupa no mercado de trabalho funções pouco valorizadas, concentrando-se principalmente nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto (áreas de maior oferta de emprego), em proporções Homem/Mulher relativamente semelhantes 123. Como se pode verificar no gráfico seguinte, exceptuam-se o caso dos imigrantes da Índia e do Paquistão, onde o fluxo está masculinizado.

121. SIC, Jornal da Noite (20:00), 16 de Março de 2004. 122. SIC, Primeiro Jornal (13:00), 23 de Março de 2004. 123. Na década de 90, o rácio Homem/Mulher andava à volta dos 1,4. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Gráfico 10 – Rácio Homem/Mulher da população estrangeira, com contratos registados em Portugal continental para a obtenção de permanência, em 31/12/2001 100 90 80

Rácio

70 60 50 40 30 20 10 0

nia râ Uc

via ldá Mo

ia én m Ro

ia ss Rú

e rd Ve bo a C

la go An

País

au ss Bi én i Gu

il as Br

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ão ist qu Pa

ia Índ

Adaptado de PIRES (2002).

Domina o grupo etário dos 16 aos 64 anos, em especial os imigrantes entre os 25 e os 45 anos, que poderá engrossar modestamente a população activa. Já os imigrantes da Europa de Leste, dado o perfil etário andar entre os 30 e os 50 anos, virão antes engrossar a população activa mais velha. Os imigrantes africanos apresentam um contingente de jovens mais elevados comparando com os outros continentes, fruto de uma taxa de natalidade mais elevada e do facto de serem dos grupos migrantes mais numerosos e mais jovens em Portugal. Pelo contrário, o grupo dos europeus é o que apresenta um menor contingente jovem, mas um maior contingente idoso, fruto dos reformados que procura o nosso país para viver.

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Gráfico 11 – População estrangeira residente em Portugal, por continente e por grupos etários, em 1998

América

18%

80%

Continentes

2% Ásia e Oceania

80%

19%

1% África

37%

62% 1%

Europa

6%

89% 5%

0%

20%

40%

60%

80%

Percentagem de população

100%

0-14 anos 15-64 anos mais de 65 anos

Adaptado do MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA (1999), SEF (2001) e INE (2002).

Todavia, a diversificação dos grupos imigrados faz com que em Portugal, no início do século XXI, se altere o padrão médio que até então dominava. Hoje será então mais correcto identificar dois segmentos bipolares. O primeiro é composto por europeus e brasileiros, com um padrão residencial mais disperso, grupo esse onde se encontra uma elevada percentagem de empregados e empregadores por conta-própria. O peso das profissões científicas e técnicas, bem como de directores e quadros superiores administrativos, é notório. O segundo segmento é composto por imigrantes oriundos dos PALOP e de países como o Zaire, o Senegal, o Paquistão… espacialmente mais concentrados (nas áreas metropolitanas, nomeadamente na de Lisboa), ocupando a base da estrutura sócio-profissional portuguesa, também devido à baixa qualificação profissional que apresentam. A construção civil é o sector que emprega a maior parte dos indivíduos que constituem este último segmento, embora haja uma distribuição também por outros sectores de actividade, nomeadamente o comércio, hotelaria e restauração (brasileiros e chineses), serviços (indivíduos dos PALOP, no caso dos serviços domésticos; brasileiros ligados ao mundo da informática, publicidade e saúde), agricultura e indústria transformadora (europeus de leste). (PIRES, 2002, p. 161)

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Quadro 5 – População estrangeira com contratos registados para obtenção de autorização de permanência, por nacionalidade e sector de actividade, em 31/12/2001 (continente)

Europa de Leste PALOP

Comércio

Hotelaria e restauração

Serviços

N.o

%

%

%

%

%

%

Ucrânia

42 252

6.9

24,3

41,3

17,1

16,6

14,5

Moldávia

18 404

5,6

13,3

54,1

15,8

16,6

15,2

Roménia

16 926

6,5

18,9

53,4

15,5

16,6

19,1

Rússia

14 777

4,9

28,2

32,3

17,3

19,6

17,6

Cabo Verde

15 174

1,6

14,3

43,3

16,0

19,2

35,5

Angola

14 723

1,1

14,7

33,7

18,1

14,1

38,3

Guiné-Bissau

13 082

0,6

13,2

56,7

13,2

15,7

30,6

Brasil

22 426

1,8

17,8

25,5

12,2

22,1

30,6

China

43 203

2,2

14,5

13,5

27,3

57.5

15,1

Paquistão

42 784

3,3

15,1

58,5

17,3

13,8

22,4

Índia

42 670

1,8

11,4

57,5

17,5

17,7

24,7

Nacionalidades

OUTROS

Agricultura, Indústria pescas e Construção transformadora extractivas

Adaptado de PIRES (2002).

Quase toda a totalidade dos trabalhadores tem vínculos de trabalho precários e temporários. A verdade é que a economia informal se apresenta como uma forte concorrente da economia formal, o que aliado ao facto de muitos dos imigrantes projectarem uma migração temporária, fomenta a prevalência de laços precários e temporários. Isto não quer dizer que a migração não se venha a transformar em definitiva: a experiência do guest-worker nos países europeus após a Segunda Guerra Mundial, resultou na sistemática fixação dos imigrantes! MENEZES (1999, p.136) especifica mais o estudo, definindo o perfil do imigrante dos pólos industrializados.124 Normalmente tratam-se de indivíduos do sexo masculino que numa primeira fase imigram individualmente e só depois reunificam a família. Apresentam com baixas qualificações profissionais, ocupando lugares com condições precárias na indústria

124. Refere-se às áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, Faro, Setúbal e Aveiro. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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intensiva e na construção civil. As dificuldades de integração e a discriminação cultural e económica são notórias, tanto que a maioria vive nos bairros degradados dos subúrbios. Mas se fizermos uma comparação geral ao nível dos imigrantes/autóctones nacionais, constata-se que a proporção de população portuguesa que ocupa as categorias de «empresário» ou «trabalhador por conta-própria» é muito menor, comparativamente ao número de europeus e brasileiros. Tal acontece inversamente quando falamos dos imigrantes originários dos PALOP: verifica-se que os brasileiros e os europeus tendem a ocupar postos profissionais técnicos e directivos, enquanto que os imigrantes de origem africana desempenham profissões manuais 125. (BAGANHA, 1999, pp. 54 e 58) O crescente número de imigrantes, principalmente dos PALOP, foi determinado pelas oportunidades de emprego na construção e obras públicas, mas também pelo processo de legalização de 1992 e 1996, que no fundo, fez emergir um grande número de imigrantes ligados à economia informal. (BAGANHA, MARQUES e FONSECA, 2000, p. 29) A população imigrante em Portugal ocupa as franjas extremas do mercado de trabalho, que confirma a já referida tendência bipolarista. Por um lado, inclina-se para a parte mais alta da escala laboral (alguns brasileiros e europeus), por outro para a mais baixa (africanos e europeus de leste). (BAGANHA, 1999, p. 58) No que concerne aos brasileiros, e como já verificámos, muitos também se dedicam ao ramo da hotelaria e restauração, bem como os chineses e indianos, que também se encontram ligados ao comércio, conjuntamente com os moçambicanos. Neste caso, e visto que muitos deles não se encontram numa posição de subserviência mas sim como patrões, já ocupam uma posição mais intermédia no mercado de trabalho. Assim, coloca-se uma questão: não parece incompreensível que nas últimas duas décadas, à primeira vista, tenha havido uma afluência tão grande de imigrantes a Portugal, ainda que se registem níveis de desemprego relativamente significativos? Os próprios índices de mobilidade interna são baixos e a verdade é que continuam a sair emigrantes de Portugal. Tudo parece indicar que o nosso país não tem capacidade de absorção de mão-de-obra imigrante. Os censos de 1981 e 1991 indicaram que na área metropolitana de Lisboa, um dos locais onde se concentram mais imigrantes, houve até uma quebra de emprego na construção civil e nos serviços domésticos, ao contrário de algumas actividades terciárias onde 125. Exceptua-se deste grupo o caso de muitos moçambicanos, que se encontram estabelecidos por conta-própria no ramo do comércio. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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se registou um crescimento (comércio, seguros, finanças…). Este desenvolvimento localizado no sector terciário pode explicar a afluência de brasileiros e cidadãos da União Europeia. Os outros grupos, como os imigrantes dos PALOP e do Leste Europeu estiveram e estão ligados a grandes obras públicas 126, mas também a actividades da economia informal, daí que se explique a continuada afluência apesar de momentos de crise. Outras áreas económicas deprimidas, como a agricultura, embora com muito menor peso, estão a ser e poderão ser também a saída para alguns imigrantes (esta actividade já o é, em alguns casos, para imigrantes da UE – Holanda – e do Leste Europeu). Na economia há quem acredite que a construção civil é um ramo em desenvolvimento.127 Portugal ainda está muito longe da média europeia ao nível das infraestruturas, cenário que no futuro tenderá a reverter-se, não só porque os investimentos nos transportes estão a ser uma prioridade na União, mas também porque as nossas infraestruturas estão de certa forma desactualizadas e a necessitar de algumas reparações (o país poderá receber apoios do IV Quadro Comunitário para este efeito). Sendo assim, e calculando que a retoma será para 2006, este é um sector que certamente abrirá portas para o emprego de imigrantes. Remetendo-nos ainda ao caso da economia informal, verifica-se que esta desempenha um papel de destaque na maioria desta população, pois se por um lado pode aparecer como parte integrante da vida profissional do imigrante, por outro pode aparecer como parte complementar/paralela da actividade formal que este se encontra a desempenhar. Esta vertente da economia atinge transversalmente todos os imigrantes, independentemente dos cargos/postos de trabalho que ocupem. Nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto é comum encontrarem-se profissionais liberais com segundas actividades, as ditas «informais», ligadas à saúde, finanças, acessoria de empresas e educação, bem como profissionais não qualificados com actividades paralelas nos serviços domésticos, construção civil e comércio. Já no norte e centro do país, verifica-se também a combinação de certo tipo de actividades. No sexo masculino há o paralelismo entre actividades ligadas à agricultura com a indústria/construção civil/comércio, enquanto que no sexo feminino alia-se o trabalho domés-

126. Como por exemplo a Expo 98, o Euro 2004… 127. PÚBLICO, A construção está mal, mas recomenda-se, Secção mundo, 2.ª feira, 19 de Abril de 2004, em entrevista ao economista António Mazoni. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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tico/agricultura à indústria (por exemplo, de calçado, onde há possibilidade de realizar o trabalho em casa). Actividades ligadas ao turismo e à indústria alimentar também aparecem, em ambos os sexos, como uma alternativa de trabalho informal. (Ob. Cit., p. 59) BAGANHA, FERRÃO e MALHEIROS (2002, p.79) afirmam que a possibilidade de organizarem o trabalho desta forma é um factor de atracção que faz com que os imigrantes procurem o sul europeu, nomeadamente Portugal, como local de chegada, aliado a outras motivações como a proximidade linguística e cultural ou os laços coloniais e as políticas migratórias «menos restritivas» que no resto da Europa. Além do estatuto sócio-profissional, o estudo da formação/nível de instrução dos imigrantes também ajuda a traçar o seu perfil. Normalmente são os norte-americanos, os asiáticos (japoneses, coreanos, iranianos…), os europeus da União Europeia e alguns brasileiros que apresentam o nível de instrução mais elevado, adequado às funções por eles desempenhadas, como anteriormente se verificou. Quem apresenta um nível de instrução intermédio 128 são normalmente os chineses, os indianos e alguns brasileiros a trabalhar no ramo do comércio, restauração e hotelaria. Por fim é a comunidade africana que apresenta os níveis de instrução mais baixos, salientando-se os Cabo-Verdianos (são os que estão em maior número em Portugal), embora haja outros grupos com qualificações elevadas (por exemplo, os São-tomenses), que ocupam muitas vezes profissões desadequadas da sua formação. Apesar de tudo, e particularmente entre os imigrantes africanos, assiste-se a uma crescente formalização e precarização do trabalho, através de contratos a curto prazo, fruto não só da quase inexistência de equivalências académicas, ou pela parca formação profissional, como também à própria conjuntura do mercado de trabalho. (Ob. Cit., pp. 97 e 98) No fundo, a formação nem sempre corresponde à actividade desenvolvida. No caso dos brasileiros e dos europeus da União tal parece ser mais linear, na medida em que os cargos que ocupam correspondem às suas habilitações. Contudo, no caso dos europeus de leste e dos São-tomenses não há essa equivalência. Tal tendência poderá ser resultado do estabelecimento de relações mais estreitas entre países, no caso dos brasileiros, o que também se poderia verificar no caso dos São-tomenses, visto tratar-se de um país de língua oficial portuguesa e do governo tanto anunciar a necessidade do estabelecimento de laços e relações com os

128. Considera-se intermédio-baixo. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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PALOP. No caso dos imigrantes da União Europeia a sua situação será promovida pelo facto de pertencermos a uma mesma unidade económica, social… Já nos europeus de leste, o facto de ser um grupo recente, pode ainda não ter despertado a consciência de ambas as partes (empregadores e imigrantes empregados) e do próprio Estado para a atribuição de equivalências e posterior abertura a outros segmentos do mercado de trabalho. Por outro lado o receio da concorrência pode levar alguns segmentos a preferir não considerar as suas habilitações. Deve-se porém ter em atenção que as funções que cada grupo ocupa neste mesmo mercado também estarão condicionadas pela conjuntura económica actual e pela capacidade de imposição /competitividade de cada grupo. No entanto cada grupo apresenta características particulares que carecem de alguma reflexão. Referindo-se ao grupo dos imigrantes africanos, MORÉN-ALEGRET (2001, p. 141) defende que a presença destes em Portugal, como o grupo imigratório mais antigo, faz-se sentir no seu poder associativo. Realmente são estes que detêm o monopólio das associações de imigrantes no nosso país, não só pela longevidade de permanência, mas também devido às relações afectivo-culturais, que lhes deu uma maior percepção da realidade. A sua participação foi por isso notória no Seminário promovido pelo Conselho de Ministros sobre o tema «A participação cívica dos imigrantes» realizado no dia 5 de Abril de 2004.129 Ficou expressa a necessidade de apoio para a integração dos estrangeiros, bem como a participação do imigrante ao nível local e regional, aspectos esses que deverão ser contemplados numa política comum. Prevê-se que até ao final deste ano abram mais 20 centros de apoio ao imigrante, contudo o papel associativo não deixa de ser muito importante para a integração. Este autor acrescenta ainda que Portugal poderá ser a ponte para o processo de desenvolvimento dos países de origem deste grupo de imigrantes (desenvolvimento ou «ocidentalização»?): Lisboa poderá ter por isso um papel preponderante, visto ter uma personalidade única , comparada com outras cidades do sul da Europa (é um «enclave» de influência atlântica e mediterrânica), onde impera o «cosmopolitismo colonial». (Ob. Cit., 2001, p. 143)

129. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Imigrantes pedem apoio, Secção sociedade, Domingo, 6 de Abril de 2004. 130. Já frei Nicolau Oliveira, no séc. XVII, considerava esta cidade como a principal do reino, a mais populosa da Europa e quiçá do mundo. Os seus ares suavíssimos, saudáveis e temperados faziam com que muitas pessoas a escolhessem para convalescer de certas doenças. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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MACHADO (2001, p.180) afirma que daqueles que se fixaram nesta área, em 1999, cerca de 95% eram oriundos dos PALOP. Na década de 90, a taxa de crescimento global foi de 133%, sendo que de uma maneira mais específica o grupo dos imigrantes guineenses aumentou 453% e o grupo dos imigrantes angolanos aumentou 339% (houve uma ligeira quebra da hegemonia cabo-verdiana). Dos 100000 a 130000 que se estima existirem em Portugal, apresentam heterogeneidades internas, principalmente ao nível das actividades desempenhadas. Normalmente os PALOP da costa Atlântica estão ligados a segmentos mais baixos do mercado de trabalho (construção civil), enquanto que os da costa do Índico se encontram mais ligados ao comércio. PIRES (2003, p.147) encontra um ponto em comum entre estes e o grupo de imigrantes dos países da União Europeia, ou seja, cruza-se o facto da maioria trabalhar por contratos temporários, os primeiros nos segmentos mais baixos do mercado, os últimos nos segmentos mais elevados. Os imigrantes da União apresentam uma maior preferência por Lisboa e pelo Algarve, onde exercem funções ligadas a quadros técnicos e científicos. Em Lisboa a fixação resulta do cruzamento entre o carácter macrocéfalo do país que aí faz concentrar boa parte do capital e das instituições, com o perfil sócio-profissional destes imigrantes. No Algarve exercem funções ligadas ao turismo, prevalecendo aqui um número significativo de reformados. Porém o estereótipo do europeu ocidental rico e empreendedor nem sempre se verifica, na medida em que muitos desempenham funções por conta de outrem (por exemplo, nos serviços domésticos…) ou são estudantes. ROCHA (2001, p. 182) No caso do grupo dos imigrantes brasileiros, se antes eram considerados como uma «contra-corrente migratória», hoje certamente já serão mais do que isso. (PIRES, 2003, p.151) Até aos anos 80, a emigração económica no Brasil era quase inexistente, sendo até aí um país receptor. No entanto, é a partir dessa data que a vinda para a Europa, em especial para Portugal, ganha um novo significado devido a motivações específicas, ligadas com a língua, com os laços familiares e culturais, com os investimentos económicos brasileiros feitos em território luso, com a formação de «nichos» de mercado em sectores específicos (saúde, informática…) e com o facto da imagem territorial ser construída com base na ideia de que Portugal poderia ser a «porta de entrada» para a Europa. Normalmente trata-se de uma população jovem (entre os 18 e os 39 anos), de ambos os sexos, com origem nos principais Estados (São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro). A diversidade social é evidente (tanto ocupam profissões altamente qualificadas como funções nas franjas mais baixas do mercado de trabalho) tratando-se normalmente de migrações temporárias. Hoje em Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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dia nota-se um crescimento geral dos imigrantes legalizados, bem como dos indocumentados. (VIANNA, 2001, pp. 180 e 181) O grupo de imigrantes asiáticos ainda apresenta números modestos, apesar das tendências de aumento. São principalmente chineses e indianos, sendo que estes últimos já apresentavam ligações com Moçambique, no que concerne ao nível comercial. Os chineses são um grupo de imigração mais recente, estando fixados com maior significado na área metropolitana de Lisboa, mas com um pólo expressivo no Porto (constituem pequenas empresas familiares no comércio e restauração). (PIRES, 2003, pp. 153 e 154) No caso do grupo de imigrantes da Europa Central/Leste, LOPES (1999, p. 104) diz ter sido decisivo a destruturação dos regimes económicos e políticos dos seus países de origem. A posterior emergência de uma nova corrente imigratória, veio operar uma viragem histórica nos movimentos migratórios daquela região da Europa, dando-lhes uma maior densidade e complexidade. Foi um fluxo que praticamente se iniciou nos anos 90, tendo vindo a ganhar grande proporção nos anos subsequentes. Muitos deles vivem em situação irregular e vêm ao nosso país para fugir à instabilidade económica e política dos seus locais de origem. Originários principalmente da Roménia, Moldávia, Ucrânia, Rússia, Bulgária, Geórgia, Bielorrússia e Letónia, entram no espaço Schengen através da fronteira da Áustria, Alemanha, Holanda ou França, por via aérea, apresentando vistos de turista, e dirigindo-se para Portugal por via terrestre (carrinhas, autocarros, combóios ou até táxis!). Podemos destacar, entre eles: – Moldavos – Com o 10.º ou 11.º ano, exercem funções de operários e mecânicos, tendo muitos vindo do espaço rural. Não é muito comum encontrarem-se profissionais liberais desta nacionalidade, onde a média de idades anda à volta dos 40 anos. Normalmente não se fazem acompanhar pela família e se o fazem é só numa fase posterior da migração; – Romenos – Apresentam formação superior técnica (existência de muitos engenheiros), mas idades inferiores ao grupo anteriormente referido. Muito ligados à família, acabam por se fazer acompanhar por ela no seu processo migratório; – Ucranianos – Também com formação académica superior, é comum encontrarem-se médicos, pilotos da força aérea, oficiais na reserva, empregados da função pública. As suas idades andam à volta dos 35/40 anos e é uma nacionalidade onde se Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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encontra o maior contingente de mulheres com formação académica superior; – Búlgaros – São aqueles que apresentam um nível cultural mais elevado, muitos deles ligados às artes. Tratam-se de países onde o fenómeno imigratório é muito recente e onde a motivação dominante é de cariz económico: um salário como servente (média de 750 euros) corresponde a 10 meses de um salário médio na Roménia! (PORTELLA, 2001, pp.184 e 185) Ainda nesta análise, as mulheres apresentam-se como um grupo que, apesar de quantitativamente inferior ao sexo masculino, como se pode constatar no gráfico seguinte 131, ao longo dos anos, têm vindo a representar um papel activo no total da população imigrante. BRITO (2001, p.189) realizou um estudo sobre a temática, onde concluiu que, em Portugal, estas imigrantes se incluíam no grupo etário jovem (entre os 20 e os 35 anos), apresentando-se solteiras nas idades mais baixas e casadas nas idades mais avançadas. Em média têm um ou dois filhos (exceptuando o caso das mulheres originárias dos PALOP, que têm mais), o que ao contrário do que alguns autores defendem, não altera de todo a estrutura demográfica portuguesa em termos de rejuvenescimento populacional. Normalmente têm uma situação precária no mercado de trabalho, fomentado por contratos de trabalho temporários (muitas vezes no mercado informal) e por não beneficiarem, salvo algumas excepções, de grande formação profissional. Por isso desempenham profissões das franjas mais baixas do mercado de trabalho (serviços de limpeza, restauração, indústria…).

131. Não existem dados para 1990 e 1993. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Gráfico 12- Evolução da população estrangeira residente, por sexo, entre 1986-2002 Homens Mulheres

Número de estrangeiros

140 000 120 000 100 000 80 000 60 000 40 000 20 000

19 86 19 87 19 88 19 89 19 90 19 91 19 92 19 93 19 94 19 95 19 96 19 97 19 98 19 99 20 00 20 01 20 02

0

Anos

Adaptado do INE (2003) – Site da Web.

Em suma, verifica-se uma tendencial diversificação da nacionalidade dos imigrantes da União Europeia (italianos, holandeses, alemães, franceses…) e a emergência de novos grupos, como é o caso dos originários da Europa de Leste, bem como no próprio contingente de imigrantes africanos (mais Guineenses e São-tomenses…, embora correspondam a reduzidos valores absolutos), a par da relevância que cada vez mais tende a ganhar a corrente migratória vinda da Ásia e do Brasil. (BAGANHA, FERRÃO e MALHEIROS, 2002, p.90) No caso dos imigrantes do Leste Europeu, o processo de regularização extraordinária de Janeiro de 2001 promoveu o aparecimento de um largo número de candidatos desta origem, o que deixa antever a preponderância que este grupo poderá ter nos próximos tempos. Portugal revelou, até ao final da década de 90, uma descida da taxa de desemprego (passou de 7,3% em 1995 para 3,8% em 2000, mostrando entretanto uma tendência oscilatória). (ROCHA-TRINDADE, 2002, pp. 151 e 154) Tudo indica pois que, durante os próximos anos, haverá necessidade de recorrer a mão-de-obra estrangeira, quer porque a população activa tenderá a diminuir, quer pela possível maior exigência por parte de sectores como a agricultura, indústria e principalmente a construção civil. Interessante será ainda fazer uma breve referência à bibliografia consultada para as reflexões discutidas neste capítulo. Refira-se que a esmagadora maioria dos autores faz apenas uma caracterização do imigrante baseada nas características económico-profissionais, deixando para Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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segundo plano as características demográficas (em termos de sexo, idade…) e sociais (em termos de condições de habitação, saúde…). Esta prevalência pode ser reveladora de interesses, nomeadamente de uma atitude defensiva face ao poder concorrencial que esta mão-de-obra poderá denunciar ao lado dos nacionais. No entanto, seria também benéfico um estudo mais aprofundado de outro tipo de características (nomeadamente demográficas), no sentido de conhecer a fundo o Outro que connosco convive. 2.3. Onde estão os estrangeiros imigrados em Portugal? Distribuição geográfica É interessante observar o mapa com a distribuição dos estrangeiros imigrados em Portugal, até porque não se afasta muito das direcções tomadas pelas migrações internas nacionais. As áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e a faixa litoral parecem ser os espaços de eleição para a fixação destes fluxos, até porque são os locais onde a quantidade e diversidade de emprego é maior, e consequentemente o grau de atracção. Mapa 2 – Percentagem de população estrangeira residente, por distritos de Portugal continental, em 2002

Percentagem de população estrangeira 1% a 2% 2% a 4% 4% a 13% 13% a 51%

0

Adaptado do INE (2003). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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50 km

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Segundo BAGANHA, FERRÃO e MALHEIROS (2002, pp. 9, 93 e 94), a área metropolitana de Lisboa concentra cerca de dois terços dos estrangeiros residentes em Portugal. Nesta bacia de emprego, podemos distinguir padrões de distribuição mais ou menos concentrados, dependendo do grupo de imigrantes que estamos a considerar. Por exemplo, estes autores verificaram que os europeus mediterrânicos (franceses, italianos e espanhóis) estão fortemente concentrados na área metropolitana de Lisboa, a par dos afro-asiáticos (neste caso, gerando até situações de segregação e exclusão social). Já os europeus do norte dispersam-se mais além desta área, ou seja, os alemães e ingleses tendem também a fixar-se na área metropolitana do Porto e no caso de serem reformados, procuram o Algarve. Os holandeses radicam-se também nos distritos de Évora e Beja (ligados à agricultura). Já no caso dos norte-americanos, as ligações com os antepassados açorianos orientam-se para este arquipélago, ao passo que os brasileiros se dispersam pela área metropolitana de Lisboa e pela região norte. O padrão de distribuição parece variar em função da nacionalidade. Em 1998 é certo que a maioria dos estrangeiros com autorização de residência vivia na capital, porém a região do Algarve já era considerada a segunda região de atracção, principalmente para imigrantes da União Europeia (técnicos e empresários). Setúbal também é um distrito, que a par de Lisboa, concentra um número significativo de imigrantes (indivíduos dos PALOP que trabalham essencialmente na construção e obras públicas). No entanto, e apesar da região de Lisboa ter um peso significativo, como se pode constatar no gráfico, hoje em dia já se assiste a uma maior dispersão geográfica no território nacional, promovida em grande parte pelos fluxos do Leste Europeu, os quais não são compatíveis com as dinâmicas clássicas de constituição de fileiras migratórias suportadas por redes de migrantes territorialmente concentrados. (PIRES, 2002, pp. 155 e 160) Gráfico 13 – Distribuição da população estrangeira, por NUT II, em 2002 Região do Algarve 13% Região Sul 1%

Regiões Autónomas Região Norte 2% 9% Região Centro 9%

Região de Lisboa 66%

Adaptado do INE (2003). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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A verdade é que cada vez mais se procuram oportunidades de emprego noutros sectores. Não se tratam de grandes grupos mas antes de casos relativamente pontuais, pequenos grupos de conhecidos ou casais que procuram trabalho como “caseiros” ou noutras actividades ligadas à agricultura, e também às pequenas indústrias do interior do país. De qualquer forma, a esporacidade destes casos está a tornar-se cada vez mais regular. Este é um cenário que contrasta com o dos anos 70, em que Portugal se vê confrontado com fluxos mais significativos, ligados a um passado colonial com África, o que se traduziu e traduz em laços culturais e espirituais entre o país de partida e o país de acolhimento. Nessa época verificava-se uma distribuição geográfica pelos distritos industrializados/pólos de atracção, nomeadamente Lisboa, Porto, Setúbal, Aveiro e Faro. (MENEZES, 1999, p. 135) Todavia ainda é difícil estabelecer a cartografia exacta da fixação dos imigrantes no nosso país, devido ao elevado número daqueles que se encontram em situação irregular/clandestina132. Mapa 3 – Proporção de população de nacionalidade estrangeira, por NUT III, em 2001

N

Percentagem ]2.1; 6.0) ]1.2; 2.1) ]1,1; 1,2) ]0.8; 1,1) ]0.5; 0.8) NUTS II

0 30 60 km

Fonte: INE (2002). 132. No mapa é revelado a «Proporção de população de nacionalidade estrangeira, por NUT III, em 2001», ou seja, o número de estrangeiros residentes por cada 100 habitantes. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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A tendência é para que se verifique o aumento do número de imigrantes e a sua possível dispersão no espaço. A procura do litoral mantém-se, no entanto observa-se que algumas regiões do interior deprimido começam a receber alguns imigrantes, nomeadamente do Leste Europeu, como é o caso da Beira Interior Norte, Alto de Trás-os-Montes, Alentejo Central, Baixo Alentejo. Há a procura de novas oportunidades, nas PME 133, nalgumas actividades agrícolas e claro está, também na construção civil e nos serviços domésticos. Refira-se que o trabalho de apoio a idosos, num interior tão desfavorecido e carente, poderá ser um sector a explorar. Actualmente há a crescente procura, por parte de particulares, de indivíduos que possam acompanhar e prestar serviços/apoio às tarefas do dia-a-dia dos idosos, especialmente dos que estão acamados. Claro que haverá certamente um pouco de renitência pelo facto de ser tratarem de indivíduos estrangeiros, contudo a necessidade deste tipo de serviços (em termos de procura) e o poder de flexibilidade laboral de alguns grupos (por exemplo, dos imigrantes de Leste), poderá levar a que esta se torne uma área de potencial desenvolvimento. PIRES (2003, pp. 136 e 137) refere que, de uma maneira geral, o crescimento dos fluxos foi acompanhado por um relativo incremento da intervenção estatal, de início com carácter pontual e defensivo, centrado no controlo das entradas, mas que depois já na segunda metade dos anos 90, apresentava uma componente mais reguladora e alargada ao domínio da integração dos imigrantes. De qualquer forma, esta é uma opinião que não é de todo partilhada por muitos autores, tal como MENEZES (1999, pp.137 e 144) que alerta para o facto de hoje podermos ser nós a explorar os imigrantes, tal como nos anos 60 os nossos emigrantes foram explorados na Europa, ao nível sócio-profissional. Segundo este autor, o Estado português só assumiu responsabilidades, em parte devido a directivas da União Europeia. Realizou-se em 1992 um primeiro e atribulado processo de legalização, onde foram regularizados cerca de 47000 estrangeiros 134. Em 1996 decorreu o segundo processo, com maior transparência e empenho que o anterior, mesmo por parte do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. No entanto parece ser necessário mais do que simples processos de regularização, ou seja, o reforço da fiscalização do trabalho, e também uma política social que promova a integração.

133. PME – Pequenas e Médias Empresas, de carácter tradicional e familiar. 134. Refere que, apesar de tudo, ainda se trata de um número incipiente, dado o conhecimento oficial de que existiriam muitos mais imigrantes em situação irregular. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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FONSECA, CALDEIRA e ESTEVES (2002, pp.54 e 150) afirmam que temos um país socialmente diversificado e etnicamente rico 135. O conceito de «Europa com grau de imigração 0» é totalmente ineficiente, o que leva a que necessitemos de uma política comum europeia de migração. O Conselho de Tampere (1999) tenta exaurir esta ideia, estabelecendo parcerias com países emissores de imigrantes. Portugal ultimamente, na sua política, tenta equilibrar as restrições às entradas (Acordo de Schengen), bem como influenciar os parceiros europeus a adoptar políticas migratórias abertas, facilitando a atribuição de documentação, de forma a minimizar o problema da imigração ilegal. No quadro institucional, parece haver vontade (ou necessidade) de integrar os imigrantes, sendo fundamental o apoio de organizações e instituições. Porém revelam-se ainda muitas situações de exploração, falta de informação e pouca abertura. 2.4. Que futuro para Portugal imigrante/da imigração? E perante este cenário, quais são as perspectivas? FERNANDES, TOMÁS e CRAVIDÃO (2002, p. 98) afirmam que da integração saudável da imigração e do modo como se encara o território e a sua territorialidade, dependerá o seu desenvolvimento. Na verdade, a geografia de Portugal não passa apenas pelas «geografias da emigração», mas também pelos territórios da imigração. Não podemos pois descurar que os imigrantes tenderão a ser uma parte cada vez mais integrante da vida nacional e isso significa que se tal passe não só ao nível laboral, como também a outros níveis da vida em geral. Há necessidade de analisar a questão em toda a sua abrangência social, económica, demográfica, cultural… A forma de ver o Outro também vai mudando, não derivado do contacto com este, mas também pelo papel do imigrante na vida portuguesa, e a forma como que é visto por parte do Estado, instituições, opinião pública, enfim, pela população em geral. O último alargamento poderá ser o motor desta progressiva tendência, ao contribuir para a construção da imagem do imigrante, numa perspectiva de progressiva abertura ao novo Outro. Portugal precisa de se preparar, a todos os níveis, para receber imigrantes. MALHEIROS (1996, pp. 203 à 205) identificou já uma nova fase no ciclo de imigração para o nosso país, que o vem libertar da pressão directa e imediata da descolonização. Neste caso, e visto o distanciamento histórico-cultural (se é que este é suficiente), já se poderá reflectir melhor sobre as próprias exigências do mercado de emprego e sobre as transformações do país no contexto 135. Essa diversificação e riqueza tendem a aumentar com a vinda de mais imigrantes. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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das migrações internacionais. Este autor defende ainda que será necessário o recrutamento de técnicos superiores especializados, bem como de trabalhadores para sectores de elevado grau de flexibilidade (como é o caso da construção civil). A verdade é que o governo já se apercebeu desta necessidade, ao anunciar publicamente em 13 de Abril deste ano que entrará em vigor um novo modelo de financiamento do sistema científico, que inclui o pagamento de um complemento de retorno a investigadores nacionais no estrangeiro, ou até mesmo a investigadores estrangeiros 136. Mas não será só a imigração destes grupos a questão relevante. FONSECA, MALHEIROS, ESTEVES e CALDEIRA (2002, p. 106) opinam que continuará a pressão imigratória em Portugal por parte dos indivíduos originários dos PALOP, também devido à impossibilidade de, politicamente, se poder parar a imigração dos países lusófonos. Por outro lado, a tendencial reunificação familiar dos imigrantes do Leste Europeu fomentará os quantitativos migratórios. RATO (2001, p. 195) afirma ainda que a imigração asiática tenderá a dar cartas nos fluxos imigratórios portugueses. Na década de 90 registou-se uma taxa de crescimento deste grupo, na ordem dos 110%, o que revela o surgimento de uma nova fileira de imigração, esta mais orientada para a prestação de serviços no âmbito da hotelaria e restauração. É certo que representam um quantitativo pouco significativo no total dos imigrantes, mas a verdade é que tal pode vir a alterar-se nos próximos tempos. Gráfico14 – Evolução da população estrangeira residente em Portugal, por continente, entre 1980 e 2001 Anos

N.o de população estrangeira

120 000 100 000 80 000

2002

1980

60 000 40 000 20 000

Europa África

0

Ásia 2001

1990

América Oceania

1998

2000

Adaptado de MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA (1999), SEF (2001) e INE (2002). 136. PÚBLICO, Cientistas vão receber dinheiro para voltar a Portugal, Secção sociedadeciências, quarta-feira, 14 de Abril de 2004. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Observando o gráfico, verificamos que houve um aumento do número de imigrantes de todos os continentes (excepto da Oceânia, onde permaneceu uma certa estagnação). Foi o grupo dos imigrantes europeus e africanos que mais se destacaram, com um crescimento mais acentuado. A manter a tendência, confirmar-se-á a ideia anteriormente defendida do desenvolvimento de fortes fluxos imigratórios de imigrantes dos PALOP e da Europa de Leste. Por outro lado, augura-se a tendência para o aumento das migrações temporárias e das estratégias de circulação migratória, o que poderá ser uma resposta às oscilações sazonais e conjunturais de determinados segmentos do mercado de trabalho. Contudo este fenómeno poderá potenciar o trabalho clandestino e a exploração dos trabalhadores, daí que será de todo essencial uma política de imigração assente numa forte componente de natureza social, que dê atenção tanto aos grupos migratórios em si, como também aos seus descendentes. (FONSECA, 2002, p. 370) Por outro lado esta política deverá também ter em conta, segundo MALHEIROS (1996, p. 205) o combate à discriminação, principalmente na área metropolitana de Lisboa. Não se deverá só pensar na perspectiva de acolher os imigrantes, senão também de promover a sua integração na comunidade. Prever as dinâmicas e dimensões dos fluxos migratórios é bastante difícil. FONSECA (2002, p. 367) refere-se a isso quando afirma que o novo regime das migrações internacionais e os aspectos inovadores que o caracterizam, apresentam um carácter fortemente imprevisível, pelo que se torna difícil encontrar mecanismos de regulação eficazes. Irá continuar, segundo a autora, a pressão emergente dos movimentos de extremadireita quanto à questão do desemprego, apesar de no Conselho de Lisboa se ter reconhecido a falta de mão-de-obra, mais especificamente de profissionais altamente qualificados e de trabalhadores indiferenciados. A considerar as perspectivas de crescimento do emprego no sector da construção (prosseguimento das obras públicas financiadas pelos fundos estruturais comunitários), é natural que a necessidade de mão-de-obra seja até superior à indicada. Vaticina-se que a concorrência entre os imigrantes dos PALOP e os Europeus de Leste: preferirão os empregadores estes segundos, pelo seu trato e nível cultural? (Ob. Cit., p. 369) MALHEIROS (1996, pp. 204 e 205) já previra há algum tempo a manutenção do ritmo de chegadas, sem grandes acelerações ou até com uma aceleração ténue, sendo possível a maior diversificação das origens, em virtude do processo de mundialização dos fluxos de migrantes. Tal Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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tendência tem vindo a ser verificada por FONSECA, MALHEIROS, ESTEVES e CALDEIRA (2002, p.107), prevendo-se até uma reactivação da emigração devido à conjuntura económica. É certo que a oferta de emprego oscila e que o Decreto-Lei n.º 304/2003 é mais restritivo nas entradas e mais «dinâmico» nas expulsões. Contudo devemos ter em conta alguns factores importantes. Em primeiro lugar, verifica-se a tendência para o incremento das migrações temporárias, o que em certa medida é favorável porque será uma forma de resposta às necessidades de alguns sectores de actividade mais flexíveis e porque não implicará encargos sociais a longo prazo (por exemplo, a reforma). Por outro lado, esta situação pode fomentar a exploração de trabalhadores, uma vez que o imigrante quer ganhar dinheiro depressa, sem passar pelas necessárias fases «burocráticas», sujeitando-se desta forma a condições de trabalho precárias. Em segundo lugar, o envelhecimento populacional tenderá a acentuar-se e será necessária mão-de-obra jovem que possa responder não só às necessidades do mercado de trabalho, como também poderá vir a contribuir para suprir os encargos sociais com a população mais velha. Em 2001, a taxa de actividade em Portugal andava à volta dos 48,19% (54,8% nos Homens e 42,0% nas mulheres). Gráfico 15 – População estrangeira residente em Portugal, por continente e pela condição perante o trabalho, em 1998

54% América

46%

Continentes

48% Ásia e Oceania

52% 45%

África

55% 45%

Europa

0%

55%

20%

40%

60%

80%

100% Activo

Percentagem de população

Não Activo

Adaptado do MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA (1999), SEF (2001) e INE (2002).

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Como podemos constatar no gráfico, a população portuguesa apresenta um número de activos mais baixo, relativamente à maioria dos grupos imigrados no nosso país. Além disso, muitos daqueles que engrossam o conjunto dos «não-activos», certamente farão parte do contingente que desempenha tarefas precárias em actividades da economia informal, daí que o número real de activos possa ser mais elevado do que realmente é sugerido. Há ainda que ter em atenção o facto de que esta conjuntura possa favorecer a imigração ilegal/clandestina. Defender o «grau de imigração 0», como já se fala, é praticamente impossível. Os movimentos migratórios são intrinsecamente dinâmicos, o que por si só afasta a possibilidade de um fluxo poder ser travado. A imigração, portanto, continuaria, independentemente desta política, no entanto com um carácter clandestino, com todos os efeitos nefastos que esta inclui. As quotas imigratórias poderão ser uma forma de «travar» a imigração, porém com efeitos menos perniciosos, visto que apostam na legalização. Portugal abriu em 2004 cerca de 8500 vagas para a entrada de imigrantes. Estes teriam direito à obtenção de um visto de trabalho e residência. Incrivelmente, a este número de vagas, apenas concorreram 17 candidatos, tendo sido apenas admitido um ucraniano, um moldavo e um brasileiro (para trabalharem como agricultor, copeiro e escriturário, respectivamente). A crise económica que cada vez mais limita o número de empregos, a falta de informação e a inoperacidade dos acordos bilaterais estabelecidos para este fim, parecem ter sido os motivos principais para o falhanço deste processo.137 Será necessário por isso apostar numa política migratória e social eficaz que contemple não só Portugal como país receptor, como o país emissor, o próprio espaço da União Europeia, o local de partida dos fluxos imigratórios e, é claro, um elemento essencial neste processo – o Imigrante!

137. SIC, Jornal da Tarde (13:00), 28 de Setembro de 2004, terça-feira. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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III – ESTUDO DO CASO DOS IMIGRANTES DA EUROPA DE LESTE NO CONCELHO DE VILA VIÇOSA Sumário: Neste capítulo é apresentado o resultado do estudo da comunidade da Europa de Leste que se instalou em Vila Viçosa, com especial destaque para o grupo dominante, os moldavos. Tentam-se conhecer as motivações, o quotidiano e os planos futuros destes imigrantes neste concelho. Além disso, procura-se estudar a visão que a comunidade autóctone tem da imigração em geral e deste grupo em particular. 1. A DINÂMICA DO CONCELHO EM ESTUDO 1.1. Breve olhar pelo concelho de Vila Viçosa Quando há uma excepção aquilo que é regra geral, a busca das razões torna-se um imperativo. É certo que a grande maioria dos imigrantes se fixa essencialmente nas regiões do litoral norte, Algarve e áreas metropolitanas. Contudo, verifica-se a existência de excepções a este cenário, como é o caso de um grupo de imigrantes da Europa de Leste, que se veio fixar num concelho do interior de Portugal, mais precisamente no concelho de Vila Viçosa, no Alentejo Central. Catalogada com epítetos depreciativos, esta região padece de problemas como a saída de população o Mapa 4 – Localização do concelho em estudo

N

Vila Viçosa

0

50 km

Elaboração própria (2004). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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envelhecimento demográfico ou o despovoamento. Sendo estes apenas dois dos problemas que pertencem a um vasto rol sócio-económico, será pertinente tratar a questão do porquê da instalação deste grupo de imigrantes logo aqui, num dos concelhos de uma das ditas regiões mais pobres da Europa. Desta forma, tentar-se-á encontrar algumas pistas, a partir de um olhar feito ao concelho em estudo, na tentativa de conhecer um pouco mais da sua dinâmica. Vila Viçosa (constituída pelas freguesias de Bencatel, Pardais, Ciladas, Conceição e S.Bartolomeu) é um dos concelhos do Alentejo Central, pertencente ao distrito de Évora. Faz fronteira a sul com o Alandroal, a oeste com o Redondo e Borba e a nordeste com Espanha, distando cerca de 45 km de Évora. Pertence, conjuntamente com Borba e Estremoz, aos designados «concelhos dos mármores», devido à riqueza mineral do seu subsolo e consequente à preponderância da indústria extractiva do mármore, de que mais adiante se falará. Mapa 5 – População residente no concelho de Vila Viçosa, por freguesias, em 2001

N

Ciladas

Conceição S. Bartolomeu

Bencatel

Pardais

0

5 km

Legenda: N.o de Habitantes < 1078

> = 1078 e < 1150

> = 1150 e < 1720

> = 1720 e < 4364

> = 4364

Resultado Nulo

Fonte: INE (2001).

Este concelho está inserido numa região que tem sofrido um intenso processo de despovoamento nas últimas décadas, o que acentua a sua posiFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ção marginal face à faixa litoral. Porém, certos problemas associados às regiões do interior português não se têm feito sentir de forma tão negativa, pois alguns factores económicos e sociais imprimem uma dinâmica diferente do habitual para estes espaços. Por exemplo, entre os períodos de 1960 e 1991, registou um decréscimo populacional de 14,4%, o que apesar de ser um valor relativamente elevado, não superou o distrito de Évora, que no mesmo período perdeu cerca de 21% de residentes, ou então o concelho vizinho de Estremoz, que perdeu 34% de residentes. Entre 1991 e 2001, o decréscimo populacional foi menos intenso (2,2%) do que nas décadas anteriores. No PDM 138 de Vila Viçosa, elaborado no início dos anos 90, previa-se que o concelho perdesse nos 10 anos subsequentes cerca de 100 habitantes. Na realidade veio a perder quase que o dobro (197 habitantes), porém já neste documento se previa que o saldo migratório 139 poderia compensar, ou pelo menos diminuir eventuais perdas populacionais que se tinham verificado em décadas anteriores. O factor de «atracção» seria, segundo o PDM, a concentração de unidades de comércio e serviços, muitos dos quais se encontram relacionados com a actividade de extracção do mármore. Esta é pois a actividade económica que imprime o cunho e a particularidade a este concelho e à própria estrutura do emprego. Trata-se de um sector que tem sido fonte de emprego para muitos indivíduos do sexo masculino, havendo poucos lugares destinados para o sexo feminino. É um sector cuja dureza das tarefas exige mão-de-obra masculina, o que se assegura como uma desvantagem para as mulheres. Daí encontramos uma maior sazonalidade no emprego do sexo feminino, já que muitas delas acabam por se ligar à agricultura, em tarefas relacionadas com as vinhas, sector de alguma relevância no concelho, aos serviços ou então são dadas como domésticas. A indústria extractiva tem vindo a crescer nas últimas décadas, sendo cada vez mais comum neste concelho as paisagens dominadas pelo branco marmóreo das pedreiras, ou melhor dizendo, pelos restos dos materiais extraídos que se vão acumulando em montes adjacentes à pedreira, e por enormes «buracos» que esventram inconsequentemente a paisagem. Em 1960, cerca de 9% da população activa do concelho trabalhava na indústria extractiva, número esse que veio a aumentar, visto que em 1981 já 27% da população activa trabalhava nesse ramo. 138. PDM – Plano Director Municipal. 139. Neste caso, previa-se uma diminuição da emigração e não propriamente um aumento da imigração. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Até 2001 esse número diminuiu, já que actualmente só cerca de 16% da população trabalha neste sector. Contudo, está-se a considerar a população activa residente, excluindo aqueles que chegam de fora do concelho para trabalhar, e os imigrantes que ainda não se encontram com a sua situação regularizada e que por isso poderão engrossar estes números. A mecanização da actividade e o crescimento do sector primário, bem como a própria saída da população do concelho, também faz com que este número tenha diminuído, embora o peso na economia do concelho se mantenha. O que se tem mesmo verificado é que apesar da indústria extractiva ver a sua importância relativa diminuída, o volume do emprego tem vindo a aumentar, embora a um ritmo inferior a anos anteriores. É certo que o retrato deste concelho, quando é feito, quase sempre é monopolizado por reflexões sobre a evolução e situação do sector da indústria extractiva do mármore já que, directa ou indirectamente, interfere com a dinâmica da comunidade a praticamente todos os níveis. Acaba por influenciar Vila Viçosa não só económica, como ambiental, social e até demograficamente. Se já viveu do esplendor régio 140 e se hoje tal não acontece, pelo menos aproveita os seus símbolos para promover o turismo que, timidamente, começa a dar algumas cartas, mas ainda poucos empregos na região. Até agora, esta análise tem-se pautado por uma perspectiva claramente economicista, já que este é o ponto que melhor poderá caracterizar este concelho. No entanto outros indicadores poderão ajudar a fazer um retrato mais claro e preciso, tendo em linha de conta a perspectiva comparada com o restante Alentejo e com o próprio país. 1.2. Situação comparativa: Portugal – Alentejo – Vila Viçosa 1.2.1. Reflexão sobre alguns indicadores De modo a se obter uma noção mais clara sobre a situação de Vila Viçosa, pareceu pertinente a comparação de alguns indicadores deste concelho com valores de referência, nomeadamente à escala do Alentejo e de Portugal. 141 Trata-se de uma análise a três escalas, com base em valores 140. Era local de residência real, onde acabou por se edificar um palácio (Palácio Ducal de Vila Viçosa). Era também um local muito apreciado para a caça, daí que ainda hoje se encontrem veados na «Mata Real». 141. O Alentejo compreende todos os concelhos do Alto Alentejo, Alentejo Central, Alentejo Litoral e Baixo Alentejo. A análise nacional compreende Portugal Continental e ilhas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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médios de indicadores sócio-económicos. Apesar de poder suscitar algumas reservas, parece importante realizá-la desta forma, até para quem não conhece o concelho, poder ficar com a noção da própria dinâmica que lhe está inerente, não só ao nível económico (como já foi feito), mas também ao nível social e demográfico 142. Vila Viçosa registava 8871 residentes em 2001, sendo a densidade populacional de 45 h/km 2, o que contrasta com a média de 24,5 h/km2 do Alentejo.143 Em 2001, o Alentejo concentrava cerca de 7,5% da população portuguesa, sendo que Vila Viçosa concentrava 0,08%. Relativamente à população do Alentejo, Vila Viçosa reunia 1,14% deste total. Ora parece haver, à primeira vista, uma certa contradição entre o valor da densidade populacional, mais relativo do que o valor percentual de população que se apresenta baixo, ao contrário do que se poderia esperar. Contudo, a realidade diz-nos que a densidade populacional é influenciada pelo espaço, ou seja, Vila Viçosa é um concelho com apenas 195 km2, sendo que a média do Alentejo é de 545 km2 por concelho.144 Além disso, entre 1991 e 2001, a variação positiva da população que se verificou ao nível do país (aumento de 4,7% de população), não se repetiu nem no Alentejo nem em Vila Viçosa. No primeiro caso a população decresceu 0,7%, enquanto que ao nível do concelho estudado, houve uma perda de 2,2% de indivíduos. Os valores da natalidade também se encontram abaixo da média nacional (10,9‰) e do Alentejo (8,4‰), já que regista uma taxa de 8,1‰. Contudo a taxa de mortalidade ascende um pouco mais aos valores da média do Alentejo (14,2‰), embora fique um pouco abaixo da média nacional (10,2‰), já que a taxa regista 12,7‰. Contudo, o crescimento natural é «menos negativo» do que no Alentejo. Enquanto que neste último a taxa ascende aos -5,8‰, em Vila Viçosa, a taxa de crescimento natural é de -4,6‰.145 Este é um dado importante, uma vez que apesar de Vila Viçosa revelar problemas inerentes aos concelhos do interior do país (e do Alentejo), como por exemplo o despovoamento e o envelhecimento, também assume uma dinâmica diferente ao nível da estrutura populacional. Se por um lado a baixa taxa de natalidade, mesmo face ao Alentejo, poderia

142. Os dados que a seguir serão apresentados foram recolhidos nos Censos 2001. 143. A média nacional é de 112,4 h/km2 em 2001. 144. Deve ter-se em conta que este é um valor médio, bastante variável de concelho para concelho. 145. Em Portugal, a taxa de crescimento natural é de 0,7‰. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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indicar um envelhecimento da população, essa ideia pode ser rebatida com o valor da taxa de mortalidade, um pouco mais baixa que da própria região Alentejana. Claro que o valor da mortalidade poderia estar condicionado por um período onde morressem menos pessoas, principalmente idosos, no entanto, quando vamos consultar outros indicadores, constatamos que tal não se verifica efectivamente. O índice de envelhecimento é de 127,8% em Vila Viçosa, enquanto que no Alentejo é de 162,7%. Mesmo estando abaixo do valor nacional (102,2%), a verdade é que se destaca e nos leva a pensar que o fenómeno do envelhecimento não esteja tão marcado neste concelho. Até porque se atendermos ao valor da porção de idosos e jovens, verificamos que apesar deste fenómeno estar patente no concelho de Vila Viçosa, não está tão marcado como no Alentejo em si, tanto que em Vila Viçosa, a proporção de jovens é de 14,4% e a de idosos é de 19,3%, enquanto que no Alentejo, a proporção de jovens é de 13,7% e a de idosos é de 22,3%.146 Parece então que este concelho se apresenta um pouco mais rejuvenescido, face ao panorama do Alentejo, e mesmo estando afastado dos valores nacionais (em Portugal a proporção de jovens é de 16% e a de idosos de 16,4%), manifesta uma estrutura demográfica diferente, o que certamente irá influenciar a própria taxa de actividade. Relativamente à estrutura populacional, revela um índice de rejuvenescimento da população activa de 122,3%, afastando-se um pouco dos níveis do Alentejo (112,3%) e aproximando-se modestamente do nível nacional (143%). A taxa de actividade é, consequentemente, mais elevada em Vila Viçosa (48,6%) do que no Alentejo (45,5%), superando até a média nacional (48,2%). Também o desemprego atinge valores mais baixos. Em Vila Viçosa é de 5,3%, enquanto que no Alentejo é de 8,4% e à escala nacional de 6,8%. Isto pode querer dizer que, apesar de se ter verificado uma perda populacional acentuada, a verdade é que o concelho manifesta uma dinâmica positiva ao nível da actividade populacional, facto que certamente está relacionado com a indústria de extracção de mármore. Economicamente, o sector dos serviços domina em detrimento do sector agrícola, embora o declínio na agricultura tenha sido colmatado pela aposta na vitivinicultura, o qual se tornou «tradicional» na região, nomeadamente em ligação com Borba. Porém, a indústria extractiva dos mármores parece ser o pilar da economia do concelho, pois trata-se duma região com o sub146. Outro fenómeno que confirma um envelhecimento menos marcado deste concelho, prende-se com o número de pensionistas por 100 habitantes: em Vila Viçosa é de 29,6 enquanto que no Alentejo o valor ascende até 34,9. Mesmo assim ainda é um valor elevado, se pensarmos que em Portugal, em média há 24,5 pensionistas por 100 habitantes. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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solo rico neste tipo de recursos petrográficos. São algumas funções inerentes a esta actividade que dinamizam as ofertas do mercado de trabalho, desenvolvendo até algumas sinergias para sectores adjacentes (nomeadamente o dos transportes e o dos serviços comerciais e administrativos). Neste concelho este sector de actividade, conjuntamente com outros sectores económicos já referenciados, e tendo em conta a oferta na construção civil, parecem oferecer à população autóctone algumas perspectivas de emprego, dinamizando economicamente a região. Por outro lado atraem população de concelhos adjacentes, nomeadamente de Borba, do Redondo e do Alandroal, que se deslocam diariamente para trabalhar em Vila Viçosa.147 No entanto o trabalho no «sector do mármore», sendo aquele que tem mais ofertas e que domina claramente o mercado de trabalho, não exige muito dos seus trabalhadores em termos de formação. Há uma escola de formação profissional com esse fim no concelho, no entanto as habilitações literárias exigidas pouco mais são do que a escolaridade obrigatória e alguma formação extra que possa transformar o indivíduo num trabalhador especializado (por exemplo, para operar com máquinas). Os níveis da taxa de analfabetismo são elevados (17,8%) relativamente ao Alentejo (15,9%) e a Portugal (9%) e os da porção de população com formação superior baixos (4,7%), se voltarmos a comparar com os valores apresentados para o próprio Alentejo (5,7%) e para o país (8,6%). Perante este cenário, onde a oferta de emprego existe e onde não há grandes exigências com a mão-de-obra, é natural que o concelho se torne polarizador dos adjacentes, exercendo influência sobre a população que vive em vilas/lugares limítrofes e que aqui encontra a resposta do mercado de trabalho que não tem na sua terra. Mas esta atracção parece ter ido mais longe, para ser exercida sobre o grupo de imigrantes da Europa de Leste, que mais adiante se estudará. 1.2.2. O cenário imigratório Apesar de serem poucos os dados a escalas de análise específicas, tentar-se-á fazer uma breve reflexão sobre o cenário imigratório no Alentejo, de modo a ficarmos com uma noção da realidade actual da imigração nesta região de Portugal. 147. Este concelho polarizador acaba por influenciar a própria taxa de actividade dos concelhos polarizados, elevando-a, uma vez que atrai para trabalhar aqui população dos concelhos adjacentes. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Quando se tentam apurar números exactos de imigrantes da Europa de Leste que eventualmente poderão estar neste espaço, o estudo parece ter resposta através de informações relacionadas com o mercado de trabalho. Quadro 6 – População estrangeira da Europa de Leste com contratos registados para a obtenção de permanência, por nacionalidade e distrito (31/12/2001) – continente Distrito de residência

Ucrânia

Moldávia

Roménia

o

o

N.o

%

N.

3635

7,1

756

%

N.

235

2,4

1,6

120

3455

6,8

Bragança

177

Castelo Branco

Rússia o

%

N.

115

1,4

784

14,3

1,2

179

2,1

54

1,0

160

1,7

305

3,6

397

7,3

0,3

7

0,1

8

0,1

22

0,4

915

1,8

54

0,6

91

1,1

61

1,1

Coimbra

2242

4,4

178

1,9

277

3,3

223

4,1

Évora

1570

3,1

342

3,6

421

5,3

117

2,1

Faro

7435

14,6

2510

26,1

2019

23,9

860

15,7

530

1,6

27

0,3

25

0,3

33

0,6

Leiria

5734

11,3

653

6,8

98

1,2

398

7,1

Lisboa

9563

18,8

2683

27,9

2913

34,5

989

18,1

400

0,8

130

1,4

225

2,7

18

0,3

Porto

5510

10,8

444

4,6

318

3,8

726

13,3

Santarém

3465

6,8

496

5,2

358

4,1

197

3,6

Setúbal

2563

5,8

1301

13,5

951

11,3

329

6,6

Viana do Castelo

557

1,1

42

0,4

30

0,4

84

1,5

Vila Real

482

0,9

22

0,2

3

0,1

54

1,5

1909

3,8

203

2,1

96

1,1

136

2,5

50898

100,8

9607

100,1

8432

100,1

5482

100,5

Aveiro Beja Braga

Guarda

Portalegre

Viseu Total

%

Fonte: PIRES cita Inspecção-Geral do Trabalho (2002).

Facilmente constatamos que os distritos onde existem mais imigrantes da Europa de Leste são os de Lisboa, Faro e Setúbal (no caso dos moldavos e romenos), Porto (ucranianos) e Aveiro (russos). É certo que os Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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distritos do Alentejo não evidenciam uma grande concentração de imigrantes destas origens, se comparamos com os anteriores, no entanto se a comparação for feita entre Portalegre, Évora e Beja, verificamos que é o segundo o que se destaca. Isto quer dizer que Évora é o distrito do Alentejo que tinha, em 2002, mais população estrangeira da Europa de Leste com contratos de trabalho para a obtenção da autorização de permanência. Esta é a capital de distrito que apresenta um maior dinamismo, relativamente às anteriores, sendo natural que seja também a que ofereçe mais empregos a quem pretende fixar-se nesta região. Vila Viçosa poderá ser um dos concelhos do Alentejo Central que atrairá imigrantes, devido às necessidades inerentes à indústria extractiva do mármore, bem como os concelhos adjacentes de Borba e Estremoz, os quais desenvolvem o mesmo tipo de actividade. Contudo, as estatísticas referem que não são só e apenas os Europeus de Leste os únicos estrangeiros que estão na região do Alentejo. Também naturais dos PALOP, brasileiros e asiáticos fazem deste espaço o seu local de chegada. No que diz respeito ao primeiro grupo, é natural que se possam encontrar imigrantes de países africanos na região do Alentejo, porém com um carácter esporádico. Os números certamente exprimirão números que não traduzem a imigração em si, ou seja, a maioria dos estrangeiros dos PALOP que residem no Alentejo são indivíduos retornados das ex-colónias portuguesas em África e os seus filhos, muitos dos quais nem se recordam do seu local de origem. No caso dos brasileiros e dos asiáticos, pode-se dizer que se tratam de dois grupos que começam a procurar as cidades do Alentejo para se fixar, principalmente as capitais de distrito. As «lojas dos chineses« e os «restaurantes chineses» são cada vez mais comuns, principalmente na área do CBD 148 destas cidades, convivendo com as lojas do comércio tradicional. Por seu lado, os brasileiros tanto podem ser vistos a desempenhar profissões liberais, como é o caso dos dentistas, como se encontram a trabalhar por conta de outrem na construção civil. Existem ainda casos fortuitos de holandeses que compraram Montes alentejanos recuperando-os estética e economicamente para fins agrícolas. Torna-se interessante analisar a estrutura demográfica da população imigrantes, com base no sexo, de forma a podermos inferir sobre a forma

148. CBD – Central Business District. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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como é feita a migração, ou melhor dizendo, que tipo de migração prevalece (individual ou familiar).149 Podemos verificar que, ao nível de Portugal, há um relativo equilíbrio quanto ao número de estrangeiros do sexo feminino (46%) e masculino (54%). No entanto, verifica-se que há uma predominância de indivíduos do sexo masculino, em qualquer uma das escalas de análise. Quando observamos em maior pormenor o caso do Alentejo em geral e do Alentejo Central, constatamos que o fenómeno se intensifica, o que leva a pensar que a migração seja essencialmente individual, sendo protagonizada pelos indivíduos do sexo masculino. Porém, no caso de Vila Viçosa, tal não se verifica com tanta veemência. Até podemos mesmo afirmar que há um equilíbrio que torna quase equitativo o peso de ambos os sexos. Quadro 7 – População estrangeira residente em Portugal, na região do Alentejo e do Alentejo Central, e no concelho de Vila Viçosa, em 2001 População Estrangeira Total Homens

Mulheres

Total

População Estrangeira (outros) Homens

Mulheres

Total

%

%

N.

%

%

N.o

Portugal

54

46

226 715

59

41

90 806

Alentejo

61

39

9 242

66

34

4 710

Alentejo Central

65

35

1 838

67

33

1 090

Vila Viçosa

48

52

85

52

48

58

o

Fonte: INE (2002).

No caso dos indivíduos de nacionalidade estrangeira (total), verificamos que 48% são do sexo masculino e 52% do sexo feminino, no entanto no que concerne aos indivíduos estrangeiros de outras nacionalidades 150 149. Refira-se que os dados se referem à população estrangeira e não apenas à imigrante. Isto quer dizer que estão incluídos os retornados e outros casos (dupla nacionalidade). É de ter em atenção também o facto de que, na tentativa de chegar ao número aproximado Europeus de Leste, se acabou por analisar nos Censos de 2001 os indivíduos de «outras nacionalidades» onde não estão incluídos os indivíduos de nacionalidade portuguesa, timorense, macaense, angolana, moçambicana, cabo-verdiana, alemã, francesa, brasileira, ou venezuelana. Os apátridas e os indivíduos de dupla nacionalidade também não estão consignados. 150. No caso específico de Vila Viçosa, a quase totalidade destes indivíduos pertencerá a países da Europa de Leste, com destaque para a Moldávia. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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acontece o contrário, sendo que 52% são do sexo masculino e 48% do sexo feminino. Apesar de haver alguns pontos percentuais de diferenças entre ambos os sexos, estes não parecem ser significativos, podendo ser basicamente fruto da dinâmica demográfica inerente a qualquer população. No entanto, este equilíbrio parece indicar o foco de uma migração familiar, a qual diverge num contexto onde domina estrangeiro/imigrante do sexo masculino. Para que tal tendência se verifique em Vila Viçosa, torna-se necessário compreender não só as características do grupo imigrante dominante, os Europeus de Leste, as suas motivações, os seus objectivos, mas também as características do «espaço» da migração, do local de chegada, que lhes permitiu realizar a migração da forma e com as particularidades lhe são inerentes. 2. O CASO DOS IMIGRANTES DA EUROPA DE LESTE EM VILA VIÇOSA 2.1. Quem são aqueles que aqui chegaram? Caracterização da amostra em estudo Dificilmente saberemos quantos imigrantes da Europa de Leste se encontram na região de Vila Viçosa. As estatísticas não são congruentes quando apontam valores, quer seja porque não contemplam este grupo em específico 151, quer porque se afastam da realidade quantitativa, pois apenas contemplam os indivíduos que se encontram com a sua situação regularizada. Em Vila Viçosa presume-se, tal como deve acontecer noutras regiões do país, que a situação dos imigrantes de Leste não está totalmente normalizada, uma vez que foi muito difícil implementar o inquérito no seio desta comunidade. O medo e a desconfiança de que este instrumento de trabalho meramente académico fosse uma forma de desvendar situações «menos claras», levou a que muitos, numa primeira fase, se recusassem a responder, alegando que poderia ser «uma manobra do SEF para descobrir alguma(s) irregularidade(s)» na vida desta comunidade. No entanto, valeu o apoio e a intervenção de alguns alunos estudantes da escola secundária Públia Hortênsia de Castro, em Vila Viçosa, que conjuntamente com os seus pais, se disponibilizaram no apoio e lançamento dos inquéritos à sua comunidade imigrante. O facto de serem pessoas 151. No caso do INE, conseguiram-se encontrar dados mais recentes e mais específicos do concelho/freguesias de Vila Viçosa nos Censos de 2001. Apesar de estarem contemplados os indivíduos nacionais de PALOP, de Timor, de Macau… os dos países da Europa de Leste não são especificamente discriminados. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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que conhecem e dominam bem quer o português, quer o moldavo e o russo 152, fez com que se o inquérito pudesse ser realizado com imigrantes da Europa de Leste de nacionalidades que não apenas a moldava, não tendo havido grandes dúvidas na aplicação das questões (feitas em português). Desta forma, e num universo de 58 imigrantes 153 (30 homens e 28 mulheres) estudou-se uma amostra de 50 imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa. Aleatoriamente, foram inquiridos indivíduos entre os 9 e os 39 anos (no sexo feminino) e entre os 11 e os 58 anos (no sexo masculino). A média de idade da amostra ronda os 30,8 anos (28,6 anos no sexo feminino e 32,3 anos no sexo masculino), o que não se deve afastar muito da realidade, visto que se trata de um grupo cujos actores da migração não são jovens-adultos propriamente ditos, tal como estivemos habituados a ver partir, nos anos 60/70, jovens portugueses para outros países da Europa, mas sim adultos entre os 25 e os 30 anos. Foram inquiridos 20 indivíduos do sexo feminino e 30 indivíduos do sexo masculino, dos quais 70% eram casados e 30% solteiros: trata-se de uma migração em que há um grande equilíbrio entre ambos os sexos, visto que se trata de uma migração familiar. Muitas vezes aconteceu que o pai e um dos filhos vieram primeiro, no sentido de arranjar habitação e regularizar a situação (ao nível do trabalho) para que, pouco tempo depois, o núcleo familiar se pudesse voltar a reunir. Estima-se, segundo opinião de alguns imigrantes de Leste, que neste concelho estejam cerca de uma centena de imigrantes da Europa Oriental, contudo a maioria poderá ter entrado já depois de 2001, estando alguns ainda em situação irregular. 154 A verdade é que a amostra revelou essa mesma tendência, uma vez que a maioria dos inquiridos entrou em Portugal depois dessa mesma data. Neste caso, a maioria entrou entre 152. Normalmente os imigrantes dos países da Europa Oriental, além da língua oficial do seu país, sabem falar russo. 153. É de ter em atenção que este número de «58» indivíduos se refere à população estrangeira de outras nacionalidades que não portuguesa, timorense, macaense, angolana, moçambicana, cabo-verdiana, alemã, francesa, brasileira, ou venezuelana. Os apátridas e os indivíduos de dupla nacionalidade também não estão consignados neste número. Presume-se então que este número de «58 estrangeiros» esteja perto da realidade referente ao quantitativo legal de imigrantes legais da Europa de Leste que estavam presentes em Vila Viçosa, na altura da recolha de dados para o recenseamento de 2001. Todavia, o número real será mais elevado, uma vez que muitos entraram depois de 2001 e outros ainda se encontram em situação irregular. 154. No quadro correspondente, não foram contabilizadas entradas de imigrantes do sexo feminino em 1999 2 2004. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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2001 e 2003, o que leva a crer que a grande maioria dos imigrantes, nesta região, ainda não esteja realmente contabilizada no seu todo. O equilíbrio entre ambos os sexos vai-se mantendo, com excepção do caso dos anos de 2000 e 2001, em que o número de entradas do sexo feminino foi superior ao masculino, o que pode querer dizer que se trataram de anos onde foi mais visível a reunificação familiar (já que praticamente não se verifica a migração exclusivamente feminina, de carácter isolado). Quadro 8 – Ano de entrada em Portugal dos imigrantes inquiridos Mulheres

Homens

Total

%

%

%

1999

***

117

114

2000

115

114

110

2001

125

123

124

2002

145

130

136

2003

125

123

124

2004

***

113

112

100

100

1100

Anos

Total

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Por outro lado, verificou-se que, entre os inquiridos, domina a nacionalidade moldava. Este é um núcleo de forte presença em Vila Viçosa e tal pode ser constatado na escola já referida, onde a esmagadora maioria dos alunos estrangeiros que ali estuda tem esta origem. Contudo, também podemos encontrar imigrantes de outros países da Europa de Leste, como se conferiu nos inquéritos, mais especificamente búlgaros (8% dos inquiridos), ucranianos (8% dos inquiridos) e romenos (4% dos inquiridos). No que concerne ao grupo dos Moldavos (80% dos inquiridos), e analisando mais especificamente a sua situação quando ainda estavam no país de origem, constatou-se que cerca de 30% não residiam no local donde eram naturais. Isto significa que deste total, cerca de 25% já tinham deixado a localidade donde realmente eram naturais, para ir residir/trabalhar em Chisinau, a capital da Moldávia. Independentemente de terem realizado esta migração em adultos ou ainda com os pais, pode levar a crer que se tratam de casos de mobilidade interna, onde já se manifesta uma acção de alguns factores motivacionais, que a outra escala, estiveram presentes na migração internacional. No entanto, parece que se Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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trata de uma migração interna revestida de um carácter de «manutenção populacional», inerente à própria dinâmica de qualquer comunidade. Gráfico 16 – Habilitações literárias dos imigrantes da Europa de Leste, em Vila Viçosa Ensino Superior 16%

Ensino Básico 1.o Ciclo 6%

Ensino Básico 2.o/3.o Ciclos 20%

Ensino Secundário 10.o/11.o anos 14%

Ensino Secundário 12.o ano 44%

Elaboração própria – Inquérito (2004).

Trata-se de uma população com um nível de instrução médio-elevado. A maioria (44% dos inquiridos) concluiu o ensino secundário, sendo que 16% obtiveram graus académicos superiores 155. De referir que o ensino nos países de Leste, segundo alguns inquiridos, está muito virado para a componente profissional e para a parte prática, também no sentido de dar resposta a necessidades mais proeminentes do mercado, nomeadamente da indústria e de sectores que a ela se encontram ligados. É o que se passa com o caso dos moldavos, onde embora o número daqueles que frequentaram o ensino superior não seja muito elevado, os que completaram o ensino secundário compensa e pode revelar a tendência para que se promova uma preparação da população para um nível de conhecimentos médio, que lhe permita ter noções básicas de carácter interdisciplinar e que ao mesmo tempo permita a especialização numa certa área de trabalho.156 Com este tipo/grau de formação escolar, o domínio das línguas como o português e o inglês parece estar assim mais facilitado. Cerca de 60% dos inquiridos afirmam ter alguns conhecimentos desta última

155. Os Censos de 2001 referem que, em Portugal, a porção de população com formação superior é de 8,6%. 156. Refira-se que aqueles que apresentam graus ligados aos 1.º/2.º/3.º ciclos se tratam maioritariamente dos filhos dos imigrantes que estão actualmente a frequentar a escola. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

186

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língua (34% revelam não falar inglês). É interessante verificar o facto de que, em relação ao português, não há nenhum inquirido que assumisse não perceber a língua, sendo que 72% dos inquiridos afirmam falar razoavelmente o idioma e 28% defendem que já têm muitos conhecimentos da língua portuguesa (a maioria destes entrou entre 2000 e 2003). A verdade é que se trata de uma comunidade com uma capacidade de adaptação linguística muito versátil e que muito se esforça neste domínio, pois muitos dos imigrantes consideram que a língua é o «passaporte» mais viável para a integração na comunidade portuguesa/Vila Viçosa. Gráfico 17 – Grau de conhecimentos das Línguas Portuguesa e Inglesa, por parte dos inquiridos Língua Portuguesa Língua Inglesa

72%

80%

60%

70%

Percentagem de inquiridos

60% 50% 34%

40%

28%

30% 20% 10%

6% 0%

0% nenhuns

alguns

muitos

Grau de conhecimento das Línguas

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

No país de origem exerciam profissões ligadas essencialmente ao sector secundário e terciário. Podemos encontrar muitos operários, bem como mecânicos, motoristas/camionistas, contabilistas, professores, principalmente no sexo masculino. No sexo feminino dominam as domésticas, bem como profissionais ligadas aos serviços (contabilistas, balconistas, enfermeiras). Não se tratam de quadros altamente qualificados, mas antes de indivíduos com formação profissional média/superior para exercerem as suas funções. De referir ainda que do total de inquiridos, cerca de 88% residem na sede do concelho e apenas 12% moram em freguesias adjacentes, facto este Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

187

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relacionado não só com a disponibilidade de habitações para arrendamento, com a sua qualidade, mas também com a proximidade a outros imigrantes e também ao local de trabalho. Esta amostra pode considerar-se representativa da realidade dos imigrantes da Europa de Leste fixados em Vila Viçosa, embora se deva ter em conta que não foram questionados indivíduos em situação ilegal/clandestina e que presumivelmente, aqueles que eventualmente apresentam algum ponto da sua situação menos regular (por exemplo, na questão do trabalho), provavelmente não assumiram nem deram a conhecer o facto, com medo de represálias. 2.2. Motivações e acompanhantes da migração Ao contrário do que parece ser a tendência nacional nos imigrantes moldavos, 92% dos inquiridos imigraram com a família. Como já referimos anteriormente, na maioria dos casos dos inquiridos, aconteceu vir o «pai» em primeiro lugar, às vezes com um «filho», para preparar a vinda da restante família (procura de habitação, trabalho para a «mãe»). PORTELLA (2001, pp. 184 e 185) afirma que normalmente os moldavos não se fazem acompanhar pela família e se o fazem é só numa fase posterior da imigração. Ora o que parece que aconteceu com os imigrantes da Europa de Leste em Vila Viçosa, não decorreu sempre linearmente com esta ideia. A verdade é que a grande maioria dos imigrantes desta origem que aqui se encontram, viveram primeiramente de outros locais de Portugal 157, o que significa que Vila Viçosa não é o lugar primeiro e pode não ser o lugar último da migração. Contudo são comuns os núcleos, normalmente constituídos pelo «pai», «mãe» e «filhos» 158. Significa que, independentemente da reunificação se ter feito aqui ou noutro local (muitas famílias foram agrupadas em Vila Viçosa), trata-se de uma migração de carácter familiar que, pelo seu carácter intrínseco, poderá levar-nos a pensar que se possa tornar uma migração definitiva. Pelo menos os inquiridos parecem achar que Vila Viçosa oferece condições económicas e sociais suficientes para que as suas famílias aqui se possam instalar, o que pode fomentar essa perspectiva. Contudo, para que tal aconteça, será necessário ter em conta as motivações que incentivaram não só a saída do local de origem, como a escolha de Portugal 157. Como posteriormente teremos oportunidade de constatar. 158. Os que referiram ter sido acompanhados na migração pelos «pais» e «pais e irmãos», são os filhos dos imigrantes de Leste. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

188

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e da região de Vila Viçosa em particular, para estabelecerem residência e exercerem uma actividade profissional. Em ambos os pólos prevaleceram factores de carácter económico e social (nomeadamente familiar). Gráfico 18 – Indivíduos que acompanharam os imigrantes inquiridos, no seu percurso migratório

60%

59%

Percentagem de inquiridos

50% 40% 30% 22%

20% 15%

10%

4%

0% Cônjuge

Cônjuge e filhos

Pais

Pais e irmãos

Acompanhantes da migração

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Cerca de 30% dos inquiridos responderam que o elevado nível de desemprego e os baixos salários auferidos no país de origem foram os principais motivos para a saída dos respectivos países de origem. A destruturação económica, política e social das economias dos países do Leste da Europa parece ter sido o principal motor que fomentou os fluxos migratórios. Quadro 9- Motivações para saída do país de origem/entrada em Portugal, do imigrante inquirido Motivo da saída do país de origem

%

Desemprego

122

Emprego e outros motivos

158

Salários baixos

128

Melhores salários e outros motivos

112

Reunificação familiar

126

Reunificação familiar

124

Desemprego/Reunião familiar

124

Outros motivos

156

Salários baixos/Reunião familiar

112

Outros motivos

128 Total

Motivo da entrada em Portugal

100

Elaboração própria – Inquéritos (2004). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

189

Total

%

100

A EUROPA DO OUTRO – A IMIGRAÇÃO EM PORTUGAL NO INÍCIO DO SÉCULO XXI – Estudo do caso dos imigrantes da Europa de Leste no concelho de Vila Viçosa

Já 36% dos inquiridos aliam estes motivos à reunificação familiar e 26% afirmam que foi apenas este último motivo que prevaleceu, o que é compreensível visto tratar-se de uma migração de cariz familiar. A entrada no nosso país prendeu-se com motivações do mesmo género. O cariz económico (70% das respostas), nomeadamente a disponibilidade de emprego, aliou-se em certos casos à reunificação familiar, à proximidade de amigos do mesmo país e em muitas situações à facilidade de entrada/legalização que o nosso país ainda oferece aos imigrantes. Este último argumento, normalmente esteve quase sempre acompanhado da motivação de cariz económico, nomeadamente da disponibilidade de emprego e de melhores salários (do que no país de origem). Ora, partindo do princípio de que o inquérito foi realizado numa época de crise económica nacional, deve ter-se ainda em atenção que a maioria dos inquiridos já está no território depois do início da mesma e que aqui reagruparam/estão a reagrupar a família. Além disso, ainda referem o facto de terem procurado Portugal pelos motivos económicos acima referidos, o que levaria a crer que a migração poderia ter condições para se tornar definitiva.159 Resta saber como será a evolução enonómico-política nos países de origem. A entrada de muitos deles na União Europeia, nomeadamente dos PECO 160 será uma oportunidade para revigorar os sectores em crise. Também tem sido defendido ultimamente que o sector da construção civil, em Portugal, conhecerá um crescendo nos próximos tempos, o que significa que certamente necessitará de mais mão-de-obra. Será certamente do equilíbrio, ou melhor dizendo, da evolução das condições em cada um dos pólos da migração, que resultará a fixação num dos territórios. Por outro lado, Vila Viçosa parece ter apresentado um conjunto de condições que atraem estes imigrantes, nomeadamente na questão do emprego (41% das respostas). Nesta região domina a indústria extractiva dos mármores. A economia regional depende em muito das inúmeras pedreiras que existem na região e nos concelhos limítrofes e dos postos de trabalho que geram aos autóctones. Porém, a oferta estende-se também àqueles que não são residentes no concelho, nomeadamente a imigrantes. Por outro lado, as obras públicas ocuparam até meados de 2004 muita mão-de-obra que trabalhou na construção do novo acesso rodoviário entre Borba e Vila Viçosa, continuando a oferecer oportunidades em outros projectos a desenvolver noutros concelhos adjacentes. 159. O inquérito aos imigrantes foi realizado entre o dia 15/03/2004 e 30/5/2004. Tal como anteriormente se fez referência é necessário que as condições motivacionais positivas se mantenham/reforcem neste local de chegada e as motivações de cariz negativo se mantenham no local de partida. 160. PECO – Países da Europa Centro-Oriental. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Gráfico 19 – Motivações que estiveram presentes na escolha para a fixação em Vila Viçosa, por partes dos imigrantes inquiridos

45%

Percentagem de respostas

40%

41%

35% 30% 27%

25%

27%

20% 15% 10% 5%

5%

0% o eg pr Em

r s ilia igo m am a f de ão aç de ific ida n u im ox Re Pr

ão aç bit a H

Motivações

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

A proximidade de amigos (27% das respostas) confirma que um pequeno e inicial núcleo aqui residente está a fomentar a vinda de mais imigrantes de Leste. Já estabelecidos e com alguns contactos, podem formar uma rede de apoio a outros que aqui se fixem, embora não pareça que esta rede seja de carácter familiar, ou seja, que proporcione contactos a familiares próximos (por exemplo, irmãos ou cunhados). Verificam-se, isso sim, as ligações de amizade, eventualmente de conhecidos/amigos que travaram contacto em Portugal, num contexto de trabalho noutro local do país e que, tendo um dos membros estabelecido posteriormente em Vila Viçosa a sua residência/local de trabalho, ajudou o outro a fazer o mesmo nesta região. A reunificação familiar (27% das respostas) torna-se por isso um fenómeno inevitável nesta região, já que muitas vezes, no caso das mulheres, a motivação primeira da migração não esteja directamente relacionada com factores económicos, como o emprego (embora eles sejam importantes e estejam presentes), mas antes com o acompanhamento do «chefe de família» e pela preocupação em manter o núcleo familiar unido (marido e filhos). Como motivação de menor peso para fixação em Vila Viçosa, aparece a habitação (5% das respostas). Certamente será mais correcto considerar esta como uma motivação à posteriori, ou seja, não tendo sido o factor primordial que condicionou a fixação do imigrante na região, funciona Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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como uma «descoberta», ou melhor dizendo, o imigrante consegue iniciar a sua estada tirando partido da região não só em termos de emprego, como também de outros aspectos, nomeadamente da qualidade/ preço do arrendamento de habitações disponíveis. Quando inquiridos, também deixaram passar a ideia de que a calma e a pacificidade do local foi outro dos aspectos de que tiraram partido e que progressivamente se transformou numa motivação para permanecerem neste local, mesmo tratandose de uma motivação secundária. Estes indivíduos, uma vez que imigraram com a família e se fixaram nesta região, parecem querer dar a esta o maior bem-estar possível, o que passa não só pelas questões materiais de índole económica, mas também pelas questões imateriais mais ligadas à segurança, equilíbrio e integração. Interessante será também referir o facto de que, apesar de ter sido perguntado directamente no inquérito, nenhum inquirido revelou ter qualquer afinidade que fosse com Portugal ou com a região de Vila Viçosa para aí se fixarem. A verdade é que, em conversa informal com alguns inquiridos, apurou-se que alguns dos seus familiares estavam imigrados em países como a Itália, Grécia, França, Alemanha, Canadá, Rússia, Israel, Irão e poucos referiram ter parentes em Portugal. Apesar de pertencermos à mesma Europa, o multiculturalismo é iminente e a variedade de destinos de migração deste grupo também. A escolha do destino prende-se portanto, não com um padrão cultural que se pretenderia similar, não pela influência de familiares, mas antes por factores económicos (emprego e salários), sociais (reunificação familiar) e legislativos (facilidade de entrada no país e regularização). Trata-se portanto de um grupo imigratório algo peculiar, uma vez que sai das normas gerais que normalmente pautam os imigrantes de Leste, nomeadamente os moldavos. Poderá ser um sinal de mudança, promovido pelo facto de apesar de serem um grupo migratório recente, já começarem a estabelecer algumas relações com o território português, bem como com Vila Viçosa. Esta região, embora englobada no contexto alentejano, onde impera um certo marasmo económico-social, materializado pelo facto de ser uma das regiões mais pobres da Europa, consegue dar a estes imigrantes os instrumentos de que precisam para consumar a sua migração. No entanto, estes também mostram que sabem tirar partido das mais simples condições que lhe são oferecidas.

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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2.3. A vida dos imigrantes de Leste: entre as expectativas e a realidade 2.3.1. Direitos e Deveres Entre as expectativas criadas sobre o local de chegada e a realidade que o caracteriza, por vezes encontra-se uma grande distância. No caso deste grupo de imigrantes, tentou-se saber um pouco mais da vida que esperavam levar e que realmente levam em Portugal, mais especificamente em Vila Viçosa, bem como o seu grau de integração na comunidade. Gráfico 20 – Percepção dos imigrantes inquiridos, sobre os Direitos e Deveres que cumprem em Portugal

100%

96%

Percentagem de inquiridos

80%

76%

60% 40% 20%

24% 0%

Iguais Direitos

4% Diferentes (menos)

Iguais Deveres

Diferentes (mais)

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

A grande maioria acha que tem os mesmos direitos e deveres de que beneficiava no país de origem, porém da totalidade de inquiridos, 24% afirmam ter menos direitos (não auferem de direito de voto, por exemplo) e 4% afirmam mesmo ter mais deveres (no trabalho). Como já constatámos anteriormente 161 a elegibilidade e o poder de voto por parte do imigrante não está ao alcance de todos. Porém, dado a aparente estabilidade que os inquiridos manifestam 162, leva a que eles próprios sintam a neces161. Ver capítulo sobre O funcionamento legislativo face ao Imigrante. 162. Ao nível da fixação de residência, trabalho, integração na comunidade através da participação nas actividades do quotidiano, os filhos a estudarem na escola em turmas de portugueses com programas «portugueses»… Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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sidade de se outorgar de um direito que se lhes vê vetado. Visto cumprirem com os deveres que lhes são exigidos e participarem na vida da comunidade, este poderia ser mais um passo para a sua integração, que já começou a ser dado com alguns PALOP, contudo a recente permanência em território português ainda não permitiu que a grande maioria (senão quase a totalidade), se tornasse votante. Tal poderá ser, em certa medida, contraproducente, quando se trata da construção da «cidadania» e do imigrante como «cidadão». Quiçá a abertura da Europa de Leste à União Europeia possa, pelo menos, trazer a debate e quem sabe alterar esta questão, acelerando o processo de possibilidade de votação. Relativamente aos deveres, as respostas que foram dadas pelos inquiridos parecem adquirir um tom denunciante em certos casos. Muitas vezes, estes imigrantes acabam por ser explorados e por se deixar explorar, na contingência de manter o emprego, ou pior ainda, de camuflar uma situação irregular. Alguns afirmaram ter mais deveres no emprego está, o que pode significar que estão ou provavelmente já estiveram subjugados a uma situação deste tipo. Gráfico 21 – Imigrantes inquiridos que pretendem obter a nacionalidade portuguesa

60% 54%

Percentagem de inquiridos

50% 40% 30% 20%

24%

22%

10% 0% Sim

Ainda não pensou

Não

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Não parece terem existido grandes problemas no processo de regularização em Portugal (para 84% dos inquiridos), no entanto 16% das respostas indicaram alguns problemas, nomeadamente com a obtenção do visto (25% dos inquiridos), extravio e atraso de documentos (25% dos inquiriFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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dos) e muita burocracia (12% dos inquiridos). Mas o maior problema esteve relacionado sobretudo com a obtenção e validade dos contratos de trabalho (38% dos inquiridos com problemas), uma vez que muitos deles tiveram problemas com patrões que negavam a atribuição do documento. Algumas destas questões só foram resolvidas há pouco tempo, muitos dos imigrantes em questão estarem em Portugal/Vila Viçosa há relativamente pouco tempo. De qualquer forma já há quem pense em obter a nacionalidade portuguesa (cerca de 24% dos inquiridos), sendo essencialmente os mais novos que comungam desta ideia. A disponibilidade de emprego, a tranquilidade do país/região e o clima parecem estar na base das motivações, sendo que até acham que a qualidade de vida é boa em Portugal (66% dos inquiridos que aspiram ficar) e isso é motivo válido para permanecer.163 Aqueles que não pretendem obter a nacionalidade (22% dos inquiridos) e que pretendem voltar ao país de origem, são alguns dos que imigraram sem a família, querendo no futuro voltar a juntar-se a ela. No entanto a maioria parece ainda não ter decidido o seu futuro (54% dos inquiridos). Há muitos que preferem esperar a evolução económica do país ou tentar integrar-se mais seguramente e só depois decidir se pretendem ou não obter nacionalidade portuguesa. Apesar de num primeiro momento a matriz familiar da migração indicar um possível sentido «definitivo», a instabilidade económica vivida parece balançar a opinião dos imigrantes quanto ao carácter temporal da migração. O PNUD 164 dá a conhecer, no seu relatório de 2004, que Portugal desceu no ranking do desenvolvimento humano, da 23.ª posição que ocupava em 2003, para a 26.ª posição que passou a ocupar no ano seguinte. A descida deveu-se sobretudo às boas prestações dos outros países em certos indicadores (económicos, de saúde, de educação…) e à «estagnação» em que Portugal apresenta nestas áreas, face a outros países da UE.165 Esta conjuntura balança assim a opinião da maioria dos imigrantes quanto ao facto de aqui permanecerem ou não. Desta forma, provavelmente só haverá uma resposta sobre a fixação deste grupo quando houver uma alteração da conjuntura económica, política e social, quer no local de partida, quer no local de chegada. Resta saber também se o campo político e jurídico facilitará ou não a sua permanência. 163. O primeiro motivo será o mais importante, embora os restantes contribuam para a decisão, mesmo que de forma secundária. 164. PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. 165. Diário de Notícias, Portugal desde no “ranking» da ONU, Secção Sociedade, sexta-feira 16 de Julho de 2004. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Ainda referente a este grupo temático, questionou-se os imigrantes desta região acerca do próprio conhecimento sobre os seus direitos e deveres que vinham consignados na legislação: 70% assumiram não conhecer de todo, sendo que apenas 30% referiram saber mais ou menos o que constava na lei sobre a sua condição. Visto não haver uma relação directa entre o conhecimento da legislação e as habilitações literárias que os inquiridos apresentam, pressupõe-se que aqueles que referiram conhecer tiveram ou alguém próximo dos mesmos teve algum problema com o processo de regularização. A falta de conhecimentos desta questão pode ser bastante nefasta, não só na tomada de consciência dos deveres, mas principalmente porque se alheiam dos direitos de que podem usufruir e que tantas vezes lhes são negados (por exemplo, no mercado de trabalho). Esta é uma lacuna da qual Estado e imigrantes não se podem furtar. Se por um lado esta situação manifesta o insuficiente apoio dado pelas instituições aos imigrantes, no que concerne à clarificação da situação, por outra também revela um certo desinteresse e acomodação por parte do agente da migração. Seria favorável a ambas as partes em questão, tomar consciência e dar a conhecer o consignado na lei, de forma a evitar problemas sociais que, pelo conhecimento da matéria, poderiam ser minimizados ou até evitados. 2.3.2. A Integração na vida da comunidade Retomando a ideia anteriormente defendida, facilmente constataremos que o desconhecimento dos direitos e deveres do imigrante, consignados na legislação portuguesa, poderá criar uma lacuna na própria integração do indivíduo na comunidade de acolhimento. Cerca de 76% dos inquiridos referiram que foram bem recebidos pela comunidade de Vila Viçosa, porém 22% afirmam que a sua recepção foi razoável. Dos que referiram ter sido razoavelmente recebidos pela comunidade, a maioria nem sequer explicou o motivo que os fez dar esta resposta (36% dos inquiridos). Provavelmente por detrás destes motivos estarão eventuais situações de exploração no mercado de trabalho que, segundo os próprios autóctones 166 , existiram/existem neste grupo de imigrantes. Contudo, há quem

166. Como veremos mais adiante. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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especifique os motivos, explicando que a hostilidade das pessoas (27% dos inquiridos) e algumas situações de discriminação/xenofobia (27% dos inquiridos) contribuíram para tal. Lembremo-nos que Portugal é um país que só recentemente começou a receber outros grupos de imigrantes que não dos PALOP, como foi o caso de grupos de asiáticos e da Europa de Leste. Ora, na região de Vila Viçosa, tal como acontece em praticamente todos os concelhos do interior alentejano e português em geral, são ainda poucos os casos de imigrantes estrangeiros que ai se fixam definitivamente. Visto que o fenómeno dos fluxos migratórios da Europa Oriental é relativamente recente, e que portanto a instalação de um conjunto de imigrantes nesta região foi um processo rápido, é natural que houvesse uma inicial relutância por parte de alguns membros da população na recepção destes «estranhos». Todavia, quando inquiridos sobre as maiores dificuldades que sentiram no momento de chegada, estes imigrantes revelam outro tipo de obstáculos que não estes. Cerca de 5% das respostas confirmaram a informação de que a discriminação se constituiu como um entrave (3% das respostas aponta para que tal ainda se mantenha no momento presente), porém a totalidade dos inquiridos referiu que a língua (o não domínio da Língua Portuguesa) foi a maior dificuldade sentida no momento da chegada. Actualmente, apenas 36% das respostas parecem manter este elemento como obstáculo. Tal como já vimos anteriormente, a língua é um instrumento de integração e de trabalho, ao qual esta comunidade dá muita importância. Autóctones e imigrantes já se aperceberam disto, tanto que a diocese de Évora já contratou um pequeno grupo de padres católicos ucranianos, no sentido de dar apoio às comunidades imigrantes do Leste Europeu que se encontram nesta região do Alentejo. O primeiro passo tomado foi fazer com que estes clérigos aprendessem o português, de modo a melhor poderem ajudar os seus compatriotas.167 Além desta, no momento de chegada outras dificuldades foram sentidas, nomeadamente as diferenças climáticas relativamente ao país de origem (22% das respostas) e a integração no mercado de trabalho (13% das respostas). Estas questões parecem ter sido mais ou menos ultrapassadas, visto que no momento presente do inquérito, 28% dos inquiridos afirmou não sentir qualquer tipo de dificuldade, e mesmo no que concerne às anteriormente enunciadas, verificou-se que eram cada vez menos sentidas. Para o grau de satisfação contribuiu certamente o facto de cerca de 84% dos inquiridos não ter tido necessidade de mudar hábitos e costumes 167. SIC, Jornal da Noite (20:00), 3 de Abril de 2004. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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para adaptação à nova realidade. Apenas os 16% de inquiridos que referiram ter alterado, referiram-se essencialmente a regras escolares e a vestuário (por causa das diferentes características climáticas entre os dois pólos da migração). No caso das regras escolares, a mudança prendeu-se com os horários (em Portugal a esmagadora maioria das escolas funciona no turno da manhã e da tarde) e com outros aspectos burocráticos (faltas, disciplina…) aos quais os alunos e pais não estavam habituados. Não que o sistema de ensino português apresentasse regras fossem mais rígidas, visto que o que muitas vezes os surpreendeu foi o laxismo patente. No que concerne à questão das roupas, aqueles que responderam ter necessidade de mudar, disseram que o fizeram para «melhor», na medida em que tiveram de comprar peças de roupa «mais leves e coloridas». No fundo, parece que paulatinamente a integração dos imigrantes de Leste nesta região se está a verificar sem maiores contratempos. As dificuldades estão a ser ultrapassadas e mais uma vez se sente que o imigrante tenta tirar partido das potencialidades que a diversidade de situações oferecida. 2.3.3. O Imigrante e o Mercado de Trabalho Na questão do mercado de trabalho, parece que para muitos Vila Viçosa não foi o primeiro local de paragem. Um número significativo de imigrantes (mais de 26% dos inquiridos) já tiveram mais do que um emprego desde que chegaram a Portugal, 10% dos quais afirmaram que o(s) mesmo(s) foi (foram) desempenhado(s) na região de Lisboa/Costa da Caparica/Setúbal. No entanto, alguns grupos trabalharam em regiões do Alentejo mais ou menos adjacentes ao concelho em estudo, nomeadamente Beja/Reguengos de Monsaraz (6% dos inquiridos), Alandroal/ /Estremoz (6% dos inquiridos), Elvas/Santa Eulália (8% dos inquiridos) e Borba (10% dos inquiridos).

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Quadro 10 – Profissões desempenhadas pelos imigrantes inquiridos, antes e depois de se estabelecerem em Vila Viçosa Profissões Anteriores Sexo Feminino

%

Sexo Masculino

%

Aj. cozinha/cozinheira

14

Agricultor

65

Empregada de mesa

13

Cortador/máq. mármore

14

Empregada doméstica

17

Pedreiro

42

Motorista/Camionista

15

Total

34

Total

66

Profissões Actuais Sexo Feminino

%

Sexo Masculino

%

Aj. cozinha/cozinheira

12

Agricultor

63

Empregada doméstica

15

Cortador/máq. mármore

27

Caseira

13

Pedreiro

34

Padeira

13

Camionista

13

Total

33

Total

67

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Em primeiro lugar, podemos constatar que o número de mulheres activas, na amostra em estudo, é inferior ao dos homens 168, o que pode levar a pensar que seja mais complicado para este sexo arranjar emprego. Porém, depois de empregadas verifica-se que nos homens há uma maior mobilidade, ou seja, normalmente são as mulheres que conseguem permanecer mais tempo a trabalhar no mesmo local/ramo 169. Há a destacar o caso de 20% dos inquiridos estarem agora no seu primeiro emprego desde que chegaram ao nosso país, o que quer dizer que a sua migração é recente (entraram entre 2003 e 2004) e que já vieram direccionados a Vila Viçosa. Mas, se compararmos as profissões que os imigrantes de Leste de Vila Viçosa já exerceram e que agora estão a exercer, verificamos que praticamente não houve grandes alterações no ramo de actividade em que se inserem, ou seja, não há uma grande diversificação das actividades 168. Também se deve ter em conta que na amostra o Ratio Homem/Mulher é de 1,5. 169. Em muitos casos, o período de trabalho das mulheres conseguiu atingir os 2 anos. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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desempenhadas/oferecidas no mercado-de-trabalho. Observando o quadro apresentado 170, verificamos o ramo da restauração e dos serviços de limpeza é aquele que emprega mais imigrantes do sexo feminino (15% e 18% dos inquiridos na data do inquérito, respectivamente), quer seja antes ou já aquando da fixação em Vila Viçosa. No sexo masculino dominam os serviços ligados à indústria extractiva e construção, bem como alguns trabalhos ligados à agricultura e aos transportes. Contudo verifica-se que antes da fixação em Vila Viçosa, a construção civil era o ramo que mais empregava estes imigrantes (42% dos inquiridos), porém actualmente a tendência é para haver um maior equilíbrio entre este sector (34% dos inquiridos) e o da indústria extractiva (27% dos inquiridos) 171. No fundo, parece não haver muita variedade de empregos para os imigrantes, tenham eles trabalhado noutros locais, ou trabalhem eles nesta região. É que embora tenham formação académica suficiente para exercer outro tipo de funções, a verdade é que não há muita resposta por parte do mercado-de-trabalho, visto não haver equivalência de diplomas. Desta forma, os imigrantes exploram ao máximo a possibilidade de trabalho em ramos de actividade com necessidades de mão-de-obra indiferenciada e que normalmente existem por todo o país (verificamos que 66% tem como modo de vida o trabalho). No caso de Vila Viçosa, a indústria extractiva é um sector peculiar que acabou por ocupar muitos imigrantes. A quantidade de explorações e o tipo de trabalho que aí se realiza exige muita mão-de-obra que só é suprida, em muitos casos, com trabalhadores extra-regionais, nomeadamente por estes imigrantes 172. A construção civil também acaba por revelar uma maior absorção de mão-de-obra imigrante, contudo poderemos contar este número de uma forma mais relativa, ligada à quantidade de obras a realizar. Por exemplo, na altura em que foi realizado o inquérito, é natural que houvesse um maior número de imigrantes a trabalhar nas obras, uma vez que estava a ser feita uma ligação rodoviária entre Borba e Vila Viçosa, que exigia bastante mão-de-obra. 170. É de ter em conta que na parte do quadro respeitante à «Profissões Anteriores», não se teve em conta o caso dos 11 estudantes inquiridos. No caso da «Profissões Actuais» não se teve em conta o caso dos 11 estudantes, de 1 doméstica e de 5 desempregados. Nesta parte da análise, apenas se reflectiu sobre as profissões em si, no entanto os casos não contemplados no quadro irão ser considerados mais adiante. 171. Pela Classificação Nacional das Profissões de 94, estes imigrantes pertencem ao grupo 9 («Trabalhadores Não Qualificados»), já que não têm formação adequada para desempenharem a função que exercem. 172. De notar que muitos já tinham exercido funções em pedreiras, nomeadamente noutros concelhos adjacentes onde referiram ter trabalhado. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Gráfico 22 – Modo de vida dos imigrantes inquiridos

A cargo da família 30%

Subsídio de desemprego 4%

Trabalho 66%

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Na data da realização do inquérito, 66% tinham o trabalho como modo de vida, sendo 30% dos inquiridos estavam a cargo da família (essencialmente estudantes e desempregados) e 4% auferiam de subsídio de desemprego. Sublinhe-se que apenas 2 dos 5 que se encontravam desempregados, no momento do inquérito, são quem recebiam subsídio de desemprego 173, o que significa que existem casos onde o imigrante não aufere dos seus direitos ou porque não têm consciência deles ou, como provavelmente aconteceu nestes casos, os anteriores contratos de trabalho não estavam claramente regulares. Analisando mais especificamente, constata-se que cerca de 66% dos inquiridos são activos com profissão, enquanto 10% estão desempregados, 2% são domésticas e 22% estudantes. O peso da população jovem aqui é notório, porém não é significativo para a estrutura demográfica, visto que a grande maioria dos casais tem 1 ou 2 filhos, sendo raros os casos em que o agregado apresenta 3 ou mais filhos. Isto quer dizer que, ao contrário do que se pode pensar, os imigrantes da Europa de Leste tendem a imitar os padrões demográficos do local de chegada. É certo que poderão engrossar a população activa, visto que a idade e o objectivo 173. Isto quer dizer que, perante a actividade económica, 66% da amostra são activos com profissão, a que se deve acrescer 10% que sendo considerados desempregados, incluem-se na população activa (76% são activos). A partir da amostra, verificamos que há um forte contraste com a população activa do concelho de Vila Viçosa, que é de 48,6% (no entanto tenha-se em atenção que o peso do número absoluto de imigrantes na população total desta região é muito baixo). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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da migração assim o permitem. Este facto é bem notório se tivermos em conta que se tratam de indivíduos que muitas vezes, no seu regime de trabalho permanente (97% dos inquiridos que exercem uma profissão), ainda fazem horas extraordinárias (cerca de 52%), numa média de 2 horas a mais do horário laboral, por dia 174. Gráfico 23 – Condição dos inquiridos perante a actividade económica

Estudante 22% Activo com profissão 66%

Doméstica 2%

Desempregado 10%

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Interessante será constatar que a grande maioria têm trabalho fixo, com contratos de trabalho que se supõem claros e congruentes: como já referimos 97% dos inquiridos que trabalham têm um regime de trabalho permanente, com tempo completo, ou seja, 8 horas diárias, embora a média de horas de trabalho da amostra seja de 9 horas diárias. No entanto, 3% dos inquiridos que trabalham afirmam ter um ritmo de trabalho ocasional, ou seja, não têm um contrato de trabalho com tempo completo. O que parece acontecer é que o ritmo de trabalho torna-se parcial, ou seja, em vez de exercerem uma só tarefa num só sítio e poderem fazer horas extras, acabam por desempenhar mais do que uma tarefa em mais do que um sítio e acabar por trabalhar mais do que 8 horas por dia 175.

174. É de ter em conta que 52% dos inquiridos que trabalham afirmaram que faziam horas extraordinárias, em média cerca de 2 por dia. 175. Em média, quem trabalha em tempo parcial, acaba por fazer 10 horas por dia. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Porém, a grande maioria afirmou não exercer nenhum trabalho em paralelo (cerca de 94% dos inquiridos que referiram trabalhar), o que perante este cenário parece um pouco contraditório. Normalmente estes imigrantes durante a semana costumam fazer horas extraordinárias (provavelmente até mais do que aquelas que foram indicadas no inquérito), e quando não o fazem no fim-de-semana, acabam por realizar algumas tarefas esporádicas ligadas à construção civil (serventia). Portanto, parece haver diferenças entre o que foi respondido no inquérito e o que se passa na realidade. Não são poucas as vezes que se podem encontrar filhos de imigrantes de Leste que chegam atrasados e cansados à escola porque os pais se encontram a trabalhar e eles ficam encarregados de tratar da casa e dos irmãos (ou até mesmo ajudar os pais). Gráfico 24 – Forma como o imigrante inquirido obteve o emprego actual A. país de origem/ Patr. português 3%

Não respondeu 3%

Patrões portugueses 25%

Amigos do país de origem 39%

Amigos portugueses 30%

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Refira-se ainda que todos os inquiridos que trabalham o fazem por conta de outrem, não estando nenhum na situação de patrão, o que se pode dever ao facto ainda não ter havido condições temporais/económicas para tal. No entanto se verificarmos noutros grupos de imigrantes que se encontram em Portugal, apenas entre os Chineses, os Indianos e alguns Moçambicanos é que há mais indivíduos estabelecidos por conta própria no ramo do comércio e da restauração. Por outro lado, os ramos em que os Europeus de Leste se encontram a trabalhar, nomeadamente a construção civil e a indústria extractiva (no caso de Vila Viçosa) são áreas onde é necessário bastante capital para iniciar um negócio. Também as mulheFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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res, que estão no ramo da restauração e dos serviços de limpeza não parecem apresentar predisposição para encetar um negócio por conta própria (nem dispõem ainda de capital suficiente, provavelmente). Um ponto que parece ser positivo e que pode ser de certa forma o testemunho da integração, refere-se à forma como estes imigrantes arranjaram o emprego actual. Em cerca de 30% dos casos, foram apenas os amigos do país de origem/portugueses queconseguiram o trabalho para o imigrante (em 68% dos inquiridos, o que mostra já um certo grau de integração na comunidade). Gráfico 25 – Formas de «sobrevivência» dos imigrantes inquiridos, durante o período de desemprego

Percentagem de activos inquiridos

35%

33%

33%

30% 22%

25% 20%

12%

15% 10% 5% 0% Tarefas precárias

Subsídio de desemprego

A cargo da família

Dinheiro ganho antes

Formas de «sobrevivência» durante o período de desemprego

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Esta é uma comunidade que começa a tomar proporções quantitativamente consideráveis. Cerca de 48% dos inquiridos afirmaram trabalhar com pessoas da mesma nacionalidade (63% trabalha apenas com mais uma pessoa). Contudo parece ser um dado interessante o facto de tal ser mais significativo no ramo da construção civil. Talvez isto aconteça porque muitas das pedreiras tratam-se de empresas familiares (PME ) 176, com um número relativamente reduzido de empregados, onde a probabilidade indivíduos de nacionalidade estrangeira se encontrarem a traba176. PME – Pequenas e Médias Empresas. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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lhar é menor, do que na construção civil, onde o mercado já é dominado por empresas maiores. O fenómeno do desemprego também atinge estes imigrantes nesta região. Existiam os casos de 5 inquiridos que, na altura do inquérito, estavam nesta situação e cerca de 73% dos inquiridos que hoje trabalham já estiveram desempregados em Portugal 177. Como nem sempre a sua situação estava regularizada, ou a precariedade dos contratos de trabalho não consignava todos os direitos laborais, restava apenas uma situação de sobrevivência baseada na realização de tarefas precárias (33% dos inquiridos) ou ficarem a cargo da família (22% de inquiridos), dependendo daquilo que o outro cônjuge recebia de salário, ou ainda promover o retrocesso da motivação económico, gastando das economias acumuladas (12% dos inquiridos). Em 33% dos casos beneficiou-se do subsídio de desemprego, o que parece ser ainda um número baixo, face a uma população com uma taxa de activos relativamente elevada. Mas esta foi uma questão que se referiu essencialmente ao passado, o que pode ter dado já tempo e margem de manobra para que as situações irregulares se regularizassem e não se voltem a repetir, pelo menos com tanta frequência. Na altura do inquérito, cerca de 90% estavam inscritos na Segurança Social e beneficiavam dos direitos consignados. Porém, apesar de tanto optimismo que demonstraram, ficará sempre um pouco de desconfiança, se afinal não estarão alguns deles a encobrir casos de injustiça, por uma questão de medo e de manutenção do emprego. Como veremos mais adiante, os autóctones são mais da opinião que além de casos de exploração no trabalho que conhecem, outros ainda estão encobertos e carecem de denúncia. Todavia, o que reina nestas situações costuma ser, infelizmente, o silêncio. 2.3.4. Outros aspectos da vida comum: da Saúde à Educação A questão da integração na vida quotidiana da comunidade de acolhimento também pode ser vista a partir da dinâmica imprimida no uso e acesso a certo tipo de serviços comuns ao autóctone e que agora passam também a ser do imigrante. Desta forma, achou-se pertinente o estudo de dois dos serviços mais utilizados pela população nomeadamente os que se encontram ligados à Saúde e à Educação.

177. O despedimento praticamente sempre individual, com respectiva justificação (cessação do contrato). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Do total de inquiridos, 80% referiu já ter acedido aos serviços do SNS 178, tendo este grupo recorrido entre 1 e 2 vezes (67% das respostas). Cerca de 18% recorreram mais do que 3 vezes, estando os seus casos ligados a questões de saúde cuja morosidade do processo de cura/acompanhamento requereu mais cuidados, como foi o caso de inquiridos que sofreram acidentes domésticos (de que resultaram queimaduras, problemas ortopédicos…) ou de inquiridas que se encontravam grávidas, respectivamente. Os motivos que estiveram na base desta procura, em 45% dos inquiridos, foram essencialmente ligados a períodos de gripe/constipação/alergia e outras patologias (dores de costas, de dentes, de barriga…), acidentes domésticos (21% dos inquiridos), bem como situações em que o inquirido não era propriamente o paciente, mas ia como acompanhante de alguém em situação de doença (12% dos casos). Outros motivos pontuais como são o caso de situações de vacinação (5% dos inquiridos), gravidez (5% dos inquiridos), acidente rodoviário (2% dos inquiridos), também levaram estes imigrantes a recorrer ao SNS. Do total de inquiridos, 10% referiu ter recorrido a este serviço porque sofreram acidentes de trabalho. Estes são indivíduos do sexo masculino que trabalham na construção civil ou na indústria extractiva. Todos estavam cobertos pelo seguro, uma vez que se encontravam com o contrato de trabalho regular e isso facilitou a sua inserção no sistema. O trabalho nas pedreiras assegura-se como de alto risco. Infelizmente são comuns as notícias de trabalhadores que ficam estropiados ou que morrem entalados em máquinas ou esmagados por blocos de mármore, porém neste grupo de inquiridos, os acidentes resultantes parecem não ter sido graves. Não quer dizer que outros casos não tenham já ocorrido, no entanto é um assunto quase que impenetrável, quer por parte dos imigrantes, quer por parte dos empregadores, uma vez que podem ter ocorrido em situação de irregularidade do trabalhador e do próprio contrato de trabalho, daí que se torne muito difícil a investigação deste ponto. No que diz respeito ao balanço no atendimento, os inquiridos referem que foi «razoável» (68%), havendo mesmo aqueles cujo grau de satisfação se elevou ao «bom» (25% dos inquiridos) e «muito bom» (2% dos inquiridos). Muitos destes casos foram influenciados pelos recursos humanos no local de atendimento, ou seja, pelo facto de Vila Viçosa ser um concelho de fronteira e por isso alguns profissionais de saúde (médicos e enfermei-

178. SNS – Serviço Nacional de Saúde. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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ros) serem espanhóis. Alguns inquiridos comentaram que esse foi um facto importante para que se tenham sentido mais apoiados e à vontade, uma vez que, tal como eles, também esses profissionais eram estrangeiros. Assim, era como se houvesse uma ligação mais forte entre médico/enfermeiro e paciente, uma vez que estavam num lugar que não eram originalmente os deles e esse aspecto em comum fazia com que se compreendessem melhor, não só no aspecto da saúde física, mas também noutros mais ligados à parte psicológica. Dos 5% de inquiridos que referiram que o balanço de atendimento foi mau, apontaram que essa percepção foi fruto de grandes períodos de espera para serem atendidos e de pouco profissionalismo de funcionários, cujo comportamento, afirmam, ter resvalado para uma atitude um pouco xenófoba. Talvez a questão das dificuldades de comunicação possam estar na base desta visão. Normalmente o atendimento é feito por pessoas sem formação adequada, nomeadamente ao nível das Línguas, o que poderá ter dificultado o contacto. Por outro lado, a «falta de paciência» por parte do paciente ou do acompanhante que estão condicionados por uma situação de doença, pode exacerbar estes comportamentos. Gráfico 26 – Balanço feito pelos imigrantes, do atendimento no SNS

70% Percentagem de inquiridos

68% 60% 50% 40% 30% 25%

20% 10%

5%

2%

0% Mau

Razoável

Bom

Muito Bom

Grau de satisfação

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Poucos são aqueles que acederam a serviços privados de saúde (apenas 12% dos inquiridos) e quando o fizeram não foi tanto por questões de urgência, mas antes na busca de uma segunda opinião (casos ortopédico e de Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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alergias), ou então porque a especialidade pretendida não estava disponível nos hospitais mais próximos do concelho e quando estava, o tempo de espera para uma consulta era longo (caso de dentista). O atendimento é considerado por praticamente todos os inquiridos utilizadores como bom. Portanto, significa que na questão da Saúde, o primeiro recurso é feito ao público e só depois, em caso de necessidade e que ocorre a procura de serviços privados. Tal comportamento estará certamente condicionado por questões económicas (a imigração ainda é relativamente recente, portanto é natural que as economias ainda sejam parcas), contudo, de uma geral, os inquiridos parecem estar satisfeitos com os serviços ligados ao SNS. A Educação também é um serviço, ou melhor dizendo, é o espaço, por excelência, onde os filhos dos imigrantes contactam diariamente com a comunidade, sendo por isso a escola um local privilegiado para a integração, não só porque os conteúdos das matérias promovem o conhecimento da realidade nacional, mas também porque é um local de convívio com autóctones e de aprendizagem da língua do país de chegada. Há necessidade de interiorização de novas regras de funcionamento da escola, que mesmo não sendo muito diferentes das praticadas no país de origem, obrigam a que haja uma adaptação a uma realidade a que muitos alunos não estavam habituados. É certo que existem casos de filhos de imigrantes que começaram aqui a sua formação escolar (no Pré-Escolar e no 1.º Ciclo do Ensino Básico), no entanto a maioria já tinha realizado alguns anos de estudo no país de origem. Gráfico 27 – Nível de ensino frequentado pelos imigrantes inquiridos/filhos dos imigrantes inquiridos

Percentagem de inquiridos

60% 14%

50% 40%

24%

30%

45%

20% 23%

16%

23% 27%

10% 0%

18%

9%

0%

o o o io ar icl icl icl ár ol o C o C o C sc nd . . . e u c é–3 –2 –1 Se Pr Pais que têm filhos a EB EB EB E. frequentar a escola Alunos a frequentar a Nível de ensino escola

Elaboração própria – Inquéritos (2004). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Como podemos constatar, a maioria dos alunos inquiridos frequentam o 2.º Ciclo (45%) e o 3.º Ciclo do Ensino Básico (27%) 179. No entanto, quando se faz uma análise dos pais que responderam ao inquérito, verificamos que há um número significativo não só daqueles que têm filhos no 3º Ciclo do Ensino Básico (24%) e no Secundário (23%), bem como no nível Pré-Escolar (23%). Não se verificou, pelo menos na amostra, nenhum caso de nenhum filho de imigrante que frequentasse o Ensino Superior. Está-se em presença de um grupo de imigrantes relativamente jovens. Estes níveis de idades correspondem adequadamente à idade dos filhos dos imigrantes desta comunidade, ou melhor dizendo, representam a idade média da maioria dos casais que aqui vivem, que andará na casa dos 30/40 anos, no entanto já se verifica um número significativo de casais na casa dos 20 anos, cujos filhos já nasceram no país de chegada e que agora frequentam o ensino Pré-Escolar. De referir que, excepto em 2 casos, todos os discentes estudam com colegas da mesma nacionalidade, o que pode ajudar no processo de integração, já que o aluno estrangeiro não se sentirá tão isolado. Gráfico 28 – Percepção sobre problemas existentes na integração escolar, por parte dos pais e alunos imigrantes inquiridos

Percentagem de inquiridos

100% 90% 80% 70%

Não; 64% Não; 82%

60% 50% 40%

Não exstiram problemas

30% 20%

Sim; 36% Sim; 18%

10%

Sim notaram-se problemas

0% Alunos

Pais

Elaboração própria – Inquéritos (2004). 179. O inquérito foi feito maioritariamente a alunos de níveis a partir do 2.º Ciclo do Ensino Básico, uma vez que se apresenta mais perceptível a partir das idades correspondentes a estes níveis. No entanto, existem alunos a frequentar os níveis anteriores a estes, como iremos ver. De notar ainda que a parte do inquérito correspondente a esta parte da análise («Educação»), foi realizado com questões adaptadas aos inquiridos que têm filhos a estudar (ou não), e aos inquiridos que frequentam instituições de ensino. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Quando inquiridos sobre o processo de integração, apesar de pais e filhos concordarem que houve alguns problemas, estes parecem já estar ultrapassados, tanto que a maioria dos pais e filhos afirma mesmo que não houve nenhuma questão problemática relevante na questão da integração no meio escolar. No entanto, e como podemos constatar no gráfico, os «filhos» parecem ter sentido mais os problemas do que os «pais», já que há uma maior percentagem de alunos inquiridos que afirmaram ter tido problemas na integração (36%). O cerne encontra-se na relação entre autóctones e imigrantes, ou seja, muitas vezes os colegas de turma manifestavam uma certa hostilidade perante o Outro que vinha do estrangeiro e que falava uma língua diferente. O problema de relacionamento pode nem estar tão relacionado com o nível etário(afinal, é suposto numa turma os níveis etários dos alunos serem próximos), mas antes com ideologias inculcadas no seio familiar, decorrentes da «concorrência» entre alunos no meio escolar. Os alunos filhos de imigrantes da Europa de Leste, apresentam até bons resultados180 a disciplinas que não necessitam do português como língua primordial, tal como acontece na matemática. Normalmente nesta matéria, costumam superar os alunos autóctones, não só porque já vêm habituados a um sistema de ensino que promoveu o pensamento lógico matemático, mas também porque é uma área em que a maioria dos pais consegue dar algum apoio em casa. Muitos alunos nacionais não se sentem confortáveis com essa situação de serem ultrapassados pelo desempenho escolar dos filhos de imigrantes, daí que alguns atritos também possam decorrer desta realidade. Todos os alunos beneficiam de Apoio Pedagógico Acrescido à disciplina de Língua Portuguesa, excepto os alunos do ensino pré-escolar e dos primeiros anos do 1º Ciclo do Ensino Básico, uma vez que o nível etário permite que poliglotismo se desenvolva com mais facilidade. Constatou-se que muitos pais com filhos nestes níveis, afirmavam que as crianças já falavam melhor o português do que eles próprios. Neste caso, o apoio deveria ser ao contrário do existente, ou seja, promover a forma de não esquecerem a língua materna do país de origem. Esta é uma questão presente quer dos pais (93% dos inquiridos), quer dos filhos (82% dos inquiridos), embora pareça que o primeiro grupo sente 180. A imprensa escrita deu a conhecer o caso de três filhos de um detido na prisão de Elvas, que vivem com dificuldades, mas que sobressaem pelo seu óptimo rendimento escolar (Correio da Manhã, Miúdos sobressaem pelo rendimento escolar, 4.ª feira, 7 de Julho de 2204). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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mais a necessidade que a sua descendência continue ligada ao país de origem, através dos laços linguísticos. Da parte dos «filhos», há essencialmente uma preocupação em não esquecer a língua que originalmente falam, uma vez que se trata da língua-materna, bem como para preservar as raízes com o seu país e dos seus pais, visto que parte considerável da família ai se encontra. No entanto, há uma maior versatilidade nesta questão visto que muitos afirmam que todas as línguas são importantes, seja ela a do país de origem ou não e não sendo esta a mais importante, é-o pelo menos em paralelo com o inglês, na questão da utilidade. A última consideram-na como «língua universal» e a primeira como língua de contacto com as raízes. Os «pais» já vão mais longe, referindo que seria importante o estudo da língua materna para não esquecer o que já aprenderam dela, mas que também é importante saber a língua porque é a que os pais, os avós e a restante família falam, e para manter as raízes com o país de origem, através do conhecimento da sua história. Perante este último argumento, poderemos ser levados a pensar que a história de qualquer país se pode escrever, obviamente, em qualquer idioma, contudo os pais acham que o conhecimento será mais completo se este for apreendido no idioma de origem. Gráfico 29 – Importância da aprendizagem da Língua Materna, para os pais e alunos imigrantes inquiridos

Percentagem de inquiridos

100%

Não; 7%

Não; 18%

90% 80% 70% 60% 50%

Sim; 93%

Sim; 82%

Não é algo importante

40% 30%

Sim é deveras importante

20% 10% 0% Alunos

Pais

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

A Língua Portuguesa parece ser uma disciplina em que os alunos manifestam mais dificuldade, a par da Língua Inglesa. Acham que são línguas Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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difíceis e no primeiro caso, acham que a gramática complexa. O facto de existirem diferenças entre os alfabetos, regras gramaticais, tempos verbais, estruturas frásicas… entre o português e o moldavo (língua da maioria dos inquiridos), pode estar na base da dificuldade de compreensão gramatical. Por outro lado, também é necessário a aquisição de vocabulário específico para abordar esta área (e que os alunos imigrantes não dominam), o que dificultam todo o processo de ensino-aprendizagem. No caso da Língua Inglesa, a dificuldade também poderá estar ligada a este tipo de argumentos. Disciplinas como a história, a geografia, as ciências naturais… também se tornam por vezes difíceis, não só porque tratam assuntos da realidade nacional (diferente do país de origem), mas sobretudo porque os conteúdos são abordados em português. Por outro lado, e como já foi referido, a matemática é vista como uma disciplina fácil, já que os números são universalmente perceptíveis. Em muitos casos tratam-se conteúdos que já tinham sido apreendidos no país de origem e que por isso já são dominados pelo aluno. Por outro lado, alguns pais referiram que esta é uma disciplina que conseguem acompanhar, já que são assuntos que dominam, numa linguagem que eles próprios conhecem. Só poderá tornar-se algo mais difícil quando alguns conteúdos são explicados em português. A educação física também é muito apreciada, não só devido à própria natureza da disciplina, mas também porque o Português não se assegura como essencial em desportos universalmente jogados (por exemplo, o futebol ou basquetebol), ou em exercícios facilmente executáveis por «imitação». A extensão dos programas e a «pressão» para que todas as matérias sejam abordadas ao longo do ano lectivo, aliado ao crescente número de alunos por turma, leva a que não seja possível um apoio mais individualizado a estes alunos. Por outro lado, as aulas de Apoio Pedagógico Acrescido nem sempre se revelam com sucesso, uma vez que os próprios professores de português (e todos os professores em geral) não têm formação adequada nem materiais didácticos adaptados para leccionar de forma eficaz os conteúdos a estes alunos. Seria pois desejável um professor de apoio individualizado com formação, que pudesse acompanhar os alunos em cada aula, de forma a manter um nível de ensino mais individualizado, o que certamente facilitaria a integração do aluno nas matérias e na própria turma. Estes seriam questões que os pais dos alunos poderiam levantar, talvez se a sua participação na vida escolar do seu educando fosse mais activa. Cerca de 68% dos pais inquiridos afirmou que mantém pouco contacto com a escola e 3% chegaram mesmo a admitir que não têm contacto Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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nenhum, sendo que apenas 29% contactam a escola frequentemente. Esta situação certamente será promovida pelo horário de trabalho dos encarregados de educação, que coincide com as horas de reunião e com o horário de atendimento do director de turma dos filhos, daí que não possam comparecer tantas vezes como o desejado. O relatório do Eurydice 181 de 2004 sobre os imigrantes que frequentam o sistema de ensino português, revelou que existem perto de 89 540 filhos de imigrantes a frequentarem o sistema de ensino português 182. São números bastante significativos, que deveriam mobilizar as instâncias competentes a estruturar um sistema de apoio a estes alunos, adaptando não só os recursos físicos, mas também os recursos humanos escolares às necessidades específicas dos filhos dos imigrantes, de forma a promover o seu sucesso escolar e a integração na própria comunidade. 2.3.5. Outros aspectos da vida comum: da Habitação aos Rendimentos Também se procurou saber um pouco mais das condições materiais de vida de que os imigrantes da Europa de Leste dispunham em Vila Viçosa, no sentido de avaliar informalmente o grau de conforto do seu dia-a-dia. Todos, sem excepção, referiram viver em casa arrendada, sendo que a maioria vive no actual alojamento há menos de 2 anos ou 2 anos inclusive (98% dos inquiridos), o que não é de estranhar, dado o facto de ser um grupo que se instalou em Vila Viçosa há relativamente pouco tempo. Os contratos temporais estabelecidos no arrendamento, deixam sérias dúvidas quanto à temporalidade da migração, ou seja, não há um vínculo mais profundo que possa deixar antever uma possível fixação, como eventualmente poderia acontecer no caso da compra de habitação. Porém, e como já se constatou, a maioria ainda não sabe se pretende obter nacionalidade portuguesa, o que traduz a indecisão quanto à questão da permanência. Por outro lado, as possibilidades económicas ainda não serão suficientes para adquirir uma habitação. Verificou-se que estes imigrantes vivem essencialmente no núcleo histórico da vila, bastante perto uns dos outros. Os autóctones, tendencialmente, procuraram habitações nos bairros novos da vila, deixando casas 181. Organização da Comissão Europeia. 182. Informação retirada do site: http://www.educare.pt/noticia_novo.asp?fich=NOT_20040917_3836, 90 mil imigrantes nas escolas portuguesas, (21/09/2004). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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vazias no centro, as quais vieram ser ocupadas por estes imigrantes de Leste. Também se observou que a mobilidade habitacional é significativa, ou seja, muitos dos inquiridos referiram que já mudaram pelo menos uma vez de habitação, visto terem conseguido melhorar as suas possibilidades económicas. Nessa altura, procuraram arrendar uma casa maior e com melhores condições de habitabilidade. Desta forma, o contrato de arrendamento delimitado no tempo, assegura-se como um forma do imigrante procurar melhorar as condições de habitabilidade do seu agregado familiar, o que de certa forma, também pode indicar o prolongamento da migração. Se esta fosse temporariamente definida «a curto prazo», certamente que haveria menos probabilidade de procura de mais conforto na habitação.183 Esta busca da melhoria das condições de vida no local de chegada, leva-nos a pensar que a possibilidade de estabelecimento neste local não seja de todo descurada. Por outro lado, há outro argumento que reforça esta ideia, e que tem a ver com bens/serviços adquiridos para melhorar o seu quotidiano. Constatou-se que dispõem de um conjunto de infraestruturas como luz eléctrica, água canalizada, casa de banho, saneamento básico; e equipamentos como televisão, vídeo ou Dvd, antena parabólica ou tvcabo, computador, máquina de lavar roupa, telemóvel, automóvel; serviços como a recolha municipal de lixo. É certo que prescindem do telefone (substituído pelo telemóvel) ou da Internet, no entanto muitos referiram ter antena parabólica (muitos autóctones também não têm estes equipamentos), uma vez que conseguem apanhar o sinal de alguns canais russos. A comunicação e o acesso à informação já é uma condição essencial para a maioria, que cada vez mais tende a investir neste tipo de equipamentos. Verifica-se também que as condições de infraestruturas/equipamentos/serviços básicos estão supridos, o que lhes dá margem de manobra para adquirir outros bens, que já não sendo considerados «básicos», contribuem para o bem-estar material do agregado (por exemplo, computador, automóvel…).184 Normalmente o agregado familiar é composto por 3 pessoas (42% dos inquiridos) ou por 4 pessoas (30% dos inquiridos), ou seja, pelo «pai», «mãe» e por 1 ou 2 filhos.185 Esta estrutura do agregado vem confirmar 183. Recorde-se que 5% das respostas indicaram que os imigrantes escolheram esta região para habitar não só mas também por causa da habitação. 184. Certamente que o facto destes imigrantes investirem no suprimento de necessidades que não as básicas (comunicação, informação…) terá a ver não só com o poder económico de que dispõem, mas sobretudo com o seu nível de formação médio-elevado. 185. A média de pessoas que fazem parte do agregado familiar é de 3,5 indivíduos. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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o facto de que estes imigrantes têm um comportamento demográfico similar à média nacional, ou seja, cada casal têm entre 1 e 2 filhos, sendo bastante mais raros aqueles que têm 3 ou mais filhos, o que por si só, e como já se constatou anteriormente, não reverterá a situação de envelhecimento populacional que cada vez mais se acentua no nosso país. Gráfico 30 – Número de pessoas que compõem o agregado familiar dos imigrantes inquiridos

Com 5 pessoas 16%

Com 2 pessoas 12%

Com 4 pessoas 30%

Com 3 pessoas 42%

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

O rendimento médio da maioria destes agregados (42% dos inquiridos) anda entre os € 501 e os € 750 , sendo que 28% referiu conseguir auferir mais do que isso (entre € 751 e € 1000). Partindo do princípio de que, serão os cônjuges apenas aqueles que contribuem monetariamente para este valor (recorde-se que os filhos estão em idade escolar) e que muitos deles recebem o ordenado mínimo, alguns poderão perfazer somas mais consideráveis, a partir da execução de tarefas mais ou menos esporádicas e precárias ou horas extraordinárias. No fundo, verifica-se que há uma predisposição para que o núcleo familiar imigrante se instale com algumas comodidades e que estas tendem a ser cada vez mais tomadas em conta, daí que seja comum a busca de habitações mais espaçosas e com melhores condições, bem como de equipamentos que possam suprir as suas necessidades. O facto da Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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migração ser familiar e dos filhos acompanharem os pais, certamente conduzirá a que se procure atingir um nível de comodidade que satisfaça toda a família. Assim, as necessidades verificadas no país de origem, acabam por ter minimamente resposta neste local de chegada, o que poderá contribuir para que o tempo de estada da migração tenha tendência a se alargar, pelo menos enquanto a resposta às necessidades for favorável. 3. IMIGRANTES DA EUROPA DE LESTE E AUTÓCTONES… NA BUSCA PELA INTEGRAÇÃO? 3.1. Quem são aqueles que vivem em Vila Viçosa? Caracterização da amostra em estudo Uma análise sobre esta temática carece sempre do ponto de vista do imigrante, porém assegurar-se-ia como incompleta, na medida em que muitas vezes a percepção do local de chegada depende sobretudo do aspecto humano que o caracteriza e do contacto diário com essa mesma população. Sendo assim, e de forma a melhor podermos conhecer a dinâmica inerente a este grupo de imigrantes da Europa de Leste que se veio estabelecer neste concelho, procurou-se saber a visão do autóctone de Vila Viçosa sobre o facto do seu quotidiano estar cada vez mais relacionado com o Outro imigrado. Gráfico 31 – Naturalidade dos autóctones inquiridos

70%

63%

50% 40% 30%

5%

3%

2%

Év or a

Al vit o

17%

20%

Bo rb a Es tr em oz Al an dr oa l

Percentagem de inquiridos

60%

4%

10%

2%

2%

2%

Naturalidade

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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M Ve on dr tr ea os Sa l la ( C m a an na ca dá ) (E sp an ha )

Al ho s

Vi la

Vi ço sa

0%

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Desta forma, aplicou-se um inquérito a uma amostra de 63 indivíduos (32 homens e 31 mulheres), que mesmo sendo uma pequena percentagem da população do concelho (com 8871 habitantes, em 2001), poderá ajudar no conhecimento e clarificação de algumas questões relacionadas, com a imigração da Europa de Leste em Vila Viçosa. Aleatoriamente, foram inquiridos indivíduos entre os 16 e os 83 anos (no feminino) e entre os 12 e os 72 anos (no sexo masculino). A média de idade da amostra ronda os 39,6 anos (39,4 anos no sexo feminino e 39,7 anos no sexo masculino), sendo que 63% dos inquiridos são casados, 32% solteiros e 5% viúvos. Gráfico 32 – Residência dos autóctones inquiridos

64%

Percentagem de inquiridos

70% 60% 50% 40% 30%

16%

20% 6%

10%

5%

3%

3%

3%

Es tr em oz

(N or a)

Bo rb a

Bo rb a

Vi ço sa

Vi la

Local de residência

Vi la

Vi ço sa

(C om .e

S. Ba rt .) Vi (B la en Vi ca ço te sa l) (S . Vi Ro la m Vi ão ço ) sa (P ar da is )

0%

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

A maioria reside no concelho (78% dos inquiridos), embora também tenham sido inquiridos indivíduos que se deslocam diariamente para trabalhar em Vila Viçosa. Embora estes não sejam residentes, a verdade é que contactam diariamente com a população imigrante, daí que se achasse pertinente a sua colaboração neste inquérito. A mobilidade da amostra pareceu ser um ponto importante para perceber até que ponto há ou não tolerância para compreender as diferenças do Outro. Desta forma, procurou-se saber num primeiro momento a nacionalidade, naturalidade e residência de cada inquirido e num segundo momento se efectivamente já tinham residido/trabalhado fora de Vila Viçosa.

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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A relação entre a naturalidade e a residência pode dar-nos pistas sobre o facto do indivíduo ter nascido e constituído vida num local que não onde reside actualmente, o que lhe confere um certo grau de mobilidade, porém, na maioria dos casos, tal não acontece efectivamente porque o nascimento num local diferente da residência não implica necessariamente que tal se tenha verificado. Por exemplo, existem casos de indivíduos que sendo os pais residentes em Vila Viçosa, tiveram de nascer no hospital de Évora, daí que sendo considerados naturais desta última cidade, efectivamente nunca viveram fora do concelho de Vila Viçosa. Constatou-se então que 96% dos inquiridos têm nacionalidade portuguesa, no entanto, no que concerne à naturalidade, há um maior número de origens, sendo que 63% são naturais de Vila Viçosa, 17% do concelho de Borba e outros de concelhos próximos (Alandroal, Estremoz, Évora…). Tal como já foi referido, a maioria dos inquiridos reside em Vila Viçosa, porém nem todos na sede do concelho, mas também nas freguesias. Assim, constatamos que 78% dos inquiridos residem em Vila Viçosa, 19% de Borba e 3% de Estremoz. Portanto, podemos observar que a maioria nasceu no local onde reside e quando isso não acontece, tratam-se de inquiridos que nasceram em concelhos mais ou menos limítrofes ao que está em estudo e que agora residem no mesmo. Portanto, à partida, não houve grandes alterações de realidades e de quotidiano que fossem suscitadas pela não residência num concelho donde não se é natural, visto que ambos os locais se encontram num meio relativamente próximo e similar. No entanto, explorou-se a possibilidade destes indivíduos, por algum momento, terem saído «da terra» para residir/ trabalhar, constatando-se que a grande maioria nunca o fez (só 17% é que já viveu noutro ponto do país e 5% no estrangeiro). Quem o fez e já residiu/trabalhou noutro ponto do país foi essencialmente na região de Lisboa e Setúbal e quem esteve fora de Portugal foi na Alemanha e no Canadá. Isto significa que o grau de mobilidade da população inquirida não é significativo, constatando-se que o comum é residir e trabalhar no local donde se é natural, sem nunca se ter saído para outro local. Trata-se ainda de uma amostra cujas habilitações literárias não são muito elevadas, como de resto na restante população autóctone, já que 30% possui o 3.º ciclo do ensino básico, 26% dos inquiridos apenas possui o 1.º ciclo e 6% nem sequer sabem ler ou escrever. Comparando com o que já foi analisado na amostra dos imigrantes de Leste, verificamos que estes têm mais formação, principalmente no Ensino Secundário e Superior do que os autóctones. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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No entanto há uma maior diversificação no exercício de funções profissionais, relativamente ao grupo dos imigrantes inquiridos, o que pode, à primeira vista, parecer contraditório. Contudo, depois de uma análise mais pormenorizada, conseguimos perceber que apesar dos imigrantes da Europa de Leste estarem mais bem preparados profissionalmente, ocupam lugares que estão em desacordo com a sua formação, uma vez que os seus diplomas não têm equivalência nem são reconhecidos no mercado de trabalho. A declaração de Bolonha 186 de 1999, propõe consolidar o espaço europeu do Ensino Superior, sendo que um dos objectivos passa pela adopção de um sistema de graus de acessível leitura e comparação no continente europeu. Baseado neste princípio, é natural que se caminhe para uma situação de equivalência de diplomas, dentro do espaços dos países que acederem à reestruturação do seu sistema de Ensino Superior nesta linha, o que poderia facilitar a mobilidade e empregabilidade nas áreas de formação, por exemplo dos imigrantes da Europa de Leste em Portugal, nomeadamente dos moldavos. No entanto, e tendo em atenção que os princípios desta declaração ainda se estão a ajustar nos países aderentes como Portugal, a Moldávia e outros países da Europa Oriental não aderiram, o que significa que o sistema de equivalências não será possível (nestes moldes). Gráfico 33 – «Mobilidade» dos autóctones inquiridos

Percentagem de inquiridos

100% 90% 80% 70%

83% 95%

60% 50% 40% 30% 20% 10%

17% 5%

0% Já residiu noutro ponto de Portugal

Já emigrou?

Sim

Não

Elaboração própria – Inquéritos (2004). 186. Estas informações foram obtidas através do site: http:\\www.ubi.pt/matubi/ Bolonha/Bolonha_Declaracao%20de%20Bolonha.pdf , (12/01/2005) Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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A concorrência que este grupo faria, se pudesse concorrer em situação de igualdade, a um emprego, com os autóctones, seria certamente intensa e em muitos casos o imigrante de Leste sairia vencedor. Este receio certamente potenciará o não reconhecimento das habilitações por parte do Estado e das entidades empregadoras, mas por mais quanto tempo? A entrada de alguns países da Europa de Leste na União Europeia poderá reverter este cenário e desta forma a concorrência será mesmo inevitável. Gráfico 34 – Habilitações literárias dos autóctones inquiridos

Ensino Secundário 18%

Ensino Superior 6%

Não sabe ler nem escrever 6%

Ensino Básico – 3.o Ciclo 30%

Ensino Básico – 1.o Ciclo 26%

Ensino Básico – 2.o Ciclo 14%

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Por outro lado, os imigrantes de Leste são apreciados pelos empregadores por realizarem bem e rapidamente o seu trabalho, além de serem considerados muito educados. Estas condições poderão pesar e se aceitarem desempenhar outro tipo de funções com salários mais baixos que os praticados, os empregadores poderão preterir os nacionais. Neste grupo de autóctones inquiridos, a maioria (46%) desempenha profissões 187 ligadas à área dos serviços (pessoal administrativo, 187. Foi utilizada a Classificação Nacional de Profissões de 1994. Deve referir-se que esta classificação não têm em conta os reformados, estudantes e domésticas que foram inquiridos (8,9 e 3, indivíduos respectivamente. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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vendedores…) 188, embora um número considerável (23%) esteja incluído no grupo dos trabalhadores não qualificados 189. Estes desempenham funções na área da construção civil e da indústria extractiva, embora 19% dos inquiridos trabalhem nesta área, com formação adequada 190. O facto da grande maioria dos inquiridos nunca ter saído do concelho onde nasceu para trabalhar/residir e as fracas habilitações literárias, são factores que poderão contribuir para uma maior dificuldade na aceitação do Outro, pois não se conhece nem há muita consciência dele. Os autóctones parecem ser pessoas com menos mobilidade, não estando habituados a viver na fronteira de culturas (apesar da proximidade com Espanha, essa é uma cultura «habitual»), que implica padrões de comportamento, hábitos, normas, regras… diferentes. Perante esta inexistência de «padrão de confronto», poderá haver o perigo da instauração da verdade absoluta, ou seja, a não-aceitação do Outro porque este traz algo de diferente que poderá alterar o sistema sócio-cultural imposto. É aqui que a hipótese de experimentar as possíveis alterações (que poderão ser para melhor) e o medo de arriscar se cruzam. 3.2. A aceitação do Outro como Cidadão A aceitação do Outro também depende da representação que este tem para o autóctone. A concepção de cidadania será um ponto-chave que ambos terão em conta, na medida em que será o elo de ligação entre o pólo imigrante-autóctone. A participação numa sociedade com regras específicas implica o cumprimento de deveres e direitos comuns. Se estes aspectos forem cumpridos por todos, ou melhor dizendo, se pelo menos o autóctone pensar que o imigrante terá capacidade para tal, o processo de aceitação será amplamente facilitado, visto que se constrói a imagem de um Outro capaz, autónomo, com possibilidade de integrar uma comunidade com funcionamento próprio, participando de forma mais ou menos activa. 188. Segundo a Classificação Nacional de Profissões de 1994, inserem-se no grupo 4 («Pessoal Administrativo e Similares») e 5 («Pessoal dos Serviços e Vendedores»). 189. Segundo a Classificação Nacional de Profissões de 1994, inserem-se no grupo 9 («Trabalhadores Não Qualificados»). 190. Segundo a Classificação Nacional de Profissões de 1994, inserem-se no grupo 7 («Operários, Artífices e Trabalhadores Similares») e 8 («Operadores de Instalações e Máquinas e Trabalhadores da Montagem»). Refira-se que a presença de uma escola profissional destinada essencialmente à aprendizagem de ofícios ligado ao trabalho na indústria extractiva, em Borba, contribuiu para a formação de muitos trabalhadores. Por outro lado, muitas das tarefas são realizadas com máquinas, que para serem operadas, exigem pessoal com formação específica. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Neste caso, os autóctones de Vila Viçosa, quando inquiridos sobre a entrada de mais imigrantes em Portugal, mostram-se apreensivos, tanto que 46% dos inquiridos não concordam com esta vinda. Justificam a sua posição essencialmente com argumentos de ordem económica, ou seja, 69% dos inquiridos que revelaram esta posição acham que não devem entrar mais imigrantes em Portugal, uma vez que irão ocupar pontos de trabalho que deveriam ser apenas para os nacionais, provocando uma situação de concorrência. Além disso, 20% acrescenta a estes argumentos o facto de que os seus costumes poderão incomodar a comunidade, além de que poderão representar um perigo para a segurança da mesma. Há ainda quem tenha referido que a conjuntura económica poderia levar a situações de eventual desemprego entre os imigrantes, o que potenciaria a insegurança e a própria mendicidade. Dos 54% de inquiridos que revelam uma opinião contrária, cerca de 76% refere que os imigrantes ajudam a desenvolver a economia do país através do seu trabalho e que, além disso, executam tarefas que muitos nacionais não querem desempenhar, portanto, por si só não ocupam postos de trabalho dos nacionais (até porque não quer dizer que estes tenham de ser única e exclusivamente para os nacionais). Por outro lado, também está patente a ideia de que os imigrantes podem trazer novas ideias que beneficiem alguns aspectos da vida económica e científica portuguesa.191 Entre estes autóctones, vigora a ideia de que os Europeus de Leste são indivíduos com bastante capacidade de trabalho e que, conjuntamente com outros grupos migratórios, poderão integrar a população activa, o que seria benéfico para a estrutura demográfica e social portuguesa. Apesar de se verificar que a amostra tende a travar a entrada de mais imigrantes, mostrando um receio de eventuais situações de exclusão social, provocada por uma saturação das ofertas do mercado de trabalho, revelam uma certa capacidade de aceitar o Outro que já cá se encontra, já que 94% dos inquiridos refere que concorda com a permanência dos imigrantes que se encontram em Portugal e cuja situação está legal. Os 6% de inquiridos que não concordam com a permanência dos imigrantes legalizados, argumentam que Portugal já tem demasiados imigrantes, os quais não pertencem ao país e que estes ocupam os empregos dos nacionais. Apesar de nunca se assumirem como tal, revelam uma atitude que resvala para um comportamento bastante intolerante.

191. Muitos deles têm formação superior, que poderão ser ligadas à área da investigação e inovação. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Gráfico 35 – Concordância dos autóctones inquiridos, com a permanência de imigrantes legais/ilegais

140%

Percentagem de inquiridos

120%

27%

100% 80% 60%

94%

73%

40% 20% 6% 0% Sim

Não

Ilegais Legais

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Contudo, a permanência dos imigrantes em situação ilegal não é aceite por 73% dos inquiridos, sendo justificada por um conjunto de argumentos pró e contra o imigrante. Por um lado, os inquiridos que manifestaram esta opinião acham que os ilegais beneficiam indevidamente de direitos (4%), infringindo a lei quando deveriam cumprir (24%). Além disso, referem que a irregularidade da sua situação gerará situações de precariedade das condições de vida, podendo arrastar estes indivíduos para a mendicidade, criminalidade (tráfico de droga, roubos…) o que se constituirá como uma alteração ao equilíbrio da ordem pública (28%). E mais uma vez, alguns inquiridos acham que Portugal é um país pequeno e que cá já se encontram demasiados imigrantes (11%), argumento este que, para qual seja a situação, se é que alguma vez poderá ser considerado como tal propriamente dito, aparece sempre mal fundamentado e pouco desenvolvido. Por outro lado muitos dos inquiridos que não concordam com a presença de ilegais no território português defendem o próprio imigrante, referindo que se tratam de situações irregulares, as quais poderão levar a que o imigrante não possa usufruir de direitos, principalmente no trabalho, onde muitos acabam por ser explorados (13%), fomentandose assim as situações de mendicidade (13%). Cerca de 27% dos inquiridos referiram que concordam com a presença de imigrantes ilegais no território nacional. Tal facto parece estar relacionado com a própria comunidade da Europa de Leste, de Vila Viçosa, uma Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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vez que existiram/existem casos de imigrantes com a situação irregular. Vivendo muitas vezes em situação precária, são alguns membros da comunidade de autóctones (vizinhos, amigos…) que ajudam não só na assistência a necessidades básicas, como também no próprio processo de regularização. Desta forma, a percepção que estes indivíduos têm do «imigrante ilegal» não é uma construção baseada em ideias negativas ligadas ao crime e à mendicidade, mas antes numa visão mais humanitária de igualdade de direitos e deveres, já que da parte do Outro há uma vontade e predisposição cumprir os deveres e beneficiar dos direitos. Gráfico 36 – Percepção dos autóctones inquiridos, sobre os Direitos e Deveres dos imigrantes em Portugal

100%

94%

96%

Percentagem de inquiridos

80% 60% 40% 20% 4%

2%

0%

Ig ua is

(m en os )

4%

Se m el ha nt es Di fe re nt es (m ai s)

Direitos

Di fe re nt es

Se m el ha nt es

Ig ua is

0%

Deveres

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Os autóctones inquiridos revelaram, na sua maioria, que os imigrantes devem ter direitos (94%) e deveres (96%) iguais ao cidadão nacional, partindo do princípio de que ambos têm as mesmas obrigações. De referir houve alguns inquiridos que acham que os imigrantes devem ter menos direitos e mais deveres que os nacionais. Mais importante do que referir as áreas em que a diferença devia ser marcada, parece ser o facto de referir que os que opinam desta forma, são jovens entre os 16 e os 22 anos (do sexo feminino), grupo donde talvez se esperasse uma maior abertura e tolerância. Pelo contrário, e como veremos mais adiante, são os mais velhos que muitas vezes mostram uma posição mais equilibrada e tolerante, fruto de uma maior experiência de vida, pois apesar da maior Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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parte nunca ter saído para trabalhar/residir fora do concelho, certas situações temporárias, como por exemplo a participação na guerra colonial ou o cumprimento do serviço militar obrigatório/voluntariado, promoveu o encontro com o Outro, ajudando o autóctone a construir uma imagem diferente do mesmo. Cerca de 79% dos autóctones inquiridos referiram desconhecer a legislação referente aos direitos e deveres dos imigrantes, embora 19% afirme que conhece mais ou menos e 2% assegure que conhece completamente o que vem consignado na lei. Visto que alguns inquiridos estiveram emigrados no Canadá e na Alemanha, é natural que conheçam a legislação referente aos imigrantes, no entanto a busca da informação foi feita na sua perspectiva e não na do Outro, imigrante estrangeiro em Portugal. Desta forma, há a possibilidade de mesmo aqueles que afirmam ter conhecimentos da temática, não estar consciencializados para a perspectiva do imigrante estrangeiro que chega a Portugal. Apesar de alguns manifestarem um certo receio do Outro, parece que, de uma maneira geral, os imigrantes são bem aceites por estes inquiridos, pelo menos aqueles que já cá se encontram em situação regular. Os outros que se encontram em situação irregular e os que ainda não entraram mas que poderão vir a entrar no nosso território, já são considerados como «excessivos». Esta superfluidade certamente estará influenciada pela conjuntura económica, que condiciona negativamente o nível de vida dos autóctones, o que os pode levar a construir uma imagem negativa do imigrante, uma vez que a motivação dominante no processo migratório se prende essencialmente com questões de emprego. Desta forma, instalase o medo que o imigrante venha ocupar postos de trabalho do autóctone, prejudicando ainda mais a sua situação. No fundo trata-se de uma atitude de precaução e de medo face a um futuro que o presente do país também não está a ajudar a construir da melhor forma. 3.3. O imigrante da Europa de Leste no quotidiano da Comunidade 3.3.1. O processo de integração e seus impactes Portugal é um país onde já há alguma variedade de origens de grupos migratórios. Podemos dizer que praticamente todos os continentes estão representados em Portugal: África com os imigrantes dos PALOP; Ásia com os imigrantes Chineses e Indianos; América com os imigrantes Brasileiros; Europa com os Europeus de Leste. Estes são apenas alguns dos grupos, visto que no nosso país existe uma panóplia considerável de Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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outras nacionalidades, embora o número dos seus membros não tenham grande peso absoluto na população total. Desta forma, achou-se pertinente procurar saber quais os grupos de imigrantes com que os autóctones mostram ter mais afinidade. Esta questão parece ser importante, na medida em que a integração será mais fácil a partir do momento em que o autóctone sinta que tem algo em comum com o imigrante. A busca do «ponto comum» poderá ser uma forma de chegar ao Outro com mais facilidade, identificar os seus problemas e potencialidades, de evitar a construção de uma imagem baseada em receios e dúvidas. Não quer dizer que a diferença não seja uma outra forma de se proceder à integração. A assimilação de experiências e pontos de vista diferentes é também uma forma de aproveitar aquilo que o Outro tem para dar e muitas vezes a «diferença» e a «novidade» são vistas como um ponto positivo na construção da própria dinâmica da comunidade. Quadro 11 – Afinidades dos autóctones inquiridos, relativamente a diversos grupos de imigrantes Nacionalidades / Origens

Grau de Afinidade

Brasileiros

4,3

Europeus de Leste

3,8

Africanos (PALOP)

2,9

«Reformados» (Europeus)

2,3

Chineses / Indianos

1,6

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Assim, foi pedido aos autóctones inquiridos que hierarquizassem as suas afinidades, relativamente a um dado conjunto de grupos de imigrantes192. Constatou-se que o grupo dos imigrantes Brasileiros são aqueles com quem os inquiridos revelaram ter mais afinidade (4,3). O facto dos inquiridos falarem a mesma língua, bem como a ligação histórica entre Portugal e Brasil, parece ter ajudado nesta representação. Os Europeus de Leste (3,8) aparecem em segundo lugar, pois embora possam haver dificuldades na comunicação, a sua presença começa a ser uma constante em 192. Refira-se que foi pedido aos inquiridos que de 1 (grupo com que têm menos afinidade) a 5 (grupo com que têm mais afinidade), hierarquizassem as suas opções, a partir dos grupos referenciados no quadro. Os valores apresentados são a média aritmética dos resultados. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Vila Viçosa. A integração no quotidiano, principalmente ao nível de relações estabelecidas no trabalho e na habitação (vizinhança), começam a tornar-se cada vez mais comuns. No grupo dos Africanos (PALOP) há uma maior contradição. Se por um lado há em comum a língua portuguesa, por outro as características físicas e as diferenças culturais parecem ser entraves na aceitação. O factor histórico intervém na visão que se construiu deste grupo, mais especificamente a Guerra Colonial. Alguns inquiridos participando apenas por uma questão de obrigatoriedade imposta pelo regime da época, referiram ter feito amizades com africanos e que por isso lhes são um grupo bastante próximo. Contudo, são os mais velhos, os que participaram neste momento histórico, que mostram esta atitude, a qual nem sempre é seguida de perto pelos mais jovens. Os «Reformados» (Europeus) 193 (2,3) e o grupo dos Chineses/Indianos (1,6) foram aqueles cujos autóctones assumiram ter menos afinidade, revelando que para isso muito contribui o facto de nunca terem tido contacto com membros desses grupos de imigrantes. Contudo, as características físicas e as diferenças culturais parecem ter intervido na hierarquização. Analisando mais especificamente os motivos que levam os inquiridos a preferir ou preterir um grupo de imigrantes relativamente a outro, constatou-se que a razão que levou os membros da amostra ter mais afinidade com determinado grupo foi o facto de falarem a mesma língua do grupo em questão (58% das respostas), ou de já terem estabelecido relações de amizade com os seus membros (44% das respostas) e as características físicas em comum (19% das respostas). Ao contrário, o que levou à escolha do grupo com que revelaram ter menos afinidades foi o facto de nunca terem conhecido/contactado com ninguém do referido grupo de imigrantes (68% das respostas), o facto de não conhecerem a sua língua (40%) ou de revelarem hábitos (24%) e características físicas (16%) diferentes. O aspecto físico e a língua são os aspectos que prevalecem em ambas as situações, ou seja, a visão do primeiro contacto. O primeiro factor parece impensável nos dias que correm. O processo de globalização e a disponibilidade de informação transmitida pela comunicação social, coloca à disposição do indivíduo o conhecimento, ainda que

193. Correspondem a indivíduos que após entrarem no seu período de reforma, procuram o sul da Europa para viver (os já falados Sun-Seekers). Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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indirecto, de outras culturas. Numa era onde a imagem é tudo, estamos habituados a ver na televisão, imagens dos quatro cantos do mundo e dos seus povos, ainda provoca estranheza um indivíduo que tenha uma fisionomia diferente da habitual. A falta de contacto com outros espaços está aqui bem marcada. E se o aspecto físico poderá ser um aspecto facilmente superado após um primeiro contacto, a língua torna-se um elemento mais moroso, que necessitará de mais tempo para ser ultrapassado como obstáculo. No entanto, não quer dizer que a comunidade não aceite os imigrantes estrangeiros. Cerca de 71% dos inquiridos acha que a presença de imigrantes em Vila Viçosa é bastante positivo, uma vez que desenvolvem a economia da região, não tanto ao nível do investimento propriamente dito, mas mais porque se trata de um grupo, como já foi dito anteriormente, bastante trabalhador e que se dedica bastante às tarefas que desempenha. Por outro lado os inquiridos acham que podem rejuvenescer demograficamente a população. Este é um facto que não se assegura, na medida em que as famílias de imigrantes não têm mais que 1 ou 2 filhos, sendo poucas as que têm 3 ou mais filho. Contudo, o mesmo tipo de argumentos que anteriormente verificamos ser a base da explicação da oposição à entrada de mais imigrantes em Portugal, repete-se quando se trata do concelho de Vila Viçosa. Cerca de 11% dos inquiridos acha que os imigrantes poderão provocar distúrbios, além de ocuparem postos de trabalho que deveriam ser para os autóctones e terem hábitos diferentes da comunidade. Já 18% acha que o quotidiano da comunidade não se alterou com a vinda de imigrantes, que nada melhorou ou piorou, o que poderá ser não tanto um sintoma de indiferença, mas antes de aceitação do Outro como semelhante. É de referir que muitos dos inquiridos podem achar que o país não necessita de mais imigrantes e que a concentração de alguns grupos desfavorecidos em certos locais pode levar a situações de instabilidade social. Mas há uma certa vontade em receber/manter os imigrantes da Europa de Leste em Vila Viçosa, já que até encontram vantagens na sua presença. Alem disso, é de ter em consideração que este grupo de imigrantes é considerado como sendo afável e de bom trato. É muito comum verem-se portugueses e moldavos, ao final do dia de trabalho, na mesma mesa do café, a discutir futebol em algumas esplanadas da vila. Um dos motivos que poderá facilitar a integração nesta região é o facto da migração ser de carácter familiar. São melhor aceites os imigrantes com Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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família, do que propriamente aqueles que imigraram sozinhos. Normalmente os que têm família dedicam-se a ela e trabalham no sentido de prover e promover toda a harmonia e estabilidade possível a esse núcleo, o que se reflecte obviamente nas motivações e no comportamento do indivíduo, fazendo com que por isso seja respeitado pela própria comunidade. Contudo, os indivíduos que migram individualmente aceitam melhor as situações precárias, porque não têm a família directamente envolvida, daí que muitas vezes se gerem situações ligadas ao álcool e a distúrbios, por isso, a população vê no «imigrante individual» uma ameaça à ordem pública. Como aqui a esmagadora maioria dos imigrantes trouxe a família, a comunidade vê neste grupo uma vontade e um esforço para a integração, que progressivamente é atingido. E são os próprios autóctones que chegam a denunciar casos de injustiças. Apesar de 73% dos inquiridos achar que os imigrantes estão bem inseridos na comunidade de Vila Viçosa, 27% acha que não, uma vez que conhecem situações onde de exploração no trabalho. Por outro lado, 94% dos autóctones acha que a vida da comunidade em si não foi alterada. Tudo parece indicar que esta comunidade está no bom caminho para a integração dos imigrantes da Europa de Leste no seu quotidiano. 3.3.2. As relações Imigrante/Autóctone A presença do imigrante na vida diária de Vila Viçosa não deixa a comunidade indiferente. O Outro é notado e o seu papel assumido, sendo tal facto promovido por factores como a proximidade de residência, ou porque se estabelece o conhecimento no local de trabalho, ou ainda porque há um aprofundamento das relações e se desenvolvem laços de amizade. A presença do imigrante da Europa de Leste, especialmente dos moldavos (grupo que imigrante em maioria face a outras nacionalidades, em Vila Viçosa), é manifesta e o autóctone vivencia o seu dia-a-dia com base em relações que paulatinamente se vão estabelecendo. Quando se reflecte sobre as relações estabelecidas com a comunidade imigrante, verificamos que 54% dos inquiridos autóctones afirmam que apenas conhecem «de vista» alguns indivíduos, sendo que, apesar de se cumprimentarem, não estabelecem qualquer tipo de diálogo que possa vir a gerar algum tipo de relacionamento. É comum, em vilas e povoações relativamente pequenas do Alentejo, as pessoas cumprimentarem-se na rua, independentemente de se conhecerem ou não. Normalmente, os imigrantes de Leste aproveitam essa particularidade cultural, para promover a aceitação e a integração, já que são eles os primeiros a cumpriFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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mentar. Esta prática deixa os autóctones com uma boa impressão destes imigrantes, dai que muitas vezes a imagem de boa educação que pauta o comportamento dos imigrantes da Europa de Leste, venha precisamente da forma como intervêm com a população. Este é um pequeno gesto que tem dado alguns frutos, principalmente porque ajuda à construção da imagem de um grupo imigrante equilibrado, perseverante e com vontade de integrar a vida da comunidade do local de chegada. Gráfico 37 – Relações mantidas entre os autóctones inquiridos e os imigrantes da Europa de Leste em Vila Viçosa

4%

Nenhuma

Relações

Amizade e outra

22% 10%

Amizade Colega de trabalho

2%

Vizinhança e outra

2% 6%

Vizinhança

54%

Conhecidos 0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Percentagem de Imigrantes

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Não há necessidade do imigrante se anular, de anular a sua identidade, até porque as diferenças entre o ser/estar no local de partida não são assim tão diferentes do local de chegada. Contudo, e apesar do autóctone achar que este Outro tem hábitos diferentes, já constatámos que tanto este como o imigrante acabam por reconhecer que não existiram mudanças significativas com a vinda deste grupo para Vila Viçosa, nem este grupo teve de alterar hábitos que já tinha. Houve sim algumas adaptações ao clima, a regras específicas na escola… não tanto impostas pela própria comunidade, mas mais por motivos da própria natureza e do funcionamento particular de cada um dos contextos. Desta forma, conseguimos justificar que 22% dos inquiridos tenha respondido que tem uma relação de amizade e não só, ou seja, tratam-se de Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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pessoas que conheceram o imigrante porque trabalhava no mesmo local, ou porque vivia próximo. Apenas 4% dos inquiridos diz não ter qualquer relação com os imigrantes da sua terra. Visto este grupo ser relativamente pouco numeroso face à população total do concelho, faz com que nem sempre haja oportunidade de se estabelecer contacto, ou então o próprio inquirido (ou a outra parte) não teve interesse em fomentar qualquer tipo de relacionamento 194. Porém, achou-se pertinente investigar um pouco mais das relações entre a comunidade e estes imigrantes, daí que se tenha colocado um cenário relacional hipotético, de forma a compreender a disponibilidade, ou melhor dizendo, a abertura dos autóctones inquiridos ao Outro. Constatou-se então que a grande maioria dos inquiridos não se importaria de ter um imigrante como colega de trabalho (95%), amigo (96%) ou até mesmo familiar (86%). O número daqueles que diz importar-se, não parece ser significativo, no entanto é um pouco mais expressivo o grupo daqueles que, estando um pouco reticentes, talvez aceitassem ou não algum destes relacionamentos.

Percentagem de inquiridos

Gráfico 38 – Possíveis relações a estabelecer entre os autóctones inquiridos e os imigrantes da Europa de Leste em Vila Viçosa

100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0%

2%

2%

95%

96%

3%

2%

2%

Amigo

Familiar

Colega de trabalho

12%

86%

Depende Não

Relacionamento

Sim

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Assim sendo, verifica-se que os autóctones inquiridos não revelam grandes entraves em terem um imigrante como colega de trabalho ou amigo, 194. É ainda de referir que nenhum inquirido revelou ter relações de parentesco com os imigrantes estrangeiros da sua terra. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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quando a relação informal se torna numa relação formal, efectivada por laços de parentesco, parece haver, por parte de alguns inquiridos (12%), um pouco mais de reticências. No entanto, não quer dizer que haja uma inteira negação, uma vez que aqueles que manifestam esta posição afirmam que tal dependeria do grau de parentesco, ou melhor dizendo, dependeria da Outra pessoa e da sua forma de ser/intenções. De qualquer forma, tal argumento tanto parece servir a imigrantes estrangeiros, como a qualquer outra pessoa nacional, já que se trata de uma questão de carácter universal e não tanto de cultura. Gráfico 39 – Motivos que os autóctones inquiridos pensam estar na base da escolha de Vila Viçosa, como local de fixação dos imigrantes de Leste

Percentagem de respostas

60%

52%

50% 40% 30% 30% 20% 9% 10%

4%

4%

1%

Em pr Re eg un o Pr iã o ox fa im m id ili ad ar e de am Af in ig os id ad Ha es bi co ta m çã a o co Tr m an un qu id ad ili da e de do lo ca l

0%

Motivos

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Apesar de nenhum imigrante inquirido ter revelado qualquer afinidade com Vila Viçosa, a verdade é que 4% das respostas dos autóctones inquiridos revelam que este factor poderia ter sido uma motivação para este grupo ter escolhido este concelho para habitar, poderia estar nesta base. No entanto há a noção que a proximidade dos amigos do mesmo país (9% das respostas) poderá ter sido um motivo mais forte (como realmente os próprios imigrantes inquiridos já tinham revelado que sim). Apesar do relacionamento entre a comunidade /imigrante não ser o motivo mais preponderantes pelos quais os autóctones inquiridos acharam que Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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o grupo da Europa de Leste se estabeleceu em Vila Viçosa, acham pelo menos que, num segundo momento, contribuiu para que estes aqui tenham permanecido. O emprego (52% das respostas) e a reunificação familiar (30% das respostas) são os motivos primordiais que os inquiridos acham que contribuíram para a escolha e fixação dos imigrantes neste concelho. Porém, esta razão por si só não seria válida se a comunidade não contribuísse para tal, ou seja, a tranquilidade do local e a pacificidade da vida da população autóctone influencia o relacionamento com os imigrantes, que progressivamente se vão integrando no quotidiano de Vila Viçosa.

Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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IV – PERSPECTIVAS PARA O GRUPO DOS IMIGRANTES DA EUROPA DE LESTE EM VILA VIÇOSA Sumário: Neste capítulo serão analisadas as perspectivas de futuro dos imigrantes da Europa de Leste em Vila Viçosa, essencialmente ao nível da permanência ou não no concelho de residência. 1. ENTRE O PRESENTE E O FUTURO A questão colocada ao chegar a este ponto do estudo e que a própria comunidade de Vila Viçosa faz, prende-se com a permanência deste grupo: qual o futuro para os imigrantes da Europa de Leste neste concelho? Primeiramente, há que ter em consideração o facto de se tratar de um grupo de tradição imigratória recente, nomeadamente tendo como destino Portugal. É principalmente nos anos 90, como já houve oportunidade de verificar, que os imigrantes de Leste começaram a ter relevância quantitativa em Vila Viçosa. A sua vinda ocorre no final dessa década, mas em especial a partir de 2000. Há dois factores que parecem ser importantes nesta reflexão e que de uma certa perspectiva podem influenciar a decisão de ficar ou retornar. Esses factores estão relacionados com a situação conjuntural do local de partida e do local de chegada. Como já tivemos oportunidade de constatar, a permanência no local de chegada prende-se muitas vezes com a manutenção ou cessação das motivações que fizeram o imigrante escolher aquele local para residir/trabalhar. Neste caso, e olhando para o que se passa em ambos os pólos, reconhecemos que há uma instabilidade (a níveis diferentes) nos países da Europa de Leste e Portugal, pois se no primeiro caso se assiste a um contexto social, económica e politicamente vulnerável, condicionado pela destruturação de regimes políticos comunistas, no segundo caso prevalece uma crise económica e uma instabilidade política. Todos estes factores apresentados, certamente influenciarão a decisão do imigrante de ficar ou voltar para o país de origem. Nota-se que não há uma resposta definitiva e que mesmo tendo ideia de muitos terem intenção de pedir a nacionalidade portuguesa, ainda há um número considerável que não sabe se o quer fazer quanto a este assunto. A indecisão impera, portanto, numa comunidade que começa a ver os países da Europa de Leste se tornarem Estados-Membros, onde há a perspectiva de abertura de novas portas e da regularização da situação de instabilidade que prevalece nos países desta região da Europa. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Quadro 12 – Perspectivas futuras dos imigrantes inquiridos Pensa… Voltar para o país de origem?

Partir para outro país?

Partir para outra região de Portugal?

%

%

%

Sim

144

118

148

Não

146

132

142

Ainda não pensou

150

150

150

100

100

100

Opinião

Total

Elaboração própria – Inquéritos (2004).

Quando inquiridos sobre a questão, 44% dos imigrantes da amostra esperam um dia poder voltar para o país de origem, até porque parte da família lá ficou e afinal as suas raízes são lá que permanecem. Dos 50% que dizem ainda não ter pensado muito no assunto, a idade parece pesar na medida em que referem ser muito jovens para pensar no assunto. Por outro lado também afirmam que tal decisão dependerá do cenário da evolução económica portuguesa. Apenas 6% pensa em ficar no país definitivamente, uma vez que a disponibilidade de emprego permite que tenham uma vida diferente daquela que levavam no país de origem e isso satisfaz estes inquiridos. Mas anteriormente havia sido constatado que cerca de 24% dos inquiridos pretendem obter nacionalidade portuguesa: como explicar então o facto de apenas 6% quererem voltar ao país de origem? Por um lado há que contar com o facto de que muitos ainda estão indecisos quanto a estas questões, o que pode levar a uma certa contradição nas respostas. Por outro lado, a aquisição da nacionalidade pode ter um carácter utilitário, ou seja, pode ser conseguida no sentido de poderem auferir do estatuto de cidadãos portugueses (também e de promover uma certa estabilidade económico-social), enquanto aqui estiverem, não havendo contudo a intenção de permanecer indefinidamente no território português. Quanto são questionados sobre se gostariam de partir para outro país (que não Portugal ou o país de origem), e apesar de 50% dos inquiridos se mostrarem indecisos pelos mesmos motivos anteriormente expressos, 32% afirma mesmo que não, uma vez que aqui são proporcionadas condições de vida relativamente satisfatórias. Os 18% de inquiridos que afirmam querer partir para um outro país são mesmo os mais novos, mas Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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numa perspectiva futura que ainda se assemelha um pouco longínqua, só depois da independência face aos pais. Já quando questionados acerca do caso de Vila Viçosa, ou seja, se gostariam de sair deste concelho para qualquer outro de Portugal, continuam a ser os mais novos a dizer que sim (8% dos imigrantes inquiridos), contudo um número significativo refere que não gostaria de partir (42% dos imigrantes inquiridos), preferindo ficar. A posição é justificada não só pela questão económica (referem que aqui há disponibilidade de emprego), como também pelo facto de muitos deles aqui terem reunido a família, bem compatriotas do país de origem e alguns portugueses, que certamente estão na base do bom ambiente referido. E mesmo os 50% de inquiridos que afirmaram ainda não ter pensado muito no assunto acrescentaram que, apesar da sua indecisão, se sentem bem em Vila Viçosa. Portanto, e perante estas perspectivas de futuro, parece que apesar de haver alguma intencionalidade no regresso, quando não o há, a tendência é para que o imigrante de Leste pretenda ficar mais algum tempo no país, mais precisamente em Vila Viçosa. A disponibilidade de emprego e a tranquilidade do local parecem ser atractivos suficientes para basearem esta decisão. Por outro lado, ir para outro país da União Europeia poderia transformar-se num retrocesso. A verdade é que muitos referiram não terem imigrado para outro país da União, pelo facto de serem postos mais entraves ao processo de entrada e regularização de imigrantes. Por isso, face à relativa facilidade de entrada e regularização no nosso país, e perante condições sociais e económicas satisfatórias, é natural que não estejam interessando em procurar novos destinos, pelo menos enquanto as condições assim se mantiverem. O contacto com o país de origem também nos poderá fornecer algumas pistas sobre o futuro desta migração. A totalidade dos inquiridos referiu manter contactos com o país de origem, uma vez que lá deixaram parte dos familiares, os quais poderão, um dia mais tarde, ser o móbil da sua volta. Por outro lado, verifica-se que os contactos são de índole afectiva, ou seja, as saudades são apaziguadas através de telefonemas ou de eventuais encomendas que são trocadas, constituídas por produtos do país de origem (produtos alimentares específicos, livros…). Por exemplo, foi referido por um casal com filhos a frequentar o 1.º Ciclo do Ensino Básico, que recebem, quando necessário, encomendas com livros escolares em moldavo, para que os seus descendentes aprendam esta língua paralelamente ao português.

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Apesar de referirem ter alguns investimentos, estes remetem-se essencialmente para a habitação que tinham no país de origem e que é mantida, agora nem tanto com o intuito de um regresso a curto prazo, mas para passarem parte das férias. Também referiram enviar remessas, porém não muito significativas, já que 84% dos inquiridos revelaram encaminhar menos de 25% do rendimento médio mensal para o país de origem. Na verdade, o envio de remessas 195 restringe-se praticamente a alturas festivas, como por exemplo o Natal, e a parentes próximos (pais, avós, tios…). Tal facto não é de estranhar, visto que o núcleo familiar principal (constituído pelos pais e filhos) encontra-se aqui reunido. É certo que estas ilações, como já foi referido anteriormente, estarão condicionadas pela conjuntura económica portuguesa (mais especificamente relacionadas com o emprego e com os salários) e com a evolução do contexto geral dos países de origem. A entrada dos PECO na União Europeia revestiu-se de uma enorme esperança para estes imigrantes, na medida em que vêm nesta nova etapa da história dos países da Europa Oriental, uma nova dinâmica para o futuro. Aliás, 64% dos imigrantes inquiridos acham muito vantajoso o facto de terem entrado para um país que pertence à União Europeia. Reconhecem que a moeda única é muito forte e marca presença no mercado económico mundial, o que é uma mais-valia para os países aderentes. Por outro lado, valorizam o trabalho dos países em conjunto, bem como o facto de se poder circular livremente no espaço Schengen. A obtenção de residência também é mais facilitada na União do que em outras regiões mundiais. Este conjunto de benefícios de que Portugal usufrui por ser um Estado-Membro, parecem agradar a estes imigrantes, que se sentem integrados num sistema económico-social melhor do que aquele que estavam habituados nos países de origem, e que influenciou a decisão de saída do local de origem. Cerca de 94% dos inquiridos acha que a situação dos imigrantes vai estabilizar, havendo mesmo o caso de 4% que acham que vai melhorar, porque poderão surgir mais oportunidades de emprego (depois da crise). Há pontos que se contradizem na decisão de fixação do imigrante no país de voltar ou não ao país de origem e este é mais um. Certos factores indicam no sentido do estabelecimento a longo prazo (imigração de matriz familiar; envio de poucas remessas para casa, porque não têm grandes investimentos no país de origem…), mas também na efemeridade da passagem pelo território (a maioria não sabe se quer a nacionalidade portuguesa; 195. Não são aqui contabilizados os quantitativos monetários dos investimentos, mas antes algum dinheiro que possa ser enviado para parentes ou para contas bancárias que tenham deixado no país de origem. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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continuam com família no país de origem…). Há que ter em conta que são um grupo de imigração recente e isso pode significar que ainda se estão a adaptar ao modo de vida e ao território. E a Outra Europa está a transformar-se num forte que paulatinamente lhes fecha as portas. Este grupo de imigrantes que se fixou em Vila Viçosa, demonstra ainda a flexibilidade e a capacidade de aproveitamento das oportunidades geradas em concelhos deprimidos do interior do país, como é o caso do estudado. Neste caso e noutros que já começam a aparecer no interior do país, os Europeus de Leste tornam-se actores do desenvolvimento regional e local, uma vez que dinamizam o tecido económico como trabalhadores, e o tecido social/cultural como novos elementos da sociedade. No entanto, estas características, aliadas à vulnerabilidade que envolve muitas vezes o processo migratório, poderão fomentar o desenvolvimento de redes de tráfico de imigrantes, as quais devem serem urgentemente combatidas. A consciencialização do imigrante sobre o facto de contribuir para o desenvolvimento regional, poderá ser um ponto a favor da fixação no nosso país e em concelhos interiores como Vila Viçosa, visto que esta ideia provém do facto de mostrarem capacidade de aproveitar o potencial regional inerente a cada espaço. Contudo, a abertura da UE a novos países da Europa Ocidental poderá, além de fomentar de certa forma o fosso entre as regiões menos e mais desenvolvidas da Europa, incentivar o retorno ao país de origem, ou então à saída de Portugal para outros destinos. Este será um cenário que poderá ser colocado, se a facilidade de circulação entre países se verificar e se as situações económicas se afigurarem mais atractivas nos novos Estados-Membros. Talvez tenha sido a pensar sobre este ponto de vista, que muitos imigrantes inquiridos que responderam ao inquérito, se mostraram de certa forma indecisos, referindo sistematicamente uma sentença, que parece enquadrar-se perfeitamente neste contexto final: enquanto tiverem emprego e forem bem acolhidos pela comunidade, certamente por aqui ficarão. E do futuro… do futuro logo se verá.

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CONCLUSÃO Sumário: Neste ponto será feita a síntese das informações, reflexões e estudos realizados ao longo desta dissertação. Também se pretende que possam ser levantadas novas questões, as quais poderão servir de base para novos debates sobre a temática. ALGUMAS REFLEXÕES O tema das migrações exige uma contínua análise, dado que a dinâmica dos fenómenos que lhe estão inerentes requerem uma actualização permanente de dados, pontos de vista e das próprias realidades. Longe de ser um assunto acabado, abre novas perspectivas de estudo. Porém, nem sempre tal se assegura como uma tarefa facilitada, uma vez que: Permanece a incoerência de dados entre alguns organismos (em Portugal, nomeadamente entre o SEF e o INE); As diferentes realidades nacionais / regionais apresentam tratamento diferenciado de dados para o mesmo assunto; Nem sempre se encontram os dados pretendidos, ou porque não existem (como acontece por vezes para Portugal, à escala nacional ou a outras escalas de análise), ou porque não estão disponibilizados ao público; Os limites conceptológicos de algumas noções ligadas às migrações nem sempre são muito claros. O momento primeiro de uma migração, ou seja, a saída do local de origem e a escolha do local de chegada, pauta-se por decisões de variada ordem: A Imagem Territorial, construída a partir de informações externas ao indivíduo, condiciona a percepção que este constrói do local de chegada. Esta pode estar muito desfasada da realidade, criando expectativas que não são de todo exequíveis; As motivações que estão na base da migração podem ser de origem física ou humana, destacando-se o factor económico como base da maioria dos movimentos migratórios; Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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A escolha/permanência num determinado local tem também a ver com a situação de atracção/repulsão criado nos dois pólos da migração. Será pela manutenção/alteração do peso exercido pelos factores de repulsão do local de partida e dos factores de atracção do local de chegada, que dependerá a duração do processo migratório. Por outro lado, tem-se constatado a evolução da figura do imigrante à luz do Direito, pois cada vez mais há a necessidade de clarificar o papel do Outro, em termos de direitos e deveres, face à comunidade estabelecida: Apesar da evolução sofrida ao longo dos tempos, o Direito apresenta ainda algumas contradições face à figura do imigrante, nomeadamente no caso português, facto não só propiciado pelo choque entre algumas directivas comunitárias e a realidade nacional, como também porque o país só a partir da década de 90 começou a receber fluxos significativos de imigrantes estrangeiros; Portugal, através de Diplomas e Decretos-Lei ainda um pouco avulsos, tem tentado clarificar os direitos e deveres do imigrante, no sentido de promover a sua integração e de controlar os fluxos migratórios; As diversas realidades dos Estados-Membros da UE e o supranacionalismo (no que diz respeito ao poder), são «barreiras» ao estabelecimento de uma política migratória comum. Tais questões certamente se repercutem na vida do imigrante que, durante muitos anos, chega a viver numa situação dúbia. A sua imagem e a sua integração são pontos essenciais para minimizar essa situação. Do ponto de vista social, a identidade do imigrante assenta numa dupla questão: preservação ou mudança? A percepção deste face ao território envolvente, e do autóctone relativamente ao imigrante, resultam numa interacção, nem sempre pacífica, entre o Outro e a comunidade do local de chegada: A construção da nova identidade (ou a reformulação da mesma), passará por um conjunto de etapas, processo esse mediado pelo espaço de encontro entre o autóctone e o alóctone. É aí que contraporão as suas diferenças e similitudes, resultando no domínio de um grupo face a outro (assimilação) ou na interacção de ambos (integração); Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Os imigrantes são considerados um grupo vulnerável, uma vez que a precariedade da sua situação profissional (exercício de funções ligadas à economia informal) e social (situação de ilegalidade/clandestinidade) os remete para uma situação de segregação social; O espaço associativo pode promover a integração com a comunidade, embora no espaço português, apenas os imigrantes dos PALOP, instalados há mais tempo no país, tenham um maior número de associações; O domínio da Língua do país de chegada é tido como um ponto forte, não só para a manutenção das «raízes», como também para a integração na nova comunidade. O quotidiano do imigrante traduz, de certa forma, até que ponto esse processo é ou não desenvolvido. São várias as áreas em que essa análise pode ser efectuada: O campo do Trabalho condiciona, na maior parte das vezes, o processo migratório (em termos de motivação). A Europa sofre o efeito tanto de fluxos de trabalhadores não qualificados, como de profissionais altamente qualificados; A irregularidade da situação do imigrante, leva a que este prefira desempenhar a tempo inteiro/parcial, funções na economia informal, estando mais expostos a um contexto de exploração no trabalho; A entrada de imigrantes na Europa é vista como um manancial de mão-de-obra, capaz de suprir a necessidade de activos num espaço com a população cada vez mais envelhecida. Contudo, o comportamento demográfico de muitos grupos imigrados é similar à matriz europeia; No campo da Saúde, os acidentes de trabalho ainda são bastante frequentes entre os imigrantes, sendo reveladores da vulnerabilidade laboral a que muitos continuam expostos; No campo da Educação, a escola é vista como um local de integração, por excelência, embora ainda padeça de falta de programas e actividades adequadas que fomentem este processo; No que diz respeito à Habitação, ainda se verifica que as áreas residenciais são reveladoras do espaço como elemento de segregação social dos grupos imigrados. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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O espaço Europeu é a origem/destino de fluxos, seja de indivíduos em situação legal ou ilegal/clandestina. Ao longo do tempo, a dinâmica migratória tem-se vindo a alterar: Nos dias actuais verificam-se não só movimentos extraeuropeus, como intra-europeus, muitos motivados pelas quedas do regime comunista (Europa de Leste); A Grécia, Itália, Espanha e Portugal, têm vindo a receber cada vez mais imigrantes, quer do espaço extra-europeu, como do intra-europeu, sendo considerados como países de imigração recentes; De «escolhida», a tendência da Europa para «escolher» os seus imigrantes, parece ser cada vez mais notada, já que se tem verificado o reforço fronteiriço e político dos fluxos. Em Portugal, o cenário das migrações também se tem vindo a alterar, principalmente a partir da década de 90. Os fluxos tendem a ser cada vez em maior quantidade e a revelar uma maior variedade de origens: Para além dos imigrantes dos PALOP, tende a aumentar o número de imigrantes do Brasil, Asiáticos e da Europa de Leste; O perfil do imigrante estrangeiro tem-se alterado. Hoje pode falar-se de uma bipolarização dos grupos de imigrantes em Portugal, fruto da formação académica e profissional que apresentam (elevada, nos imigrantes de Leste; fraca, nos imigrantes dos PALOP); Os imigrantes da Europa de Leste, apesar de revelarem semelhanças entre si, do ponto de vista geral (habilitações literárias elevadas, idade acima dos 30 anos…), apresentam diferenças particulares (nas áreas já referidas e noutras, conforme a sua origem). A dispersão geográfica tende a acentuar-se no território português. Apesar das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e de alguns distritos do litoral (como Aveiro, Faro…) concentrarem a grande parte dos grupos migratórios, cada vez mais se assiste à procura de algumas áreas do interior para fixação. Tal acontece em Vila Viçosa, onde reside um grupo significativo de imigrantes da Europa de Leste (maioritariamente moldavos), o qual foi alvo deste estudo: A grande maioria dos inquiridos reagrupou aqui a família (migração de carácter familiar), a qual apresenta uma estrutura demográfica similar aos padrões portugueses («pais e dois filhos»); Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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Viviam na capital da Moldávia (Chisinau), exercendo profissões ligadas à indústria e aos serviços (formação profissional média); A saída do local de origem/entrada em Portugal, teve como principal móbil motivos económicos (emprego, salário) e familiar (reunificação); Não houve dificuldades significativas na regularização, apesar de muitos ainda terem estado algum tempo em situação irregular; A Língua e a integração no mercado-de-trabalho foram as principais dificuldades sentidas no momento de chegada, embora no momento presente estas tenham sido praticamente superadas; A indústria extractiva do mármore e a construção civil são as grandes áreas que ocupam os activos imigrantes do sexo masculino. A restauração e os serviços domésticos oferecem lugar a grande parte do contingente feminino. Porém, as ofertas do mercado de trabalho, em termos de variedade, são escassas; Residentes na sede do concelho, beneficiam dos serviços de saúde e de educação públicos disponíveis. Os autóctones de Vila Viçosa, constituindo-se como a comunidade de acolhimento, também emitiram o seu parecer sobre a presença de imigrantes em Portugal/Vila Viçosa. Deste estudo, surgiram várias pistas que poderão levar a melhor compreender o processo de integração do Outro: Concordam com a permanência de imigrantes legais em Portugal, porém discordam da permanência de imigrantes ilegais/clandestinos; Mostram-se um pouco cépticos, quanto à entrada de mais imigrantes em Portugal, no entanto acham positivo a presença de imigrantes da Europa de Leste em Vila Viçosa, já que os consideram como factor que poderá propiciar o desenvolvimento da região; Revelam mais afinidades com os brasileiros do que com os Europeus de Leste, embora este seja o grupo dominante. A Língua aparece, mais uma vez, como elemento primordial no processo de integração; Acham que os imigrantes devem ter os mesmos direitos e deveres que os cidadãos portugueses, reconhecendo que ainda existem situações de exploração no trabalho, nomeaFát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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damente em Vila Viçosa. Contudo consideraram que os Europeus de Leste se encontram bem inseridos na sua comunidade. Mas que futuro para a imigração da Europa de Leste em Vila Viçosa? A maioria dos inquiridos no estudo, ainda não decidiu se quer ou não regressar ao seu país de origem. Porém mostraram intenções de permanecer o período da sua migração em Vila Viçosa; Os autóctones consideram os imigrantes da Europa de Leste como um grupo constituído por indivíduos bem-educados e trabalhadores, não se importando de estreitar laços de amizade/trabalho/familiares com os mesmos. Portugal, no início do século XXI, revela-se como um país de imigrantes. No entanto, e se fomos (e ainda somos) essencialmente um país de emigrantes, hoje a leitura das migrações começa a alterar-se, já que existe um número considerável de estrangeiros imigrados em território nacional. Este cenário faz de Portugal um dos países de imigração recente da Europa do sul. É portanto urgente que o país conheça quem tem e quem vem à procura de um cais de abrigo, que tantas vezes se revela antes como um lugar de expectativas irrealizáveis. A proliferação de máfias e de angariadores de mão-de-obra ilegal é um negócio crescente, com base em massas humanas onde a situação escravizante é um atentado aos direitos humanos. A situação económica, social e política ditará a evolução dos próprios fluxos imigratórios ao nível do tempo de permanência, da situação humanitária e social dos imigrantes, e até do próprio desenvolvimento regional do país. Num país que até agora estava habituado a ver partir os seus residentes transformados em emigrantes, chegou a altura de assumir o papel de receptor de imigrantes. É por isso urgente aprender a o olhar o Outro, não só no sentido crítico, mas com a perspectiva de que ele cada vez mais integra o nosso dia-a-dia. Como país de emigrantes que fomos e somos, o dever é ainda mais acentuado, já que muitos sentiram efectivamente o significado de imigrante, no mais pleno sentido pejorativo (se é que esta associação alguma vez fará sentido). Numa Europa em que somos Nós Mesmos e simultaneamente o Outro, não passamos de elementos de uma cadeia humana dinâmica, onde é urgente a promoção para o desenvolvimento. Pois bem, que o novo milénio seja sinónimo de que o Outro Imigrado tenha o seu lugar efectivo nessa cadeia e que contribua para o seu fortalecimento. Fát i m a Ve l e z d e Ca s t ro

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